Economia Verde VIEIRA, Agostinho. “Economia Verde”. O Globo. Rio de Janeiro, 8 de agosto de 2013. Em 2008, na gestão de Carlos Minc no Ministério do Meio Ambiente, um acordo informal foi fechado entre a área ambiental e o setor energético do governo. O primeiro se encarregaria de tornar mais ágil a análise e a liberação das licenças ambientais dos projetos hidrelétricos. Inclusive da polêmica obra de Belo Monte. Em contrapartida, o governo não faria mais leilões envolvendo as poluentes usinas térmicas a carvão. Alguns empresários e certos ambientalistas não gostaram nem um pouco dessa combinação. Mas o fato é que, nestes cinco anos, as hidrelétricas voltaram a ser construídas com mais celeridade e nenhum kW novo de energia suja entrou no sistema. Além disso, cresceu bastante a participação de fontes alternativas, como a eólica, a solar e a biomassa. No próximo dia 29 de agosto, essa história termina e o governo volta a incluir as térmicas a carvão num leilão de energia. Dos 7.552 MWh inscritos no leilão A5, que contratará a energia a ser entregue em 2018, cerca de 2.100 MWh devem vir de quatro usinas movidas a carvão. Duas no Rio Grande do Sul, uma em Santa Catarina e uma no Rio de Janeiro. Juntas elas poderão emitir mais de 15 milhões de toneladas de CO² por ano. Em 2011, todo o Sistema Elétrico Integrado do país emitiu 14 milhões de toneladas de CO²/ano. Ou seja, numa canetada só vamos contratar um aumento de 100% nas emissões do setor. O principal argumento do governo para este retrocesso é o da segurança. Ou melhor, o da falta de segurança energética. Os reservatórios das hidrelétricas estão mais baixos do que se gostaria e as licenças para novas usinas não estariam saindo tão rápido quanto se desejaria. Isso sem contar os conflitos com os índios, os protestos de ambientalistas e as greves dos trabalhadores nos canteiros de obras. Nos últimos 12 meses, todo o estoque de térmicas a gás, diesel e carvão precisou ser ligado para garantir o abastecimento. Com reflexos nos custos e nas emissões. Mas será que esta é mesmo a única alternativa? Obviamente, não. Mais uma vez estamos seguindo pelo caminho teoricamente mais fácil. Ganham os produtores de carvão do Sul do país, ganham alguns empresários que perderam dinheiro nos últimos anos e perde o país que passa a ter uma matriz energética desnecessariamente mais suja. O CO² gerado por kWh numa térmica a carvão é o dobro do que se produz numa térmica a gás e 80 vezes maior do que num parque eólico. Para não ser completamente injusto, é preciso reconhecer que o Sul do país vive uma situação de fragilidade energética. Como dizem os especialistas, eles são a ponta de linha do sistema elétrico nacional. Um espirro em Belo Horizonte pode representar uma gripe séria em Porto Alegre. O potencial hidrelétrico da região é mínimo. A solução teria que passar por linhas de transmissão mais potentes e caras, usinas nucleares ou térmicas a gás e a carvão. Mas esse é um caso específico, de curtíssimo prazo e que sequer aparece nas explicações do governo. Não justifica, de modo algum, uma usina no Norte Fluminense usando carvão importado da Colômbia. As soluções de verdade passam por um programa sério de eficiência energética, novas hidrelétricas de diferentes tamanhos e fontes alternativas como o bagaço da cana. Dados da Associação Brasileira de Empresas de Serviços e Conservação de Energia (Abesco) indicam que o Brasil desperdiça mais de 10% da energia que produz. O que daria para abastecer toda a população do Rio. Um estudo da Agência Internacional de Energia (AIE) estima que o potencial de economia só no setor industrial supere os 50% e chegue perto de 80% nas áreas de construção. O problema é que isso dá trabalho e exige uma boa dose de coerência. O que não é exatamente o forte desta gestão. Nos últimos anos, acumulamos exemplos de paradoxos ambientais. O mesmo governo que anuncia investimentos de R$ 50 bilhões em mobilidade urbana reduz o IPI dos carros, facilita o financiamento e engarrafa as grandes cidades. Investimos em combustíveis novos, como o etanol celulósico, mas mantemos os velhos subsídios da gasolina. Daqui a 30 meses, no final de 2015, lideranças de todo o mundo vão se reunir em Paris para fechar um acordo global em torno das mudanças climáticas. Desta vez não haverá a divisão entre ricos e pobres, emissores antigos e novos. Todos terão uma cota de contribuição a dar. Inclusive o Brasil. A volta do desmatamento na Amazônia e a decisão de sujar a matriz energética pelos próximos 25 anos não ajudam muito. Vamos precisar de negociadores criativos.