MITRE, Maristela Jorge. O TRABALHO SOCIAL NOS PROGRAMAS

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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA E PESQUISA
Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local
MARISTELA JORGE MITRE
O TRABALHO SOCIAL NOS PROGRAMAS DE HABITAÇÃO DE INTERESSE
SOCIAL: análise e proposições para adequações metodológicas
Belo Horizonte
2015
MARISTELA JORGE MITRE
TRABALHO SOCIAL NOS PROGRAMAS DE HABITAÇÃO DE INTERESSE
SOCIAL: análise e proposições para adequações metodológicas
Dissertação apresentada ao Programa
de
Pós-Graduação
Mestrado
Profissional
em
Gestão
Social,
Educação e Desenvolvimento Local do
Centro Universitário UNA, como
requisito parcial para obtenção do grau
de Mestre em Gestão Social.
Área de concentração: Inovações
sociais e desenvolvimento Local.
Linha de pesquisa:
Gestão Social e desenvolvimento local
Professor Orientador: Profa. Drª.Wânia
Maria de Araújo
Belo Horizonte
2015
M684t
Mitre, Maristela Jorge
O trabalho social nos programas de habitação de interesse social: análise e
proposições para adequações. / Maristela Jorge Mitre. – 2015.
222f. il.
Orientador: Prof.ª. Drª. Wânia Maria de Araújo
Dissertação (Mestrado) – Centro Universitário UNA, 2015. Programa de
Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local.
Bibliografia f. 149-154
Ficha catalográfica desenvolvida pela Biblioteca UNA campus Guajajaras
1.
Habitação popular - Brasil. 2. Desenvolvimento urbano sustentável. I.
Araújo, Wânia Maria de. II. Centro Universitário UNA. III. Título.
CDU: 658.114.8
Primeiramente dedico esse trabalho aos meus pais amados que, com esforço
e sacrifício me proporcionaram trilhar os primeiros passos na direção do
conhecimento e cuja vida abreviou-lhes a dimensão de sua instrução.
Todas as horas de estudo sobre o tema e seus frutos eu dedico a dois grupos
que se encontram no caminho da intervenção social: os técnicos sociais que,
em sua missão sacerdotal e idílica, não se cansam de conjugar os verbos
querer e poder na vontade de imprimir a mudança ocupando ainda um lugar
tão pequeno na escala de valor; e as pessoas que também desejam seu lugar
no território do viver, sejam elas quais for, que estão sempre a espera de uma
vida repleta de lugares. Que essa espera se converta em busca ativa.
AGRADECIMENTOS
Chegar até aqui foi uma prova de resiliência. Mostrou-me que a vida é uma constante
renovação do nosso ser nesse mundo. E nesta empreitada uma luz divina conduziame. Agradeço, portanto, primeiramente a Deus.
Tive companhias preciosas nessa caminhada como a do Lucius que, apoiando-me
com dedicação, abdicou de muitos momentos de convívio sem abdicar de sua fina
cumplicidade. Minha gratidão e minha reverência eterna por toda parceria e amor.
Agradeço à Rossana, minha querida orientadora institucional, aos meus gestores da
Caixa Econômica Federal que gentilmente me permitiram conciliar o trabalho com os
estudos confiando em minha responsabilidade profissional.
Agradeço aos colegas de trabalho, queridos, que seguraram as ausências, sempre
acompanhando as aventuras, aos técnicos sociais das prefeituras de Alfenas e Três
Pontas, e aos credenciados da Caixa Econômica Federal, sujeitos da pesquisa, que,
mais do que gentis, foram comprometidos com a participação.
Agradeço à professora Dra. Wânia Maria de Araújo, minha orientadora, por ter sido
essa pessoa tão querida. Às professoras Dras. Matilde Meire Miranda Cadete e
Alexandra Nascimentos Passos, externo um especial agradecimento pelas palavras
de incentivo quando da qualificação do projeto. Aos professores das disciplinas
cursadas, meu carinho e agradecimento pelo conhecimento agregado. Por meio de
vocês reporto-me também aos servidores do Centro Universitário UNA pela atenção
a mim dispensada e a todos os queridos colegas da turma do mestrado.
Aos professores da banca de defesa, Dra. Raquel Garcia Gonçalves e Dra. Alexandra
Nascimentos Passos meu reconhecimento pela certeza da contribuição para meu
crescimento cognitivo.
As necessidades sociais têm um fundamento antropológico[...]. A essas
necessidades antropológicas socialmente elaboradas [...] acrescentam-se
necessidades específicas, que não satisfazem os equipamentos comerciais
e culturais que são mais ou menos parcimoniosamente levados em
consideração pelos urbanistas. Trata-se da necessidade de uma atividade
criadora, de obra [...], necessidade de informação, simbolismo, de imaginário,
de atividades lúdicas. [...]. As necessidades urbanas específicas não seriam
necessidades de lugares qualificados, lugares de simultaneidade e de
encontros [...]? Henri Lefebvre, 2001, P.105.
RESUMO
As normas do Ministério das Cidades para programas de habitação de interesse social
constantes da Política Nacional de Habitação determinam a realização de um trabalho
social conjugado com a produção de empreendimentos habitacionais. Esse trabalho
social, regido pela Portaria 21/2014, do Ministério das Cidades, consiste em
estratégias e ações voltadas à promoção de processos participativos e de mobilização
social, inserção social e econômica dos beneficiários, desenvolvimento socioterritorial
e sustentabilidade dos bens e serviços disponibilizados. A partir de estudos
diagnósticos participativos e de um conjunto de atividades informativas, sócioeducativas e estruturantes, o trabalho social assume um papel importante na
promoção e consolidação da gestão social e do desenvolvimento urbano, tornando-se
capaz de contribuir na formação de comunidades cívicas, aptas a fazer a mediação
entre a sociedade e o Estado na conquista de direitos e na materialização do acesso
a bens e serviços para consagração da cidadania plena. Entretanto, o fato de estar
normatizado e ser potencialmente viabilizador da gestão social, não garante sua
concretude; e esse é ponto de origem da discussão que constitui essa dissertação do
Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do
Programa de Pós-Graduação do Centro Universitário UNA. A pesquisa, realizada por
meio de revisão bibliográfica, pesquisa documental e questionários aplicados junto a
profissionais do trabalho social adotando o paradigma qualitativo, teve o propósito de
buscar respostas para as seguintes perguntas: o trabalho social pode ser considerado
o “mediador” entre o que está previsto nas normativas que regulamentam os
programas de HIS e o que se espera materializar nos empreendimentos habitacionais
voltados à população de menor renda? Como propor formas de viabilizar uma
participação construtiva, com engajamento e coesão do público destinatário dos
programas e projetos? Os profissionais do trabalho social conhecem e aplicam as
metodologias de intervenção mais adequadas às intervenções? As instituições estão
preparadas para a implementação do trabalho social com governança e
governabilidade? A concepção dos programas e a forma como são implantadas os
empreendimentos contribuem para uma ação transformadora pelo viés do trabalho
social? Uma análise da Política Nacional de Habitação e do Programa Minha Casa
Minha Vida abre a discussão que passará também por uma abordagem sobre o tema
da gestão social, tomando como base a dinâmica de produção e reprodução das
relações no território e deste próprio território.
Palavras-chave: Trabalho Social. Habitação de Interesse Social. Gestão Social.
Desenvolvimento Urbano. Política Nacional de Habitação.
ABSTRACT
The legal regulations of the Ministry of cities for housing programs social interest
constituent from the National Housing Policy determine the accomplishment of a social
work combined with the production of housing developments. This social work, ruled
by the 21st / 2014 Therm, from the Cities Ministry, consists of strategies and actions
toward the promotion of participatory and and social mobilization processes, social and
economic insertion of the gainers, social-territorial development and, the riches and the
available services sustainability. From participatory diagnostic studies and a set of
information, social-educational and structuring activities, the social work assumes an
important role in the promotion and consolidation of social management and urban
development, becoming able to contribute in the formation of civic communities, apt to
doing the mediation between the society and the State in the achievement of rights and
in the materialization of access to the riches and services to the consecration of the
fully citizenship. However, the fact of being standardized and being potentially enabler
of the social management, doesn’t ensure its concreteness; and this is the point of
origin of the discussion that constitutes this dissertation resulting from research of the
completion of the Professional Master Course in Social Management, Education and
Local Development of the Post-graduation Program from UNA University Centre. The
research, carried out through literature and documentary research and questionnaires
applied with professionals from social work adopting the qualitative paradigm, aimed to
seek answers for the following questions: Can the social work be considered the
“mediator” between what is foreseen in the regulations which settle the programs of
Social Housing Interest and what is hoped to be materialized in the housing
developments directed to the low-income population? How to propose ways of making
feasible a constructive participation, with engagement and cohesion of the target public
of programs and projects? Do the professionals of social work know and apply the most
appropriate intervention methodology to interventions? Are the institutions prepared for
the implementation of social work with governance and governability? Do the
conception of programs and the way the enterprises are implemented contribute to a
transforming action through the bias of social work? An analysis from the National
Housing Policy and the Program “Minha Casa Minha Vida” (My House My Life) opens
the discussion which will also undergo an approach about the theme of social
management, based on the production and reproduction dynamics in the territory and
this own territory.
Key-words: Social Work. Social Housing Interest. Social Management. Urban
Development. National Housing Policy.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Trabalho Social
LISTA DE QUADROS E TABELAS
Tabela 1 – Marcos Temporais e Instrumentos de Execução do Trabalho Social
Quadro 1 – Categoria 9 - Metodologias consideradas mais adequadas e ferramentas
mais utilizadas pelos profissionais na realização do trabalho social
Quadro 2 – Categoria 13 – Atividades realizadas pelos profissionais na realização do
trabalho social
Quadro 3 – Considerações gerais e sugestões dos profissionais para o incremento
do trabalho social
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
BID
Banco Interamericano de Desenvolvimento
BNDES
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BNH
Banco Nacional de Habitação
CADÚNICO
Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal
CAIXA
Caixa Econômica Federal
CEP
Comitê de Ética em Pesquisa
COHAB
Companhias de Habitação
CONCIDADES
Conselho das Cidades
FAR
Fundo de Arrendamento Residencial
FAT
Fundo de Amparo ao Trabalhador
FDS
Fundo de Desenvolvimento Social
FGTS
Fundo de Garantia Por Tempo de Serviço
FNHIS
Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social
HBB
Habitar Brasil BID
HIS
Habitação de Interesse Social
MCIDADES
Ministério das Cidades
ONG
Organização Não Governamental
OGU
Orçamento Geral da União
PAC
Programa de Aceleração do Crescimento
PLANHAB
Plano Nacional de Habitação
PMCVM
Programa Minha Casa Minha Vida
PMCMV-FAR
Programa Minha Casa Minha Vida com recursos FAR
PMI
Project Management Institute
PNH
Política Nacional de Habitação
PNHIS
Política Nacional de Habitação de Interesse Social
PNHU
Programa Nacional de Habitação Urbana
PPA
Plano Plurianual
SNHIS
Sistema Nacional de habitação de Interesse Social
TAC
Taxa de Apoio Comunitário
Sumário
Lista de Figuras .............................................................................................................
Lista de Siglas ...............................................................................................................
1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 13
CAPÍTULO 1: Habitação de Interesse Social: O trabalho social como possibilidade de
gestão social ............................................................................................................. 26
Resumo ..................................................................................................................... 15
Introdução ................................................................................................................. 29
1.1. Política Nacional de Habitação de Interesse Social ........................................... 33
1.1.1. Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social. ...................................... 35
1.2. O trabalho social como possibilidade de gestão social ..................................... 44
1.3. Gestão Social e trabalho social .......................................................................... 58
1.4. Considerações finais .......................................................................................... 65
Referências Bibliográficas ......................................................................................... 67
CAPITULO 2. Um olhar técnico sobre o trabalho social nos Programas de Habitação
de Interesse Social .................................................................................................... 73
2.1. Introdução .......................................................................................................... 74
2.2. O trabalho social no contexto da habitação de interesse social ......................... 81
2.2. Metodologia da pesquisa.................................................................................... 86
2.3. Coleta de Dados e categorias de análise ........................................................... 90
2.5.Considerações finais ......................................................................................... 145
Referências ............................................................................................................ 148
CAPÍTULO 3. Produto Técnico: Guia de Orientações Metodológicas para o Trabalho Social
APÊNDICES
I. Questionário ...............................................................................................................
II. Questionário ..............................................................................................................
......................................................................................................................................
14
INTRODUÇÃO
O objeto de estudo da presente pesquisa está centrado no trabalho social1 no contexto
do desenvolvimento urbano2 com recorte nos Programas de Habitação de Interesse
Social – HIS, do Governo Federal geridos pelo Ministério das Cidades – MCidades. A
arquitetura da discussão abriga as premissas e os objetivos do trabalho social no
contexto em questão e busca identificar, ressaltar e avaliar as dificuldades e
potencialidades dos Projetos de Trabalho Social3 na promoção da participação, da
gestão social e do desenvolvimento local no âmbito da Política Nacional de Habitação
de Interesse Social – PNHIS, instituída pela Lei 11.124/2005.
Para iniciar a discussão buscou-se analisar, à luz da legislação e das normativas do
MCidades, as premissas dos programas de provisão habitacional, comparando-as
com a prática e os instrumentos utilizados pelos profissionais da área social nos
projetos propostos e implementados nas intervenções.
Para uma melhor compreensão do que se propõe, é pertinente trazer à tona a
concepção do trabalho social na perspectiva dos programas de provisão habitacional,
que, com a faculdade de promover um conjunto de ações organizadas por eixos de
atuação, tem por objetivo promover a autonomia e o protagonismo social por meio de
mecanismos que viabilizem a “participação dos beneficiários nos processos de
decisão, implementação e manutenção dos bens e serviços a fim de adequá-los às
necessidades e realidade local” (BRASIL, 2010, p. 81 ), configurando-se como um
1
Seus objetivos, premissas e condições de realização serão descritos com maior profundidade no primeiro capítulo
desta dissertação.
2
Desenvolvimento urbano entendido como melhoria das condições materiais e subjetivas de vida nas cidades,
com a diminuição da desigualdade social e garantia de sustentabilidade ambiental, social e econômica. Ao lado da
dimensão quantitativa da infraestrutura, dos serviços e dos equipamentos urbanos, o desenvolvimento urbano
envolve também uma ampliação da expressão social, cultural e política do indivíduo e da coletividade, em
contraponto aos preconceitos, à segregação, à discriminação, ao clientelismo e à cooptação.
(www.antac.org.br/pdf/relator/1.pdf, aces. em 20/03/2006, apud SANTOS, C.C.B. Participação cidadã e
participação comunitária, p. 19, 2006).
3
Documento que sistematiza a proposta de trabalho a ser realizado junto aos beneficiários e exigido nas
intervenções de habitação e de desenvolvimento urbano geridas pelo Ministério das Cidades que tenham impacto
direto na vida das comunidades ou que envolvam reassentamento, remanejamento de famílias ou produção de
moradia. Fundamenta-se nos princípios da participação comunitária e sustentabilidade dos empreendimentos e
tem enfoque multidisciplinar. Tais projetos devem ser desenvolvidos pelos agentes executores (prefeituras e outras
entidades ) com todas as famílias beneficiárias. As equipes técnicas destinadas a elaborá-los e executá-los devem
ser interdisciplinares e constituídas por profissionais da área social com experiência em processos participativos
devendo a responsabilidade técnica ficar a cargo de Assistentes Sociais ou Sociólogos (BRASIL, 2010, p.4).
15
componente essencial para a gestão social, sustentabilidade das intervenções e
desenvolvimento local.
A pergunta norteadora da pesquisa foi assim estruturada: o trabalho social pode ser
considerado o “mediador”
4
entre o que está previsto nas normativas que
regulamentam os programas de HIS e o que se espera materializar nos
empreendimentos habitacionais voltados à população de menor renda? Dessa
questão central derivaram outras que foram traduzidas da seguinte forma: é possível
contribuir na proposição de melhores projetos, no incremento e efetividade das ações
de mobilização e organização comunitárias desenvolvidas no trabalho social com
vistas à promoção do desenvolvimento local e da gestão social? É possível propor
formas de viabilizar uma participação construtiva, com engajamento e coesão do
público destinatário dos programas e projetos? Os técnicos sociais, responsáveis pela
elaboração e execução dos projetos sociais, conhecem e aplicam as metodologias de
intervenção mais adequadas ao público beneficiário e ao tipo de programa a que estão
inseridos? As instituições estão preparadas para a implementação do trabalho social
com governança e governabilidade?
Partiu-se do pressuposto de que há uma grande dificuldade entre os profissionais da
área social na aplicação prática do conhecimento, na interpretação e na aplicação das
orientações técnicas, premissas, leis e normas necessárias para a realização do
trabalho social e sua interlocução com as obras. Mas acredita-se, sobretudo, que as
ferramentas, metodologias e técnicas de intervenção utilizadas na execução de
projetos não são condizentes com o que se espera do trabalho social, principalmente
no que concerne à comunicação, à informação, à instauração de processos
participativos para a mobilização e organização comunitárias, para a construção de
diagnósticos e a apropriação e potencialização de saberes locais. Presume-se ainda,
pela forma como se deu o processo de descentralização e municipalização das
políticas públicas no país, que os governos locais ainda não estão preparados para
4
A partir do conceito de mediação como instituto jurídico que visa à promoção do diálogo cooperativo das partes
e meio consensual e imparcial de facilitar a comunicação e a construção de acordos (OAB/Guarujá. 2010). Nesse
sentido, o Trabalho social como mediador estaria responsável por viabilizar a participação ampla e ativa e viabilizar
a interlocução entre as políticas públicas e as demandas das comunidades atendidas com o objetivo final de
promover a “apropriação e o usufruto efetivo dos serviços e programas sociais” [...] (CARVALHO, 2014, p. 19).
16
se ‘adaptarem ao seu meio social’ (PUTNAM, 2006) apresentando fraco desempenho
no campo da implementação das políticas públicas.
A realização da pesquisa teve sua origem nos questionamentos da pesquisadora que,
trabalhando na área de habitação desde 1989 e atuando como Assistente de Projetos
Sociais na área de Desenvolvimento Urbano da Caixa Econômica Federal desde
2000, desenvolveu ao longo de sua atuação profissional uma percepção crítica acerca
das deficiências dos projetos sociais, da maneira como o trabalho social é visto,
proposto e desenvolvido junto aos empreendimentos de Habitação de Interesse Social
e da forma como as instituições lidam com a exigência de sua realização nos
programas. Tal percepção constituiu-se como balizadora ao longo de toda pesquisa.
Assim, credita-se ao presente estudo a oportunidade de poder identificar onde
residem as dificuldades na implementação de projetos sociais efetivos, que, em
consideração às suas premissas, levem a cabo seus objetivos suscitando assim um
debate em torno das reais possibilidades do trabalho social nos programas de
provisão habitacional.
Ressalta-se
que
ao
trabalho
social
é
atribuída
a
responsabilidade
pela
sustentabilidade dos empreendimentos, a qual compreende, nesse caso, a promoção
da inserção social das famílias beneficiárias no processo construtivo e nos novos
espaços de moradia, a redução dos impactos nos ou decorrentes dos
reassentamentos de famílias, o correto uso e apropriação dos bens e serviços, o
desenvolvimento local e gestão social. Para o alcance desse feito, as equipes técnicas
responsáveis pelo trabalho social devem estar aptas a desenvolver ações
informativas, socioeducativas e psicopedagógicas aliadas a ações estruturantes 5 a
partir de metodologias de intervenção social próprias a cada etapa dos trabalhos – do
diagnóstico, passando pela implementação até o pós-obra e a avaliação final –
permeando todo o processo com ações de monitoramento. Entretanto, para tamanho
desafio, não lhe são oferecidas condições logísticas, operacionais, institucionais e
instrucionais para sua realização resultando em projetos superficiais desenvolvidos
5
Ações voltadas à geração de trabalho e renda, à inclusão de gênero e ao desenvolvimento sócio-organizativo
que resultem na mudança efetiva nas condições de vida das comunidades diretamente beneficiadas pelos
programas. Essas ações, a partir da publicação da Portaria 21 do Ministério das Cidades, em janeiro de 2014,
devem levar em consideração a macroárea do empreendimento.
17
apenas como cumprimento de uma exigência protocolar deixando para trás um legado
que só reforça a fragilidade das políticas públicas.
Como parte integrante de uma política habitacional setorizada e fragmentada, os
projetos sociais não são pensados dentro de um horizonte de totalidade e
complementaridade que promova uma interface entre as esferas econômica, social e
política (PAZ; TABOADA, 2006). O resultado disso são ações dispersas que não se
consolidam como projeto estruturante voltado às demandas sociais e à promoção do
desenvolvimento socioeconômico e sócio-organizativo. O trabalho social, que poderia
ser o elemento articulador de uma intersetorialidade e interdisciplinaridade 6 que
contribuísse na promoção da interlocução das políticas públicas, se vê pouco vigoroso
e inoperante diante da precariedade das condições em que é realizado.
Dessa forma, o problema central da pesquisa residiu na fragilidade do trabalho social
nos programas de habitação de interesse social que, percebe-se, não vem sendo
efetivo no cumprimento de suas premissas e das diretrizes dos programas de provisão
habitacional. Essa não efetividade do trabalho social, resultante também da falta de
interesse e apoio político e logístico por parte do poder executivo local e da forma
como as intervenções são concebidas, planejadas e influenciadas pelas instituições
formais (PUTNAM, 2006), compromete sobremaneira a sustentabilidade dos
empreendimentos habitacionais voltados à população de baixa renda.
A partir dessa questão estabeleceu-se uma discussão em torno dos limites e
possibilidades do trabalho social na Política Nacional de Habitação de Interesse Social
com um olhar direcionado aos métodos e técnicas de intervenção social e de
gerenciamento dos projetos sociais nos programas de provisão habitacional para
população de baixa renda. Entende-se haver certa fragilidade nas ações voltadas à
realização de diagnósticos socioterritoriais e nas ações inerentes à gestão social e ao
desenvolvimento local que minimamente englobarão atividades socioeducativas e
informacionais, de mobilização e organização comunitárias, de geração de trabalho e
renda. Por sua vez, a gestão dos recursos do projeto e o processo de transição,
6
Interdisciplinaridade “[...] não apenas na sua faceta cognitiva - sensibilidade à complexidade, capacidade para
procurar mecanismos comuns, atenção a estruturas profundas que possam articular o que aparentemente não é
articulável - mas também em termos de atitude - curiosidade, abertura de espírito, gosto pela colaboração, pela
cooperação, pelo trabalho em comum” (POMBO, OLGA, 2004).
18
entendido como o momento da conclusão dos trabalhos, da saída da equipe da área
de intervenção e da entrega dos produtos da intervenção social às comunidades,
também se coloca como um ponto frágil desse processo.
Assim, constituiu-se como objetivo geral da pesquisa a análise das metodologias de
intervenção social e de gerenciamento de projetos adotadas pelos técnicos sociais na
proposição e execução dos projetos sociais a partir das orientações normativas do
MCidades relativas ao trabalho social nos Programas de HIS, tendo em vista o
desenvolvimento de contribuição técnica na área de gestão social voltada ao
desenvolvimento local. Para o desenvolvimento da pesquisa foram definidos os
seguintes objetivos específicos:
1. Analisar as orientações e premissas das normativas que regem o trabalho social
nas políticas de desenvolvimento urbano, notadamente no que concerne à HIS;
2. Investigar, descrever e analisar como o trabalho social vem sendo realizado pelos
técnicos sociais das prefeituras e pelos técnicos sociais credenciados7 pela Caixa
Econômica Federal para a prestação de serviços nas intervenções de
desenvolvimento urbano voltadas à HIS;
3. Identificar junto aos técnicos sociais vinculados às prefeituras e junto aos
credenciados da Caixa Econômica Federal as dificuldades na aplicação das
orientações contidas nas normativas em especial no que tange aos processos
participativos e de organização comunitária, buscando conhecer as metodologias
de intervenção social e de gerenciamento de projetos utilizadas na elaboração e
execução dos projetos;
4. Desenvolver um Guia de Orientações Metodológicas Para a Intervenção Social
como contribuição técnica na área de gestão social voltada à promoção do
desenvolvimento local..
7
Profissionais e empresas especializadas em coleta e análise de dados, elaboração e execução de projetos sociais
e planos de intervenção, apoio técnico e consultoria especializada, contratados pela CAIXA ECONÔMICA
FEDERAL por meio de editais específicos regidos pela Lei 8666/93, conforme Edital de Credenciamento nº
1447/2014 - CPL/GILOG/BH da Caixa Econômica Federal.
19
Cabe dizer que a relevância da pesquisa reside no fato de poder contribuir com as
discussões em torno das políticas públicas concernentes aos programas de
desenvolvimento urbano com foco na habitação de interesse social colocando o
citadino no centro dessa discussão. É possível dizer que, apesar do trabalho social
estar prescrito na regulamentação dos programas e ser inerente às questões urbanas,
muito pouco do que lhe é atribuído se implementou de fato nas intervenções até então
realizadas no país. Dada sua importância, é uma prática que necessita de
amadurecimento, profissionalização, reconhecimento, valorização e consolidação e
as instituições responsáveis pela gestão e implementação das políticas públicas, por
sua vez, precisam colocá-lo na pauta da sua governança.
É ainda importante ressaltar que o trabalho social nesses programas, que sempre
acabam por produzir grandes conjuntos habitacionais, sustenta-se na crença de que
a concessão da moradia pura e simplesmente não se configura como ação
emancipatória e de construção da cidadania. O direito à moradia está associado ao
direito e acesso à saúde, à educação, ao lazer, ao esporte, ao trabalho, à mobilidade,
à informação. Defende-se, portanto, que é preciso trazer o beneficiário para o centro
do processo de concepção e consolidação dos empreendimentos, promovendo ali,
nas comunidades, uma gestão social baseada na formação política dos indivíduos e
da coletividade para o despertar de uma nova consciência cidadã que leve à exata
compreensão dos papéis e atribuições de cada um na concepção e aplicação das
políticas públicas.
As informações apuradas a partir da pesquisa permitiram, não só confirmar certos
pressupostos, mas construir um produto técnico que, conjectura-se, possa contribuir
para a potencialização e efetividade das ações na consecução dos objetivos do
trabalho social como parte de uma política pública de habitação que deve ser, por
essência, intersetorial, interdisciplinar e ter como centro os indivíduos e as
comunidades atendidas.
Espera-se que a pesquisa realizada possa elucidar e ratificar as dimensões do
trabalho social no desenvolvimento urbano reforçando sua importância enquanto
instrumento capaz de promover a participação e a mobilização comunitária, a gestão
social e o desenvolvimento local. Empreendeu-se como resultado a produção de um
20
guia prático aplicável às ações do trabalho social não necessariamente de forma
inovadora, mas de forma que os técnicos sociais possam vislumbrar mais facilmente
algumas aplicações práticas da teoria para a concretização das premissas dos
programas e do próprio trabalho social. Um contributo para a formação e qualificação
do trabalhador social que recebe o título de Guia de Orientações Metodológicas para
a prática social e que compõe o Capítulo 3 desta dissertação.
Por fim, acredita-se que a revisão bibliográfica, que constituirá o corpo teórico desta
pesquisa, e os relatos advindos da análise dos dados possam contribuir na ampliação
do debate e na disseminação das premissas e conceitos relacionados ao trabalho
social no desenvolvimento urbano ratificando sua importância como meio capaz de
promover a gestão social e o desenvolvimento local a partir da utilização de
metodologias adequadas de informação, comunicação e participação e abrindo novas
questões ao colóquio.
Ao oferecer, como resultado desta pesquisa, um suporte didático-metodológico
relacionado à perspectiva do gerenciamento de projetos e da intervenção social em
habitação, tornar-se-á possível contribuir para o trabalho dos profissionais
responsáveis pela elaboração e execução e acompanhamento de projetos sociais
facilitando-lhes a escolha das metodologias mais adequadas a cada situação ou etapa
das intervenções, contribuindo assim na promoção da eficácia, eficiência e efetividade
de suas ações.
Uma outra expectativa é a de que a pesquisa e o produto técnico dela resultante
possam permitir a percepção de novos caminhos para a realização do trabalho social
junto aos programas de HIS, dada a carência na disseminação de instrumentos,
métodos e materiais que melhor possam elucidar e incrementar a prática dos
profissionais do trabalho social que atuam na promoção do desenvolvimento urbano.
Portanto, a pesquisa tem a intenção de contribuir para a identificação e proposição
de metodologias apropriadas à realização de diagnósticos e implementação de
processos participativos que resultem no fortalecimento social, no desenvolvimento
local, no alcance dos objetivos dos programas, na sustentabilidade das intervenções.
E que essa sustentabilidade possa se traduzir na promoção e ampliação da cidadania,
na melhoria contínua e apropriação, pelos beneficiários dos bens e serviços
21
produzidos e que findem na inclusão social e econômica das famílias atendidas e na
disseminação e assimilação de informações e conceitos que possam gerar
empoderamento social.
Do ponto de vista da produção de conhecimento, a pesquisa traz uma discussão em
torno da temática urbana no contexto da recente Política Nacional de Habitação de
Interesse Social fazendo uma abordagem dos conceitos inerentes ao trabalho social,
em especial das metodologias de intervenção social em programas de provisão
habitacional e de gerenciamento de projetos públicos aplicados ao desenvolvimento
socioeconômico e territorial.
O referencial teórico que embasa essa discussão traz autores como Henri Lefrebvre
(1997; 1999), Milton Santos (2000), Dirce Koga (2011), Ermínia Maricato (2001; 1987),
Raquel Rolnik (2000; 2002); Ana Fani Carlos ( 2012 ), debatendo a questão urbana;
Robert D. Putnam (2006), Maria da Gloria Gohn (2004), Marilene Maia (2005); apoiam
a discussão da gestão social e do desempenho institucional do poder público. Serge
Paugam (2004 ) traz para esta discussão um embasamento para abordagem da
questão da exclusão social. O tema do trabalho social vinculado ao desenvolvimento
urbano propriamente dito ainda é incipiente na literatura, mas as ponderações da
pesquisadora encontraram forte identificação com as reflexões de Maria do Carmo
Brant de Carvalho (2014).
Pela interface identificada, entendeu-se mais pertinente o enquadramento do presente
estudo na linha de pesquisa em Gestão Social e Desenvolvimento Local do Mestrado
Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Programa de
Pós-Graduação do Centro Universitário UNA. Dessa forma, pela pertinência, torna-se
essencial, portanto, o direcionamento de algumas reflexões no sentido de definir as
escalas do desenvolvimento delimitando todos esses conceitos no contexto da cidade
por ser esse o cenário em que se insere a pesquisa..
Em decorrência das grandes transformações observadas nos modos de produção e
acumulação capitalista, os sentidos atribuídos ao desenvolvimento adquiriram novos
pressupostos conceituais exigindo que façamos a aproximação necessária ao
22
presente debate que tem por contorno as comunidades atendidas pelos programas
de habitação de interesse social fulcro da premissa do desenvolvimento local.
