Margarida Cardoso Administradora do Centro de Informação Europeia Jacques Delors Nota de Abertura O tema dos mares e dos oceanos ganhou, neste princípio do século XXI, uma enorme importância e visibilidade, quer a nível europeu, quer a nível nacional. Após anos de estudos e encontros internacionais que levaram à elaboração, em 1998, pela Comissão Mundial Independente para os Oceanos, do Relatório “O Oceano – Nosso Futuro”, foram finalmente anunciadas uma série de iniciativas e medidas. No Programa da Comissão Europeia de Durão Barroso, a Política Marítima Europeia, é apresentada como uma necessidade premente. Em 2005, é instituída a pasta dos Assuntos Marítimos, atribuída ao Comissário maltês Joe Borg e, em Junho de 2006, é lançado o Livro Verde sobre os diferentes aspectos de uma futura Política Marítima Europeia. A nível nacional, o oceano foi identificado como um dos três factores diferenciadores de referência no Programa Nacional de Acção para o Crescimento e o Emprego (PNACE). Além disso, o Governo aprovou, a 16 de Novembro de 2006, a Estratégia Nacional para o Mar, alicerçada numa abordagem integrada das várias políticas nacionais, projectando o mar como um dos principais motores de desenvolvimento do país, no futuro. É neste contexto que o Centro de Informação Europeia Jacques Delors (CIEJD) se associa ao debate, dedicando dois números da sua revista Europa: Novas Fronteiras à Política Marítima Europeia. Este número, que aborda as perspectivas e linhas estratégicas da Política Marítima Europeia, e o n.º 20, dedicado às áreas-chave da Política Marítima Europeia. Com estas duas publicações, lançadas simultaneamente, o CIEJD pretende sensibilizar os leitores para as perspectivas que se abrem a uma futura política marítima comunitária e para a importância da formação de um sector marítimo inovador, competitivo e respeitador do ambiente, assim como contribuir para o debate sobre a Estratégia Nacional para o Mar. No actual número da revista, o CIEJD reuniu os contributos de um conjunto de personalidades com responsabilidades na concepção, adopção e execução duma Política Marítima Europeia. A visão europeia dos oceanos e mares é-nos oferecida pelo Presidente da Comissão Europeia que, partindo do pressuposto de que os assuntos dos oceanos estão interligados e precisam de ser abordados como um todo, afirma: “Com uma política marítima integrada vamos poder, a prazo, promover a qualidade de vida das regiões costeiras e das regiões ultraperiféri- 5 6 cas da União, contribuindo para o bem-estar de uma larga parte dos cidadãos europeus, nelas residentes ou visitantes. Vamos poder melhorar a competitividade das indústrias marítimas e criar novos empregos. Vamos permitir o processamento óptimo das exportações e das importações do mercado comum europeu – transportadas por mar – e assim contribuir para a economia europeia em geral. Vamos apostar mais na ciência e na tecnologia e, assim, promover a inovação e a criação de novas empresas”. O Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Europeus, Manuel Lobo Antunes, defende a importância de uma Política Marítima para Portugal advogando que, caso se pretenda valorizar e beneficiar de um dos principais recursos naturais existentes no nosso país, é necessário que os principais agentes, públicos e privados, que se encontram ligados ao mar, acreditem na utilidade de investir nos projectos com ele relacionados, devendo porém ter em atenção a necessidade de garantir que a melhoria das condições sociais e económicas da sociedade deve estar presente, sempre no respeito pela conservação da biodiversidade e ecossistemas marinhos. Uma nova visão dos oceanos é-nos dada por Mário Soares, que foi Presidente da Comissão Mundial Independente para os oceanos (CMIO) no âmbito da qual, em 1998, apresentou a Kofi Anan o Relatório “O Oceano – Nosso Futuro” e por Tiago Pitta e Cunha que, em Portugal, dirigiu os trabalhos da Comissão Estratégica dos Oceanos, em resultado dos quais, em Julho de 2004, apresentou o relatório “O oceano: um desígnio nacional para o Séc. XXI”. Mário Soares salienta o longo processo de reconhecimento da necessidade de instrumentos fundamentais para uma eficaz governação e desenvolvimento sustentável do oceano por parte da Comunidade Mundial, defendendo que o Novo Regime do Oceano deverá ser inspirado na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, mas integrando as mais recentes evoluções, em termos científicos, tecnológicos e ambientais, bem como a questão da crescente exploração dos recursos marinhos. Destaca, ainda, a actualidade de algumas das sugestões formuladas no Relatório da CMIO e faz um apelo para que o acompanhamento e a implementação de uma Estratégia Nacional para o Oceano sejam assegurados ao mais alto nível institucional, com o envolvimento activo da sociedade civil e dos grupos de interesse, com vista a mobilizar a adesão dos cidadãos. Tiago Pitta e Cunha destaca a importância do reconhecimento do real valor dos oceanos e mares pela comunidade internacional que, na sua opinião, só a partir da Cimeira de Joanesburgo, em 2002, assumiu claramente que os oceanos não podem continuar a ser vistos como uma fonte inesgotável de recursos. Reconhece que