Uma chance de mudar a economia - Agência de Notícias Brasil

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Agência de Notícias Brasil-Árabe - SP
12/06/2012 - 07:00
Uma chance de mudar a economia
Especialistas dizem que a Rio+20 é uma oportunidade para discutir o
desenvolvimento da economia verde e a inclusão social, mas pode acabar sem
resultados, pois isso exige grandes mudanças.
Marcos Carrieri
São Paulo – Existe o risco de que a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento
Sustentável, a Rio+20, resulte em muitas declarações e nenhum efeito prático. Não apenas
porque chefes de estado de países influentes no cenário internacional cancelaram sua vinda ao
Rio de Janeiro, mas porque, segundo especialistas, há pouco foco no objetivo da conferência:
assegurar um comportamento político “renovado” para o desenvolvimento sustentável e avaliar
quais foram os progressos feitos até aqui a partir de conferências sobre o clima.
Para que dê algum resultado, a Rio+20 precisa extrair dos participantes compromissos que até
agora não foram alcançados: combater o consumo excessivo, obter energia de fontes limpas,
desmatar menos e promover a inclusão social no contexto da economia verde.
Físico e professor da Universidade de São Paulo (USP), José Goldemberg crê que a Rio+20
não irá resultar em acordos de redução de emissões nem de metas para substituição de
matrizes energéticas, por exemplo. Afinal, diz, esta conferência não tem caráter legislativo,
como teve a Eco-92, também realizada no Rio.
“A Rio+20 foi escolhida para marcar o 20º aniversário
da Eco-92, que foi uma conferência legislativa. A partir
dela se adotou a convenção do clima, Agenda 21 e da
Biodiversidade. Alguns países ratificaram e o que se
decidiu nela virou lei. Isso (legislar) não está previsto na
Rio+20. Ela será uma avaliação desses 20 anos, nos
quais os problemas não desapareceram. Até se
agravaram”, observa.
O documento que irá pautar a conferência, o rascunho
zero, recebeu 643 sugestões de propostas que estão
Divulgação
Goldemberg: Rio+20 pode tentar gerar
compromissos
sendo debatidas pelos negociadores. Antes da abertura
oficial da Rio+20 será realizada uma última rodada de discussões para se decidir o que será
incluído e o que será cortado. Goldemberg afirma que ainda dá tempo de incluir a celebração
de um compromisso que a conferência não fique apenas nas declarações.
“Dá tempo de incluir que dentro de três a cinco anos os países se comprometam a fazer
negociações para definir as responsabilidades de cada um. Senão, a Rio+20 corre o risco de
ser apenas declaratória”, diz. Essas “responsabilidades”, avalia Goldemberg, poderiam
determinar o que cada país pode fazer para obter eficiência energética, como cada um pode
obter melhorias na sua cadeia produtiva e onde cada um pode cortar suas emissões de carbono
para se enquadrar na economia verde. Isso exigirá uma transformação nos fundamentos
econômicos, que, para o pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP, Wagner da
Costa Ribeiro, é possível.
“A economia verde propõe até mudanças de paradigmas da globalização. Hoje, uma empresa
extrai minério do Pará, coloca num trem e envia este minério para o Maranhão. De lá, embarca
em um navio para a China, a milhares de quilômetros daqui. Lá, esse minério é processado e
retorna ao Brasil. Não dá para pensar num fluxo assim na economia verde.”
Consumo e consumismo
Outro desafio que se faz neste processo, e que é parte do que será discutido na Rio+20, é como
aliar eficiência energética com uma sociedade cada vez mais consumista e com uma
população mundial cada vez maior. Em 1999, a população mundial era de seis bilhões de
habitantes. Hoje, é de sete bilhões. Em 2030 serão oito bilhões e, em 2050, nove bilhões de
pessoas. A questão não é mais sobre como alimentar tanta gente, uma preocupação do
economista Thomas Malthus no século 19, mas como alimentar tanta gente e oferecer a todos
condições dignas de sobrevivência sem degradar ainda mais o planeta.
Divulgação/ONU
Isso só será possível se a inclusão social considerar na
sua agenda a economia verde. “Hoje temos uma crise não
apenas de empregos, mas do trabalho. A economia verde
tem que gerar postos de trabalho para incluir recuperação
de áreas degradadas, de rios, reciclagem do lixo,
trabalhar com uma agricultura sem agrotóxicos”,
exemplifica Ribeiro.
Na economia verde, todos têm acesso à
água
Gerente executivo de relações com investidores do
Instituto Ethos, Henrique Lian também afirma que a
Rio+20 precisa discutir o sistema econômico atual e formas de incluir todos em um
desenvolvimento sustentável. “Há 1,4 bilhão de pessoas que não têm luz. Elas precisam ter luz.
Todos precisam mudar para que se tenha um padrão de consumo aceitável”, diz.
Para Ribeiro uma forma de construir um mundo socialmente mais justo e ambientalmente mais
responsável seria investir em instituições multilaterais responsáveis por dialogar e cobrar os
compromissos dos países signatários.
“A Rio+20 irá tratar da governança da ordem ambiental internacional, que discute os protocolos
e tem três opções na agenda: o primeiro seria discutir a criação de uma Organização Mundial
do Meio Ambiente. Para isso, teriam que ser revistos 300 acordos internacionais; o segundo
seria fortalecer o Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), que foi criado
em 1972, mas tem poucos recursos. Se tivesse mais recursos, seria mais importante. O terceiro
seria não fazer nada. Acho que a opção mais conveniente seria fortalecer o Pnuma e
aperfeiçoá-lo”, afirma.
O Brasil na economia verde
De acordo com informações da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), a
participação do petróleo como fonte de energia caiu em 2009 em comparação com 1973. Por
outro lado, ganharam importância o carvão, gás, usinas nucleares e hidrelétricas.
O levantamento da IEA aponta que em 1973 o petróleo correspondia a 46% fornecimento de
energia primária. Em 2009, essa participação caiu para 32,8%. A participação do gás natural
subiu de 16% para 20,9%; a nuclear subiu de 0,9% do total para 5,8%; aquela proveniente de
hidrelétricas, que representava 0,8% do total em 1973, passou a corresponder a 2,3% em 2009;
e a energia proveniente do carvão aumentou sua participação de 24,6% para 27,2%. A
quantidade de energia consumida no mundo dobrou neste período, segundo a IEA.
Em uma economia verde seria preciso obter energia a partir de fontes menos poluentes do que
o petróleo. Isso abre oportunidades para o Brasil, que, segundo Lian, tem credenciais de
sustentabilidade significativas. “A China teria que mudar o seu modelo produtivo, o Brasil já
larga na frente, mas precisa transformar essa vantagem em oportunidade”, diz.
Goldemberg também observa que o País, com sua matriz energética essencialmente “limpa”, é
mais “verde” do que muitos asiáticos, africanos e europeus. A missão do Brasil seria cortar o
desmate e as queimadas.
Ainda de acordo com informações da IEA, o Brasil é o segundo maior produtor mundial de
energia a partir de usinas hidrelétricas. O primeiro é a China. As hidrelétricas correspondiam,
em 2009, a 83,7% da geração de energia doméstica no Brasil. Nesse aspecto, o País só fica
atrás da Noruega, onde 95,7% da energia doméstica é gerada a partir de hidrelétricas. Para a
China, a geração de energia a partir de hidrelétricas correspondia, em 2009, a 16,7% do total,
mas, no país asiático, a principal matriz ainda é o carvão.
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