Nº 36 2013 CADERNOS DISCENTES COPPEAD N° 36 2013 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO A Editora EDITORIAL Kleber Figuriredo Os recentes avanços no estudo do impacto da espera nos serviços de saúde : uma revisão de literatura André Luiz Maiocchi Alves Costa Experiência em serviços : uma análise de casos permeando seus conceitos Jan Krüger, Nicolle Kauffmann Desenvolvimento de novos serviços : a participação do cliente Glauce Nascimento, Joana Sacramento, Marcelo Franca Serviço como lógica de negócio implicações para criação de valor e marketing: Átila de Assis,Václav Filho Serviços em empresas manufatureiras Guido Maculan, Sheila Christina Ribeiro Fernandes 7 21 45 65 93 Custos de mudanças em serviços : pesquisa sobre a percepção do cliente e discussão de práticas gerenciais para sua retenção Clarissa Taciana Gabriel Gussen, Natália dos Santos Jordão de Oliveira 115 Dados dos autores Normas para submissão de trabalhos 139 141 Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 1-142 2013 Cadernos discentes COPPEAD/UFRJ/ Instituto COPPEAD de Administração. – n. 1, (2000) -- Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2000 Irregular ISSN 1983-3377 1. Administração – Periódicos. I. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto COPPEAD de Administração. SUMÁRIO Editora Leticia Casotti Assistentes da editora Luciana Velloso Editoração Lucilia Silva Projeto Gráfico e Capa Raquele Mendes Coelho Correspondências devem ser enviadas para: COPPEAD/UFRJ Cadernos Discentes COPPEAD Caixa Postal 68514 21941-972 – Rio de Janeiro – RJ Telefone: (21) 2598-9816 Fax: (21) 2598-9817 E-mail: [email protected] Disponível em www.coppead.ufrj.br (Publicações) Direitos e permissão de utilização As matérias assinadas são de total e exclusiva responsabilidade dos autores. Todos os direitos reservados ao COPPEAD/UFRJ. É permitida a publicação de trechos e de artigos, com autorização prévia e identificação. APRESENTAÇÃO Os CADERNOS DISCENTES COPPEAD têm por objetivo divulgar a produção de alunos e ex-alunos latu sensu, de Mestrado e de Doutorado. Dentro de uma filosofia de integrar teoria e prática, é comum que os alunos sejam solicitados a realizar pesquisa e a escrever casos relativos aos conteúdos abordados nas diversas disciplinas. Produzem, assim, um material que, apesar de ter por objetivo primário a avaliação de desempenho, constitui, também, um esforço de investigação de alta qualidade. No entanto, nem todos os trabalhos e pesquisas apresentados nas disciplinas estão de acordo com as regras básicas e usuais de publicação de trabalho científico. A preocupação com essa questão fez com que o processo de seleção dos mesmos seguisse uma rígida metodologia. Em primeiro lugar, o professor de cada disciplina seleciona e indica aqueles trabalhos que considera terem sido os melhores da turma. A editora, por sua vez, analisa a adequação da inclusão em determinado volume. Embora não seja esse o objetivo principal dos Cadernos, alguns aprendizados adicionais estão presentes no processo. Primeiro, a compreensão, por parte dos alunos, de que a qualidade do trabalho por eles desenvolvido pode render frutos não pensados inicialmente. Segundo, o entendimento de que o mérito de ter o artigo publicado não se faz sem ônus, uma vez que podem ser necessárias algumas modificações, ou seja, faz parte do processo de aprendizado do aluno não apenas a geração de um trabalho de pesquisa em si mesmo, mas também a compreensão de que o reconhecimento decorre de um comprometimento com a excelência, necessariamente presente em todos os passos do caminho. Por fim, mas não com menor ênfase, entendemos que os artigos aqui publicados são de utilidade para as comunidades acadêmica e empresarial brasileiras. A maior parte dos trabalhos publicados diz respeito a situações de negócios relevantes para quem discute ou para quem aplica os conceitos de Administração. A Editora EDITORIAL A edição deste Caderno Discente número 36 reúne uma seleção de seis trabalhos realizados por alunos do mestrado do Instituto COPPEAD de Administração da UFRJ, da minha disciplina “Excelência na Prestação de Serviços” Partindo de um artigo atual que tratava de um tema específico relacionado com o programa da disciplina, cada trabalho apresenta a discussão de conceitos, modelos e exemplos atuais e inovadores focados na prestação de serviços de excelência. Trata-se de uma área de conhecimento capaz de diferenciar a oferta das empresas de setores diversos, de crescente importância para a economia brasileira e em especial para a cidade do Rio de Janeiro, onde se localiza nosso Instituto. O primeiro trabalho, de André Luiz Maiocchi Alves Costa, traz uma revisão da literatura sobre esperas em serviços de saúde, buscando compreender como os recentes progressos no entendimento do impacto da espera em serviços podem contribuir para a gestão dos negócios no setor saúde. Em seguida, o trabalho de Jan Kruger e Nicolle Kauffmann discute diferentes abordagens identificadas na literatura para estudar a experiência de serviços apontando a complementaridade existente entre elas. O trabalho seguinte, de Glauce Nascimento, Joana Sacramento e Marcelo Franca, trata dos serviços agregados como forma de fugir da “comoditização” dos produtos em diversos setores. Nesse trabalho, a busca pela diferenciação seria através do desenho de serviços inovadores que envolvam o cliente como copartícipe desde os estágios iniciais do processo de inovação. A expectativa associada a tal tendência cocriadora é a de que o envolvimento dos clientes favorece um melhor ajuste entre oferta e demanda. A cocriação em serviços volta a ser discutida no trabalho de Átila de Assis e Václav Filho, que se utiliza de exemplos reais para contextualizar a discussão teórica. A servitização e suas implicações gerenciais são analisadas no estudo de Guido Maculan e Sheila Fernandes, que se utiliza de exemplos que contemplam o setor de gestão de documentos, de impressão profissional e de editoração de livros. Finalmente, o trabalho de Clarissa Gussen e Natália Jordão traz uma pesquisa que buscou entender os custos relativos à mudança em serviços de cabeleireiro a partir da aplicação de uma survey. Convidamos nossos leitores a percorrer esta coleção de artigos, que pode ser inspiradora por suas abordagens diversas, pela literatura percorrida e pelos exemplos aplicados que contemplam recortes da realidade das empresas. Kleber Figueiredo OS RECENTES AVANÇOS NO ESTUDO DO IMPACTO DA ESPERA NOS SERVIÇOS DE SAÚDE: UMA REVISÃO DA LITERATURA. André Luiz Maiocchi Alves Costa RESUMO Na sociedade contemporânea, o tempo é visto pelas pessoas como um recurso cada vez mais escasso e valioso. Muito desse tempo é gasto na espera por serviços, o que tem reduzido a tolerância dos consumidores em relação a essa espera. Com o envelhecimento da população e aumento da expectativa de vida, a questão do tempo de espera nos serviços de saúde tem ganhado ainda mais relevância, pois se trata de um segmento populacional cuja demanda por cuidados é crescente. Nesse sentido, o presente ensaio busca conduzir o leitor, por meio de uma revisão de literatura, ao entendimento das últimas contribuições no estudo da espera em serviços e a sua relação com os prestadores de serviços em saúde. Inicia-se com os conceitos fundamentais e os efeitos da espera em serviços. Em seguida, faz-se uma correlação entre os achados desses estudos relacionados à espera e aos seguintes serviços em saúde: (i) serviços de emergência; (ii) agendamento de consultas; e (iii) o gerenciamento de leitos. A partir dessas correlações, busca-se compreender como os recentes progressos, no entendimento do impacto da espera em serviços, podem contribuir para a gestão dos negócios no setor saúde. Palavras-chave: espera em serviços, serviços de saúde, qualidade em serviços Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 7 1. INTRODUÇÃO A espera é algo que faz parte da vida, em momentos como, por exemplo, a gravidez que gera emoções positivas relacionadas à antecipação e à esperança (VAN RIEL et al., 2012). Entretanto, com o crescente valor dado ao tempo pelos consumidores em nossa sociedade (HEINEKE e DAVIS, 2007 apud VAN RIEL et al., 2012), a maioria deles acaba sentindo, em diversos graus, sensações como irritação, tédio, frustração e infelicidade, por terem que esperar por um serviço. Esse estado mental negativo surge a partir de sua avaliação da experiência de espera (BAGOZZI et al., 1999 apud VAN RIEL et al., 2012) e pelo fato de que a espera em serviços é geralmente entendida como uma perda de tempo, algo improdutivo e que não gera valor para aquele que espera. Um período significativo de tempo é gasto pelos pacientes à espera de serviços em estabelecimento de saúde, seja em consultórios médicos ou hospitais. A literatura aponta para um impacto negativo que o tempo de espera pode exercer nas percepções e no comportamento dos clientes em relação aos serviços de saúde (HILL e JOONAS, 2005). Embora o estudo do tempo de espera e seus efeitos na prestação de serviços seja um tema que tem recebido maior atenção nos últimos anos, pouco se tem estudado sobre o impacto do tempo de espera sobre atitudes e comportamentos dos pacientes em relação aos profissionais de saúde (HILL e JOONAS, 2005). Tal desatenção por parte dos prestadores de serviços em saúde pode se tornar um problema, visto que o envelhecimento populacional tem pressionado as organizações do setor, dada a maior demanda por consumo de cuidados à saúde. Portanto, o papel do tempo de espera no atendimento de saúde é particularmente relevante para o crescente e amplo segmento de pacientes em fase de maturidade (POL e THOMAS, 1995; MOSCHIS et al. 2003 apud HILL; JOONAS, 2005). Dado esse cenário, os prestadores de serviços em saúde deveriam reavaliar as relações que têm com seus pacientes, com o objetivo de promover e manter relacionamentos de longo prazo com a sua clientela (HILL e JOONAS, 2005). Nesse sentido, o modo como se dá o acesso aos serviços de saúde é um aspecto fundamental no entendimento do impacto que o tempo de espera pode ter na avaliação da qualidade do serviço como um todo. Aday e Andersen (1974) apresentam um framework básico para o estudo do acesso, conceituando todo o trajeto desde o delineamento dos objetivos das políticas de saúde com base nas características do sistema de saúde e das populações em risco (inputs), até os desfechos das intervenções ou outputs: a utilização efetiva dos serviços de saúde e a satisfação dos consumidores com estes serviços. As inter-relações entre as variáveis envolvidas são apresentadas com maior detalhe, a seguir, no framework adaptado de Aday e Andersen (1974). Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 8 Figura 1 – Framework para o estudo de acesso Fonte: adaptado de Aday e Andersen (1974). Aday e Andersen (1974) apresentam ainda dois índices descritivos que ilustram a real coordenação e disponibilidade de serviços, desenvolvidos por M. K. Chen em seu trabalho inédito, na tentativa de revelar alguns indicadores quantitativos de acesso. Um dos índices é composto pela a soma ponderada do tempo de espera para agendamento da consulta, tempo de deslocamento, tempo na sala de espera e tempo real de processamento do serviço para os pacientes, em uma determinada unidade de cuidados em saúde; enquanto o outro índice consiste na soma ponderada da diferença entre o número ideal e real dos serviços, pessoal e equipamentos em uma determinada comunidade. 1.1 O que é uma espera excessiva? Internacionalmente, uma variedade de definições tem sido utilizada em relação ao que seria um tempo de espera excessivo, sendo que em muitas delas a questão é referida muito mais como aglomeração do que espera prolongada (COOKE et al., 2004). A definição de superlotação em um departamento de emergência é indescritível. No Canadá, por exemplo, uma das definições seria a de “uma situação em que a procura de serviço excede a capacidade de prestação de cuidados dentro de um tempo razoável, fazendo com que médicos e enfermeiros sejam incapazes de prestar cuidados de qualidade” Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 9 (DRUMMOND, 2002 apud COOKE et al., 2004). Embora esta definição tenha um apelo intuitivo, é de difícil operacionalização para fins de investigação. Derlet e colaboradores (2001 apud COOKE et al., 2004) realizaram uma pesquisa junto a diretores de departamentos de emergência nos Estados Unidos, sugerindo cinco diferentes definições possíveis: 1. Pacientes que esperam mais de 60 minutos para ver o médico 2. Todos os leitos em um serviço de emergência encontram-se ocupados por mais de seis horas por dia 3. Pacientes em corredores por mais de seis horas por dia 4. Médicos de emergência se sentem apressados por mais de seis horas por dia 5. Sala de espera cheia por mais de seis horas por dia. O período de tempo gasto por pacientes no serviço de emergência tem sido objeto de debate. Em 1989, Rutherford e colaboradores (apud COOKE et al., 2004) argumentam que, para pacientes com doenças ou lesões graves, a espera no departamento de emergência por até quatro horas não era “justificável” e que tais atrasos resultam em irritação para alguns pacientes e familiares. Eles argumentaram que entre 80% e 90% dos pacientes eram vistos e tinham uma decisão tomada dentro do espaço de uma hora de chegada. Além disso, “nos locais onde havia a ocorrência de repetidos atrasos, ou o staff da unidade de saúde não entendia o que fazer para alcançar um bom funcionamento, ou a alocação desse pessoal era insuficiente para a carga de trabalho demandada” (RUTHERFORD et al., 1989 apud COOKE et al., 2004). No Brasil, uma iniciativa adotada para reduzir tanto o tamanho das filas quanto o tempo gasto na espera do atendimento é o QualiSUS, considerado uma das prioridades do Ministério da Saúde (VASCONCELOS, 2006). De maneira a melhorar o atendimento oferecido aos pacientes, principalmente nas unidades de pronto-socorro, o QualiSUS propões que seja feita uma triagem com base na classificação de risco: a prioridade de atendimento se dá em função da gravidade e não por ordem de chegada. Conforme relata Catarina Araújo, coordenadora do QualiSUS no Hospital da Restauração de Recife, o maior do estado de Pernambuco, “depois de ser recebido por uma equipe de acolhimento composta de psicólogas e assistentes sociais, o paciente vai para uma triagem em que seu risco é analisado. De lá, sai classificado como vermelho, amarelo, verde ou azul”, esclarecendo que o paciente classificado como vermelho deve ser atendido imediatamente; o amarelo pode esperar no máximo 15 minutos pela consulta; o verde, 30 minutos; e o azul, até três horas (VASCONCELOS, 2006). Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 10 1.2 As causas da espera Pouco do tempo gasto em uma unidade de emergência acrescenta algum valor à experiência de serviço do paciente (por exemplo, o tempo de contato com o staff da unidade durante as investigações de triagem). A triagem costuma levar aproximadamente 15 minutos (SMELTZER e CURTIS, 1987 apud COOKE et al., 2004), enquanto que a etapa de exame e tratamento entre 13 e 15 minutos (SMELTZER e CURTIS, 1987; RODRIGUEZ et al, 1992 apud COOKE et al., 2004). Para admissões, o período de avaliação leva mais tempo. O tempo para exames de Raios-X foi de 69 minutos, enquanto que exames de sangue tiveram um turnaround de 77 minutos (SMELTZER; CURTIS, 1987 apud COOKE et al., 2004). COOKE e colaboradores (2004) fazem uma revisão dos diversos trabalhos que estudam as possíveis causas da espera os quais utilizam uma grande variedade de técnicas. A diversidade de respostas encontradas nesses estudos indica que provavelmente as causas podem variar de acordo com o hospital, podendo ser multifatorial. Dentre os estudos analisados por COOKE e colaboradores (2004), algumas das causas de espera publicadas incluem os seguintes tópicos: • Níveis alternativos de cuidados na comunidade indisponíveis (SCHULL et al., 2001a apud COOKE et al., 2004) • Acesso a recursos domésticos (SCHULL et al., 2001a; ESTEY et al., 2003 apud COOKE et al., 2004) • Fechamento de hospitais comunitários (DERLET, 1992 apud COOKE et al., 2004) • Fraca ligação entre o hospital e os serviços fora do hospital (ANDERSSON & KARLBERG, 2001 apud COOKE et al., 2004) • Outros compromissos do staff de admissão da unidade (REGAN, 2000; THE SCHUMACHER GROUP, 2002 apud COOKE et al., 2004) • Equipes de admissão demandando os resultados de testes antes do encaminhamento do paciente (REGAN, 2000 apud COOKE et al., 2004) • Tempo de resposta das equipes de admissão (DERLET, 1992; FLETCHER et al., 2004;. SCHULL et al., 2001a; DERLET et al., 2000; ANDERSSON; KARLBERG, 2001; YOON et al., 2003, ESTEY et al., 2003 apud COOKE et al., 2004) • Atrasos em diagnósticos (SCHULL et al., 2001a; DERLET et al., 2000.; ANDERSSON; KARLBERG, 2001; THE SCHUMACHER GROUP, 2002; FLETCHER et al., 2004 apud COOKE et al., 2004) e a escassez de radiologistas (DERLET, 1992 apud COOKE et al., 2004) • O acesso a diagnósticos (SCHULL et al., 2001a;. YOON et al., 2003; ESTEY et al., 2003 apud COOKE et al., 2004) Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 11 • Indisponibilidade de leitos (FLETCHER et al., 2004; REGAN, 2000; DERLET, 1992; THE SCHUMACHER GROUP, 2002; DERLET et al., 2000 apud COOKE et al., 2004) ; • Bloco de acesso / disponibilidade de leito (RICHARDSON, 2001 apud COOKE et al., 2004) • Pacientes mantidos em unidades de emergência aguardando admissão (SCHULL et al., 2001a apud COOKE et al., 2004) • Falta de protocolos acordados entre o staff da unidade (REGAN, 2000 apud COOKE et al., 2004) • Aumento das exigências de documentação a ser apresentada pelo paciente (THE SCHUMACHER GROUP, 2002 apud COOKE et al., 2004) • Profissionais de saúde da unidade inexperientes (DERLET, 1992; REGAN, 2000 apud COOKE et al., 2004) • Médicos e suas características (SCHULL et al., 2001a; LAMBE et al., 2003; DERLET, 1992 apud COOKE et al., 2004) • Pessoal de enfermagem e o seu perfil (SCHULL et al., 2001a; LAMBE et al., 2003; ESTEY et al., 2003; THE SCHUMACHER GROUP, 2002 apud COOKE et al., 2004) • Reestruturação do hospital com redução de leitos para internação de pacientes (SCHULL et al., 2001b apud COOKE et al., 2004) • Mudança do papel da medicina de emergência (ESTEY et al., 2003; THE SCHUMACHER GROUP, 2002 apud COOKE et al., 2004) • Fluxo de leitos da unidade hospitalar, incluindo tempo de permanência, ocupação de leitos e disponibilidade de leitos de cuidados intensivos (SCHULL et al., 2001a apud COOKE et al., 2004) • O tempo total de atendimento diário do paciente (RICHARDSON, 2003a, b, c; THE SCHUMACHER GROUP, 2002 apud COOKE et al., 2004) • Complexidade crescente (THE SCHUMACHER GROUP, 2002 apud COOKE et al., 2004) • Número de crianças que frequentam a unidade (CHAN et al., 1997 apud COOKE et al., 2004) • Número de admissões na unidade (CHAN et al., 1997 apud COOKE et al., 2004); • Aumento da frequência de pacientes psiquiátricos e dependentes químicos (DERLET, 1992 apud COOKE et al., 2004) • Sobrecarga com casos não urgentes (SIDDHARTHAN et al., 1996 apud COOKE et al., 2004) • Hospitais rurais versus urbanos e o tamanho do hospital (SOLOMON e JOHNSON, 1999; AUDIT COMMISSION, 1998 apud COOKE et al., 2004) • Outros casos encaminhados por outras unidades (SCHULL et al., 2001a apud COOKE et al., 2004). Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 12 1.3 Os efeitos dos atrasos e da superlotação Em relação aos efeitos nos desfechos clínicos para os pacientes, Derlet e colaboradores (2001 apud COOKE et al., 2004) realizaram um survey nos Estados Unidos, constatando que 33% dos diretores de unidades de emergência informaram que alguns pacientes atendidos em suas unidades realmente experimentaram desfechos clínicos ruins como resultado da superlotação. É importante destacar a ocorrência de casos de óbito atribuídos à demora no atendimento por causa da superlotação de unidades de emergência (THOMPSON, 1999 apud COOKE et al., 2004). Além disso, atrasos na administração de medicamentos, como antibióticos para o tratamento de pneumonia (MAGALSKI et al., 1999 apud COOKE et al., 2004) e diuréticos em casos de insuficiência cardíaca (ROSENSTEIN et al., 2000 apud COOKE et al., 2004) aumentam o tempo de permanência do paciente no hospital. O aumento no tempo médio de internação causado pela superlotação da unidade de emergência tem apresentado como resultado acréscimos de custos por paciente (KROCHMAL e RILEY, 1994 apud COOKE et al., 2004). Durante os períodos de superlotação, os pacientes podem sentir dor prolongada, sofrendo desnecessariamente, pois o staff da unidade de emergência encontra-se ocupado demais para atendê-los (DERLET e RICHARDS, 2000 apud COOKE et al., 2004). Conforme observado no framework adaptado de Aday e Andersen (1974), a satisfação do consumidor (paciente) é um elemento importante do processo de atendimento em uma unidade de saúde, servindo como indicador de qualidade desse atendimento. Ainda de acordo com esse framework, o intervalo de tempo relacionado à utilização do serviço de saúde é outro fator a ser avaliado na busca por um fluxo adequado de atendimento. Muitas das causas de superlotação tiveram um efeito negativo sobre a produtividade do corpo médico da unidade (COOKE et al., 2004). Os médicos que atuam em unidades de emergência tentam preencher as lacunas no serviço, assim como devem estender sua capacidade de atender muitos pacientes simultaneamente. Derlet e Richards (2000 apud COOKE et al., 2004) demonstraram que a produtividade cai a partir de um determinado limite de pacientes atendidos, de modo que a qualidade dos cuidados providos a esses pacientes fica comprometida. Outro problema a ser enfrentado está relacionado ao fato de que tanto a retenção quanto recrutamento de recursos humanos para essas unidades são adversamente afetados, como consequência da superlotação (PEARCE, 2002 apud COOKE et al., 2004). Stirling e colaboradores (2001 apud COOKE et al., 2004), em um trabalho de revisão sistemática dos casos de violência em serviços de emergência, demonstraram a associação entre o aumento da violência contra o staff da unidade e os tempos de espera mais longos. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 13 No caso de hospitais particulares, pode haver perda de receita em função de falhas na admissão de pacientes para os leitos hospitalares, à medida que esses pacientes ficam retidos na unidade de emergência (COOKE et al., 2004). 2. UMA REVISÃO DOS ESTUDOS SOBRE A ESPERA EM SERVIÇOS Nas últimas décadas do século XX, o gerenciamento da espera ganhou destaque como objeto de estudo de pesquisadores da área de Administração, um aspecto do pacote de serviços cuja importância continua crescendo devido à maneira como o tempo passou a ser valorizado pelos consumidores (JACOBY et al., 1976, BERGADAA, 1988;. MOWEN; MOWEN, 1991; USUNIER, 1991 apud DURRANDE-MOREAU, 1999). No ano de 1985, Maister (apud DURRANDE-MOREAU, 1999), autor reconhecido por sua pesquisa operacional a respeito da teoria das filas, apresenta um importante trabalho sobre atividades de serviços, fornecendo uma lista de fatores que levam à espera negativa. Durrande-Moreau (1999) utiliza os conceitos de Maister como referência para o seu trabalho de revisão de 18 estudos empíricos publicados entre a década de 1980 e 1990, apresentando oito proposições detalhadas a seguir. 1. O tempo desocupado parece mais longo do que o tempo ocupado (distração) 2. A espera pré-processo parece mais longa do que a espera no processo (momento) 3. A ansiedade faz a espera parecer mais longa (ansiedade) 4. As esperas incertas são mais longas do que esperas certas (incerteza) 5. As esperas não explicadas são mais longas do que aquelas explicadas (explicação) 6. As esperas injustas são mais longas do que as esperas justas (justiça) 7. Quanto maior o valor do serviço, mais tempo o cliente vai esperar (valor) 8. A espera sozinho parece mais longa do que a espera em grupo (espera solo). Durrande-Moreau (1999) estabelece, então, um modelo para classificação dos fatores que afetam a espera em serviços, com base nos seguintes critérios. 1. Antes e durante a espera: por exemplo, a motivação para o serviço é um fator existente “anterior à espera”, enquanto distração ocorre “durante a espera” 2. Individual e situacional: o hábito do consumidor em relação ao serviço, por exemplo, é um fator individual, enquanto que justiça está relacionada à situação em que se dá a espera. Essa distinção tende a separar o que pode ser controlado pelo prestador de serviços (fatores situacionais) do restante (fatores individuais) Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 14 3. Duração e outros fatores: fatores expressos em minutos também são levados em consideração. Por exemplo, expectativa (tempo de espera esperado) é medida em minutos. A partir desses critérios, Durrande-Moreau (1999) organiza os fatores de espera em grupos representados de G1 a G6, ordem utilizada para apresentação dos achados de sua pesquisa. 1. Antes da espera: 2. G2 - Fatores individuais ligados à duração (expectativa pessoal). 3. G3 - Fatores individuais não relacionados à duração (hábito, valor, humor, motivação e pressão do tempo). 4. G4 - Fatores situacionais ligados à duração (expectativa manipulada). 5. Durante o tempo de espera: 6. G5 - Fatores individuais não relacionados à duração (autodistração, ambiente percebido e autoexplicação). 7. G1 - Fatores situacionais ligados à duração (duração real). 8. G6 - Fatores situacionais não relacionados à duração (distração sugerida, incerteza, momento, explicação manipulada, injustiça, espera solo e ambiente manipulado). A tabela a seguir, adaptada do trabalho de Durrande-Moreau (1999), resume os achados desse estudo. Tabela 1 – Fatores relacionados à espera em serviços Grupo de fatores G1 - Durante o tempo de espera: fatores situacionais ligados à duração Duração real da espera G2 - Antes da espera: fatores individuais ligados à duração Expectativa pessoal G3 - Antes da espera: fatores individuais não relacionados à duração Hábito, valor, humor, motivação e pressão do tempo G4 - Antes da espera: fatores situacionais ligados à duração Expectativa manipulada G5 - Durante o tempo de espera: fatores individuais não relacionados à duração Autodistração, ambiente percebido e autoexplicação G6 - Durante o tempo de espera: fatores situacionais não relacionados à duração Distração sugerida, incerteza, momento, explicação manipulada, injustiça, espera solo e ambiente manipulado Resultados Forte influência, principal fator. Tempo real aparece como estímulo central. Forte influência, principal fator. O tempo de espera esperado é também um fator essencial. Fatores promissores. Estes cinco fatores parecem ser importante, mas de difícil controle por parte do gestor. Fator promissor. Importante e controlável. Fatores promissores. Estes três fatores parecem ser importantes, mas de difícil controle por parte do gestor. Fatores decepcionantes. As variações no ambiente de espera não influenciam de maneira clara o modo como se dá a experiência de espera do consumidor. Fonte: adaptado de Durrande-Moreau (1999). Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 15 3. O TEMPO DE ESPERA E O APROVISIONAMENTO DE SERVIÇOS EM SAÚDE Segundo Hill e Joonas (2005), diversos estudos demonstram que o tempo de espera pode impactar negativamente não apenas a satisfação do paciente, mas também as percepções de qualidade e a escolha do provedor de serviços (ANDRUS, 1984; COFFEY, 1983; GOPALAKRISHNA; MUMMALANENI, 1993; HILL e GARNER, 1991; KATZ et al., 1991; TAYLOR, 1994 apud HILL; JOONAS, 2005). É também possível que os pacientes, mesmo acreditando estar recebendo um serviço de qualidade, se sintam tão incomodados com a espera que se tornam insatisfeitos com a experiência geral oferecida pelo prestador de serviços em saúde e troquem de prestador (HILL e JOONAS, 2005). Dado o aumento do nível de concorrência no setor de saúde e as vidas cada vez mais agitadas dos indivíduos, passa a ser fundamental uma investigação mais aprofundada do efeito potencialmente negativo que tempo de espera pode exercer nas atitudes e no comportamento que o paciente tem em relação aos serviços de saúde que consome, incluindo a possibilidade de mudança de fornecedor (HILL e JOONAS, 2005). Conforme sugerido por Huynh (2004 apud HILL; JOONAS, 2005), o desafio hoje está relacionado ao modo como gestores de saúde podem se adaptar às novas necessidades de seus pacientes, ao invés de esperar que a sua clientela se adapte às inconveniências que enfrentam no contato com o serviço de saúde. 3.1 Acesso aos serviços de emergência O número de pacientes que se encaminham a serviços de emergência está aumentando a cada ano, o que, por sua vez, resulta em um aumento de demandas e expectativas. A ocupação dos serviços de emergência em sua capacidade máxima rapidamente provoca deficiências na segurança do paciente, no atendimento ao paciente e no gerenciamento de situações emergenciais vitais, bem como síndrome de burnout entre os membros do staff dessa unidade de saúde e a falta de leitos. A intensidade das mudanças no contexto dos serviços de emergência faz com que a satisfação do paciente, um conceito que vem ganhando importância nos últimos anos, se torne uma questão corrente (KARACA, ERBİL e ÖZMEN, 2011). Ainda de acordo com Karaca, Erbil e Özmen (2011), a espera na sala de emergência faz com que tanto os pacientes quanto os profissionais de saúde percebam o tempo de espera de forma diferente do real tempo decorrido nessa espera, existindo duas dimensões para o período de espera: o tempo real de espera (medido) e o tempo de espera percebido (subjetivo). O atendimento adequado e suficiente às demandas do paciente, com profissionalismo e comunicação adequada, garantindo que o paciente se encontra bem cuidado e informado, são, na visão de Karaca, Erbil e Özmen (2011), os fatores mais importantes que afetam a satisfação do paciente e a percepção de espera. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 16 3.2 Agendamento de consultas Em razão da capacidade de se obter consultas agendadas de forma conveniente ser um indicador-chave para o acesso aos serviços de saúde, Resneck, Pletcher e Lozano (2004) realizaram um survey, pesquisando as atividades de dermatologistas em 12 comunidades de médio e grande porte para avaliar o tempo de espera para a nova rotina ambulatorial. Dada a atual demora no agendamento de consultas resultante de uma relativa escassez de dermatologistas, a hipótese dos autores era a de que pacientes com menor poder aquisitivo e consequente “lower-paying coverage” estariam mais propensos a experimentar recusas no agendamento de suas consultas e maiores tempos de espera, ou ambos. 3.3 Gerenciamento de leitos Surpreendentemente poucas têm sido as pesquisas relacionadas à questão de gerenciamento de leitos, tratando de inovações para reduzir os atrasos, das práticas de trabalho e dos números da força de trabalho (COOKE et al., 2004). O gerenciamento de leitos tem sido o foco de muita atenção nos últimos anos, com particular ênfase sobre a necessidade de previsão das requisições de leitos, adotando um estilo de gerenciamento preventivo desses leitos (DEPARTMENT OF HEALTH, 2002b; AUDIT COMMISSION, 2003 apud COOKE et al., 2004). O acesso a leitos em tempo hábil é fundamental para evitar a espera nos serviços de emergência (RICHARDSON, 2001 apud COOKE et al., 2004). Cooke e colaboradores (2004) enfatizam a existência de uma falta de evidências que deem suporte a qualquer inovação no gerenciamento de leitos, embora tenha sido demonstrado que a carga de trabalho pode ser prevista. Há uma fraca evidência que permitir a admissão direta por parte da equipe da unidade de emergência vai reduzir espera, sem que haja nenhum efeito negativo. O gerenciamento dos leitos em um hospital é uma função fundamental para o seu funcionamento eficiente e ainda não foram encontrados registros de ensaios que testassem diferentes estratégias para gerenciamento de leitos (COOKE et al., 2004). Portanto, esta deveria ser uma área prioritária para futuras pesquisas, tendo em vista o alegado desperdício de leitos em longas e desnecessárias internações hospitalares. 4. IMPLICAÇÕES GERENCIAIS E RECOMENDAÇÕES Fundamentalmente, segundo Durrande-Moreau (1999), a primeira questão para a qual se deve atentar é a importância da duração (o tempo real de espera). De acordo com Hill e Joonas (2005), muitos médicos vêm tentando por muitos anos melhorar o atendimento dado à sua clientela. Estes esforços geralmente levam em Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 17 consideração uma das duas formas de gerenciamento da percepção (médico x paciente) e a gestão de agendamento de consultas. Nenhuma dessas abordagens foi completamente satisfatória até o momento, conforme suportado pelas conclusões desses autores. Para Hill e Joonas (2005), os passos iniciais para resolução do dilema das percepções de tempos de espera inaceitáveis para os pacientes e as consequências de tais percepções são a determinação do tempo de processamento do serviço de cada paciente e o desenvolvimento de um processo de agendamento de consultas correspondente a esta demanda. O principal fator guiando esse processo não deve ser o uso mais eficiente do tempo do profissional de saúde, mas sim o uso mais efetivo do tempo, de maneira a trazer benefícios para o cliente (HILL e JOONAS, 2005). Supõe-se que a principal razão para o sobreagendamento de consultas, sobrecarregando a programação, seja a busca do profissional de saúde por uma vantagem financeira. O profissional de saúde coloca um valor maior em seu tempo, enquanto o paciente geralmente acredita que o seu tempo é, no mínimo, de igual valor (HILL e JOONAS, 2005). Como visto anteriormente nos conceitos abordados por Maister (1985 apud DURRANDE-MOREAU, 1999), sabe-se que o tempo “ocupado” parece passar mais rápido do que o tempo “desocupado”. Na prática, o tempo de espera do paciente muitas vezes é preenchido com uma variedade de técnicas de “percepções de tempo” iniciadas tanto pelo prestador de serviços em saúde (televisão, revistas, etc.) quanto pelo paciente (ler um livro, tricô, papelada), conforme descrito por Hill e Joonas (2005). O prestador de serviços em saúde pode ocupar o mesmo tempo de espera, atualizando arquivos de pacientes, fazendo call-backs e outras tarefas necessárias. A realidade, porém, é que as percepções opostas sobre o valor individual de tempo não são susceptíveis a alterações. No cenário atual da saúde, tanto o fornecedor quanto o paciente acreditam estar concedendo um tempo precioso, se decepcionado muitas vezes com o desfecho (HILL e JOONAS, 2005). Na visão de Hill e Joonas (2005), o prestador de serviços em saúde deve primeiro aceitar a premissa de que um paciente leal rende aumentos na remuneração para o provedor no longo prazo. Haverá, então, uma ampla oportunidade para o profissional de saúde manter registros do tempo gasto para cada paciente. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O artigo de Maister (1985 apud DURRANDE-MOREAU, 1999) traz diversos conceitos que podem ser considerados como uma referência básica no estudo do impacto do tempo de espera na percepção da qualidade e na satisfação do cliente. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 18 O agrupamento dos fatores relacionados à espera em serviços, feito por DurrandeMoreau (1999), revelou a importância de se observar a hierarquia desses fatores: em primeiro lugar, é preciso ter atenção aos fatores temporais; em segundo, aos fatores individuais; e, finalmente, aos fatores situacionais. Essa hierarquia é importante e deve renovar a abordagem que se tem do fenômeno da espera em serviços. Em suma, todos os prestadores de serviços em saúde têm motivos para avaliar o nível de insatisfação entre os diferentes grupos de pacientes, enquanto eles esperam para o serviço, uma vez que a maior parte dos estudos com foco na satisfação e lealdade do consumidor demonstra que a satisfação é um dos principais fatores na fidelidade do cliente. Um paciente leal é capaz de tanto reduzir os custos de prestação de serviços quanto aumentar a receita do prestador do serviço em saúde. A lealdade do paciente deveria ser a meta de todos os prestadores de cuidados de saúde (HILL; JOONAS, 2005). 