Pensando que o desenvolvimento em qualquer de suas escalas acontece a partir das
relações de troca, sejam elas sociais, econômicas, culturais, torna-se essencial trazer
o citadino para o centro da discussão e pensar seus papéis enquanto agente propulsor
ou limitador do processo de desenvolvimento que se instaura a partir de uma
organização espacial caracterizada pelo bairro, a comunidade ou a cidade. E, pelo
exposto, considerando essa dimensão relacional existente no princípio do
desenvolvimento imprime-se como exigência uma discussão em torno do conceito de
gestão social. Todas essas abordagens serão feitas no primeiro capítulo desta
dissertação.
Essa prática, constituída pelo trabalho social, que tem ao mesmo tempo uma estreita
relação com a gestão social e com o desenvolvimento local adquire um profundo teor
de uma educação popular “que promova a conscientização a partir de uma leitura
crítica do mundo, tomando consciência dos problemas [...] no sentido não somente de
conhecer, mas de compreender, analisar criticamente, refletir [...] e transformá-lo”
(QUARESMA, 2012, p.188 ). Será por esse viés que se pensará a gestão social e o
desenvolvimento local no âmbito do presente estudo em interlocução com os
conceitos de governança e governabilidade como ingredientes essenciais para um
desempenho institucional generoso na efetividade das ações e políticas públicas.
A definição da metodologia da pesquisa levou em consideração o fato de que a
pesquisa nas Ciências Sociais lida diretamente com o indivíduo, a sociedade e todas
as suas implicações culturais, sociais, políticas, emocionais, econômicas, e, como tal,
acaba por ter “um substrato comum de identidade com o investigador, tornando-os
solidariamente imbricados e comprometidos” (DESLANDES; GOMES, MINAYO,
2012, p. 13).
As questões implícitas na pesquisa social comportam particularidades que dificilmente
se permitem quantificar constituindo, dessa forma, seu caráter “essencialmente
qualitativo” (DESLANDES; GOMES, MINAYO, 2012, p.14, grifo dos autores ), que
envolve o “universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos
23
valores, das atitudes” (DESLANDES; GOMES, MINAYO, 2012, p. 21 ) numa relação
dinâmica e processual entre o mundo real e os sujeitos. A partir dessa relação e nas
observações e padrões encontrados nos dados levantados, o pesquisador desenvolve
conceitos, ideias e entendimentos e, intervindo na realidade, muda a si próprio e/ou
instiga a mudança no outro. Essa dinâmica fundamenta-se no método dialético e
constitui o arcabouço da abordagem qualitativa aqui adotada.
Portanto, a pesquisa, desvia-se da perspectiva anunciada pelo positivismo clássico,
inerente às ciências exatas e ao paradigma quantitativo, privilegiando assim a
percepção da ação de sujeitos estruturada de forma dinâmica e relacional e o contexto
social, jurídico, político-institucional, econômico e ambiental que envolve a questão
urbana. Por esta razão a pesquisadora valeu-se dos princípios da fenomenologia e da
dialética adotando o paradigma qualitativo. Essa temática será objeto de reflexão no
capítulo 2.
Entre os procedimentos de coleta de dados para a presente pesquisa incluiu-se a
revisão bibliográfica e a pesquisa documental em razão da natureza inter e
multidisciplinar que rege o campo de interesse e a amplitude do objeto da pesquisa,
considerando seu caráter institucional e sua relação com um programa do Governo
Federal de abrangência nacional. Nas investigações, procurou-se privilegiar
publicações dos últimos cinco anos que abordem os conceitos pertinentes à discussão
aqui proposta tais como trabalho social, cidadania, território, desenvolvimento local,
gestão social, participação, mobilização social, governança e governabilidade na
busca de reunir elementos que possam cercar tais conceitos da visão da
interdisciplinaridade e da intersetorialidade reconhecidamente essenciais nos projetos
de desenvolvimento.
Para o levantamento de dados empíricos foi utilizada a técnica de questionário
autoaplicado contendo questões abertas e fechadas o qual foi aplicado junto a 02
(dois) técnicos sociais da Prefeitura de Alfenas e 03 (três) da Prefeitura de Três
Pontas8, ambos os municípios localizados no Sul de Minas Gerais e com intervenções
em programas habitacionais do Programa Minha Casa Minha Vida, inserido na
8
Apêndice I
24
PNHIS. O primeiro com empreendimentos na tipologia verticalizada, no formato de
condomínio, e o segundo com empreendimentos na tipologia horizontal, no formato
de loteamento. Outro modelo de questionário 9 foi aplicado também junto a 13
profissionais da área social, credenciados pela Caixa Econômica Federal para
prestação de serviços especializados em trabalho social, o que caracterizou uma
amostragem não probabilística intencional.
O universo desses técnicos constitui-se necessariamente, por exigência do Ministério
das Cidades, de psicólogos, pedagogos, sociólogos e assistentes sociais os quais
trabalham não só com os programas de habitação de interesse social, recorte do
objeto de pesquisa, mas com outros programas e outras ações incluindo aquelas
relacionadas ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) com intervenções
em saneamento, regularização fundiária, reassentamento e remanejamento de
famílias. A partir desse universo, os sujeitos desta pesquisa foram os técnicos sociais
que já tiverem realizado, ou que realizam trabalho social em empreendimentos
habitacionais de interesse social no âmbito da PNH.
Buscou-se, junto aos sujeitos da pesquisa, identificar como aqueles profissionais
atuam como Responsáveis Técnicos (RT) na proposição e execução dos projetos
sociais e dos programas de habitação de interesse social. Sabe-se, entretanto, que
não é possível generalizar os resultados do inquérito a toda a população de técnicos
sociais, embora esse universo seja representativo, mas as informações ali contidas,
seguramente auxiliaram na consecução das análises realizadas.
Ciente de que todo o conhecimento gerado a partir da investigação não se consagrará
como verdade absoluta, infalível ou definitiva, coube a esta pesquisadora primar pela
compreensão de tudo o que buscou investigar, ainda que a explicação dos
fenômenos, dados e informações levantados não seja um princípio ou a primazia do
método qualitativo.
De acordo com Alves-Mazzotti e Gewandsznajder, F. (1998, p. 170)
Pesquisas qualitativas tipicamente geram um enorme volume de dados que
precisam ser organizados e compreendidos. Isto se faz através de um
9
Apêndice II
25
processo continuado em que se procura identificar dimensões, categorias,
tendências, padrões, relações, desvendando-lhes o significado. Este é um
processo complexo, não linear, que implica um trabalho [...] que se inicia já
na fase exploratória e acompanha toda a investigação. À medida que os
dados vão sendo coletados, o pesquisador vai [...] construindo interpretações
e gerando novas questões e/ou aperfeiçoando as anteriores, o que, por sua
vez, leva a buscar novos dados, complementares ou mais específicos, que
testem suas interpretações [...].
Assim, considerando o caráter descritivo da pesquisa e a utilização de método
indutivo, característico da pesquisa qualitativa, a investigação não envolveu uma
coleta de dados voltada à comprovação de teorias, mas adotou procedimentos
interpretativos e exploratórios para uma melhor compreensão do tema apresentado.
Buscou-se estruturar uma investigação maior dos significados que cercam os erros e
acertos, limites e possibilidades do trabalho social no desenvolvimento urbano.
Como o contexto da pesquisa está diretamente relacionado com a área de atuação
profissional da pesquisadora, que, por conseguinte, já indaga, apreende, pressupõe,
se inquieta e muitas vezes constata algumas dimensões da análise no seu fazer
cotidiano de trabalho, é possível afirmar que, apesar das dificuldades inerentes a esse
tipo de pesquisa, essa análise foi desenvolvida durante toda a investigação por
“teorizações progressivas em processo interativo com a coleta de dados” (ALVESMAZZOTI A.J;
GEWANDSZNAJDER, F. , 1998, p.171), em decurso contínuo e
permanente de reflexão para a compreensão.
O conteúdo que se apresenta aqui está estruturado em três capítulos, cada um
desenvolvido no formato de artigo, conforme determinação do colegiado do programa
de Pós de Graduação em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do
Centro Universitário UNA. O primeiro consiste do referencial teórico para a inserção e
discussão dos conceitos de território, governança e governabilidade, gestão social, e
desenvolvimento local; todos inerentes e essenciais à compreensão do objeto da
pesquisa e aprofundamento do tema.
Pela perspectiva educadora existente no trabalho social, ainda no primeiro capítulo
faz-se uma aproximação da práxis do trabalho social como processo de gestão
coletiva com a perspectiva da educação como ação política e transformadora proposta
por Paulo Freire. O capítulo apresenta também uma aproximação do trabalho social
26
com as metodologias de intervenção social e de gerenciamento de projetos indagando
sobre os limites e potencialidades do trabalho social como instrumento de mediação
entre aquilo que está prescrito nas normativas dos programas de habitação de
interesse social e o que efetivamente se materializa ou se espera materializar na
prática. Para contextualização dessa abordagem, por pertinência, percebeu-se
necessário introduzir algumas informações sobre o MCidades e a Política Nacional de
Habitação trazendo com tema central o trabalho
O segundo capítulo discute mais especificamente no trabalho social nos programas
de Habitação de Interesse Social e apresenta os relatos da pesquisa e procedimentos
adotados na coleta de dados. A análise das informações obtidas a partir do
questionário aplicado junto a profissionais do trabalho social, estruturado com
questões, abertas, fechadas e mistas, descortinou, portanto, a prática desses
profissionais nas intervenções de habitação de interesse social, suas percepções,
experiências e dificuldades.
As informações levantadas e apresentadas nesse capítulo embasam um debate em
torno das potencialidades e deficiências do trabalho social e permitem elucidar
algumas ações que, desejáveis, levariam a uma maior efetividade do trabalho social
a partir de metodologias de intervenção social e de gerenciamento de projetos
adequadas à natureza das intervenções em questão. O mais importante a considerar
é que as percepções e discussões trazidas nesse capítulo abrem caminho para novas
pesquisas e indagações que possam contribuir na consolidação do trabalho social
como um importante instrumento a ser colocado a serviço do desenvolvimento
socioterritorial.
O terceiro capítulo, resgatando parte do referencial teórico, traz uma síntese
conclusiva da pesquisa, abre caminho para novas pesquisas e indagações e nos leva,
na sequência, às considerações finais construindo assim uma reflexão acerca dos
limites e possibilidades do trabalho social. O capítulo encerra com a apresentação do
produto técnico constituído por um guia de orientações metodológicas e de
gerenciamento de projetos aplicável não só aos programas de provisão habitacional
para populações de baixa renda, mas a outras intervenções sociais com foco no
desenvolvimento, o qual tem por objetivo reunir em um só instrumento algumas
27
orientações técnicas para a proposição e execução de projetos sociais na intenção de
facilitar o trabalho dos profissionais da área social. Espera-se, portanto, que a
aplicação do produto técnico não se restrinja apenas ao universo do recorte desta
pesquisa, mas estenda-se como orientação metodológica a intervenções sociais de
outras naturezas.
28
CAPÍTULO 1
HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL: o trabalho social como possibilidade de
gestão social
MITRE, Maristela Jorge1
ARAÚJO, Wânia Maria de2
RESUMO
A presente análise é parte integrante da dissertação de mestrado em Gestão Social,
Educação e Desenvolvimento Local, realizado pelo Programa de Pós-Graduação do
Centro Universitário UNA, e busca contribuir para o debate em torno da temática
urbana e das metodologias de intervenção social nos programas voltados ao
desenvolvimento socioterritorial, entre eles os de provisão habitacional. As
abordagens e reflexões aqui trazidas serão desenvolvidas de forma a inserir o leitor
no contexto da Política Nacional de Habitação de Interesse Social instituída pelo
Ministério das Cidades, com recorte no Programa Minha Casa Minha Vida, e do
Trabalho Social como parte integrante e essencial para a consecução de suas
premissas. Pela pertinência em relação ao tema, conceitos como território, gestão
social, participação governança e governabilidade e práxis social amarram a
discussão que está referenciada, entre outros, em Santos (2010); Koga (2011);
Putnam (2006); Maia (2005); Gohn (2004); Tenório (2005); Maricato (2011); Rolnik
(2000; 2002); Carlos ( 2012 ); Carvalho (2014) e Paugam (2003). O referencial teórico
incorpora ainda, nesse primeiro capítulo da dissertação, uma discussão em torno das
dificuldades e potencialidades do trabalho social na promoção da participação e do
desenvolvimento sócio territorial. Por tratar-se de pesquisa social com particularidades
não quantificáveis toda discussão e análise levou em consideração a ação dinâmica
e relacional dos sujeitos sob regência do método dialético. Para discussão do
conteúdo deste artigo realizou-se revisão bibliográfica em torno dos conceitos e temas
pertinentes e relativos ao trabalho social.
Palavras-chave: Trabalho Social; Habitação de Interesse Social. Gestão Social.
Território. Desenvolvimento Urbano. Projeto Social.
ABSTRACT
The present analysis is part of a Master course dissertation in Social Management,
Education, and Local Development, carried out by the Post-graduation Program of
UNA University Centre, and aims to contribute to the debate around the urban issue
29
and the social intervention methodologies in the programs regarding the socialterritorial development, among them the ones of housing provision. The approaches
and thoughts brought here will be developed in a way which will insert the reader in
the context of the Social Interest National Housing Policy by the Cities Ministry,
focusing on the Program “Minha Casa Minha Vida” (My House My Life), and the Social
Work as a component and essential part for the success of their premisses. For the
pertinence related to the theme, concepts as territory, social management, governance
and governability participation, and social práxis tie the discussion which is referenced,
among others, in Milton Santos (2010); Dirce koga (2011); Putnam (2006); Maia
(2005); Gohn (2004); Tenório (2005); Ermínia Maricato (2011); Carvalho (2014) e
Paugam (2003). The theoretical referencial also incorporates, in this first chapter of the
dissertation, a discussion around the difficulties and potentialities of social work in the
promotion of participation and the social-territorial development. Being a social
research with non-quantifiable particularities, all discussion and analysis, took into
consideration the dynamic and the relational action of the subjects under the rules of
the dialectic method. The data which served as baseline were taken from a
questionnaire containing open and closed questions, applied with professionals from
social work and through literature review and documentary research whose results and
analysis are described in the chapter 2 of this dissertation. For further discussion of
the paper's content, a literature review about the concepts and pertinent themes
related to social work was carried out
Key-words: Social Work; Social Housing Interest. Social Management. Territory.
Urban Development. Social Project.
30
1 INTRODUÇÃO
O processo de produção e reprodução das cidades no Brasil vem desde sempre
reforçando as condições de vulnerabilidade
10
, exclusão social e segregação
socioespacial colocando a situação de pobreza num patamar que não apenas está
sustentado pela questão da renda, mas pela “impossibilidade de usufruir de bens e
serviços da sociedade e pela falta de acessos à cidade e a espaços de participação e
ao poder” (PAZ; TABOADA, 2006, p.2).
De acordo com Rolnik (2000, p. 12)
O quadro de contraposição entre uma minoria qualificada e uma maioria com
condições urbanísticas precárias relaciona-se a todas as formas de injustiça
social. Essa situação de exclusão é muito mais do que a expressão da
desigualdade de renda e das desigualdades sociais: ela é agente de
reprodução dessa desigualdade. Em uma cidade dividida entre a porção
legal, rica e com infraestrutura e a ilegal, pobre e precária, a população que
está em situação desfavorável acaba tendo muito pouco acesso a
oportunidades de trabalho, cultura ou lazer. Simetricamente, as
oportunidades de crescimento circulam nos meios daqueles que já vivem
melhor, pois a sobreposição das diversas dimensões da exclusão incidindo
sobre a mesma população fazem com que a permeabilidade entre as duas
partes seja cada vez menor.
Essa relação tão perversa provoca tensões entre as classes que por um lado,
detentoras de condições de mobilidade e de apropriação econômica e social do
espaço, se cercam de meios e aparatos de segurança, e outros, destituídos, acabam
por ser relegadas ao que lhes sobra do espaço urbano, espalhando pela cidade
fenômenos como o da gentrificação que Hirata ( 2010 ) qualifica como “a substituição
de antigos moradores por outros de faixas mais altas de renda, que acompanha a
verticalização das construções” (HIRATA, 2010, p.67).
Guerra (2002) afirma que esse fenômeno da gentrificação e da “polarização social
crescente nas cidades” (GUERRA, 2002, p.108), além de obstaculizar as
possibilidades de acesso ao mercado de trabalho e consequetemente à “mobilidade
social ou profissional [...], traduzindo-se assim, em segregação residencial, cultural e
10
Sobre os conceitos de vulnerabilidade e pobreza ver Kowarick (2002); Cunha (2006); Paugam
(2003)
31
simbólica” 11 ( GUERRA, 2002, p.108 ), vem associado ao conceito de “relegação
urbana” ( GUERRA, 2002, p. 109-110 ) que Guerra diz traduzir-se
[...] pela degradação das relações sociais e das identidades colectivas. Esses
espaços relegados 12 caracterizam-se por uma distância relativa face ao
centro, o que acarreta para os seus habitantes uma constante «pendularidade
casa-trabalho»,por outro lado, são espaços geralmente marcados por uma
certa «desertificação cultural» e distantes da qualidade de vida que
caracteriza o centro urbano13 ( GUERRA, 2002, p. 109-110 ).
Constituir espaços de vocalização e participação, criar condições de articulação de
políticas públicas, inovar em termos da capacidade de intervir na realidade, criar
mecanismos de governança e governabilidade investindo no desenvolvimento
institucional, na intersetorialidade e no fortalecimento das entidades representativas e
movimentos sociais constitui-se assim no arranjo minimamente competente para o
enfrentamento e mitigação das desigualdades sociais e de uso e apropriação do
espaço urbano que deve ser conjugado com a complementaridade das políticas.
Leva-se em consideração que a universalização das políticas públicas, a efetividade
de programas e ações, o bom uso dos espaços que constituem as cidades, a
valorização da cultura, pressupõem não somente o enfrentamento da ditadura do
mercado e o conflito de interesses, mas também, e tanto pela sua interligação, a
necessidade do desenvolvimento institucional dos governos municipais, responsáveis
na ponta pela operacionalização desses programas, políticas e ações, e a superação
do patrimonialismo, o clientelismo e a cultura da exceção e do favorecimento que se
perpetuam nas relações.
Acredita-se que, a partir da relação dialética da gestão social com a governabilidade,
que requer, provoca e é em si empoderamento e participação, abre-se espaço para
uma repactuação social por meio da qual os cidadãos possam creditar a si a
capacidade de transformar o caráter relacional, instrumental e burocrático presente
na forma de gerir e implementar as políticas públicas fazendo-se seus destinatários
11
Guerra ( 2002 ) cita Christ Hamnett tece importantes considerações, “La polarisation sociale: déconstruction d’un
concept chaotique?”, in Albert Martens e Monique Vervaeke (coords.), La Polarisation Sociale des Villes
Européenes, Paris, Anthropos, 1997, pp. 111-123 para a busca de maior profundidade sobre esta questão
12
Cf. Jean Labbens, “Le quart monde des cités d’urgence”, in Serge Paugam, (dir.), L’Exclusion, l’État des Savoirs,
pp. 228-236 ( apud GUERRA, 2002 ).
13 Expressões de Isabel Guerra, “Viver na periferia”, in Sociedade e Território, n. 18, 1993 (apud GUERRA, 2002).
32
naturais por direito em lugar da benesse que até agora só vem escamoteando o traço
“hierárquico-autoritário” presente nas concessões ( KOGA, 2011, p. 44).
Pelo exposto, considerando o contexto da discussão, apreende-se que a essência dos
programas de provisão habitacional no recorte da habitação de interesse social
necessita estar emoldurada no que Rolnik (2002) chama de “política urbana contra a
exclusão”, consolidando a premissa de que habitar vai muito além de ocupar um
espaço físico sob o solo. O habitar carrega em si o sentido da cultura, da interação,
do convívio, das relações sociais que se estabelecem no território enquanto lugar
social dotado de complexidade e multiplicidade e do exercício da cidadania, mas
também exige que esses lugares representem as centralidades necessárias ao existir
de qualquer cidadão.
O trabalho social de que tratamos nesse estudo traz em si um potencial agregador de
todas essas forças e elementos para imprimir complementaridade aos programas e
ações partindo do princípio de que não se poder atribuir exclusivamente às políticas e
aos governos a capacidade de minimizar os efeitos históricos da exclusão
socioterritorial. Entende-se que a intersetorialidade, a participação e a mobilização
social têm um papel complementar que o trabalho social é capaz de orquestrar.
Segundo Carvalho (2014, p.7),
[...] o trabalho social é a mediação necessária a toda política pública que se
comprometa com a busca da equidade e enfrentamento das gritantes
desigualdades sociais, mas também envolve uma reflexão sobre a gestão
social com seus novos arranjos e especificidades próprios à condução da
política pública em sociedades que são cada vez mais complexas.
Este artigo, portanto, resultante de pesquisa realizada no Mestrado Profissional do
Programa de Pós-Graduação em Gestão Social Educação e Desenvolvimento Local
do Centro Universitário UNA pretende provocar a continuidade desse debate trazendo
à luz uma discussão em torno do trabalho social14 concebido como um conjunto de
14
“[...] conjunto de estratégias, processos e ações, realizado a partir de estudos diagnósticos integrados
e participativos [...] compreendendo as dimensões: social, econômica, produtiva, ambiental e políticoinstitucional do território” ( BRASIL, 2014 ) estruturado em projeto, cronograma e composição de custos
específicos e realizados por profissionais com formação e experiência requerida, a ser implementado
33
estratégias que se voltam à informação, participação e mobilização social e
desenvolvimento socioterritorial realizadas junto a famílias beneficiárias dos
programas habitacionais da Política Nacional de Habitação ( PNH ) do Governo
Federal instituída pelo Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social ( SNHIS )
operacionalizado pelo Ministério das Cidades ( MCidades ).
Portanto, o teorema que norteia a pesquisa estrutura-se em torno dos limites e
possibilidades desse trabalho social enquanto potencial instrumento de mediação
entre as premissas dos programas de habitação de interesse social, e do próprio
trabalho social, e o que efetivamente se materializa nos empreendimentos produto
das intervenções.
Entretanto, abstrai-se que o simples fato de estar normatizado e ser parte integrante
dos programas de provisão habitacional não garante ao trabalho social sua
concretude. Antes é preciso vencer todo arcabouço de dificuldades que enfrenta para
a consecução de suas premissas e objetivos entre as quais enumera-se a falta de
governança e governabilidade, ausência de espaços de vocalização, falta de inovação
metodológica nas intervenções sociais combinada com assistencialismo e
patrimonialismo e a frequência com que os projetos se apresentam precários e
incompatíveis com o porte da intervenção, com a realidade dinâmica e relacional como
campo de ação, com o perfil das famílias envolvidas e características socioterritoriais,
a falta de reconhecimento de sua importância, desinteresse dos beneficiários em
constituir-se parte, e, sobretudo, pela instabilidade administrativa frente à
transitoriedade dos governos e ausência de intersetorialidade.
O trabalho social de que tratamos é sistematizado por meio de instrumentos de
execução estruturados a partir de quatro eixos temáticos estabelecidos pela Portaria
21/2014 do Ministério das Cidades, quais sejam: Mobilização, Organização e
fortalecimento Social; Acompanhamento e Gestão da Intervenção; Educação
ambiental e Patrimonial e Desenvolvimento Socioeconômico (BRASIL, 2014).
junto ao público alvo dos programas geridos pelo Ministério das Cidades, contextualizado aqui nos
programas de habitação de interesse social.
34
Para debater sobre o assunto, fez-se essencial buscar um referencial teórico que
anunciasse conceitos como território, cidadania, governança e governabilidade, práxis
social, civismo e gestão social, todos imprescindíveis à compreensão do objeto da
pesquisa. Uma abordagem sobre o processo de constituição e implementação do
SNHIS, da PNH e do Programa Minha Casa Minha Vida como a principal bandeira da
política, abre o contexto do trabalho social como tema central da discussão.
1.1 A Política Nacional de Habitação de Interesse Social
A criação do Ministério das Cidades ( MCidades ) no primeiro mandato do governo
Lula, em 2003, representou para o país a institucionalização da política urbana e das
políticas setoriais de habitação e saneamento. Com a alçada de promover o
desenvolvimento urbano, o MCidades incorpora em suas ações a política de
subsídio15 à habitação popular e o compromisso de promover a articulação com as
diversas esferas de governo, com o setor privado e organizações não governamentais
na gestão das áreas de sua competência (BRASIL, 2010, p.28-29 ).
Para promover essa articulação e a mobilização para a discussão da questão urbana
no Brasil, o MCidades realizou, em parceria com a sociedade civil organizada, as
conferências municipais das cidades e, em outubro de 2003, foi realizada a
Conferência Nacional das Cidades, que, além de definir as diretrizes para a nova
Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNHU) e seus componentes setoriais,
elegeu o Conselho das Cidades (ConCidades), como instância de discussão das
questões relativas às cidades brasileiras (BRASIL, 2004).
Por intermédio da Lei 11.124, de 16 de Junho de 2005, e com o objetivo de se
consolidar a Política Nacional de Habitação (PNH), o MCidades instituiu o Fundo
Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS) e o Sistema Nacional de
Habitação de Interesse Social (SNHIS), regido pelo princípio constitucional da moradia
como direito e vetor de inclusão social e garantia de acesso à terra urbanizada e ao
15
Os subsídios, em caráter único e no formato de desconto aplicado às prestações, são concedidos às
famílias, de forma pessoal e intransferível, e não ao imóvel. Tem o propósito de compatibilizar o custo
de aquisição do imóvel à capacidade de renda da população mais pobre ( BRASIL, 2004).
35
pleno desenvolvimento da função social da cidade e da propriedade. Priorizar o
atendimento habitacional para a população de menor renda é uma das diretrizes do
SNHIS.
Para enaltecer a força e a importância da mobilização social e da participação, que
integram o objeto da presente discussão, cumpre ressaltar que, desde a década de
1990, já havia uma proposta de política habitacional elaborada pelos movimentos
sociais e que deu origem ao FNHIS, o qual foi aprovado para atender às pressões que
na época resultaram em um projeto de lei de iniciativa popular entregue ao Congresso
Nacional naquele ano contendo mais de um milhão de assinaturas ( MARICATO,
2011).
Entre 2007 e 2008, como um desfecho das ações e desdobramento da PNH, o
MCidades preparou o Plano Nacional de Habitação (PlanHab), elaborado a partir de
estudos técnicos e consultoria contratada, levando em consideração o perfil do déficit
habitacional brasileiro, a demanda por moradia e a diversidade do território nacional.
O PlanHab foi objeto de amplo debate e pactuação com os diversos segmentos da
sociedade caracterizando-se, simultaneamente, como um plano estratégico de longo
prazo e ferramenta de planejamento das ações públicas e privadas de enfrentamento
das necessidades habitacionais do país ( BONDUKI; ROSSETTO; GHILARDI, 2006).
Garantir que os recursos públicos para moradia sejam destinados exclusivamente
para subsidiar a população de mais baixa renda compõe o objetivo principal do SNHIS
que estabelece também que o acesso à moradia seja assegurado por meio do FNHIS
de forma articulada entre as três esferas de Governo. O SNHIS constitui-se de um
sistema concebido para ser democrático e participativo e sustenta um modelo
descentralizado
de
gestão
que
convoca
os
entes
federados
a
uma
corresponsabilidade na implementação da política de habitação de interesse social. A
gestão e o controle dos recursos do FNHIS são feitos pelo Conselho Gestor do FNHIS
(CGFNHIS).
Uma nova sistemática de acesso aos recursos do Orçamento Geral da União (OGU)
e do FNHIS foi instituída a partir da criação do SNHIS e a obtenção dos recursos
passou então a depender da adesão formal dos entes federados ao sistema e do
36
cumprimento das atribuições firmadas em termo específico. Essa adesão constitui-se
em mecanismo que fundamenta a relação de parceria e integração da União com os
Estados, Distrito Federal e Municípios para viabilizar a descentralização das ações
inerentes à PNH, cuja estrutura configura uma interinstitucionalidade que teria sido
concebida para potencializar ações e recursos e compartilhar os compromissos
advindos das políticas públicas relativas ao desenvolvimento urbano tanto entre as
instâncias federativas quanto com a sociedade.
O Termo de Adesão assinado pelos Entes Federados estabelece os padrões de
reciprocidade e contrapartidas atribuídos às partes e inclui a obrigatoriedade de
constituição de Conselho e Fundo Local de Habitação de Interesse Social pelos
estados, Distrito Federal e Municípios e o compromisso de elaborarem, de forma
participativa, seus próprios Planos Locais de Habitação de Interesse Social para terem
acesso aos recursos do OGU e FNHIS (BRASIL, 2005).
Como ferramenta de planejamento, o PlanHab apresenta propostas operacionais que
devem ser implementadas no curto, médio e longo prazos de forma articulada com os
Planos Plurianuais (PPAs) e como plano estratégico define metas a serem alcançadas
até o ano de 2023 com revisões a cada quatro anos e avaliação de resultados e
análise de novos cenários e projeções (BRASIL, 2010). Por sua essência estratégica,
envolvendo diagnósticos, prognósticos, prospecção e planejamento, tal sistemática
requer o um engajamento da sociedade, principal interessada e alvo das ações e,
consequentemente, a consolidação e efetividade das instâncias de participação, que
devem ser permanentes, para que as demandas e ajustes necessários sejam
incluídos nas agendas e nas metas estabelecidas.
Tanto a PNH quanto o PlanHab foram resultantes de processos participativos
envolvendo os diversos segmentos da sociedade civil. Movimentos populares,
empresários, organizações não governamentais (ONGs), setor acadêmico, entidades
de classe, e poder público municipal e estadual foram mobilizados em torno das
discussões para construção do cenário habitacional brasileiro e proposição de um
plano que pudesse desenhar as formas de atendimento às demandas identificadas e
inspirar os governos municipais e estaduais na elaboração dos seus próprios planos.
37
A PNH divide-se em Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS),
voltado à população com renda entre 0 e 5 salários mínimos, e o Sistema de Habitação
de Mercado, que atende principalmente às classes de renda entre 5 e 10 salários
mínimos ( BRASIL, 2011). A presente discussão está centrada no SNHIS.
1.1.1 Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social – SNHIS
Os Programas do SNHIS utilizam recursos originários do Fundo de Garantia por
Tempo de Serviços (FGTS), Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), Fundo de
Desenvolvimento Social (FDS), Orçamento Geral da União (OGU), Fundo de
Arrendamento Residencial (FAR) e Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social
(FNHIS) ( BRASIL, 2011). Os benefícios e subsídios concedidos a partir destes
recursos são inversamente proporcionais à capacidade de pagamento da família
beneficiária, assim, as prestações habitacionais são tanto menores quanto menor a
renda familiar caracterizando uma sistemática mais redistributiva e menos
assistencialista uma vez que o beneficiário é alçado à condição de participante e
corresponsável na provisão de sua moradia. Uma sistemática que supera os modelos
anteriores no sentido de substituir procedimentos paternalistas de cessões de uso e
doações por uma forma concebida para propiciar, ainda que de maneira simbólica, a
participação financeira do beneficiário na produção e aquisição de seu imóvel
residencial e o retorno financeiro aos cofres públicos na forma de prestações
subsidiadas pelo governo federal.
