Tratamento Percutâneo Combinado: Implante de Stent Coronário e

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Rev Bras Cardiol Invas 2006; 14(4): 391-393.
Portela A, et al. Tratamento Percutâneo Combinado: Implante de Stent Coronário e Embolização com Micromolas para Ablação
de Miocardiopatia Hipertrófica Obstrutiva. Rev Bras Cardiol Invas 2006; 14(4): 391-393.
Relato de Caso
Tratamento Percutâneo Combinado: Implante de Stent
Coronário e Embolização com Micromolas para
Ablação de Miocardiopatia Hipertrófica Obstrutiva
Antenor Portela1, João Sousa1, Raldir Bastos1, Jacinto Lay1, Benjamim Pessoa1,
Carlos Linhares1, Paulo Henrique Costa1
RESUMO
SUMMARY
O tratamento usual para pacientes sintomáticos com cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva (CMHO) e doença arterial
coronária (DAC), que requerem revascularização do miocárdio, tem sido a cirurgia combinada (revascularização e
miectomia). Entretanto, esta abordagem aumenta significativamente o risco cirúrgico. O objetivo deste relato é mostrar
a possibilidade e a eficácia da embolização da artéria
septal com micromolas, associada a implante de stent na
artéria descendente anterior, como modalidade alternativa
de tratamento em casos selecionados de pacientes com
CMHO e DAC.
Combined Percutaneous Treatment: Coronary Stent
Implantation and Microcoil Embolization for Ablation
of Hypertrophic Obstructive Cardiomyopathy
Symptomatic patients with HOCM and coronary artery disease
(CAD) that require revascularization, surgery – simultaneous
myectomy and bypass – has usually been performed. However,
the procedure significantly increases surgical risk. The aim
of our report is to show the feasibility and efficacy of septal
artery embolization with microcoils and simultaneous coronary
dilation and stenting in the anterior descending as an alternative therapy to selected patients with HOCM and CAD.
DESCRITORES: Cardiomiopatia hipertrófica, terapia. Embolização terapêutica. Contenedores.
DESCRIPTORS: Cardiomyopathy hypertrophic, therapy. Embolization, therapeutic. Stents.
A
percutâneo da doença arterial coronária (DAC) uniarterial,
acometendo a artéria descendente anterior.
cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva (CMHO) é
uma doença cardíaca transmitida geneticamente.
A obstrução da via de saída do ventrículo esquerdo (VE) é o componente fisiopatológico mais importante na determinação dos sintomas. Diversos tratamentos
têm sido propostos para os pacientes sintomáticos: tratamento medicamentoso inotrópico negativo, alteração
da seqüência de contração do VE com marca-passos
DDD, miectomia septal cirúrgica. Em 1995, Sigwart1
propôs a ablação septal seletiva com etanol. Este tratamento consiste em provocar um infarto químico localizado,
por injeção de álcool absoluto através do primeiro ramo
septal maior da artéria descendente anterior. O objetivo
do presente relato é demonstrar a possibilidade e eficácia da embolização da artéria septal com micromolas
de platina, realizada ao mesmo tempo do tratamento
1
Serviço de Hemodinâmica e Intervenção Cardiovascular do Hospital
São Marcos, Teresina-PI
Correspondência: Antenor Portela. Rua Aviador Irapuan Rocha, 2101
- Apto. 1.002 - Bairro Fátima - Teresina, PI - CEP 64048-230
E-mail: [email protected]
Recebido em: 29/04/2006 • Aceito em: 03/10/2006
RELATO DO CASO
Paciente do sexo masculino, negro, 63 anos, hipertenso, com incapacidade de realizar qualquer atividade física sem desconforto (angina de repouso). Encontrava-se em uso de captopril 75mg/dia, propranolol 80mg/
dia e hidroclorotiazida 25mg/dia, tendo sido realizado
diagnóstico ecocardiográfico de CMHO e encaminhado para realização de estudo cinecoronariográfico. O
exame físico revelou paciente em bom estado geral,
com freqüência cardíaca de 60bpm e pressão arterial
sistêmica de 150/70mmHg. Sopro sistólico rude era
audível na borda esternal esquerda. O eletrocardiograma
revelou ritmo sinusal e hipertrofia ventricular esquerda (strain pattern). O ecocardiograma transtorácico mostrou acentuada hipertrofia ventricular esquerda, com
espessura septal de 22mm e registrou gradiente de
pressão na via de saída do VE igual a 119mmHg.
