Hiperparatireoidismo secundário com deformidade facial

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Reis DA et al.
RELATO DE CASO
Hiperparatireoidismo secundário com
deformidade facial (leontíase ossea)
Secondary hyperparathyroidism with facial deformity (leontiasis ossea)
Daniel Adriano Reis1, Rebeca Paohwa Liu1, Waldemar Chaves Nascimento Brandão Penna1, Carla Salomão Auad1,
Gustavo Moreira da Costa Souza2, Sérgio Moreira da Costa3
RESUMO
ABSTRACT
Introdução: A osteodistrofia renal raramente acomete
os ossos da face e, quando o faz, pode assumir três formas.
Relato do Caso: Relatamos o caso de um paciente com
a forma mais rara de apresentação, a leontíase óssea,
caracterizada pela hipertrofia óssea importante dos ossos
da face, principalmente maxila e mandíbula levando a um
prejuízo estético e funcional importante ao paciente. O tratamento desta doença baseia-se principalmente no combate
à etiologia, no caso deste paciente, a paratireoidectomia,
com resultados discretos.
Background: Renal osteodystrophy rarely affects the
bones of the face, and when it does, can take three forms.
Case Report: We report a case of a patient with the rarest
form of presentation, leontiasis ossea, characterized by
significant hypertrophy of the facial bones, especially the
maxilla and mandible leading to a significant functional
and aesthetic damage to the patient. The treatment of
this disease is based primarily on combating etiology, in
the case of this patient, parathyroidectomy, with discrete
outcomes.
Decritores: Hiperostose Frontal Interna. Hiperparatireoidismo. Face/anormalidades.
Key words: Hyperostosis Frontalis Interna. Hyperparathyroidism. face/abnormalities.
1. Membro Aspirante em Treinamento da Sociedade Brasileira de Cirurgia
Plástica (SBCP) - Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG, Brasil.
2. Membro titular da SBCP, Preceptor de Cirurgia Plástica do Hospital Felício
Rocho, Belo Horizonte, MG, Brasil.
3. Membro titular da SBCP, Regente Serviço de Cirurgia Plástica Hospital Felício
Rocho, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Correspondência: Daniel Adriano Reis
Rua Tenente Brito Melo, 496 ap 1102 – Barro Preto – Belo Horizonte, MG,
Brasil – CEP 30180-070
E-mail: [email protected]
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Hiperparatireoidismo secundário com deformidade facial (leontíase ossea)
Figura 2 – Hipertrofia importante dos ossos da face,
disoclusão, perda de elementos dentais.
INTRODUÇÃO
A doença renal crônica leva o paciente a um estado de
depleção de cálcio devido à redução da conversão da vitamina
D pelos rins. A hipocalcemia, bem como o acúmulo de fosfato
no organismo, elevam a secreção do paratormônio (PTH).
As alterações ósseas decorrentes do hiperparatireoidismo são
raras e podem assumir três formas1: a primeira é a “osteíte fibrosa
cística”, que se apresenta com atividade óssea aumentada, fibrose
peritrabecular e tumores marrons císticos2; a segunda forma se
assemelha à displasia fibrosa, com um padrão em vidro fosco,
porém se distingue desta por ser difusa e apresentar uma pobre
distinção corticomedular; a terceira e mais rara é a leontíase
óssea, caracterizada por importante hipertrofia de mandíbula
e maxila com formação de túneis em forma de serpente e má
visualização do osso cortical, não havendo causa definida para
este tipo de estrutura bem como padrões específicos de alterações
microscópicas que expliquem as alterações radiológicas3.
RELATO DO CASO
D.G.F.F, 38 anos, portador do vírus da hepatite C, gromerulonefrite crônica em diálise há vinte anos devido a doença
renal terminal, evoluindo com hiperparatireoidismo secundário
tratado com paratireoidectomia total.
Solicitada interconsulta para Clínica de Cirurgia Plástica
devido a deformidade facial importante. Ao exame físico, o
paciente apresentava crescimento acentuado de maxila e mandíbula, disoclusão e perda de elementos dentais (Figuras 1 a 3).
Realizado estudo tomográfico de face, que evidenciou
espessamento ósseo difuso em padrão de vidro fosco em todos
os ossos da face, com padrão esclerótico principalmente em
maxila e mandíbula (Figuras 4 e 5).
Figura 3 – Visão frontal oblíqua esquerda.
Figura 1 – Fotografia do paciente no início de sua doença.
Figura 4 – Tomografia computadorizada (reconstrução
tridimensional): hipertrofia óssea dos ossos da face.
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No caso do paciente relatado, optou-se por conduta conservadora
devido à ausência de sintomas mais significativos (dor, compressão
de vias aéreas) e aos resultados desanimadores relatados de tratamento cirúrgico e radioterápico. Obtivemos uma discreta regressão
da lesão após a paratireoidectomia total (Figura 6).
Figura 5 – Tomografia computadorizada (sagital): espessamento
ósseo difuso em padrão de vidro fosco em todos os ossos da face,
com padrão esclerótico principalmente em maxila e mandíbula.
Figura 6 – Evolução de um ano após paratireoidectomia,
melhora discreta.
DISCUSSÃO
REFERÊNCIAS
São raros os casos de leontíase óssea bem relatados. Espécime
exposta no Museu Nacional de Antropologia do México demonstra
alterações dos ossos da face e do neurocrânio semelhantes a
este caso4, que podem ocorrer também na Doença de Paget e na
Displasia Fibrosa.
Ferrario et al.5 demonstraram que as estruturas faciais de
pacientes com doença renal estão aumentadas em relação a indivíduos saudáveis, o que poderia ser justificado pelo menos em parte
por este remodelamento ósseo causado pelo PTH.
Além do prejuízo estético, foram relatadas complicações
como disfagia, dificuldade respiratória6, paralisia facial, surdez7,
neuropatia óptica compressiva8, telecanto e alterações visuais9.
Em relação ao tratamento, foram descritos a paratireoidectomia10, com resultados de melhora parcial ou não progressão da
doença; radioterapia11, que resultou em fratura patológica; cirúrgico,
com resultados desanimadores; corticoterapia no caso de neuropatia
óptica7 com recuperação parcial da visão. e conduta conservadora.
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CONCLUSÃO
A leontíase óssea é uma forma de osteodistrofia renal extremamente rara e não muito bem entendida. Pacientes com esta comorbidade apresentam deformidades que levam a prejuízo estético
e funcional importante. O tratamento inicial está direcionado às
síndromes ameaçadoras à vida e ao combate às causas da doença.
Trabalho realizado na Clínica de Cirurgia Plástica do Hospital Felício Rocho – Belo Horizonte, MG, Brasil. Trabalho Apresentado no Congresso no
DESC, São Paulo, SP, Brasil em 25/2/2011.
Artigo recebido: 12/3/2011
Artigo aceito: 30/5/2011
Rev Bras Cir Craniomaxilofac 2011; 14(2): 108-10
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