Para ter acesso aos recursos do FNHIS, estados e municípios devem atender a três
exigências regulamentares: ter firmado Termo de Adesão ao SNHIS; ter instituído o
Fundo Local de Habitação de Interesse Social com dotação orçamentária própria de
sua instância governamental; ter constituído seus conselhos estaduais e municipais
de habitação, respectivamente, garantindo ¼ dos assentos aos representantes dos
movimentos sociais, e ter elaborado, de forma participativa, seus Planos Municipais
de Habitação de Interesse Social ( BRASIL. Lei nº 11.124, 2005, Art.12 ). Ou seja, um
modelo de governança e um arranjo institucional que reproduz em âmbito municipal e
estadual um arcabouço criado no âmbito Federal para a gestão dos recursos e da
própria política e que representa um pacto firmado com as respectivas instâncias
governamentais.
38
Os Conselhos Municipais de Habitação, apesar de terem sido constituídos de forma
compulsória, por exigência do SNHIS, para que os municípios pudessem fazer jus aos
recursos do FNHIS, foram concebidos para garantir integração com a sociedade e
deveriam, com ela, debater e aprovar as políticas, definir prioridades e critérios de
elegibilidade, seleção e enquadramento dos programas, das famílias e das áreas na
aplicação dos recursos financeiros originários da União, estados e municípios. Juntos,
SNHIS, FNHIS, ConCidades e conselhos municipais constituem uma estrutura criada
para dar ancoragem à política nacional de habitação no Brasil ( BRASIL,2012.) e
favorecer o planejamento das ações de urbanização, regularização e integração de
assentamentos precários e provisão habitacional.
Tal sistemática veio propor a efetivação de um novo paradigma na formulação e
implementação de políticas públicas baseado na criação de canais legítimos de
interlocução voltados à promoção de uma maior transparência e corresponsabilidade
dos entes federados e da sociedade civil no atendimento às demandas setoriais de
habitação, saneamento ambiental, infraestrutura, mobilidade e transporte coletivo,
equipamentos públicos e serviços, integrando a Política de habitação ao conceito de
desenvolvimento urbano integrado.
Desde a extinção do Banco Nacional da Habitação (BNH), em 1986, nenhum outro
mecanismo institucional de gestão que pudesse dar conta da enorme demanda
habitacional instalada havia sido implementado no país. Uma carência de políticas,
programas e ações que negligenciou ao longo dos anos os preceitos constitucionais
que consideram a habitação como direito do cidadão e a participação social como um
princípio da gestão democrática expresso no Artigo 1º da Constituição Federal e
previsto no Estatuto das Cidades, Lei 10.257/2001, em seu Artigo 43, Capítulo IV.
A PNH e o PLANHAB representam, portanto, um marco histórico, primeiramente por
terem o propósito de suprir o vazio deixado pelo BNH, segundo por constituir-se num
grande aparato voltado à consolidação de ações e alocação de recursos, envolvendo
as três esferas de governo e a iniciativa privada que encerra um modelo de
governança pública jamais visto; e terceiro por prescrever a participação popular no
39
planejamento de ações contínuas e integradas, com metas de longo prazo e revisões
periódicas.
Ainda assim não se pode deixar de mencionar que a política habitacional, tanto aquela
adotada pelo BNH, quanto a que está vigente trazendo um arcabouço de gestão
compartilhada, privilegia o modelo capitalista de produção, promovendo empresas
ligadas ao financiamento, produção e venda de moradias (MARICATO, 1987 apud
HIRATA, F. 2009 )16 e definindo a localização dos empreendimentos.
Por outro lado, a amplitude e complexidade do PMCMV, concebido como a bandeira
da PNH, passou a exigir do gestor público local um papel de articulador e parceiro
essencial do Governo Federal, cabendo-lhe promover a interlocução entre os diversos
atores, a seleção das famílias beneficiárias e a implementação do trabalho social junto
ao público atendido. Esse talvez seja o grande diferencial trazido pela PNH que levou
os municípios a terem que assumir um protagonismo e uma corresponsabilidade na
aplicação dos recursos destinados à implementação do programa que, a princípio,
viabilizaria a participação e o controle social.
Entretanto, apesar dos avanços na construção de políticas voltadas ao
desenvolvimento urbano e de todos os dispositivos de governança e governabilidade 17
previstos no SNHIS, “a implementação das políticas e do processo de participação
ainda está muito aquém dos anseios e apostas feitas pelos movimentos de moradia e
de reforma urbana” ( FERREIRA, 2012, p.9 ). Como nas palavras de Ferreira ( 2012,
p.9),
O principal programa habitacional do atual governo, o Programa Minha Casa
Minha Vida (PMCMV), por exemplo, sequer foi discutido no Conselho das
Cidades antes do seu lançamento, em 2009. Teve como objetivo principal
reaquecer o mercado imobiliário no Brasil – respondendo à crise mundial de
2008 – financiando diretamente empresas e construtoras para a construção
para as classes de faixa de renda de 0 até 10 salários mínimos. É um
programa dos governos Lula e Dilma que responde a uma demanda do
empresariado da construção civil, desconsiderando o papel que os governos
municipais e estaduais podem (e devem) ter na formulação e implementação
de uma política habitacional mais ampla, que inclua produção de novas
16
MARICATO,E. Política Habitacional no Regime Militar. Petrópolis:Vozes, 1987.
Governabilidade referindo-se “as condições sistêmicas sob as quais se dá o exercício do poder, centrando-se,
sobretudo, no processo de tomada de decisões; e governança compreendida como a capacidade de tomar e
executar decisões, garantindo sua continuidade no tempo (...)” (Diniz, E. Crise, reforma do Estado e
Governabilidade: Brasil, 1985-95. Rj. FGV, 2000, apud CARVALHO, 2014, p. 51).
17
40
moradias, estoque de terras, urbanização, regularização fundiária e
planejamento urbano ( FERREIRA, 2012, p.9 ).
Enquanto programa de habitação de interesse social, o PMCMV busca atender à
demanda habitacional do público formado por famílias com renda de até R$5.000,00,
priorizando inicialmente aquelas com renda de até R$1.600,00 em um leque de
estratégias para favorecer o acesso à moradia por meio de subsídio do Estado
associado ou não à concessão de crédito. Os recursos para o programa foram
divididos pelas regiões do país de acordo com o déficit habitacional de cada uma delas
e conforme regulamentação específica para municípios com população acima de 50
mil habitantes e entre 20 mil e 50 mil habitantes ( BRASIL. Lei 11.977, 2009 ).
Cabe ressaltar que o mecanismo de priorização de regiões de acordo com seu número
de habitantes presente no programa não caracteriza uma política redistributiva e de
universalização e não leva em consideração a “expressão territorial das
desigualdades” (KOGA, 2011, p. 24) assumindo, portanto, um caráter apenas paliativo
“de minorar as agudizações e não de universalizar um padrão de cidadania” (KOGA,
2011, p. 25) e caracterizando o direito como mérito. Para Koga,
neste caso, a orientação que é tomada como parâmetro para uma ação é a
busca em localizar a agudização de situações e não as restrições à cidadania
e à justiça social. A precariedade de condições de vida espalha-se no Brasil
e está presente em todas as cidades [...]. Selecionar os municípios restringe
direitos dos cidadãos ( KOGA, 2011, p. 25 ).
A elegibilidade das famílias no público alvo do programa é definida pela Portaria
595/2013, do MCidades e o controle, verificação, organização e seleção da demanda
são feitos por meio do CADÚNICO 18 , cujas informações são utilizadas durante o
processo de seleção das famílias19 para o levantamento de todos os integrantes do
18
CADÚNICO, ou Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, é um instrumento coordenado
pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à fome (MDS) que identifica e caracteriza as famílias de
baixa renda. Utilizado como base de informação e dados para obtenção de diagnóstico e seleção de beneficiários
nos programas, incluindo o PMCMV ( BRASIL, 2010), o CADÚNICO funciona também como ferramenta de
controle uma vez que nele ficam registrados os nomes dos beneficiários contemplados nos programas
habitacionais do Governo Federal.
19
O MCidades estabeleceu três critérios nacionais para enquadramento de beneficiários no PMCMV: Mulheres
chefes de família, famílias residentes em áreas de risco e famílias que tenham em sua composição idosos e
portadores de necessidades especiais. As entidades proponentes devem constituir outros três critérios locais que,
41
grupo familiar ( BRASIL, 2010 ). O CADMUT, Cadastro de Mutuários, de abrangência
nacional, é utilizado para verificar o impeditivo da existência de financiamentos
habitacionais ativos ou inativos ou a titularidade de imóvel em nome dos proponentes.
Os subsídios do PMCMV são intransferíveis, válidos apenas para famílias que não
possuam outro imóvel em qualquer parte do território nacional. Sendo de ordem
pessoal, esses subsídios são concedidos uma única vez e, tendo recebido o subsídio,
o beneficiário contemplado não se beneficia novamente com recursos de mesma
natureza constituindo assim um mecanismo colocado a serviço da gestão do déficit
habitacional do país.
O que ocorre, entretanto, é que muitos beneficiários ao receberem o imóvel não o
destinam à sua própria moradia, seja pela localização dos empreendimentos, sempre
distante e precária, seja por não quererem abrir mão dos vínculos estabelecidos em
seus locais de origem. Muitos desses beneficiários, ainda no processo de inscrição,
já possuindo seu próprio imóvel, agem como “pequenos capitalistas” vendo no
programa a chance de promover sua “reserva patrimonial”. Dentre as várias situações
que denotam essa questão, observa-se casos em que os beneficiários ou mantêm o
imóvel vazio, desocupado, sujeito a invasões e depreciação, ou vendem, alugam ou
até mesmo cedem a terceiros e continuam morando em áreas de risco ou em situação
de vulnerabilidade social preterindo outras famílias que efetivamente necessitam da
moradia. Há também situações, em que esses próprios beneficiários se recolocam
nos cadastros da assistência social do município para obtenção de novo imóvel. Tais
comportamentos afetam diretamente a gestão do déficit habitacional no país.
Cabe aqui uma digressão para lembrar que o programa é voltado à população de
menor renda, mas o indivíduo ou a família 20, para ser contemplada, deve atender
também a outros requisitos além da renda, inclusive não ter outro imóvel residencial
junto com os critérios nacionais, comporão o conjunto de critérios para seleção e hierarquização das famílias
beneficiárias ( BRASIL, Lei 11.124/2005)
A regulamentação da PNH classifica a população destinatária do PMCMV como “beneficiários”. Seria
interessante discutir a pertinência de tal nomeação, mas, de certa forma, teríamos que desviar o foco
dessa discussão. Entretanto, faz-se oportuno ressaltar a carga de estigma que a nomenclatura pode
carregar uma vez que define um “status social” vinculado a uma condição de desfavorecimento na
estrutura econômica e social. Paugam (2003) aborda a questão da “concessão de assistência” e as
rotulagens ( pobre, assistido”, fragilizado ) dela decorrentes.
20
42
financiado em seu nome em qualquer parte do país ou quitado no município no qual
está se inscrevendo ao programa. Os beneficiários passam por processo de inscrição
e seleção a partir de diagnóstico socioeconômico realizado pelo poder público e essa
população indicada ao PMCMV, Faixa I, compõe um grupo social composto por muitas
pessoas em situação de vulnerabilidade social que pode ser comparada à condição
de pobreza.
A questão é que a pobreza21 tem um caráter relativo, e, apesar de não ser fulcro dessa
discussão, é importante ressaltar que podendo ser concebida, nesse caso, como uma
condição social composta por um “conjunto de pessoas cujo status social é definido
por instituições especializadas de ação social que assim a designam [...] e para quem
a legislação reconhece o direito de auxílio ou de assistência” (PAUGAM, 2003, p.55),
manifesta-se aí uma certa fragilidade ao processo de seleção e enquadramento dos
possíveis destinatários das ações, podendo resultar naquela situação acima exposta.
Assim, é preciso verificar “o sentido que os indivíduos atribuem às suas experiências
vividas” (PAUGAM, 2003, p.60 ) e questionar acerca da relação22 que se estabelece
entre os “beneficiários” e a instituição concessora e/ou os assistentes sociais que se
colocam na linha de frente dos diagnósticos. E aí, dado o caráter jurídico vinculado ao
direito ao benefício (PAUGAM, 2003 ) é possível que a população alvo se coloque na
condição de destinatário intrínseco ou que se estabeleça com aqueles profissionais
uma relação de dependência ( que pode ou não ser mútua ).
Após essa breve digressão acrescenta-se que os beneficiários de programas
habitacionais que agem daquela maneira, aceitando o rótulo, ou até mesmo
coadunando com o processo de rotulagem instituído, arriscam-se a permanecer na
condição de desfavorecidos que o próprio rótulo lhes confere, e de destituídos, pois o
agente financeiro, em cumprimento às determinações legais e contratuais deve,
nesses casos, promover a reintegração de posse do imóvel para que este possa ser
destinado a outra família. Aquele beneficiário que deu outra destinação ao imóvel que
não a de sua própria moradia, num programa de subsídio habitacional que é de
21
Ver em Serge Paugam. A Desqualificação social: ensaio sobre a nova pobreza. 2003.
Paugam (2003 ) faz um breve debate sobre essa questão com Jeanine Verdès-Leroux (J.Verdès-Leroux, Le
Travail social, 1978).
22
43
interesse social, se verá impossibilitado de se beneficiar novamente com programas
de mesma natureza dado o caráter único do subsídio instituído para programas de
HIS.
Apesar dos pontos críticos ressaltados, é possível afirmar que o PMCMV inova ao
articular mecanismos de transferências de recursos não onerosos, de diferentes
fontes (na forma de transferência de renda, como subsídio à família, e não ao imóvel),
priorizando o atendimento à parcela da população de baixa renda e à classe média (
BRASIL, 2010 ). Por outro lado padece por não incorporar os instrumentos de gestão
urbana23 previstos no Estatuto das Cidades, em especial no que tange ao combate à
segregação socioespacial, tornando frágil seu alcance social.
E é importante ressaltar que à medida que o programa incorpora uma sistemática de
subsídio único e intransferível, é preciso que sejam feitos diagnósticos despidos de
assistencialismo e imunes ao patrimonialismo e, já no processo de seleção de
beneficiários, sejam adotadas metodologias adequadas que privilegiem a informação
e a conscientização sobre a natureza do programa e a origem dos recursos, buscando
favorecer mais a justiça social e a gestão do déficit habitacional qualitativo e
quantitativo existente.
Um outro ponto que merece destaque reside no fato de que o modelo de subsídio
único e intransferível adotado no PMCMV exige do aparelho estatal a adoção de
mecanismos de controle integrados para a sistematização dos dados e eficiência na
gestão das informações. Uma eficiência que a máquina estatal já demonstrou ainda
não possuir24 e que se confirma nas várias matérias publicadas nos grandes veículos
de comunicação informando sobre os empreendimentos do Programa Minha Casa
23
De acordo com a Constituição Federal o principal instrumento da política de desenvolvimento e expansão
urbana devem ser os Planos Diretores. O Estatuto da Cidade, Lei no 10.257/2001, “dedica grande parte de seu
conteúdo aos instrumentos para a promoção da política urbana, em especial na esfera municipal, classificados, de
acordo com sua natureza, em tributários, financeiros ou econômicos; jurídicos; administrativos e políticos.
parcelamento, edificação ou utilização compulsórios; imposto predial e territorial urbano progressivo no tempo;
desapropriação com pagamento em títulos da dívida; e usucapião especial de imóvel urbano. direito de superfície;
o direito de preempção (de preferência); a outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso; as
operações urbanas consorciadas; a transferência do direito de construir; e o estudo de impacto de vizinhança” (
OLIVEIRA, 2001, p.7-10 ).
24
A exemplo da falta de eficiência e efetividade na aplicação da metodologia do IPTU Progressivo
previsto no Estatuto das Cidades ( Lei 10.257/2001) que prevê o aumento do imposto na medida da
ociosidade e reserva de terras à especulação imobiliária nos centros urbanos.
44
Minha vida dominados pelo crime organizado, invadidos e depreciados, muitas vezes
com a aquiescência dos próprios beneficiários do programa.
Assim, no que tange às políticas públicas, é necessário que o Estado possua a
capacidade necessária não só para pensá-las, mas para implementá-las e
acompanhar sua execução, monitorando dados e resultados. De acordo com
Filgueiras e Andrade é importante levar em consideração “a organização do governo
municipal para a execução das políticas sociais” (FILGUEIRAS; ANDRADE, 2010, p.
127 ). Segundo as autoras, no caso da provisão habitacional, da urbanização e em
outras ações, pesam sobre as administrações municipais “diversas exigências em
termos de habilidades políticas, recursos operacionais, diagnósticos das situações e
clareza dos propósitos das intervenções” (FILGUEIRAS; ANDRADE, 2010, p. 127).
Citando Santos Jr25, as autoras afirmam que
O organograma da área social e a capacidade institucional dos órgãos
gestores são alguns dos muitos fatores que podem incidir sobre o
desempenho de programas nesta área. A frágil capacidade técnicooperacional das administrações municipais pode ser constatada pela
deficiência na oferta de serviços públicos, pela precária informatização dos
procedimentos administrativos, pelo reduzido número e baixa capacitação
profissional dos quadros técnicos, pelos procedimentos orçamentários
desvinculados da atividade de planejamento e não submetidos a controle
social e pela administração escassamente dotada de instrumentos
adequados para o planejamento a médio e longo prazo ( SANTOS JR, 2001,
apud FILGUEIRAS; ANDRADE, 2010, p. 127 ).
Apesar de Filgueiras e Andrade ( 2010 ) estarem se referindo à questão urbana nas
regiões metropolitanas, as ponderações por elas apresentadas estendem-se a outras
cidades de menor porte que também padecem da falta de saneamento, da incidência
de ocupações irregulares e precárias, de problemas fundiários, da falta de capacidade
técnica, administrativa e logística, da falta de espaços de participação, e sobretudo,
de gestões “personificadas no gestor” demandando portanto que se estabeleça um
modelo de governança também para essas cidades compatível não só com as
matrizes das políticas, mas com a complexidade dos problemas, da sociedade e do
próprio Estado.
25
SANTOS Jr. Orlando Alves dos. Democracia e governo local: dilemas da reforma municipal no Brasil.
RJ: Revan/Fase, 2001.
45
É nesse contexto das cidades que se insere o trabalho social como elemento
integrante dos programas de desenvolvimento urbano, essencial no incremento da
relação Estado sociedade e potencializador da governabilidade e da gestão social. De
acordo com Carvalho (2014), esse trabalho social, que atravessou momentos de uma
“razão instrumental” baseada em controles técnicos, vem resgatando seu papel de
mediação no processo de implementação das políticas públicas e promotor de
processos participativos “associados à transformação e à emancipação social”
(CARVALHO, 2014, p. 18).
1.2
Trabalho Social na Habitação de Interesse Social como possibilidade de
gestão social
É possível afirmar que o trabalho social como componente obrigatório dos programas
de HIS e política de governo está presente desde que o extinto Banco Nacional de
Habitação (BNH) definiu sua Política Nacional de Habitação e Saneamento entre 1968
e 1986. As atividades eram desenvolvidas naquela época pelas Companhias de
Habitação (COHABs) com recursos da Taxa de Apoio Comunitário (TAC), uma taxa
criada em 1973 para manutenção dos conjuntos habitacionais e seus equipamentos
comunitários ou para pagamento de assistentes sociais que atuassem nos
empreendimentos. Os custos das ações eram embutidos no preço do imóvel
financiado ao mutuário (BRASIL, 2010).
A partir de 1994, na gestão do Presidente Itamar Franco, o Programa Habitar
introduziu o trabalho social como contrapartida dos estados e municípios, mas foi
somente a partir de 1999, na primeira gestão do Presidente Fernando Henrique
Cardoso, tendo como base o Programa Habitar Brasil BID (HBB), que o trabalho social
tornou-se uma exigência. Naquele momento, o Governo Federal passou a incluir os
recursos necessários para o desenvolvimento do trabalho social nos custos do
empreendimento, cujas verbas dependiam de emendas parlamentares, ( BRASIL,
2010 ).
A experiência adquirida com o HBB, em que se tinha como exigência a execução das
intervenções físicas de forma integrada à realização de um trabalho social junto às
46
famílias beneficiárias, mostrou-se interessante e eficaz em relação ao modelo
anterior26 levando os órgãos gestores a normatizá-lo e estendê-lo, ainda que de forma
limitada, às ações de urbanização de favelas, inaugurando assim uma etapa de
regulamentação do trabalho social. Desde então o trabalho social, regido sob dois
grandes marcos regulatórios (a Instrução Normativa 050/2008 e a 008/2009) vem
ganhando respaldo normativo e, após a criação do MCidades, o número de programas
com exigência do trabalho social se ampliou (PAZ; TABOADA, 2006).
Conforme se pode verificar na regulamentação dos próprios programas de provisão
habitacional e saneamento do MCidades, em muitos desses programas, embora o
trabalho social fosse obrigatório, não havia destinação específica de recursos para a
sua realização, devendo ser realizado por meio de contrapartida de Estados e
Municípios. Depois, passou-se a estabelecer percentuais mínimos “desejáveis” para
a sua realização em alguns programas.
Hoje, com a Política Nacional de Habitação e o PAC, e expressivos volumes de
investimentos, são definidos percentuais mínimos obrigatórios para a realização do
trabalho social que passou a ser visto como componente essencial à sustentabilidade
das intervenções, ratificando assim a percepção de que “[...] as mediações produzidas
pelo trabalho social são indispensáveis para a apropriação e o usufruto efetivo dos
serviços e programas sociais priorizados pelas políticas públicas” (CARVALHO, 2014,
p.19).
Tendo como escopo um conjunto de atividades informativas, sócio-educativas e
estruturantes, o trabalho social vinculado aos programas de provisão habitacional para
famílias de baixa renda passa a ter um papel importante na promoção e consolidação
das premissas do desenvolvimento territorial e urbano. A partir de eixos específicos
de atuação, o trabalho social pressupõe a inserção dos beneficiários no processo
construtivo, a geração de trabalho e renda, a educação sanitária, ambiental e
patrimonial, a inclusão de gênero, a mobilização e organização comunitárias,
participação nos processos decisórios, comunicação e transparência e a gestão
Modelo tecnocrático e instrumental adotado na década de 1990, que sustentou a crença de que “a expansão da
política social e seus serviços criavam por si próprios os insumos para a redução das desigualdades” e que
sucedeu aquele adotado na década de 1960, em que a ênfase era colocada “nas metodologias de educação
popular” sob influência das proposições de Paulo Freire (CARVALHO, 2014, p.18).
26
47
condominial nos empreendimentos verticalizados. Seu objetivo maior passa a ser o
de contribuir na promoção da defesa dos direitos sociais, promover a participação e a
mobilização social, o acesso à cidade, aos serviços públicos e à informação.
Tais premissas inscrevem os programas habitacionais na política de desenvolvimento
urbano integrado e sustentável27, guarnecendo a concepção de uma intervenção que
promova o acesso das comunidades não só à habitação, mas aos serviços e
equipamentos públicos e seu desenvolvimento social, político e econômico. Prover
moradia passa a significar e demandar também inserção social das famílias, a
mobilização comunitária e a participação das famílias no processo, desde a sua
concepção até o pós-obra, a gestão democrática dos investimentos públicos, a
verificação e análise prévia da viabilidade social e ambiental das intervenções, a plena
apropriação dos bens e serviços disponibilizados, enfim, a implementação de ações
inovadoras voltadas à gestão social e ao desenvolvimento local28 que têm no trabalho
social seu instrumento de consolidação.
Não se pode ter a intenção de imputar a esse trabalho social o papel patronal de
promover a gestão social e o desenvolvimento socioterritorial ignorando as muitas
condicionantes que dificultam sua realização, os diversos agentes envolvidos na
consecução de suas premissas e o próprio Estado com suas atribuições,
complexidades e responsabilidades. Como assinala Koga (2011, p. 19), “o social
subjaz à economia” e nessa relação o trabalho social também não conquistou seu
lugar de reconhecimento na prática. Embora se tenha ampliado o número de
programas que o têm como componente obrigatório, sua execução ainda é realizada
sem o apoio institucional de que necessita. Mas, como um conjunto de atividades a
ser implementado em determinado território, o trabalho social adquire uma dimensão
macro que se potencializa, dada a pluralidade existente no território de sua ação,
catapultando-o a uma posição privilegiada na escala relacional que se volta à gestão
social.
27
Abrangendo o desenvolvimento econômico, social, cultural, político e institucional, a organização físico-territorial
e a gestão ambiental ( FRANCO, 1998, p.8 ). A sustentabilidade nesse sentido seria alcançada pela articulação de
todas essas esferas de ação no processo de mobilização e organização social com foco na melhoria contínua do
empreendimento e seu entorno.
28 Local como um espaço de atuação de diferentes indivíduos e segmentos sociais na busca do desenvolvimento
que implica na necessidade da mobilização e articulação de atores sociais ( FRANÇA, 2002, p.6-7 ).
48
Koga afirma que “ o território [...] representa o chão do exercício da cidadania, pois
cidadania significa vida ativa no território, onde se concretizam as relações sociais, as
relações de vizinhança e solidariedade, as relações de poder [...] (KOGA, 2000, p. 33
). É nesse território que o trabalho social deve estabelecer seu lugar buscando agir a
partir do que nele acontece cotidianamente de forma coerente com a concepção de
território adotada por Milton Santos que o considera “utilizável para a análise social
[...] a partir do seu uso, a partir do momento em que o pensamos juntamente com
aqueles atores que dele se utilizam” ( SANTOS, 2000, apud KOGA, 2011, p. 35 ).
O trabalho social visto nessa perspectiva adquire uma outra envergadura que se volta
para a totalidade ( figura 1 ) e não apenas para uma dimensão focal, devendo levar
em consideração as relações, identidades, ações, vocações, saberes e contextos
locais, onde a participação deve imbuir-se do significado da construção coletiva “ao
intervir com novos e velhos princípios centrados no e com o território, na ação
integrada e intersetorial e no fortalecimento de aportes culturais e vínculos
sociorrelacionais” ( CARVALHO, 2014, p.22 ).
Figura 1
-
Fonte: CARVALHO, 2014, p.22.
Há, portanto, nesse trabalho social que se propõe uma aproximação com a práxis
social como “ação política do ser humano” que busca “a melhoria de suas condições
49
de vida e, consequentemente, da sociedade, uma vez que compreende também a
dimensão coletiva” ( QUARESMA, 2012, p.185 ). O trabalho social inserido nesse
contexto e representado na figura 1 pressupõe e requer ação transformadora a partir
de um agir individual e/ou coletivo baseado na perspectiva da ação-reflexão-ação não
alienante “[...] na qual o homem faz história com sua práxis nela, e, com ela, cria-se
a si mesmo, produz-se a si mesmo” ( SÁNCHEZ VÁSQUEZ29, 2007, p. 404, apud
QUARESMA, 2012, p.185 ) e assim transforma o ambiente vivido e construído.
Adotando esses movimentos do processo pedagógico, o trabalho social incorpora um
“componente estratégico” nos programas de desenvolvimento urbano, tornando-se
capaz, a partir de metodologias adequadas, de “promover a retotalização da ação da
política pública [...]” (CARVALHO, 2014, p.21 ) e assim assumir o desafiante papel de
compartilhar e instigar competências para pensar, propor e executar projetos
societários consistentes e avaliados permanentemente com vistas à sua efetividade.
Tais premissas já haviam sido regulamentadas nas Instruções Normativas 050/2008
e 008/2009 que regulamentavam o trabalho social nos programas de desenvolvimento
urbano, e a Portaria 21/2014, instituída pelo MCidades em 22/01/2014, e instruída
pela Orientação Operacional 01/2014, vem ratificá-las principalmente na proposição
dos eixos Mobilização, Organização e Fortalecimento Social e Desenvolvimento
Socioeconômico e Territorial por meio dos quais propõe-se que o trabalho social
implemente processos de informação e organização sociocomunitária e ações
estruturantes que levem à autonomia e o protagonismo social, inserção das ações
desenvolvidas pelas organizações existentes na macroárea no escopo do projeto, a
constituição e a formalização de novas representações e novos canais de participação
e controle social.
Os demais eixos de atuação, igualmente importantes e obrigatórios previstos na
Portaria 21/2014 são: Acompanhamento e gestão social da intervenção; educação
ambiental e patrimonial e desenvolvimento socioeconômico e territorial. A ênfase a
ser dada em cada um deles deve respeitar o perfil dos beneficiários, as características
29
SÁNCHEZVÁSQUES, A. Filosofia da práxis. 1. Ed.Buenos Aires: consejo Latino-americano de
Ciencias sociales – CLACSO; São Paulo; Expressão Popular, 2007.
50
da área de intervenção e da macroárea30 indicadas no diagnóstico (BRASIL, 2014).
As ações que constituem o escopo do trabalho social devem ser implementados
antes, durante e após as obras, de acordo com um cronograma previamente
estabelecido e aprovado por meio de três instrumentos distintos de execução: o
Projeto Social Preliminar (PTS-P), o Projeto de Trabalho Social (PTS ) e o Plano de
Desenvolvimento Socioterritorial (PDST), cada um com escopos e objetivos
específicos e amarrados a marcos temporais próprios.
A Portaria 21 estabelece alguns mecanismos de governança que, não fosse sua
dificuldade de estruturação, mitigaria muitos problemas relativos ao processo de
construção e destinação das unidades habitacionais às famílias como as invasões,
ocupações irregulares, problemas construtivos, controle social. Vejamos: o PTS-P
deve ser apresentado pelo Ente Público e aprovado pela Instituição Financeira com
vistas à assinatura do convênio para realização do trabalho social em, no máximo, até
15% da obra. A partir desse momento o Ente Público inicia as ações relativas ao
cadastro, seleção e hierarquização das famílias para caracterização da demanda.
Nesse ínterim, período que tem duração de doze meses, ou até 65% da obra, a equipe
técnica vai realizando o diagnóstico socioeconômico das famílias, a caracterização da
macroárea e as atividades informativas iniciais e procede à elaboração e entrega do
PTS à instituição financeira. A partir daí, e durante oito meses, até a assinatura dos
contratos com os beneficiários, a equipe técnica implementa o PTS em cujo
cronograma
devem
constar
os
arranjos
necessárias
à
viabilização
da
intersetorialidade necessária à complementaridade de políticas e ações e a inserção
da macroárea no processo. Já o PDST é elaborado a partir da consolidação dos
arranjos intersetoriais voltados à integração territorial para o desenvolvimento
econômico e deve ser apresentado pelo Ente Público e aprovado pela Instituição
Financeira até no máximo o final da Fase de Obras e iniciado após a assinatura do
contrato ou a mudança das famílias para as unidades habitacionais tendo duração de
até doze meses.
Incluindo a poligonal dos empreendimentos compreende todo o território da intervenção e constitui-se de “região
relativamente homogênea de vulnerabilidades e riscos sociais, que inclui uma ou mais áreas de intervenção física,
próximas e seu entorno com o qual tal(ais) área(s) de intervenção interage(m) para acesso a serviços e
equipamentos públicos, ao mercado de trabalho, a organizações sociais (comunitárias, ONGs e movimentos
sociais)”. BRASIL, 2014, P. 54.