6. REFERÊNCIAS ADAY, L. A.; ANDERSEN, R. A framework for the study of access to medical care. Health Services Research, v. 9, n. 3, p. 208-220, Fall 1974. COOKE, M. et al. Reducing attendances and waits in emergency departments: A systematic review of present innovations. London: National Co-ordinating Centre for NHS Service Delivery and Organization R & D (NCCSDO), 2004. Relatório. DURRANDE-MOREAU, A. Waiting for service: Ten years of empirical research. International Journal of Service Industry Management, v. 10, n. 2, p. 171-194, 1999. HILL, C. J.; JOONAS, K. The impact of unacceptable wait time on health care patients’ attitudes and actions. Health Marketing Quarterly, v. 23, n. 2, p. 69-87, 2005. KARACA, M. A.; ERBİL, B.; ÖZMEN, M. M. Waiting in the emergency room: Patient and attendant satisfaction and perception. European Journal of Surgical Science, v. 2, n. 1, p. 14, 2011. RESNECK, J.; PLETCHER, M. J.; LOZANO, N. Medicare, medicaid, and access to dermatologists: The effect of patient insurance on appointment access and wait times. Journal of American Academy of Dermatology, v. 50, p. 85-92, 2004. VAN RIEL, A.C.R. et al. Waiting for service at the checkout: Negative emotional responses, store image and overall satisfaction. Journal of Service Management, v. 23, n. 2, p. 144169, 2012. VASCONCELOS, L. Saúde: tempo real. Revista Desafios do Desenvolvimento, v. 3, n. 21, abr. 2006. Disponível em: Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 19 <http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=991: catid=28&Itemid=23>. Acesso em: 14 out. 2012. ABSTRACT In contemporary society, time is seen by people as a resource increasingly scarce and valuable. Much of this time is spent waiting for service, which has reduced the tolerance of consumers to the waiting in service. With an aging population and increased life expectancy, the issue of waiting times in healthcare services has gained even more importance, because elderly people are a population segment whose demand for care is growing. Therefore, this essay seeks to lead the reader through a literature review, an understanding of the latest contributions in the study of waiting in services and its relationship with the providers of healthcare services. It begins with the fundamental concepts and the effects of waiting. Then it presents a correlation between the findings of these studies and the following healthcare services: (i) emergency care services, (ii) appointment scheduling, and (iii) management of beds in a hospital. From these correlations, we seek to understand how the recent progress in understanding the impact of waiting in services can contribute to business management in the health sector. Keywords: waiting in service, healthcare services, quality in services Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 7-20 2013 20 EXPERIÊNCIA EM SERVIÇOS: UMA ANÁLISE DE CASOS PERMEANDO SEUS CONCEITOS Jan Krüger Nicolle Kauffmann RESUMO O setor de serviços representa uma fatia cada vez mais relevante na economia moderna e ao mesmo tempo apresenta um desafio no que tange o desenvolvimento de ofertas que satisfaçam o consumidor. Esse desafio do setor e suas ofertas se dá pela sua natureza intangível, heterogênea, perecível, e pelo fato de serem produzidos e consumidos de maneira simultânea. O presente artigo tem como objetivo abordar o tema de experiência em serviços, explanando as três principais metodologias utilizadas no estudo da experiência do consumidor de serviços. São apresentadas a abordagem fenomenológica, a análise da experiência baseada em processos e a análise da experiência baseada em resultados. Em seguida, são apresentados casos de serviços a fim de exemplificar o uso de cada abordagem e como estas podem auxiliar o corpo gerencial a aprimorar a experiência do consumidor. Palavras-chave: experiência em serviços, desenho de serviços, dominância de serviços, marketing de merviços, qualidade de serviços Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 21 1. INTRODUÇÃO Serviços diferenciam-se substancialmente de produtos pelo fato de terem uma natureza intangível, heterogênea e perecível, e pelo fato de serem produzidos e consumidos de maneira simultânea. Tais características fazem com que a comparação técnica entre serviços distintos seja praticamente impossível. Enquanto um produto físico, por exemplo, um computador, conta com atributos técnicos facilmente comparáveis entre as distintas ofertas, o mesmo não é valido para um serviço de consultoria que envolve, além dos relatórios elaborados, um pacote de serviços intangíveis que dificilmente podem ser comparados matematicamente entre as diferentes ofertas. Ademais, o peso e a percepção de cada atributo numa prestação de serviços são distintos de acordo com o cliente. Esses fatos fazem com que seja um desafio bastante complexo prestar o melhor serviço possível para cada cliente, uma vez que o melhor serviço possível é distinto de um cliente para o próximo. O recente foco das pesquisas acadêmicas gira em torno do gerenciamento das experiências dos consumidores e como os serviços devem ser desenhados de maneira a aprimorar tais experiências. Segundo Lusch e Vargo (2006), a experiência deve ser a base fundamental para a elaboração de novos pacotes de serviços e produtos. Estes autores trazem para o centro da discussão uma nova lógica baseada na dominância de serviços, ante a abordagem centrada em produtos que, até então, predominava nos estudos e nas práticas gerenciais. O tema é de especial relevância para a realidade brasileira uma vez que o mercado de serviços está assumindo um papel gradativamente maior na economia nacional e, apesar disso, ainda conta com diversas dificuldades para propiciar experiências à altura das ofertas que são feitas em mercados exteriores. O desenho de pacotes de serviços que entreguem ao cliente uma experiência superior pode significar o caminho para uma vantagem competitiva frente aos incumbentes, além de permitir capturar maior valor na prestação de serviços. O presente trabalho tem como objetivo apresentar as diferentes maneiras utilizadas para analisar e desenhar serviços que busquem aprimorar a experiência dos clientes. É importante notar, de antemão, que as diferentes abordagens não são mutuamente exclusivas. Muito mais que isso, elas se complementam e buscam embasamento teórico em diferentes fontes de conhecimento para analisar a questão da experiência na prestação de serviços. O entendimento dessas diferentes abordagens pode municiar os gestores de uma organização com conhecimento necessário para aprimorar a qualidade na prestação de serviços, independente da área ou setor em que estão atuando. Serão apresentadas ao longo desse trabalho as três principais linhas de pesquisa relacionadas ao tema. Primeiro, será apresentada a abordagem fenomenológica, que traz a lógica do serviço dominante e o foco nas experiências do indivíduo como sua base de estudo. Em seguida, será colocada em foco a análise da experiência baseada em Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 22 processos, ou seja, tendo como base a arquitetura do serviço e uma característica longitudinal. E por último, será feita a análise da experiência baseada em resultados, tendo como sujeito de estudo dados agregados de resultados e a visão dos consumidores em conjunto. Para facilitar a compreensão dessas três abordagens e visualizar como o mercado vem trabalhando com o conceito de experiência em serviços, serão analisados casos de empresas e serviços correspondentes a cada uma dessas três abordagens. A experiência fenomenológica será retratada pelos casos da Disney e do River Magic; a experiência baseada em processos terá sua caracterização feita pelo caso de serviços de teleatendimento de instituições financeiras; e a baseada em resultados será exemplificada por um caso do Varejo Online. Ao final desses três casos, haverá a discussão sobre como essas abordagens podem trabalhar em conjunto e uma síntese de como as organizações vem utilizando esse tema. 2. EXPERIÊNCIA EM SERVIÇOS O termo “experiência em serviço”, atualmente, vem sendo muito debatido na academia (HELKKULA, 2011; ZOMERDIJK e VOSS, 2010; CARÚ e COVA, 2003), pois, de acordo com a revisão de literatura de Helkkula (2011), seu conceito pode variar dependendo da visão do autor e da situação na qual o fenômeno/evento ocorre. Portanto, a primeira parte desta seção tem o intuito de mostrar a origem e o conceito de forma mais ampla da experiência e da experiência voltada para área de serviços. Ainda nessa parte, serão apresentados os conceitos de experiência, perpassando as três formas mais comuns encontradas na revisão literária realizada por Helkkula (2011), analisando como esses conceitos são apresentados. Na segunda parte da revisão de literatura, alguns estudos de autores e teorias a respeito das dimensões da experiência do consumidor, como os reinos da experiência (PINE; GILMORE, 1998), serão abordadas com a intenção de compreendermos melhor as várias facetas da experiência e as razões de sua conceituação e apresentação ocorrerem de forma tão variada. 2.1 Conceito e origens O conceito de experiência em serviço teve como seus pioneiros os autores Holbrook e Hirschman (1982), que introduziram a relação entre aspectos de experiência e consumo. Esses autores compartilhavam uma visão fenomenológica e experiencial do termo consumo, caracterizando-o como “estado subjetivo da consciência com uma variedade de significados simbólicos, respostas hedônicas e critérios estéticos”. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 23 A inovação para a academia trazida por esses autores foi a nova perspectiva encontrada para analisar o comportamento do consumidor, uma perspectiva experiencial. Antes desses estudos, acreditava-se que esse comportamento de consumo poderia ser avaliado como um sistema de processamento de informações baseada nos atributos dos produtos, porém essa nova visão da experiência em serviços transcende as características de benefícios utilitários e funcionais do processo de consumo. O termo experiência também agrega vários significados. Ao olharmos no dicionário de português Houaiss, podemos encontrar que experiência é o ato de experimentar, é a forma de conhecimento via prática, é provar. Se pudéssemos caracterizar a experiência com adjetivos a sua multiplicidade de significados estaria compreendida nos seguintes adjetivos: participativa, intangível, subjetiva, individual, longitudinal e de múltiplas dimensões. Esses elementos deixam claros a complexidade e o mundo de perspectivas a se trabalhar quando se trata de experiência no consumo (MARANHÃO, 2011). Não apenas as multiplicidades de sentidos do termo experiência geram complexidade; a avaliação divergente entre autores sobre a profundidade e a importância dessa experiência em serviços também é motivo de discussões. Para autores como Pagtett e Allen (2007), a experiência apresenta-se como intrínseca ao serviço, ou seja, o consumo em si já pode ser considerado uma experiência. Estes autores definem esse tipo de experiência como “as reações cognitivas, afetivas e comportamentais associadas a um evento de serviço específico”. Portanto, os autores seguem a linha de pensamento de que é impossível separar experiência de serviço, portanto, seria difícil precificá-las de maneira separada, pois não dá para identificar a adição de valor da experiência. Em contrapartida, outra linha de pensadores (PINE e GILMORE, 1998) acredita que há diferenciação entre serviços e experiências, assim como há diferença entre serviço e produto. A diferença principal apontada pelos autores pode ser compreendida na seguinte frase “a experiência é essencialmente pessoal e só existe na mente do indivíduo”. A vantagem dessa visão para profissionais da área e acadêmicos de marketing é a abertura de uma janela de possibilidades de adição de valor na diferenciação do serviço baseado na utilização da experiência para os consumidores. De acordo com a pesquisa de Helkkula (2011), a questão da experiência em serviços não se limita ao conceito da interação com o fenômeno, ao hedonismo e à emoção. Isso pode ser retratado por Carú e Cova (2003) com sua declaração de experiência em serviço: “um episódio subjetivo na transformação e construção do indivíduo, com uma ênfase nas emoções e sentidos em detrimento da dimensão cognitiva”. O hedonismo no fenômeno é um ponto importante na conceituação desse termo, mas não é a única maneira de se abortar o tema. Portanto, a seguir serão apresentadas as três formas de abordagem do termo de experiência em serviços: fenomenológica, baseada em processos, e a baseada em resultados. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 24 2.1.1 Experiência fenomenológica A análise da experiência sobre uma perspectiva fenomenológica é a mais comum das três visões, sendo encontrada na revisão de Helkkula (2011) em mais de 50% dos artigos analisados e está relacionada à lógica do serviço dominante (SD-logic). Esta lógica, apresentada pelos autores Lusch e Vargo (2006, 2008), traz a experiência em serviço como a base de todo e qualquer negócio e veio para complementar a lógica baseada na troca de bens, em recursos tangíveis e em transações até então utilizada pela economia nos negócios. Essa lógica do serviço dominante trouxe novas perspectivas para análise do consumo e da experiência, agora baseadas em atributos intangíveis, na cocriação de valor e nos relacionamentos (LUSCH e VARGO, 2006). Todas essas novas premissas advindas da lógica do serviço dominante (SD-logic) podem ser vistas na tabela 1 (anexo A). Muitas dessas características estão intrinsecamente ligadas à questão da abordagem de experiência fenomenológica. O escopo de estudo desse tipo de abordagem da experiência são as experiências subjetivas e as experiências relacionais (sociais), presentes em diferentes contextos de análise na literatura, como: lealdade à marca, o fator “wow” (surpresa e encantamento), a experiência total do consumidor e marcas. Dentro desses contextos, o sujeito de análise nessa visão é o cliente, que pode ter um contato direto ou indireto com a empresa/marca, e as suas interações nesse ambiente. Vale ressaltar que em estudos anteriores, o foco era mais no indivíduo e na situação em que se encontrava, contudo, com novos estudos descobriu-se o valor da interação social durante a experiência, cabe aqui o exemplo do atual sucesso das redes sociais (ex: Facebook) na população mundial. É possível perceber a forte presença, nesse tipo de abordagem, de características voltadas para o lado emocional. A maioria de estudos nesse campo abordam casos de experiências em serviços hedônicos, simbólicos e muitas vezes estéticos; itens abordados desde o início dessa discussão sobre o consumo por Holbrook e Hirschman (1982). Há autores (HELKKULA, 2011; VARGO e LUSCH, 2008) que criticam essa ausência de estudos não hedônicos, inclusive nomeando esse efeito de “Disneyworld event”. Contudo, estes autores não foram capazes de citar exemplos dos quais esse fenômeno poderia aparecer em outra circunstância. O valor da experiência, nesse caso, é justamente trabalhar com o emocional do consumidor e lhe oferecer uma experiência ou um momento de prazer que fará com que ele tenha boas lembranças ou sentimentos perante a marca em questão. Portanto, é por esse motivo que, apesar das críticas a exclusividade do hedonismo, será analisada, numa das sessões posteriores, os casos da Disney e do River Magic que abordam essa perspectiva de experiência fenomenológica. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 25 2.1.2 Experiência baseada em processos A linha de pesquisa que caracteriza experiência de serviços com base nos processos que são executados ao longo da prestação do serviço analisa os elementos estruturais para a execução e entrega do pacote de benefícios que são ofertados. O foco dessa linha de pesquisa é descrever a arquitetura dos serviços e determinar onde há falhas ou oportunidades que podem ser exploradas para melhorar a percepção por parte dos clientes. Edvardsson et al. (2005) descrevem processos de serviços como elementos que criam uma resposta cognitiva no seu consumidor, levando a eventos emocionais e comportamentais nos mesmos de acordo com o estimulo que foi recebido. Segundo Helkkula (2011), uma das ênfases de tal abordagem é o sequenciamento temporal da prestação de um determinado serviço, classificando os diferentes elementos de um serviço em “estágios” ou “fases”. O cliente pode participar ou não ativamente em cada uma dessas fases. Tal sequenciamento é comumente representado por fluxogramas que detalham quais processos são desempenhados em cada estágio, podendo também indicar quais são os agentes envolvidos em cada processo (i.e. clientes, funcionários de back-office, funcionários de atendimento, etc) e também qual a capacidade de atendimento em cada estágio do processo de prestação de serviços. A figura 1, a seguir, foi adaptada do trabalho de Rich e Piercy (2006) e demonstra um fluxograma simplificado de um possível serviço de teleatendimento. Figura 1 – Fluxograma do serviço de teleatendimento Fonte: adaptado de Rich e Piercy (2006). A utilização desse tipo de ferramenta permite aos gerentes identificar gargalos onde faltam recursos para completar as atividades necessárias para a prestação de serviços. Por outro lado também evidencia folgas de recursos que poderiam ser remanejadas ou Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 26 reduzidas para evitar o desperdício. O mapeamento dos processos geralmente segue uma metodologia e linguagem estabelecida como, por exemplo, a UML (Unified Modeling Language). O reconhecimento dos diferentes processos que constituem a produção do serviço para o cliente final permite que sejam utilizadas ferramentas advindas do estudo de operações como, por exemplo, o Six Sigma e o LEAN Management. Estas ferramentas, reconhecidas como fundamentais para o sucesso do modelo de produção Toyota, podem ser aplicadas a operações de serviços para diminuir a existência de falhas e gargalos na “linha de produção” de tais serviços. Segundo Liker e Morgan (2006), o sistema Toyota de produção pode ser bem aplicado a serviços, uma vez que parte das demandas do cliente final para definir as atividades que criam valor e que precisam ser aprimoradas, e aquelas que não agregam valor e podem ser eliminadas. Em consequência, cada atividade dentro de um processo de serviço pode ser caracterizada de acordo com o valor que cria para o usuário final, ou seja, adiciona-se qualidades positivas à experiência do cliente final ou não. Ademais, os autores chamam atenção para o fato de que o sistema Toyota de produção concentra esforços para que os processos sejam eficientes da primeira vez, evitando o trabalho de ajustes e remodelagem de processos. Tal fato é igualmente importante em serviços, se não mais, uma vez que a marca de uma empresa pode ser impactada de maneira irrecuperável por um serviço de baixa qualidade. Acertar da primeira vez garante que a organização consiga capturar valor, além de possibilitar uma percepção de valor para com a marca da empresa. Por fim, é importante ressaltar a capacidade de melhoria contínua e aprendizado, gerada pela esquematização dos processos que compõem uma prestação de serviços. Segundo Helkkula (2011), o reconhecimento de gargalos e folgas permite que as organizações ajustem a sua alocação de recursos, a fim de criar maior valor aos seus clientes finais. Por outro lado, a sistematização e documentação dos processos executados durante o fornecimento de uma prestação de serviços tem a função de institucionalizar processos, reduzindo dessa maneira a variação de qualidade e atributos durante a sua execução. 2.1.3 Experiência baseada em resultados A análise da experiência em serviços baseada em resultados é outra maneira de investigar como os diferentes atributos impactam a percepção e comportamento do cliente de um serviço específico. Segundo Helkkula (2011), esta linha de pesquisa busca relacionar diferentes atributos e variáveis de uma prestação de serviços com um resultado específico que se deseja medir. O método busca evidenciar as correlações existentes, construíndo um modelo de causa e efeito que pode ser usado para o desenvolvimento ou aprimoramento de diferentes serviços. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 27 Dentro desse modelo, a experiência de consumo é apenas uma das variáveis que irá afetar o resultado a ser medido. O foco principal não é, portanto, a experiência percebida pelo cliente, mas como todos os elementos envolvidos na prestação de serviço interagem e contribuem para a geração de uma experiência, que por si só também é um elemento que irá levar a uma determinada ação do indivíduo. Essa linha de pesquisa busca padrões de comportamento em nível agregado, ou seja, qual é o padrão médio de comportamento e reação de uma população em relação aos diferentes atributos e características de um serviço. O resultado é geralmente medido por meio de formulários de pesquisa que relacionam os diferentes atributos do serviço, assim como as variáveis que buscam ser medidas como, por exemplo, satisfação e prazer (BEL, 2005) ou qualidade percebida (FLANAGAN et al., 2005). As variáveis a serem medidas precisam poder ser quantificadas por de escalas que buscam quantificar sentimentos como prazer e qualidade percebida. Outras são mais evidentes, como por exemplo, o ticket médio de um cliente ou a quantidade de vezes que o mesmo retorna a um estabelecimento, por exemplo qual a frequência de um cliente num determinado restaurante. Com a identificação dos elementos que levam a um determinado resultado, gestores podem alocar os seus recursos naqueles fatores que mostram maior correlação com o resultado que está sendo buscado. Dessa maneira, esse tipo de caracterização de experiência de serviços coloca-se como importante ferramenta para aprimorar a criação e valor para o cliente e a captura de valor por parte da organização. 2.2 Dimensões da experiência Como foi dito quando abordados a origem e os conceitos de experiência, algo que ficou muito explícito foi a sua multiplicidade de sentidos, ou seja, a experiência engloba uma gama de significados subjetivos que precisam ser enquadrados para facilitar sua análise. Diversos autores criaram suas próprias formas de enquadramento para o tema, colocando, assim, a experiência dividida em dimensões. Os autores que originaram os estudos sobre o tema, Holbrook e Hirschman (1982), dividiram a experiência em três dimensões: fantasias, sentimentos e diversões. Nesse caso temos a fantasia relacionada com aspectos cognitivos da experiência, de projeções do imaginário, de sonhos. A dimensão do sentimento traz o emocional na relação com bem ou serviço, transposta em sentimentos como amor, raiva, ódio, prazer. Já a última dimensão está associada ao prazer, ao hedonismo, à diversão, aspectos tão abordados e por sua vez criticados pelo excesso por Helkkula (2011). Uma forma mais recente e talvez mais objetiva, visualizada por meio de uma matriz, é a proposta dos quatro reinos apresentada por Pine II e Gilmore (1998). A ideia da divisão por dimensões nesse caso propõe classificar o tipo de experiência vivenciada pelo indivíduo Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 28 em contato com a organização. A matriz (Figura 2,) que representa essas quatro dimensões, é bidemensional e composta pelos seguintes reinos: entretenimento, educacional, estético e escapista. Os eixos em questão são definidos pelo tipo de participação (linha horizontal) e pela conexão do cliente com o evento (linha vertical). Absorção Participação Passiva Participação ativa Imersão Figura 2 – Os Quatro Reinos da Experiência Fonte: Pine II e Gilmore (1998) – Artigo “Welcome to the experience economy”. Neste modelo cruzamos os eixos e definimos os quatro reinos propostos. O primeiro reino ou dimensão, do entretenimento, é caracterizado por uma participação passiva, porém com alta conexão do cliente (absorção). Esse tipo de experiência pode ser exemplificado com peças de teatro, cinema, circo, ou seja, atividades nas quais o consumidor assiste ou presencia algo do qual sente uma conexão mesmo que não esteja envolvido ativamente. O segundo reino é o educacional, a aprendizagem de forma ativa pelo participante. Um bom exemplo nesse caso é a leitura de um livro ou a participação numa aula de línguas, das quais se extrai algum conhecimento. O terceiro reino desse modelo é o escapista, no qual há uma participação ativa do sujeito envolvido e uma imersão na atividade proposta pela organização. Esse tipo de experiência pode entreter tanto quanto o primeiro reino e ensinar tanto quanto o segundo, mas envolve muito mais o consumidor. Exemplos dessas experiências podem ser: tocar num orquestra, atuar numa peça ou participar de um rafting. O quarto reino leva a uma menor participação desse sujeito, mas mantendo o grau de imersão, e é conhecido como estético. Esse tipo de experiência ocorre quando você faz parte de um todo, mas pouco o modifica, como, por exemplo, a visita a um museu ou algum passeio turístico. A importância de se conhecer esses autores e essas dimensões se dá na medida em que se precisa desenvolver ou criar um posicionamento para a criação da sua experiência, além de também facilitar no momento de avaliá-las. Nas próximas seções serão feitas Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 29 análises de casos que poderão ser encaixados dentro dessas dimensões apresentadas e ao final desse trabalho serão analisados como as organizações poderiam usar esses conhecimentos para garantir e melhorar os processos de suas empresas e serviços. 3. METODOLOGIA A proposta deste trabalho foi realizar um levantamento literário com diferentes abordagens do conceito de experiência em serviço com o objetivo de trazer à luz a discussão de temas sobre os tipos de abordagem, a relevância desse conceito para a sociedade atual e como as empresas vêm utilizando desse artifício para ter sucesso ou destaque no mercado. Como metodologia, esta é uma pesquisa qualitativa de caráter descritivo, que utilizará análises de casos reais de empresas relevantes para cada tipo diferente de abordagem da experiência em serviços (fenomenológica, baseada em processos e baseada em resultados). Nas próximas seções serão apresentados os casos da Disney e do “River Magic” para representar a visão fenomenológica; o caso de teleatendimento de duas instituições financeiras britânicas para a experiência baseada em processos e o caso de um setor, novo e importante para a economia, de Varejo Online para abordar a visão da experiência baseada em resultados. 4. EXEMPLOS 4.1 Os casos Disney e River Magic e a experiência fenomenológica A Walt Disney Company foi fundada em 1923 pelos irmãos Walt Disney e Roy Disney. O que era para ser apenas um estúdio de animação acabou se tornando uma das maiores e mais conhecidas marcas mundiais, presentes em negócios como redes de televisão, cruzeiros, hotéis, produtoras de filmes e dona dos mais famosos parques temáticos do planeta. Uma das frases mais famosas de Walt Disney é “se você pode sonhar, você pode fazer” e ele fez, transformou seus sonhos nas realidades mais prazerosas de pessoas mundo afora. Foi a partir de 1928, com a criação de um dos personagens mais emblemáticos já inventados de nome original Mortimer Mouse, mais conhecido como Mickey Mouse, que o império Disney passou a ser conhecido como a marca símbolo dos Estados Unidos (JUNIOR, H., 2011). Esse reconhecimento pode ser traduzido em números, pois o faturamento da Walt Disney Company em 2012 foi Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 30 de U$40,8 bilhões de dólares (Burbank, 2012), a segunda maior empresa de mídia do planeta. O motivo de todo esse gigantismo? A magia da experiência Disney. Os locais nos quais os clientes podem ter contato direto e participação ativa com a empresa, ou seja, no reino escapista da experiência (PINE II e GILMORE, 1998) são os parques temáticos e os mais novos cruzeiros Disney. Com o objetivo de avaliar a experiência em serviços da companhia Disney, foi colocado o foco no mais novo empreendimento de participação do grupo, a linha de cruzeiros Disney Cruise Line. Criada em 1998, atualmente o grupo opera com quatro navios: Disney Wonder, Disney Magic, Disney Dream e, o mais recente, Disney Fantasy. A linha de cruzeiros da Disney foi a pioneira na indústria a desenvolver o posicionamento de cruzeiros para famílias, esperando acomodar principalmente pais e filhos. Diferentemente de outros navios, esses não possuem cassino e possui todos os seus navios com decoração temática de personagens da Disney (vide imagens no Anexo B). Contudo, o principal diferencial não é a sua decoração, mas a experiência proporcionada pela companhia para seus passageiros. Relatos sobre clientes que utilizaram o serviço giram sempre em torno do emocional, do encantamento presente na experiência e na surpresa que obtiveram ao encontrar o mesmo clima Disney que a maioria encontrou nos parques. Isso pode ser demonstrado num depoimento de uma ex-cliente em seu blog Viajando com os pimpolhos (2012): “Confesso que até então, não éramos fãs de cruzeiros, mas os cruzeiros Disney acabaram de entrar na nossa listinha de desejos!” Este é apenas um dos milhares de comentários fervorosos que giram em torno desse ambiente de entretenimento e lazer, dos quais a experiência do cliente conta muito para o sucesso do programa. Todo o hedonismo, a experiência total do consumidor e o fator encantamento citados na abordagem fenomenológica da experiência estão presentes na ideia de prestação de serviços dessa empresa. Outro exemplo de atividade e experiência que podem ser citados como parte da abordagem fenomenológica da experiência em serviços é o caso abordado pelos autores Arnould e Price (1993) em seu artigo “River Magic: extraordinary experience and the extended service encounter”. Este artigo é baseado na análise de diversas experiências sob o olhar da atividade comercial de rafting1 em rios do Colorado, nos Estados Unidos. 1 Rafting é a prática de descida em corredeiras em equipe utilizando botes infláveis e equipamentos de segurança. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 31 A experiência que envolve a prática de rafting é considerada pelos seus praticantes como “extraordinária”, “transformativa”. O rafting pode ser considerado uma atividade recreativa e esportiva, mas há um algo mais na sua experiência por necessitar de rituais intensos e de muita integração. Os autores do artigo (ARNOULD e PRICE, 1993) colocaram em questão o poder da “magia” nessa experiência, retratando-o como “capaz de unir objetos distantes”. A magia nesse caso é encontrada na união e na integração hedônica entre participantes, guias e a natureza. O artigo em questão sobre o River Magic fez uma pesquisa qualitativa e quantitativa com participantes desta atividade para entender o que transformava aquela atividade numa experiência marcante e transformadora. Seus resultados mostraram que o mais interessante de analisar esse tipo de experiência, caracterizada como “extraordinária”, era a dificuldade das pessoas em relatarem o porquê de ter sido tão prazerosa e significativa. Isso nos leva de volta aos adjetivos da experiência de subjetivo e individual. A conclusão tirada pelos autores desse fenômeno é o fato de ser mais importante analisar significados não articulados ou de difícil expressão (o “inexplicável”) do que os atributos de expectativas mais bem explicadas como, por exemplo, o desejo de ter piscina aquecida no cruzeiro da Disney ou qualquer outro atributo utilitário. Em suma, a conclusão possível de se chegar ao analisar casos pela ótica fenomenológica está associada à lógica do serviço como dominante e do hedonismo presente nos exemplos. Os casos da Disney e do “river magic” mostraram que os participantes dos eventos foram cocriadores de valor, seja de forma individual ou em grupo, ao se engajarem e se integrarem com o ambiente e a atividade proporcionada. O foco dessa análise fenomenológica foi nas experiências do indivíduo e suas sensações post-act retratadas. 4.2 O caso Teleatendimento e a experiência baseada em processo A análise da experiência baseada no estudo dos processos envolvidos na prestação de serviços tem ganhado cada vez mais importância, uma vez que grande parte da riqueza gerada pelas nações ao redor do mundo é cada vez mais decorrente da prestação de serviços. Apesar dessa crescente importância alguns estudos apontam para um grau de satisfação por parte dos clientes cada vez menor (FORNELL, 2008). Ao mesmo tempo, há uma pressão cada vez mais pesada sobre o controle de custos das operações de serviço, o uso de análises e ferramentas baseadas na visão tayloriana de administração tem levado a impactos negativos Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 32 sobre a moral e motivação das pessoas envolvidas nesse tipo de atividade, retroalimentando um ciclo vicioso de qualidade deteriorada e custos em elevação (ELLIS e TAYLOR, 2006). Rich e Piercy (2006) analisam se os métodos de LEAN Management podem ser aplicados de maneira bem sucedida num ambiente de serviço puro, isso é, onde não há a troca de bens físicos. A distinção entre serviços puros e um pacote de serviços produto é justificada pelos autores pelo fato que a ausência de qualquer tipo de bem físico implica em substanciais diferenças no modo de operação de uma organização. Os autores fazem uma pesquisa com dois centros de teleatendimento de instituições financeiras para observar os efeitos que a utilização do método LEAN pode ter sobre a eficiência na prestação de serviços, englobando tanto questões de custo quanto de qualidade de atendimento. Baseados no trabalho de Womack et al. (1990) sobre o método Toyota de produção de bens físicos, os autores apresentam os princípios básicos que norteiam a metodologia de análise LEAN: 1. Valor. Determinar quais são os aspectos valorados pelo cliente final e quanto este está disposto a desembolsar, seja em termos monetários ou na coprodução de valor, para ter acesso a esse valor 2. Cadeia de Valor. Mapeamento do processo de agregação de valor, detalhando todos os entes envolvidos e como é feita a entrega de valor para o próximo elo da cadeia de produção. Esta ferramenta é essencial para a análise de falhas e capacidade ociosa 3. Fluxo. Garantir que produtos e informações possam fluir sem empecilhos ao longo da cadeia de geração de valor. Há também a preocupação de eliminar estoques intermediários por meio do design modular das unidades de produção, produção celular (minifábricas) e ferramentas e recursos humanos que possam ser alocados de maneira dinâmica ao longo da cadeia de produção 4. Produção Puxada. A intenção é de apenas entregar aquilo que é requisitado pelo cliente final, eliminando ao máximo a existência de estoques 5. Perfeição. Buscar continuamente a melhoria da cadeia de produção de valor eliminando excessos e falhas. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 33 Esse tipo de análise de uma cadeia de produção e valor para o cliente final está alinhado com a análise apresentada por Helkkula (2011) que define a caracterização da experiência baseada em processo como uma análise de diferentes etapas na criação e cocriação de valor. Estas, uma vez sequenciadas e mapeadas podem servir como base de aprimoramentos, a fim de melhorar a qualidade dos serviços prestados, diminuir a variação entre clientes e possibilitar a eliminação de ineficiências ao longo de toda a cadeia de produção de valor. O estudo de caso de Rich e Piercy (2006) apontou para a existência de significativas falhas no desenho do serviço de teleatendimento das instituições financeiras estudadas. Como, por exemplo, pode ser citado o sistema automático de roteamento das ligações para os determinados departamentos responsáveis pela prestação de um serviço. Por falta de informações e falta de capacidade dos clientes, estes muitas vezes selecionavam a opção incorreta durante essa fase, levando ao desperdício de tempo de atendimento, uma vez que depois de identificada a real demanda por parte do atendente, o cliente era redirecionado a outro atendimento ou reinserido no sistema automático de atendimento para informar novamente a opção pretendida. Esse tipo de falha, identificado nas duas instituições, levava a um tempo de espera maior para os clientes, impactando negativamente a qualidade percebida do serviço e levando a custos elevados para as instituições. A utilização do processo LEAN levou as companhias a redesenhar os departamentos de teleatendimento, a fim de atender melhor os seus clientes. Para tanto foi identificado o fator crucial valorizado pelos clientes das empresas, nesse caso o foco era no atendimento e resolução do problema já no primeiro posto de atendimento. Para conseguir entregar valor dessa maneira as instituições acabaram com os diferentes departamentos responsáveis por cada tipo de problema e criaram uma força de trabalho única, multidisciplinar que seria capaz de resolver a grande maioria dos problemas sem a necessidade de transferir a ligação a outro atendente. Junto com essa mudança houve a alteração dos índices de desempenho cobrados da área de atendimento. Medidas mais operacionais e de pouca relevância foram trocados por informações que representam com mais fidelidade a geração de valor para o cliente final, como, por exemplo, o tempo total entre a primeira apresentação do problema e a resolução completa do mesmo. Rich e Piercy (2006) concluem que a utilização de métodos LEAN na geração de valor em serviços puros pode ter impactos positivos significativos sobre custos, qualidade e moral das pessoas envolvidas. Segundo os autores o mapeamento permite criar uma organização que busque a melhoria contínua, eliminando pontos Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 34 de gargalo e ociosidades que contribuem para o custo elevado das operações. Além disso, a introdução de uma força de trabalho multidisciplinar, com maior autonomia para resolução de problemas, levou a um ambiente de trabalho mais agradável para todos os envolvidos na geração e valor. 