o valor actual dos oceanos, e a perspectiva do seu crescente papel nas sociedades do futuro, é importante para todos os países, mas assume, sem dúvida, um interesse geopolítico mais importante para os Estados costeiros – onde se inclui Portugal. Considera que uma nova abordagem aos oceanos deve materializar-se numa política marítima integrada, inovadora na governação do oceano e inovadora pela sua ancoragem profunda na ciência, na investigação e na tecnologia. Chama a atenção para o papel fundamental dos Estados-Membros na adopção da política do mar prevista para Outubro de 2007. Um conjunto de diferentes perspectivas geopolíticas e geoestratégicas sobre a Política Marítima Europeia é-nos apresentado pelos Secretários de Estado responsáveis pela política marítima em Portugal, França e Espanha. João Mira Gomes, Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar refere o mar como “imagem de marca” do nosso país ao longo dos séculos, que convém adaptar às novas realidades e desafios, como factor de centralidade europeia. Refere a importância da “Estratégia Nacional para o Mar, aprovada a 16 de Novembro de 2006 – dia Nacional do Mar, que, pela primeira vez, dota o País de um instrumento articulado de coordenação e de acção”. Afirma que esta estratégia transformará o mar numa plataforma de afirmação de Portugal, aproveitando, para o efeito, as oportunidades que se ofereçam com o exercício da Presidência Portuguesa da União Europeia, no segundo semestre de 2007, e com a aposta estratégica que está subjacente à futura Política Marítima Europeia. Catherine Colonna, “Ministre déleguée aux Affaires Européennes” de França, considera que a política marítima europeia é um dos novos projectos que levará a Europa a aproximar-se mais dos cidadãos. Lembra o memorando que França, Espanha e Portugal enviaram, conjuntamente, à Comissão Europeia, em 2005, defendendo uma política europeia dos mares e dos oceanos que vá para além da segurança, da pesca ou da qualidade das águas, permitindo uma visão global e partilhada, inscrita na perspectiva do desenvolvimento sustentável. O “Secretário de Estado para la Unión Europea”, Alberto Navarro, apresenta o ponto de vista do governo espanhol relativamente ao debate sobre a futura política marítima europeia, lançado com a publicação do Livro Verde. Partindo do compromisso de Espanha em garantir um meio marinho próspero, sustentável e seguro, analisa as prioridades estratégicas e as políticas mais apropriadas para a sua realização. O Presidente da Região Autónoma dos Açores e o Secretário Regional do Ambiente e Recursos Naturais da Região Autónoma da Madeira, dão-nos a visão das regiões ultraperiféricas. Carlos César reclama medidas positivamente diferenciadoras numa série de áreas em que as responsabilidades são maiores (por exemplo, na gestão das costas) ou em que as ilhas têm dependências agravadas (transportes marítimos, portos ou energia). Defende que deve atribuir-se especial destaque à dimensão atlântica e insular de uma futura Política Marítima da União. Manuel Correia enuncia as premissas que, no entender da Região Autónoma da Madeira, são fundamentais para o sucesso das políticas marítimas, defendendo novos modelos de governação capazes de assegurar a presença dos actores mais capazes de as implementar no terreno. Considera que as regiões insulares serão actores decisivos e imprescindíveis em matéria de governação do mar, quer pelo seu posiciona- mento, quer pelo conhecimento e compreensão do meio marinho. Uma visão de Estrasburgo é-nos dada por dois deputados europeus. Luís Queiró considera que o Livro Verde da Comissão Europeia para uma futura política marítima é um excelente ponto de partida para uma abordagem ao mar e a tudo o que lhe está relacionado, de uma forma global. Compreendendo que há uma identidade comum, considera que não pode, contudo, ignorar-se a importância do princípio da subsidiariedade, nem esquecer questões de soberania sobre riquezas naturais, concluindo que o desafio que se coloca agora ao Parlamento Europeu é a busca de um equilíbrio vantajoso, tanto a nível económico como social e ambiental. Emanuel Jardim Fernandes relembra a capacidade de geração de bem-estar social que os mares e os oceanos têm, e a sua influência directa na identidade e vivência cultural das populações das ilhas. Defende, contudo, que o desenvolvimento da futura Política Marítima Europeia, além do impacto directo na vida das populações das ilhas, deverá garantir que um recurso de carácter universal e global seja universalmente utilizado como caminho para o desenvolvimento de todos os sectores e de todas as populações. Finalmente, Eduardo Lourenço, no seu artigo “Portugal sem Mar”, citando Camões e Pessoa, traça-nos um quadro da relação de Portugal com o mar ao longo da história, apelando aos políticos responsáveis para resolver as equações que se apresentam ao quádruplo espaço de uma Federação Atlantista de matriz luso-africana. Uma menção particular ao Dr. Tiago Pitta e Cunha que, desde Bruxelas, muito nos ajudou na concepção desta revista. A todos os que com os seus artigos, colaboraram na construção deste número, o Centro Jacques Delors agradece reconhecidamente o generoso contributo. 7