30
51
Abnegado, para cumprir seu papel o trabalho social precisa ser diligente e fazer valer
seu grande poder de comunicar e transitar pelas disciplinas, áreas, setores,
instituições, lideranças, enfim, movimentar-se com inovação na direção de seu
objetivo maior: transformar a qualidade da democracia uma vez que, abrindo espaço
à participação de pessoas e instituições existentes no território, torna-se capaz de
contribuir na formação de comunidades políticas fortalecidas e aptas a fazer a
mediação entre sociedade e Estado na conquista e manutenção de direitos e na
materialização do acesso a bens e serviços, viabilizando a emancipação dos
indivíduos e a autonomia das comunidades. Nesse sentido, o trabalho social ganha
um atributo especial de também poder intervir na promoção da qualidade da
cidadania.
Considerando a transversalidade31 e complexidade das questões que aborda e dos
próprios fenômenos urbanos, o trabalho social demanda interdisciplinaridade e
intersetorialidade, capacidade técnica e de gestão criativa, além de estreita
interlocução entre as políticas públicas e as obras. Boa parte do que se espera do
trabalho
social,
tanto
como
processo,
quanto
como
resultado,
depende
essencialmente de um efetivo processo comunicativo e de participação com adoção
de ferramentas adequadas para se pensar, propor e executar os projetos a partir de
diagnósticos consistentes e preferencialmente
participativos. Governança e
governabilidade, portanto, são mecanismos imprescindíveis aqui.
O trabalho social, privilegiando a informação e a formação, tem um enorme potencial
de promover, para além de um formalismo burocrático e de projetos prescritos, uma
mudança de consciência e a educação para a transformação do espaço de vivência
das pessoas que, beneficiárias de programas de habitação de interesse social, devem
transformar-se em sujeitos da ação capazes de impulsionar forças construtivas,
cívicas, modificadoras da área de intervenção e seu entorno estimulando de forma
contínua o desenvolvimento socioterritorial.
31
As ações que integram os eixos do trabalho social para a consolidação de suas premissas passam pela
comunicação, informação, educação patrimonial, educação sanitária e ambiental, mobilização social, geração de
trabalho e renda, inclusão de gênero, que encerram em si diversas atividades multidisciplinares e intersetoriais e
uma multiplicidade de possibilidades de ação, atores e parcerias.
52
Cabe aqui ressaltar, entretanto, que, “para que as pessoas se mobilizem e tomem
uma decisão de se engajarem em algum movimento, projeto ou ação, é preciso não
só que estas pessoas tenham carências e problemas em comum, mas que
compartilhem valores e visões de mundo semelhantes” (HENRIQUES; BRAGA;
MAFRA, 2004, p.4 ). Os problemas nesse sentido devem ser colocados “em
movimento e circulação na sociedade para o que é essencial estabelecer estratégias
comunicativas” com “um mínimo de informação”, trabalhando “o imaginário, emoções
e conhecimentos sobre a realidade das coisas [...], gerando a reflexão e o debate para
a mudança” (HENRIQUES; BRAGA; MAFRA, 2004, p.3-4).
Nesse quesito ressalte-se que “o grande desafio da comunicação32, ao mobilizar, é
tocar a emoção das pessoas, sem, contudo, manipulá-las, porque se assim se fizer,
ela será autoritária e imposta” (HENRIQUES; BRAGA; MAFRA, 2004, p.4 ). É preciso
planejá-la “no sentido de permitir a tomada de posições [...] de motivar, associar e
integrar os diversos públicos através da criação, da manutenção e do fortalecimento
dos vínculos [...] com o projeto instituído”. E assim, “o fazer comunicativo”
mais do que informar, tem por tarefa criar uma interação própria [...] através
do compartilhamento de sentidos e de valores. Deseja-se, assim, que sejam
fortalecidos os vínculos destes públicos com os movimentos e que sejam
capazes de tomar iniciativas espontâneas de contribuir à causa (sic) dentro
de suas especialidades e possibilidades HENRIQUES; BRAGA; MAFRA,
2004, p.5 ).
Portanto, abona-se a conjectura de que a execução de um trabalho social consistente
e estruturante demanda a utilização de mecanismos de intervenção social e
participação que garantam legitimidade às ações e canais de comunicação eficientes,
disponibilizados de forma acessível e abrangente para garantir um mínimo de
vocalização, interlocução, alcance e transparência necessários e desejáveis em se
tratando, em especial, de ações envolvendo a aplicação de recursos públicos.
Acredita-se ser esta uma medida necessária à regulação e controle social.
Fomentar a participação de qualidade, precedida e permeada pelos passos
necessários ao entendimento de suas razões, entre eles a contínua construção, troca
Comunicação aqui entendida não apenas como repasse de informações, “mas também como uma troca de
ideias, pensamentos ou sentimentos entre pessoas [...] tanto por meio da linguagem falada, quanto da escrita,
assim como de sinais, gestos, atitudes, atos ou até mesmo a omissão dos mesmos” ( PFEIFFER, 2006, p.29 )
32
53
e disseminação de informações, permite garantir a regulação e o controle social
permanentes, contribui na realização de um projeto democrático e um passo
significativo na direção da mobilização e engajamento daqueles para quem se pensa
as políticas e ações e da instituição de uma corresponsabilidade entre as partes
envolvidas. Afinal, “as prioridades contempladas pelas políticas públicas são
formuladas pelo Estado, mas nascem na sociedade civil” (ÁVILA, 2001, p.14). As
políticas públicas, das quais fazem parte o trabalho social,
dependem hoje de soluções democraticamente partilhadas entre Estado e
sociedade. [...] Nenhuma política nasce do Estado. As prioridades em
políticas públicas emergem na sociedade e só adentram a agenda do Estado
quando se constituem em demanda vocalizada (CARVALHO, 2014, p.50).
Imbuído de uma dimensão pedagógica, o trabalho social tem a prerrogativa de
fomentar a gestão social que implica um processo de desenvolvimento societário
constituído de poder, conflito, aprendizagem (FISCHER, 2002, apud MAIA, 2005) e
transformação (DOWBOR, 1999 apud MAIA, 2005), sustentáculo da governança
pretendida. Como tal, dá seguimento a “processos de adesão de sujeitos sociais
implicados” e qualifica mecanismos “de tomada de decisão e de implantação de
políticas e programas sociais” (CARVALHO, 2014, p. 33). Nesse sentido, o trabalho
social constitui-se a base de um processo dialético de formação e consolidação de
uma cidadania deliberativa que dará ancoragem à própria noção de gestão social.
Citando Schön (1992; 2000), Alarcão (2003) e Gómez (1992), Silva e Araújo ( 2005 )
recuperam o conceito de reflexão a partir de Paulo Freire e apresentam um modelo
de gestão social e participação que insere quatro movimentos no processo
pedagógico implícito naquele conceito: “o conhecimento na ação; a reflexão na ação;
a reflexão sobre a ação; e a reflexão para a ação” (SILVA; ARAÚJO, 2005, p. 2) todos
atinentes ao trabalho social, tanto do ponto de vista do técnico que o implementa ou
das entidades proponentes, quanto do beneficiário e da comunidade atendida. Os
autores então explicam
O conhecimento na ação é o conjunto de saberes interiorizados (conceitos,
teorias, crenças, valores, procedimentos), que são adquiridos através da
experiência e da atividade intelectual, mobilizados de forma inconsciente e
mecânica nas ações cotidianas [...].
A reflexão na ação é a reflexão desencadeada durante a realização da ação
pedagógica, sobre o conhecimento que está implícito na ação. Ela é o melhor
54
instrumento de aprendizagem [...], pois é no contato com a situação prática
que [...] (se) adquire e constrói novas teorias, esquemas e conceitos,
tornando-se um profissional flexível e aberto aos desafios impostos pela
complexidade da interação com a prática. No entanto, a reflexão realizada
sobre a ação e para a ação é de fundamental importância, pois elas podem
ser utilizadas como estratégias para potencializar a reflexão na ação.
A reflexão sobre a ação é a reflexão desencadeada após a realização da ação
pedagógica, sobre essa ação e o conhecimento implícito nessa ação. Neste
momento, também poderá ser realizada a reflexão sobre a reflexão realizada
durante a ação.
A reflexão para a ação é a reflexão desencadeada antes da realização da
ação pedagógica, através da tomada de decisões no momento do
planejamento da ação que será desenvolvida (SILVA; ARAÚJO, 2005, p.2).
Defende-se essa aproximação com Paulo Freire uma vez que no trabalho social prevê
a implementação de ações que promovam o desenvolvimento socioterritorial de longo
prazo a partir da educação, da capacitação, da mobilização social, da participação e
isso se torna possível somente se essas ações puderem pressupor uma “educação
que promova a conscientização a partir da leitura crítica do mundo” (QUARESMA,
2012, p. 188 ) por meio da qual a ação não seja “puramente técnica” mas contribua
para uma formação política ( idem ). A autora complementa esse pressuposto dizendo
À educação, na perspectiva da práxis social, cabe a tarefa de construir
situações de aprendizagem nas quais os interesses, as visões de mundo, os
desejos, as experiências individuais e coletivas de participação e autogestão,
os conflitos ideológicos surjam discutidos, debatidos, tendo em vista essa
percepção crítica da realidade ( QUARESMA, 2012, p. 189 )
As intervenções no desenvolvimento urbano são potencialmente favoráveis à
apropriação do local como espaço de “encontro das ações do Estado e da sociedade”
[...] e ao mesmo tempo “alvo (grifo do autor) socioterritorial” dessas ações ( FRANCO,
1998, p.7 ), que demandam uma articulação entre o social, o político e o econômico
na promoção do desenvolvimento que se quer local. Defende-se, portanto, o caráter
mobilizador, socializador, mediador do trabalho social, pois é no território que se
concentram os problemas, mas é também no território que residem “as energias e
forças sociais da comunidade, constituindo o poder local [...]” (GOHN, 2004, p 24).
Segundo Gohn (2004, p.24)
no local onde ocorrem as experiências, ele” (o poder local) “é a fonte do
verdadeiro capital social, aquele que nasce e se alimenta da solidariedade
como valor humano. O local gera capital social quando gera autoconfiança
nos indivíduos de uma localidade, para que superem suas dificuldades. Gera,
55
junto com a solidariedade, coesão social, forças emancipatórias, fontes para
mudanças e transformação social.
Assim, para um trabalho social consistente, estruturante e desafiador, que faça
cumprir as diretrizes das normativas e promova o desenvolvimento local e a gestão
social, é preciso criar competências locais, instituir metodologias de proposição,
execução e monitoramento apropriadas. Os profissionais envolvidos em tais ações
necessitam de capacitação para gerir processos, pessoas e recursos e buscar
entender quais são os produtos que, construídos a partir de e junto com as
comunidades atendidas, lideranças, conselhos e entidades representativas, devem
ser apresentados aos agentes promotores e gestores dos programas e aos que
residem na área de intervenção e seu entorno.
Por ser recente sua inscrição no patamar das ações inerentes às intervenções
urbanas, o trabalho social ainda requer profissionalização e necessita de
metodologias específicas, adequadas às realidades encontradas. Os profissionais
que nele atuam precisam conhecer melhor suas atribuições e funções e estar mais
bem preparados para irem além da ação assistencial e da burocrática tarefa de
favorecer a abertura e manutenção dos canteiros de obras e a facilitação do trabalho
dos agentes executores dos empreendimentos e das construtoras.
As deficiências do trabalho social decorrem também da fragilidade dos processos
participativos, pois, num país de tenra democracia, as formas e canais de participação
ainda estão sendo edificados e os instrumentos de controle social 33 persistem em se
manter precários e conflitantes na perspectiva da vigilância social sobre as ações do
Estado na implementação das políticas públicas e na defesa dos interesses das
camadas menos favorecidas da sociedade.
Nesse sentido, as intervenções sociais no âmbito dos programas habitacionais devem
se desfazer do modelo tutelar que objetiva somente a informação unidirecional
constituída para satisfazer às formalidades e preceitos normativos e imbuir-se de
Atente-se para a ambiguidade do significado de “Controle social” no sentido do controle do Estado sobre a
sociedade na medida do atendimento a algumas de suas demandas e da sociedade sobre o Estado. A perspectiva
utilizada aqui considera a capacidade da sociedade civil tem de interferir na gestão pública (CORREIA, M.V.C,
2009)
33
56
estruturas interacionais inovadoras que motivem as interlocuções, a formação política
e o protagonismo social para que, efetivamente, se processe mudanças no contexto
socioterritorial a partir das pessoas. Segundo Carvalho ( 2014 ), “nenhuma mudança
ocorre se não querida e apropriada” (CARVALHO, 2014, p. 176).
Despertar nas pessoas e grupos beneficiários as aptidões de pertencer e apropriar-se
de espaços constituídos, provocar nos indivíduos a disposição para fortalecer
identidades a partir de atitudes mentais construtivas que se coloquem a serviço da
coletividade, é algo que requer dos profissionais responsáveis pelos projetos de
trabalho social certas habilidades específicas para a percepção, adoção e condução
de metodologias apropriadas. Como assinala Carvalho (2014), tais metodologias
“devem identificar e construir oportunidades que permitam à população processar
mudanças desde dentro” ( CARVALHO, 2014, p. 176). Carvalho (2014, p. 170) ainda
afirma que as “metodologias de trabalho social são constructos pensados a partir de
intencionalidades, conhecimentos e experiências”. Na intervenção social, a
efetividade das ações depende das metodologias adotadas pois são elas que,
“sustentadas por um quadro referencial constituído de aportes teóricos e da
experiência acumulada” garantem o “ordenamento da ação” que se quer exitosa.
Não há como prescrever a melhor metodologia para o trabalho social que se vincula
aos programas habitacionais, pois são programas implementados em distintas e
complexas realidades e destinados a territórios dotados de uma dinâmica própria que
incorpora ao mesmo tempo “totalidades e particularidades” que exigem “um olhar
dialógico entre o todo e as partes, entre o singular e o coletivo” (CARVALHO, 2014,
p. 173). Para pensá-la é preciso considerar o contexto em que irá se inserir tendo em
mente que um “programa social é sempre sociorrelacional” (CARVALHO, 2014, p.
172).
Os Projetos de Trabalho Social (PTS) desenvolvidos nos empreendimentos de
habitação de interesse social são direcionados a territórios determinados envolvendo
não somente as comunidades diretamente beneficiárias, mas também o seu entorno,
tratado pela Portaria 21/2014 como macroárea, e, de forma indireta, contemplam a
sociedade como um todo. Garantir a apropriação e o bom uso dos bens e serviços
disponibilizados, despertar nas pessoas os sentidos de pertencimento e preparar os
57
beneficiários para dinamização e a melhoria contínua do território devem ser a
essência das ações dos projetos de trabalho social.
O êxito desses projetos demanda modos de organizar a alocação dos recursos em
um cronograma físico-financeiro que leve em consideração todas as etapas que
envolvem a proposição e execução de um conjunto de atividades, desde o
planejamento, na fase pré-contratação, até o pós-entrega dos produtos aos
beneficiários e usuários finais. O PDST dever representar a possibilidade de deixar na
comunidade a perspectiva de continuidade da intervenção por outras entidades
presentes na macroárea. Num processo de avaliação e monitoramento constantes, é
preciso verificar ao longo de toda a sua execução a necessidade de redirecionar
ações.
A elaboração e execução de projetos de trabalho social requer dos profissionais da
área social capacidade técnica para a definição e a aplicação de metodologias
apropriadas às necessidades e objetivos dos projetos para a garantia da efetividade
e eficácia das ações, mas requer também a sensibilidade necessária para conduzir o
processo de apreensão da realidade. Pressupõe, portanto, uma atuação técnica ao
mesmo tempo sistemática e flexível que dê conta de todas as variáveis relevantes
contidas num projeto de intervenção, que requer habilidades de gestão e de
gerenciamento de Projetos34.
No trabalho social os projetos dispensam padrões e receitas, não são estanques nem
engessados. Devem se valer da própria riqueza da estrutura social e territorial e da
própria dinâmica que nela se encerra, mas isso não isenta o trabalho social e as
metodologias eleitas em sua realização de métodos de planejamento e
gerenciamento, pois o trabalho social, de acordo com Carvalho (2014, p. 180),
[...] consolida-se como uma ação intencionada com base em diretrizes
teóricas e metodológicas, que devem se materializar num ordenamento dos
processos de trabalho no contexto da operação das políticas sociais. Isto quer
dizer que as ações de diagnóstico, planejamento e avaliação, próprias do
ciclo da gestão, também permeiam o cotidiano do trabalho social. A
intervenção requer o processo sistemático de leitura e análise da realidade,
Conforme Pfeiffer (2005), o termo “gerenciamento” aplicado a projetos está relacionado ao nível operacional
relativo ao planejamento, organização e implementação. Diferente do termo “gestão” que tende a assumir uma
conotação mais política, voltada mais para o nível estratégico e institucional.
34
58
da conjuntura e da própria intervenção no âmbito dos programas e serviços
sociais.
Dessa forma, o gerenciamento e a gestão de um projeto aplicado ao trabalho social
no desenvolvimento urbano deve levar em consideração os sujeitos e suas demandas
priorizando dessa forma não o objetivo final do projeto e as mudanças que irão se
consolidar, mas o processo de construção dessa mudança e as deliberações dela
decorrentes que se quer coletivas e compartilhadas. Gerenciar um projeto social,
portanto, requer que se considere a heterogeneidade presente na coletividade, a
dialogicidade e, consequentemente, a produção e a socialização de saberes como
processo permanente (MACHADO, 2004 apud AFONSO, 2010).
O ato de gerenciar projetos sociais, de certa forma, se assemelha ao ato de gerenciar
projetos de desenvolvimento 35 pois implica aplicar “conhecimento, habilidades,
ferramentas e técnicas às atividades do projeto a fim de atender aos seus requisitos”
(PMI, 2004 apud PFEIFFER, 2005, p.3136) e assim pressupõe a participação não só
dos beneficiários diretos e indiretos, mas de todas as partes interessadas,
antecipando situações futuras desejadas, definindo os caminhos para alcançá-las e
delimitando “o quê compartilhar e de que forma” (PFEIFFER, 2005, p.31). Antever as
áreas implicadas nas ações propostas e definir os mecanismos que viabilizarão a
inserção dessas áreas no processo de implementação do projeto é fundamental para
o êxito dos propósitos. Garantir um modelo de governança a partir da
intersetorialidade, da interlocução entre as áreas, do diálogo aberto, da troca entre os
saberes constituídos, da interdisciplinaridade, é condição essencial na proposição e
implementação de projetos sociais.
O modo de trabalhar e gerenciar os projetos sociais influencia significativamente
nesse processo de construção coletiva e interdisciplinar e impacta de maneira direta
nos resultados pretendidos, e, nesse quesito, é preciso levar em conta a articulação
de conceitos como identidade, comunicação, representações sociais, atitudes,
35
“ Voltados à mudança de uma situação social [...]. Processo de transição de uma situação atual, caracterizada
pela existência de problemas [...], para uma situação futura, melhorada [...]. Se o projeto pretende alavancar a
transição, não só com a instalação de bens e serviços, mas também procurando a participação dos envolvidos,
ele pode ser considerado um Projeto de Desenvolvimento” ( PFEIFFER, 2005, p. 19).
36
PMI (Project Management Institute (2004): Um Guia do Conjunto de Conhecimentos de Gerenciamento de
Projetos.
59
vínculos, grupos, instituições, poder, (AFONSO, 2010), controle social. A condução
dos projetos deve ser feita na direção de uma execução responsável, que valorize o
processo como premissa não apenas do resultado imediato, mas de um legado
consistente e duradouro que seja resultante de uma dimensão ético-política intrínseca.
Como menciona Cury (2001, p. 38)
A dimensão técnica – maior competência na busca de conteúdos e de estratégias que
nos permitam aferir resultados eficientes e eficazes – não é suficiente. Existe uma
outra dimensão, a ético-política, que importa ressaltar, a qual organiza e sustenta esse
processo, delimita-o em seu sentido e em seus fins, pois atuar na esfera pública,
coletiva e social exige, antes de mais nada, um compromisso com a efetividade e,
para isso, é preciso que tenhamos uma visão crítica que questione, a todo momento,
o sentido desse nosso agir.
É imprescindível conhecer a relação do projeto com a entidade proponente e definir a
responsabilidade técnica para sua implementação. A garantia de execução e êxito,
entretanto, é assegurada também por outras variáveis igualmente importantes:
objetivos bem definidos, claros e exequíveis, abrangência ou escopo coerente com as
limitações do projeto, planejamento realista e bom dimensionamento dos recursos
(PFEIFFER, 2005), a interação entre os sujeitos, a nomeação de facilitadores
constituídos do próprio grupo, a instituição de canais permanentes de informação e
comunicação, a construção de diagnósticos participativos e interativos.
Assim, gerenciar projetos, no contexto das políticas públicas, pressupõe desconstruir
as
relações
hierárquicas
em
favor
da
participação
horizontalizada.
Uma
coparticipação que leve os sujeitos a pensar e agir em suas próprias demandas
(AFONSO, 2010). Pressupõe, além do que já foi dito, a preparação das comunidades
beneficiárias para a fase do desligamento da equipe técnica para que, imbuídos do
espírito
de
pertencimento,
coletividade
e
solidariedade,
pressupostamente
desenvolvido pelas metodologias de intervenção no trabalho social, possam se fazer
representar e, não só trabalhar pela melhoria contínua, mas demandar aos gestores
dos programas, em qualquer instância governamental o incremento da área de
intervenção e do seu entorno para a constituição de centralidades e consolidação de
seus vínculos.
Parte-se da premissa de que os programas de provisão habitacional não são capazes
de promover emancipação e inclusão social pela tão somente disponibilização de
60
moradia sem que com ela estejam vinculadas políticas de inserção socioterritorial do
público favorecido. O trabalho social então, constituindo-se como parte integrante dos
programas habitacionais, assume uma dimensão estratégica de promoção da
“retotalização da ação ” ( CARVALHO, 2014, p. 169) e articulação da intervenção física
com uma intervenção social de caráter sociopedagógico que se quer dialógico e
mediador ( CARVALHO, 2014, p. 169 ).
Pelo exposto, considerando o longo caminho a percorrer na direção da consolidação
do trabalho social como mediador nas implementação das políticas públicas, o
presente estudo propõe como produto técnico um guia de orientações metodológicas
para a atividade profissional dos técnicos responsáveis pelo trabalho social nas
intervenções do desenvolvimento urbano sem que se tenha o propósito de engessar
a ação, mas na intenção de facilitar a prática e contribuir com o tão necessário
incremento da capacidade técnica para a conquista de maior efetividade dos projetos
sociais.
1.3 Gestão social e Trabalho Social
De acordo com Ávila (2001), “a gestão social é em realidade, a gestão das demandas
e necessidades dos cidadãos” ( ÁVILA, 2001, p. 14 ), e como tal impõe às populações
o desafio de serem protagonistas na construção de seus próprios territórios pois as
políticas, programas e projetos virão em resposta a essas demandas que
“reconhecidas como legítimas” ( ÁVILA, 2001, p.14 ) passam a se constituir em direito
fundamentando, por sua vez, as políticas públicas ( ÁVILA, 2001).
A gestão social impõe ao Estado o desafio e a condição de se estruturar para não só
atender às necessidades da sociedade, mas de participar de forma ativa do processo
de identificação e organização das demandas e contendas sociais. Na gestão social
cabe ainda o planejamento das ações públicas necessárias à universalização das
políticas sociais em conjunto com os demais atores e partes interessadas, rompendo
de vez com seu modelo anacrônico de se aparelhar para se enclausurar na máquina
burocrática e ineficiente.
61
O princípio da gestão social, assim como da governança e governabilidade, permite
aos atores repensar a “concepção do exercício do poder”. Como processo sinérgico e
intersetorial, demanda “capacidade de mediação entre opostos, conciliando
conhecimentos, ética e efetividade” (ROCHA; SANTOS, 2012, p. 79 ) num processo
contínuo e dialético de compartilhamento do agir por meio do qual a técnica e o
conhecimento tácito (ou “poder político da população”) ( ROCHA; SANTOS, 2012, p.
79 ) retroalimentam os saberes, habilidades e potencialidades locais. Imbuído de tal
princípio a gestão social “rompe o hiato entre a técnica e a política” (PAES DE
PAULA37, 2005, p. 46, apud ( ROCHA; SANTOS, 2012, p. 79 ).
De acordo com Rocha; Santos (2012) os processos de gestão assim instituídos
“objetivam a consolidação de um projeto político societário” por meio do qual “a
democracia e a participação cidadã ativa são exercidas dialeticamente por todos os
sujeitos envolvidos” ( ROCHA; SANTOS, 2012, p. 79 ) e no qual o gestor passa a ser
“[...] um mediador entre pessoas (dimensão individual), coletivos (dimensão relacional)
e interorganizacional [...]” ( FISCHER38, 2006, p.22, apud ROCHA; SANTOS, 2012, p.
79 ). Mais do que uma “estratégia administrativa”, a gestão social é uma ação política
contra-hegemônica frente às formas tradicionais de gestão.
Entretanto, promover a gestão social em estruturas complexas de Estado e sociedade,
emoldurados por profundos e históricos problemas sociais é naturalmente difícil
quando em sua dimensão territorial novos atores emergem com seus interesses
particulares. Essas políticas, tratadas sob o paradigma da benesse, da concessão,
“como dotações exclusivas do Estado [...] e, portanto, dissociadas do plano de direitos
subjetivos de seus destinatários” só agravam o processo de exclusão social ( PIRES,
2010, p. 186 ).
Tais circunstâncias demonstram a existência de uma sociedade segmentada em seus
interesses dificultando a construção e o fortalecimento das políticas públicas, a
universalização de direitos, a oferta democrática de serviços e a formação de
37
PAES DE PAULA, A.P.Administração pública brasileira entre o gerencialismo e a gestão social. Revista de
Administração de Empresas, São Paulo, v. 45, n. 1, p. 36-49, jan./mar. 2005.
38
FISHCER, T.; MELO, V.P. Programa de desenvolvimento e gestão social: uma construção coletiva. In:
FISHCER,T. et al.( Org). Gestão do desenvolvimento territorial e residência social: casos para ensino. Salvador:
EDUFBA, CIAGS/UFBA, 2006. P. 13-41.
62
“comunidades cívicas” 39 . Para ajustar essa engrenagem, Estado, sociedade civil,
iniciativa privada e mercado devem se reordenar e buscar pontos de convergência
para um trabalho conjunto na construção da cidadania e fortalecimento das ações que
se destinem ao bem coletivo. Boschi (1999), em consonância com o que diz Putnam,
afirma
Práticas institucionalizadas de ‘bons governos’ são geralmente identificadas
com o estabelecimento de relações sociais horizontais que tenderiam a
fortalecer a sociedade civil frente ao Estado. [...]. Relações verticais,
assimétricas e hierárquicas dariam lugar à instauração de práticas autoritárias
e de relações sociais predatórias, por sua vez impeditivas da geração de
políticas conducentes ao desenvolvimento. [...] com a consequente utilização
de bens públicos como moeda de troca para se auferirem benefícios privados
( BOSCHI, 1999, p. 656 )
Carvalho (2014) complementa essas colocações dizendo que a ação pública para ser
efetiva deve ser sinérgica e não setorial, em razão, inclusive, da heterogeneidade e
complexidade dos fenômenos sociais, demandando para tal o “ amadurecimento das
instituições” (SILVA, 2012, p. 22-23). Segundo Carvalho (2014, p. 53)
fortalecer a gestão compartilhada pressupõe consolidar um novo padrão de
articulação e complementaridade no qual a heterogeneidade de grupos
sociais derive na construção de um novo compromisso social, engajando a
todos de forma democrática, participativa e proativa.
É relevante a atuação das organizações sociais no território no contexto das políticas
públicas, o que revela a “incompletude do Estado e a necessidade de democratização
da ação pública” (CARVALHO, 2014, p. 44). Para a autora, conjugar o papel do Estado
com a participação da sociedade nas decisões públicas das cidades contemporâneas
é o grande desafio. Segundo ela, “o fortalecimento da intelligentsia (grifo da autora)
do fazer público, do ponto de vista da gestão, terá de apostar na consolidação dos
mecanismos de integração, articulação, negociação e participação da sociedade” (
CARVALHO, 2014, p.44).
De acordo com Putnam ( 2006) “numa comunidade cívica, a cidadania se caracteriza primeiramente
pela participação nos negócios públicos [...]. Implica direitos e deveres iguais para todos. Tal
comunidade se mantém unida por relações horizontais de reciprocidade e cooperação, e não por
relações verticais de autoridade e dependência. Os cidadãos interagem como iguais, e não como
patronos e clientes ou como governantes e requerentes. Nessa comunidade, [...] os líderes devem ser
e considerar-se responsáveis por seus concidadãos” (PUTNAM, 2006, p. 101-102).
39
63
Putnam ( 2006 ) afirma que “as associações civis contribuem para a eficácia e a
estabilidade do governo democrático” por disseminar “hábitos de cooperação,
solidariedade e espírito público”. Segundo o autor, “a participação em organizações
cívicas desenvolve [...] o senso de responsabilidade comum para com os
empreendimentos coletivos” ( PUTNAM, 2006, 103-104 ).
Constituir o vigor de um governo democrático e representativo e a vitalidade política
de uma comunidade estaria por assim dizer diretamente relacionado a uma
propriedade sócio-organizativa endógena, capaz de surgir no interior do próprio tecido
social de forma pragmática a partir das condições locais instaladas e de visões e
problemas compartilhados. Os cidadãos aqui representados adquirem a faculdade de,
não só participar de, mas de participar em organizações que se constituem para gerir
de forma organizada as demandas sociais. Essa estrutura de engajamento fortalece
os propósitos e projetos comunitários e o próprio Estado.
Trata-se de reconhecer as “novas potencialidades relacionadas à ampliação dos
atores sociais envolvidos na gestão da coisa pública” (FREY, 2007, p.138) e a
necessidade de promover a intersetorialidade e a articulação desses atores em favor
da melhoria da capacidade de governar do Estado em prol do bem comum. Essa
orientação inspira a adequação de um modelo de gestão pública de caráter mais
gerencialista40 por uma gestão “democrático-participativa” (FREY, 1996, apud FREY,
2007, p. 138 ) no sentido de “mobilizar todo conhecimento disponível na sociedade
em benefício da melhoria da performance administrativa e da democratização dos
processos decisórios locais” ( FREY, 2007, p.138 ) e consolidar a gestão social.