4.3 O caso Varejo Online e a experiência baseada em resultados O setor de varejo online está ganhando em popularidade a cada ano que passa e a sua onda de crescimento aparenta estar longe da exaustão. Segundo dados da revista Forbes2, o Brasil conta atualmente com 78 milhões de usuários que usam regularmente a rede mundial de computadores para acessar sites. Destes, 32 milhões (ou 41% dos usuários) valeram-se pelo menos uma vez da internet para fazer uma compra de um produto ou serviço. Por fim, estimativas apontam para um faturamento recorde no setor, saltando aproximadamente 25% na comparação ano a ano de 2011 para 2012, para 12,7 bilhões de dólares. Apesar dos números animadores é necessário manter em mente que o comportamento de consumo online difere consistentemente do comportamento de consumo no varejo físico. Para investigar essas diferenças e apontar falhas na prestação dos serviços, alguns estudos concentraram-se na análise de casos internacionais e nacionais que apontam os fatores e atributos que influenciam o resultado no comportamento de compra dos consumidores online. Doolin et al. (2005) fazem um levantamento junto a aproximadamente 700 consumidores Neo-zelandeses quanto ao seu comportamento de consumo online. O estudo baseia-se em pesquisas anteriores que focam principalmente nas questões relativas a segurança financeira e de informações pessoais, da perda de contato pessoal entre cliente e vendedor, e em questões de hábito de uso da internet e demográficas dos usuários. Os resultados da pesquisa, aplicada pelos autores, mostraram três aspectos interessantes que podem ser úteis para os gestores desse tipo de canal de venda. Primeiro, a conveniência oferecida pelo canal de vendas virtual, especificamente a grande variedade que pode ser oferecida, não é necessariamente um fator que tem impacto positivo sobre o consumo online de produtos e serviços. Por outro lado, o risco percebido pelos clientes e a perda do contato pessoal entre cliente e vendedor mostrou forte correlação negativa com o padrão de 2 Site da Forbes: http://www.forbes.com/sites/ricardogeromel/2012/03/23/brazils-e-commerce-isbooming-record-breaking-figures-in-2011-growth-of-26-earnings-of-11-bi Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 35 consumo online dos clientes. Segundo Solomon (1998), o risco percebido é a crença de que haverá consequências negativas posteriores à compra de um produto ou serviço. A pesquisa de Dollin et al. (2005) aponta que o risco percebido pelos consumidores quanto a transações online tem impacto negativo considerável sobre o seu comportamento de compra atual e futuro. Ademais, a perda de contato pessoal é apontada como outro fator que afeta de maneira negativa o comportamento dos consumidores. Farias e Kovacs (2004) analisam o comportamento do consumidor de produtos e serviços adquiridos através da rede mundial de computadores no cenário brasileiro. Os autores analisam um survey aplicado a 200 internautas, sendo estes divididos entre aqueles que já realizaram uma compra online no passado (89 respondentes) e aqueles que nunca efetivaram tal tipo de transação (111 respondentes). O resultado da pesquisa mostra que os dois grupos são afetados por atributos semelhantes aqueles evidenciados na pesquisa de Doolin et al. (2005). A perda de contato pessoal e questões relativas à segurança de informações financeiras e pessoais são apontadas como os principais fatores que influenciam o comportamento dos clientes. Farias e Kovacs (2004) apontam ainda que as dimensões de incerteza são distintas entre o grupo que já realizou uma compra no passado e aquele que nunca o fez, porém, a influência negativa sobre compras futuras é a mesma nos dois casos, inibindo o consumo mais regular desse tipo de canal de vendas. Ambas as pesquisas apontam para uma necessidade de investir em maneiras que tornem o canal de vendas baseado na internet mais amigável e confiante para o cliente final. Os esforços devem, segundo os autores de ambas as pesquisas, focar numa política de investimentos em segurança, atrelados a comunicação desses mecanismos para que o cliente tenha uma percepção de maior segurança na sua compra. Ademais, Doolin et al. (2005) ressaltam a importância de investir em tecnologias de comunicação digital que aproximem o consumidor final da loja, mitigando o efeito de perda de contato pessoal que é inerente a esse tipo de canal de vendas. 5. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES O presente trabalho teve como objetivo apresentar diferentes maneiras de como a experiência durante o consumo de serviços vem sendo abordada nos Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 36 estudos acadêmicos sobre o assunto assim como exemplificar algumas das aplicações que as mesmas estão tendo nas práticas gerencias modernas. Foram apresentadas a abordagem fenomenológica, baseada na análise predominante das emoções e sentimentos do individuo, a abordagem de processos, que busca mapear a cadeia de criação e captura de valor durante a execução de uma serviço, e por fim a abordagem focada em resultados, que busca correlacionar atributos e características da prestação de serviços com comportamentos específicos de um agregado de consumidores durante ou após a execução do serviço. Segundo Porter (1996), vantagens competitivas podem advir de vantagens de custo e de vantagens de diferenciação dos produtos e serviços. Porém, o autor adverte para o fato de que, num mercado competitivo, a adoção de melhores práticas já não é mais suficiente para se proteger de concorrentes, que rapidamente adotam as mesmas práticas. No âmbito da prestação de serviços puros as vantagens dependem cada vez mais da capacidade dos gestores de gerenciar a sua força de trabalho (com treinamentos e programas motivacionais) e de gerar uma percepção de qualidade por parte dos clientes. Nesse sentido, as organizações precisam tornar-se ambientes de aprendizado constante, garantindo uma geração de valor maior para o cliente e uma captura maior de valor para as próprias organizações. No cenário de economias cada vez mais baseadas na prestação de serviços torna-se, portanto, de vital importância o domínio de técnicas de análise e design de serviços que permitam sustentar vantagens competitivas em relação aos concorrentes que atuam no mercado. As técnicas e casos apresentados neste trabalho servem como exemplo de como podem ser analisados e criados serviços que almejem esse tipo de vantagem competitiva. Cabe ressaltar que nenhuma delas exclui o uso de outra. Muito mais que isso, elas são ferramentas que devem ser vistas como complementares, sendo que cada uma tem vantagens e desvantagens em ralação à próxima. O uso deve, portanto, sempre ser avaliado de antemão e os objetivos bem delimitados para que o resultado tenha impacto positivo sobre as operações de uma determinada empresa. Por fim, cabe ressaltar que a nova lógica baseada na dominância de serviços, ante a até então dominante abordagem baseada em produtos, deve colocar o cliente final como base fundamental para a elaboração de pacotes de serviço e produto (LUSCH e VARGO, 2006). Ou seja, o centro da criação de valor é o cliente final, não mais a organização que detêm determinados recursos Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 37 produtivos. Esse novo paradigma deve ser a base para qualquer operação de serviços que vise propiciar uma experiência de alto nível para os seus clientes. 6. REFERÊNCIAS ARNOULD, E.; PRICE, L. River magic: Extraordinary experience and the extended service encounter. Journal of Consumer Research, v. 20, p. 24-45, June 1993. BEL, J. L. Le. Beyond the friendly skies: An integrative framework for managing the air travel experience. Managing Service Quality, v. 15, n. 5, p. 437-51, 2005. CARÚ, A.; COVA, B. Revisiting consumption experience: A more humble but complete view of the concept. Marketing Theory, v. 3, n. 2, p. 267-286, June 2003. DOOLIN, B. et al. Perceived risk, the internet shopping experience and online purchasing behavior: A New Zealand perspective. Journal of Global Information Management, v. 13, n. 2, p. 66-88, 2005. EDVARDSSON, B.; GUSTAFSSON, A.; ROOS, I. Service portraits in service research: A critical review. International Journal of Service Industry Management, Bradford, v. 16, n. 1, p. 107-121, 2005. ELLIS, V.; TAYLOR, P. You don’t know what you’ve got till it’s gone: Recontextualising the origins, development and impact of the call centre. 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Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 40 ANEXOS A) Tabela 1 – Premissas fundamentais da lógica do serviço dominante (SD logic) B) Imagens do navio “Fantasy” da Disney Foto 1 – Corredor do navio baseado no filme “Procurando Nemo” Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 41 Foto 2 – Tobogã com tema do Pato Donald’s Foto 3 – Pista de dança baseada no filme “Piratas do Caribe” Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 42 ABSTRACT The service sector represents a growing share of the modern economy and at the same time represents a challenge for improvement and innovations since services are by nature intangible, heterogenic, perishable and produced and consumed simultaneously. The present paper aims to aboard service experience by providing an overview of the three main methodologies used to study and analyze customers service experience. Phenomenological, process based and result based analysis methods are presented, followed by concrete cases to exemplify their uses. By this the present paper provides assistance to services managers of how to enhance their customers’ service experience. Keywords: service experience, service design, service-dominant logic, service marketing, service quality Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 43 Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 21-43 2013 44 DESENVOLVIMENTO DE NOVOS SERVIÇOS: A PARTICIPAÇÃO DO CLIENTE Glauce Nascimento Joana Sacramento Marcelo Franca RESUMO Vargo e Lusch (2004) apontam uma nova lógica dominante para o marketing, focada em recursos intangíveis, na criação de valor e na relação, sendo o fornecimento de serviços, em vez de bens, fundamental para a realização das transações econômicas. Diante desse fenômeno, os autores defendem que o valor passa a ser definido pelos consumidores e cocriado por eles. Dessa forma, é necessário que as empresas colaborem e aprendam com seus clientes, adaptando-se para atender suas necessidades. Uma das formas de adaptação encontradas pelas empresas foi a cocriação, pela qual a empresa conta com a colaboração dos clientes com o propósito de inovação (LUSCH et al., 2007). Este conceito de cocriação não deve ser confundido com o de customização, no qual, segundo Kristensson, Matthing e Johansson (2008), há um menor envolvimento do consumidor, restrito às fases finais. Assim, além de a empresa equipar seus clientes com as ferramentas adequadas para que eles sejam capazes de participar dos processos de inovação da organização, ela também precisa ajustar seus modelos de negócio para a nova forma de interação com o mercado. Em suma, empresas que competem em campos diferenciados pela inovação podem encontrar melhores resultados se conseguirem aproximar o cliente de seu processo de desenvolvimento de produto ou serviço; devem estar, porém, preparadas cultural e organizacionalmente para essa nova abordagem. Considerando essa mudança de perspectiva na lógica dominante das transações econômicas, o presente trabalho apresenta em sua revisão da literatura os conceitos de cocriação, de lógica dominante em serviço e de orientação para o mercado, além da nova forma de geração de valor para os consumidores. Em seguida, são apresentadas algumas estratégias-chave identificadas por Kristensson, Matthing e Johansson (2008) para o envolvimento bemsucedido do consumidor como forma de cocriação de valor. Por fim, são expostas algumas iniciativas de empresas que já adotam o conceito de cocriação junto aos seus clientes e as implicações da adoção desse conceito para a prática gerencial no contexto brasileiro. Palavras-chave: cocriação, lógica dominante de serviço, inovação, participação do cliente. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 45 1. INTRODUÇÃO O ambiente de negócios global tem demonstrado níveis crescentes de competição e, em meio a essa acirrada disputa, muitas empresas têm procurado se diferenciar das concorrentes por meio da inovação contínua, como forma de gerar sempre uma oferta com valor único para seus clientes. Nesse ambiente competitivo, em que também figura uma espécie de tendência à comoditização dos produtos em diversos setores, os serviços agregados têm se revelado cada vez mais importantes para a mencionada busca por diferenciação. Uma das fortes correntes no âmbito desse processo de desenvolvimento de novos produtos e serviços consiste no envolvimento do consumidor, isto é, na ampliação da participação do cliente, que deixa de ser mero objeto de pesquisas quanto às preferências ou níveis de satisfação com relação a uma dada proposta, para despontar como copartícipe desde os estágios iniciais do processo de inovação. A expectativa associada a tal tendência cocriadora é a de que o envolvimento dos clientes favoreça um melhor ajuste entre oferta e demanda, entre os novos produtos e serviços propostos pelas empresas e as necessidades e desejos efetivos dos clientes. Tendo em vista a relevância e a atualidade das questões referentes à participação do cliente no desenvolvimento de novos serviços, a proposta do presente estudo é discutir os principais aspectos das estratégias bem sucedidas de cocriação à luz da teoria desenvolvida sobre o assunto e as possibilidades para a gestão empresarial no Brasil. Dessa forma, o trabalho está organizado da seguinte maneira: inicialmente é feita uma revisão da literatura sobre o tema, com destaque para alguns aspectos relativos ao chamado processo de cocriação: a lógica dominante de serviços, a geração de valor e a orientação ao mercado. A seguir serão apresentados os fatores de sucesso na inovação em serviços, bem como algumas estratégias-chave para o bemsucedido envolvimento do cliente nesse processo. Em seguida, procura -se ilustrar alguns casos reais de empresas que têm procurado fazer desse envolvimento um diferencial na geração de serviços inovadores e estimular o pensamento sobre algumas possíveis implicações para a prática gerencial no Brasil. A finalização do presente texto é feita através de uma conclusão e da listagem de todas as referências utilizadas ao longo do mesmo. 2. REVISÃO DE LITERATURA 2.1 Cocriação Lusch et al. (2007) referem-se à cocriação como a colaboração dos clientes com propósitos de inovação, sendo também a premissa fundamental da lógica dominante de serviços, a ser discutida no próximo item. Essa ação cocriadora tem como um de seus principais objetivos evitar a ocorrência de falhas ou problemas de mercado, a partir do Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 46 momento em que há o envolvimento do consumidor na criação e no desenvolvimento de produtos e/ou serviços, através da sugestão de ideias (KRISTENSSON, MATTHING e JOHANSSON, 2008). Sawhney, Verona e Prandelli (2005) afirmam que a colaboração é importante para a criação e a sustentabilidade de vantagens competitivas. Contribui para tanto o fato de a criação de valor se dar por produtos inovadores. Segundo Kristensson et al. (2004) envolver o consumidor nos estágios iniciais de desenvolvimento do novo produto e/ou serviço (new product development – NPD) tem o condão de proporcionar a geração de ideias mais criativas e de maior facilidade de implementação. De fato, o conceito ultrapassa a visão do consumidor com uma postura passiva; pelo contrário, o cliente é inserido no processo de inovação de forma plenamente ativa. De acordo com Lusch et al. (2007), apesar de o conceito da atuação do consumidor como colaborador ser tanto uma premissa fundamental da lógica dominante de serviços quanto um foco recorrente na literatura contemporânea de marketing, muitas vezes não é reconhecida a existência de dois componentes de colaboração. Segundo os autores, o mais abrangente desses componentes é a cocriação de valor, pela qual o valor só pode ser determinado pelo usuário durante o processo de consumo do serviço. Sendo assim, a ideia de cocriação de valor está intimamente ligada ao "valor-em-uso" e é inerentemente relacional. Já a produção, segundo componente de colaboração, envolve a participação de consumidores ou outros parceiros da rede de valor na criação do produto ou serviço que é oferecido propriamente dito. Dessa forma, a coprodução pode ocorrer através do compartilhamento de uma invenção, do codesign ou da partilha da produção. Cabe definir corretamente, segundo alguns autores, o conceito de customização, para que não haja qualquer dúvida em relação ao de cocriação. Segundo Kristensson, Matthing e Johansson (2008), o envolvimento do consumidor na customização é bem menor, tendo uma postura menos ativa, se comparado ao processo de cocriação. Eles, os clientes, têm sua interação restrita às fases finais do processo produtivo ou de inovação, sugerindo mudanças incrementais a um protótipo praticamente acabado. Obviamente, o conceito é fortalecido pela mudança de postura dos próprios consumidores, a partir do momento em que se tornaram conectados e informados. Historicamente, isso exigiu uma alteração na visão das empresas, com a troca do ponto focal apenas em seus produtos e em si mesmas com suas ofertas (product, service or company centric), para as relações empresa-cliente e suas respectivas experiências. Ratificando as afirmações acima, há o surgimento de um consumidor ativo. (PRAHALAD e RAMASWAMY, 2004). Para Ballantyne e Varey (2008) cocriação é uma forma distinta de colaboração quando comparada à coprodução. Ainda segundo os autores, a cocriação pode ser iniciada a partir de idéias espontâneas que surgem com simples conversas e resulta na Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 47 geração de um valor único. Por outro lado, a coprodução, na visão de Ballantyne e Varey (2008), envolve o conhecimento dos recursos e das capacidades necessárias para a produção. Os autores Prahalad e Ramaswamy (2004), elencam listas de características inerentes ao conceito de cocriação e de aspectos que não lhe dizem respeito. No primeiro grupo se encontram: a variedade de experiência; o diálogo contínuo; a articulação da definição do problema e a sua solução; e a criação de um ambiente de experiências pela empresa, onde o cliente possa ter um diálogo ativo e possa coconstruir experiências personalizadas. No segundo grupo, dos aspectos que não representam o conceito de cocriação, encontram-se: a variedade de produtos; as pesquisas de marketing; a customização de massa; a oferta de itens que atendam a cadeia de suprimentos da indústria; e a transferência de atividades aos clientes, tal como os self-services. Além das características acima, os autores Prahalad e Ramaswamy (2004) também citam outro ponto bastante interessante, que é a dependência da qualidade da experiência em relação ao envolvimento entre as partes durante o processo de cocriação. Por isso, ao longo de seu artigo, apesar de a variedade de experiências ser uma característica desse tipo de processo, a variedade única, de cada indivíduo, será determinante para a qualidade do serviço final. Prosseguindo com as ideias expostas por Prahalad e Ramaswamy (2003, apud Prahalad e Ramaswamy 2004), eles sugerem, de forma bastante interessante, a expressão "company's a la carte menu". Ou seja, a cocriação vai além do que a empresa oferece, há uma interação única de cada cliente. Sawhney, Verona e Prandelli (2005) citam a vantagem da utilização da internet ao processo cocriativo. A rede mundial de computadores é capaz de possibilitar interações em tempo real, mais frequentes e com diversos níveis de envolvimento. No entanto, como ponto negativo, devido à falta de interação física, poderá haver uma perda da profundidade da informação. Apesar disso, a internet não "força" a participação dos consumidores, de modo que há a auto-seleção destes, com conversas espontâneas. Cabe informar que os autores citados neste tópico, como Prahalad e Ramaswamy (2004), Sawhney, Verona e Prandelli (2005) e Kristensson, Matthing e Johansson (2008), tecem críticas às tradicionais ferramentas de marketing como pesquisas de mercado, surveys e focus groups. Sawhney, Verona e Prandelli (2005), por exemplo, afirmam que tais ferramentas são limitadas, em termos da frequência com que as empresas podem interagir com os clientes, e criticam o tempo demandado para tal. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 48 2.2 Lógica dominante de serviços Segundo Vargo e Lusch (2004), os fundamentos do marketing herdaram da economia um modelo de troca que é baseado no intercâmbio de bens. Nesse caso, a lógica dominante é centrada nos recursos tangíveis, no valor embutido e na transação. Contudo, com os anos, foi identificada uma nova lógica, focada em recursos intangíveis, na criação de valor e na relação. Sendo assim, os autores acreditam que essa nova perspectiva identificada converge para a criação de uma nova lógica dominante para o marketing, na qual o fornecimento de serviços, em vez de bens, é fundamental para a realização das transações econômicas. A definição de serviço proposta por Vargo e Lusch (2004) consiste na aplicação de competências específicas, como conhecimento e habilidades, em ações, processos ou performances, para o benefício da própria entidade ou de outras. Ballantyne e Varey (2008) resumem o ponto de vista de Vargo e Lusch (2004), citando que serviço é o processo interativo e valioso de se "fazer alguma coisa para alguém". Ainda segundo Vargo e Lusch (2004), a visão centrada no serviço tem como funções: identificar ou desenvolver competências-chave que representem vantagens competitivas; identificar outras entidades – clientes potenciais – que podem se beneficiar dessas competências; cultivar relações que envolvam os clientes na criação de propostas customizadas e com valor competitivo, para atender as necessidades dos mesmos; e analisar os feedbacks de mercado para aprimorar as ofertas da empresa e melhorar o seu desempenho. Para os autores, a lógica centrada no serviço implica que o valor é definido pelo consumidor e cocriado com ele. Sendo assim, as empresas vivem em um ciclo contínuo de geração e testes de hipóteses. Trabalhar de acordo com essa nova lógica implica mais do que a empresa ser orientada para o consumidor: é necessário colaborar e aprender com os clientes e se adaptar para atender suas necessidades individuais e dinâmicas. Segundo Heackel (1999, apud Vargo e Lusch, 2004) observou, empresas bem-sucedidas mudaram as suas práticas baseadas em uma estratégia de "fazer e vender" para uma estratégia de "compreender e responder". Vargo e Lusch (2004), ao proporem a mudança do marketing para uma nova lógica dominante, estipularam oito premissas básicas que ajudam a apresentar a lógica centrada no serviço. Essas premissas foram revistas de acordo com as críticas feitas à primeira publicação dos autores, que foi amplamente discutida por outros teóricos, chegando-se a dez premissas finais (VARGO e LUSCH, 2008). São elas: Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 49 1. 2. 3. O serviço é a base fundamental de troca As trocas indiretas mascaram a base fundamental de troca Os bens são mecanismos de distribuição para fornecimento de serviços 4. 5. 6. Os recursos operantes são a fonte fundamental de vantagem competitiva Todas as economias são economias de serviço O cliente sempre é um cocriador de valor 7. 8. 9. A empresa não pode entregar valor, mas pode fazer propostas de valor A visão centrada no serviço é relacional e orientada para o cliente Todos os atores sociais e econômicos são integradores de recursos 10. Os valores são sempre únicos e fenomenologicamente determinados pelo beneficiário. Provavelmente, a implicação fundamental da lógica dominante centrada em serviços é a mudança geral na perspectiva. Ou seja, uma visão centrada nos bens implica que a qualidade dos bens produzidos, a separação das etapas de produção e consumo, a padronização e a não perecibilidade do bem são qualidades normativas. Porém, na visão centrada no serviço, essas características, segundo Vargo e Lusch (2004), não são válidas nem desejadas. Já para Ballantyne e Varey (2008), o ponto que merece destaque na lógica observada por Vargo e Lusch (2004) é a constatação de que os consumidores avaliam o valor daquilo que eles consomem durante o uso e o valor percebido é sempre provisório, podendo mudar de acordo com as experiências posteriores. Sendo assim, quando o marketing passa a trabalhar com a perspectiva de valor em uso, os consumidores são revelados como produtores e consumidores que determinam o que é valor. Para o estudo apresentado neste documento, as premissas que foram identificadas como sendo as mais relevantes foram as de número 3, 6, 7 e 8. Sendo assim, essas premissas serão explicadas melhor. Premissa 3: Os bens são mecanismos de distribuição para fornecimento de serviços. Segundo Vargo e Lusch (2004), bens não são o denominador comum da troca. Os autores identificam esse denominador comum como a aplicação de conhecimento especializado, habilidades mentais e, em menor grau, habilidades físicas. Sendo assim, conhecimento e habilidades podem ser transferidos diretamente, através de educação e treinamento, ou indiretamente, sendo incorporadas em um objeto. De forma geral, bens duráveis ou não-duráveis entregam o seu valor através do uso, ou seja, do serviço que é proporcionado. Conforme a sociedade evoluiu, a utilização de bens com o intuito de alcançar benefícios superiores, como satisfação, auto-realização e estima, cresceu. Essa funcionalidade dos bens reforça a afirmação de que os objetos são mecanismos de distribuição de serviços ou provedores de satisfação para necessidades superiores. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 50 Premissa 6: O cliente sempre é um cocriador de valor. A perspectiva tradicional de troca, baseada na produção de bens, separa a produção do consumo com o intuito de atingir a máxima eficiência produtiva. Entretanto, na visão centrada no serviço, com foco na continuidade de processos, o consumidor está sempre envolvido na criação de valor. Mesmo quando se trata de bens tangíveis, a produção não termina com o processo de manufatura, sendo este apenas um processo intermediário. Para o serviço ser entregue através do bem, o cliente precisa aprender a usá-lo, mantê-lo, repará-lo e adaptá-lo de acordo com as suas necessidades individuais. De forma geral, durante o uso de um produto, o cliente continua os processos de marketing, consumo, criação de valor e entrega. Premissa 7: A empresa não pode entregar valor, mas pode fazer propostas de valor. Segundo Vargo e Lusch (2004), se os consumidores são o ponto focal do marketing, a criação de valor só é possível quando o bem ou serviço é consumido e, nesse momento, cabe a ele identificar o valor. Sendo assim, a empresa pode oferecer os seus recursos para a criação de valor, ou seja, fazer propostas de valor, mas não pode entregá-lo de forma independente. Premissa 8: A visão centrada no serviço é orientada para o cliente e relacional. De acordo com Vargo e Lusch (2008), na lógica dominante de bens, a empresa e o cliente são entidades devidamente separadas, sendo o primeiro gerador de valor e o segundo, destruidor. Porém, na perspectiva do domínio de serviço, a criação de valor é um processo interativo e, por isso, empresa e cliente devem ser considerados em um contexto relacional. Como nessa lógica o valor é sempre determinado pelo beneficiário do serviço, ela é intrinsecamente orientada para o cliente. 2.3 Geração de Valor De acordo com o conceito tradicional de criação de valor, onde os consumidores são mantidos do "lado de fora" da empresa, valor é criado dentro da firma através das suas atividades. Segundo Porter (1980, apud Prahalad e Ramaswamy, 2004), o conceito de cadeia de valor resume o papel unilateral da empresa na função de criar de valor. Prahalad e Ramaswamy (2004) ressaltam que a interação entre firma e consumidores não era reconhecida como uma fonte de geração de valor. Esse papel, segundo os autores, cabia ao processo de troca, ou seja, a empresa precisava persuadir o consumidor para realizar a compra e poder extrair o maior valor possível da transação. Sendo assim, as características de mercado e o conceito de criação de valor levavam a um fluxo de comunicação unilateral, direcionado da empresa para o mercado. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 51 Entretanto, durante as duas últimas décadas, as empresas começaram a buscar maneiras de envolver os clientes em seus processos, compartilhando com eles parte do trabalho feito pela firma. Os consumidores reconheciam algum benefício nesse envolvimento, mas, independentemente da variação do envolvimento dos clientes, a empresa comandava toda a experiência que seria proporcionada, ou seja, os clientes continuavam sendo tratados como agentes passivos que seriam conectados com as ofertas da empresa (PRAHALAD e RAMASWAMY, 2004). Na visão dos autores, a globalização, o outsourcing, a desregulamentação de mercados e as tecnologias convergentes tornam cada vez mais difíceis para a empresa diferenciar o seu produto ou serviço. Os mercados estão sendo comoditizados e, diante desse fenômeno, os consumidores passam a fazer as suas escolhas de compras de acordo com os preços. Para evitar esse cenário, as empresas precisam buscar diferenciar os seus produtos: "escute com cuidado o que os seus consumidores desejam e responda com novos produtos capazes de atender ou superar a esses desejos" (THOMKE e VON HIPPEL, 2002). Como observado por Thomke e Von Hippel (2002), esse mantra atualmente domina muitas empresas, porém entender completamente as necessidades dos consumidores é um processo custoso e impreciso. Segundo os autores, mesmo quando os consumidores sabem exatamente o que eles querem, dificilmente conseguem transferir essa informação para a área de produção da empresa com clareza e de forma completa. Como forma de contornar as falhas que podem ocorrer nesse processo de compreender o mercado, algumas companhias têm adotado ações alternativas para acompanhar as exigências de seus consumidores. Sendo assim, essas empresas basicamente abandonaram os seus esforços para entender exatamente o que os seus consumidores desejam e os equiparam com ferramentas para desenharem e desenvolverem os seus próprios produtos, podendo variar desde pequenas modificações até grandes inovações. As ferramentas utilizadas pelos clientes são frequentemente chamadas de "kit de ferramentas para inovação do usuário" e permitem que o desenvolvimento de novos produtos ocorra de forma mais rápida e menos cara. Segundo Prahalad e Ramaswamy (2004), a facilidade de conexão e o maior nível de informação e empowerment dos consumidores fazem com que eles desejem exercitar a sua influência em todas as partes do negócio. Equipados com novas ferramentas e insatisfeitos com as alternativas disponíveis no mercado, os clientes desejam interagir com as empresas e criar valor. Ao disponibilizar o kit de ferramentas para os clientes, a empresa modifica a fase do processo de desenvolvimento de novos produtos em que ocorre a interação entre fornecedor e cliente, bem como a fase de teste e ajuste, como pode ser observado na figura abaixo, o que torna todo o processo de criação mais rápido e eficaz (THOMKE e VON HIPPEL, 2002). Além disso, a empresa transfere para os consumidores o esforço e o risco do processo de inovação (THOMKE e VON HIPPEL, 2002, apud PRAHALAD e RAMASWAMY, 2004). Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 52 Figura 1: Formas de abordar o consumidor Fone: Thomke e Von Hippel (2002). Thomke e Von Hippel (2002) reconhecem que a inovação criada pelo cliente pode gerar significativo valor, porém, segundo os autores, capturar esse valor não é um processo simples. As empresas, além de desenvolverem o kit de ferramentas adequado, precisam ajustar os seus modelos de negócio para a nova forma de interação com o mercado. Terceirizar uma parte das atividades de inovação para os clientes geralmente é uma abordagem eficaz para acelerar o desenvolvimento de produtos que melhor atendem as reais necessidades dos consumidores. Além disso, essa abordagem é capaz de criar e transferir valor em três níveis distintos: para a indústria como um todo; para as empresas que desenvolvem e implementam as ferramentas de criação pelo usuário; e para os clientes que utilizam e se beneficiam do processo. Segundo Thomke e Von Hippel (2002) a grande questão que ainda está sem resposta é saber exatamente onde o valor será gerado e qual é a melhor forma de ser capturado. A proposta de criação de valor de Prahalad e Ramaswamy (2004) difere dessa apresentada por Thomke e Von Hippel (2002), na qual o consumidor é o inovador. De acordo com Prahalad e Ramaswamy (2004), as empresas devem buscar mudar a visão tradicional de mercado, centrada nelas próprias, e procurar cocriar valor com os clientes através da possibilidade de interações personalizadas entre a firma e o consumidor. Estes autores defendem que o processo de cocriação de experiência proposto inclui cada indivíduo poder escolher como deseja interagir com o ambiente experimental disponibilizado pela empresa. Prahalad e Ramaswamy (2004) destacam Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 53 que a interação de alta qualidade entre a empresa e seus consumidores, que permite ao segundo grupo cocriar experiências únicas com a firma, é a fonte para encontrar novas vantagens competitivas para a organização. Figura 2: Interação empresa-consumidor Fonte: Prahalad e Ramaswamy (2004). A perspectiva de Prahalad e Ramaswamy (2004) defende que a interação entre a empresa e os consumidores é a fonte de criação de valor. Sendo assim, todos os pontos de interação entre os envolvidos no processo de inovação são possíveis para a criação de valor, uma vez que a empresa não consegue prever que tipo de experiência o consumidor terá durante os estágios do processo. Além disso, aprofundam a questão de criação de valor, sugerindo o framework abaixo, reforçando que todas as interações entre empresa e cliente são críticas e oportunas à criação e extração de valor. Essas partes, em geral, são colaboradoras para a cocriação e competidoras para a extração econômica. 