25. Jamine de Almeida Geraldino - V Congresso Internacional de

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REPRESENTAÇÕES IMAGÉTICAS DOS IMPERADORES NA OBRA DE
HERODIANO (SÉC. III d.C.).
Jamine de Almeida Geraldino – Universidade Federal de Goiás (UFG)
Através do aprofundamento do estudo no período entre 193 e 197 d.C. na obra
História do Império Romano depois de Marco Aurélio, de Herodiano, começamos a
nos situar de forma mais segura neste projeto, pois, compreender de forma mais clara
este período de guerra civil é essencial para a obtenção da comprovação da nossa
principal hipótese: Severo não se apoiou apenas na força das armas para chegar ao
poder e nele permanecer por 18 anos. Para isto ainda estamos analisando as imagens
forjadas por Herodiano a respeito de Dídio Juliano, Pescênio Nigro, Septímio Severo e
Clódio Albino, mas já começamos a contrapô-las, observando que Herodiano atribuiu a
imagem de “bom” imperador a Severo enquanto Dídio Juliano, Pescênio Nigro e Clódio
Albino são considerados como “maus” imperadores.
Pertinax foi considerado por Herodiano um pai bondoso e protetor magnânimo,
pois, via nele o desejo de dar continuidade ao governo de Marco Aurélio. Para
Herodiano, Marco Aurélio foi tido como o melhor imperador e que após seu governo
Roma teria entrado num estado de declínio. O fracasso do governo de Cômodo, que o
sucedeu, gerou nos mais diversos meios sociais o desejo de um governo como o de
Marco Aurélio.
Herodiano desenvolve seu relato traçando a imagem de cada um que sucedeu
seu modelo de imperador, Marco Aurélio, e também os vê contrapondo-os uns aos
outros. Para ele Pertinax foi um bom imperador porque este se espelhou em Marco
Aurélio. Teve o apoio do Senado e da plebe, porém não o teve dos pretorianos que
foram duramente controlados, pois, desde o tempo de Cômodo eles tinham uma ampla
liberdade de ação: saqueavam e causavam inquietações na cidade de Roma. Mesmo na
sua morte Pertinax ao ter seu palácio invadido pelos pretorianos não fugiu, antes os
enfrentou e morreu com dignidade.
Dídio inicia seu governo da forma mais vergonhosa: comprando a vaga de
imperador dos pretorianos. Herodiano diz que Dídio enganou os pretorianos, pois,
somente os pagou quando teve que enfrentar Severo. Este “mau” imperador,
considerado pelo autor, dedicava-se a luxos e bebedeiras, entregando-se a uma vida
mole e desprezível. Sua imagem é construída em oposição a de Marco Aurélio. O autor
cita que Dídio Juliano ao tomar conhecimento de que a legião da Panônia marchava
contra ele, sob o comando do general proclamado imperador por seus homens, Septímio
Severo, se desesperou (Herodiano II.14). Buscou comprar o apoio dos pretorianos,
porém, estes não se posicionaram a seu favor. Procurou o apoio do Senado, no entanto
estes além de não o apoiarem votaram sua morte. Dídio Juliano, o covarde e miserável
ancião, foi encontrado só e abandonado por todos vergonhosamente, entre súplicas e
lágrimas foi executado, conforme nos escreve Herodiano (Herodiano II.7). Ele
opostamente ao modelo do escritor, começa e termina seu governo de forma
vergonhosa. Para a visão Herodiano, após apresentarmos de forma seqüencial sua
ascensão e morte, podemos considerar Dídio Juliano como um “mau” imperador.