Em meio às diversas relações que se estabelecem entre os diferentes atores sociais;
em meio aos “projetos societários de desenvolvimento em disputa” ( MAIA, 2005, p.2)
que Maia polariza no “desenvolvimento do capital e desenvolvimento da cidadania”
(MAIA, 2005, p.2 ), representando interesses públicos ou privados, individuais ou
coletivos, torna-se exigência incondicional à criação de mecanismos estratégias,
40
Baseado no modelo gerencial que incorpora na administração pública o princípio da eficiência voltada a
resultados e apadrinhado pelo conceito da Nova Gestão Pública ( New Public Management – NGP ) que propunha
uma “reforma geral do Estado” ( PAES DE PAULA, 2005, apud FERREIRA NETO, 2012, p. 90 ) em razão das
crises globais da década de 1970 que abalaram o processo de construção do Estado de Bem Estar Social. O
modelo foi adotado no Brasil dentro do que se chamou “administração pública gerencial” ( BRESSER-PEREIRA,
1998, apud FERREIR NETO, 2012, p. 90 )
64
ferramentas, metodologias ou instrumentos que sustentem os processos de condução
desses interesses e que constitui em si a gestão social.
Nessa estrutura composta de interesses hegemônicos e contra-hegemônicos, a
gestão social como “processo social de desenvolvimento ou conjunto de processos
sociais, viabilizador do desenvolvimento societário” (MAIA, 2005, p.14, grifo da autora)
pode assumir o viés da “gestão do social” - como soma das ações em torno das
políticas públicas e sociais - ou “gestão contra o social” (MAIA, 2005, p. 2-3). Sob a
perspectiva gerencialista, que coloca o social como meio e o capital como fim (como
nas ações de responsabilidade social), a gestão social, que deve ser “determinada
pela solidariedade” (TENÓRIO, 2005, p.103), assume o caráter de gestão contra o
social (MAIA, 2005). Enquanto aquela perspectiva gerencialista exclui do processo,
ou do conjunto de processos, pessoas e comunidades, que deveriam, muito antes,
ser tomadas como agentes da ação, a gestão social que se ancora na solidariedade,
ao contrário, prima “pela concordância, em que o outro deve ser incluído” ( TENÓRIO,
2005, p. 103 ).
O contexto desse estudo incorpora portanto o conceito de gestão social proposto por
Maia (2005), para quem gestão social é então
[...] um conjunto de processos sociais com potencial viabilizador do
desenvolvimento societário emancipatório e transformador. É fundada nos
valores, práticas e formação da democracia e da cidadania, em vista do
enfrentamento às expressões da questão social, da garantia dos direitos
humanos universais e da afirmação dos interesses e espaços públicos como
padrões de uma nova civilidade. Construção realizada em pactuação
democrática, nos âmbitos local, nacional e mundial; entre os agentes das
esferas da sociedade civil, sociedade política e da economia, com efetiva
participação dos cidadãos historicamente excluídos dos processos de
distribuição das riquezas e do poder.
Como o objeto de estudo aqui apresentado por si só já pressupõe os diversos
segmentos da sociedade como partícipes do processo de implementação de
programas e ações do governo, trazendo o setor privado representado, por exemplo,
pelas grandes construtoras e incorporadoras, os especuladores imobiliários e
latifundiários desejosos de desmembrar suas terras para implantação dos
empreendimentos habitacionais e assim se beneficiarem da extensão da
infraestrutura até suas propriedades, os cartórios que não abrem mão de suas
65
estruturas monopolizantes, o setor público, a sociedade e comunidades destinatárias
das intervenções, é conveniente trabalhar também com o conceito de gestão social
proposto por Tenório (2005) que a entende como “processo gerencial dialógico no
qual a autoridade decisória é compartilhada entre os participantes da ação”
(TENÓRIO, 2005, P. 102 ), pois nessa mesma concepção, o autor considera o ‘social’
que adjetiva a gestão como espaço de diálogo e interação “ sem nenhum tipo de
coação” e ressalta o coletivo como centro do processo.
Diante da “centralidade do mercado na gestão da vida social” (FERREIRA NETO,
2012, p. 89 ), e considerando que ao Estado cabe regular, normatizar e cuidar do
interesse público, e compreendendo que “entre a administração pública e a cidadania
não há um contrato comercial com base individual”, mas “um contrato social e político
de base coletiva” (FERREIRA NETO, 2012, p. 97) é do Estado a incumbência de se
organizar para que a gestão social genuinamente aconteça e se consolide. E nesse
sentido é preciso que ele consiga aliar “resolutividade” às suas práticas gerenciais
viabilizando o exercício do controle social por meio de canais efetivos de participação
direta (FERREIRA NETO, 2012).
Ao discorrer sobre governança urbana e participação pública, Frey ( 2007 ) traz uma
colocação bastante interessante e complementar ao tema que diz: “Governar tornase um processo interativo porque nenhum ator detém sozinho o conhecimento e a
capacidade de recursos para resolver problemas unilateralmente” (STOKER, 2000, p.
9341, apud FREY, 2007, p.138 ) e complementa com Kickert ( 1999 ): “O governo é
apenas um entre muitos influentes atores sociais que estão envolvidos na formulação
e implementação de políticas públicas” (KICKERT et al.42, 1999, p.5, apud FREY,
2007, p.138 ).
Assim, permeiam entre si os conceitos de gestão social, governança e
governabilidade e é tênue a linha que separa conceitualmente um do outro. Rocha e
Santos ( 2012 ) afirmam que
41
Stoker, g. 2000. Urban political science and the challenge of urban governance. In J.Pierre (Ed.). Debating
Governance: authorit, steering and democracy (pp.91-109). New York:Oxford university Press.
42 Kickert, W. J. M., Klijn, E. H., & Koppenjan, J. F. M. (1999b). Introduction: a management perspective on policy
networks. In W. J. M. Kickert, E. H. Klijn, & J. F. M. Koppenjan (Eds.). Managing complex networks. Strategies for
the public sector (pp.1-13). London, Thousand Oaks, New Delhi: SAGE.
66
A gestão social se diferencia dos modelos tradicionais de gestão pela sua
finalidade e também pelo processo. Finalidade e processo se complementam
como faces da mesma moeda. O modo de gerir é reinventado para alcançar
determinada finalidade, a finalidade proposta reformula e transgride o modo
de gerir em movimento dialético. [...] A gestão social caracteriza-se pela
construção coletiva de regras, normas, instrumentos de gestão, pela inovação
de metodologia que privilegiam o diálogo, a participação, decisões
compartilhadas, horizontalidade hierárquica, com valorização de diferentes
saberes na ação [...]. O modo de gerir da gestão social constitui-se como
verdadeiros processos coletivos de aprendizagem.
A gestão social resgata o processo da gestão coletiva e democrática deixada
como herança pela educação popular idealizada por educadores da geração
dos anos de 1960 e 1970 e deve ser entendida como um processo educativo.
[...] A gestão social supõe posicionamento político quanto à sua finalidade, ‘
a favor de quem e do quê ( ROCHA;SANTOS, 2012, pp.75-77 ).
Dessa maneira, os servidores e gestores públicos, a que Carvalho (2014) chama de
“atores internos” e os grupos da sociedade civil, que para essa autora são os “atores
externos”, devem agir de modo conciliador buscando “fortalecer e construir novas
relações entre Estado e sociedade civil para recuperar a confiança social perdida e
fortalecer a dimensão da participação” (CARVALHO, 2014, p. 51) instituindo assim
modelos de governança e governabilidade para organizar e gerir os interesses
coletivos.
1.4 Considerações finais
Vimos que o SNHIS instituído em junho de 2005 pelo Ministério das Cidades, por
intermédio da Lei 11.124, criou mecanismos de governança e governabilidade na
implementação da política de provisão habitacional para a população de menor renda
e delegou às administrações públicas municipais uma corresponsabilidade no
processo de implementação dos programas imputando-lhes atribuições para uma
gestão compartilhada. As prefeituras ganharam papel central na articulação com o
Governo Federal e interlocução entre os atores tendo que assumir um protagonismo
na aplicação dos recursos destinados à execução das intervenções e na
implementação da Política Nacional de Habitação (BRASIL, 2005).
A constituição da SNHIS e da PNH foi um passo importante na direção de uma política
urbana que contemple os princípios da função social da propriedade estabelecido na
Constituição Federal e no Estatuto da Cidade e que abarque o estímulo à participação
e ao compartilhamento de ações, a intersetorialidade e uma “atuação coordenada e
67
articulada entre os entes federativos” (BONDUKI; ROSSETO; GHUILLARD, 2006).
Entretanto, a implementação da PNH depende de ações voltadas ao desenvolvimento
institucional, pois as prefeituras continuam não dispondo de capacidade governativa
para a consolidação de suas premissas. Tomamos as palavras de Milton Santos para
ratificar tal postulado
A luta pela cidadania não se esgota na confecção de uma lei ou da
Constituição porque a lei é apenas uma concreção, um momento finito de um
debate filosófico sempre inacabado. Assim como o indivíduo deve estar
sempre vigiando a si mesmo para não se enredar pela alienação circundante,
assim o cidadão, a partir das conquistas obtidas tem de permanecer alerta
para garantir e ampliar sua cidadania (SANTOS, 2001, p. 104).
Se os mecanismos de governança estão dados, prescritos e tratados, resta-nos
pensar que o que esteja faltando sejam então os mecanismos de governabilidade e
gestão social que façam permear pelo campo da exequibilidade aquilo que a norma
guardou para si. E nesse sentido, dado que necessitamos de, para isso, promover
espaços de vocalização, estimular a participação deliberativa, consciente, cívica, resta
ao trabalho social um papel a desempenhar.
Assim, o trabalho social que se deseja ver executado está exatamente centrado na
preparação das comunidades para o exercício das virtudes cívicas ou no despertar
das virtudes das comunidades, para que a reciprocidade, a interação, a solidariedade,
a confiança mútua e a cooperação sejam resultantes de relações horizontalizadas e
baseadas no princípio da igualdade política (PUTNAM, 2006). Considera-se como
princípio desta dissertação que o trabalho social pode se constituir em uma
oportunidade de investir nas consciências individual e coletiva (virtude cívica) como
ingredientes na construção da ‘força social’ (LEFEBVRE, 1991, p. 116) necessária à
transformação da realidade. Enxergar nos beneficiários dos programas e políticas
públicas o potencial agente de transformação que reside em cada um, fazendo-os
migrar do cômodo papel de pacientes suplicantes ou destinatários das ações e
“favores”, para o lugar de protagonistas e coparticipantes da ação, poderá fazer da
sustentabilidade das intervenções a consequência e não a meta a ser alcançada.
Neste sentido, o trabalho social deve ser colocado não somente como mediador entre
a norma e o concreto, mas como mecanismo que irá investir nas atitudes que
68
precedem a norma, ou seja, na preparação dos indivíduos para o cumprimento de
acordos tácitos que viabilizem a superação dos ‘familismos amorais’43 ( BANFIELD,
1958, p. 85 apud PUTNAM, 2006, p. 102 ), que degeneram a própria lei ou norma. E
por esse caminho o trabalho social toma para si também a ação naquilo que está
formalmente expresso, normatizado.
Mas objetiva-se pensar também num trabalho social que descubra a arte, que invista
na cultura, na criatividade e potencialidade ao mesmo tempo latente, ao mesmo tempo
oculta que existe nas comunidades mas que não encontra espaço de manifestação.
Esse trabalho deve servir à sede de vocalização das pessoas em relação a
expectativas, anseios, demandas ou simplesmente sentimentos.
Em suas empreitadas, este trabalho social precisa encarregar-se de despertar nos
indivíduos a compreensão daquilo que não precisa ser dito, mas que está implícito,
subentendido no cotidiano das pessoas, dos núcleos familiares ou da comunidade de
onde deve emergir a atitude cívica que os leve para além dos enunciados da lei. É
essa a mediação que se espera do trabalho social na implementação das políticas
públicas, pois o agir no tácito transcende o explícito, se encarrega dele.
Segundo Carvalho (2014, p. 7), “toda política pública que se comprometa com a busca
da equidade e enfrentamento das gritantes desigualdades sociais” deve ter um
trabalho social como mediador capaz de gerar “uma reflexão sobre a gestão social
(grifo da autora) com seus novos arranjos e especificidades próprios à condução da
política pública em sociedades que são cada vez mais complexas” (CARVALHO,
2014). Descomplexificar a sociedade começa por reverter o processo de postergação
do agir no e para o coletivo, extirpando das relações a acomodação de delegar ao
outro a obrigação cívica sem ver-se no compromisso de também ter parte nela.
Assim posto, conjuga-se o trabalho social como um conjunto de atividades
psicopedagógicas e socioeducativas com uma concepção de práxis social como ‘ação
política’ para conhecimento e transformação de uma dada realidade de forma dialética
43
Falta de virtude cívica existente na intenção de “maximizar a vantagem material e imediata da família nuclear”;
supondo “que todos os outros agirão da mesma forma” ( BANFIELD, 1958, p. 85 apud PUTNAM, 2006, p. 102 ). A
questão é abordada no segundo capítulo desta dissertação.
69
e dialógica (QUARESMA, 2012, p. 185) e permanentemente crítica, voltada à
formação de cidadãos virtuosos e de estruturas sólidas de reciprocidade e respeito
mútuo e viabilizador da gestão social, governança e governabilidade.
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76
Capítulo 2
77
UM OLHAR TÉCNICO SOBRE O TRABALHO SOCIAL NOS PROGRAMAS DE
HABITAÇÃO SOCIAL.
MITRE, Maristela Jorge1
ARAÚJO, Wânia Maria de2
RESUMO
Este artigo apresenta os resultados da pesquisa realizada no Mestrado em Gestão
Social, Educação e Desenvolvimento Local do Programa de Pós-Graduação do
Centro Universitário UNA referente ao trabalho social presente nos programas de
habitação de interesse social da Política Nacional de Habitação regido pela Portaria
21/2014 do Ministério das Cidades. Concebido como um conjunto de ações para o
desenvolvimento socioterritorial, o trabalho social objetiva o fomento à participação e
à mobilização social, o apoio à inclusão produtiva, a articulação de políticas, a
manutenção, apropriação e a sustentabilidade dos bens e serviços disponibilizados.
Diante de tão complexas atribuições e a partir dos dados coletados na pesquisa a
presente discussão busca fazer uma abordagem crítica em torno das metodologias
de intervenção adotadas pelos técnicos sociais responsáveis pela execução do
trabalho social para a consecução dos seus objetivos bem como às condições de
realização do trabalho social nos programas de habitação de interesse social. Os
dados oriundos da pesquisa foram distribuídos em 20 categorias de análise para
identificar na prática dos técnicos sociais as dificuldades e deficiências da atuação
profissional e a compreensão acerca das potencialidades do trabalho social, para
proposição de melhorias. O levantamento de dados foi feito por meio de questionários
autoaplicados, contendo questões abertas e fechadas, direcionados aos técnicos de
prefeituras e técnicos credenciados pela Caixa Econômica Federal para prestação de
serviços. Para análise dos fatos foi considerada a ação de sujeitos estruturada de
forma dinâmica e relacional e o contexto social, jurídico, político, econômico e
ambiental que envolve a questão urbana a partir dos princípios da fenomenologia e
da dialética.
Palavras-chave: Metodologias de intervenção, Trabalho Social, Projeto Social
Desenvolvimento Urbano. Habitação de Interesse Social.
78
ABSTRACT
This dissertation presents the results of the research carried out in the Master course
in Social Management, Education and Local Development of the Post-graduation
Program of UNA University Centre, carried out in the context of social work in social
housing interest programs from the National Housing Policy ruled by the 21/2014
Therm of the Cities Ministry. The research looked for answers to the following
questions: To what extent do the intervention methodologies adopted by the social
work professionals allow the materialization of their guidelines, premises, and
objectives? What are the limits and potentialities of social work as an enabler
instrument of the social management? Conceived as a set of actions for the socialterritorial development, the social work aims to promote the participation and social
mobilization, the support to productive inclusion, the articulation of policies, the
maintenance, appropriation and sustainability of the riches and the available services.
Facing so many complex assignments, and from the data collected in the research,
the current discussion aims to provide a critical approach around the intervention
methodologies adopted by the social technicians responsible for the execution of social
work for accomplishing their objectives as well as the conditions for the achievement
of social work in the programs of social housing interest. The data from the research,
which also included literature and documentary review, were distributed in 20 analysis
categories, all of them intending to identify in the practice of the social technicians the
difficulties and the weaknesses in the professional performance, and the
comprehension about the potentialities of social work, for the proposal of
improvements. The data survey was done through self-administered questionnaires,
containing open and close questions, directed to the municipalities technicians, and
authorized technicians by Caixa Econômica Federal, as public bank, for the provision
of services. For the analysis of the facts, it was considered the action of subjects
structured in a dynamic and relational way, and the social, legal, political, economic,
and environmental context which involves the urban issue from the principles of the
phenomenology and dialectics adopting the qualitative paradigm. As a result from the
research, there was the elaboration of a Methodological Guideline to the Social Work
which doesn’t intend to plaster the social doing, mainly because they are the
proponents that arbitrate the methodologies to be used in projects, but support the
professionals in the difficult task of thinking and doing technical projects in dynamic
and complex realities.
Key-words: Intervention Methodologies. Social Work. Social Project. Urban
Development. Social Housing Interest. Social Intervention.
79
2.1
INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo, resultante da pesquisa realizada no Mestrado em Gestão
Social, Educação e Desenvolvimento Local do Programa de Pós-Graduação do
Centro Universitário UNA, é construir uma reflexão em torno da prática dos
profissionais do trabalho social e das metodologias de intervenção adotadas nos
programas de habitação de interesse social. Buscou-se responder essencialmente às
seguintes perguntas: até que ponto as metodologias de intervenção adotadas pelos
profissionais do trabalho social permitem a materialização das diretrizes, premissas e
objetivos prescritos nas normativas dos programas de habitação de interesse social?
Quais os limites e potencialidades do trabalho social como instrumento de mediação
entre as normas, as premissas e a ação? Como os profissionais do trabalho social
conduzem a intervenção social no âmbito dos programas de habitação de interesse
social? Os entes públicos garantem mecanismos de governança para a realização
sistemática do trabalho social?
As atividades que compõem o escopo dos instrumentos de execução do trabalho
social devem contemplar “os temas da mobilização e organização comunitária,
educação sanitária e ambiental e geração de trabalho e renda dispostos no Decreto
7.499, de 16 de Junho de 2011” ( BRASIL, 2014, p.30 ). Nesse sentido, a Portaria
21/2014 que regulamenta o trabalho social estabeleceu quatro eixos distintos de
atuação que devem obrigatoriamente ser observados pelo trabalho social respeitando
as características da intervenção indicadas no diagnóstico. Esses eixos são
respectivamente: i) Mobilização, organização e fortalecimento social: voltado à
autonomia, ao protagonismo social, bem como ao fortalecimento, a constituição e a
formalização de novas representações e novos canais de participação e controle
social;
ii)
Acompanhamento
e
gestão
social
da
intervenção:
voltado
ao
acompanhamento das obras e gestão tempestiva dos problemas construtivos junto às
construtoras, com a participação representativa dos beneficiários; iii)
Educação
ambiental e patrimonial: voltado à percepção crítica e mudanças de atitude em relação
ao meio ambiente, ao patrimônio e à vida saudável; iv) Desenvolvimento
Socioeconômico: visando à inclusão produtiva, econômica e social, de forma a
promover o incremento da renda familiar para um processo de desenvolvimento
socioterritorial de médio e longo prazo ( BRASIL, 2014, p. 30).
80
De acordo com suas diretrizes, o trabalho social deve ter enfoque multidisciplinar e
intersetorial, deve ser realizado em sincronia com a execução das obras viabilizando
a disseminação permanentes de informações “sendo a transparência um elemento
essencial na construção do processo participativo” (BRASIL, 2009, p.4). Além disso,
deve promover a integração das políticas sociais de forma a contribuir para o acesso
aos serviços essenciais como saúde, educação, esporte, lazer, cultura, assistência
social, segurança alimentar, segurança pública, etc.
De acordo com a portaria 21/2014 trabalho social compreende
[...] um conjunto de estratégias, processos e ações, realizado a partir de
estudos diagnósticos integrados e participativos do território, compreendendo
as dimensões social, econômica, produtiva, ambiental e político-institucional
do território e da população beneficiária, além das características da
intervenção, visando promover o exercício da participação e a inserção social
dessas famílias, em articulação com as demais políticas públicas,
contribuindo para a melhoria da sua qualidade de vida e para a
sustentabilidade dos bens, equipamentos e serviços implantados (BRASIL,
2014, p.5).
Assim concebido, o trabalho social parte das premissas de que a participação dos
beneficiários nos processos de planejamento e execução das intervenções e nas
ações do trabalho social promove uma melhor adequação dos seus produtos e
resultados às necessidades e demandas dos grupos envolvidos dando suporte à
sustentabilidade das intervenções. Entende-se que a participação comunitária gera
comprometimento e apropriação para um melhor uso dos bens e serviços
disponibilizados, abre espaço para o exercício dos direitos e deveres para a
consolidação dos princípios da cidadania ativa e do controle social. Nesse sentido, o
trabalho social acabaria por se tornar um viabilizador da gestão social.
Compreendendo quatro marcos temporais distintos (ver tabela 1), o trabalho social
deve começar antes mesmo do início das obras com o processo de seleção da
demanda habitacional e disseminação das informações preliminares sobre, entre
outras coisas, o programa, requisitos de participação e seleção, procedimentos de
destinação das unidades habitacionais e condições contratuais, estendendo-se por
todo o período de obras e pós-obras. Para cada etapa está previsto um instrumento
próprio de planejamento e execução das atividades de acordo com o Capítulo III da
81
portaria. O Projeto de Trabalho Social Preliminar (PTS-P) deve ser apresentado até
quatro meses após o início das obras ou quando estas atingirem o percentual de 15%,
com previsão de execução em doze meses ou até quando as obras atingirem o
percentual de 65%, o que ocorrer primeiro. Ao atingir este percentual de obras
apresenta-se o Projeto de Trabalho Social (PTS), que, elaborado durante a execução
do PTS-P, deverá ter prazo de oito meses antes da assinatura dos contratos com os
beneficiários. E, por último, o Plano de Desenvolvimento Socioterritorial (PDST) que
deve ser apresentado até o final das obras e iniciado logo após a mudança das
famílias para os imóveis, com duração de 12 meses. O PDST tem por objetivo o
desenvolvimento econômico e a integração socioterritorial dos beneficiários. Dada
sua relação com o território, o PDST necessita de articulações intersetoriais, cujos
mecanismos devem ser garantidos explicitamente no PTS ( idem ).
Tabela 1
Marcos temporais e instrumentos de execução do trabalho social
Fases
Marcos
Temporais
Instrumento
de
Planejamento
Atividades
1. Pré-cotratação
2. Pré-obras
3. Obras
4. Pós-obra
Da apresentação e
seleção de propostas
até a assinatura do
instrumento de
repasse/
financiamento.
Da assinatura do
instrumento de
repasse/
financiamento até
o início das obras.
Do início das
obras até a
conclusão/
mudança das
famílias.
Da
conclusão
das obras
ou mudança
das famílias,
pelo período
de 6 a 12
meses.
PTS-P - Projeto Social
Preliminar
PTS – Projeto de
Trabalho Social
PTS ou PDST
(PDST-Plano de
Desenvolvimento
Socioterritorial )
PTS e
PDST
- Execução das
ações do PTS
para essa fase.
- Execução das
ações do PTS.
- Elaboração e
aprovação do
PDST.
- Eventual início
da execução do
PDST.
- Execução
do PTS e
PDST.
- Execução das ações
para a elaboração e
aprovação do PTS.
Fonte: Portaria 21/2014 do Ministério das Cidades
Os questionamentos que deram origem à pesquisa partiram do princípio de que o
trabalho social traz em si um grande potencial de mediar a prescrição da norma que
regulamenta os programas de habitação na concretização de um protagonismo social
82
humanizador das relações e na implementação de ações que resultem no despertar
dos sentidos de pertencer à comunidade, ao bairro, à cidade nas populações
destinatárias dos programas e na consolidação das próprias políticas. Como afirma
Carvalho (2014, p. 17-18)
[...] a política social como ação do Estado tem intencionalidades, diretrizes,
planos, prevendo desenhos para a implementação das metas e resultados a
serem perseguidos. Mas ela depende de processos que a concretizem no
território, produzam adesão e participação dos cidadãos. A essa ação,
chamamos de trabalho social.
Acredita-se que os projetos sociais podem se tornar mais efetivos partir da adequação
das metodologias de intervenção social que, adotadas de maneira criteriosa, permitem
a realização de um trabalho social consistente e desafiador, fazendo cumprir suas
diretrizes normativas de forma menos tutelar, unilateral e assistencialista e menos
instrumental e mais interacional e inovadora. Para isso é preciso desenvolver
competências e habilidades, instituir e adequar as metodologias de execução e
monitoramento
apropriadas,
aprimorar
os
instrumentos
e
mecanismos
de
comunicação, preparar os profissionais para a sua aplicação na busca do
protagonismo social e da autonomia nas comunidades envolvidas e promover o
desenvolvimento institucional dos Entes Públicos para o incremento de sua
capacidade governativa e consequentemente para a efetivação das políticas públicas
e sociais.
De acordo com Maria do Carmo Brant de Carvalho
as novas gerações de trabalhadores sociais encontram-se pouco seguras
para o agir competente na questão social tal qual se apresenta na sociedade
complexa em que vivemos. [...] há uma baixa competência dos trabalhadores
sociais em mover processos que produzam mudanças substantivas,
emancipação, participação [...] (CARVALHO, 2014, p.17).
Como fruto das observações recolhidas ao longo da prática profissional da autora
deste estudo e da percepção crítica acerca da maneira como o trabalho social é visto,
proposto e desenvolvido junto aos empreendimentos de habitação de interesse social,
entende-se que a execução desse trabalho social ainda padece dos seguintes
agravantes que, por sua vez, de alguma forma, encontram-se abordados na literatura
que trata da questão urbana e social:
83
a)
implantação e replicação de empreendimentos padrão, sem inovações, sem
áreas de convívio, sem áreas verdes, em regiões destituídas dos serviços e
equipamentos públicos, distantes dos centros geradores de renda e trabalho,
desfocados das necessidades, expectativas e perfil das famílias beneficiárias;
b)
remanejamento e reassentamento de famílias sem as devidas e necessárias
pactuações prévias sobre os impactos em suas vidas: desconsideração aos seus
vínculos sociais e à prerrogativa do acesso à cidade, imposição da condição de habitar
o não-lugar44;
c)
proposição de projetos e execução das obras à revelia das famílias
beneficiárias, embora esteja prevista normativamente sua participação na concepção
e acompanhamento das obras e da aplicação dos recursos;
d)
embaraço à sustentabilidade das intervenções no pós-obra e à viabilização das
condicionalidades para a gestão social e o desenvolvimento local;
e)
deficiências na oferta e disponibilidade de equipamentos e serviços
enfrentadas pelos beneficiários no pós-ocupação comprometendo os níveis de
satisfação e apropriação por parte das famílias e descumprindo as diretrizes e
premissas do Estatuto das Cidades e planos diretores;
f)
impactos negativos dos empreendimentos habitacionais de interesse social
sobre o entorno, os quais são propostos e construídos sem a devida análise de
viabilidade;
g)
tímida participação dos beneficiários nas atividades e ações e nítido
esvaziamento dessa participação ao longo da execução do projeto e após a entrega
das unidades habitacionais, extinguindo a representatividade do grupo e sua
capacidade de mobilização e comprometendo a legitimidade das demandas;
A partir do conceito de lugar como um “fenômeno da experiência humana” (RELPH, 1979, apud CARLOS, A.F.A;
SOUZA, M.L, de; SPÓSITO, E.B (org), 2012, p. 100). Essas experiências definem o lugar como “histórico,
relacional e identitário”. “Um espaço que não se pode definir de tal modo deve ser encarado então como um não
lugar” (CARLOS, A.F.A; SOUZA, M.L, de; SPÓSITO, E.B (orgs), 2012).
44
84
h)
reaplicação de projetos (social e construtivo) em toda e qualquer realidade,
como matrizes pré-concebidas, sem verificação das especificidades, demandas e
potencialidades de cada uma, sem pactuações prévias, sem participação e sem
construção de conhecimento;
i)
execução de projetos sem registro e “benefícios das Lições Aprendidas” (
PFEIFFER, 2005, p.48 ) e sem a experimentação e consolidação de metodologias que
possam se adequar ao tipo de intervenção que envolve os programas de habitação
de interesse social;
j)
extensão do clientelismo e do patrimonialismo para além dos programas de
transferência de renda a exemplo dos programas de provisão habitacional dificultando
a gestão do déficit habitacional e a sustentabilidade das intervenções;
k)
fragilidade da governança e da governabilidade45;
l)
verticalização e periferização da moradia. Distanciamento das centralidades
dos serviços, equipamentos e polos geradores de renda, sem garantia de constituição
de outras centralidades; descumprimento da função social da propriedade ( Artigos
182 e 183 da Constituição Federal ).
2.2 O trabalho social no contexto dos programas de habitação de interesse
social
O Capítulo III da Portaria 21/2014, cuja aplicação é instruída pela Orientação
Operacional 01/2014, é dedicado exclusivamente ao Programa Minha Casa Minha
Vida implementado com recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR)
45
Governança como modus operandi do Estado (SANTOS, 1997) ou capacidade governativa ( World Bank,
1992:1, apud SANTOS, 1997) e governabilidade como a “capacidade conferida pela sociedade ao Estado para o
exercício do poder, para governar e empreender as transformações necessárias” ( SILVA, 2012, p.17 ). Apreendese a governabilidade, portanto, resultante da gestão social e, como tal, essencial, não só para garantir que se
promova a implantação e a universalização das políticas públicas, mas para que se instaure aptidões de gestão e
avaliação contínua dessas políticas e consolide a participação.
85
destinado a municípios com mais de 50 mil habitantes, que caracterizando-se como
programa de habitação de interesse social funda-se como objeto do presente estudo.
A regulamentação em questão define as atribuições dos agentes envolvidos na
implementação do programa ficando a Caixa Econômica Federal (CAIXA), como
instituição financeira, responsável por prestar assistência técnica aos Entes
Federados, as demais entidades responsáveis por executar o programa e aos
profissionais do trabalho social, com a atribuição de acompanhar e monitorar a
realização do Trabalho Social, assim como verificar a regular aplicação dos recursos
financeiros, condicionando sua liberação ao cumprimento de metas previamente
estabelecidas nos instrumentos de execução do trabalho social ( BRASIL, 2014 ).
A regulamentação em questão imputa ao Ente Público 46 , na implementação do
programa, a responsabilidade de, a partir de convênio específico assinado com o
agente financeiro, elaborar e executar o projeto de trabalho social, definir a forma de
execução do trabalho social, que pode ser com equipe própria ou contratada,
“assegurar, na sua integralidade, a qualidade técnica dos projetos e da execução do
trabalho social”[...], “articular e integrar políticas públicas em todas as fases do
trabalho Social, de forma a promover a multidisciplinaridade, intersetorialidade e a
sustentabilidade das intervenções, fomentando condições para o processo de
desenvolvimento socioterritorial de médio e longo prazos, com a criação de arranjo
institucional que possibilite a articulação de políticas públicas” ( BRASIL, 2014, p. 29).