Havia movimento anterior sistólico do folheto anterior
da valva mitral, com insuficiência mitral secundária
leve. A cinecoronariografia revelou lesão obstrutiva de
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70 por cento, no terço proximal da artéria descendente
anterior e o estudo hemodinâmico confirmou o diagnóstico de CMHO. Os exames laboratoriais bioquímicos
de rotina foram normais. O paciente havia se submetido a implante de stent convencional, há um ano, no
terço médio da artéria descendente anterior, sem ter
apresentado reestenose. Nenhum tratamento prévio para
CMHO, excetuando-se o tratamento medicamentoso
para hipertensão arterial sistêmica, havia sido realizado.
Baseado nestes achados, optamos por tratamento
percutâneo simultâneo da DAC uniarterial e embolização septal com micromolas de platina.
Com o paciente sob sedação feita por anestesiologista, foram colocados introdutores em ambas artérias
femorais e na veia femoral direita. Um cateter-guia JL4
6F foi posicionado no óstio da artéria coronária esquerda. Um cateter pig-tail 6F foi colocado no VE para
avaliar o gradiente de pressão intraventricular e um
eletrodo de marca-passo provisório foi posicionado no
ventrículo direito. O gradiente de pressão foi medido
em repouso (65mmHg) e pós-extrassístole (120mmHg).
Um balão de angioplastia pleon 1,5x6mm (Biotronik,
Switzerland) foi insuflado na primeira septal maior, por
cinco minutos, sendo observada uma queda no gradiente
de pressão em torno de 50 por cento. Foi realizada
injeção simultânea de contraste no VE e na artéria septal,
para confirmar que o septo hipertrófico era suprido pela
artéria septal selecionada. Na ocasião em que o procedimento foi realizado, não foi possível realizar ecocardiograma contrastado para melhor localizar o vaso-alvo.
As micromolas de platina foram liberadas através
de um microcateter Excelcior (Boston Scientific, USA),
colocado na artéria septal, o mais distalmente possível. Três micromolas Helical 10 2x8 (Micro Therapeutics,
Inc, Germany) foram necessárias para oclusão completa do vaso.
Após a retirada do microcateter da artéria septal,
foi feito implante direto de um stent PRO-Kinetic 3,5x
18mm (Biotronik, Switzerland), na artéria descendente
anterior, com 14atm de pressão.
O gradiente de repouso foi medido após o procedimento (Figura 1). A oclusão da artéria septal foi
confirmada pela angiografia coronária (Figura 2).
Figura 1 - Resultado imediato após embolização da artéria septal
maior com micromolas de platina, quase completa eliminação do
gradiente de pressão na via de saída do ventrículo esquerdo. VE=
ventrículo esquerdo; AO= aorta.
Figura 2 - Modalidade alternativa de oclusão artéria septal. A: artéria septal maior (setas); B: após embolização da artéria septal maior com
micromolas de platina.
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Portela A, et al. Tratamento Percutâneo Combinado: Implante de Stent Coronário e Embolização com Micromolas para Ablação
de Miocardiopatia Hipertrófica Obstrutiva. Rev Bras Cardiol Invas 2006; 14(4): 391-393.
O gradiente de pressão intraventricular em repouso, medido após o procedimento, caiu de 65mmHg
para 10mmHg. O paciente (que se encontrava sedado)
não referiu dor durante o procedimento, queixandose apenas de precordialgia leve no pós-procedimento.