2.4 Orientação para o Mercado Podemos dizer que há duas conceituações principais de orientação para o mercado (market orientation). A primeira é concebida por Kohli e Jaworski (1990) e compreende a orientação para o mercado como implementação do conceito de marketing. Essa operacionalização diz respeito ao uso das informações de pesquisas de mercado, com ênfase nas atividades da empresa que lidam com informações relativas às necessidades dos consumidores e com o ambiente competitivo. Assim, segundo os autores, a orientação para o mercado consiste em um processo que envolve a geração Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 54 de inteligência de mercado por toda a organização, relativa às necessidades atuais e futuras dos consumidores, na disseminação dessa inteligência através de todos os departamentos e na capacidade de resposta da organização como um todo a essa inteligência gerada e disseminada. Dessa forma, Kohli e Jaworski (1990) fornecem uma útil distinção e interpretação do conceito de marketing a partir de uma perspectiva de processo comportamental (implementação). A segunda conceituação é feita por Slater e Narver (1990), para quem a orientação para o mercado consiste na cultura organizacional que mais eficaz e eficientemente gera os comportamentos necessários para a criação de valor superior para os consumidores e, assim, contínuo desempenho superior para os negócios. O entendimento destes autores, portanto, é de que a cultura organizacional funciona como um condutor de comportamentos, sendo que comportamentos orientados ao mercado não se manifestariam na organização na ausência de comprometimento cultural com a entrega de valor superior para os clientes. Dessa forma, a cultura é vista como um antecedente causal do comportamento orientado ao mercado. Trata-se de uma conceituação cujo ponto de vista é mais cultural e filosófico, com foco nos valores e crenças que a orientação para o mercado encoraja na organização: contínuo aprendizado multifuncional (cross-functional learning) sobre as necessidades expressas e latentes dos consumidores e sobre as capacidades e estratégias dos competidores; e ação coordenada multifuncional para criar e explorar o aprendizado (SLATER e NARVER, 2000). Não obstante as duas compreensões acima abarquem efeitos na rentabilidade das atividades empresariais, a orientação para o mercado também já foi objeto de associação positiva com o sucesso de novos produtos (GRINSTEIN, 2008). Nesse sentido, Narver, Slater e MacLachlan (2004) fazem uma interessante distinção entre formas reativa e proativa de orientação para o mercado, que têm diferentes impactos no envolvimento do cliente no processo de inovação, podendo influenciar o potencial de sucesso de novos produtos e serviços. A orientação para o mercado na forma rea tiva diz respeito à descoberta, à compreensão e ao atendimento das necessidades expressas dos consumidores pela organização. Já na forma proativa, a empresa vai fazer esse mesmo processo de descoberta, compreensão e atendimento, mas das necessidades latentes, ainda não formuladas pelos clientes. De acordo com Narver, Slater e MacLachlan (2004), a forma reativa tem recebido muito mais atenção tanto da parte de pesquisadores quanto da de gerentes, sendo geralmente de mais fácil implementação. Nela, a empresa necessita "somente" deter as habilidades de formular questionamentos inteligentes ou de conduzir cuidadosas observações do comportamento do consumidor, para a partir daí elaborar novos produtos ou serviços que tenham valor para o consumidor. A denominação reativa, portanto, está em plena sintonia ao papel da empresa de reagir, com novas ideias e soluções, às informações coletadas de um consumidor que desempenha um Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 55 papel basicamente passivo, seja respondendo perguntas ou permitindo que seja observado. Kristensson, Matthing e Johansson (2008) sugerem algumas estratégias-chave cujo gerenciamento se faz necessário para o alcance de um conhecimento valioso do cliente nessa forma reativa de orientação para o mercado: classificar diferentes respostas dos consumidores em diferentes segmentos de consumidores; preocupar-se com abordagens alternativas para diferentes tipos de clientes e com modos diversos de motivação para a sua participação; e solicitar aos consumidores que respondam às perguntas (em pesquisas em profundidade, por exemplo) revendo, em retrospectiva, situações que eles tenham vivenciado no passado. Embora ainda possa haver muitas organizações sem sequer uma orientação para o mercado na forma reativa, seja pela inabilidade de implementação do conceito de marketing (KOHLI e JAWORSKI, 1990), seja pela ausência de uma cultura fortemente comprometida com a geração de valor superior para o cliente (SLATER e NARVER, 1990), entende-se que o diferencial competitivo será alcançado por aquelas instituições que buscarem cada vez mais a pró-atividade como forma de orientação para o mercado. O grande desafio para os negócios, portanto, reside na identificação e no atendimento das necessidades latentes (KRISTENSSON, MATTHING e JOHANSSON, 2008). É na forma proativa que o cliente é inserido no processo de inovação, revestindo-se de um papel de parceiro colaborativo, que cocria valor juntamente com a organização. Segundo Kristensson, Matthing e Johansson (2008), a permanência dos consumidores colaborando com a empresa por certo período favorece o surgimento de oportunidades à medida que eles podem compartilhar suas experiências. Dessa forma, a cocriação de valor ocorreria em meio a um processo conjunto de descoberta de necessidades latentes com a organização. Uma das práticas sugeridas por estes autores para a cocriação de inovações via geração de conhecimento a respeito de necessidades latentes é o envolvimento do usuário (user involvement). Na próxima sessão, serão discutidos alguns fatores considerados críticos para o sucesso no desenvolvimento de novos produtos e serviços, bem como algumas estratégias tidas como fundamentais para um envolvimento bem-sucedido do usuário, mais especificamente. 3. FATORES DE SUCESSO E ESTRATÉGIAS-CHAVE Embora haja na literatura o reconhecimento da existência de alguns fatores de sucesso comuns tanto ao desenvolvimento de novos produtos quanto ao desenvolvimento de novos serviços, tais quais comprometimento gerencial, cultura organizacional que valorize a inovação, objetivos claros e reconhecidos por todos os colaboradores, sistematização de processos e recursos adequados (JOHNSON et al., Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 56 2000; NIJSSEN et al., 2006), também são encontradas características próprias e específicas para a organização e o bem-sucedido desenvolvimento de serviços, diferentes do tradicional desenvolvimento de produtos, como organização informal, maior desafio gerencial, desafios da intangibilidade e ênfase no contato com o consumidor e seu envolvimento. Com relação à organização informal, Nijssen et al. (2006) indicam que o desenvolvimento de novos serviços não costuma ser organizado tão formalmente e em separado, como o tradicional departamento de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de produtos. Segundo os autores, em muitos casos as inovações em serviço não são resultado de uma atividade completamente deliberada; elas surgem na prática do processo de entrega do serviço e, consequentemente, nem sempre é fácil detectar uma mudança ou melhoria como uma inovação. Além disso, a inovação em empresas de serviço tem sido descrita como um processo coletivo, no qual sistemas informais de comunicação e atitudes empreendedoras têm desempenhado um papel importante na produção de ideias, sendo a função formal do gerenciamento estratégico inspirar os colaboradores e assegurar que a implementação das ideias geradas esteja em sintonia com a estratégia. Como consequência, a coordenação dos ambientes de front-office e back-office no desenvolvimento de serviços trazem desafios adicionais em relação ao desenvolvimento de produtos (MENOR, TATIKONDA e SAMPSON, 2002). Cultura organizacional, competências e conflitos internos, assim como treinamento requerido têm efeitos mais profundos no sucesso de novos serviços que no tradicional desenvolvimento de produto (NIJSSEN et al., 2006). Quanto à característica de intangibilidade, própria dos serviços, os esforços de "tangibilização" durante o desenvolvimento se fazem ainda mais central, como forma de criar para todas as partes envolvidas uma visão compartilhada de objetivos (MENOR, TATIKONDA e SAMPSON, 2002). Por fim, devido à simultaneidade entre produção e consumo, o desenvolvimento do serviço não pode ser separado da sua entrega nem de todo o processo que o envolve. A interação entre a empresa fornecedora e o cliente é ainda mais pronunciada em inovações de serviço, sendo o pessoal de linha-de-frente uma importante fonte de ideias (NIJSSEN et al., 2006). E aqui ganha formato a questão da cocriação de valor. De acordo com Menor, Tatikonda e Sampson (2002), o envolvimento do consumidor no desenvolvimento pode ser mais útil em processos de inovação em serviços que em processos de inovação em produtos. A respeito desse envolvimento do usuário como forma de cocriação de valor, mais especificamente, Kristensson, Matthing e Johansson (2008), por meio de um estudo na área de serviços baseados em tecnologia, chegaram à conclusão de que o projeto de desenvolvimento de novos produtos e serviços deve levar em consideração as seguintes sete estratégias-chave (EC) para um envolvimento bem-sucedido: Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 57 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. Identificação das necessidades dos clientes a partir de uma situação de uso; Identificação das necessidades dos clientes a partir de seus diversos papéis sociais; Fornecimento de ferramentas analíticas aos clientes; Motivação dos clientes por meio de benefícios aparentes que sejam alcançados pelo envolvimento; Não-uso de brainstorming para geração de ideais; Expertise limitada em tecnologia por parte dos clientes; Envolvimento de um grupo heterogêneo de clientes para assegurar que haja diversidade de ideias para o fornecimento de serviços futuros. De acordo com os autores, vários estudos demonstraram que o envolvimento de usuários conduz a ideias inovadoras. Particularmente, o envolvimento de clientes é reportado como sendo útil para a captação das necessidades latentes dos consumidores, tão importantes para o bem-sucedido desenvolvimento de novos produtos e serviços e que, como mencionado anteriormente, estão inseridas na forma proativa de orientação para o mercado (NARVER, SLATER e MACLACHLAN, 2004). O envolvimento do usuário pode facilitar a identificação de necessidades latentes porque os clientes percebem suas próprias necessidades somente quando elas ocorrem (EC 1), isto é, o valor não é percebido até o bem ou serviço ser usado ( valuein-use). O envolvimento do usuário é bem-sucedido quando ele aprende fazendo, pois os insights que surgem de uma experiência são de difícil simulação apenas por pensamentos. Além disso, a segunda estratégia-chave sugere que os usuários devem adotar toda a gama de papéis que eles desempenham na vida, como gerente de projeto, chefe de família, praticante de esporte, etc. (EC 2). Isso afeta a forma com que percebem o futuro valor de um serviço e as empresas obtêm um leque maior de ideias originais e criadoras de valor para futuros serviços. Entretanto, segundo Kristensson, Matthing e Johansson (2008), nenhuma dessas estratégias irá funcionar se a empresa for adotante da forma reativa de orientação para o mercado, usando, por exemplo, grupos de foco (focus groups) de curta duração ou pesquisas de grande escala (surveys). É preciso alimentar o envolvimento do cliente por mais tempo e em maior profundidade. Também é importante assegurar que as contribuições dos usuários sejam geradas com suas próprias necessidades em mente (EC's 4 e 5), assim melhorand o a originalidade e o valor das ideias para futuros serviços. Usuários intrinsecamente motivados por um benefício pessoal aparente geram maiores possibilidades de sucesso à estratégia. E o brainstorming deve ser evitado porque pedidos explícitos de geração de novas ideias a pessoas comuns são menos eficientes do que a geração de novas ideias por profissionais. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 58 Outra estratégia-chave propõe que os participantes precisam ter um conhecimento mínimo sobre o que é factível em termos das possibilidades das novas tecnologias. Daí a importância de oferecer a eles algumas ferramentas analíticas que auxiliem nesse processo (EC 3). Todavia, elevada expertise técnica pode inibir as pessoas de produzir ideias verdadeiramente inovadoras, porque quanto maior a familiaridade com um assunto, maiores as chances de se limitar a esse campo de conhecimento para a busca de soluções (EC 6). Por fim, a última estratégia-chave sugere que a heterogeneidade de clientes envolvidos no processo de desenvolvimento de novos produtos e serviços tende a promover a produção de ideias que servirão a uma variedade de segmentos de mercado. 4. EXEMPLOS DE EMPRESAS ADOTANTES DO CONCEITO A literatura aponta a utilização da metodologia por algumas empresas em voga na atualidade. Sawhney, Verona e Prandelli (2005) dizem que um dos mecanismos é uma caixa de sugestões, onde os clientes podem contribuir com suas ideias inovadoras. A Starbucks Coffee Company, uma grande rede de cafés presente em vários países do mundo, é uma dessas organizações que se utiliza desta metodologia, através de página na internet, "My Starbucks Ideas", onde são registradas as sugestões, fazendo -se um ranking daquelas adotadas, enfim dando um feedback aos clientes sobre suas proposições. Um outro exemplo do mesmo mecanismo é o do Banco Santander, um dos maiores do planeta, com o desenvolvimento do conceito do "Banco do Juntos" e a valorização das ideias de seus clientes. Há a sugestão e, se possível, a posterior adoção dessas sugestões. Na maioria dos casos, essa postura é totalmente voluntária por parte do consumidor. As empresas também podem trabalhar o conceito através de feedbacks destes com a experiência de cada cliente. Uma destas é a Hallmark, empresa produtora de cartões. Ela possui um canal com seus clientes, o "Hallmark Idea Exchange", onde eles consideram seus clientes a extensão de sua equipe de marketing, isto é, eles fazem parte diretamente, de alguma forma, da criação. Em 2004, a Hallmark lançou o projeto "Project HaHa!", para entender como o senso de humor das pessoas veio mudando e a melhor forma de expressá-lo em sua linha de cartões. Percebe-se uma grande concentração das empresas de produtos conhecidas no mercado como inovadoras, como são os casos da 3M e da DuPont, utilizando -se dos conceitos e preceitos da cocriação. Recentemente, a PepsiCo fez uma grande iniciativa junto ao mercado para o lançamento de novos sabores da batata Ruffles no Brasil, conhecida como "A Batata da Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 59 Onda". O consumidor não apenas fazia a sugestão de sabor e dos ingredientes, como também do design e layout da embalagem. As empresas de tecnologia, como provedoras de software ou serviços baseados na internet, costumam utilizar-se do conceito ao introduzir as versões beta de seus serviços ou aplicativos, algo muito comum no setor. A gigante Google dispõe do Google Labs, o qual ela apelida de "coisas malucas e experimentais" onde os usuários interagem, comunicando-se com os engenheiros desenvolvedores. Outra abordagem para o conceito é o que se pode fazer para uma cidade melhorar, que poderá ser levado aos gestores públicos para a elaboração de planos diretores. Um exemplo ilustre é a cocriação da cidade de Londres, via site (http://www.cocreatelondon.com/). "Co-create London" é uma iniciativa social que dá às pessoas a oportunidade de modificar algo em sua cidade. No Brasil, há uma iniciativa similar, no estado do Rio Grande do Sul (RS) (http://agenda2020.com.br), com uma agenda estratégica para a cocriação do futuro dos moradores do estado, seus filhos e netos. 5. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA GERENCIAL NO BRASIL Acredita-se que a prática gerencial no mercado brasileiro fará com que este se torne amadurecido e cada vez mais próximo das reais necessidades dos cliente s. Dessa forma, através da participação ativa dos clientes, tem-se uma contribuição valiosa para as empresas. Especificamente no caso do País, um mercado emergente e com diversos pontos a serem desenvolvidos, por exemplo, a inserção de milhões de habitante s no universo do consumo, em especial nas regiões Norte e Nordeste, irá gerar oportunidades únicas de crescimento dos negócios. Como esse novo modelo de envolvimento do cliente em meio a uma lógica dominante de serviços exige uma abordagem na atitude dos empresários diferente da tradicional, sendo necessária a abertura para mudanças, acredita-se que aqueles que não se utilizarem da proposta poderão ter suas empresas ultrapassadas por concorrentes que melhor empreguem tais métodos. Simplesmente não haverá espaço para as empresas centradas em si próprias e em suas respectivas cadeias de suprimento. Esta discussão no Brasil ainda é embrionária, dados os poucos estudos e publicações da iniciativa, especialmente para o campo dos serviços. Além disso, essas visões de cocriação, de lógica dominante de serviços, de geração de valor e de orientação proativa para o mercado devem ser acompanhadas de sistemas eficazes de qualidade. Alguns setores de serviço no País, por serem provenientes de sistemas de concessão ou com poucos players, como o fornecimento de energia elétrica e a telefonia, não permitem uma interação do consumidor no desenvolvimento e projeto de Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 60 novos serviços. O consumidor ainda não conseguiu estabelecer uma relação positiva de parceria com tais empresas que permitam um re-design. Sendo assim, de acordo com as colocações anteriores, com a percepção de geração de valor ao ter os clientes como reais parceiros para o desenvolvimento de novos produtos e serviços, ainda existem setores no Brasil que precisam ad aptar-se para a utilização do novo conceito. Tais setores devem entender que esse ponto pode ser primordial para suas políticas futuras de infraestrutura, por exemplo; é preciso fazer planos estratégicos considerando essa nova visão. Quanto aos produtos, os avanços são maiores, a incidência é mais significativa e factível. Algo que deve ser considerado tanto para serviços quanto para produtos é a questão cultural. É preciso que o empresariado brasileiro consiga perceber nessa estratégia a criação de valor para ambas as partes, e não uma interferência na origem e concepção de suas ideias, atribuindo e valorizando seu cliente, tratando-o de forma única e singular. Além disso, evitar qualquer confusão entre os conceitos de customização e cocriação será essencial para o sucesso e progresso das iniciativas. 6. CONCLUSÕES Diante das ideias expostas acima e do referencial teórico, fica clara a necessidade de adoção de ferramentas e práticas em busca de uma orientação para o mercado (market orientation), além dos benefícios em termos de inovação, tanto em produtos, como em serviços. Entender seus processos e estratégias será fundamental para a conquista e a manutenção da base de clientes. Dessa maneira, as afirmações dos autores Prahalad e Ramaswamy (2004) de que as empresas precisam mudar seus pontos focais, alterando-os de si para os do cliente, ou seja, estando aberta às ideias e projetos dos externos à organização, são aqui ratificadas. Pode ser verificado que pesquisas tradicionais de mercado sobre preferências dos clientes, como focus groups e surveys não são suficientes para desenvolver produtos e serviços de fato inovadores. Em outras palavras, empresas que competem em campos distintos e competitivos diferenciadas pela inovação podem encontrar melhores resultados se conseguirem aproximar o cliente de seu processo de desenvolvimento de produto ou serviço; porém, deve estar preparada cultural e organizacionalmente para essa nova abordagem de certa interferência. O campo dos serviços é muito rico em detalhes, mas algumas vezes é tratado com certo desprezo por seus prestadores por considerarem-se essenciais e únicos. Essa lógica faria com que os players entrantes, ao adotar tais metodologias, pudessem conquistar clientes insatisfeitos. Trata-se de uma forma de migração do conceito de massa ao de cocriação, sem confundi-lo com a diferenciação (processo que altera apenas o produto em sua fase final de produção). Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 61 Verificou-se, também, a confirmação da hipótese de que a colaboração do cliente se traduz em valor agregado cujo propósito específico é o de causar satisfação ao próprio cliente. E, finalmente, percebe-se a necessidade do desenvolvimento de novos estudos no setor, tanto no aprofundamento das principais teorias, trazendo -as, por exemplo, ao contexto do mercado brasileiro, como as abordagens práticas, como estudos de caso. 7. REFERÊNCIAS AGENDA 2020 [Informações]. Rio Grande do <http://agenda2020.com.br/>. Acesso em: 16 out. 2011. Sul. Disponível em: BALLANTYNE, D.; VAREY, R. J. The service-dominant logic and the future of marketing. Journal of the Academy of Marketing Science, v. 36, n. 1, p. 11-14, Spring 2008. CO-CREATE [Informações]. Londres. Disponível <http://www.cocreatelondon.com/>. Acesso em: 16 out. 2011. em: GOOGLE LABS [Informações]. Disponível em: <www.google.com>. Acesso em: 17 out. 2011. GRINSTEIN, A. 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One of these forms of adaptation encountered by companies was the co-creation, in which the company has the support of customers for the purpose of innovation (LUSCH et al., 2007). This concept of co-creation should not be confused with the customization, in which, according to Kristensson, Matthing and Johansson (2008), the consumer involvement is restricted to the final stages of innovation. Beyond the company equips its customers with the right tools, enabling them to participate in the innovation processes of the organization, it also have to adjust its business models to the new form of interaction with the market. In other words, companies that compete in segments differentiated by innovation may find better results if they include the customer in their development process of product or service. However, these companies must be culturally and organizationally prepared for this new approach. Considering this change of perspective in the dominant logic of economic transactions, this paper presents a literature review about the concept of co-creation, servicedominant logic, market orientation, and the new way of creating value for consumers. Then some key strategies identified by Kristensson, Matthing and Johansson (2008) for the successful involvement of the consumer as a cocreator of value are presented. Finally, this paper presents some initiatives of companies that have adopted the concept of co-creation and some implications of adopting this concept in the Brazilian context. Keywords: co-creation, service-dominant logic, innovation, customer participation Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 45-64 2013 64 SERVIÇO COMO LÓGICA DE NEGÓCIO: IMPLICAÇÕES PARA CRIAÇÃO DE VALOR E MARKETING Átila de Assis Václav Filho RESUMO Na prestação de serviços, um dos maiores desafios é gerar diferenciação efetiva e fidelização de clientes, dado o acirramento da concorrência e a abundância crescente de ofertas. Na visão tradicional do Marketing, a criação de valor para o cliente se dava durante a troca, seja de mercadorias ou serviços. Vargo e Lusch (2004, 2006, 2008), GRÖNROOS e RAVALD (2011), no entanto, trazem o conceito de cocriação de valor, ressaltando a importância da interação entre cliente e fornecedor nesse processo, a fim de identificar estratégias e oportunidades de melhorias na proposição de valor. Além da revisão de literatura recente, foram trazidos três casos concretos para que o leitor compreenda o serviço como lógica de negócio e suas diversas implicações. Constatouse, como salientam os autores, que o verdadeiro locus de criação de valor para os clientes se dá no uso, do produto ou serviço, e na interação simbiótica e relacional entre clientes e fornecedores. Aqueles que souberem repensar seus produtos e serviços dentro dessa nova lógica, do consumidor como parte ativa do processo, terão mais condições de gerar vantagem competitiva sustentável. Palavras-chave: prestação de serviços, diferenciação, cocriação de valor, visão orientada ao cliente. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 65 91 1. INTRODUÇÃO As empresas cada vez mais procuram ser vistas pelo consumidor através da diferenciação de suas ofertas. Com o passar do tempo, a dificuldade tem aumentado. Em virtude da variedade de produtos e marcas que chamam a atenção do consumidor e do aumento significativo da concorrência. O consumidor é bombardeado constantemente com propaganda e disponibilidade de produtos e serviços que lhe dão mais opções de escolhas e de mudanças. Raramente se consegue manter a fidelidade e o nível de consumo dos clientes, se não houver uma estratégia que permita satisfazer suas necessidades com qualidade e que conduza à diferenciação, condição necessária para se sobressair perante os concorrentes e poder se estabelecer no mercado, ou mesmo, aumentar a sua participação. Para fazer frente à ameaça da grande oferta de produtos no mercado, as empresas têm buscado a diferenciação por meio da associação de serviços e produtos, tentando chamar a atenção do cliente, criando uma boa reputação, mostrando um desempenho superior com entregas no prazo, respostas melhores e mais rápidas para consultas, e solução ágil para reclamações (KOTLER, 2006). Desta forma, a mudança da lógica dominada pelo produto para a lógica dominada pelos serviços começa a tomar corpo nos negócios e nas empresas (LUSCH e VARGO, 2004). Tradicionalmente, fornecedores produzem mercadorias e serviços, e consumidores compram mercadorias e serviços. Hoje, isto está mudando com a participação ativa do consumidor desde a produção até à entrega do produto. Esse está começando a se tornar o verdadeiro diferencial na venda de produtos ou prestação de serviços. Tal processo de interação tem sido visto como uma forma conjunta de aprendizado (BALLANTYNE, 2004). Juntos, o fornecedor e o consumidor têm a oportunidade de criar valor através da participação e da interação entre eles. A cocriação de valor é um objetivo que pode auxiliar a empresa a conhecer o ponto de vista do consumidor e a melhorar o processo de entendimento das suas necessidades e desejos (LUSCH e VARGO, 2006). No caminho de melhorar o atendimento e superar as expectativas do cliente, o fornecedor pode fazer a sua parte disponibilizando as ferramentas necessárias para que o cliente participe e se envolva no processo, auxiliando não só na criação, design e atendimento, mas também permitindo que o valor do produto seja percebido no uso e na experiência do consumidor. O propósito deste trabalho é mostrar a importância para a prática empresarial e apresentar alguns exemplos da coparticipação e cocriação de valor na prestação de serviços, tendo como direcionador o artigo de Grönroos e Ravald (2011) que realizam uma análise do escopo, conteúdo e natureza da cocriação de valor numa visão baseada na lógica de serviço, direcionada para a perspectiva do consumidor numa relação mútua fornecedor-consumidor. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 66 91 2. ANTECEDENTES De acordo com Payne, Storbaka e Frow (2007), a noção do marketing como um facilitador e estruturador da criação mútua e conjunta de valor tem ganhado credibilidade. Suas origens, segundo Grönroos e Ravald (2011), têm raízes na década de 1970 quando a pesquisa de marketing em serviços começa a tomar força e prossegue durante as três décadas seguintes, sofrendo grande mudanças a partir do trabalho de Vargo e Lusch (2004), momento em que a lógica de serviço dominante toma corpo. O artigo “Evolving to Service-Dominant Logic for Marketing”, de Vargo e Lush (2004), foi um marco nos estudos de Marketing, propondo uma revisão das pesquisas e entendimentos sobre as lógicas existentes e apresentando oito premissas fundamentais (PF): PF1: A aplicação de habilidade especializada e o conhecimento são as unidades fundamentais da troca PF2: Trocas indiretas mascaram a unidade fundamental de troca PF3: Os bens são os mecanismos de distribuição da prestação de serviços PF4: O conhecimento é a fonte fundamental de vantagem competitiva PF5: Todas as economias são economias de serviços PF6: O cliente é sempre um coprodutor PF7: Uma empresa só consegue oferecer, mas não criar, propostas de valor PF8: Uma visão centrada em serviço é orientada ao cliente e relacional. Logo após a publicação de Vargo e Lush (2004) vieram as conclusões de que a Prestação de Serviços era considerada mais como uma perspectiva do que como uma atividade (EDVARDSSON et al. , 2005, apud GRÖNROOS, 2011). Em Vargo e Lusch (2006) passa a ser adicionad uma nona premissa fundamental (PF9): "As organizações existem para integrar e transformar competências micro-especializadas em serviços complexos que são exigidos no mercado ". Também, logo assim que o artigo de Vargo e Lusch (2004) foi publicado, vários estudiosos de marketing apontaram que o termo "coprodução", que foi o foco da PF6, era um termo que tinha a lógica de produto dominante (PD), ao contrário de uma lógica serviço dominante (SD) descrita pelo artigo. Visto que o termo “coprodução” implicava em produzir algo, uma unidade de produção, os autores reconheceram que as críticas eram, de fato, corretas. Quase imediatamente Vargo e Lusch (2006) mudaram a PF6 para 'o cliente é sempre um cocriador de valor'. No entanto, os autores chamam a atenção para que se reconheça que existem dois componentes de valor de cocriação: um no uso e outro no processo de produção. O mais abrangente deles é a cocriação de valor. Este conceito representa uma mudança bastante drástica da lógica PD, que visa valorizar como algo que é adicionado aos produtos no processo de produção e, depois, no ponto de troca é capturado em valorde-troca (preço, por exemplo) pelo cliente ou consumidor. A lógica dominante de serviço Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 67 91 (SD), no entanto, argumenta que o valor só pode ser criado e determinado pelo usuário no 'consumo' do processo e com o uso ou o que é referido como o valor no uso. Esse é um dos pontos centrais do presente trabalho e representa o que os profissionais de Marketing denominam como “o momento da verdade”, ou seja, o momento da interação entre empresa e cliente, que permite a verdadeira cocriação de valor através da facilitação do fornecedor, e onde se formam as percepções sobre a oferta de produtos e, principalmente, dos serviços prestados. O segundo componente da cocriação é o que Vargo e Lusch (2006) consideram mais corretamente chamar de coprodução. Ela envolve a participação na criação da oferta principal em si. A coprodução pode ocorrer por meio de criatividade compartilhada, codesign, ou de compartilhamento da produção de bens relacionados e podem ocorrer com os clientes e quaisquer outros parceiros da rede de valor. Portanto, tanto "cocriação de valor" como a "coprodução" fazem o consumidor se inserir no processo e ambos são diferentes dos conceitos de produção associados à lógica PD. Posteriormente é acrescentada mais uma premissa fundamental em Vargo e Lusch (2008a), a PF10, onde valor é sempre único e fenomenologicamente determinado pelo beneficiário. Assim, os autores modificam os enunciados anteriores de algumas das premissas fundamentais de acordo com a Tabela 1, abaixo: Tabela 1 – Premissas da lógica de Serviço Dominante (SD) Número da Premissa Fundamental Premissa PF 1 Serviço é a base fundamental de troca. PF 2 Trocas indiretas mascaram a base fundamental de troca. PF 3 Bens são um mecanismo de distribuição para a provisão de serviços. PF 4 Recursos operacionais são a fonte fundamental de vantagem competitiva. PF 5 Todas as economias são economias de serviços. PF 6 O cliente é sempre um cocriador de valor. PF 7 A empresa não consegue entregar valor, mas apenas oferecer propostas de valor. PF 8 Uma visão centrada em serviços é inerentemente orientada ao cliente e relacional. PF 9 Todos os atores sociais e econômicos são integradores de recursos. PF 10 Valor é sempre única e fenomenologicamente determinado pelo beneficiário. Fonte: Traduzido de Vargo, Maglio e Akaka (2008). Grönroos e Ravald (2011) citam que os papéis exercidos pelos fornecedores e consumidores na lógica de PD são muito mais claros do que na lógica de SD, pois quando se fala em cocriação de valor pode gerar confusão, em quem cria e para quem se cria valor. E para eles, é importante para a prática e para a pesquisa de marketing saber identificar os papéis dos diferentes atores que participam do processo. Portanto, o entendimento de onde está o valor para o consumidor passou a despertar o interesse da pesquisa de marketing e dos gestores. A visão até então prevalente de que o valor estava no produto, na saída da produção do fornecedor e de que o valor era considerado apenas como o valor de troca, passa a ter uma nova visão que inclui como desafio a noção de valor no uso. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 68 91 3. LÓGICA DE SERVIÇOS E VALOR-NO-USO Grönroos e Ravald (2011) usam a expressão lógica de serviço em vez de lógica de serviço dominante e tratam como diferentes construtos a noção de produção e a noção de criação de valor. Para os autores a produção é o processo de gestionar os recursos que serão integrados ao consumo e ao processo de uso pelo consumidor, enquanto a criação de valor é o processo de criar valor-no-uso como um valor que é externo e não inerente de cada recurso. De acordo com Kotler e Keller (2006), os serviços possuem características próprias, dentre elas: a Intangibilidade – não podem ser vistos, tocados ou sentidos antes de serem adquiridos; a Inseparabilidade – os serviços são produzidos e consumidos simultaneamente; a Variabilidade – os serviços dependem de por quem, onde e quando são fornecidos, logo existe uma variação em cada prestação de um mesmo serviço, que depende tanto de quem fornece como de quem consome, pois as percepções são diferentes, e, finalmente, a Perecibilidade – serviços não podem ser estocados, ao contrário de mercadorias ou bens tangíveis. Devido à natureza interativa do serviço e da sua inseparabilidade, no qual o processo de produção e o consumo são simultâneos, os consumidores acabam por ter eles mesmos participação no processo. Um serviço sem o consumidor não consegue ser fornecido, logo o papel do consumidor como coprodutor das atividades de serviço já tinha sido percebido logo de início nas pesquisas de marketing (GRÖNROOS e RAVALD, 2011). No entanto, a visão de que mesmo ao comprar um produto ou atividade de serviço, o consumo se dará sempre como serviço, muda a lógica. Os autores consideram que, sob o ponto de vista do consumo, tanto mercadorias e bens, quanto atividades de prestação de serviços, são mecanismos de distribuição de serviços, como visto em Vargo e Lush (2004). A lógica de serviço possui uma questão fundamental para o seu entendimento, que é a noção de valor-no-uso, por meio da qual o valor para o consumidor é criado durante o uso do recurso. A criação de valor torna-se resultado da interatividade no processo de uso e, de certa forma, gera uma subjetividade, por depender do julgamento e da própria experiência de quem produz o valor. A visão do valor-no-uso não é considerada como uma nova abordagem, mas algo que tem sido encoberto pela noção de valor-na-troca. Grönroos e Ravald (2011) apresentam que, de acordo com a visão da lógica de serviço, o valor não é criado e entregue pelo fornecedor, mas surge durante o processo de uso do consumidor. Experiência de posse ou do uso torna-se mais importante do que o bem em si. O valor é criado pela experiência sentida pelo consumidor, portanto a criação do valor ou a mensuração do valor é dependente do contexto em que se dá a experiência. A criação de valor do consumidor é um processo dinâmico, tendo em vista que o contexto se torna mutável e o valor-no-uso da mesma maneira se altera em função da mudança. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 69 91 4. COCRIAÇÃO DE VALOR E FACILITAÇÃO DE VALOR Para entender o processo de cocriação de valor é necessário que se estabeleça uma diferença entre a facilitação de valor e criação de valor, definida por Grönroos e Ravald (2011), e o papel do fornecedor e o do consumidor no processo de criação de valor. Podemos entender que o fornecedor é responsável pelo desenvolvimento, desenho, fabricação e entrega do produto ou serviço, bem como pela operação do back-office e front-office. O fornecedor tem como papel entregar o produto como input do processo de criação de valor do consumidor, permitindo que o consumidor passe a criar valor. Essa etapa é rotulada pelos autores como o processo de facilitação de valor. Como é apresentado na Figura 1, abaixo, é necessário que o fornecedor disponha do produto, num relacionamento entre fornecedor-consumidor, e sirva como um facilitador para o processo de criação de valor. Em contrapartida, o fornecedor pode melhorar a interação, fruto do feedback gerado pelo consumidor no processo. Figura 1- Processo de facilitação e criação de valor Um ponto de vista importante na lógica de serviço definida pelos autores é que todos fornecedores de produtos tornam-se prestadores de serviço, já que o produto é apenas um componente no processo de criação de valor. O papel do fornecedor de produtos é atuar na facilitação da criação de valor do consumidor e é nesta interação que ele pode direta e ativamente influenciar a criação de valor. Através da assistência e da facilitação de valor o fornecedor torna-se cocriador de valor junto ao consumidor. A compreensão da interação entre consumidor e fornecedor no processo de criação de valor é importante para identificar as estratégias a serem utilizadas e para a identificação de oportunidades de melhorias na oferta de valor. Segundo Grönroos e Ravald (2011), a interação é a ação recíproca ou mútua onde cada um dos participantes interage e têm influência um sobre o outro. Para que haja a interação é necessário que exista conectividade entre os membros e algum contato, de forma que cada um possa influenciar a outra parte e ser influenciado por ela. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 70 91 Os processos de facilitação e de criação de valor ocorrem simultaneamente e não em fluxo paralelo. Sob o ponto de vista do fornecedor, a coordenação da interação permite que ele se insira no processo de criação de valor do consumidor, permitindo a criação conjunta de valor, a cocriação de valor (GRÖNROOOS e RAVALD, 2011). Figura 2 – Criação de valor e cocriação no relacionamento fornecedor-consumidor Fonte: adaptado de Grönroos e Ravald, 2011. As dimensões da criação de valor e da cocriação e os diferentes papéis no processo são apresentadas na Figura 2. Para o consumidor como sujeito, o processo ocorre de uma área aberta até uma área fechada e, nesta área fechada, única para cada sujeito, é onde o consumidor cria valor, pela experiência, pelo valor-no-uso. Por outro lado, no processo de produção, onde o fornecedor é o sujeito, também existe uma área fechada no qual existe a produção e se dá a facilitação até uma área aberta, em que mercadorias e atividades de serviços são o resultado do processo inicial e servem como suporte na criação de valor. Os dois processos ocorrerão simultaneamente e, pela interação no relacionamento entre fornecedor-consumidor, surge uma área aberta onde os dois são os sujeitos que participam da ação e pelo contato e integração dos processos surge a coprodução e a cocriação valor. Os autores advertem que, na realidade, os processos não são lineares como aparenta a figura, mas seguem caminhos diferentes nas atividades diversas. Advertem, ainda, que é no relacionamento entre fornecedor e consumidor que toma lugar o processo de cocriação, nas atividades de desenvolvimento, design, fabricação e entrega. O consumidor, por sua vez, assume o papel de codesenvolvedor, codesigner, coprodutor e outros, no processo do fornecedor. Nos exemplos a seguir, os papéis tanto do fornecedor quanto do consumidor se tornarão mais claros. O restaurante Benihana, com a inovação e a participação dos consumidores em seu modelo, o bar Heavy Duty Beer Club, com o aclamado “pior Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 71 91 atendimento do Rio” e uma loja virtual, Camiseteria.com, que mostra o uso da ferramenta da Internet como exemplo de cocriação de valor, com a participação ativa dos consumidores no próprio processo de produção. 5. EXEMPLOS Buscamos trazer um exemplo clássico de serviço como lógica de negócio e a cocriação de valor, no caso do mundialmente famoso restaurante Benihana. Como bem humorado contraponto, apresentamos na sequência o caso do Heavy Duty Beer Club, bar temático de rock localizado na Praça da Bandeira, bairro da região metropolitana do Rio de Janeiro. Sua inusitada proposta de valor, no fim das contas, gera uma legião de clientes fiéis! Finalmente, o Camiseteria.com vem demonstrar como é possível a cocriação e coprodução de valor na Internet, mesmo que não haja uma interação física e presencial entre o front-office da empresa e cliente durante os “momentos da verdade”. a. Caso Benihana3 Fundado em 1964 por Rocky Aoki no coração de Nova Iorque, em 2008 o Benihana havia crescido e chegado aos seus 44 anos de existência tendo servido mais de 100 milhões de refeições, por meio de uma cadeia de restaurantes de fama internacional. Sua proposta de valor, analisada superficialmente, parecia relativamente simples: propiciar a seus clientes diversão e comida de boa qualidade. Como seu fundador, um imigrante japonês que trabalhava sete dias por semana vendendo sorvetes no coração do Harlem, conseguiu realizar o sonho de transformar um pequeno restaurante numa grande rede que fizesse as pessoas felizes? Para compreender o fenômeno Benihana, primeiro é preciso fazer uma anamnese para entender as raízes históricas, os pilares que viabilizaram sua trajetória de sucesso. O nome Benihana, que em japonês significa “flor vermelha”, Rocky herdou da pequena cafeteria que seu pai tinha em Tóquio. Além disso, seu genitor era popular no meio do entretenimento do Japão e tinha perfeito conhecimento da atração do público por experiências diferentes. Em 1958, preocupado com os crescentes custos operacionais, Yonusuke incorporou pela primeira vez o conceito da mesa hibachi às suas operações. Crescendo nesse meio, Rocky aprendeu desde cedo a importância de uma cozinha limpa, ingredientes frescos e de oferecer aos clientes algo mais do que uma simples refeição. Percebe-se aqui a preocupação com um importante tripé estratégico para a construção da excelência em serviços: (i) preocupação com a qualidade do serviço, (ii) 3 Inspirado no caso redigido por Kleber Figueiredo e Claudia Araújo, professores do COPPEAD/UFRJ, e consulta a sites diversos da Internet. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 72 91 preocupação com a criação de valor, por meio do gerenciamento da experiência do cliente, e (iii) preocupação com uma lógica de negócios voltada ao serviço, através da cocriação de valor, aumentando a área aberta de contato e interação ativa com o cliente (o front-office, ou a parte da frente) e reduzindo a área sem contato com cliente (o backoffice, ou a parte de trás). Para compreender esse último aspecto do serviço, a da cocriação de valor, torna-se necessário entender o papel estratégico das mesas hibachi e do chef como um showman no preparo das refeições. A partir de uma análise do mercado de restaurantes, Rocky descobriu que os americanos gostavam de comer em ambientes exóticos, mas desconfiavam de comidas exóticas. Também aprendeu que as pessoas gostavam de ver a sua comida sendo preparada. Unindo esse estudo de campo à experiência herdada de seu pai, o outrora vendedor de sorvetes revolucionou o conceito de restaurante substituindo a cozinha convencional por chefs bem treinados e habilidosos que, com enormes facas e espátulas, davam um show de malabarismo e gestos teatrais enquanto preparavam a comida na mesa hibachi e depois a serviam aos clientes que, sentados à sua volta, assistiam entretidamente ao show. Ao transformar o ato de comer fora numa espécie de espetáculo, o Benihana facilitou a criação de valor para seu cliente, que via na ida ao restaurante uma oportunidade para aliar diversão à alimentação. A cocriação de valor, como vimos nos tópicos acima, é a criação de valor recíproco entre empresa e consumidor, constituindo a base de serviços como lógica de negócios. Parte de uma promessa de valor para a sua efetiva realização, por meio da interação ativa entre fornecedor e cliente. Como o Benihana, porém, se beneficia desse diferencial que oferece a seus clientes? Sabemos que a famosa rede de restaurantes lucra com a experiência que oferta, pois pode cobrar um preço Premium por isso. Ademais, há economias significativas em custos operacionais e no uso eficiente da capacidade, como veremos adiante. Uma vez que o foco da oferta é a performance dos chefs, o Benihana pode oferecer um cardápio relativamente reduzido, limitando-se aos pratos favoritos já conhecidos pelos americanos, como bife, frango, frutos do mar e vegetais. Isso permite minorar a necessidade de estoques, reduzindo a área de back-office, os custos de armazenagem e garantindo ingredientes sempre frescos, condizentes com a filosofia de qualidade do pai de Rocky. Ao preparar a comida na frente dos clientes, além do prazer do show, os consumidores podiam presenciar esse preparo e não ficavam esperando entediados o prato chegar. A espera em restaurantes, antes e depois de comer, costuma ser um fator que desagrada aos clientes e reduz a percepção de valor. Além disso, Rocky sabia da importância de minimizar tempos de espera, por isso aprendeu a usar também a área do Bar como uma espécie de buffer (estoque intermediário) de clientes para evitar longos tempos de espera, permitindo um equilíbrio entre oferta (de mesas) e demanda (de clientes). Além disso, o chef só inicia sua performance quando a mesa de oito lugares está completa. Ao trazê-los em grupos ou “lotes” de oito para as mesas, é possível equacionar o dilema da Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 73 91 perecibilidade em serviços, evitando lugares vazios e otimizando o trabalho de preparo da refeição, permitindo até uma eventual e benéfica integração social entre os clientes. Todos esses recursos, além de criarem valor para os clientes, trazem grandes economias de escala e escopo para o Benihana, o que gera benefícios mútuos ou a cocriação de valor, definida no presente trabalho. Consumidor e produtor passam a ter papéis relativamente indistintos e a criação de valor emerge durante o processo de criação, que sai da parte de trás da cozinha e vem para frente do cliente. Esse é um caso clássico e bem sucedido de cocriação de valor. No próximo exemplo, traremos uma proposta inusitada de criação de valor que deu muito certo no Rio de Janeiro. b. Caso Heavy Duty Beer Club4 “Bar conhecido pelo mau atendimento faz sucesso no Rio” - essa é a abertura de uma reportagem que foi ar no Jornal da Globo em 16 de Setembro de 2010. “Ele se orgulha do mau atendimento do bar dele” – disse Jô Soares ao chamar o Zeca em seu conhecido programa de entrevistas no dia 30 de Novembro de 2011. Como que uma suposta má prestação de serviço consegue se transformar num caso de absoluto sucesso, a ponto de chamar a atenção da imprensa? Qual o processo de cocriação de valor entre cliente e fornecedor que, possivelmente, ocorre num ambiente aparentemente hostil e contrário a todas as usuais recomendações à excelência na prestação de serviços? Para entender esse fenômeno, precisamos ir um pouco além daquilo que é mostrado superficialmente nas reportagens da TV e mergulhar na história de vida do Zeca, que se mistura à trajetória de seu lendário bar. Há cerca de 40 e poucos anos (apesar de não parecer vaidoso, Zeca não revela sua verdadeira idade), um pernambucano de seis anos de idade veio com seus pais e mais seis irmãos para o interior de SP. Os pais vieram em busca de uma melhor condição de vida para seus filhos. No entanto, enfrentando inúmeras dificuldades, os dois se divorciaram em pouco tempo. A mãe voltou para Pernambuco com três filhos e o pai decidiu permanecer em São Paulo com os outros quatro. Zeca prefere ficar com o pai em SP e começa a trabalhar e estudar desde cedo. Aos 18 anos alista-se ao serviço militar, mas fica fora da seleção por “excesso de contingente”. Resolve, então, voltar para Pernambuco, a fim de rever a família e ajudar sua mãe. Depois de alguns meses, decide retornar para a região Sudeste, porque lá no Nordeste havia poucas oportunidades e a remuneração era muito ruim. Sem dinheiro, viaja de carona durante sete dias, pagando algumas despesas de comida e estadia vendendo gibis de uma coleção sua de adolescente. Chegando ao Rio de Janeiro, onde ficaria só de passagem, Zeca recebeu proposta para trabalhar de atendente num bar. Cerca de dois anos depois, após juntar um 4 Mini-caso redigido por Átila e Václav, alunos de mestrado do COPPEAD/UFRJ, com base nos sites www.heavydutybeerclub.com/, www.riocomela.com.br/index.php/2011/08/24/aqui-e-lugar-de-rockheavy-duty-beer-club/, entrevista do Jô Soares em: http://www.youtube.com/watch?v=aYQo_awzo6c e um bate papo informal com o dono do bar. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 74 91 pouco de dinheiro com muita dificuldade, resolve trabalhar de ambulante na praia, aos fins de semana, e vendedor de barraca de doces na porta de uma escola, durante a semana. É aí que ele consegue realmente começa a ganhar algum dinheiro extra e tem condições de economizar para comprar sua primeira moto Harley, uma antiga e, até então, platônica paixão. A moto é sua ligação quase acidental com a Rua Ceará e, consequentemente, com o surgimento do Heavy Duty Bar. Vamos explicar. Zeca precisava levar a moto Harley para consertar e pintar e não havia muitos lugares para isso na região metropolitana do Rio de Janeiro. Conhece, por meio de amigos, a oficina do Moto Clube Balaios, no qual ingressaria algum tempo após o conserto. O Moto Clube tem lá suas práticas de iniciação, bem pouco ortodoxas, mas não entraremos nesse mérito para o presente trabalho. O que importa é que Zeca foi aceito no grupo, recebendo dos amigos a alcunha de “Zeca Urubu”5, em função do cabelo desgrenhado e seu jeitão de enfezado, e aos poucos ascendeu e adquiriu o respeito dos outros membros. Após alguns meses, já nos idos de 1995, o dono da oficina de motocicletas estava em dificuldades financeiras, e Zeca enxergou uma oportunidade de adquirir o negócio. Junto com a oficina havia um pequeno bar anexo, estreito, de uma só porta. Durante dois anos Zeca operou os dois negócios simultaneamente, transformando o boteco, aos poucos, num pequeno bar temático de rock, trazendo alguns shows que eram montados na rua mesmo (à essa época, a Rua Ceará ainda era fechada). O bar estava dando certo e ampliando a clientela, inicialmente composta por motociclistas do Balaios e depois passando a jovens e fãs de rock. A oficina, por sua vez, não estava caminhando bem. Em 1997, então, Zeca decide fechar a oficina e se dedica exclusivamente ao bar, que passa a se chamar oficialmente Heavy Duty, nome que perdura até hoje. Uma marca registrada do seu estabelecimento sempre foi o tal mau atendimento, ou autoatendimento, como prefere chamar o seu proprietário. Alguns clientes seus não concordam com a fama e dizem, apenas, que o bar tem um atendimento “sem frescura”. Essa suposta fama criava uma atmosfera de curiosidade pitoresca, que atraía a atenção da imprensa e, consequentemente, de novas pessoas ao local. Zeca sabia muito bem disso e, portanto, caprichava na ambientação, na cerveja sempre gelada (com destaque a alguns rótulos importados) e na atmosfera de intimidade, de familiaridade. Apesar de ser um bar de rock alternativo, Zeca proibia terminantemente o consumo de drogas ilícitas no local. Ele fazia um papel de “segurança” de seu estabelecimento e, se pegava alguém fazendo uso de drogas, expulsava, literalmente, a chutes e pontapés. Com isso, conseguia atrair um público que efetivamente consumia os produtos do bar e não trazia encrenca. Essa é uma das características que nenhuma das reportagens soube explorar e que, de fato, fazia a diferença na seleção e determinação do seu público-alvo. 5 Zeca Urubu (Buzz Buzzard) é um personagem criado em 1948 e é inimigo do Pica-Pau (Woody woodpeeker), desenho animado produzido pelo estúdio de Walter Lantz e distribuído pela Universal Pictures. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 75 91 O movimento ano após ano ia bem, embora o Heavy Duty competisse a atenção dos fãs de rock com a casa de shows GARAGE, que ficava a poucos metros dali, e que pertencia a outro membro do Moto Clube Balaios. Esse dono não participava da administração direta e deixou a gestão da casa e dos shows na mão de um produtor musical. Durante cerca de 15 anos o GARAGE prosperou, porém em 2000 começou a enfrentar dificuldades financeiras. Sem entrar no mérito das razões que levaram à sua derrocada, após idas e vindas podemos dizer que em 2006 o local fechou, definitivamente, suas portas. Órfãos da mais famosa casa de shows de rock alternativo daquela região, seus frequentadores somaram-se aos clientes habituais do Heavy Duty. Zeca, então, passou a ter um problema sério nas mãos: falta de espaço para atender a toda essa gente, para absorver a nova demanda! Apesar da suposta fama do mau atendimento, o Zeca era um comerciante inteligente e não queria perder clientes, que conquistara arduamente durante anos de trabalho duro e dedicação. O invocado, mas perspicaz, dono do Heavy Duty resolve, então, fazer uma das mais ousadas apostas de sua vida como empreendedor: mudar para um espaço próximo dali e cerca de oito vezes maior que o atual! O processo de mudança demorou em torno de um ano entre obras e preparação do novo local. A espera valeu a pena e, em 2007, o Heavy Duty foi reinaugurado num espaço amplo que incluía áreas interna (fechada) e externa (ao ar livre) e, segundo palavras de uma frequentadora “com cara de espaço VIP, com sofás, moto Harley Davidson decorando o ambiente, chão xadrez, mesas de sinuca e até um palco, em cima do bar rebaixado”. Veja algumas fotos (Anexo 2) ao final do trabalho. Todo esse sucesso não veio por acaso. Embora o Zeca possa ter tido alguma “sorte” ao comprar a oficina falida, em 1995, ou com o fechamento do concorrente GARAGE, em 2006, ele procurou estar sempre antenado e preparado para as oportunidades emergentes e soube criar empatia com seu público. Seu antigo bar começou com umas cinco ou seis mesas, hoje ele tem mais de 50, fora o espaço para shows, pista de dança, área aberta, lounge, etc. O atendimento sem frescura, uma “marca registrada” apreciada pelos fãs de rock e demais frequentadores, permitiu que economizasse na contratação de garçons e focasse a atenção e investimentos no ambiente, no serviço de balcão e nas bebidas e aperitivos oferecidos em seu reduzido, mas bem elaborado, cardápio. Zeca tem dois cozinheiros, duas atendentes de balcão, um encarregado de limpeza e, ele próprio, é responsável por organizar os eventos, animar o ambiente com suas performances (vide fotos no Anexo 2) e cuidar da segurança. Aliás, um dos pontos altos da noite ocorre quando o Zeca resolve servir bebidas. O balcão, no caso dele, funciona como a mesa hibachi para os chefs do Benihana. É lá que ele anuncia ao microfone quando tem um prato pronto, bem ao seu estilo desbocado de ser: “batata frita pronta, po**a!”. É lá que ele faz seus avisos, anuncia as bandas de rock, executa performances pirotécnicas ao servir bebidas, dentre outros. Realmente fica difícil imaginar o futuro do Heavy Duty Beer Club sem a presença e atuação de seu engajado fundador. Ele é a alma do bar temático, e isso com certeza se Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 76 91 traduz na fidelidade que consegue cativar entre seus clientes. Quem conhece o Zeca sabe que sua “fama de mau” é apenas um tipo. No fundo, ele é um comerciante muito sério, competente, que aparentemente sabe aonde quer chegar e que busca oferecer uma atmosfera experiencial singular a seus clientes. Essa interação única é a inusitada cocriação de valor que ele consegue fomentar junto a seus frequentadores, muitos dos quais acabam virando verdadeiros amigos. A agenda de eventos do Heavy Duty é bastante disputada, e o bar abre de quarta a domingo, sempre de 19h até a saída do último freguês. Para quem quiser conhecer, o endereço é Rua Ceará, 104, Praça da Bandeira. Tel: 2567-8890 ou 7865-2630. Aceita pagamento em dinheiro, cartões de débito e para chegar é bem fácil, pois a Praça da Bandeira é farta de linhas de ônibus e, além disso, tem o Metrô bem pertinho! c. Caso Camiseteria.com6 Fundado no ano de 2005 por Rodrigo David e Fabio Seixas, a loja virtual Camiseteria.com define-se como a última palavra em democracia da moda. A ideia surgiu quando Rodrigo participou de um concurso de estampas de camisetas no site norteamericano Threadless.com. Funciona assim: um designer (profissional ou amador) se cadastra e pode enviar estampas, que são votadas pelos clientes por um período de 10 dias. Ao fim desse período a estampa recebe uma nota que ajuda a decidir se a camisa será ou não produzida. Se for produzida, o autor da estampa pode receber até R$ 800,00 em dinheiro e R$ 500,00 em produtos. Veja o esquema abaixo: Figura 3 – Esquema de relacionamento do Camiseteria Fonte: www.socialcommerce.blog.br/social-commerce/estudo-de-caso-camiseteria 6 Baseado nos casos redigidos por Catarina Pimentel, disponível em www.casodesucesso.com/?cid=452, por Rafael Vieira, em www.socialcommerce.blog.br/social-commerce/estudo-de-caso-camiseteria/ e no site da empresa www.camiseteria.com. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 77 91 Esse modelo cria um relacionamento contínuo entre as partes, numa verdadeira relação de cocriação de valor e coprodução entre loja, designers e compradores. Em termos de comércio eletrônico, esse modelo colaborativo ficou conhecido como Social Commerce, um relacionamento entre as partes que cria uma retroalimentação positiva e acaba beneficiando a todos os envolvidos. Como, então, ocorre a cocriação de valor no caso do Camiseteria.com? Os clientes e designers participam, ativamente, tanto do processo de criação quanto da escolha dos desenhos que serão estampados nas camisetas, fazendo com que o público se sinta parte do produto. A exposição do trabalho dos designers, que têm suas estampas reproduzidas nas camisetas, funciona como uma exposição do trabalho deles e acaba gerando novos contratos profissionais. As camisetas são produzidas em lotes reduzidos, o que aumenta a percepção de exclusividade para o cliente e evita o encalhe de mercadorias, algo relativamente comum no mercado de confecções. Por outro lado, o Camiseteria dispõe de designers que trabalham para eles, sem receber salário fixo e cuja remuneração é totalmente variável, atrelada única e exclusivamente à escolha de uma estampa de sua autoria para produção. Veja o esquema desse processo abaixo: Figura 4 – Esquema de remuneração do Camiseteria Fonte: www.socialcommerce.blog.br/social-commerce/estudo-de-caso-camiseteria Esse esquema colaborativo foi tão bem sucedido que o público aprovou a novidade e, em apenas quatro meses, a empresa teve retorno do investimento inicial de 30 mil reais e obteve lucros significativos. A interatividade no site também é estimulada através de outros meios, como um blog onde os usuários conversam entre si e fazem comentários sobre as estampas. As redes sociais são a ponte entre a empresa e o consumidor. Essa proximidade com o público é uma grande arma de divulgação e, assim, a loja raramente tem que investir em publicidade, aplicando mais recursos no marketing de relacionamento e no desenvolvimento de produtos. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 78 91 O site também disponibiliza espaços temáticos para concursos especiais, tais como, o “Camiseteria Extra” e “Diorama”, iniciativas que consistem de parcerias com outros sites, empresas, produtos ou eventos sociais para gerar concursos temáticos variados para a cocriação de design do Camiseteria.com. Os usuários concorrem a prêmios diferenciados que mudam a cada concurso. As estampas enviadas para o concurso só concorrem dentro dele e não na competição permanente do Camiseteria. São exemplos de parcerias: Compactor, Fiat fashion, Coca Cola, Sprite, site de compras coletivas Peixe Urbano, Supermercados Extra, Guaraná Antártica, site Pag Seguro, Curso IBEU, Canal VH1 Cultura pop, Copa do Mundo, Comunidade da Internet Tribo do Gol e outros. Desta forma, aumentam as opções de participação e de integração por meio do relacionamento entre fornecedor-criador-consumidor. Através da votação dos participantes e consumidores o site entra como facilitador do processo de criação de valor. Sabendo que seu bem sucedido modelo de negócios pode ser facilmente copiado, o Camiseteria procura focar no crescimento contínuo, buscando sempre inovar, lançar novos produtos, fortalecer a marca e investir ainda mais nessa troca de ideias com os clientes, trazendo continuamente novidades que venham de encontro aos anseios e desejos de seus consumidores. A loja virtual não abre informações sobre o faturamento ou a taxa de crescimento anual. Porém, nos anos de 2008 e 2009, por exemplo, a empresa diversificou a gama de produtos e lançou a linha infantil e as bolsas ecológicas, que seguem o mesmo bem sucedido projeto colaborativo de criação das estampas. 6. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA EMPRESARIAL E CONCLUSÕES A análise da interação entre o fornecedor de produtos, prestador ou provedor de serviços (GRÖNROOS E RAVALD, 2011) e o entendimento da experiência que o cliente tem com um serviço ou produto, pode ser fundamental para a diferenciação de muitas empresas, em função da elevada quantidade de produtos, marcas e serviços disponíveis no mercado atualmente. É desta análise que se pode gerar a vantagem competitiva sustentável. Compreender onde a experiência do cliente está ligada ao serviço e buscar uma oportunidade nessa ligação, que ocorre por meio da interação entre o cliente e a empresa, na chamada cocriação de valor (PRAHALAD e RAMASWAMY, 2004) ou da coprodução (VARGO e LUSCH, 2006). A atual complexidade das ofertas, com grande variedade de produtos e serviços, nem sempre resulta em melhores experiências de consumo (PRAHALAD e RAMASWAMY, 2004). As empresas, que já não garantem sua lucratividade por meio de velocidade, qualidade e menores custos, precisam encontrar uma nova forma de gerar valor, por meio da criatividade e inovação. No exemplo do Benihana, a menor variedade do cardápio é largamente compensada pela experiência do cliente na mesa hibachi. A ideia garantiu economias operacionais para o restaurante e, ao mesmo tempo, uma experiência de entretenimento única para seu frequentador. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 79 91 Assim, o conceito de cocriação de valor: a participação do cliente no processo de produção, sua interação com a empresa na busca da criação de valor (GRÖNROOS e RAVALD, 2011; PRAHALAD e RAMASWAMY, 2004) passa a ter importância nas estratégias empresariais. Os consumidores eram vistos no passado como elementos passivos, por se considerar no processo de consumo o valor-na-troca e de que o locus do valor encontravase no produto. Com a noção de valor-no-uso, pela visão da lógica de serviço (GRÖNROOS e RAVALD, 2011), não só passam a ser vistos como atores num papel de criação de valor, como passam a ser considerados cocriadores de valor e coprodutores (VARGO e LUSCH, 2006) através da interação entre o fornecedor e o consumidor. Os consumidores estão cada vez mais engajados no processo de criação de valor, não só pela facilidade de acesso às ferramentas necessárias para a colaboração e cocriação, mas também pela necessidade de inovar em suas experiências. É ai que surge o espaço onde eles podem criar suas próprias regras, tendo um papel verdadeiro e efetivo no desenvolvimento de novos produtos e serviços. No caso de bares temáticos de rock, no Rio de Janeiro muitos deles não deram certo. Depois de um curto período de sucesso, devido talvez ao interesse despertado pelo lançamento, eles acabaram fechando. Provavelmente prevalece, nesses casos de insucesso, a lógica de produto dominante (PD): o cliente é tratado como apenas mais um componente numa linha de produção “sem vida”. No Heavy Duty, ao contrário, prevalece a lógica de serviço dominante (SD). Com sua inusitada proposta de valor, o estabelecimento cria diferenciação e um forte vínculo com seus frequentadores, que interagem por meio da coprodução e cocriação de valor. Ganha o cliente, com a experiência que ele não encontra em outros bares, e ganha a casa, reduzindo gastos operacionais com garçons, pessoal de apoio e podendo canalizar seus investimentos naquilo que realmente interessa a seu público-alvo. Talvez o Heavy Duty possa servir de inspiração para quem deseja compreender, na prática, como a lógica de serviço dominante (SD) ajuda a criar fidelidade com seus clientes, ao menos no ramo de bares temáticos. Atualmente e de forma crescente, a Internet (TAPSCOTT e WILLIAMS, 2007) tem sido o grande exemplo da ferramenta que tem permitido a colaboração no processo de cocriação de valor, coprodução e de coinovação. Surge um novo modelo de inovação e de criação de valor, que ocorre por meio da colaboração e participação através de redes. Com a ferramenta Internet, comunidades auto-organizadas que se unem para produzir um único resultado através da união voluntária criam uma nova maneira de produzir bens e serviços. Segundo Tapscott e Williams (2007): “(...) está surgindo uma nova forma de organização horizontal, que rivaliza com a empresa hierárquica no que diz respeito à sua capacidade de criar produtos e serviços baseados em informações e, em alguns casos, bens físicos” (TAPSCOTT e WILLIAMS, 2007) Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 80 91 No exemplo apresentado do site Camiseteria, o processo de coprodução e de cocriação de valor (VARGO e LUSCH, 2006) se encontra na participação dos consumidores na votação das estampas que irão ser impressas, sem seguir modas ou tendências impostas pela mídia, apenas a opinião dos consumidores, como é propagado em seu manifesto (Anexo 1): “Nós acreditamos... ...que moda é para o povo e não para o mercado. A moda que criamos é a moda que você gostaria de usar. Não criamos tendências. Você é quem diz o que é bom ou ruim. Nossas camisetas são feitas para pessoas como você, não para modelos ou desfiles.”(www.camiseteria.com) No caso das criações, é permitido nos concursos a participação de leigos ou de designers profissionais e a participação voluntária ocorrem não só pela premiação de quem vence o concurso, mas pela oportunidade de ter sua estampa divulgada e seu trabalho reconhecido, uma nova experiência para o consumidor e uma forma de interação entre o fornecedor e o consumidor, tanto no processo de escolha, quanto no processo de cocriação. No mesmo site, diversas grandes empresas com marcas de renome podem promover concursos, na busca de estampas e padronizações que atendam a demanda do público. Isso reduz custos fixos de profissionais especializados e cria uma nova forma de divulgação da marca, interação e valorização do consumidor. Em contrapartida, a participação no processo criativo da empresa permite ao consumidor ter uma nova percepção no envolvimento do processo criativo. É uma relação ganha-ganha com benefícios mútuos para a empresa e seus clientes, consoante com a lógica de serviço dominante (SD) segundo Grönroos e Ravald (2011). Caso contrário, seria apenas mais uma marca de camisas entre centenas de outras que inundam o mercado. No Heavy Duty Beer Club, que se intitula pelo seu dono, o Zeca Urubu, como o bar com o “pior atendimento” do Rio de Janeiro, a experiência está na vivência de um ambiente que reflete o estereótipo do Rock, das gangs de “motociclistas”, e quando o cliente busca o seu próprio tira-gosto ou a sua bebida, ele interage com o ambiente e com os profissionais, na verdade se sente como se fizesse parte do bar, do ambiente, por se tornar um ator ativo na prestação de serviço e através da experiência, ele cocria valor pela interação. O dono do bar, Zeca Urubu, e sua equipe, são facilitadores e contribuem para a experiência e a criação de valor individual, pela experiência e pelo contexto. Os produtos não diferem de nenhum bar do gênero, mas o que traz a diferenciação é o contexto e o ambiente, e o cliente, já que aparentemente, o serviço de atendimento “é o pior do Rio de Janeiro”. No caso Benihana, desde o momento da espera, até o da preparação dos alimentos e do “show” dos chefs, a participação do cliente no consumo de bebidas no bar, no entendimento da espera para completar os oito lugares da mesa, nos aplausos e na interação com o chef que prepara o alimento e na desocupação da mesa, para que outros Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 81 91 clientes possam também interagir, é fundamental para a cocriação de valor e para o sucesso do modelo adotado. O cardápio não se torna o grande diferencial, mas mais uma vez, o ambiente, o show de malabarismo e a experiência vivida pelo cliente é o que fazem a diferenciação. Talvez seja um clássico exemplo de negócio que consegue atender a praticamente todas as dez premissas da lógica de serviço dominante (SD), segundo Vargo e Lusch (2008). Aparentemente, dentro de uma visão mais tradicionalista, o Heavy Duty Beer Club estaria na contramão da excelência na prestação de serviços. Por outro lado, o Restaurante Benihana seria o grande exemplo a ser apresentado. Os dois, no entanto, têm algo muito importante em comum: a participação do cliente no processo, experimentando e devolvendo uma experiência diferente. Nessa interação ativa entre cliente e prestador do serviço existe, de fato, a cocriação de valor (GRÖNROOS e RAVALD, 2011). A criação de valor, o entendimento de como se dá o processo, quem cria, como se cria e em que momento o valor é percebido, é de fundamental importância para o marketing, principalmente no momento em que o mercado apresenta uma grande variedade de ofertas de produtos e serviços. O consumidor, nesse cenário, pode ter opções alternativas atraentes e, portanto, uma falha ou deslize do fornecedor pode ocasionar a perda do consumo para um concorrente. Quando uma empresa como o Benihana, Heavy Duty ou a Camiseteria.com trabalha segundo a lógica de serviço dominante (SD), por sua vez, busca cativar e fidelizar seu cliente por meio de um processo filosoficamente simbiótico: uma interação que cria laços mutuamente benéficos. Com isso, o custo da troca para esse cliente, psicologicamente falando, torna-se mais elevado. A chance de ele fugir para o concorrente, assim, reduz-se substancialmente. A visão da lógica SD (serviço dominante) (VARGO e LUSCH, 2004, 2006, 2008; VARGO, MAGLIO e AKAKA, 2008) apresenta o entendimento das organizações como organizações de serviço e o consumidor como um cocriador e coprodutor, mudando a visão anterior de que o valor estava na entrega do produto e era inerente a ele. Com isto em sua sétima premissa fundamental (PF7) os autores propõem que “a empresa não entrega valor e sim proposta de valor”, trazendo uma nova forma de pensar o marketing e a visão empresarial. Na lógica tradicional, os profissionais de marketing não possuem o poder de influenciar diretamente o processo da criação de valor pelo consumidor, já que a criação de valor é algo inerente a ele. Os profissionais somente podem fazer propostas e promessas de valor e apresentar o valor potencial futuro. Numa lógica de serviço (GRÖNROOS e RAVALD, 2011), as oportunidades se ampliam pela interação e pela experiência no relacionamento e pela oferta de cocriação ao consumidor. A ação do marketing sai da dimensão da promessa futura e age ativamente pela interação e envolvimento do consumidor no processo de satisfação do cliente. Desta forma, existe uma ampliação no papel do marketing no processo de criação de valor, tanto nas atividades que envolvem bens, como nas atividades de prestação de serviços. Em outras palavras e fazendo um paralelo com os casos apresentados, TODOS participam ativamente do Marketing Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 82 91 (fornecedores, colaboradores e clientes), que deixa de ser uma responsabilidade de um departamento isolado da empresa. Assim, para Grönroos e Ravald (2011) o contexto da lógica de serviço traz alguns papéis a serem exercidos pelo marketing, pelos fornecedores e prestadores de serviços, apresentados nas cinco teses seguintes: (1) O objetivo para o marketing é dar suporte ao processo de criação de valor do consumidor; (2) A criação de valor recíproco é a base do negócio; (3) O consumidor é o criador de valor; (4) O fornecedor (provedor de produtos, prestador de serviços) é fundamentalmente um facilitador, mas durante a interação com o consumidor, o fornecedor pode somar, tornando-se, também, um cocriador de valor com eles; (5) Prestadores de serviços não só fazem propostas de valor. Durante as interações que surgem com os clientes, eles também contribuem para a satisfação de valor do cliente. Portanto, a visão de uma nova lógica traz mudanças no comportamento de gerenciamento e novas implicações para a prática dos negócios. Traz um novo olhar para o aproveitamento das oportunidades de cocriação e coprodução pela interação fornecedor-consumidor, para administradores e profissionais de marketing. Ter o cliente, o consumidor, não mais como um sujeito passivo da relação de troca, mas alguém que pode contribuir na criação de valor do produto ou serviço. Entender o papel ativo do cliente na criação de valor, e o papel de facilitador do provedor de produto ou serviço, contribui definitivamente para a melhoria e a exploração da experiência do consumidor. Isto exige nova postura, e desta forma, pode permitir a geração de um diferencial de peso e, em consequência, uma vantagem competitiva sustentável num mercado cada vez mais exigente. Nesse sentido, pode-se entender que o propósito do presente trabalho foi atingido. Os casos de sucesso apresentados mostram a importância para a prática empresarial da lógica de serviço, segundo as propostas teóricas e ideias apresentadas no artigo de Grönroos e Ravald (2011). Devem-se considerar, entretanto, algumas limitações desse ensaio, que se baseou em revisão parcial de literatura recente de Excelência em Serviços e em apenas três casos específicos. Portanto, generalizações não podem ser imediatamente extrapoladas para outras situações, em contextos similares ou diferentes. Assim, sugere-se um aprofundamento da pesquisa, buscando respaldar as considerações de ordem qualitativa por meio de pesquisas quantitativas correlacionadas. Sugere-se, também, estudos de casos comparativos focados em diversas regiões e países, para entender até que ponto os fatores socioculturais influenciriam no processo de cocriação de valor em serviços. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 83 91 7. REFERÊNCIAS BALLANTYNE, D. Dialogue and its role in the development of relationship specific knowledge. Journal of Business & Industrial Marketing, v. 19, n. 2, p. 114-123, 2004. COUTINHO, A. R.; RAMASWAMY, V. Cocriação made in Brazil: engajando clientes e stakeholders na geração de valor para todos. 24x7 comunicação, São Paulo, 17 Mai. 2012. Disponível em: <http://www.slideshare.net/24x7COMUNICACAO/criao-de-valorcocriao-made-in-brazil-12972562>. Acesso em: 13 ago. 2012. GRÖNROOS, C.; RAVALD, A. Service as business logic: Implications for value creation and marketing. Journal of Service Management, v. 22, n. 1, p. 5-22, 2011. KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de marketing. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2006. 750p. LUSCH, R. F.; VARGO, S. L. Service-dominant logic: Reactions, reflections and refinements. Marketing Theory, v. 6, n. 3, p. 281–288, 2006. PAYNE, A. F.; STORBAKA, K.; FROW, P. Managing the cocreation of value. Journal of the Academy of Marketing Science, v. 36, n. 1, p. 83-96, 2007. PRAHALAD, C. K.; RAMASWAMY, V. O futuro da competição: como desenvolver diferenciais inovadores em parceria com os clientes. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. 