Cabe-lhe disponibilizar equipe multidisciplinar para o planejamento, execução e
avaliação das ações devendo seus componentes comprovar experiência compatível
com o escopo dos projetos. O coordenador, responsável técnico, dos trabalhos neste
caso deve ser do quadro funcional da prefeitura e deve ter graduação
preferencialmente em Serviço Social ou Sociologia, admitindo-se também graduação
em Pedagogia e Psicologia, e prática profissional em processos participativos. Pode
o Ente Público optar por realizar o trabalho social com equipe contratada, mas isso
não o exime da responsabilidade de designar equipe de coordenação e
acompanhamento dos trabalhos (BRASIL, 2014).
46
No contexto em questão, a administração pública do Distrito Federal, dos estados ou municípios responsáveis
pela assinatura dos convênios para a execução das intervenções e realização do trabalho social
86
As famílias beneficiárias, por sua vez, cuja seleção é regulamentada pela Portaria
595/2013, do MCidades, também assumem responsabilidades específicas definidas
na Portaria 21, entre elas, apropriar-se corretamente dos bens e serviços implantados
pela intervenção, contribuindo para a manutenção e conservação do patrimônio
gerado com investimentos públicos e cumprir as obrigações previstas em contrato,
especialmente quanto à vedação de transferência ou alteração de uso e destinação.
É prevista a participação financeira do beneficiário no Programa Minha Casa Minha
Vida – FAR, uma vez que o programa se constitui na modalidade de alienação com
parcelamento traduzida no financiamento, sem juros, para aquisição da unidade
habitacional com subsídios do governo federal às famílias cuja renda não ultrapasse
R$1600,00.
O Programa Minha Casa Minha Vida, central nesse contexto, amarra-se em
arcabouço legal que lhe assegura, na forma, mecanismos de governança. Há na
regulamentação uma expectativa de transparência no processo de seleção da
demanda depositada na determinação de uma definição conjunta dos critérios locais
de seleção das famílias que devem ser somados aos critérios predefinidos pela
norma. Espera-se uma participação ativa das equipes interdisciplinares na ação de
definir as famílias beneficiárias, dos conselhos municipais e dos movimentos sociais,
que devem ter ¼ dos assentos nos conselhos de habitação. Entretanto, diante do
histórico caráter voluntarista presente na composição desses conselhos, do aspecto
formal de sua composição, da essência patrimonialista que valoriza a cultura do favor,
e do assistencialismo, essa transparência ao final torna-se frágil.
A natureza de reduzir agudizações sem a presunção do direito impõe limites ao
PMCMV na premissa da universalização da política habitacional. A esperada
capacidade governativa dos municípios, a falta de intersetorialidade e interlocução
entre os agentes envolvidos em sua implantação, bem como a falta de
complementaridade das políticas, não permitem materializar muitos dos preceitos do
programa.
87
Grandes empreendimentos, pequenas ilhas de privações. De serviços, equipamentos,
lazer, cultura, espaço, privacidade, convívio, conforto, trabalho. Entre as modalidades
do PMCMV encontra-se a produção de empreendimentos na tipologia de condomínio.
Verticalizar as cidades tornou-se uma diretriz também para os municípios de pequeno
e médio portes sob o argumento de que neles também não existem terras
urbanizadas. Relega-se a grande massa da população despossuída a habitar o
longínquo, distante das centralidades, que segundo Rolnik caracteriza o “urbanismo
de risco” (ROLNIK, 2002, p.2).
Confinar os beneficiários a esse modelo de habitação certamente não se constitui na
melhor opção do ponto de vista da mobilidade urbana, do ponto de vista social,
econômico, cultural. Na perspectiva da preservação do patrimônio, a verticalização da
moradia para baixa renda requer a constituição de fundos de reserva para
manutenções e conservação que não fazem parte dos hábitos das pessoas que
compõem o público alvo. Por sua vez, o entendimento da coletividade sobre o
compartilhamento de espaços coletivos e o viver em condomínios se embasam em
uma outra noção, a da informalidade.
O programa não dá, financia. O beneficiário então não ganha; adquire. Mas a
compreensão dessa questão é mais complexa do que parecer. Deixar entender o
contrário é melhor. Com efeito, sustenta-se o assistencialismo ao invés de dar
sustentação aos cofres públicos para a superação do déficit habitacional no longo
prazo. Mas por outro lado, não se quer entender, pois assim fica mais fácil se
desobrigar com o encargo financeiro decorrente da aquisição. A inadimplência é o
resultado e com ela a depreciação. Deprecia-se a própria vida e perpetua-se a
alienação.
Beneficiar-se de uma unidade habitacional do programa pode representar para muitas
famílias enquadradas no público alvo uma oportunidade, ainda que a moradia não
seja sua necessidade maior, mais imediata ou premente. Preterir outras famílias em
piores condições muitas vezes não tem significado para algumas delas. O
individualismo suplanta o espírito cívico e nesse sentido, beneficiários em certa
proporção, se apropriam de uma colocação na fila de selecionados, favorecidos pela
ausência de mecanismos de controle e da cultura do clientelismo e assistencialismo.
88
Ao ser contemplado, não se apropria do bem. Torna-o mercadoria, objeto de
consumo. Cláusulas contratuais deixam de ter importância. Gestão e controle social
se perdem nessa estrutura. Superação do déficit habitacional também. O civismo que
reclama o direito, deveria também exercer o dever. E como diz Milton Santos
A luta pela cidadania não se esgota na confecção de uma lei ou da
Constituição porque a lei é apenas uma concreção, um momento finito de um
debate filosófico sempre inacabado. Assim como o indivíduo deve estar
sempre vigiando a si mesmo para não se enredar pela alienação circundante,
assim o cidadão, a partir das conquistas obtidas tem de permanecer alerta
para garantir e ampliar sua cidadania (SANTOS, 2001, p. 104).
A sustentabilidade das intervenções tão aclamada pela norma não pode ser vista
como meta, como objetivo, como algo que vem depois, mas como pressuposto, como
algo que já nasce intrínseca, amarrada em uma estrutura de ética, compromisso,
condições institucionais de torná-la pré-requisito e não uma expectativa remota,
perdida num turbilhão de obstáculos a sua materialidade. Cumprir o que está previsto
na lei, é sobretudo premissa, dever, não só do Estado, mas de todas as partes
envolvidas.
É diante desse cenário que o trabalho social se coloca como elemento estruturante
dos programas de provisão habitacional da PNHIS. Recai sobre ele, portanto, uma
grande responsabilidade, ao tempo em que se reveste de grande potencial. A acepção
do termo potencial aqui deve ser literal, no sentido do que ainda se encontra em
estado latente, como faculdade, uma possibilidade que necessita de outras variáveis.
A governança, a governabilidade, o apoio institucional, logístico, operacional, político,
a capacidade técnica, são as variáveis prementes.
A prescrição do trabalho social como parte integrante e obrigatória nos programas de
HIS, no contexto descrito, acaba por encerrar um caráter muito mais mitigador dos
impactos, circunstâncias e agravantes, do que de propriamente intervir nas
potencialidades. Nesse sentido, as expectativas nele depositadas, além de
ultrapassar suas atuais e reais possibilidades, dadas as condições para a sua
realização e o cenário em que se inscreve, desafiam as capacidades e competências
locais constituídas, comprometendo seus resultados, perpetuando os problemas e
estigmatizando o próprio trabalho social que, de forma cíclica, padece da falta de
89
métodos eficazes de gestão e execução. Faltam-lhe inovação e capacidade técnica,
mas faltam-lhe antes, as condições necessárias para que as premissas ainda idílicas
alcancem o exequível e factível.
A opção, portanto, de se fazer uma abordagem em torno do trabalho social no
Desenvolvimento Urbano, especificamente no que diz respeito à HIS, está posta em
virtude das observações pessoais enquanto profissional da área que vem enfrentando
as mais diversas frustrações em torno da ineficácia do trabalho social em se alinhar
correta e satisfatoriamente, na prática, às suas diretrizes ao tempo em que padece de
falta de reconhecimento, valorização e o apoio institucionais de que necessita e
almeja.
A pesquisa então realizada representou uma empreitada no sentido de se buscar
descobrir as dificuldades e dilemas enfrentados pelos técnicos sociais na consecução
dos objetivos do trabalho social nos programas de HIS, despertar para a necessidade
de se criar condições para a sua efetividade, tanto pelo viés da capacitação, quanto
do desenvolvimento da governança e da governabilidade.
Nesse sentido, os questionamentos que recaem sobre a efetividade do trabalho social
em relação ao que lhe é prescrito parte do pressuposto de que não somente a precária
capacidade técnica dos profissionais dificulta a realização de um trabalho social
consistente, mas a frágil governança e governabilidade também compromete sua
realização. Além disso, postula-se que, assim como a gestão social, o exercício
profissional dos técnicos do trabalho social, a governabilidade e a governança
necessitam de um rompimento com a ação clientelista e assistencialista para dar lugar
a uma “interação negociada” que despreze o caráter tecnoburocrático e instrumental
em função da relação direta entre gestão e participação (TENÓRIO, 2004, p.1).
Assim, a pesquisa teve como sujeitos dezoito profissionais do trabalho social, sendo
cinco técnicos sociais dos municípios de Alfenas e Três Pontas, no sul de Minas
Gerais e treze técnicos credenciados pela Caixa Econômica Federal ( CAIXA ) para
prestação de serviços técnicos especializados na área do desenvolvimento urbano
que atuam em Belo Horizonte e região metropolitana e em diversas cidades do Estado
de Minas.
90
2.3 A metodologia da pesquisa
Ao realizar sua investigação, o pesquisador lida com informações amplas, subjetivas
e carregadas de símbolos e significados47 que oferecem uma gama de possibilidades
de análise. O próprio pesquisador, ao embarcar numa pesquisa qualitativa, leva
consigo sentimentos e valores que poderão interferir no processo de pesquisa e
esbarra nos limites paradigmáticos que utiliza para entender seu objeto pesquisado
em razão do que pensa, conhece ou pensa conhecer sobre a realidade (gnose) e da
própria natureza da realidade. Nesse sentido, o ontológico e o morfológico podem
conduzi-lo a uma compreensão ampla e menos profunda daquilo que quer investigar.
Assim, nesse exercício de apreensão da realidade, considerando que os significados
na pesquisa não são apenas social, material e historicamente dados, mas resultantes
de uma interação do pesquisador com seu objeto no contexto de sua pesquisa e das
próprias relações que se estabelecem no território-campo de sua investigação, tornase importante uma a aproximação da dialética com a fenomenologia como paradigma.
Uma buscando o registro do vivido, o sentido histórico daquilo que se quer apreender,
e a outra buscando conhecer sua essência, ouvir os sujeitos, conhecê-los para
interpretá-los. Juntos, esses paradigmas podem ser complementares construindo o
“vir-a-ser” do pesquisador e de seu objeto.
Serpa (2006) em seu estudo sobre o trabalho de campo da geografia, que tem o
território como ponto de intercessão com o presente debate, traz algumas
considerações que respaldam a escolha do diálogo entre os paradigmas em questão
em que
[...] dialética e fenomenologia não se excluem [...]. Enquanto métodos podem
funcionar como estratégias complementares, buscando-se sempre a
construção da síntese sujeito-objeto, própria ao ato de conhecer, ora
utilizando-se da história enquanto categoria de análise, ora buscando-se
intencionalmente abstrair a historicidade dos fenômenos, visando à
explicitação de sua “essência”.
47
Do ponto de vista da abordagem microssociológica do Interacionismo simbólico de George Herbert Mead (1862-1931) e
Charles H. Cooley (1864-1929), que postula que a sociedade é constituída de pessoas que atuam em relação às outras pessoas
e aos objetos em seu ambiente com base nos significados que essas pessoas e objetos têm para aquelas. Esses significados,
por sua vez, surgem da interação que cada pessoa tem com as outras e são estabelecidos e modificados mediante um processo
interpretativo. (...) Do ponto de vista metodológico, (...) como os símbolos e significados são forjados pelos atores, requer-se o
conhecimento da natureza reflexiva dos sujeitos (GIL, A.C, 2008, pg. 23).
91
Trata-se de reconhecer que a própria relação da sociedade com seu espaço é dialética
e assim voltar-se ao território, enxergar as interações e manifestações culturais que
ali se estabelecem e perceber nele a sua própria dinâmica, as desigualdades
existentes, as potencialidades latentes e “elementos aparentemente invisíveis, mas
significativos, que dizem respeito aos valores, sentimentos, perspectivas que rodeiam
as vidas das populações” (KOGA, 2012, p. 56). É o território o lugar dos sujeitos e é
nele que se estabelece a condição de cidadania. Reafirmando tal postulado, Milton
Santos assinala que “é impossível imaginar uma cidadania concreta que prescinda
do componente territorial” (SANTOS, 2001, p.144). E Koga complementa
Esse território que expande sua definição para além dos limites geográficos
alcançando as gamas de relações nas suas formas objetivas e subjetivas, de
vida individual e coletiva, literalmente ganha espaço à medida que se
complexifica e faz a reflexão sobre a comunidade. Em contextos de fortes
desigualdades sociais, de tendências à focalização cada vez mais presentes
nas propostas de políticas sociais, o território representa uma forma de fazer
valer as diferenças sociais, culturais que também deveriam ser consideradas
nos desenhos das políticas públicas locais ( KOGA, 2012, p. 56).
Nesse sentido, o objeto da pesquisa não foi recortado de forma objetiva e racional,
restringindo-se o olhar às condições materiais do que lhe é dado a ver, mas analisado
em um contexto ampliado considerando o lugar “como um fenômeno da experiência
humana” (SERPA, 2012, p.99 ), os vários sujeitos envolvidos e suas relações, a
realidade em que se inserem, com seus conflitos e contradições, e a necessidade do
diálogo não só entre as diversas áreas e disciplinas que envolvem seu objeto, mas
também entre os paradigmas definidos para a análise que consideram os sujeitos e o
território, sua ação e sua história, suas relações e contradições, produções e
reproduções. Ora o sujeito é visto como produto do espaço e de sua história, ora ele
é abstraído de sua história, centrado em seu agir, entre o pensar e o viver em seu
meio presente, constituído.
Os procedimentos de coleta de dados para a presente pesquisa dividiram-se entre
revisão bibliográfica e pesquisa documental em razão da natureza inter e
multidisciplinar que rege o campo de interesse e a amplitude do objeto da pesquisa,
considerando seu caráter institucional e sua relação com um programa do Governo
Federal de abrangência nacional e com amplo arcabouço legal e normativo. As duas
92
formas de pesquisa, documental e bibliográfica, são semelhantes, porém com
algumas distinções notadamente em relação à natureza das fontes.
Pesquisa documental, de acordo com Gil (2008), é aquela por meio da qual o
pesquisador utiliza-se de materiais que ainda não receberam um tratamento analítico,
como arquivos de órgãos públicos e Instituições privadas, regulamentos, ofícios, etc.
Lakatos e Marconi (2003) descrevem essa pesquisa como uma coleta de dados de
documentos, constituindo o que se denomina de fontes primárias. Foram objeto da
pesquisa documental os arquivos e publicações do MCidades, normas e leis entre
elas a Lei 11.124/2005, que dispõe sobre o SNHIS, a Lei 11.977/2009, que dispõe
sobre o Programa Minha Casa Minha vida, o Estatuto da Cidade, Lei 10.257/2001, e
a Portaria 21/2014.
A pesquisa bibliográfica, segundo Gil (2008), abrange o uso de documentos impressos
para determinado público, como livros e artigos científicos. Para a realização da
pesquisa em questão utilizou-se levantamento bibliográfico, por meio de livros, teses,
artigos sobre o tema incluindo o material disponibilizado ao longo do Mestrado em
Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local, além da coleta de informações
relativas ao objeto de estudo em jornais, revistas e pesquisa virtual em periódicos
indexados.
O critério de saturação foi utilizado com a suspensão dos questionários a partir da
percepção de traços de redundância ou repetição nos dados levantados
(FONTANELLA; RICAS.; TURATO, 2008 ); o que é esperado,
pois, apesar do
universo constituir-se de profissionais de diferentes formações na área social, com
diferentes vínculos, que atuam em diferentes municípios e programas, e além da
proposição de projetos seguir determinado roteiro com eixos de atuação e
macroações predefinidos, essa atuação se desenvolve sob o mesmo rigor normativo
e sob as mesmas orientações teórico e técnico-metodológicas advindas do Ministério
das Cidades e da Caixa Econômica Federal, e mesmo da literatura que trata a
questão urbana e suas implicações socioespaciais, econômicas e políticas.
Pelo exposto e como pressuposto, foram utilizados como critérios de exclusão para a
participação na pesquisa os técnicos sociais da prefeitura de Alfenas e Três Pontas
93
que não realizaram trabalho social em empreendimentos habitacionais de interesse
social e os técnicos sociais credenciados48 pela Caixa Econômica Federal que não
estiveram envolvidos em atividades de trabalho social em tais tipos de
empreendimentos.
Para realização da pesquisa empírica foram elaborados dois tipos de questionários
semiestruturados. Um direcionado aos técnicos das prefeituras, que se constitui do
Apêndice I e outro, que se constitui do Apêndice II, foi aplicado junto a treze
credenciados da CAIXA. O primeiro foi aplicado junto a dois técnicos da Prefeitura do
município de Alfenas e Três técnicos da Prefeitura de Três Pontas, ambas no Sul de
Minas Gerais.
Os dados oriundos da pesquisa foram distribuídos em 20 categorias de análise
partindo da formação acadêmica e tempo de experiência dos profissionais, passando
pela relação entre as formações acadêmicas e o preparo dos profissionais para
atuação na área, dificuldades apresentadas na elaboração e execução dos projetos,
metodologias adotas na execução do trabalho social, visão dos profissionais acerca
do trabalho social, indo até sugestões de melhorias. Todas depositadas na intenção
de identificar na prática desses profissionais as metodologias utilizadas nas
intervenções de habitação de interesse social voltadas à participação e ao
desenvolvimento sócio-territorial, as dificuldades e deficiências da atuação
profissional e a compreensão acerca das potencialidades do trabalho social.
2.4 Coleta de dados e categorias de análise
Explicar os fenômenos, dados e informações levantados em pesquisa não é um
princípio ou a primazia do método qualitativo, portanto, cabe ao pesquisador primar
pela compreensão de tudo o que buscar investigar ciente de que todo o conhecimento
gerado a partir de sua investigação não se consagrará tampouco como verdade
absoluta, infalível ou definitiva principalmente “numa ciência, onde o observador é da
48
Profissionais e empresas especializadas em coleta e análise de dados, elaboração e execução de projetos
sociais e planos de intervenção, apoio técnico e consultoria especializada, contratados pela CAIXA ECONÔMICA
FEDERAL por meio de editais específicos regidos pela Lei 8666/93, conforme Edital de Credenciamento nº
1447/2014 - CPL/GILOG/BH da Caixa Econômica Federal.
94
mesma natureza que o objeto, e o observador é, ele próprio, uma parte de sua
observação” (LEVY-STRAUSS, 1975 apud DESLANDES; GOMES; MINAYO, 2012,
p. )49.
Assim, considerando o caráter descritivo da pesquisa e a utilização de método
indutivo, característico da pesquisa qualitativa, a investigação não envolveu uma
coleta de dados voltada à comprovação de teorias, mas adotou procedimentos
interpretativos e exploratórios para desenvolvimento de uma teoria acerca do tema
apresentado. Buscou-se uma compreensão maior dos símbolos e significados que
cercam os erros e acertos, limites e possibilidades do trabalho social no
desenvolvimento urbano. De acordo com Alves-Mazzotti; Gewandsznajder, (1998,
p.170)
Pesquisas qualitativas tipicamente geram um enorme volume de dados que
precisam ser organizados e compreendidos. Isto se faz através de um
processo continuado em que se procura identificar dimensões categorias,
tendências, padrões, relações, desvendando-lhes o significado. Este é um
processo complexo, não linear, que implica um trabalho [...] que se inicia já
na fase exploratória e acompanha toda a investigação. À medida que os
dados vão sendo coletados, o pesquisador vai [...] construindo interpretações
e gerando novas questões e/ou aperfeiçoando as anteriores, o que, por sua
vez, leva a buscar novos dados, complementares ou mais específicos, que
testem suas interpretações [...].
Nesse sentido, todos os dados foram tabulados para sistematização das informações
apuradas cuja análise foi norteada pelos pressupostos e pelo referencial teórico. Os
dados foram organizados em vinte categorias de análise sobre as quais se tecem as
considerações que seguem apresentadas no próximo tópico deste artigo.
2.4.1 CATEGORIA 1: Formação e experiência na área do desenvolvimento
urbano/habitação
Esta categoria teve o propósito de identificar a formação acadêmica e o tempo de
experiência dos profissionais na área de desenvolvimento urbano uma vez que, por
determinação do Ministério das Cidades, os profissionais que atuam como
49
LÉVY-STRAUSS, C. Aula inaugural. In ZALUAR, A ( Org.) Desvendando máscaras sociais. Rio de Janeiro: Francisco Alves,
1975, p. 211-244.
95
responsáveis técnicos nos projetos sociais atrelados ao desenvolvimento urbano
devem ter experiência em processos participativos e graduação em nível superior,
preferencialmente em Serviço Social ou Sociologia, mas também em pedagogia e
psicologia ( BRASIL, 2014 ).
Detectou-se que todos os sujeitos da pesquisa são graduados em uma dessas
formações, sendo um deles ‘educador social’ e a maioria tem alguma especialização
Lato Sensu na área de atuação. Entre os treze credenciados que participaram da
pesquisa, somente seis possuem especialização. Dos dezoito respondentes, somente
quatro, entre os credenciados, indicaram possuir mestrado. No âmbito das prefeituras
a maioria dos profissionais possui entre cinco e dez anos de experiência na área de
habitação e entre os credenciados a maioria está há mais de dez anos prestando
serviços à CAIXA na área de desenvolvimento urbano em âmbito regional.
2.4.2 CATEGORIA 2: Relação entre formação e preparação para atuar na área
Nesta categoria buscou-se identificar a contribuição da formação acadêmica para a
atuação profissional dos técnicos na área objeto da pesquisa, a necessidade de
especialização e a percepção dos técnicos em relação ao que lhes falta para uma
atuação competente.
Entre os cinco profissionais das prefeituras que responderam aos questionários,
quatro consideram que os cursos de graduação e especialização lhes permitiram
compreender a complexidade dos fenômenos sociais, mas que não adquiriram, pela
graduação ou especialização, conhecimentos em gestão urbana e de projetos e
consideram que os conhecimentos relacionados à questão urbana adquiridos na
prática ou nos cursos realizados não os habilitam a elaborar, executar e gerenciar
projetos sociais de habitação de interesse social.
Para oito, dos treze credenciados CAIXA que responderam aos questionários, a
formação e especialização
proporcionaram à maioria a compreensão da
complexidade dos fenômenos sociais e a formação necessária para a elaboração e
execução de projetos sociais na área de desenvolvimento urbano, mas o
96
conhecimento em gestão urbana e gerenciamento dos projetos foi adquirido na
prática.
Todos os profissionais, tanto da prefeitura, quanto os credenciados, por unanimidade,
acreditam que é preciso melhorar sua capacidade técnica, que “lhes falta algo” para
sua atuação profissional. E, nesse sentido, os profissionais não se sentem aptos a
elaborar projetos sociais e relatórios e realizar diagnósticos socioeconômicos e
socioterritoriais. Seis credenciados e quatro técnicos municipais entenderam haver
déficit de conhecimento específico relacionado ao gerenciamento de projetos e
conhecimento acerca de métodos e técnicas de intervenção social/mediação em
projetos de habitação. Dois dos cinco profissionais das prefeituras sentem falta de
conhecimento teórico. Um desses profissionais expressou a necessidade do trabalho
social em habitação romper com os métodos assistencialistas adotados nos
programas de transferência de renda.
Ressalta-se que onze, dos treze credenciados, em sua maioria com mais de 10 anos
de experiência no desenvolvimento urbano, afirmaram que lhes faltam conhecimentos
acerca de métodos e técnicas de intervenção social e mediação específicos para
projetos em habitação. Sete credenciados mencionaram falta de conhecimento
prático e experiência profissional seis mencionaram a falta de conhecimento
específico relacionado a gerenciamento de projetos. Isso pode ser considerado um
elemento que evidencia, portanto, a necessidade de especialização e capacitação dos
técnicos sociais para a realização do trabalho social em habitação de interesse social
ratificando a afirmação de Carvalho ( 2014 ) no sentido de que esses profissionais
sentem-se inseguros para a atuação técnica.
Ao afirmarem que os cursos de graduação não lhes proporcionaram conhecimentos
acerca da questão urbana, que sentem falta de conhecimento teórico, apresentam um
indicativo da necessidade de reforma ou maior enfoque da questão urbana com
melhor orientação para a intervenção social nos currículos de graduação dos cursos
das áreas de formação social e humana. Detectou-se também a partir das respostas
a necessidade de preparação dos técnicos no quesito gerenciamento de projetos.
97
Carvalho, “como professora na universidade em cursos de Serviço Social e, ao mesmo
tempo, como profissional na gestão pública” afirma
Parece que as universidades, em sua missão formativa, nem sempre tem
explicitado e instrumentalizado os jovens profissionais para as urgências
éticas de busca concreta da transformação da qualidade de vida daqueles
para os quais se destinam os programas sociais (CARVALHO, 2014, p. 17).
Os dados da pesquisa aqui apresentados e as colocações de Carvalho nos mostram
quão pertinente se faz nos perguntarmos: como os profissionais do trabalho social
executam os projetos sociais nas intervenções do desenvolvimento urbano que, por
sua natureza, exigem capacidade técnica e operacional para executar as políticas
públicas e “incorporar uma agenda de desenvolvimento do território” (CARVALHO,
2014, p. 21 ). E assim chamar à reflexão os gestores dos programas e políticas
públicas, as universidades, os Entes Federados, agentes financeiros e os próprios
profissionais no sentido de que a capacitação para a realização do trabalho social não
é somente necessária, é urgente para que possamos viabilizar a efetividade das
políticas sociais e a consolidação da cidadania plena e ativa.
Já a superação do clientelismo e do princípio da exceção, que privilegiam o
favorecimento em lugar da universalização do direito e que segmentam o público-alvo
das políticas públicas ( KOGA, 2011 ), cuja necessidade se fez presente tanto na fala
dos
técnicos
das
prefeituras,
quanto
na
dos
credenciados,
depende
fundamentalmente de uma profunda reformulação da cultura institucional no sentido
de torná-la capaz de gerir os processos de tomada de decisão “em nível das partes
em conflito” e não em nível dos elos ( DaMATTA, 1997, p.10750, apud KOGA, 2011, p.
43 ). Koga afirma que
Na cultura institucional presente em organismos governamentais, nãogovernamentais, empresariais, partidários, eclesiais, de movimentos sociais... enfim,
nas formas organizacionais mais diversas, é comum encontrarmos a prevalência do
aspecto relacional sobre o aspecto racional. Trata-se de um enraizamento tão forte
nas relações que chega a naturalizar práticas iníquas, do ponto de vista da cidadania
e dos direitos humanos.
Há que se reforçar, portanto, a governança e governabilidade numa agenda que
defina prioridades, que compartilhe soluções de forma responsável, que reconheça e
50
DaMATTA, Roberto. A casa e a rua. 5.ed. Rio de Janeiro, Rocco, 1997.
98
institua a intersetorialidade como um princípio essencial na condução das políticas
públicas e que instigue e valorize espaços de participação sustentados pela
informação e conhecimento, pela técnica e pela mobilização social.
2.4.3 CATEGORIA 3: Logística e gestão do processo de elaboração e execução
dos projetos
A Categoria 3 centrou-se na análise da capacidade instalada das prefeituras e dos
técnicos credenciados para a implementação do trabalho social. No âmbito das
prefeituras pesquisadas, há assistentes sociais que trabalham na secretaria de
assistência social e no Centro de Referência da Assistência Social (CRAS). Entre eles,
somente um profissional fica com dedicação exclusiva aos projetos e contando com
equipe de apoio. Esse profissional afirma trabalhar de forma interdisciplinar e
intersetorial. Os demais acumulam atribuições da assistência social e do
desenvolvimento urbano “prestando serviços” para o setor de habitação quando é
necessário elaborar e executar projetos sociais.
Os dados referentes a categoria 3 apresentam uma amostra da realidade presente
nos municípios que enfrenta quadros deficitários de técnicos. Estes, por sua vez,
acabam por acumular funções sob pena de se sobrecarregarem de atribuições e
comprometer a qualidade dos serviços prestados à população. Apreende-se, portanto,
um indicativo sobre a necessidade de se investir no desenvolvimento institucional dos
municípios com incremento do quadro funcional e formação de equipes
interdisciplinares para instauração de melhor capacidade governativa para atuar nas
políticas públicas. Mas, sobretudo, é preciso inverter a lógica de que “o social subjaz
à economia” ( KOGA, 2011, p. 19 ) e materializar o princípio de que é nas pessoas
que se encontra o poder de transformação de qualquer realidade e é nelas que se
deve investir.
Quanto aos credenciados, cuja maioria é habilitada para atuar em âmbito regional, na
elaboração e execução de projetos sociais fora do município-sede, identificou-se que
o Responsável Técnico ou permanece com equipe própria no município da
intervenção para elaboração e execução do projeto durante todas as etapas, desde o
99
diagnóstico até o pós-obra/pós-ocupação, ou subcontrata profissionais para a
execução fazendo o acompanhamento da execução à distância e deslocando-se
conforme a necessidade para acompanhamento no local.
Somente quatro, dos treze representantes dos credenciados, permanecem com
equipe própria no município da intervenção durante todas as etapas do projeto.
Portanto, na maioria das vezes, quando as atividades são fora do município sede do
credenciado, ocorre a subcontratação dos serviços nos municípios da intervenção. Tal
logística acaba por demonstrar uma atuação polarizada na qual o responsável técnico
se desdobra para realizar o acompanhamento das ações à distância, denotando
muitas vezes o acompanhamento simultâneo de mais de um projeto em municípios
diferentes. Pode-se inferir, pelas respostas dadas, que os responsáveis técnicos
assinam os relatórios de execução dos projetos sem um acompanhamento
sistemático das ações ou ainda um comprometimento da capacidade de avaliação
periódica e gestão tempestiva de problemas e demandas geradas pela própria
dinâmica dos projetos e consequentemente de sua efetividade; e ainda o
comprometimento da capacidade de se fazer a representação institucional diante dos
órgãos demandantes e de se garantir a intersetorialidade requerida.
2.4.4 CATEGORIA 4: Forma de atuação dos responsáveis técnicos credenciados
na realização de suas atribuições
Nesta categoria buscou-se avaliar a atuação dos responsáveis técnicos na execução
dos projetos sociais visto que muitas vezes assumem a implementação simultânea de
projetos
Como responsáveis técnicos pela elaboração e execução dos projetos sociais, nove,
dos treze credenciados CAIXA se encarregam de acompanhar a execução das ações
fazendo pontos de controle com a equipe quando necessário, oito elaboram e
executam os projetos, sete, mesmo não executando o projeto, vão a campo,
participam de algumas atividades e verificam o cumprimento do escopo e do
cronograma. Há entre os profissionais quatro que elaboram e assinam os projetos
para uma equipe técnica constituída executá-los. Quanto aos relatórios das
atividades, três dos respondentes disseram recebê-los da equipe técnica assinando-
100
os junto com a equipe. Curiosamente dois dos treze profissionais elaboram e assinam
os relatórios das atividades que a equipe realizou.