Pescênio Nigro, segundo Herodiano, tinha fama de homem imparcial e amável
que se mirava na vida de Pertinax (Herodiano II.5). Aclamado imperador pela Síria, ele
começou a desconsiderar a direção dos assuntos públicos, abandonando-se a uma vida
mole de festas e espetáculos (Herodiano II.9). Herodiano observa que nem mesmo algo
considerado de extrema urgência ele fez: buscar o apoio do exército da Ilíria (Herodiano
II.10). Pescênio Nigro que havia se acomodado com o título de imperador e com a vida
que passou a usufruir ao tomar conhecimento que Dídio havia sido morto pelos
senadores em Roma e que Severo, general da legião da Panônia, havia sido proclamado
imperador pelos seus homens, senadores, plebe romana e que marchava contra a Síria,
foi tomado por uma terrível perturbação (Herodiano II.7). Com a primeira batalha
ganha pela legião da Panônia em terras Orientais , Cízico, as cidades passaram a ter
diferentes opiniões sobre permanecerem fiéis ao governador da Síria. O encontro dos
dois exércitos se deu às margens da bahia de Iso, onde Nigro após fugir e se esconder
teve sua cabeça decepada. Herodiano diz que Nigro pagou com morte sua morosidade e
negligência, pois, se houvesse decidido ir à Roma sem demora, logo após saber da falta
de apoio e proteção dos pretorianos a Dídio e da aclamação povo para que viesse
proteger o sagrado ofício de imperador, ele teria o apoio também do Senado que
mobilizaria outras legiões. Assim como Dídio, Pescênio Nigro teve uma morte
vergonhosa. Sua acomodação e falta de atitude demonstraram que ele também foi tido
como um “mau” imperador.
Herodiano nos apresenta Lucio Septímio Severo como um entusiasta e bem
dotado para as tarefas de governo e acostumado a uma vida dura e agitada, resistia
facilmente às fadigas (Herodiano III.1). Era além de tudo isso, perspicaz na reflexão e
rápido na execução de seus projetos. Ele provinha de uma família da ordem eqüestre e
foi levado ao senado por Marco Aurélio. Diferentemente de Pescênio, Herodiano
apresenta Severo como um homem de ação e capaz, que ao se dar conta de que o
Império estava exposto ao alcance de qualquer pretendente tomou a decisão de
converter-se em seu dono. Ao se colocar como o vingador de Pertinax, ele não só
ganhou o apoio de toda a região da Panônia como também do Senado romano.
Simulando que não o moviam suas aspirações ao Império nem a pretensão de poder,
senão o desejo de vingança. O autor descreve o general como um mestre na arte de
simular e inspirar confiança (Herodiano III.7). Herodiano ressalta que Severo era um
líder respeitado por seus homens, compartilhando suas fadigas, usava uma tenda
simples e levava à boca a mesma comida e bebida que sabia que todos tinham. Ele
marchava com a cabeça descoberta de baixo da chuva e neve, oferecendo assim a seus
soldados um modelo de entusiasmo e valentia. Deste modo, eles resistiam aos esforços
não somente por temor mas pelo desejo de imitar o imperador. O escritor ainda aponta
que Severo acreditava que a divina providência o havia chamado para fazê-lo
imperador.
Severo buscou fazer aliança com reis de outras regiões e como nos ressalta o
autor no caso do general da Panônia um só homem derrotou três imperadores já no
poder. Para Herodiano nenhum homem ou imperador havia conseguido antes um êxito
tão importante sem sangue e luta com relação a sua entrada em Roma. Analisando a
trajetória de Severo, no texto, percebemos que Herodiano forja sua imagem como sendo
a de um “bom” imperador. Podemos inferir que isto se deve ao a to de Septímio Severo
se dizer filho de Marco Aurélio. Tal colocação criava uma situação incômoda a ele, pois
sendo filho de Marco Aurélio ele se colocava como irmão de Cômodo. Como sua
imagem foi forjada como a de um péssimo imperador, odiado por todos, cabia agora a
Severo tentar modificar a imagem de seu irmão. Ao retirar a responsabilidade de todos
os erros de Cômodo atribui-lhes aos seus bajuladores, verdadeiros culpados por suas
atitudes vergonhosas.
Nossa última imagem é a de Clódio Albino, chefe das legiões da Bretanha.
Conforme Herodiano, Severo o atraiu com astúcia e o seduziu com promessas
(Herodiano II.3). O nomeou César e com esta participação no poder se antecipou às
aspirações que mais desejava Albino. O escritor cita que Albino satisfez seu desejo sem
luta nem perigo. Posteriormente a derrota de Nigro, Severo percebendo que muitos
senadores preferiam a Albino e que este desfrutava do status de imperador na Bretanha,
declarou-lhe guerra. Quando o general da Bretanha, que seguia vivendo ocioso e
desordenadamente, recebeu a notícia que Severo já estava próximo, caiu numa profunda
perturbação. Embora Herodiano escreva que o exército de Albino tenha sido superior,
Severo venceu a batalha e Albino teve sua cabeça também decepada. Assim como Dídio
e Pescênio, Albino teve sua imagem forjada como a de um “mau” imperador, pois,
muito embora contasse com uma das mais temidas legiões e com o apoio de boa parte
do Senado, ele não ousou conquistar, antes se acomodou com a posição de César cedida
à ele.