320p. TAPSCOTT, D.; WILLIAMS, A. D. Wikinomics: como a colaboração em massa pode mudar o seu negócio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2007. 368p. VARGO, S. L.; LUSCH, R. F. Evolving to a new dominant logic for marketing. Journal of Marketing, v. 68, n. 1, p. 1-17, Jan. 2004. VARGO, S. L., LUSCH, R. F. Service dominant logic: Continuing the evolution. Journal of the Academic Marketing Science, v. 36, n.1, p. 1-10, Spring 2008. VARGO, S. L.; MAGLIO, P. P.; AKAKA, M.A. On value and value cocreation: A service systems and service logic perspective. European Management Journal, v. 26, n. 3, p. 145– 152, 2008. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 84 91 ANEXO 1 – Manifesto do site camiseteria.com (http://www.camiseteria.com/manifesto.aspx) Nós acreditamos... ...em preço justo Acreditamos que o preço deve ser bom pra quem vende e pra quem compra. Assim se faz um bom mercado. Por isso o Camiseteria oferece produtos originais de alta qualidade sem cobrar valores absurdos por isso. ...em recompensa No Camiseteria, recompensamos nossos clientes e usuários por qualquer atividade que ajude a desenvolver o site. Damos prêmios para quem cria estampas, para quem envia fotos e para quem ajuda a divulgar o site. Desta forma todos saem ganhando e experimentam uma navegação mais participativa. ...que o povo tem o poder Acreditamos que a melhor forma de criar bons produtos é através das pessoas que os usam. O Camiseteria permite que qualquer um crie suas estampas, participe da nossa competição permanente e escolha os melhores produtos. Assim asseguramos que os produtos produzidos refletem o gosto e as tendências de nossos consumidores. Nunca produziremos uma camiseta que não tenha sido aceita pelo nosso público. ...que moda é para o povo e não para o mercado A moda que criamos é a moda que você gostaria de usar. Não criamos tendências. Você é quem diz o que é bom ou ruim. Nossas camisetas são feitas para pessoas como você, não para modelos ou desfiles. ...que moda é o reflexo da sua personalidade E por causa disso, todas as nossas camisetas são produzidas em edições limitadas, com uma eventual reedição. Exclusividade é a palavra de ordem no Camiseteria. Aqui você não vai encontrar uma camiseta que é produzida e vendida aos milhares numa grande rede de lojas. ...em transparência O Camiseteria é totalmente transparente com seus clientes e usuários. Jogamos limpo com vocês porque queremos formar um grupo de amigos e não um número de usuários. ...em opinião e comunicação No Camiseteria você tem a liberdade de opinar sobre as estampas, novidades e todo o resto. Você faz o nosso site. Sua opinião é fundamental para a nossa equipe e para o desenvolvimento do site. Faremos o possível para que você tenha voz aqui dentro. ...em atendimento de qualidade Faremos o impossível para manter um atendimento de altíssima qualidade. A gente quer manter nossos amigos, clientes e parceiros por perto. Por isso nosso e-mail estará sempre disponível para escutar a sua opinião. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 85 91 ...na simplicidade das coisas As pessoas que fazem o Camiseteria sabem que as coisas simples são sempre as mais bem aceitas, e por isso, sempre nos preocupamos em desenvolver nosso serviço para que seja o mais fácil possível para você. ...na coragem de pequenos empresários Somos uma empresa jovem e nem por isso pensamos pequeno. Queremos ser os melhores no que fazemos. Queremos ser competentes. Queremos que essa competência tenha impacto direto no nosso serviço. Teremos sempre a coragem de fazer o melhor para o Camiseteria, independente das adversidades econômicas e burocráticas brasileiras. Teremos a coragem de sempre almejar mais. Mais satisfação sua, mais qualidade, mais produtos. ...que o lucro é consequência Nós do Camiseteria queremos oferecer serviços e produtos de qualidade. O importante aqui é a experiência positiva no nosso site e fora dele, no uso dos nossos produtos. Lucro é apenas uma consequência dessa forma de pensar e agir. ...que o mercado é feito de seres humanos Pra nós, cada usuário é gente como a gente, com vontades, sentimentos e opiniões. E assim serão tratados. Sem distância. ...em comunidades O Camiseteria é uma comunidade. Comunidades servem a um propósito. A nossa tem como objetivo criar moda da melhor qualidade, acessível a todos. ...que os clientes merecem atenção Nós queremos que você compre conosco e daremos toda a atenção que pudermos lhe dar. ...em pessoas que fazem a diferença Nós sabemos que por trás de grandes conquistas existem grandes pessoas. Queremos sempre ter pessoas incríveis ao nosso lado, sejam clientes, amigos, fornecedores, parceiros, sócios ou funcionários. Pessoas como você, que agregam valor a nossa marca e fazem o nosso trabalho muito mais divertido. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 86 91 ANEXO 2 – Fotos do Heavy Duty (www.heavydutybeerclub.com) Zeca Urubu entrando no bar com sua moto Harley Davidson Zeca e seu show pirotécnico atrás do balcão, anunciando uma banda de rock Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 87 91 Foto do bar – palco para shows em cima do bar rebaixado Foto do bar – em dia de festa Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 88 91 Em dia de show – área externa do bar Foto do bar – lounge com mesa de sinuca e piso xadrez Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 89 91 Foto do bar – área interna Decoração das paredes do bar, com quadros e fotos de frequentadores Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 90 91 Caricatura do Zeca ilustrando sua fama de invocado Logomarca do Heavy Duty Beer Club Mais fotos em: http://www.heavydutybeerclub.com Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 91 91 ABSTRACT In servicing, one of the biggest challenges is to generate effective differentiation and customer loyalty, given the increased competition and the abundance of offers. In the traditional marketing view, the creation of value for the customer happened during the exchange of goods or services. Vargo and Lusch (2004, 2006, 2008), Grönroos and Ravald (2011), however, bring the concept of co-creation of value, emphasizing the importance of the interactions between customer and supplier in this process in order to identify strategies and opportunities for improvement of the value proposition. In addition to the literature review, we brought three cases for the readers to understand the service as business logic and its various implications. We found, as the authors emphasize, that the true locus of value creation for customers is placed in the use of the product or service, and the symbiotic interaction and relationship between customers and suppliers. Managers that know how to rethink their products and services within this new logic, with the customer as an active part of the process, will be more prepared to generate sustainable competitive advantage. Keywords: services, differentiation, value cocreation, client-oriented view Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 65-92 2013 92 91 SERVIÇOS EM EMPRESAS MANUFATUREIRAS Guido Maculan Sheila Christina Ribeiro Fernandes RESUMO Este artigo aborda o fenômeno da servitização no segmento industrial. A servitização consiste na oferta de valor a partir da integração da produção de bens com a prestação de serviços, com foco nas necessidades dos clientes, na geração de inovações e na diferenciação entre concorrentes no mercado. Assim, a partir de revisão de literatura sobre o tema, este artigo retrata casos de empresas e segmentos industriais marcados por mudanças estruturais com base no conceito da servitização. Para tanto, foram apresentados os casos das empresas Air Liquide, do ramo de gases industriais e a Océ, que atua na prestação de serviços de gestão de documentos e impressão profissional. Ambas as firmas reestruturaram suas operações e o posicionamento no mercado de forma a oferecer aos clientes uma solução completa em termos serviços. De maneira a caracterizar o processo de servitização no cenário brasileiro, o artigo discorreu também sobre o processo de mudança da indústria editorial nacional, que passou da simples produção de livros didáticos para a geração de conteúdo em múltiplas plataformas de mídia. Portanto, conclui-se que a servitização confirmase como tendência entre as empresas inseridas no atual cenário de mudanças tecnológicas profundas e demanda crescente e diferenciada por parte dos consumidores. Palavras-chave: gestão de serviços e operações, servitização, estratégia em serviços, empresas manufatureiras, Sistema Produto-Serviço Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 93 1. INTRODUÇÃO As condições de mercado, ao longo das últimas décadas se tornaram mais competitivas e turbulentas, sujeitas a mudanças constantes, (GEBAUER, GUSTAFSSON e WITELL, 2011), exigindo arranjos empresariais mais complexos, seja por conta da evolução tecnológica ou pela diversidade na demanda de consumidores com necessidades específicas, interessados em produtos e serviços com atributos diferenciados (NEU e BROWN, 2005). Essas influências têm provocado mudanças significativas na concepção estratégica de operações das empresas. Com um mundo cada vez mais globalizado, as fronteiras entre países se estreitam e a competição se torna mais acirrada. Empresas se digladiam em um oceano vermelho, levando seus produtos a uma comoditização. Na busca por novos mercados, tais empresas procuram associar serviços aos seus produtos adicionando valor a eles, e assim, procurando evitar a erosão de suas margens (CORRÊA et al., 2007). Por isso, indústrias tradicionais têm ampliado o escopo de atuação para se diferenciarem de concorrentes. Com isso, empresas manufatureiras passaram a redirecionar esforços para um foco no cliente e na inovação. Além disso, nota-se no mercado uma nítida reorientação estratégica de indústrias, antes voltadas somente à fabricação de produtos, agora preocupadas também com a prestação de serviços (GEBAUER, GUSTAFSSON e WITELL, 2011). Esse processo pode, então, ser traduzido no desenvolvimento de soluções capazes de atender plenamente às necessidades dos consumidores. A integração de oferta de produtos a serviços é conhecida como servitização, citada pela primeira vez pelos autores Vandermerwe e Rada, em 1988. Atualmente, a servitização é amplamente reconhecida como um processo de criação de valor com efeitos positivos em duplo sentido, tanto para empresas como para clientes. Por isso, com o objetivo de investigar esse conceito e analisar suas implicações sobre as práticas gerenciais de indústrias, este trabalho pretende discorrer sobre o tema. Serão aqui contempladas as definições, implicações gerenciais e contradições desse modelo estratégico. Como forma exemplificativa será apresentado o caso de uma indústria adotante da servitização como estratégia de operações, reconhecida como líder mundial no segmento de gases industriais. Para ilustrar o tema de servitização e as implicações gerenciais decorrentes do modelo, será analisado um pequeno estudo de caso sobre uma indústria do setor de gestão de documentos e impressão profissional. Finalmente, com a finalidade de enriquecer a análise, este trabalho pretende ainda abordar a servitização no mercado editorial brasileiro e demonstrar como a nova concepção de serviços, adotada por empresas do setor, repercutiu em diversas mudanças internas e externas. Este trabalho está, então, dividido em cinco seções. A primeira apresentará os principais conceitos e reflexões relacionados ao tema da servitização em indústrias. Em Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 94 seguida, será comentado o exemplo de uma empresa conhecida por adotar serviços como estratégia de atuação no mercado. A terceira seção é dedicada a um estudo empírico sobre as repercussões gerencias com a incorporação de serviços. A próxima seção analisa as transições ocorridas no mercado de livros didáticos no Brasil, na era dos serviços. Finalmente, serão apresentadas considerações a respeito do fenômeno da servitização no meio empresarial. 2. PLATAFORMA TEÓRICA 2.1 O contexto da servitização O mercado atual pode ser caracterizado como um espaço permanente de mudanças, marcado pela demanda diversificada e crescente. As indústrias são cada vez mais desafiadas a oferecer novos produtos com qualidade superior, no menor tempo possível. Para tornar ainda mais complexo o cenário, as indústrias enfrentam também o processo constante de inovação tecnológica, cuja principal consequência é a redução do ciclo de vida dos produtos (FRY, STEELEe SALADIN, 1994). Desde que o tema foi apresentado por Vandermerwe e Rada (1988), houve um fluxo constante de pesquisas sobre o assunto. Segundo Baines et al. (2009), a maioria dos artigos sobre servitização cobre tópicos como a classificação do fenômeno, os drivers, as orientações e os métodos para sua implementação. Entretanto, há pouca literatura com orientações aos profissionais interessados em implantar de fato a abordagem da servitização nas empresas. 2.2 Definição de servitização Os autores Baines et al. (2009) explicam que na servitização os termos produtos e serviços estão ligados intrinsecamente. Antes, porém, é pertinente definir o próprio conceito de serviço e de produto. No ambiente de manufatura, a terminologia de produto é bem compreendida, sendo em geral caracterizado como algo tangível. Já o termo serviço é controverso, muitas vezes definido com base no que ele não é. Os mesmos autores o definem como uma atividade econômica que não resulta na posse de um ativo tangível, sendo constantemente referido como uma oferta. Vandermerwe e Rada (1988) constataram que a servitização tornou-se um movimento de crescente adesão pelas indústrias. Com ela as empresas buscam proporcionar mais e melhores ofertas. Esses autores definiram servitização como um estágio diferenciado alcançado por empresas manufatureiras, caracterizado por um enfoque no cliente com a finalidade de ofertar a ele uma combinação de produtos, serviços, suporte, Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 95 autoatendimento e conhecimento. A partir dessa concepção surgiram algumas definições, como a proposta por Baines et al. (2009) que diz: a servitização é a inovação de processos e recursos de uma organização, com a mudança de venda restrita de produtos para produtos e serviços integrados, de maneira a agregar valor. Para os autores, a servitização como estratégia é eficaz, sobretudo, em mercados com competição baseada em preços. De forma alternativa, a servitização pode ser definida como o potencial para adicionar valor ao cliente. Para a empresa “servitizada” é possível alcançar novas posições no mercado ao explorar atividades mais rentáveis ao atuar em nichos em downstream (BAINES et al., 2009). O termo Product-Service Systems (PSS), segundo Baines et al. (2009) é próximo ao conceito de servitização. No entanto, diferencia-se pela origem dos seus pesquisadores, a Escandinávia, e a relação com debates sobre a oferta de soluções integradas como caminho para a sustentabilidade e meio de redução de impactos ambientais. O conceito de PSS pode ser definido, portanto, como um produto integrado à oferta de serviços que agrega valor em uso (BAINES et al., 2007). 2.3 Uma oferta de valor e diferentes tipos de ofertas A maneira como uma empresa se move na cadeia de valor onde está inserida, pode ditar seu crescimento e sua capacidade de diversificação. Quanto mais eficaz for a habilidade em mover-se nessa cadeia, maior será a vantagem competitiva (DAVIES, 2004). A partir da definição de servitização proposta por Vandermerwe e Rada (1988), começouse a perceber que cada vez mais empresas procuravam agregar valor aos seus negócios por meio do oferecimento de serviços. No entanto, para conquistar uma vantagem competitiva, não basta apenas prover serviços, mas deve haver um entendimento pleno de como os serviços combinados com produtos proporcionarão soluções e agregarão valor aos clientes. Os motivos para a inclusão de serviços na oferta de valor de uma empresa podem ser diversos: estreitar o relacionamento com os clientes, criar oportunidades de crescimento em mercados maduros e balancear os ciclos econômicos com diferentes fluxos de caixa (ALMEIDA, CAUCHICK e SILVA, 2011). Os serviços podem ser classificados de acordo com as ofertas da empresa. O termo oferta pode ser interpretado como o valor oferecido e entregue ao cliente. A classificação é importante para o entendimento do fenômeno da servitização e das mudanças decorrentes desse processo (ALMEIDA, CAUCHICK e SILVA, 2011). A partir de definições na literatura, os autores classificaram as ofertas de serviços representadas em cinco categorias: natureza das ofertas, temporalidade, finalidade das ofertas, natureza da interação com o cliente e abrangência das ofertas. A classificação das ofertas está representada na Figura 1, a seguir. É possível notar como a abordagem de serviços demanda uma sofisticação de atividades da empresa. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 96 Figura 1 - Classificação das ofertas de serviços Fonte: Almeida, Cauchick e Silva (2011). 2.4 Servitização: fonte de vantagem competitiva? Segundo Kindstrom (2010), na busca por vantagens competitivas e maiores receitas, as empresas tradicionais de manufatura procuram estender o escopo de atuação ao incorporar serviços aos produtos. Com isso, elas esperam expandir a presença nos atuais mercados de atuação. No entanto, para isso ocorrer, os gerentes dessas empresas precisam compreender o processo de transição de foco restrito na produção de bens para ênfase na oferta de produtos integrados a serviços. Enquanto o nível estratégico das indústrias reconhece o cenário de mudanças, seus gerentes ainda têm dificuldades em compreender como o novo modelo de negócios deve ser abordado na prática. O sucesso na transição da produção restrita de bens para a oferta de soluções integradas depende tanto do rearranjo organizacional como da criação de serviços específicos, assim como da ênfase no desenvolvimento e inovação de novos serviços. No entanto, empresas estabelecidas, com modelos de negócios maduros, podem encontrar dificuldades para se adaptar ao novo cenário, marcado pela inovação permanente (KINDSTROM, 2010). Ao adotar o modelo de negócios baseado em serviços, as empresas precisam considerar mudanças em todas as áreas do negócio. Não basta apenas modificar a proposta de valor (inovar na oferta de serviços), mas deve haver um alinhamento (interno e Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 97 externo) para criar e capturar valor. Assim, à medida que aumenta o conteúdo de serviço, a organização deve considerar novos parâmetros do modelo de negócio (KINDSTROM, 2010). Abaixo, a Tabela 1 descreve os principais aspectos de um modelo de negócios baseado em serviços. Cabe destacar que a proposta de oferta de valor com base em serviços é marcada por mudanças em diversas dimensões como relacionamento com o cliente, modelo de geração de receita e diferenciação no mercado. Tabela 1 - Modelos de negócio baseados em serviços Parâmetros Proposição de valor Elementos principais Visualização Interação mais próxima do cliente Portfólio de oferta dinâmica Mecanismos de receita Novo modelo de receita Objetivos gerenciais Estruturar novas ofertas e torná-las tangíveis Comunicar o novo valor criado (pode ser intangível) Obter excelente entendimento das operações dos clientes Focar novos parâmetros de vendas, impulsionados, sobretudo, pelo valor percebido pelos clientes em vez de ênfase em custos internos Funções exclusivas de Alcançar ímpeto e foco organizacional desenvolvimento de serviços Processo de desenvolvimento Criar um processo de decisão e estabelecer etapas Cadeia de de serviço estruturado de desenvolvimento valor Novo sistema de recompensa Criar ímpeto para mudanças Ampliação da base de Adquirir recursos (ex.: prestação de serviços antes recursos inexistentes na empresa) Marca Associar a marca do produto a valores de serviços Estratégia competitiva Diferenciação Possibilidades crescentes de diferenciação Fonte: Kindstrom (2010), com adaptações dos autores. O aumento do conteúdo de serviços nas propostas de valor pode ser visto como primeiro passo para atender as necessidades dos clientes, possível a partir de pesquisas de mercado realizadas junto aos consumidores, de modo a oferecer a eles o serviço esperado (KINDSTROM, 2010). 2.5 Paradoxo do serviço Em busca de margens mais altas, empresas de manufatura têm demonstrado um crescente interesse em associar produtos e serviços, como forma de adquirir uma fonte extra de receita e lucro (GEBAUER, FLEISCHe FRIEDLI, 2005). Essas empresas acreditam que expandir o escopo do negócio e incluir serviços, parece ser o caminho certo para a diferenciação. Essa seria uma forma de obter uma vantagem competitiva que propiciará margens mais elevadas, além de atender as necessidades dos clientes, cada vez mais complexas. Os autores Gebauer, Fleisch e Friedli (2005) observam, entretanto, que muitas organizações são acometidas por um fenômeno denominado paradoxo do serviço em empresas de manufatura. Essas empresas investem pesadamente no processo de Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 98 servitização, incorrendo em um aumento de custos, mas não obtêm o retorno financeiro esperado. Para os autores, as principais razões que explicam o paradoxo de serviços compreendem dimensões tanto organizacionais como comportamentais. Em primeiro lugar, para que qualquer estratégia seja implementada com sucesso, é necessário o envolvimento e comprometimento da gerência da empresa, para apoiar o processo de transição. No entanto, há fenômenos cognitivos que limitam a incorporação de serviços no negócio. O primeiro fenômeno é uma ênfase exagerada nas características óbvias e tangíveis. Isso significa que os gerentes preferem investir recursos em produtos a serviços, simplesmente porque são tangíveis. O segundo fenômeno é a falha em reconhecer o potencial econômico que a extensão de serviços pode proporcionar à empresa. E o último fenômeno cognitivo diz respeito à aversão ao risco de gerentes dessas empresas de manufatura. Eles preferem investir em produtos, que têm menores riscos associados, a investir em resultados incertos, porém mais rentáveis, como serviços. Em segundo lugar, para implementar com sucesso a abordagem de serviço são necessárias diversas mudanças na estrutura organizacional de empresas de manufatura. As principais recomendações gerenciais nesse sentido são: Estabelecer um processo orientado para o mercado e desenvolver um processo de serviço Iniciar um marketing de relacionamento Definir uma estratégia de serviço clara Estabelecer uma organização de serviço à parte Criar uma cultura de serviço. De acordo com Gebauer, Fleisch e Friedli (2005), esses fatores tendem a ser os gatilhos organizacionais mais adequados para possibilitar um aumento de receitas de maneira desejada. A última razão para a ocorrência do paradoxo de serviço diz respeito a como lidar com a uma série de eventos inesperados durante a implementação do processo de servitização. Para diminuir os riscos, os gestores de empresas de manufatura devem planejar cuidadosamente as mudanças organizacionais de forma a assegurar a definição adequada dos objetivos. A partir disso, os funcionários tornam-se mais aptos a aceitar as metas e a se comprometer em alcançá-las. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 99 2.6 Qual estratégia de serviços adotar? Drives pelos quais é possível “servitizar” Apesar do conceito de servitização ter sido introduzido no final da década de 80, desde então houve poucas pesquisas relacionadas à implementação de estratégias de serviço em empresas com estruturas organizacionais ímpares. Para conseguir entender a forma como diferentes estratégias se correlacionam de acordo com características específicas de cada organização, Gebauer et al. (2010) consideram três perspectivas: a) Serviço orientado à cultura corporativa: Envolve dois constructos, a saber: os valores corporativos da empresa e o comportamento dos empregados. Em termos práticos refere-se ao valor dos serviços dentro das empresas de manufatura e a forma pela qual os trabalhadores se comportam em uma cultura voltada a serviços b) Serviço orientado à gestão de recursos humanos: Envolve três constructos, a saber: o recrutamento, o treinamento e a avaliação e remuneração de pessoas (HOMBURG, FASSNACHT e GÜNTHER, 2002) c) Serviço orientado à estrutura organizacional: Envolve dois constructos, a saber: especificidade organizacional e proximidade da organização de serviço de seus clientes. Gebauer et al. (2010) afirmam que uma mudança na orientação de uma empresa de manufatura pode ser implementada a partir de estratégias diversificadas de serviços. Entretanto, a implementação de estratégias de serviços de sucesso pode depender de fatores diferentes em cada organização. De acordo com o tipo de serviço que a empresa pretende oferecer, pode ser requerido um conjunto específico de competências. Uma empresa que deseje prestar serviços de pós-venda, por exemplo, terá maior propensão a ser bem-sucedida se tiver a orientação a serviços e proximidade com os consumidores, como elementos de sua cultura corporativa. Por outro lado, se a empresa tiver foco no apoio a clientes, tenderão alcançar maior sucesso empresas com elevada orientação para serviços. Logo, a adoção da servitização pode ser vista como uma série de medidas, traduzidas em diferentes estratégias de serviços de acordo com a situação específica de cada empresa. Somente quando os gestores compreendem as características da estratégia de serviço de suas empresas é possível implementar a estratégia correta. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 100 2.7 As consequência de uma orientação para serviços É amplamente reconhecido que o ambiente atual de negócios é extremamente competitivo. Isso exige que as empresas de manufatura procurem ganhar destaque no mercado, pois acrescentar serviços a produtos é a principal forma de alcançar diferenciação dos concorrentes. Assim, os serviços têm o objetivo de aumentar a oferta dos principais produtos ou então, adicionar valor a eles. Aliado a isso, as rápidas mudanças tecnológicas, ciclos de vida de produtos menores e necessidades de rapidez no time-tomarket têm pressionado empresas a se manterem competitivas. No entanto, a inovação de produtos por si só já não é suficiente para garantir o sucesso do negócio (HOMBURG, HOYER e FASSNACHT, 2002). Em resposta a essas pressões, empresas como IBM, Xerox, Caterpillar, entre outras, buscam se tornar provedoras de soluções totais, para obter vendas superiores aos seus concorrentes e aumentar a importância das receitas de serviços em percentagem do volume de negócios total (ANTIOCO et al., 2008). Diante disso, as empresas de manufatura precisam entender quais tipos de parâmetros organizacionais irão gerar algum benefício e de que forma irão afetar a relação entre uma orientação para serviços e as vendas relativas aos produtos (ANTIOCO et al., 2008). Homburg, Hoyer e Fassnacht (2002) explicam que essa orientação está baseada em três variáveis: O número de serviços oferecidos O número de consumidores receptores dos serviços Pró-atividade da empresa na oferta de serviços. Os autores consideram válida tal abordagem porque contempla questões relativas ao tipo e à quantidade de consumidores para os quais o serviço é oferecido. A consequência de um foco em serviço pode levar a um relacionamento de longo prazo da empresa com os clientes. Isso acontece por conta da interatividade entre eles, alcançada após a adaptação de parâmetros organizacionais (ANTIOCO et al., 2008). Assim, quando uma empresa tem esse enfoque nos seus negócios, os resultados são: Possibilidade de troca de conhecimento específico Estreitamento de relações Cocriação de valor. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 101 3. UM EXEMPLO DE SERVITIZAÇÃO Com o objetivo de apresentar um exemplo prático de empresa manufatureira adotante da lógica da servitização, será abordado o caso da empresa Air Liquide, do segmento de gases industriais. 3.1 Air Liquide A Air Liquide é uma empresa francesa, fundada em 1902, considerada como líder mundial na fabricação e comercialização de gases para uso na indústria, saúde e meio ambiente. Atualmente opera em 80 países, inclusive no Brasil desde 1945, por meio de 150 subsidiárias, que ao todo empregam mais de 46 mil funcionários. A Air Liquide atua basicamente no fornecimento de oxigênio, nitrogênio, hidrogênio e muitos outros produtos e serviços para clientes de diversos segmentos como indústria siderúrgica, petroquímica, química, vidros, eletrônica, papel e celulose, metalúrgica, alimentos, saúde e aeroespacial. No ano de 2011, alcançou receita de $ 14,5 bilhões de euros (AIR LIQUIDE, 2012). De acordo com os autores Maussang, Zwolinki e Brissaud (2006), a Air Liquide atua no fornecimento de produtos como gases e equipamentos industriais. No entanto, é clara a adoção, por parte da companhia, de uma orientação de comercialização de produtos associada à oferta de serviços. 3.1.1 Concepção estratégica de serviços A empresa passou a incorporar serviços à venda de produtos em razão de motivos como atender as necessidades e garantir a satisfação dos clientes, reduzir custos e gerenciar a informação de modo estratégico, analisados a seguir. Para melhor exemplificar o caso abordado, será aqui discutida a prestação de serviços ligados à venda e operação da estação de hélio liquefeito, um dos produtos da Air Liquide, customizado conforme o tipo de atividade da empresa compradora. A busca por atender as necessidades dos clientes e garantir a sua satisfação explicase porque uma das principais motivações de uma empresa de gases é a expansão do seu leque de serviços. Por isso, uma preocupação constante dos clientes era o tempo e esforço gastos no pedido de reposição de gases. A partir daí, a Air Liquide observou uma oportunidade de oferecer um serviço de reposição automática, de forma que tanto a provedora de gás quanto o próprio cliente pudessem, de forma remota, acompanhar o nível de suprimento de gases. Com isso, o cliente não precisava mais se preocupar com o ressuprimento, realizado agora automaticamente pela Air Liquide. Esse serviço é, portanto, uma forma simples, porém efetiva, de garantir a satisfação do cliente e destacar a empresa das demais concorrentes do mercado, conforme argumentam (GEBAUER, GUSTAFSSON e WITELL, 2011) em relação à orientação estratégica de firmas com foco na servitização. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 102 Além da venda da estação de gás hélio liquefeito, representada na Figura 2, a companhia oferta diversos outros serviços associados ao produto. A estação de gás é do tipo turnkey, pronta para uso imediato. A busca por desenvolver um produto com essa característica se explica pela oportunidade e conveniência de reduzir o tempo de criação do sistema, caso o cliente o fizesse. Esse quesito, portanto, demonstra o grau de intensidade da interação com o cliente (CORRÊA et al., 2007). A Air Liquide disponibiliza também um especialista técnico para acompanhar, nas instalações do cliente, a fase inicial de uso da estação, durante um período de três semanas. O trabalho do técnico é iniciar e ajustar os parâmetros de funcionamento da estação. Esse tipo de solução permite aumentar o nível de satisfação do cliente, porque garante o início imediato da operação, de forma rápida e adequada. Figura 2 – Helial © System Fonte: Maussang, Zwolinski e Brissaud (2006). Outro aspecto importante é a questão de custos, tanto pela ótica do cliente quanto da Air Liquide. O envio de um técnico para assistir à empresa cliente nos primeiros dias de uso da estação é justificado em termos de custos. Isso porque, como o sistema de liquidificação é complexo e automatizado, o ajuste de parâmetros na fase inicial de uso é fundamental para o adequado funcionamento da estação. Portanto, se os parâmetros não estão ajustados apropriadamente, logo surgem os primeiros problemas e descontentamentos dos clientes. Uma prática comum em outras empresas seria o envio Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 103 imediato de um especialista para solucionar a questão, por diversas vezes, se necessário, incorrendo em gastos e perda de tempo. Com uma abordagem alternativa para o problema, a Air Liquide encaminha um técnico uma única vez, sem a necessidade de solicitação pelo cliente para a realização dos acertos necessários. Essa é uma prática de atuação preventiva, pois não se apoia no surgimento das primeiras falhas para, então, agir para solucioná-las. Cabe acrescentar que, juntamente com a venda da estação de hélio liquefeito a Air Liquide oferece treinamento ao cliente para habilitá-lo a utilizar o sistema de forma plena e a corrigir, ele mesmo, eventuais problemas. Nesse aspecto, Corrêa et al. (2007) destacam a importância da firma em reforçar a atenção no treinamento do cliente, à medida que maior parcela de atividades são a ele delegadas. A Air Liquide oferece ainda um serviço de monitoramento remoto da estação de hélio liquefeito. Trata-se basicamente do monitoramento à distância dos parâmetros de funcionamentos do sistema, possível a partir da instalação, na própria estação, de um dispositivo que registra dados de desempenho e os transmite por rede à central de serviço de manutenção da Air Liquide. Com isso, a empresa consegue, por exemplo, identificar exatamente o local de ocorrência de uma falha. Como benefícios, a facilidade e a rapidez na manutenção. Outro aspecto relevante do monitoramento remoto é a redução de custos com a mobilização de equipes locais. Isso porque a empresa mantém contratos com clientes na Europa e Ásia. Assim, em momentos de eventuais problemas, basta somente o contato do cliente para que seja enviado um técnico da França para o país de origem do cliente. A Air Liquide utiliza-se do serviço de monitoramento à distancia também como uma oportunidade de melhoria no sistema de hélio liquefeito. Quando um determinado problema é notificado por diversas vezes, a empresa busca corrigir a falha e evitar que ela ocorra novamente. Como um feedback, a empresa faz uso dessas informações sobre problemas recorrentes para, então, desenhar novos sistemas já modificados, a fim de reduzir o número de falhas comuns encontradas nos modelos anteriores de estações de hélio liquefeito. 3.1.2 Considerações sobre o caso O caso descrito pode ser analisado a partir das cinco dimensões propostas por Almeida, Cauchick e Silva (2011), para a classificação das ofertas de serviços. No quesito natureza das ofertas, o pacote de valor ofertado pela Air Liquide pode ser categorizado como venda de produto tangível com serviços acompanhados. Quanto à temporalidade, a disponibilização dos serviços ocorre em dois momentos. Primeiro com serviços anteriores à compra, no caso específico da construção de plantas industriais de acordo com as necessidades específicas do cliente. Em seguida, no momento pós-vendas, com a prestação de diversos serviços de monitoramento de desempenho. No aspecto finalidade das ofertas, Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 104 a Air Liquide oferece serviços ao cliente, uma vez que presta suporte técnico para uso do produto. Sobre a natureza de interação com o cliente, a empresa estabelece relacionamentos com a parte compradora, ao longo do pós-venda. Finalmente, em relação à abrangência das ofertas, a Air Liquide disponibiliza soluções integradas, ou seja, não se restringe à comercialização do produto, mas além, inclui diversos serviços para manter em pleno funcionamento a estação de hélio liquefeito. Por isso, o exemplo da Air Liquide é emblemático ao demonstrar como uma empresa consegue aliar a oferta de produtos a uma cesta de serviços, de forma a obter redução de custos, otimizar as operações e ainda, oferecer soluções completas aos cliente, garantindo a satisfação deles. A empresa consegue, a partir da prática da melhoria contínua, desenvolver produtos inovadores e menos propícios a falhas. Como consequência, a opção pela orientação de serviços confere destaque à empresa frente aos demais concorrentes da indústria de gases. Por essa razão, a abordagem inovadora na oferta de soluções integradas pode ser considerada como uma as explicações da posição de liderança mundial da Air Liquide no segmento de gases industriais. 4. ESTUDO DE CASO O estudo de caso a seguir retrata o processo de adoção da servitização pela empresa holandesa Océ, do segmento de gestão de documentos e impressão profissional. O foco aqui é demonstrar quais mecanismos a empresa lançou mão para alcançar o propósito de inserir serviços no modelo estratégico de oferta de valor aos clientes. 