Essa questão, que não foi abordada com os técnicos das prefeituras, ratifica as
ponderações da questão anterior relacionadas aos relatórios de execução.
2.4.5 CATEGORIA 5: Habilidades e experiência no desenvolvimento de ações
Considerando que na execução de um projeto social está prevista a realização de
ações complementares que passam pelo diagnóstico, avaliação e execução
propriamente dita, buscou-se nesta categoria identificar onde se concentram as
habilidades e experiências dos profissionais.
Verificou-se que entre os técnicos municipais, três sentem-se mais aptos e possuem
maior experiência em ações de mobilização comunitária e em processos participativos
e quatro na seleção dos beneficiários. Dois deles têm maior experiência na em
execução de projetos. Um técnico se sente apto a realizar diagnóstico e um se acha
capaz de executar projetos sociais.
Entre os credenciados que responderam aos questionários, sete se sentem aptos e
possuem maior experiência em executar, acompanhar e avaliar projetos sociais,
realizar atividades de mobilização e organização comunitária. Cinco se disseram
aptos a elaborar projetos, três em gerenciar projetos sociais, cinco em trabalhar na
seleção de beneficiários e elaboração de relatórios. Dos treze credenciados que
participaram da pesquisa, três disseram possuir experiência em todas as atividades
aqui mencionadas.
Os técnicos das prefeituras possuem maior experiência em seleção de beneficiários
e na realização de ações de mobilização e organização comunitária e processos
participativos. Há indicação em menor incidência, de aptidão em execução de projetos
sociais. Apenas um técnico se disse apto a realizar diagnóstico socioeconômico.
A análise dos dados coletados indica a fragmentação do trabalho desempenhado
pelos técnicos, fato que não deveria ocorrer, pois os programas de habitação de
101
interesse social são sociorrelacionais por essência e são implementados em territórios
dotados não só de mazelas, mas de demandas, histórias, relações e potencialidades
(GATTI51, 2004, apud CARVALHO, 2014 ). A execução polarizada e segmentada do
trabalho social dificulta a consolidação da intersetorialidade, interlocução e
simultaneidade que tanto se faz necessária nas intervenções do desenvolvimento
urbano. Como afirma Carvalho (2014, p. 173)
[...] para se avançar na ação é preciso romper com as fronteiras setoriais e
disciplinares; tornou-se necessário um olhar, pensar e agir multidimensionais.
[...]. A realidade está em movimento e se revela numa cadeia de múltiplas
determinações e multicausalidades, de forma que intervir nela supõe agir na
sua totalidade.
Um outro ponto delicado na análise dos dados está no fato de que entre os técnicos
das prefeituras apenas um deles possui experiência em diagnóstico socioeconômico
e territorial sendo o diagnóstico o caminho necessário para romper a barreira entre a
“intuição e a evidência” (PUTNAM, 2006, p. 28 ) na construção das percepções que
balizam as ações de um bom projeto social. Como propor e realizar projetos sociais
em determinado território sem conhecer sua dinâmica, suas relações, demandas,
potencialidades com toda a complexidade que lhe é inerente? Como pensar a
mudança sem conhecer seu ponto de partida? Desenvolver essa capacidade tornase portanto uma necessidade premente notadamente em razão das novas exigências
da Portaria 21/2014.
Carvalho (2014) afirma que
[...] na formação do trabalhador social é absolutamente necessário um
consistente e contínuo aprendizado voltado para a leitura e análise da
conjuntura econômica, social, cultural, política, em seus desdobramentos
reais no movimento de comunidades ou na sociedade em dado momento,
considerando todos os atores sociais envolvidos (CARVALHO, 2014, p. 198).
Não se espera que o profissional do trabalho social esteja preparado para todas as
percepções necessárias à interpretação da realidade, razão da importância da
interdisciplinaridade. Espera-se, ao contrário, que a incompletude seja sempre a
premissa da busca do outro, da complementaridade, em especial no desenvolvimento
urbano onde a intervenção requer mesmo a leitura sob o olhar da sociologia, da
51
GATTI, Bernadete. Avaliação de Projetos Sociais. São Paulo, 2004 (Mimeo.).
102
pedagogia, do serviço, social, da psicologia, da antropologia, da arquitetura,
engenharia, meio ambiente, para a leitura das relações, permeadas de subjetividade,
objetividade, cultura e poder, que produzem e reproduzem os territórios físicos e
usados.
2.4.6 CATEGORIA 6: Preparação técnica para elaborar e executar projetos
A Categoria 6 está centrada num dos pontos nodais desta pesquisa visto que focalizou
a preparação técnica dos profissionais para a elaboração e execução de projetos
sociais partindo do pressuposto de que os projetos são replicados sem inovação e
particularização em relação ao território das intervenções.
Para elaborar e executar projetos, os profissionais pesquisados utilizam-se
principalmente de leis, decretos, portarias e normas do Ministério das Cidades, ou
seja, de um arcabouço legal, bem como de textos, artigos e cartilhas, além de
assistência técnica da CAIXA como fontes de consulta e orientação. Livros didáticos
e técnicos somente um técnico de prefeitura e quatro credenciados utilizam.
Infelizmente, sem surpresa, identificou-se, entre os pesquisados, dois credenciados e
um técnico municipal que costumam replicar o mesmo projeto em intervenções
diferentes mudando apenas alguns itens do escopo. Seis credenciados e um técnico
municipal se valem de projetos elaborados por outros colegas profissionais da área
ou de outras prefeituras.
Na elaboração do escopo dos projetos, doze credenciados afirmam seguir as
instruções e os roteiros predefinidos pelo Ministério das Cidades. Cinco credenciados
buscam reproduzir ou adaptar outros cronogramas de outros projetos já realizados,
uma vez que a estrutura e os eixos de atuação não variam, replicando o que já deu
certo em outras experiências. Cinco dizem construir os projetos em conjunto com as
comunidades que auxiliam na realização do diagnóstico e na proposição de ações
participando ativamente das etapas do trabalho. Quatro profissionais buscam
inspiração na própria comunidade e na realidade onde o projeto será implementado
orientando-se pelo diagnóstico. A opção de resposta “ elabora escopo e cronograma
enxutos, pois os projetos baseiam-se sempre em atividades expositivas que cansam
as pessoas” foi marcada por um credenciado ( Questionário TCC 11).
103
Três dos técnicos das prefeituras disseram normalmente reproduzir ou adaptar
cronogramas de outros projetos já realizados uma vez que a estrutura e os eixos de
atuação não variam replicando, portanto, o que já deu certo em outras experiências,
os mesmos três disseram também seguir as determinações contidas nas normas para
elaboração dos projetos propondo ações informativas dentro dos eixos de ação
previstos ou seguem roteiros predefinidos pelo Ministério das Cidades e por fim um
deles preza a elaboração de escopo e cronogramas curtos e enxutos, pois os projetos
baseiam-se sempre em atividades expositivas que cansam as pessoas.
Todos os profissionais, tanto credenciados, quanto das prefeituras, foram unânimes
em afirmar que, na elaboração e implementação dos projetos sociais, é dada maior
ênfase em conhecer o projeto construtivo, a área de intervenção, seu entorno e o
programa antes de pensar o projeto social atuando de forma interdisciplinar e
intersetorial.
Nas prefeituras, os dados mostram que, na hora de elaborar e executar os projetos
sociais, os técnicos dão ênfase ao cumprimento das funções de controle do tipo
elaboração de relatórios, documentos de registro e sistematização das atividades para
envio à CAIXA e em reportar-se às comunidades apresentado o diagnóstico realizado
informando sobre o plano de ação e o cronograma estabelecido. Um, entre os cinco
técnicos municipais, dá maior ênfase em cumprir as formalidades relativas às
exigências do Ministério das Cidades e da CAIXA. Apenas um entre eles indicou
preocupação em construir um bom diagnóstico, participativo e discutido com a
comunidade envolvida como ponto de partida para a elaboração do projeto.
Os dados trouxeram a informação de que quatro técnicos dos municípios realizam os
diagnósticos a partir de visitas às famílias para levantamento socioeconômico. Três o
fazem por meio
ou por meio do CADÚNICO 52 e outras fontes de informações
existentes na prefeitura e no CRAS/CREAS. Um técnico informou que busca parceria
52
CADÚNICO, ou Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, é um instrumento coordenado
pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à fome (MDS) que identifica e caracteriza as famílias de
baixa renda. Utilizado como base de informação e dados para obtenção de diagnóstico e seleção de beneficiários
nos programas, incluindo o PMCMV ( BRASIL, 2010), o CADÚNICO funciona também como ferramenta de
controle uma vez que nele ficam registrados os nomes dos beneficiários contemplados nos programas
habitacionais do Governo Federal
104
com
essas
unidades
de
atendimento
para
o
preenchimento
de
fichas
socioeconômicas relativas ao diagnóstico necessário à elaboração dos projetos
sociais.
Os dados mostram que a “unidade de intervenção” (CARVALHO, 2014, p. 61) da
assistência social enquanto responsável também pela realização do trabalho social
no âmbito dos programas de provisão habitacional, é a família. Preocupa-se em
identificar as condições de renda, saúde, escolaridade, adição (alcoolismo, drogas,
dependência
química),
de
forma
apartada
do
contexto
socioterritorial,
desconsiderando a interdependência das vulnerabilidades sociais (CARVALHO,
2014). O que resulta desse modelo é a fragilização das capacidades e possibilidades
de vocalização e perpetuação da relação clientelista e patrimonialista presente na
gestão pública, sobre a qual se deve verter investidas de superação e rompimento
definitivo.
Ainda, de acordo com Paugam (2003), é importante estar atento ao peso que deve
ser atribuído às relações que se estabelecem entre as populações destinatárias das
políticas públicas e as instituições de assistência social. O autor reconhece “a
dependência das populações-alvo em relação aos profissionais da ação social e
sobretudo o efeito da estigmatização nascida dessa relação” (PAUGAM, 2003, p. 58)
mas pondera dizendo
Poder-se-ia dizer que os beneficiários dos serviços sociais participam
também, ao menos em parte, na definição de seu status social e na
constituição de sua identidade pessoal, ao aceitarem ou recusarem as
imposições da intervenção pontual ou regular em sua vida privada [...].
Aceitar a designação de “pobre” depende, então, da condição social objetiva
das populações em situação de precariedade econômica e social, de sua
dependência em relação aos serviços assistenciais e, enfim, dos interesses
recíprocos do assistente – que designa – e dos beneficiários – que são
designados” (PAUGAM, 2003, p.59-60 ).
Seguindo com os dados desta pesquisa, Sete credenciados disse dar ênfase também
ao cumprimento das funções de controle do tipo elaborar atas, relatórios, listas de
presença, fotografias de eventos e atividades para encaminhar à CAIXA e cumprir as
formalidades relativas às exigências normativas do Ministério das Cidades e da
CAIXA. Interessante é que entre os credenciados apenas cinco se preocupam em
105
construir um bom diagnóstico, de forma participativa, discutindo-o com a comunidade
envolvida e, a partir dele, desenvolver de forma coletiva o projeto ou que se reportem
às comunidades fazendo devolutivas e informando sobre a intervenção, as ações do
projeto e o cronograma. Cinco credenciados disseram focar em cumprir os prazos
para garantir a liberação dos recursos financeiros e dois afirmaram realizar
diagnósticos gerais privilegiando fontes secundárias.
Dos 13 credenciados, 06 costumam construir coletivamente os diagnósticos a partir
de levantamento socioeconômico e territorial com utilização de metodologias de
intervenção/mediação. Há credenciados que visitam todas as famílias e/ou utilizam
dados do CADÚNICO, do IBGE e/ou de fichas de caracterização socioeconômica
preenchidas em parceria com os CRAS/CREAS. Um credenciado criou um modelo de
questionário com levantamento de “informações sobre saúde, educação, renda e
conhecimentos de benefícios municipais para cada família” que utiliza alterando
questões de acordo com o necessário.
Na análise dos dados fica claro o caráter instrumental dado à execução dos projetos
sociais ao perceber a grande preocupação que se tem com as atividades
tecnocráticas da execução: elaborar relatórios, atas, listas de presença, cumprir
prazos para garantir a liberação dos recursos financeiros. A ação de replicar projetos
em diferentes intervenções adaptando o cronograma demonstra, por sua vez, uma
despreocupação com a questão territorial e com a dimensão sociorrelacional do
trabalho social que tem por objeto a transformação da realidade que por essência é
complexa e dinâmica. Como personalizar, enrijecer e congelar cronogramas que
devem antes passar por um planejamento vivencial, compartilhado, participativo no e
com os sujeitos da área de intervenção?
É comum ouvir dos profissionais do trabalho social que as realidades são diferentes e
por isso os projetos devem ser diferentes. Mas na prática o que se tem são “escopos
matriz” de replicação consecutiva de projetos que não se diversificam e se restringem
a enquadrar os destinatários das ações a beneficiários. Fatos interessantes nesse
sentido já aconteceram e como narrativa pessoal vejo oportunidade em colocar: como
Assistente de Projetos Sociais na área de habitação da CAIXA, já testemunhei
retornarem para mim projetos de uma determinada prefeitura com transcrições de
106
orientação técnica passada formalmente a outra prefeitura e que depois se
multiplicaram em inúmeros outros projetos ao ponto de se legitimarem como
necessárias.
Tem-se ainda a percepção de que o “conhecer a área de intervenção e seu entorno”
antes de pensar o projeto social, mencionado pelos técnicos como ênfase dada em
sua atuação, refere-se à ação de dar vistas ao terreno, identificar os equipamentos
públicos existentes (ou não existentes) no entorno imediato e, junto com os
engenheiros (ou não), conhecer o projeto construtivo da unidade habitacional e de
implantação do empreendimento. Não está evidente que essa seria uma preocupação
em identificar o território, seus atores, seus agentes, suas relações, sua realidade de
déficits e potencialidades, sua produção e reprodução.
2.4.7 CATEGORIA 7: Dificuldades apresentadas para elaboração, execução de
projetos e aplicação do conhecimento e das orientações técnicas normativas
Nesta categoria objetivou-se identificar as dificuldades apresentadas pelos
profissionais na aplicação prática dos conhecimentos e das orientações técnicas na
elaboração e execução dos projetos sociais pressupondo que os técnicos privilegiam
o aspecto formal da execução e o caráter mais expositivo e informacional das ações.
De acordo com os dados levantados nas pesquisas, quatro técnicos das prefeituras
sentem dificuldades na aplicação prática do conhecimento elaborar os projetos
sociais. Para três dos técnicos municipais, essa dificuldade reside principalmente na
definição dos itens de custos dos projetos. De acordo com as respostas, ‘há mais
recursos do que o necessário para os escopos propostos’ (questionário TSP3; TSP4;
TSP5). Para dois técnicos falta conhecimento, experiência e para um deles não há
orientação técnica, e um outro entende faltar apoio logístico, instrucional e institucional
por parte dos demandantes dificulta o trabalho.
Essa falta de apoio logístico, instrucional e institucional é sentida também pelos
técnicos credenciados. Outras dificuldades sentidas por eles residem na definição dos
custos dos projetos ( questionários TCC 9; TCC 11; TCC12; TCC13), na falta de
107
conhecimento e experiência ( questionários TCC5; TCC 9; TCC12;
). Dois dos
credenciados disseram que os roteiros de projetos são confusos e complexos
(questionários TCC1; TCC6); outros dois disseram apenas cumprir as exigências
apostando no aspecto tecnocrático do projeto (executar, registrar as ações com fotos
e listas de presença e elaborar relatórios) ( questionários TCC3; TCC10). Dois
credenciados afirmaram: “é difícil pensar em ações estruturantes para compor o
cronograma no contexto dos projetos, por isso me restrinjo a palestras”
(questionáriosTCC5; TCC10). Para um dos credenciados, “a CAIXA não oferece
treinamento e capacitação para os credenciados, especialmente das normativas e
portaria seria importante nivelar informações com os credenciados” (questionário TCC
4).
Quanto à execução dos projetos sociais foi interessante observar que somente um
dos cinco técnicos das prefeituras sente dificuldades na aplicação do conhecimento e
das orientações técnico-normativas na hora de executar os projetos sociais, mas ao
mesmo tempo todos falam das maiores dificuldades na execução dos projetos e essas
dificuldades variam entre a falta de compromisso das pessoas com a própria cidadania
e interesse pelas questões da coletividade; gerenciamento de prazos e recursos; falta
de colaboração e interesse das comunidades que só comparecem nas primeiras
reuniões. Três técnicos disseram que a falta de mecanismos de promoção da
intersetorialidade e interdisciplinaridade acaba por levá-los a executar os projetos
sozinhos ou com um pequeno apoio de mais alguns funcionários. Um outro técnico
afirmou ser difícil atrair o interesse do público beneficiário ao longo da execução do
projeto, promover processos participativos e mobilização social.
Dos treze credenciados, sete disseram sentir dificuldades na aplicação prática do
conhecimento e das orientações técnicas na hora de executar os projetos sociais.
Sete atribuíram essa dificuldade à falta de compromisso das pessoas com a própria
cidadania e interesse pelas questões coletivas. Sete disseram também ser difícil
gerenciar prazos e recursos. Atrair o interesse do público beneficiário ao longo da
execução, promover processos participativos e mobilização social foram as outras
dificuldades mais apontadas. Mas houve também apontamentos em relação à
dificuldade de interlocução com a equipe de engenharia (questionários TCC1; TCC4;
TCC6;TCC7;TCC10). Falta de colaboração e interesse das comunidades que só
108
comparecem nas primeiras reuniões ( questionáriosTCC8; TCC10) e dificuldades na
adoção de mecanismos de comunicação eficazes que façam chegar as informações
à população beneficiária de forma adequada foram também relatadas. Um
credenciado sente dificuldades na execução de projetos sociais por desconhecer as
metodologias de intervenção e mediação adequadas ao trabalho social vinculado a
programas habitacionais (TCC6).
Antes da PNH havia um consenso de que os recursos destinados ao trabalho social
eram escassos e imputava-se a isso sua condição de não efetividade. Hoje, no
Programa Minha Casa Minha Vida, é destinado o percentual de 1,5% do valor de
aquisição de cada unidade habitacional ao trabalho social e considera-se que ‘há mais
recursos do que o necessário para os escopos propostos’ (questionários TSP3 e TSP
4). Tomando como referência as análises das questões anteriores, apreende-se que
sobra recurso porque faltam projetos consistentes uma vez que na prática, além de
não se prezar a realização de diagnósticos socioterritoriais ampliados, intersetoriais,
interdisciplinares, interinstitucionais, com a participação dos sujeitos e partes
interessadas para balizar as ações e o escopo dos projetos (que certamente seriam
mais ricos), tem-se a replicação de cronogramas que se constituem em sua grande
maioria de atividades expositivas apoiadas basicamente em palestras que submetem
os participantes a condição de ouvintes.
Carvalho (2014 ), citando Gatti 53 (2004) afirma ser “preciso quebrar com a lógica
dominante de processos diretivos de transmissão de informações/conhecimentos que
consideram apenas sua dimensão cognitiva, para recuperar as dimensões
socioafetiva, relacional e cultural envolvidas” (CARVALHO, 2014, p. 178).
Complementando com Gatti (2004),
”os conhecimentos adquirem sentido ou não, são aceitos ou não,
incorporados ou não, em função de complexos processos não apenas
cognitivos, mas socioafetivos-culturais. Essa é uma das razões pelas quais
tantos programas que visam mudanças de práticas, de posturas, mostram-se
inefetivos. Seu centramento apenas nos aspectos cognitivos individuais
esbarra nas representações sociais e na cultura de grupos (GATTI, 2004
apud CARVALHO, 2014).
53
GATTI, Bernadete. Avaliação de projetos sociais. São Paulo, 2004.
109
As dificuldades na elaboração de projetos estruturantes, de aplicar os conhecimentos
nessa empreitada, também se deve ao fato de que o técnico centraliza nele e
exclusivamente nele todo o esforço de pensar os projetos que por essência deve ser
construído coletivamente. Se, além de pensá-los a partir de diagnósticos consistentes,
resultantes de processos participativos, que por si só lhe garantirão imaginação,
criatividade e pertinência, o técnico buscasse a intersetorialidade, compartilhasse com
seus pares e as áreas complementares a tarefa de elaborar os projetos para
determinada intervenção, seguramente poderia abrir-se uma janela na superação das
dificuldades na aplicação prática do conhecimento.
Uma outra imposição ao bom desempenho dos técnicos está relacionada
inevitavelmente ao comprometimento dos governos com os programas e políticas
públicas. Como diz Silva (2012, p. 22)
Sem o envolvimento dos agentes participantes da política [...], o resultado não
sai do papel. Afinal, a política é uma ação intencional, com objetivos a serem
alcançados. [...]. Não adianta estabelecer apenas leis se não existem arranjos
institucionais capazes de implementá-los, executá-los e acompanhá-los.
2.4.8 CATEGORIA 8: Metodologias utilizadas na execução de projetos e alcance
dos objetivos propostos
Nesta categoria a intenção foi identificar a percepção dos profissionais acerca das
metodologias adotadas na realização dos projetos enquanto meio para o alcance dos
objetivos.
Nove dos treze credenciados e dois técnicos municipais acreditam que as
metodologias adotadas nos projetos promovem o desenvolvimento da cidadania e a
articulação de políticas sociais. Dois técnicos municipais e nove credenciados
acreditam também na mobilização comunitária como ação promovida pelas
metodologias do trabalho social. Para sete, dos treze credenciados, de acordo com
essas metodologias, é possível fomentar o diálogo, quatro atribuem a elas a
participação dos beneficiários nos processos de decisão, implantação e manutenção
dos bens e serviços e o controle social. Três credenciados e dois técnicos municipais
110
acreditam que a aplicação de metodologias adequadas pode levar também à
implantação de processos socioeducativos. Um credenciado acredita ser possível
alcançar parcialmente todos os objetivos aqui descritos.
De acordo com Carvalho (2014), “a dimensão metodológica é aquela que alia os
fundamentos teóricos a formas de ação gerando métodos de trabalho, no sentido da
criação de caminhos que dão significação concreta às perspectivas teleológicas”
(CARVALHO, 2014, p.170). Nesse sentido, diante da necessidade de transformação
de uma dada realidade, a escolha da metodologia pressupõe uma aposta que se faz
nas metas e objetivos definidos a partir do conhecimento prévio mínimo que (já) se
tem da realidade, a partir de um projeto de intervenção social.
O que as respostas dos técnicos retratam é o reconhecimento do poder das
metodologias de intervenção social de provocar mudanças, de fazer a mediação entre
o teórico e o concreto, as políticas públicas e as demandas, entre a norma e a prática,
entre o indivíduo e o coletivo, o sujeito, a família e o território e, portanto, de consolidar
as premissas das políticas públicas. O que ocorre entretanto é que a falta do
conhecimento teórico, da prática e experiência dos profissionais do trabalho social, e
a conjuntura estrutural, institucional e logística retratadas na pesquisa, dificultam sua
aplicação.
2.4.9
CATEGORIA
9:
Metodologias
consideradas
mais
adequadas
e
ferramentas/técnicas mais utilizadas
A Categoria 9 indagou aos técnicos sobre as metodologias consideradas mais
adequadas para a intervenção social sob o pressuposto de que os projetos sociais
padecem de inovação social por falta de conhecimento acerca das metodologias de
intervenção social mais apropriadas ao trabalho social em habitação ou de como
aplicá-las.
111
Para Wanderley e Oliveira54 (2004 apud CARVALHO, 2014, p. 170, p. 17), “definir
uma metodologia de intervenção significa exercer a difícil arte de transformar os
pressupostos teóricos escolhidos em diretrizes operacionais, e detalhar processos e
técnicas de abordagem no seio das relações sociais que se pretende alterar”.
É correto afirmar que as metodologias não são prescrições transmutáveis de uma
realidade a outra sem ponderação de sua pertinência ou adequação se o que se
almeja na intervenção em territórios que são dinâmicos, complexos e diferentes entre
si é a efetividade da ação. Portanto, no trabalho social não há a metodologia mais
adequada na estrutura de um projeto, mas a mais adequada no contexto em que esse
projeto se coloca, no nível da ação que se quer imprimir e dos resultados que se quer
alcançar, das transformações que se quer realizar. Ainda assim, com monitoramento
e avaliação constantes, que, mais que desejáveis, são necessárias, a opção feita
estará sujeita à própria dinâmica do processo que pode requerer redirecionamentos
no percurso de sua execução, pois “avançar na intervenção social” requer uma
“proximidade dialética entre teoria e prática. Inovação e compromisso se constroem
nesta cumplicidade reflexão-ação-reflexão” (CARVALHO, 2014, p. 174).
Às perguntas sobre as metodologias consideradas mais adequadas às intervenções
de desenvolvimento urbano voltadas à habitação de interesse social e aos objetivos
dos projetos, os credenciados responderam
Grupo focal, grupo operativo e plantão social (questionário TCC2).
Até então utilizamos as metodologias participativas de pesquisa ação que tem
demonstrado eficácia no alcance dos objetivos propostos ( questionário
TCC3).
Informação, implantação e organização condominial, educação sanitária e
ambiental, ações envolvendo crianças e adolescentes (questionárioTCC8).
Participativas, questões práticas, vividas por beneficiários ( questionário
TCC7).
Metodologias participativas que atuem a partir de questões de prática da
população (questionário TCC6).
Junto aos beneficiários levantar suas reais necessidades e organizar a
estruturação do TTS (Trabalho Técnico Social) de acordo com os
apontamentos feitos por eles, buscando a partir disso intervir nessas
54
WANDERLEY, M.B; OLIVEIRA, I.C ( Org.). Trabalho com famílias: metodologia e monitoramento.
São Paulo: IEE-PUC-SP, 2004.v.1.
112
necessidades, criando uma organização comunitária entre estes beneficiários
(questionário TCC1 )
Metodologias participativas, encontros que promovam a participação das
pessoas e a discussão dos sentidos das intervenções, metodologias que os
próprios moradores possam propor (questionário TCC4)
Participativa, onde os beneficiários durante o desenvolvimento do projeto
possam discutir, refletir e dar sugestões de interesse do grupo e da
comunidade.
Iniciar as intervenções antes mesmo das famílias adquirirem o imóvel para
conscientização dos seus direitos e deveres.
No plano ideal, a participativa é sempre mais adequada. Contudo não se
viabiliza muitas vezes, especialmente em grandes grupos. Com pequenos
grupos, ou aqueles beneficiários que apresentam maior disposição em “estar
junto”, aplicamos o método ZOPP (uso de tarjetas). Entendo que como o
diagnóstico, o planejamento – a atividade em si – vai acontecendo “na hora”,
ao vivo, isso atrai a atenção dos participantes/beneficiários (questionário
TCC10 ).
Metodologias participativas como pesquisa-ação, fenomenologia, grupo
operativo, pesquisa participante (questionário TCC9).
Informação, conscientização ( TCC5 )
Para técnicos das prefeituras as metodologias mais condizentes com as intervenções
em habitação seriam:
Metodologias participativas que realmente incluam a população atendida no
processo como um todo, fazendo com esta assuma de fato seu papel dentro
do programa ou projeto; reuniões e encontros para esclarecimentos e
repasse de informações ( atividades informativas ). Mobilização de grupo
através de propostas contextualizadas na sua realidade (questionário TSP2).
As de mobilização comunitária, cidadania. Onde tem um grande agente
transformador, onde o beneficiário começa a ter sua autonomia (questionário
TSP1)
Participativa onde os beneficiários durante o desenvolvimento do projeto
possam: discutir, refletir e dar sugestões de interesse do grupo e da
comunidade (questionário TSP 3 )
As atividades estratégicas de acordo com o perfil do grupo, clareza quanto as
informações que serão repassadas aos mesmos (questionário TSP4)
Metodologia participativa, uma vez que proporciona um maior interesse da
população; através de pesquisa de campo ( questionário TSP5)
Um diagnóstico para levantamento de demandas. Desta forma fico
conhecendo a realidade de cada família encaminhando quando necessário e
mediando da melhor forma com a realidade da população beneficiada (
questionário TSP4)
113
Considero a pesquisa de campo uma das metodologias de extrema
importância para a transformação de um contexto social ( TSP3)
Planejamento estratégico para as ações (questionário TSP4)
Na pergunta sobre as ferramentas e técnicas utilizadas, os técnicos das prefeituras
disseram adotar formulários, reuniões, “explicações visuais e depois um espaço para
eles falarem, expor suas dúvidas e sugestões, reclamações” (questionário TSP1),
grupos de discussão, gráficos, pesquisa, parcerias, encaminhamentos, relatórios,
entrevistas, dinâmicas de grupo, palestras, campanhas, cartilhas, panfletos
(questionários TSP3, TSP4, TSP5), “formulários socioeconômico; relatórios,
questionários de avaliação, reuniões, assembleias, visitas domiciliares, entrevistas,
dinâmicas de grupo, palestras, campanhas, cartilhas [...] ” ( questionário TSP2)
Os credenciados adotam como ferramentas: grupo focal, grupo operativo e plantão
social, diagnóstico e pesquisa de campo, entrevistas, avaliação constante, discussão
mensal do planejamento, Diagnóstico Rápido Urbano Participativo (DRUP55), mapa
falado, formação de grupos, reuniões de planejamento e avaliação, dinâmicas, visitas,
mapas interativos, fotografias para construção de diagnóstico de trabalho em grupo,
produção coletiva de eventos, grupos de discussões, gráficos, “o projeto desenvolvido
e aprovado pela Caixa Econômica Federal” ( questionário TCC13), exposições
dialogadas ,
Ferramentas e técnicas que busquem a integração/interação
[...] a
valorização do indivíduo [...]. É importante ratificar o quão importante eles são
para o projeto, para suas famílias, para a vida do bairro, do condomínio.
Tenho percebido que o componente motivacional tem que estar inserido em
qualquer abordagem: rodas de conversas, reuniões informativas, oficinas.
Como hoje a participação/a adesão é frágil, tenho refletido bastante e
buscado estudar as técnicas ou melhor a prática de utilizar a “mistica” dos
antigos movimentos de base – e tentar introduzi-la nas ações do social. Uma
vez que participar é “caro” para o indivíduo, no sentido de ser custoso, tem
que fazer escolhas entre programas de TV, internet, o próprio descanso. E o
retorno, a contrapartida do indivíduo não é imediata e também não se tem
garantias. Então promover um espaço/momento agradável, gostoso de se
estar é tão importante. Acolher bem é importante (questionário TCC10).
55
Diagnóstico Rápido Urbano Participativo
114
E sobre as metodologias consideradas pelos credenciados como mais adequadas aos
objetivos dos projetos sociais em programas de habitação, o quadro mostra as
respostas
Quadro 1
Categoria 9
Você conhece as metodologias de intervenção/mediação mais adequadas aos objetivos
dos projetos sociais e premissas dos programas voltados à habitação?