Septímio Severo formou sua base de governo apoiado não apenas por seus
soldados. Toda a região da Panônia e Ilíria declarou apoio a ele. Algumas regiões do
Oriente também lhe declararam apoio durante a batalha contra Pescênio. O Senado se
aliou a ele, pois, em seu discurso no Senado lhes declarou que seria um governo
aristocrático, uma imitação do Império de Marco Aurélio. A plebe da mesma forma
mostrou seu apoio ao recebê-lo com honras e coroas de flores. Dos seguimentos sociais
observados até o momento, percebemos que apenas os pretorianos, que em sua grande
parte teve que fugir, não são citados quanto ao apoio prestado a Severo.
Depois de retornar inúmeras vezes à fonte, começamos a nos atentar às
referências do tradutor da obra, Juan J. Torres Esbarranch ( 1985, p.159 )para a língua
espanhola. Segundo ele, Severo é descrito por Herodiano com o estereótipo do
triunfador que foi aclamado imperador imediatamente depois que soube do assassinato
de Pertinax. Conforme Esbarranch apresente, Severo é considerado por Herodiano
como um homem de ação.
Na historiografia analisada até o momento nos são apresentados o governo de
Severo como tendo uma grande preocupação apenas na área militar. F W. Walbank
ressalta a importância dada ao exército e cita que no governo de Severo por meio de
uma ordem especial se davam instruções às províncias pelas quais as legiões iam passar,
para que ministrassem suas provisões. Este imposto foi conhecido como annona
militaris, consistia numa quantidade fixa de produtos que os fazendeiros tinham que
entregar aos centuriões.
Para M. Rostovtzeff ( 1986, p. 102 ) o período marcado pelo início da Dinastia
dos Severos é caracterizado pelo controle do poder do exército. O exército tornava-se
senhor do Império e agia através dos governantes.
Michael Grant coloca a importância do exército para o governo de Severo ao
ressaltar que ele postou uma legião dentro da Península Itálica. Ela poderia ser usada
tanto para combater agentes internos quanto externos.
O exército sofreu uma reorganização, segundo Pierre Grimal. A substituição da
guarda pretoriana por tropas recrutadas nas províncias caracteriza o governo de Severo.
Ao recompensar homens que o haviam guindado ao poder, ao mesmo tempo em que
constituía um exército pessoal. Preocupou-se em integrar os soldados na sociedade
aumentando-lhes o soldo, permitindo que se oficializassem suas uniões com suas
mulheres e conferindo-lhes o direito de usar um anel de ouro.
Mais leituras dentro da historiografia proposta serão, ainda analisadas. Porém,
ressaltamos que a grande maioria dos autores acredita e aponta que Severo assentou a
força de seu governo no poder das armas, visão esta que buscamos refutar.
Referências bibliográficas
HERODIANO. Historia del Imperio Romano después de Marco Aurélio. Traducción y
notas por Juan J. Torres Esbarranch. Madrid: Gredos, 1985.
ALFOLDY, A . La Grande Crise du Monde Romain au III Siècle. L’Antiquité
Classique. Bruxelles, 7:5-18,1938.
LE ROUX, P. L’Empereur et l’Armée Romaine. Revue des Études Latines. Paris, 63:
42-49, 1987.
LUHMANN, N. Poder. Brasília: Edunb, 1985.
MACMULLEN, R. Enemies of the Roman Order. London : Routledge, 1992.
MANSUELLI, G. A . Roma e il Mondo Romano. Torino: Feltrinelli, 1976.
MILLAR, F. The Emperor in the Roman World. London : Duckworth, 1983.
PETIT, P. Histoire Générale de l’Empire Romain. Paris: Seuil, 1974. v. 1, 2 e 3.
ROSTOVTZEFF,Michael. História de Roma. Tradução: Waltensir Dutra. 5ª edição –
Rio de Janeiro. Editora Guanabara. 1986.
WALBANK, F.W. La Pavorosa Revolución – La Decadencia del Imperio Romano en
Occidente. Alianza Editorial
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