Hemorragia Pulmonar

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HEMORRAGIA PULMONAR
Paulo R. Margotto
Capítulo do livro Assistência ao Recém-Nascido de Risco, Editado por Paulo R.
Margotto, 2ª Edição, 2004
A hemorragia pulmonar é definida pela presença de secreção tinta de sangue na
sucção do tubo endotraqueal, acompanhado por um aumento no índice de oxigenação maior
que 100% do valor imediatamente antes da ocorrência da hemorragia pulmonar.
Maciça hemorragia pulmonar no RN freqüentemente está associada à Doença da Membrana
Hialina, podendo ser, freqüentemente indistinguível desta do ponto de vista radiológico. A
incidência no período neonatal varia de 0.8 a 1.2/1000 nascidos vivos.
A mortalidade após a hemorragia pulmonar é alta (75 –90 %), embora a hemorragia
pulmonar não aumenta significativamente o risco de alterações tardias, pulmonar e
desabilidades neurocomportamentais.
FISIOPATOLOGIA
Pelo fato do hematócrito do sangue proveniente do pulmão acometido na
hemorragia pulmonar ser mais baixo que o hematócrito do sangue (geralmente < 10 %)
fortalece o conceito de que a maioria destas crianças tem edema pulmonar hemorrágico.
Assim, imagina-se que a hemorragia pulmonar neonatal resulte de choque, hipóxia e
acidose que levam a insuficiência ventricular esquerda com aumento da pressão capilar e
conseqüentemente, edema pulmonar hemorrágica. O aumento da tensão superficial causada
pela hiperinsuflação e anormalidades na matriz de suporte destes capilares, associado ao
aumento da pressão a que são submetidos, tornam os capilares pulmonares pronos a rutura.
Fatores que predispõem ao aumento da pressão capilar nos RN com edema hemorrágico
incluem aqueles que favorecem a filtração de fluídos, como a hipoproteinemia, a excessiva
transfusão e aqueles que causam lesão do tecido pulmonar, como a infecção, a Doença da
Membrana Hialina, a ventilação mecânica é a excessiva administração de oxigênio.
FATORES DE RISCO
Entre os principais fatores de risco associados estão a asfixia, a prematuridade
extrema, o retardo de crescimento intra-uterino grave, a infecção, a hipotermia, o
tratamento com oxigênio, a doença hemolítica Rh grave, coagulopatia (interessante que a
maioria dos RN com hemorragia pulmonar não tem coagulopatia), apresentação pélvica,
cesariana, persistência do canal arterial, uso precoce de lipídeos e a hipotensão. Quando
ocorre em RN a termo anteriormente saudáveis, a hemorragia pulmonar esteve associada a
erro inato do ciclo da uréia com hiperamonemia.
Quanto ao papel do Surfactante Pulmonar, os estudos clínicos identificaram a
hemorragia pulmonar como uma complicação em potencial da terapia com o surfactante
pulmonar, principalmente com o uso de surfactante profilático, embora o aumento do risco
para hemorragia pulmonar seja pequeno, comparado com os benefícios da terapia com o
surfactante na Doença da Membrana Hialina. Avaliação recente da incidência de severa
hemorragia pulmonar (severo sangramento endotraqueal com queda aguda do hematócrito e
o desenvolvimento de infiltrados multilobares ao Rx ) nas era pré e pós – surfactante,
concluíram que a terapia com surfactante pulmonar não alterou a incidência de severa
hemorragia pulmonar e que o severo retardo do crescimento intra-uterino é um importante
fator de risco. O exato mecanismo permanece não bem esclarecido, mas postula-se que a
administração do surfactante exógeno resulta em diminuição da resistência vascular
pulmonar (diminui a pressão sistólica na artéria pulmonar em 20%) com aumento do shunt
E-D pelo canal arterial pérvio (PCA) e desenvolvimento de edema pulmonar hemorrágico.
A presença do canal arterial pérvio em RN que recebeu surfactante pulmonar esteve
significativamente associado com o início da hemorragia pulmonar, sendo esta associação
modificada pelo uso da dopamina (menor incidência de hemorragia nos RN com PCA em
uso de dopamina), o que sugere que a hipotensão arterial produzida pela presença do PCA
podendo atuar como um fator causal da hemorragia pulmonar; por outro lado, o PCA
sintomático e a hipotensão poderiam simplesmente ser indicadores da presença de citocinas
e outros mediadores vasoativos responsáveis pela alteração da integridade da vasculatura
pulmonar.
O uso profilático de indometacina, iniciado nas primeiras 24h de vida nos RN <
1250g que recebem surfactante diminuiu significativamente a incidência de shunt E-D pelo
PCA e a hemorragia pulmonar severa (OR = 0.54, 95% IC: 0.30-0.96: ou seja, diminui a
incidência de hemorragia pulmonar em 46%).
CLÍNICA
O curso clínico envolve rápida deterioração da função respiratória, com hipoxemia
progressiva, hipercapnia, bradicardia, apnéia, palidez ou choque podendo sucumbir
rapidamente.
Em muitos RN, o diagnóstico pode ser suspeito por um infiltrado difuso com
opacificação dos campos pulmonares ao RX, sem evidência de sangue no tubo
endotraqueal. Na autópsia destes bebês, os pulmões aparecem grosseiramente hemorrágico
e pesados e histologicamente é evidenciado hemorragia intra-alveolar, principalmente nos
RN prematuros extremos que receberam surfactante pulmonar.
PREVENÇÃO / TRATAMENTO
1. O pronto fechamento do canal arterial, principalmente após a administração de
surfactante pulmonar desempenha papel significativo na redução da severa hemorragia
pulmonar. Consulte Persistência do Canal Arterial no capítulo Distúrbios Cardiológicos
2. Corrigir a hipotensão arterial (drogas vasoativas), a hipoxemia e a acidose.
3. Após surfactante pulmonar:
- diminuir inicialmente a FiO2
- evitar ventilar com baixas pressões
4. Estratégia ventilatória:
- ventilação convencional: aumento da PEEP (6 cm H2O)
- ventilação de alta frequência (jato ou oscilação ), quando paO2/pAO2 < 0.2,
PEEP 8 cmH2O, paCO2 60 mmHg com pH < 7.25 sob ventilação convencional.
Outros autores tem preconizado o uso imediato da ventilação de alta freqüência
nestes pacientes, havendo significativa resposta em 30 minutos.
5. Uso do surfactante pulmonar natural:
A razão do seu uso se deve ao fato da hemoglobina e componentes plasmáticos
(proteinas) inibirem o surfactante pulmonar, inibição esta reversível pelo aumento da
concentração do surfactante pulmonar. O uso de 100 mg/kg de surfactante natural diminuiu
o Índice de Oxigenação (IO) de 24.6 para 8.6 três a seis horas depois e a hemorragia
pulmonar não recorreu em nenhum recém-nascido.
6. Restaurar o volume sangüíneo com transfusão sanguínea (20ml/kg).
7. Anormalidades da coagulação devem ser corrigidos com plasma fresco congelado
(10-15 ml/kg) de 8/8 horas e Vit K.
8. Diuréticos e drogas vasoativas são indicados se insuficiência cardíaca congestiva.
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