A enzima CK-MB aumentou duas vezes e meia o valor
basal (normal até 10, com pico de 26). Os primeiros
vetores septais em V1 e V2 na evolução do ECG foram
amputados. O gradiente máximo avaliado pelo ECO
no pós-procedimento foi de 31mmHg. O paciente,
que previamente estava em classe funcional IV pela
classificação da Canadian Cardiovascular Society (a
despeito do tratamento clínico instituído), evoluiu para
classe funcional II, após a realização do procedimento.
O uso de marca-passo provisório não foi necessário.
DISCUSSÃO
Devido ao significativo aumento do risco cirúrgico
no tratamento combinado da CMHO e DAC, tratamento
percutâneo simultâneo tem sido realizado em casos
selecionados e com anatomia favorável.
Várias modalidades terapêuticas podem ser usadas
para aliviar o gradiente de pressão intraventricular nos
pacientes com CMHO. Nenhum dos tratamentos atualmente disponíveis é eficaz em todos os casos.
A alcoolização septal para tratamento da CMHO
tem se mostrado efetiva2. Entretanto, algumas complicações associadas a esta técnica (como arritmias, ruptura
septal e infarto) têm sido relatadas3.
Outras técnicas já foram descritas para redução
da hipertrofia septal. O implante de stents revestidos
com PTFE, implantados na artéria descendente anterior
para ocluir a origem das artérias septais, mostrou-se
eficaz em uma série de pacientes, com resultados mantidos após três meses de evolução4.
O implante de micromolas já foi relatado por outros
autores. Em uma série, o procedimento foi eficaz para
reduzir o gradiente de pressão na via de saída do VE,
com resultados mantidos após três meses5.
O mecanismo pelo qual a embolização com micromolas causa ablação septal é diferente da alcoolização. É possível que um infarto puramente isquêmico
possa levar a resultados e complicações diferentes
daqueles produzidos por um infarto químico.
Nesse caso em particular, o resultado clínico e a
melhora hemodinâmica imediata demonstraram a eficácia e a segurança deste procedimento. Diferente da
alcoolização e semelhante aos stents recobertos com
PTFE, a embolização com micromolas pode induzir a
resultados temporários em alguns pacientes devido à
presença de circulação colateral6. A fim de evitar este
problema, deve-se liberar as micromolas o mais distalmente possível no interior da artéria septal. Uma maior
experiência faz-se necessária, visando avaliar a eficácia da técnica a longo prazo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Sigwart U. Non-surgical myocardial reduction of hypertrophic
obstructive cardiomyopathy. Lancet 1995;346:211-4.
2. Knight C, Kurbaan AS, Seggewiss H, Henein M, Gunning M,
Harrington D et al. Nonsurgical septal reduction for hypertrophic obstructive cardiomyopathy: outcome in the first
series of patients. Circulation 1997;95:2075-81.
3. Aroney CN, Goh TH, Hourigan LA, Dyer W. Ventricular
septal rupture following nonsurgical septal reduction for
hypertrophic cardiomyopathy: treatment with percutaneous
closure. Catheter Cardiovasc Interv 2004;61:411-4.
4. Garza L, Saucedo JF, Aude YW. Echocardiographic followup of a pilot study of PTFE-covered stent-induced artery
ablation in hypertrophic obstructive cardiomyopathy: septal
thickness reduction persistent at 3 months. Am J Cardiol
2003;92:160-5.
5. Iacob M, Pinte F, Tintoin I, Cotuna L, Caroescu M, Popa
A, et al. Microcoil embolisation for ablation of septal hypertrophy in hypertrophic obstructive cardiomyopathy. Kardiol
Pol 2004;61:350-5.
6. Fifer MA, Yoerger DM, Picard MH, Vlahakes GJ, Palacios IF.
Failure of covered stent implantation in the treatment of
hypertrophic obstructive cardiomyopathy due to late collateral formation. Disponível em: http://tctmd.com
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