4.1 Océ Fundada em 1877, na Holanda, a Océ atua no setor de gestão de documentos e impressão profissional. Em 2010, a companhia foi adquirida pelo grupo japonês Canon. Juntas, as duas companhias pretendem criar a empresa número nº 1 do setor, ao combinar inovação com uma ampla oferta de serviços. Os produtos e serviços oferecidos pela empresa são sistemas de impressão e cópia para escritórios, impressoras de alta produção e sistemas de impressão em grande formato. A Océ é também reconhecida internacionalmente pelos serviços de outsourcing de documentos. Está presente em mais de 100 países e, atualmente emprega cerca de 22 mil funcionários. No ano de 2011, a empresa apresentou faturamento na ordem de $ 2,5 bilhões de euros (OCÉ, 2012). A fim de melhor detalhar o caso, será abordada a questão da servitização na unidade de sistemas de impressão de grandes formatos. Essa unidade comercializa equipamentos e serviços de impressão para tamanhos acima do A3, assim como serviços adicionais de consultoria, financeiros e de manutenção. A opção por abordar a empresa Océ justifica-se pela liderança da empresa, durante anos, no setor de impressão de Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 105 grandes formatos, além disso, segundo a própria companhia, o seu foco está no desenvolvimento de soluções para atender seus clientes. Como forma de enriquecer a discussão do caso, serão apresentados tópicos como as motivações para a mudança na ótica de negócios com base na oferta de serviços, variedade de serviços oferecidos pela companhia, além de mudanças necessárias de adequação ao novo perfil da empresa. Afinal, como mencionado neste trabalho, há pouca ênfase em textos com orientações voltadas à implementação de serviços, em termos práticos nas empresas. 4.1.1 Concepção estratégica de serviços De acordo com Visintin (2012), uma intensa competição no setor de impressão de documentos desencadeou o desenvolvimento de diversas soluções, em geral, baseadas em produtos e serviços de manutenção. O objetivo básico era garantir a satisfação do consumidor a partir do funcionamento adequado dos equipamentos de impressão. Outro momento importante do setor foi o início da oferta de serviços relacionados a sistemas de impressão em rede, com serviços de suporte ao gerenciamento do processo de impressão. Atualmente, os serviços de impressão integram sistemas com terminais de computadores interligados em rede para operações de cópia, escaneamento e impressão, utilizados por usuários com preferências e competências distintas. Nesse cenário, a Océ foi a primeira companhia do setor a abandonar a lógica de produção e comercialização de produtos para incorporar a abordagem de negócio baseada na oferta de soluções aos clientes. A transição na orientação da empresa repercutiu, inclusive, em adaptações internas, ao longo de cinco anos. A primeira delas foi a de cunho organizacional, de modo a reforçar a interface entre pesquisa e desenvolvimento (P&D) e serviços. A partir disso, foi criada uma unidade especial da empresa de modo a integrar o pessoal de marketing, vendas e P&D no relacionamento e contato com o cliente. O segundo passo fundamental compreendeu o desenvolvimento de serviços no formato de solução integrada para impressões em grandes formatos, considerada pela equipe da empresa como uma tarefa complexa. Por isso, foram criadas três categorias de serviços: Equipamentos: instalação e operação Utilitários: drives, por exemplo Aplicativos. Para cada tipo de serviços a Océ desenvolveu uma política específica de suporte, compartilhada entre o pessoal da área de marketing, P&D e serviços. Com isso, era Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 106 possível ajustar uma solução aos problemas específicos de cada cliente, reportados pelos representantes de vendas. A empresa desenhou também algumas ferramentas com o objetivo de auxiliar os representantes de vendas na interação junto aos clientes como checklists, formulários de pedidos, contratos de manutenção com cláusulas claras, entre outras. Isso permitiu criar nos representantes de vendas a consciência sobre o valor dos serviços que, por meio deles, eram oferecidos aos clientes. Desenvolveu, assim, uma espécie de cultura de serviços. Concluída a etapa de estabelecimento de uma cultura de serviços, o passo seguinte considerou a tarefa de desenvolver um framework apoiado em três pilares sendo: a) os serviços oferecidos, b) o processo geral de entregas e, c) um quadro esquemático com quatro abordagens específicas de entregas. Esse framework será discutido com mais detalhes a seguir. A Tabela 2 abaixo apresenta alguns dos serviços oferecidos pela companhia. Como é possível perceber, a empresa integra diversos serviços de modo a oferecer ao cliente uma solução completa de serviços de impressão em grandes formatos, contemplando inclusive, mecanismos de financiamento para acesso aos produtos e serviços da Océ. Tabela 2 – Serviços oferecidos pela Océ Serviços oferecidos Principais atividades realizadas Serviços de consultoria de documentos Análise de ambiente de negócios, mapeamento de processos e análise de fluxo de documentos. Serviços de consultoria Serviços de consultoria de sistema Análise do ambiente técnico, especificação de requisitos de sistema, design funcional e desenho técnico. Serviços de serviços de engenharia Implementação de Desenvolvimento de formatos de impressão, aplicações e integração. serviços Serviços de campo Instalação. Serviços de educação Treinamento para usuários e administradores do sistema Suporte de hardware, manutenção de software, migração de dados, Serviços de suporte backup e recuperação de dados, peças, consumíveis e help desk. Serviços financeiros Serviços de leasing financeiro e locação Fonte: Maussang, Zwolinski e Brissaud (2006). A empresa desenvolveu, em seguida, um processo geral de entregas com base em seis fases, sendo, orientação, investigação, análise, desenho, implementação e suporte. De forma resumida, a Océ busca identificar e priorizar os problemas dos clientes. Após isso, na fase de investigação, a empresa pesquisa com maiores detalhes os problemas dos clientes. Na fase de análise a empresa identifica uma possível solução para o problema. As etapas seguintes são desenhar e implementar a solução. Por fim, a empresa oferece suporte após a implementação da solução. A sequência de atividades relatadas pode ser visualizada na Figura 3, a seguir. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 107 Definição de de requisitos requisitos do cliente Definição do cliente Customização integração Customização ee integração Desenvolvimento Suporte Figura 3 – Processo geral de entregas da Océ Fonte: Visintin (2012). O framework da Océ inclui ainda uma abordagem de entregas, definidas em quatro etapas: produto, pacote, sistema de integração e processo de reengenharia. Cada abordagem é aplicada de acordo com as necessidades específicas do cliente. Para melhor visualização das abordagens citadas, vide Figura 4. O principal resultado observado pela empresa com a aplicação do framework é a possibilidade de oferecer aos clientes uma solução eficiente e altamente customizada e, que em alguns casos, pode servir como padrão para desenvolvimento de novos serviços para os demais clientes. . Abordagem de produto Abordagem de pacote Abordagem de sistema integrado Abordagem de processo de reengenharia Figura 4 – Processo de entregas da Océ de acordo com cada abordagem específica Fonte: Visintin (2012). 4.1.2 Considerações sobre o caso O caso da Océ insere-se no modelo conceitual de negócios baseados em serviços, proposto por Kindstrom (2010). A empresa aplicou, ao longo de anos, diversos mecanismos para adaptar suas operações ao novo cenário competitivo. Dentre os Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 108 parâmetros considerados, em relação à proposição de valor, pode-se destacar o trabalho da Océ no aspecto de visualização, ou seja, estruturou novas ofertas de serviços. No quesito mecanismo de receitas, a empresa desenvolveu novos meios de geração de fluxo de caixa, ao ofertar no mercado pacotes de soluções integradas, em substituição à comercialização de produtos isolados. Quanto à cadeia de valor, pode-se citar a criação de metodologia de desenvolvimento de serviço como uma inovação nessa dimensão. Por fim, no que tange ao parâmetro estratégia competitiva, a empresa buscou, cada vez mais, destacar-se no mercado a partir da diferenciação, com a oferta de serviços exclusivos aos clientes. Portanto, como conclusão, é possível afirmar que para a empresa ser conhecida no mercado como uma provedora de soluções de impressões em grandes formatos, foi preciso antes adequar a estrutura organizacional e, neste caso em especial, desenvolver um método para conhecer, desenvolver e implementar soluções adequadas às necessidades dos clientes. Outro tópico a se destacar neste caso é a concepção integrada de solução oferecida pela Océ. A empresa busca aliar diversos serviços ao cliente, de forma a criar valor para ele, de maneira diferenciada. Esse tipo de abordagem destaca a empresa das demais concorrentes no mercado e torna a Océ um benchmark como provedora de soluções no segmento de impressões profissionais. Afinal, como defende Davies (2004), quanto maior a habilidade de uma empresa em mover-se na cadeia de valor, maior será sua vantagem competitiva. 5. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA NO BRASIL Nesta seção serão discutidas as implicações do conceito de servitização sobre as práticas empresariais brasileiras. Para tanto, será analisado o mercado nacional de editoras de livros didáticos, dada a contínua adesão à abordagem de serviços por empresas do segmento. Em termos econômicos, a importância do setor pode ser expressa no faturamento obtido pelas editoras no ano de 2009, cerca de 1,03 bilhão de reais. A oportunidade de estudar esse mercado em especial explica-se pela nítida incorporação, nos últimos anos, da lógica da servitização na estratégia de atuação de editoras nacionais, em substituição à lógica industrial de produção e distribuição de livros. Essa mudança repercutiu, inclusive, no perfil do profissional que trabalha nas editoras, assim como na estrutura organizacional dessas empresas. A transição ocorreu como forma de adaptação ao novo modelo de competição no mercado. 5.1 Mudanças no mercado editorial brasileiro Segundo Ferreira Júnior (2011), as editoras brasileiras perceberam que o core business delas passou da criação e produção de livros (bens tangíveis), para a elaboração Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 109 e desenvolvimento de conteúdo didático e a prestação de serviços. A produção física, aliás, praticamente deixou de ser realizada no âmbito das editoras, que em geral, aboliram os departamentos gráficos e terceirizaram esse tipo de atividade. No mercado editorial, inclusive, os serviços são considerados como qualificadores, ou seja, tornaram-se essenciais para atuação de editoras no mercado. Enquanto alguns serviços específicos são considerados como ganhadores de pedidos. As mudanças abrangem também a forma de pré-venda e promoção dos livros. Em geral, os funcionários das editoras atuam em contato direto com escolas e professores, o público-alvo deste negócio. Essa abordagem permite captar informações sobre as necessidades dos clientes. A partir disso então, as editoras buscam desenvolver novos produtos e serviços. Aliás, o professor pode ser considerado como o principal receptor dos serviços prestados pelas editoras, visto como uma oportunidade de negócio para as empresas do setor. Dentre os serviços prestados pelas editoras às escolas e professores pode-se citar a assessoria pedagógica, treinamento de professores, criação de site/blogs para o professor, elaboração do projeto educacional, projeto de gestão escolar e desenvolvimento de material complementar. Em termos práticos, os serviços acima mencionados serão detalhados com o objetivo de melhor compreender como as editoras ofertam valor mediante serviços, muito além da mera comercialização de livros. A assessoria pedagógica tem por objetivo auxiliar o cliente, neste caso o professor, no uso do livro em sala de aula. A cesta de serviços inclui ainda cursos voltados à atualização e valorização do profissional de educação. Em casos específicos as editoras elaboram materiais complementares aos livros didáticos, a pedido dos professores. O objetivo é oferecer informações adicionais como fatos históricos de determinadas regiões do Brasil. Quanto aos serviços disponibilizados pelo site, trata-se de um canal de troca de informações. Nele os professores podem tirar dúvidas diretamente com os autores dos livros. Além de poder contar com o auxílio online de assessores pedagógicos. Essas facilidades representam um mecanismo complementar, de modo a facilitar o entendimento do professor em relação ao conteúdo a ser abordado em sala de aula. As editoras desenvolveram também mecanismos para captar o feedback dos profissionais de educação, entre eles visitas às escolas, criação de showrooms e auditórios. A prática recorrente de visita dos autores dos livros às escolas, para conversas com os coordenadores pedagógicos, faz parte do processo criativo de elaboração do conteúdo didático, ou seja, esse método insere-se no conceito de cocriação de valor, segundo abordam Antioco et al. (2008). Além disso, a criação de espaços como auditórios – para a realização de cursos e palestras dadas pelos autores dos livros, e de showrooms – para divulgação de produtos, são vistas como oportunidades de relacionamento das editoras com os clientes, uma forma, portanto de estreitar relações (ANTIOCO et al. 2008). Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 110 A adoção da lógica da servitização repercutiu inclusive em mudanças na estrutura organizacional de algumas editoras, característica já assinalada por Gebauer, Fleisch e Friedli (2005). A partir dos anos 90, editoras com tendência à servitização iniciaram um processo gradual de desfazimento de bens. Essa desincorporação considerou o fechamento de filiais pouco rentáveis e encerramento das atividades da área gráfica, agora contratadas por terceirização, em alguns casos com fornecedores do exterior, principalmente da China. Com a nova onda houve a criação de departamentos voltados para a assessoria pedagógica, a partir de uma visão de negócio centrada no cliente. A distribuição dos livros também passou a ser uma atividade terceirizada, como forma de reduzir ativos e concentrar esforços no chamado core business do negócio, ou seja, a produção de conteúdo didático. A adoção da lógica da servitização provocou mudanças também no perfil de trabalhadores das editoras. Antes, era maciça a presença de profissionais que atuavam na área operacional, na fabricação do livro em papel. No novo cenário, a ênfase é na contratação de funcionários mais qualificados, especializados na elaboração de conteúdos, inclusive, ex-funcionários de escolas, por conhecerem de perto as necessidades em relação à abordagem de conteúdos em sala de aula. As mudanças foram percebidas também em termos de processos. Na busca pela qualidade das coleções, algumas editoram instituíram procedimentos periódicos de revisão e atualização de obras, antes realizadas de forma esporádica. A internet, por sua vez, passou a ser um espaço propício para oferta de novos serviços. As editoras disponibilizam via web conteúdos complementares como vídeos, jogos, músicas, mapas interativos e animações. A análise do mercado brasileiro de livros didáticos pode ser feita pela aplicação prática do conceito de Baines et al. (2009), sobre a empresa “servitizada” que, ao explorar serviços mais rentáveis e com maior proximidade junto ao consumidor, conseguem obter novas posições no mercado. Assim, pode-se concluir que a servitização no segmento de livros pedagógicos tem como objetivo satisfazer as necessidades dos clientes, desenvolver vantagem competitiva e melhorar o desempenho comercial das empresas nele atuantes. As mudanças nos últimos anos foram nítidas e necessárias, como forma de adequar a estrutura e perfil das editoras diante da nova concepção de oferta de serviços aos clientes. Cabe comentar que na era digital, a elaboração de conteúdo, em substituição à produção do livro, será ainda mais visada, pois, o processo atual é de redução do ciclo de vida dos produtos (FRY, STEELE e SALADIN, 1994). Trata-se, portanto, de uma oportunidade clara de negócio e atuação em um mercado competitivo e fundamental para o desenvolvimento do país. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 111 6. CONCLUSÕES Discutir a incorporação de serviços por indústrias é ter a oportunidade de refletir sobre as mudanças profundas do mercado atual. Conforme analisado, a servitização é uma tendência crescente e pode definir a sobrevivência e a rentabilidade. Os casos apresentados possibilitaram visualizar as diferentes metodologias utilizadas pelas empresas ao adotar o modelo estratégico de servitização nos negócios. Ao se abordar o caso da servitização sobre as práticas empresariais no mercado nacional de livros didáticos é nítida a compreensão de que, para atuar nesse segmento específico, as regras antigas já não funcionam. Há forte tendência de incorporação de serviços em empresas agora definidas como provedoras de conteúdo, em substituição à visão de fabricantes de livros. Portanto, a servitização faz parte do novo modelo de negócios típico do cenário atual, marcado por mudanças rápidas, inovações tecnológicas profundas e demanda crescente e diferenciada por parte dos consumidores, cada vez mais exigentes. 7. REFERÊNCIAS AIR LIQUIDE. Quem somos. Disponível em: <www.airliquide.com.br>. Acesso em: 12 out. 2012. ALMEIDA, L.; CAUCHIK, P.; SILVA, M. 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Thus, it is concluded that the servitization is confirmed as a trend among companies inserted in the current scenario of profound technological change and increasing demand and differentiated by consumers. Keywords: service management and operations, servitization, service strategy, manufacturing firms, Product-Service System Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 93-114 2013 114 CUSTOS DE MUDANÇA EM SERVIÇOS: PESQUISA SOBRE A PERCEPÇÃO DO CLIENTE E DISCUSSÃO DE PRÁTICAS GERENCIAIS PARA SUA RETENÇÃO Clarissa Taciana Gabriel Gussen Natália dos Santos Jordão de Oliveira RESUMO O objetivo deste trabalho é de levantar e analisar as questões relativas aos custos de mudança em serviços, por meio de uma investigação da dimensão deste construto e, uma vez constatada sua multidimensionalidade, identificar os tipos de custos de mudança que mais elevam as barreiras à troca de um provedor de serviço em um salão de beleza. Para isso, o método de pesquisa utilizado foi o survey, sendo aplicada a técnica estatística de análise fatorial para o tratamento da informação coletada, com a finalidade de buscar e definir as dimensões assumidas como inerentes às variáveis originais, as quais foram identificadas na literatura. A constatação da multidimensionalidade do construto, com dois fatores – “relacionamento” e “conveniência e serviços” para os clientes -, conduz ao gerenciamento destes no sentido de atração e manutenção da base de clientes de uma empresa do setor analisado. Palavras-chave: custos de mudança, satisfação, lealdade, intenção de recompra, retenção de clientes Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 115 1. INTRODUÇÃO Com o intuito de maximizar o lucro das empresas, muito se discute a respeito da lealdade de seus clientes, entendendo que esta é determinada a partir da satisfação e da entrega de valor superior aos consumidores. Dessa forma, medidas de satisfação têm sido utilizadas para monitorar os lucros e o crescimento de vendas de uma empresa. No entanto, alguns autores constataram que a ligação entre satisfação do cliente e retenção pode depender, em algum grau, de outros fatores como grau de concorrência, existência de programas de lealdade e barreiras de mudanças, entre outros. Nesse contexto, estudos acadêmicos passaram a realizar pesquisas com o intuito de avaliar o impacto causado pelos custos de mudança nas intenções de recompra dos clientes (JONES et al., 2000; JONES et al., 2002; BURNHAM et al., 2003). O presente trabalho tem como objetivo levantar e analisar as questões relativas aos custos de mudança em serviços, com aplicação prática em um setor - salão de beleza. O setor foi escolhido, principalmente, com base nos estudos de Jones et al. (2002). Além disso, levou-se em consideração a importância do setor de beleza no Brasil, país que atualmente ocupa a terceira posição geral no mercado mundial de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC, 2012). Em princípio, faremos uma revisão de literatura para abordar os principais conceitos que permeiam o assunto do presente estudo: satisfação, lealdade e custos de mudança, além de dedicarmos subitens para o tratamento da relação entre eles. Em seguida, passaremos para a descrição da pesquisa. Os resultados e análises da pesquisa serão mais bem detalhados nos itens seguintes. E, por fim, trataremos das implicações gerenciais que encontramos a partir dos resultados encontrados. 1. REVISÃO DE LITERATURA 2.1 Satisfação A literatura diferencia os conceitos de satisfação e lealdade ao definir a satisfação como um estado emocional resultante de uma experiência momentânea (KOTLER e KELLER, 2006) e a lealdade como uma disposição do cliente em repetir uma compra com regularidade e recomendar uma empresa ou marca para outros (JACOBY e CHESTNUT, 1978; OLIVER, 1999). A maioria dos autores relaciona a satisfação com o valor percebido pelo cliente, bem como por suas expectativas em relação a um produto ou serviço. De acordo com Kotler e Keller (2006), a satisfação está associada a um sentimento de pós-compra, que pode ser de prazer ou desapontamento, e que depende da comparação realizada entre o resultado percebido de um produto ou serviço e as expectativas do comprador. Solomon (2011) trata de maneira parecida o assunto, ao dizer que a satisfação ou insatisfação pósCadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 116 compra pode influenciar uma nova compra ou não pelo cliente. O autor destaca, ainda, que as empresas que se preocupam com a satisfação de seus clientes normalmente possuem uma vantagem competitiva sobre as concorrentes. Desta forma, as expectativas dos clientes atuariam como um ponto de referência na experiência de compra ou pós-compra. Caso a experiência seja aceitável e alcance ou supere as expectativas do cliente, ele provavelmente ficará satisfeito. Caso contrário, se a experiência for ruim e não atingir as metas de expectativa do cliente, ele provavelmente ficará insatisfeito. As expectativas, portanto, estão ligadas a uma predição dos consumidores em relação aos prováveis acontecimentos em transações iminentes (PARASURAMAN et al., 1988). Muitas vezes a satisfação está associada à qualidade do serviço oferecido. No entanto, trata-se de conceitos diferentes. A qualidade de um serviço estaria associada a uma percepção do consumidor em relação a um serviço, na qual há um julgamento ou atitude associada à superioridade do serviço, enquanto que a satisfação estaria relacionada à transação específica, que se refere às expectativas do cliente (PARASURAMAN et al., 1988). Descobrir as expectativas de cada cliente é uma tarefa bastante difícil, pois há uma variedade imensurável de pessoas que possuem seus próprios desejos e necessidades. 2.2 Lealdade Na literatura, a lealdade costuma se referir a uma intenção de recompra do cliente e a uma propensão em recomendar uma marca ou empresa para outras pessoas (JACOBY e CHESTNUT, 1978; OLIVER, 1999). Ao longo do tempo, autores discordaram sobre os conceitos de satisfação e lealdade, sem chegar a um consenso sobre um conceito convergente. De acordo com Reichheld e Sasser (1990), a lealdade estaria associada a uma questão de qualidade do serviço e de retenção de clientes. Para os autores, a qualidade de um serviço poderia ser aperfeiçoada a partir do momento em que esse fator começa a ser medido, por meio de uma taxa de retenção de clientes. Assim, Reichheld e Sasser (1990) sugerem que uma análise dos clientes “desertores” funcionaria como um guia para o aperfeiçoamento de empresas que procurassem obter um feedback desses clientes sobre os motivos pelos quais eles deixaram de ser consumidores leais. Desta forma, a partir dessas informações, a empresa poderia agir em seus pontos fracos antes que eles começassem a afetar seus lucros. Jacoby e Chestnut, em 1978, dividiram a lealdade em dois aspectos: comportamental, em que o consumidor teria um comportamento repetitivo de compra em relação a um produto ou serviço; e atitudinal, em que o consumidor possui uma atitude positiva e uma preferência em relação a uma marca, resultando em uma intenção de recompra ou na propensão a recomendar o produto ou serviço dessa marca para outras pessoas (OLIVER, 1999; ZACHARIAS, 2009; WU e WANG, 2012). Como contribuição Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 117 relevante para a literatura, os autores sugerem que a compra consistente não poderia ser um indicador válido de lealdade, já que o consumidor poderia ser leal a várias marcas substituíveis entre si ou poderia comprar ao acaso e por conveniência. Assim, inferir se o consumidor é leal ou não com base somente em sua frequência de compras seria imprudente, tornando-se necessária uma análise mais a fundo sobre a questão, que abrangeria outros sentimentos, como afeto, crenças e intenções do consumidor, para se detectar a verdadeira lealdade a uma marca (OLIVER, 1999). Dick e Basu (1994) confirmam que a definição comportamental da lealdade é insuficiente para explicar como e por que a lealdade a uma marca se desenvolve ou se modifica. Para os autores, a lealdade se baseia na relação entre a atitude relativa em relação a uma entidade (seja marca, serviço, loja ou vendedor) e um comportamento de patrocínio repetitivo. Ao relacionarem a atitude relativa e o patrocínio repetitivo, Dick e Basu (1994) chegaram ao esquema abaixo: Repetição de Patrocínio Alta Atitude Relativa Baixa Alto Baixo Lealdade Verdadeira Lealdade Ilegítima Lealdade Latente Ausência de Lealdade Figura 2.1 – Matriz atitude relativa e patrocínio repetitivo Fonte: Dick e Basu (1994). De acordo com o esquema, uma alta atitude relativa, mas com baixa repetição de patrocínio configura uma lealdade latente que Dick e Basu (1994) creem acontecer, provavelmente, em um ambiente em que normas subjetivas e efeitos ocasionais são tão ou mais influentes do que atitudes que determinam o comportamento de patrocínio. Já uma atitude relativa baixa, combinada com uma alta repetição de patrocínio, ocasiona uma lealdade ilegítima, caracterizada por influências não-atitudinais no comportamento. Pode ocorrer quando o consumidor percebe uma baixa diferenciação entre as marcas do mercado ou quando seu comportamento de compra se baseia em situações de ocasião, seja por familiaridade ou ofertas. 2.2.1 Relação entre lealdade e satisfação No que se refere à relação entre satisfação e lealdade, Oliver (1999), na figura abaixo, demonstra seis das diversas interpretações encontradas na literatura sobre as associações entre lealdade e satisfação: Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 118 Figura 2.2 - Representações de Satisfação e Lealdade Fonte: adaptado de Oliver (1999). De acordo com as interpretações de Oliver (1999), o painel 1 representa uma suposição de que lealdade e satisfação são manifestações distintas de um mesmo conceito; o painel 2 sugere que a satisfação é um conceito âncora para a lealdade, e um verdadeiro fator sem o qual a lealdade não poderia existir; o painel 3 indica que a satisfação é um dos elementos da lealdade; o painel 4 indica que satisfação e lealdade são elementos de um conceito maior, que seria a “lealdade máxima”; o painel 5 mostra que uma fração da satisfação pertence à lealdade, mas não faz parte da essência desta; e, por fim, o painel 6 sugere que a satisfação é o início de uma sequência transitória que culmina em um estado separado de lealdade, na qual uma mera insatisfação não seria capaz de reverter este estado. Para o autor, a lealdade representa um compromisso profundo de recompra futura em relação a um produto ou serviço, referentes a uma mesma marca (brand ou brand-set), independente de influências ocasionais e esforços de marketing que poderiam causar um comportamento de mudança (OLIVER, 1999). Entretanto, a lealdade teria quatro fases, nas quais o consumidor passaria por diferentes estágios antes de atingir a lealdade ativa: Lealdade cognitiva. Nesta fase, o consumidor se torna leal a uma marca com base em informações prévias e no desempenho da marca. Porém, a ligação consumidor-marca é mais frágil e mais provável que o consumidor esteja sujeito a trocas ou mudanças. Lealdade afetiva. Se a satisfação é processada, a lealdade pode se tornar afetiva, aonde há uma ligação maior com a marca construída a partir de ocasiões de uso satisfatórias e cumulativas. Nessa fase, a lealdade está associada ao grau de afeição do consumidor em relação à marca. O consumidor ainda está sujeito a trocas, pois a ligação com a marca ainda não é muito forte. Lealdade conativa. Caso haja episódios repetitivos de afeição à marca, o consumidor passa para a próxima fase, de lealdade conativa, em que há uma intenção de recompra de uma mesma marca. O ato de recompra, no entanto, pode não ser realizado. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 119 Lealdade ativa. Já na fase final, a intenção de recompra do estágio anterior se torna realidade através de uma ação do consumidor. Os obstáculos para a recompra são superados, causando a repetição da compra pelo consumidor. Dessa forma, Oliver (1999) indica que o painel mais próximo de sua perspectiva é o 6 (v. Figura 2.2), no qual a satisfação se transforma na lealdade ao longo do tempo. No entanto, o autor faz ressalvas, já que esse painel não prevê que a lealdade pode retornar ao estágio de mera satisfação ou chegar ao extremo de insatisfação, no caso de experiências insatisfatórias repetitivas. Além disso, acrescenta que, para que a satisfação vire lealdade, é necessário que haja fatores, como determinação pessoal e apoio social, pois, caso contrário, a satisfação fica “dormente” e não tem os “nutrientes” necessários para se tornar lealdade. 2.2.2 Intenção de recompra A intenção de recompra é geralmente associada ao conceito de lealdade, figurando, muitas vezes, como sinônimo do construto. A intensidade de recompra, como visto acima, não é um fator suficiente para a determinação da lealdade (OLIVER, 1999). Como abordado por Dick e Basu (1994), tanto uma atitude favorável, que é elevada em relação a alternativas potenciais, quanto o patrocínio repetitivo são essenciais para a configuração da lealdade. De acordo com Oliver (1999), a lealdade representa um compromisso profundo de intenção de recompra de uma mesma marca, independente de influências ocasionais que possam causar um comportamento de mudança. Nesse sentido, trata-se de um comportamento do cliente, que tem o interesse de permanecer com um fornecedor, mesmo em um ambiente repleto de custos de troca. Assim, a intenção de recompra aparece no estágio de lealdade conativa, porém, somente na lealdade ativa que os obstáculos para uma nova compra são superados e a ação é efetuada, ocasionando na recompra de um produto ou serviço. 2.2.3 Retenção de clientes De acordo com Kotler e Keller (2006), há duas formas de se reter clientes: criando barreiras elevadas para impedir a mudança e entregando um alto grau de satisfação ao cliente. Ao criar altos custos de mudança, os clientes tornam-se menos propensos a mudar de fornecedor, ao passo que a entrega de alto grau de satisfação dificulta a atuação de outras empresas, que teriam de superar esse grau para estimular a mudança. Algumas das formas de se entregar um alto grau de satisfação são por meio de um bom gerenciamento de sua base de clientes (CRM), da facilitação do processo de Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 120 reclamações e da reação rápida e eficaz a essas reclamações. A informação sobre os seus clientes é um recurso muito valioso para se descobrir que ações reverterão em uma maior entrega de valor a eles e que pode garantir bons resultados, como a redução do índice de perda de clientes, aumentar a longevidade do relacionamento com o cliente, concentrar esforços em clientes de alto valor, etc. Contudo, manter um banco de dados de clientes gera altos custos, que nem toda empresa está disposta a pagar. Para Reichheld e Sasser (1990), as empresas deveriam preocupar-se mais com a lealdade do cliente do que com sua mera satisfação, pois mesmo um cliente satisfeito em um determinado momento poderia ser um desertor no futuro próximo. Nesse sentido, os autores sugerem que a empresa invista na retenção de clientes, pois, quando servidos da forma correta, eles geram cada vez mais lucro a cada ano em que continuam sendo leais à empresa. Reichheld e Sasser (1990) ainda mencionam que, quando a empresa diminui sua taxa de deserção, o tempo médio de relação com o cliente aumenta e, consequentemente, os lucros da empresa crescem significativamente. 2.3 Custos de mudança Porter (1980) conceitua os custos de mudança como sendo iniciais, ao contrário daqueles em andamento, associados ao uso de um produto ou provedor, que os clientes associam com o processo de troca de um fornecedor para outro, não se limitando àqueles econômicos e não necessitando incidir imediatamente após a troca. Na mesma linha, Jones et al. (2002) definem como sendo os custos econômicos e psicológicos percebidos associados com a troca de uma alternativa por outra. Assim, tais custos podem ser pensados como barreiras que prendem os consumidores nas relações de serviços. O papel dos custos de mudança pode ser analisado do ponto de vista teórico e prático. Sob o aspecto teórico, esses custos representam um meio importante para um melhor entendimento e previsão da retenção de clientes. Em relação ao ponto de vista prático, a gestão das percepções dos clientes quanto aos custos de mudança para promover retenção representa um elemento tático nos programas de fidelidade de clientes. (JONES et al., 2002). A importância dos custos de mudança é destacada na concepção da estratégia de lock in (SHAPIRO e VARIAN, 1999), definida quando os usuários de tecnologia se veem “amarrados”, limitados devido aos custos substanciais de troca de uma marca por outra. Assim sendo, lock in significa que os consumidores estão restritos a escolhas passadas e quando eles mudam de uma marca para outra, incorrem em custos. 2.3.1 Dimensões do custo de mudança Para grande parte de estudiosos no tema, custos de mudança é um termo plural, que engloba uma série de custos individuais, porém, não há um consenso da melhor Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 121 classificação a ser utilizada. A determinação da categorização apropriada dos custos de mudança é ajudada pela compreensão de como esses custos surgem. Desse modo, em relação aos fatores antecedentes dos custos de mudança, Chen e Hitt (2002) perceberam que a natureza geral do produto, as características dos clientes que as empresas atraem ou estratégias deliberadas e investimentos pelos fornecedores de serviço e produto, podem aumentar esses custos. Kim et al. (2001) sugerem diversas razões econômicas e psicológicas para o aumento dos custos de mudança, e outras causas possíveis incluem informação (EVANS e WURSTER, 1997) e o investimento do consumidor em ativos específicos de relacionamento (SENGUPTA et al., 1997). Diante de diversas classificações de custos de mudança, o presente trabalho se propõe a contemplar três estudos: Jones et al. (2002), Burnham et al. (2003) e Zacharias (2009). Jones et al. (2002) basearam-se em três categorias: Custos de continuidade incluem o grau e a probabilidade de perda de benefícios de desempenho e pré-requisitos assegurados por meio da continuidade do relacionamento com um dado provedor. As dimensões envolvidas são: custos de perda de desempenho e custos de incerteza Custos de aprendizado incluem o tempo e o esforço gastos na aquisição, troca e avaliação de informação. As dimensões envolvidas são: custos pré-mudança de busca e avaliação, custos pós-mudança comportamentais e cognitivos e custos de setup Custos afundados envolvem os economicamente irrelevantes, mas importantes psicologicamente investimentos na relação de troca. Burnham et al. (2003) fornecem uma tipologia contemplando oito custos de mudança: Custos de risco econômico: são os custos de aceitar a incerteza com um potencial de resultado negativo quando se adota um novo provedor sobre o qual o cliente tem informação insuficiente Custos de avaliação: são os custos de tempo e esforço associados com a busca e análise necessárias para tomar uma decisão de troca. Custos de aprendizagem: são os custos de tempo e esforço de adquirir habilidades ou know how para que se possa usar efetivamente o produto ou serviço. Esses custos são frequentemente específicos do fornecedor Custos de inicialização (setup): são os custos de tempo e esforço associados com o processo de iniciar uma relação com um novo provedor. No caso de empresas de serviços, entende-se principalmente como o intercâmbio de informação Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 122 necessário para reduzir os riscos de vendas dos provedores assim como entender as necessidades específicas dos clientes Custos de perda de benefícios: são os custos associados com vínculos contratuais que criam benefícios econômicos pela permanência com o fornecedor atual Custos de perdas monetárias: gastos iniciais incorridos na mudança de fornecedor, diferentemente daqueles necessários para a compra do novo produto Custos de perda de relacionamento pessoal: são as perdas afetivas associadas com a quebra de laços sociais que tenham sido formados com as pessoas da empresa com as quais o cliente interage Custos de perda de relacionamento com a marca: associados com a quebra de identificação que foram formadas com a marca ou empresa. A tabela 2.1 apresenta os grupos formados a partir das relações existentes entre as oito dimensões inicialmente propostas por Burnham et al. (2003). Tabela 2.1 – Tipologia das percepções dos clientes de custos de mudança Tipologia das percepções dos clientes de custos de mudança Procedimento Financeiros Relacionais Custo de risco econômico Custos de avaliação Custos de perda de benefícios Custos de aprendizagem Custos de perdas monetárias Custos de perda de relacionamento pessoal Custos de relacionamento com a marca Custos de inicialização (setup) Fonte: adaptado de Burnham et al. (2003). Zacharias (2009) construiu uma escala inédita e abrangente de custos de mudança, adaptada ao contexto brasileiro, aplicável a serviços em geral. Neste estudo, o construto custo de mudança é multidimensional, de segunda ordem, composto de oito dimensões, ou seja, oito construtos de primeira ordem: custos de Avaliação, custos de Perda de Benefícios, custos de Pós-Mudança, Atratividade de Alternativas, custos Afundados, custos de Perda de Relacionamento Pessoal, custos Monetários, custos de Perda de Relacionamento com a Marca. A definição da maioria dos custos é remetida aos estudos de Jones et al. (2002) e Burnham et al. (2003), com exceção da Atratividade de Alternativas, dimensão esta baseada em um estudo anterior de Jones et al. (2000). Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 123 2.3.2 Mensuração de custos de mudança Conforme foi apresentado no item anterior, os custos de mudança são categorizados na literatura a partir de uma série de dimensões, sendo adaptado ao contexto de pesquisa. Nesse sentido, Fornell (1992) afirma que seria difícil encontrar uma medida direta de barreiras de mudança. Apesar disso, não há um consenso na forma de mensuração de custos de mudança, alguns autores observam os custos de mudança a partir de uma escala multidimensional, enquanto outros como um construto global, de escala unidimensional. O objetivo deste subitem não é esmiuçar todos os estudos nessa área e sim apresentar alguns que sejam relevantes na literatura e que se relacionem com a aplicação proposta nesse estudo. Jones et al. (2002) estudaram duas indústrias de serviços, bancos e cabeleireiros, utilizando os seguintes itens, dentre outros, para mensurar os custos de mudança: Tabela 2.2 – Escala de mensuração de dimensões de custos de mudança de Jones et al. (2002) Dimensão Escala - Há certos benefícios que eu não manteria se eu mudasse de cabeleireiro - Eu perderia tratamento preferencial se mudasse de cabeleireiro - Se eu mudasse de cabeleireiro, o serviço que eu receberia no Custos de incerteza novo local poderia ser pior do que o que recebo agora - Levaria muito tempo e esforço para localizar um novo Custos pré-mudança de cabeleireiro busca e avaliação - Se eu mudasse de cabeleireiro, eu não teria que procurar muito para achar outro - Se eu mudar de cabeleireiro, terei que aprender como as coisas Custos pós-mudança funcionam no novo cabeleireiro comportamentais e - Se eu mudasse de cabeleireiro, teria que aprender como o cognitivos sistema funciona no novo local - Se eu mudasse de cabeleireiro, levaria muito tempo e esforço de Custos de setup minha parte para explicar ao novo profissional o que eu gosto e o que eu quero - Muita energia, tempo e esforço foram investidos na construção e Custos afundados manutenção do relacionamento com meu cabeleireiro - Eu não investi muito no relacionamento com este cabeleireiro Fonte: adaptado de Zacharias (2009). Custos de perda de desempenho Já o estudo de Burnham et al. (2003) desenvolveu-se no contexto de serviços de cartão de crédito e de telefonia de longa distância. A tabela 2.3 apresenta um resumo dessa escala. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 124 Tabela 2.3 – Escala de mensuração de dimensões de custos de mudança de Burnham et al. (2003) Dimensão Custos de risco econômico - Custos de avaliação Custos de aprendizagem Custos de setup - Custos de perda de benefícios Custos de perdas monetárias - Custo de perda de relacionamento pessoal - Custos de perda de relacionamento com a marca - Escala Fico preocupado se o serviço oferecido por outro provedor não funcionará tão quanto esperado Eu não sei com o que terei que lidar enquanto estiver mudando para um novo provedor Eu não tenho tempo para obter as informações necessárias para avaliar completamente outros provedores É difícil comparar os outros provedores de serviços Aprender a usar os serviços oferecidos por um novo provedor, do mesmo modo que uso com o atual, levaria muito tempo Não há muito problema em entender bem um novo provedor de serviços Leva tempo para passar pelas etapas de troca para um novo provedor Mudar de provedor envolve um processo não prazeroso de compra e contratação de serviço Mudar para um novo provedor significaria perder pontos, serviços que eu já acumulei com meu provedor atual Eu perderei benefícios por ser um cliente delonga data se eu deixar o meu provedor Mudar para um novo provedor envolveria custos iniciais (ex: compra de novo aparelhos, taxas de adesão, etc) Eu sentiria falta de trabalhar com as pessoas de meu provedor atual, se eu mudasse Eu gosto da imagem pública que meu provedor tem Eu não me importo com nome/marca do provedor que uso Fonte: adaptado de Zacharias (2009). 3. METODOLOGIA DE PESQUISA Modelos comportamentais de custo-benefício sugerem que os consumidores participam de atividades se os benefícios percebidos superam os custos percebidos. Se todo o resto permanecer igual, os custos mais elevados percebidos de mudança de fornecedor ou provedor de serviço deve reduzir a probabilidade que os consumidores trocam (JONES et al., 2002; ANDERSON, 1994). Diante da importância de custos de mudança, parece natural que as empresas queiram gerenciar a percepção de seus clientes em relação à distinção e ao entendimento de tais custos. Jones et al. (2002) apresentaram duas razões pelas quais a distinção das dimensões dos vários custos de mudança conceitual e empiricamente deve ser benéfica. Em primeiro lugar, as diferentes dimensões dos custos de mudança são suscetíveis de estarem relacionadas diferencialmente com certos antecedentes e consequências de maneiras que são teórica e praticamente importantes. Segundo, porque é provável que diferentes Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 125 estratégias sejam necessárias para gerenciar efetivamente as dimensões de custos de mudança como parte de um programa de retenção global. Assim, a proposta de pesquisa é investigar a dimensão do construto, para, deste modo, se for constatado sua multidimensionalidade, identificar os tipos de custos de mudança que mais elevam as barreiras à troca de um provedor de serviço em um setor específico: salão de beleza. Portanto, o método de pesquisa escolhido foi o survey. A escolha do setor “salão de beleza” foi inspirada no estudo de Jones et al. (2002), o qual aplicou ao serviço de cabeleireiro. Sua justificativa é que este profissional representa um provedor de um serviço customizado, de alto contato. Dessa forma, o conhecimento e a atitude dos empregados são de fundamental importância em fornecer um serviço satisfatório para os consumidores, uma vez que as necessidades dos clientes são sempre usadas como input na criação do serviço. 3.1 Amostra e coleta de dados A população alvo do estudo são usuários de salões de beleza de ambos os sexos, moradores da cidade do Rio de Janeiro. O termo empregado “salão de beleza” inclui os serviços oferecidos em um salão de beleza típico para mulheres bem como serviços prestados em barbearias. Dessa forma, a apuração dos resultados pode ser estendida aos dois gêneros. O questionário encontra-se no apêndice A e foi elaborado a partir de oito dimensões de custos de mudança, baseadas em Zacharias (2009). Os 28 itens de mensuração de Zacharias (2009) foram reduzidos para oito itens por serem considerados suficientes e relevantes para investigar as questões em discussão neste trabalho. Vale ressaltar que todas as dimensões expostas em Zacharias (2009) foram contempladas. A elaboração do questionário foi realizada por meio de uma ferramenta disponibilizada para usuários do e-mail do Google. Dessa forma, a transmissão e coleta de dados foram feitas via internet, onde os questionários foram encaminhados para contatos das autoras. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 126 Tabela 3.1 – Dimensões e itens da escala de custos de mudança propostos no presente estudo Variáveis Dimensão de custos de mudança V1 Avaliação V2 Perda de Benefícios V3 Pós-Mudança V4 Atratividade de Alternativas V5 Custos Afundados V6 Perda de Relacionamento Pessoal V7 Monetários V8 Perda de Relacionamento com a Marca Itens 1. Levaria muito tempo e esforço para encontrar um novo salão 2. Eu perderia tratamento especial que eu tenho hoje se mudasse de salão 3. Se eu mudar, o novo salão pode não oferecer os mesmos serviços que já estou acostumado(a) a utilizar 4. Se eu tivesse que trocar, existem outros bons salões a escolher 5. Muita energia, tempo e esforço foram investidos por mim na construção e manutenção do relacionamento com a equipe do meu salão 6. Eu perderei um relacionamento amigável se eu mudar de salão 7. Se eu mudar para um novo salão posso ser surpreendido(a) com cobranças de valores não justificados 8. Eu gosto da imagem que meu salão tem Com relação à amplitude da escala, optou-se por adotar, de forma padronizada, um escala de mensuração de onze pontos, variando de discordo totalmente a concordo totalmente, para todas as dimensões de custos de mudança por ser mais intuitiva e pelo maior refinamento das respostas à medida que se tem um grande número de categorias na escala (MALHOTRA, 2001). Tendo em vista a realização da análise fatorial, o tamanho planejado da amostra é de no mínimo 40 observações, visto que estando sendo consideradas oito variáveis. Hair et al. (2005) afirmam que, como regra geral, o mínimo é ter pelo menos cinco vezes mais observações do que o número de variáveis a serem analisadas. Foram obtidas 55 respostas, sendo 71% dos respondentes pessoas do sexo feminino e 29% pessoas do sexo masculino. Em relação à frequência de utilização dos serviços, a tabela 3.2 descreve as características da amostra. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 127 Tabela 3.2 – Caracterização da amostra, por frequência de uso do serviço Frequência de uso 3.2 Total % 2x / semana ou mais 1x / semana 1x / quinzena 1x / mês 1x / 2 meses 1x / 3 meses 1x / 4 meses Menos 1x / 4 meses Sem periodicidade 0 11 7 6 11 8 2 3 7 0,0 20,0 12,7 10,9 20,0 14,6 3,6 5,5 12,7 TOTAL 55 100 Análise e resultados A análise fatorial é uma técnica estatística multivariada, cujo propósito é encontrar um modo de condensar a informação contida em diversas variáveis originais em um conjunto menor de novas dimensões compostas ou variáveis estatísticas com uma perda mínima de informação – ou seja, buscar e definir os construtos fundamentais ou dimensões assumidas como inerentes às variáveis originais (HAIR et al., 2005). A aplicação dessa técnica no estudo em questão é justificada pelo fato de querer-se observar a dimensão do construto Custos de Mudança, multi ou unidimensional. Segundo Hair et al. (2005), o processo de decisão em análise fatorial é constituído de seis estágios. A figura 3.1 apresenta cada um desses estágios, especificando o procedimento utilizado nessa pesquisa, sendo operacionalizado a partir do software SPSS. Objetivo Planejamento Suposições Determinação Fatores e Avaliação Ajuste Geral Interpretação dos Fatores Validação •Redução dos dados (identificação das dimensões ou fatores latentes) - refinir e purificar a escala de Custos de Mudança •Cálculo da matriz de correlação para atender os objetivos especificados de agrupamento de variáveis – PEARSON •Planejamento do estudo em termos de número de variáveis (8) •Tamanho necessário para a amostra - função do número de variáveis na análise 5:1 •Quantificar o grau de intercorrelações entre as variáveis e a adequação da a. fatorial •Medida de Adequação da Amostra (MSA) - acima de 0,5 é aceitável •Teste Bartlett de Esfericidade •Principal Axis Factoring (não queremos inserir o máximo de informação no fator 1, senão teríamos escolhido a análise dos componentes principais) • Critérios para extração de fatores: Raiz Latente e Teste Scree •Rotação Fatorial - método de rotação não ortogonal OBLIMIN (acreditamos que há correlação entre as variáveis) •Fora do escopo do trabalho Figura 3.1 – Estágios do processo de análise fatorial Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 128 É importante destacar que o valor da variável da escala que apresentaram conotação invertida à coerência da escala, listado a seguir, teve seu valor recodificado, substituindo seus valores originais pelos valores resultantes de sua subtração de 10. Se eu tivesse que trocar, existem bons salões a escolher. A tabela 3.3 apresenta as estatísticas descritivas das variáveis da escala de custos de mudança (média e desvio padrão). Tabela 3.3 – Estatísticas descritivas das variáveis da escala de custos de mudança Var N Média V1 V2 V3 V4 V5 V6 V7 V8 55 55 55 55 55 55 55 55 4,36 4,64 4,25 2,25 3,18 4,62 4,04 5,05 Escala Mínimo 0 0 0 0 0 0 0 0 Máximo 10 10 10 10 10 10 10 10 Desvio Padrão 3,29 3,43 3,70 2,17 3,10 3,37 2,97 3,18 A maior média obtida (5,05) foi na variável “Eu gosto da imagem que meu salão tem”, enquanto a menor média (2,25) foi na variável “Se eu tivesse que trocar, existem outros bons salões a escolher”, a qual foi codificada reversamente. Isso significa que os respondentes não veem dificuldades em escolher outro salão. O desvio padrão nas respostas de cada variável foi bastante elevado, variando de 2,17 a 3,70. A matriz de correlação entre as oito variáveis (tabela 3.4) parece indicar, a princípio, uma correlação entre as variáveis (V2, V5 e V6 entre si; V1, V3, V4i, V5 e V7; V2 e V3). Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 129 Tabela 3.4 – Matriz de correlação entre as variáveis V1 V2 V3 V4i V1 1 V2 ,306* V3 ,402 ** ,559** 1 ,387 ** 0,077 0,066 ,428** ,678** ,472** 0,106 V4i V5 V6 V7 V8 ,469 0,245 V6 V7 V8 1 0,213 ,689 ** V5 ** ,364 ** 1 1 0,105 ,653** 0,217 0,191 0,239 ,337 ,306 * 0,15 ,279 0,064 1 * 0,254 1 * 0,24 0,029 1 *. Correlation is significant at the 0.05 level (2-tailed). **. Correlation is significant at the 0.01 level (2-tailed). Na primeira rodada, foram consideradas oito variáveis. A medida de adequação amostral (MSA) foi de 0,722, indicando uma adequação média dos dados para análise fatorial. O teste Bartlett de esfericidade apresentou nível de significância 0,000, também favorável à realização da análise fatorial. O critério de corte inicial para extração de fatores foi de autovalores maiores ou iguais a 1. A solução encontrada apresentou dois fatores explicando 58,77% da variância total. Pelo teste Scree, observou-se que mais um fator poderia ser considerado. A partir da matriz rotacionada, as variáveis V2, V3, V5 e V6 formaram um fator, enquanto as variáveis V1, V4i e V7 foram agrupadas no segundo fator. A variável V8 foi diluída entre os dois fatores. A partir da observação do teste Scree, rodou-se a segunda vez, configurando a opção de critérios a priori, inserindo o valor “3” no número de fatores. Não foi possível rodar a análise fatorial dessa forma. Tentou-se aumentar o número de interações, porém, novamente, não se obteve um resultado. Na terceira rodada, a variável V8 foi excluída por ter sido diluída entre os fatores na primeira rodada. O critério de extração de fatores foi o de autovalores maiores ou iguais a 1. A medida de adequação amostral (MSA) foi de 0,741 e o teste Bartlett de esfericidade apresentou nível de significância 0,000. A solução encontrada apresentou dois fatores, os quais explicam 65% da variância total. Pela matriz rotacionada não ortogonal (oblíqua) o fator 1 inclui as variáveis V2, V3, V5 e V6, enquanto o fator 2 inclui as variáveis V1, V4i e V7, a mesma composição encontrada na primeira rodada. O teste Scree também indicou a possibilidade de inclusão de um terceiro fator. A quarta rodada foi estruturada de forma a considerar apenas as sete primeiras variáveis (V1 a V7), configurando para geração de três fatores. Por continuar com as mesmas variáveis analisadas na terceira rodada, os testes de adequação da análise fatorial Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 130 não foram alterados. Os três fatores explicaram 76,73% da variância total, sendo que o fator 1 englobou as variáveis V2, V5 e V6; o fator 2 incluiu V1, V4i e V7 e o fator 3 incluiu apenas a V3. Ao observar as comunalidades (estimativas da variância compartilhada entre as variáveis), a V4i e V7 apresentaram níveis baixos, sugerindo que fossem retiradas tais variáveis. Portanto, na quinta rodada, apenas cinco variáveis (V1, V2, V3, V5 e V6) foram consideradas. O critério de extração de fatores foi o de autovalores maiores ou iguais a 1. A medida de adequação amostral (MSA) foi de 0,774, um índice superior ao obtido nas análises anteriores. O teste Bartlett de esfericidade também apresentou nível de significância 0,000. A solução encontrada sugeriu a formação de apenas um fator, explicando 59,09% da variância total. A partir do teste Scree, observou-se a possibilidade de gerar mais um fator. Desta forma, na sexta e última rodada, configurou-se o critério de seleção de fatores para ser igual a 2. As variáveis apuradas foram as mesmas da quinta rodada: V1, V2, V3, V5 e V6. A continuidade da análise fatorial com as mesmas variáveis fez com que não houvesse alteração nos testes de adequação. A solução final encontrada foi de 76,88% da variância total explicada por dois fatores: fator 1 – V2, V5 e V6 -, e fator 2 –V1 e V3. A tabela 3.5 mostra a variância total explicada pelos fatores e a tabela 3.6 mostra a matriz de padrão fatorial. Tabela 3.5 – Total da variância explicada Initial Eigenvalues Factor Total % of Variance Tabela 3.6 – Matriz de padrão fatorial final Extraction Sums of Squared Loadings Cumulative % Total % of Variance Factor 1 2 1 2,954 59,089 59,089 2,596 51,917 V1 2 0,887 17,733 76,822 0,409 8,178 V2 0,668 0,046 0,743 0,178 3 0,588 11,753 88,575 V3 0,235 0,515 4 0,305 6,099 94,674 V5 0,61 0,307 5 0,266 5,326 100 V6 0,929 0,141 Extraction Method: Principal Axis Factoring Extraction Method: Principal Axis Factoring Rotation Method: Oblimin with Kaiser Normalization Portanto, a solução final da escala de Custos de Mudança resultou em cinco subdimensões/itens agrupados em dois fatores. As variáveis iniciais V2, V5 e V6 relacionadas respectivamente a benefícios, custos afundados e relacionamento pessoal geraram um fator. Pelo caráter relacional comum às três variáveis, denominou-se esse fator como “Relacionamento”. Já as variáveis V1 e V3 relacionadas respectivamente à avaliação Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 131 e incerteza foram agrupadas em um segundo fator, o qual foi denominado “Conveniência e Serviços”. O esquema abaixo representa o resultado obtido a partir da análise fatorial exploratória. Relacionamento • Custos de Perda de Benefícios • Custos Afundados • Custos de Perda de Relacionamento Pessoal Custos de Mudança Conveniência e Serviços • Custos de Avaliação • Custos de Incerteza Figura 3.2 – Representação da multidimensionalidade dos custos de mudança 3.3 Limitações da pesquisa A pesquisa apresenta uma série de limitações, que podem servir como base para estudos futuros. As restrições podem ser entendidas com relação à amostra e ao meio de aplicação do questionário. A respeito da amostra, a primeira delas refere-se ao seu tamanho. Devido a restrições temporais, foram obtidas apenas 55 respostas. Esse valor absoluto em termos de usuários de serviços de salão de beleza é insignificante. A questão geográfica, assim como a discriminação da classe social dos respondentes (amostra de conveniência), também foram percebidas como limitações, uma vez que as percepções podem ser diferentes de acordo com a localização ou classe social dos consumidores. Dessa forma, os resultados podem não ser replicáveis ao restante do país. A escolha de um setor é outra restrição. O meio escolhido para aplicação dos questionários, a internet, apresenta diversas facilidades para os pesquisadores assim como para aos respondentes. Porém, podem surgir dúvidas em relação a alguma pergunta que não podem ser respondidas pelos pesquisadores, uma vez que não há a presença física em nenhum momento. 4. IMPLICAÇÕES GERENCIAIS A constatação da multidimensionalidade do construto custos de mudança sugere diversas implicações para gestores de empresas desse setor. A generalização para outras indústrias não pode ser confirmada com certeza, de forma que as seguintes sugestões sejam aplicadas moderadamente e preferivelmente à indústria da beleza. O resultado Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 132 obtido está de acordo com estudos anteriores como o de Jones et al. (2002), Burnham et al. (2003) e Zacharias (2009). A diferença está no agrupamento das variáveis iniciais em dois fatores. Apesar das limitações, dentre elas, a generalização para contextos geográficos mais amplos, como para todo o país, as autoras entendem a importância desse estudo para a construção de estratégias de atração e retenção de clientes. A recomendação é que a escolha das iniciativas seja feita de forma a não criar um sentimento de aprisionamento (negativo) nos clientes. Ao invés disso, a partir do conhecimento gerado nesta pesquisa sobre a relevância do relacionamento na percepção dos clientes, seja ele entendido como benefícios e privilégios conquistados ao longo da relação, investimento realizado para sua construção ou tratamento amigável, entre outros, pode influenciar positivamente a permanência dos clientes na empresa. Os resultados da pesquisa mostraram também a importância da conveniência e serviços para os clientes. Desse modo, o gerenciamento dos serviços prestados no sentido de diversidade e de intangibilidade é crucial para a permanência da base de clientes de uma empresa do setor analisado. Algumas variáveis como a atratividade de alternativas, custos monetários e custos de relacionamento com a marca, não foram percebidas como custos de mudança. Dessa forma, seria interessante direcionar esforços para mudar essa percepção para, assim, as empresas se beneficiarem de mais um atributo na retenção de seus clientes. Jones et al. (2002) apresentam potenciais implicações estratégicas de acordo com a dimensão de custos de mudança envolvida. A aplicação dessas propostas às dimensões encontradas nesse estudo - “Relacionamento” e “Conveniência e Serviços” - orientam as empresas que desejam atrair novos clientes a partir dos seguintes aspectos: Tabela 4.1 – Implicações Estratégicas para as dimensões dos custos de mudança Relacionamento Focar no aumento do serviço Estruturar os benefícios à mudança como perdas atuais Promover a transição entre provedores de maneira rápida, fácil e de baixo custo Estruturar os custos afundados como os menores em comparação com o fluxo de benefícios de desempenho futuros perdido por não mudar Conveniência e serviços Aumentar o número/ visibilidade de localizações Aumentar a disponibilidade de informação via vários meios de comunicação Fornecer sinais tangíveis de qualidade Estimular o “boca a boca” positivo Fornecer garantias de serviço A indústria da beleza é uma das que mais cresce em comparação aos demais países. O Brasil, atualmente, ocupa o terceiro lugar em relação ao mercado mundial de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC, 2012). Entre 2010 e 2011, o Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 133 crescimento foi de 18,9% em comparação ao primeiro lugar, Estados Unidos, que cresceu somente 3,9%. As oportunidades de trabalho em salões de beleza cresceram, entre 1994 e 2011, 168,4%. Sendo assim, trata-se de um setor que está em evidência no país e que pode utilizar estudos como os realizados no presente trabalho, para a adoção de estratégias de retenção de clientes. 5. CONCLUSÃO As descobertas encontradas por autores como Jones et al. (2002) e Burnham et al. (2003) foram confirmadas com esse estudo. O entendimento e a medição dos custos de mudança aplicáveis em cada indústria e segmento de consumidores podem ser muito úteis para uma boa estratégia de atração e retenção de clientes, levando à tão almejada – por 10 entre cada 10 empresas – fidelização de clientes. Apesar das limitações do estudo, os resultados mostram caminhos que podem ser percorridos por provedores de serviços para entender como funcionam os custos de mudança e quais dimensões estão mais presentes em uma determinada indústria ou segmento de clientes. O método quantitativo de análise fatorial permitiu que fossem identificados dois fatores, que foram denominados como relacionamento e conveniência e serviços. Tais fatores foram resultado das peculiaridades desta pesquisa, que se limitou a serviços de salão de beleza. Assim, outras pesquisas provavelmente encontrarão fatores diferentes, que enfatizarão dimensões de custos de mudança distintas. O fato de a pesquisa ter confirmado a determinação dos custos de mudança como fatores de retenção de clientes não implica na “desqualificação” da satisfação como um fator ao mesmo tempo importante na criação de laços com o provedor de serviços, e que também estimulam as intenções de recompra do cliente, como visto em Jones et al. (2000). Lembrando novamente os dizeres de Kotler e Keller (2006), há duas maneiras de se reter clientes: criando barreiras de mudança ou entregando um alto grau de satisfação do cliente. Assim, a sugestão deixada é a de que o provedor busque entender que custos de mudança permeiam sua indústria de atuação, sem prejuízo da entrega de um alto grau de satisfação aos seus clientes, para se alcançar uma alta taxa de retenção de clientes. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 134 6. REFERÊNCIAS ABIHPEC – Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos. Disponível em: <http://www.abihpec.org.br/wp-content/uploads/2012/04/Panorama-dosetor-2011-2012-03-Set-2012.pdf>. Acesso em 14 out.12. ANDERSON, E. W. Cross-category variation in customer satisfaction and retention. Marketing Letters, v. 5, n. 1, p. 19-30, 1994. BURNHAM, T. A.; FRELS, J. K.; MAHAJAN, V. Consumer Switching Costs: A Typology, Antecedents and Consequences. Journal of the Academy of Marketing Science, v. 31, n. 2, p. 109-126, 2003. CHEN, P.-Y. S.; HITT, L. M. Measuring switching costs and the determinants of customer retention in Internet-enabled Businesses: A study of the on-line brokerage industry. Information Systems Research, v. 13, n. 3, p. 255-274, 2002. DICK, A. S.; BASU, K. (1994). Customer loyalty: Toward an integrated conceptual framework. Journal of the Academy of Marketing Science, v. 22, n.2, p. 99-113, 1994. EVANS, P. B.; WURSTER, T. S. Strategy and the new economics of information. Harvard Business Review, v. 75, n. 5, p. 70-82, 1997. FORNELL, C. 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Tese (Doutorado em Administração)--Programa de PósGraduação do Instituto COPPEAD de Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 136 APÊNDICE A – Versão do questionário Pesquisa sobre Salão de Beleza INFORMAÇÕES INICIAIS 1. Sexo ( ) Masculino ( ) Feminino 2. Qual o seu estado civil? 3. ( ) Solteiro ( ) Casado ( ) Viúvo ( ) Desquitado/Divorciado RELACIONAMENTO COM O SALÃO DE BELEZA 1. Com que frequência, em média, você utiliza serviços do seu salão? ( ) Diariamente ou seis vezes por semana ( ) Duas vezes por semana ( ) De três a cinco vezes por semana ( ) Uma vez por semana ( ) Uma vez a cada 15 dias ( ) Uma vez por mês ( ) Uma vez a cada 2 meses ( ) Uma vez a cada 3 meses ( ) Uma vez a cada 4 meses ( ) Menos do que uma vez a cada 4 meses ( ) Sem periodicidade definida PERCEPÇÃO DE TROCA DE SALÃO DE BELEZA Gostaríamos que você atribuísse um valor de 0 a 10, onde 0 significa Discordo Totalmente, 10 significa Concordo Totalmente e 5 significa Nem Concordo Nem Discordo. Utilize os demais números para respostas intermediárias. 1. Levaria muito tempo e esforço para encontrar um novo salão. 2. Eu perderia tratamento especial que eu tenho hoje se mudasse de salão. 3. Se eu mudar, o novo salão pode não oferecer os mesmos serviços que já estou acostumado(a) a utilizar. 4. Se eu tivesse que trocar, existem outros bons salões a escolher. 5. Muita energia, tempo e esforço foram investidos por mim na construção e manutenção do relacionamento com a equipe do meu salão. 6. Eu perderei um relacionamento amigável se eu mudar de salão. 7. Se eu mudar para um novo salão posso ser surpreendido(a) com cobranças de valores não justificados. 8. Eu gosto da imagem que meu salão tem. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 137 ABSTRACT The goal of this paper is to raise and analyze questions pertaining to switching costs in services by means of an inquiry into the dimension of this construct, and once its multidimensionality is ascertained, to identify the types of costs of change that are most apt to hinder the substitution of a service provider in a beauty parlor. The research method used to that end is the survey, the data being treated to factor analysis, with the aim of seeking and defining the dimensions assumed as inherent to the original variables, which were identified in the literature. Ascertaining the multidimensionality of the construct with two factors - "relationship” and “convenience and services" for customers - leads to their management in the sense of attracting and maintaining the customer base of a company in the relevant sector. Keywords: switching costs, satisfaction, loyalty, repurchase intention, customer retention Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36, p. 115-138 2013 138 DADOS DOS AUTORES André Luiz Maiocchi Alves Costa Mestrando em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2012 Graduação: Farmácia (UFRJ) E-mail: [email protected] Átila de Assis Mestrando em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2012 Graduação: Formação de Oficial (AMAN) / Psicologia (UERJ) E-mail: [email protected] Clarissa Taciana Gabriel Gussen Mestranda em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2012 Graduação: Engenharia de Produção (UFRJ) E-mail: [email protected] Glauce Nascimento Mestranda em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2011 Graduação: Engenharia de Produção (UERJ) E-mail: [email protected] Guido Maculan Mestrando em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2012 Graduação: Engenharia Elétrica (PUC-Rio) E-mail: [email protected] Jan Krüger Mestrando em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2012 Graduação: Administração (UFRJ) E-mail: [email protected] Joana Sacramento Mestranda em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2011 Graduação: Engenharia de Produção (PUC-RIO) E-mail: [email protected] Marcelo Franca Mestrando em Administração de Empresa, COPPEAD/UFRJ – Turma 2011 Graduação: Comunicação Social (UFRJ) E-mail: [email protected] Natália dos Santos Jordão de Oliveira Mestranda em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2012 Graduação: Direito (UERJ) E-mail: [email protected] Nicolle Kauffmann Mestranda em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2012 Graduação: Engenharia Elétrica (PUC-Rio) E-mail: [email protected] Sheila Christina Ribeiro Fernandes Mestranda em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2012 Graduação: Administração (UFRJ) E-mail: [email protected] Václav Filho Mestrando em Administração de Empresas, COPPEAD/UFRJ – Turma 2012 Graduação: Administração (UNESA) E-mail: [email protected] NORMAS PARA SUBMISSÃO DE TRABALHOS 1. OBJETIVO Estimular e divulgar a produção acadêmica do corpo discente do COPPEAD, constituída pelos alunos dos cursos latu sensu, mestrado e doutorado. 2. CARACTERÍSTICAS DOS TRABALHOS Os trabalhos publicados nos Cadernos Discentes COPPEAD deverão ser sempre inéditos, subdividindo-se em duas classes: original, quando apresenta temas ou abordagens próprias e de revisão, quando resume, analisa e discute informações já publicadas. Cada Caderno terá, em média, quatro artigos e será publicado assim que quatro artigos sejam aprovados (não existirá periodicidade). Os trabalhos deverão cobrir os tópicos e práticas de Administração, relacionados com os seguintes grandes temas: Economia e Finanças Empreendedorismo Estratégia, Sistemas de Informação e Organizações Marketing Negócios Internacionais Operações, Logística e Tecnologia Planejamento e Controle. 3. SUGESTÕES DE TRABALHOS Trabalhos de final de curso que tiveram, de preferência, conceito A ou equivalente Revisões de literatura Teses e dissertações que não viraram artigo ou livro. 3.1 Exclusões Não serão aceitos os trabalhos que forem análise de um caso didático. 4. NORMAS EDITORIAIS O conteúdo deve ser semelhante, em forma, ao de um artigo a ser submetido a qualquer revista ou congresso, não se exigindo, no entanto, a mesma profundidade teórica ou empírica. a) Os trabalhos deverão ser submetidos no formato pré-estabelecido no parágrafo 4.1 b) Os trabalhos poderão ser submetidos por um professor ou pelo próprio aluno c) Trabalhos submetidos pelo professor já deverão vir acompanhados do formulário de avaliação proposto d) Trabalhos submetidos diretamente pelo aluno, serão posteriormente avaliados pelo professor responsável pela disciplina ou então por um professor indicado pelo Editor e) O Editor poderá solicitar a avaliação de um segundo docente (do Instituto ou externo) Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36 p. 1-142 2013 141 f) O Editor será escolhido pela Diretoria do Instituto, dentre os membros do seu corpo docente g) Toda vez que o trabalho citar nomes de empresas os seguintes procedimentos serão adotados. • • • • O Aluno deve indicar se a coleta de dados foi feita na empresa e, nesse caso, solicitar a autorização da empresa para a publicação. O Professor que avalia o trabalho deve verificar se alguma empresa foi citada ou se sua identificação é óbvia (nas duas situações, somente para casos com dados primários). O Editor é responsável por verificar se a autorização foi dada (nos casos em que o professor avaliador verificar que alguma empresa foi citada a partir de dados primários). O Editor é responsável, com o auxílio do professor, de resolver os casos em que o nome da empresa não tenha sido citado, mas a identificação seja óbvia. 4.1 Estrutura dos trabalhos Sugere-se que a estrutura do trabalho siga as seguintes recomendações: Os trabalhos deverão ter a extensão máxima de 20 páginas incluindo notas e referências bibliográficas Deverão estar em formato Microsoft Word for Windows O texto deverá ser apresentado em papel A4, margens a 3,0 cm, utilizando caracteres em Futura LT BT, corpo 11, com, espaçamento múltiplo de 1,2 cm Apresentar em página separada: título do trabalho, nome completo do(s) autor(es) acompanhado de breve curriculum mencionando profissão, titulação acadêmica, vinculação institucional com endereço completo, telefone, fax e e-mail Título: deverá ser breve e descritivo contendo palavras que representem o conteúdo do texto Deverão conter um resumo em português, de aproximadamente 100 palavras, acompanhado da versão em inglês (abstract), ressaltando objetivo, método, resultados e conclusões do trabalho Palavras-chave: três a cinco termos que expressem o conteúdo do texto, com a devida versão em inglês Texto: deverá apresentar introdução expondo objetivos e metodologia, desenvolvimento tratando da matéria de forma clara e objetiva e conclusões, destacando os resultados obtidos. As seções e sub-seções deverão ser numeradas com títulos próprios evitando-se símbolos e demais caracteres que não denotam estrutura hierárquica do texto Deverão conter referências bibliográficas relacionadas com o assunto, seguindo as regras da ABNT As citações ao longo do texto deverão conter a fonte e serem apresentadas seguindo o padrão sobrenome do autor, ano de publicação e página. Exemplo: (BETHLEM, 1999, p. 3) Apêndice: texto autônomo que complementa a argumentação principal Anexo: texto que serve de fundamentação, comprovação ou ilustração Notas deverão ser apresentadas em ordem progressiva ao longo do texto com sua respectiva lista ao final do texto, localizadas depois das referências bibliográficas. Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n° 36 p. 1-142 2013 142 Rua Pascoal Lemme, 355 - Ilha do Fundão CEP: 21941-918 - Rio de Janeiro - RJ Caixa Postal 68514 21941-972 Fax: (21) 2598-9848 E-mail: [email protected] site: www.coppead.ufrj.br