A mais adequada é difícil dizer, pois depende da realidade/demanda da população. É importante
sempre, informação constante, incentivo a grupalização, capacitação das equipes e trabalhos
educativos ( questionário TCC8)
Durante nosso período de atuação temos desenvolvido metodologias próprias (TCC7)
A experiência de longos anos de atuação na área social nos possibilita a adequação de várias
metodologias participativas, a realidade e necessita do trabalho. O enfoque dado por nós ao
trabalho social está relacionado aos seguintes apelos: a) informação sistemática todos os
moradores e aos grupos, b) a grupalização, incentivando, apoiando e constituindo grupos que
além de se tornarem elementos de apoio e mobilizadores da comunidade, se constituirão em
mediadores entre comunidade e outros agentes, em especial públicos: a qualificação e
capacitação desses grupos para o exercício de suas funções; a formação da comunidade e dos
grupos, trabalho essencialmente educativo; ação sistemática junto a comunidade (imersão
nesta), processo avaliativo permanente (questionário TCC6)
Os eixos de intervenção indicados como educação patrimonial, saúde, educação, entre outros
são importantes porém o mais importante é atender as famílias, dentro da realidade local, ex:
trabalhar transporte em uma cidade com mais de 100 mil habitantes é importante, já em uma
cidade de 10 mil seria necessário ( questionário TCC1)
Metodologia de participação com a formação de grupos de interesse de acordo com as
demandas e proposições do público beneficiário ( TCC4 )
Os projetos elaborados e executados pelo município foram embasados no Caderno de
Orientações Técnico Social - COTS56; Portaria 21 e demais orientações sobre MCMV ( TCC11)
O caderno de orientações para o trabalho técnico (TCC13)
Entendo que a melhor metodologia é aquela mais hibrida e porosa, no sentido de ser possível
de ser reformada em qualquer etapa ( questionário TCC TCC10)
pesquisa-ação, diagnóstico participativo, fenomenologia ( questionário TCC 9)
Fonte: Apendice II, questão 34
Percebe-se nas respostas dos profissionais certa falta de discernimento entre
paradigma, metodologia, ferramenta, técnica, ação e atividade. A perspectiva da
grupalização, da mobilização social e da mediação das comunidades com os agentes
públicos citada pelos técnicos representa uma aproximação com os objetivos do
trabalho social, mas pela frequência com que entendem que a melhor metodologia é
a ‘participativa’, apreende-se um entendimento de que é comum a incorporação da
56
Com a publicação da Portaria 21/2014, a CAIXA suspendeu a utilização do COTS. Para os credenciados,
entretanto, a CAIXA disponibiliza o COT-“Caderno de Orientações Técnicas para Empresas Credenciadas do
Trabalho Social”, o qual não apareceu citado nas entrevistas pelos profissionais.
115
participação como princípio e fim do método sem ser possível reconhecer nas
manifestações, o reconhecimento das formas de se viabilizar essa participação, o
seja, quais metodologias adotam para tal, nem de que participação estão falando. As
respostas a essa questão, que é central na pesquisa, ratifica mais uma vez as
colocações de Carvalho (2014 ) acerca da “baixa competência dos trabalhadores
sociais em mover processos que produzam mudanças substantivas, emancipação,
participação, autorias, qualidade de vida duradoura e inclusão social” (CARVALHO,
2014, p.17). E, nesse sentido, é tácita e explícita a necessidade urgente de
investimento na formação técnica dos profissionais do trabalho social, mas de,
sobretudo, esses profissionais tomarem contato com essa realidade que se lhes
apresenta para começarem a enxergar nela a possibilidade de emergirem nas
múltiplas possibilidades de transformação social existentes no trabalho social e
buscarem sua própria formação para o exercício profissional.
2.4.10 CATEGORIA 10: Mecanismos de comunicação utilizados na execução de
projetos e identificação de possíveis ruídos nessa comunicação
Enquadrou-se na categoria 10 os mecanismos e o processo de comunicação no
trabalho social. Considera-se essa uma questão importante na análise da efetividade
do trabalho uma vez que a comunicação aqui está relacionada ao caráter dialógico do
trabalho social e pressupõe mais do que informar.
Em relação aos mecanismos de comunicação na execução de projetos sociais, nove
credenciados e quatro técnicos das prefeituras disseram utilizar o celular. Sete
credenciados utilizam também faixas e cartazes em pontos estratégicos da área de
intervenção e entorno; cartas e bilhetes também são empregados. Nas prefeituras, os
técnicos utilizam-se também do envio de cartas e bilhetes às famílias, além de
panfletos e flyers, carros de som e faixas. Um credenciado e um técnico de prefeitura
utilizam a internet como instrumento de comunicação. Alguns credenciados fazem
“contatos individuais entregando convites ou outro instrumento, jornal, mural, jornal
institucional, folder, boletim informativo” ( questionário TCC6), e usam ainda os cultos,
missas e eventos locais para as comunicações necessárias e jornais e boletins
informativos locais. Um credenciado informou que
116
na primeira entrevista cada beneficiário recebe um cronograma de todo o
projeto, com datas e horários e todo mês na reunião recebem por escrito e
assinam a ata de possível alteração ou nova reunião. Quando necessário ligo
de casa em casa mantendo assiduidade dos beneficiários (Questionário
TCC1).
Todos os técnicos das prefeituras disseram verificar se as informações estão
chegando às pessoas de forma adequada e tempestiva verificando e cuidando dos
possíveis ruídos de comunicação fazendo-o por meio de reuniões e visitas
domiciliares. Entre os credenciados, dez verificam das seguintes formas: “em todos
os encontros é verificado como as informações estão niveladas. E são ajustados os
possíveis ruídos” (questionário TCC2); “fazendo uma visita
e conversando” (
questionário TCC8); “nas reuniões ou atividades, contatando as pessoas e
reproduzindo as informações” (questionário tcc6); com “pesquisa” (questionário
TCC7); “via telefone e visita domiciliar” (questionário TCC11); “através de reuniões
comunitárias e ligações” (questionário TCC13); “contato com lideranças locais que
servem de termômetro metodológico” (TCC3); “programação de carro de som ao
meio-dia e a tardinha/noite. Entrega de convite porta a porta com coleta de assinatura,
confirmando o recebimento. Perguntamos no plantão social57 e na atividade como e
quando ficou sabendo da atividade” (questionário TCC10)
De acordo com Carvalho (2014, p. 177), “a natureza sociorrelacional do trabalho social
exige relações de proximidade e supõe mover ações em duas dimensões-chave de
fundamental importância: a arte da comunicação e a arte da articulação”. E
complementa
Comunicação e articulação têm como perspectiva construir participação,
mobilizar vontades e implementar pactos de complementaridade entre atores
sociais, organizações, projetos e serviços. Movem processos e atividade em
coautoria com os próprios implicados na ação. É preciso que os diversos
sujeitos envolvidos queiram, valorizem e reconheçam como factíveis as
ações desenvolvidas e as metas traçadas.
Dessa forma, a produção de metodologias de trabalho social não pode ser
mais pautada numa racionalidade apenas instrumental (CARVALHO, 2014,
p. 179 ).
57
“Estrutura(s) de escritório/plantão social, constituída(s) por, no mínimo, uma estrutura fixa na área da
intervenção, dotada de recursos humanos e equipamentos, eventualmente complementada por outro imóvel
dependendo do tamanho da área, que deverão ser mantidas ao longo de toda a intervenção para o atendimento
da população, onde serão disponibilizadas todas as informações necessárias, funcionando também como base
logística para o Trabalho Social e para funcionamento do mecanismo para prevenção e mediação de eventuais
conflitos” ( BRASIL, 2014, p, 17-18).
117
Nesse sentido, é importante que o trabalho social se desvista do caráter instrumental
do qual se vale para construir uma performance mais interacional, da articulação, em
que os próprios destinatários das políticas sejam reconhecidos como atores. Utilizar
essa premissa para a construção de redes de relacionamentos no território, trazer
para dentro dos projetos as tecnologias que hoje já se encontram ao alcance de parte
significativa dos seus usuários é premissa básica da comunicação minimamente
diretiva. Mas a comunicação de que se fala no trabalho social não é apenas a
informacional ou de construção de agendas, mas aquela relacionada às leituras e
tradução da realidade, construção de pactos, participação, inserção e para essa
comunicação, são necessárias as metodologias de intervenção adequadas ao
processo dialógico que se quer construir. Não se detectou essa compreensão nas
colocações dos participantes da pesquisa, conforme se descreve a seguir na categoria
11.
2.4.11 CATEGORIA 11: Ações para motivar e envolver o público beneficiário nas
ações
Nesta categoria encontra-se um dos pontos altos da pesquisa e que está relacionada
às formas de promover os processos participativos, de angariar o interesse, a
motivação para a participação visto que na execução dos projetos sociais é comum
uma maciça “presença” no início das atividades e um esvaziamento ao longo da
intervenção. O que se quer detectar é se os técnicos têm essa percepção em relação
ao que é promover essa participação ativa, de sujeitos, e o que é viabilizar a presença
nas atividades.
As formas de buscar a motivação e o envolvimento do público alvo nas atividades do
trabalho social não variaram muito entre os credenciados e os técnicos dos
municípios. Em três das respostas dadas pelos técnicos das prefeituras à questão
percebe-se que o argumento da importância da participação é utilizado no processo
de sensibilização do público alvo. Os técnicos informam a necessidade da
participação “avisando com antecedência por bilhetes, visitas e convites entregues em
casa” ( questionário TSP1), dizem ser uma “exigência da CAIXA” ( questionário TSP4)
118
; apresentam “os objetivos e as melhorias que os projetos e programas trarão no grupo
beneficiado e mostrando aos beneficiários possibilidades de crescimento pessoal e
até profissional através das ações do TTS” (questionário TSP2). Foram dadas duas
possibilidades de resposta à essa pergunta: anunciando que haverá lanche ou
informando que haverá distribuição ou sorteio de brindes. Apenas um técnico de
prefeitura e um credenciado informaram utilizar a distribuição ou sorteio de brindes
como elemento de incentivo e um credenciado diz utilizar o lanche em todas as
atividades como fator de motivação.
A prática não variou muito entre os credenciados. Afirmando a necessidade de
mobilizar constantemente esses técnicos também focam no argumento de que o
trabalho social é exigência da CAIXA e da importância da participação apropriandose também de visitas, convites individuais, flyers, ‘reuniões dinâmicas, com
informações claras e transparentes’. Encontrou-se entre eles as seguintes respostas
“Na primeira entrevista com a família, explico a importância do ‘TTS’
(Trabalho Técnico Social) e convoco a responsabilidade deles em frequentar
as reuniões, cada um assina uma declaração dizendo da importância do TTS
e firmando o compromisso de estar presente em todas elas e quando
necessário faltar, enviar um representante” ( questionário TCC1)
“O lanche e o brinde são práticas que a empresa que trabalho sempre
combateu, no sentido de servirem de isca para as atividades. Atualmente
temos lançado mão dos brindes. Contudo quando a indiferença da população
é significativa, nem mesmo o brinde é suficiente para atrair. [...] fizemos uma
confraternização junina. Foi anunciado o bingo com distribuição de cartelas
gratuitas e que um dos prêmios era um forno microondas. E mesmo assim
nem 20 pessoas compareceram ao bingo” (questionário, TCC10)
“Escolhendo horários alternativos, como noturno e finais de semana,
escolhendo técnicas adequadas de acordo com o tema, visitas e ou contatos
mais diretos com a população, escolha de locais apropriados/próximos para
a realização das atividades” (questionário TCC 9)
Nas atividades do trabalho social cabe a participação consultiva e deliberativa, mas
cabe também aquela participação conduzida pela “intencionalidade pedagógica” de
aproximação dos sujeitos, de construção dos espaços de vivência, de valorização e
resgate de saberes, “de organização espacial das relações entre as pessoas da
cidade, voltando o olhar para os suportes espaciais dos intercâmbios e atividades de
troca (econômicos e/ou sociais)” (DUARTE; VILLANOVA, 2013, p. 7). Para isso é
preciso convocar vontades e “[...] apoiar o indivíduo, o grupo no ato de conhecer e no
119
agir, com ênfase nas capacidades de ligar e religar fatos e significados, realizar
mediações, expressar, argumentar, pesquisar, construir nexos de compreensão do
mundo e dele(s) no próprio mundo” (CARVALHO, 2014, p. 208).
Essa participação que se espera no trabalho social não se concretiza em reuniões ou
em assembleias de comunicação unidiretiva, onde se expõe um tema e depois se abre
(ou não) um debate onde ninguém se manifesta, ou, ao se manifestar finda-se ali a
exposição do tema sem valorizar os desdobramentos necessários. Nem tampouco se
tratada como imposição ou exigência de terceiros. Nesses formatos ela poderá ser
avaliada quantitativamente, mas não qualitativamente. Apenas dizer que é importante
participar não provoca a ação. É como dizer que preciso cuidar da casa, dos espaços
e equipamentos coletivos, da saúde, que é preciso ser cidadão. O dizer não induz à
ação. Se não houver um estímulo, uma motivação que ‘venha de dentro’ para que os
indivíduos e a coletividade tragam os seus conhecimentos, experiências, a sua
vivência e a sua contribuição ao processo, dificilmente o argumento da exigência ou
da importância de participar os retirará da inércia.
É importante ressaltar que responsabilidade pelo estímulo à participação e pela
qualidade técnica da execução do trabalho social não recai apenas sobre os técnicos,
mas deve ser compartilhada, pois está amarrada a uma “estrutura cívica e cidadã”
(SOUZA58, 2001, apud MILANI, 2008, P. 557) ainda incipiente. Portanto, desenvolver
espírito cívico é meio e fim precípuo para a participação ativa, premissa da
participação espontânea, da gestão social e do poder local. Nesse sentido, planejar a
participação requer que se pense nela não em termos percentuais, computando o
número de presentes nos eventos e atividades realizadas, mas que se valorize o
processo participativo, com toda a sua riqueza e poder.
58
SOUZA, Celina. A nova gestão pública. In: Gestão pública: desafios e perspectivas. Salvador: Fundação Luís
Eduardo Magalhães, 2001. p. 38-62., 2001.
120
2.4.12 CATEGORIA 12: Ferramentas utilizadas para interpretar os problemas
mais relevantes do diagnóstico
Um bom diagnóstico é o ponto de partida para um bom projeto de intervenção social.
E esse diagnóstico não pode e não deve se restringir ao caráter socioeconômico das
famílias, mas estender-se ao território da ação. Nesse sentido, esta categoria também,
aliadas às demais, constitui-se numa oportunidade essencial para analisar o
significado do diagnóstico para os técnicos e identificar o modo como o realizam já
pressupondo a ênfase que é dada ao núcleo familiar como objeto dos levantamentos.
Perguntados sobre as ferramentas que utilizam para estabelecer a relação causa e
efeito entre os problemas mais relevantes do diagnóstico os técnicos das prefeituras
e os credenciados, em sua maioria, demonstraram não valorizarem (ou não
reconhecerem) essas percepções. Vejamos: Cinco credenciados deixaram a questão
em branco, nem responderam. Um afirmou que não utiliza ( questionário TCC7). Os
técnicos
municipais
encaminhamentos
mencionaram:
quando
necessário,
“um
questionário
reuniões
com
com
temas
tabulação,
identificados”
(questionário TSP1); “coleta de dados e construção de gráficos” (questionário TSP3);
“aplicação de questionários para a coleta de dados” (questionário TSP5);
Dois
técnicos municipais disseram
Visitas domiciliares para discussão de questões gerais e também
particulares, assembleias para discussão, avaliação e votação de conteúdos
do projeto. Inscrição de beneficiário nos trabalhos e delegação de atribuições
de apoio ao TS59 entre outros (questionário TSP2).
Como às (sic) do Residencial são referenciadas ao CRAS ( Centro de
Referência de Assistência Social ) muitos dos problemas apresentados são
encaminhados aos órgãos competentes para providências.
Nas análises os pressupostos se confirmaram. Entre os profissionais das prefeituras,
a centralidade das intervenções está na família. Não são consideradas as variáveis
socioterritoriais, as dificuldades, problemas e desajustes advindos das relações que
se estabelecem no território das intervenções.
Consequentemente não são
reconhecidas as ferramentas de intervenção social aplicáveis a diagnósticos
socioterritoriais.
59
Técnico Social ou Trabalho Social. Não é possível identificar o emprego que o técnico quis dar à sigla.
121
Entre os credenciados elencam-se as seguintes respostas: “a ferramenta comumente
utilizada são os relatórios de pesquisa, gráficos dos diagnósticos” (questionário
TCC3); “avaliação com os beneficiários” (questionário TCC1); “coleta de dados e
planejamento de ações com alternativas para solucionar e/ou minimizar os
apontamentos” (questionário TCC11); “parcerias e encaminhamentos para resolução
dos problemas apresentados” (questionário TCC13). Houve credenciado que
informou não utilizar ferramentas de interpretação dos problemas mais relevantes.
Outras três respostas foram
“Dinâmicas de construção de mapas interativos para identificação de pontos
fracos, potencialidades e proposições. Reuniões por blocos de apartamentos,
diagnóstico fotográfico dos problemas e potencialidades dos próprios
moradores” (questionário TCC4)
.
“Entrevistas em profundidade com pessoas ‘chave’ do território, seja
beneficiários e/ou órgãos prestadores de serviços” (questionário TCC10);
.
“Técnicas do PES – Planejamento estratégico situacional” (questionário TCC
9)
Entre as respostas observou-se relevantes as percepções acerca do PES –
Planejamento Estratégico Situacional e mapas
interativos 60 como ferramenta de
análise de situações problemáticas adaptável ao contexto do trabalho social na
habitação social. Entretanto, a centralidade nos beneficiários ainda se manifesta forte.
De acordo com Reg e Filho ( 2002, p.164 )
O PES apresenta três características principais. A primeira é o subjetivismo,
que tem por objetivo identificar e analisar uma situação problemática, centrase nos indivíduos envolvidos (atores), em suas percepções e pontos de vista,
pressupondo, portanto, que se cada indivíduo tem suas próprias
características, sua interpretação de determinada situação vai depender de
seus conhecimentos, experiências, crenças, posição no jogo social etc
(RIEG; FILHO, 2002, p. 164 )
Dos profissionais do trabalho social espera-se certa capacidade de análise e
compreensão da realidade, e de também agir sobre essa realidade numa busca
conjunta da mudança que se quer imprimir sobre ela unindo a técnica aos
60
Embora não se tenham definido do uso de tais ferramentas.
122
conhecimentos tácitos, implicando todos os envolvidos nas análises da realidade que
se quer mudar. A matéria de sua ação, as relações sociais, seus frutos e
desdobramentos, as vulnerabilidades, deficiências e potencialidades, esta se
consolida no território e sobre esse território não se pode contentar com uma visão
genérica e pessoal. Como afirma Koga (2014, p. 26)
É preciso um exercício de revisita à história, ao cotidiano, ao universo cultural
da população que vive nesse território, se o considerarmos para além do
espaço físico, isto é, com toda gama de relações estabelecidas entre seus
moradores, que de fato o constroem e reconstroem.
E nesse sentido a perspectiva multidimensional, interdisciplinar e intersetorial deve
nortear essa ação sobre o território de forma a romper com a percepção fragmentada
da realidade. Na prática do diagnóstico, por exemplo, o olhar compartilhado, buscando
o destinatário das políticas públicas para além de sua capacidade expectante,
“permitiria inventar novos tipos de relação entre os diferentes atores que intervêm num
projeto urbano” (VILLANOVA, 2013, p.224). Essa mesma autora diz
O compartilhamento do diagnóstico leva à tomada de consciência de pontos
de vista e de usos em uma apreensão comum e diferenciada do espaço
perceptível. Ela solicita a responsabilidade de cada um em reavaliar seu
comportamento e suas preferências. Assim, adquire-se uma cultura da
concertation, que permite a reapropriação do espaço com que o habitante se
identifica, invertendo a prescrição de identidades verificadas nas relações
assimétricas entre governantes e governados (VILLANOVA, 2013, p. 224).
São muitos e múltiplos os modos, meios e mecanismos de leitura e compreensão da
realidade que, consequentemente sustentam os procedimentos de realização de
diagnósticos, cada um com suas incompletudes e complementaridades. Na
“sociologia cartográfica ou cartografia simbólica” (SANTOS 61 , 200, apud KOGA,
2011), pela qual se lê o território como um “sujeito em ação” (KOGA, 2011, p.21 ),
tudo o que se vê, implícito nos conceitos que representam a realidade, é
imprescindível à compreensão das relações sociais. E nesse sentido Koga lembra o
que disse Milton Santos: “o homem não vê o universo a partir do universo” mas “desde
um lugar” (KOGA, 2011, p. 26).
61
SANTOS, B.S de. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. São Paulo:
Cortez, 2000.
123
Indo um pouco mais além, é ainda possível se trabalhar com “experiências sensoriais
da cidade” (DUARTE; VILLANOVA, 2013, p. 9) no âmbito da “microescala, como a
antropologia sempre pensou” ( DUARTE; VILLANOVA, 2013, p. 9). Para as autoras,
“os instrumentos de observação da cidade e de seus usos” deve “levar em
consideração o discurso do morador para o conhecimento do universo urbano”, para
“apreensão da dimensão vivida do espaço, seja ela individual ou coletiva; a dimensão
dos sentimentos, das sensações, das representações e das significações dos locais
no interior da moradia e em espaços públicos” (DUARTE; VILLANOVA, 2013, p.9-15).
De qualquer maneira, as formas de analisar e interpretar a realidade não será nunca
absoluta, estará sempre permeada de erros e acertos, será sempre semiplena,
inacabada, imperfeita. O tempo, o espaço, as relações (de poder, de troca, de afeto),
as comunicações, o mercado, a política, serão sempre senhores de sua incompletude
e de suas mutações.
Não é em vão que as equipes técnicas do trabalho social devem ser multidisciplinares
e interdisciplinares. Para que os olhares se cruzem num processo produtivo de visões
e apropriações menos sujeitas ao erro ou, pelo menos mais complementares, onde o
sociólogo, o antropólogo, o assistente social, o pedagogo, o psicólogo, o arquiteto,
possam contribuir com suas disciplinas para além do funcionalismo histórico (que
rotula as funções de cada uma dessas áreas do conhecimento), sem hierarquia. Como
afirma Villanova (2013, p. 224)
O compartilhamento do diagnóstico leva à tomada de consciência de pontos
de vista e de usos em uma apreensão comum e diferenciada do espaço
perceptível. Ela solicita a responsabilidade de cada um em reavaliar seu
comportamento e suas preferências. Assim, adquire-se uma cultura de
concertation que permite a reapropriação do espaço com que o habitante se
identifica invertendo a prescrição de identidades verificadas nas relações
assimétricas entre governantes e governados. A busca da compreensão
mútua certamente não evita os jogos de poder na arte de tomar a palavra,
contudo, a relação se abre para a circulação dos saberes top-down e bottomup [...]. Trata-se, de algum modo, de fazer emergir os saberes de minorias
étnicas e culturais.
124
2.4.13 CATEGORIA 13: Atividades realizadas para a execução do projeto
Esta categoria, a exemplo das demais, busca confirmar pressupostos de que há nos
projetos uma configuração expositiva desvinculada dos sujeitos, apartada do território.
Na implementação dos projetos sociais os técnicos das prefeituras privilegiam
atividades informativas realizadas em reuniões, assembleias e no plantão 62 social,
cujo objetivo foca na apresentação do projeto, da equipe, dos agentes envolvidos,
informação sobre o andamento das obras e abordagens sobre o tema da saúde e da
questão ambiental. Palestras, oficinas, confraternizações, filmes e cursos também são
atividades que os técnicos dizem realizar.. Em uma das respostas houve indicação do
“acompanhamento pós-ocupação
63
através de visitas in loco, participação nas
reuniões de comissões e/ou associações no empreendimento ou entorno” (
questionário TSP3). Seguem transcritas algumas das respostas
Atividades informativas como reuniões e assembleias, além do plantão social;
Levantamento de demandas para trabalhos como palestras, filmes,
dinâmicas de grupo que agreguem os temas levantados e os objetivos do
projeto. Avaliações periódicas para levantamento de resultados ao final do
projeto (questionário TSP2)
Informações aos beneficiários: apresentação do projeto e dos responsáveis
por sua execução; origem dos recursos, atribuição dos agentes envolvidos,
dentre outras. Participação e organização comunitária: reuniões e demais
eventos tais como palestras, encontros, oficinas, confraternização com temas
voltados para a participação, andamento das obras, educação sanitária
ambiental e saúde, dentre outras ( questionário TSP3).
Reuniões; palestras; curso de acordo com a necessidade; encaminho quando
necessário ;plantão social ( questionário TSP1).
reuniões com o público alvo para expor sobre o trabalho que será realizado
(questionário TSP4).
Fica evidente nas respostas dadas pelos técnicos das prefeituras que os projetos
sociais executados nos municípios assumem uma modelagem expositiva, permeada
62
“Estrutura(s) de escritório/plantão social, constituída(s) por, no mínimo, uma estrutura fixa na área da
intervenção, dotada de recursos humanos e equipamentos [...] que deverá(ão) ser mantida(s) ao longo de toda a
intervenção para o atendimento da população, onde serão disponibilizadas todas as informações necessárias,
funcionando também como base logística para o Trabalho Social e para funcionamento do mecanismo para
prevenção e mediação de eventuais conflitos” ( BRASIL, 2014, p.17-18 ).
63
Etapa que se inicia após a conclusão das obras e se consolida com a mudança das famílias para
os imóveis.
125
de informações unidirecionais, que lida com os destinatários das políticas públicas
mais como pacientes ouvintes do que como sujeitos partícipe, ratificando todas as
ponderações já feitas até aqui.
As respostas dadas pelos técnicos credenciados à questão encontram-se no quadro
abaixo. Um dos profissionais deixou a questão em branco.
Quadro 2
Categoria 13
Que atividades costuma realizar na implementação dos projetos sociais?
Grupos focais, palestras, oficinas ( questionário TCC2).
Costumo realizar as atividades integrantes no escopo de cada projeto social apresentado e
aprovado ( questionário TCC3).
1)pesquisa quantitativa e qualitativa, 2) reuniões informativas, 3) atendimentos, visitas, 4)
representantes de bloco e subsíndicos mirins, 5) utilização de informativos ( questionário TCC
8).
Pesquisas quantitativas e qualitativas, atuação com jovens e crianças (GR meio ambiente,
síndicos mirins), monitoramento, teatros, oficinas ( questionário TCC7).
Pesquisa quantitativa e qualitativa (DPR 64, grupo focal, observação participante, mapa falado),
diagnóstico, reuniões informativas com pequenos grupos; visitas domiciliares, monitoramento
dos domicílios e famílias; implantação de grupos diversos: representantes de quadra de blocos,
subsíndicos mirins, agentes mirins, outros;
planejamento participativo, avaliações de
resultados; distribuição de material informativo e educativo a partir das atividades em
andamento, festas apresentações teatrais, jornal mural; dinâmicas diversas; oficinas,
seminários e palestras ( questionário TCC6).
Na geração de renda ofereço cursos de capacitação na educação e possibilidade de formação
com cursos do PRONATEC que além de trazer formação trazem aumento de renda. Na saúde
palestras de informação e direcionamento, acompanhado do beneficiário, quando necessário,
entre outros eixos como organização comunitária e educação patrimonial que trabalhamos em
palestras e grupos de discussão ( questionário TCC1).
Mobilização: arrastão de informação porta a porta, elaboração conjunta de formas e canais de
comunicação; organização comunitária: reuniões por blocos, formação de grupos de
interesse, criação de um grupo de gestão do empreendimento, representação, formação de um
grupo intersetorial com as prefeituras para o atendimento das demandas. Esse grupo
intersetorial deveria ser constituído antes da entrega do empreendimento. Só depois da
mudança da família é que as prefeituras se mobilizam para resolver as demandas; Eixo
educação sanitária/ambiental: nesse eixo o objetivo é criar um espaço saudável de viver. A
noção ambiental está ligada à construção de espaços saudáveis de moradia. Dessa forma,
temos promovido atividades de lazer e esportivas para gerar apropriação dos espaços coletivos
e discutir o bem-estar dos moradores. Para as crianças e adolescentes também propomos a
mesma forma com a discussão da defesa dos seus direitos. Normalmente todos os problemas
de depredação condominial são atribuídos a esse público; Eixo educação patrimonial: as
atividades são na mesma linha da discussão ambiental acrescentado a tratativa do
empreendimento como patrimônio coletivo e patrimônio da família, construção de segurança e
tranquilidade; Eixo Empreendedorismo: é o eixo mais problemático e de difícil execução, o
tempo de execução do PHS não permite o desenvolvimento de ações, esse eixo acaba sendo
desenvolvido com ações fracas e sem diagnóstico da situação de trabalho das famílias. E os
64
Diagnóstico Rápido Participativo
126
técnicos não tem capacidade e nem treinamento para essa ação. Na minha avaliação ele não
deveria constar no PHS e precisa ser revisto (TCC4).
Informação ao beneficiário [...] encontros voltados para fortalecimento da convivência
comunitária, orientações sobre a preservação e valorização do meio ambiente, discussão sobre
o uso racional dos recursos hídricos, valorização do imóvel, adimplência e inadimplência. [...]
incentivo à criação de comissões, associações ou participação em associações já existentes no
entorno do empreendimento [...]( questionário TCC 11)
Reunião Comunitária para explicar no que consiste o trabalho social. Monitoramento das
atividades e avaliação dos resultados alcançados. Abordagem de temas de interesse geral dos
moradores. Emancipação dos usuários através da realização do TTS ( questionário TCC 13)
Reunião para apresentação e rápido diagnóstico de demandas para realizar encaminhamentos,
grupos de convivência: crianças e adolescentes, mães e idosos. Visitas guiadas a horto florestal,
dia de lazer com cinema na rua. Distribuiçao de mudas de plantas frutíferas ou hortaliças ou
ornamentais de pequeno porte. Atendimento individual para empreendedores locais, orientação
jurídica para acesso a direitos, benefícios, como pensão, questões trabalhistas, oficinas de
esporte: jogos para crianças e adolescentes e exercícios e caminhadas para adultos e idosos.
Confraternização em datas comemorativas ( questionário TCC 10)
Evento inicial para expor o trabalho que será realizado; reuniões de mobilização comunitária,
articulação interinstitucional, cursos e oficinas de acordo com o diagnóstico inicial; pesquisa
sócio familiar; palestras com profissionais específicos; escolha de representantes dos
moradores; encaminhamentos para setores públicos/privados; plantão social; visitas
domiciliares ( questionário TCC 9)
Mobilização e comunicação: ações informativas, suporte as intervenções físicas, articulação
para parcerias, avaliação e monitoramento. Participação comunitária e desenvolvimento sócioeducativo: monitoramento e organização comunitária, atividade sócio cultural, geração de
trabalho e renda, educação ambiental, patrimonial saúde e sanitária ( questionário TCC 5)
Fonte: Apêndice II, questão 36
Da fala dos técnicos credenciados, apreendem-se algumas questões que merecem
ser ressaltadas: Pergunta-se acerca das atividades realizadas na implementação dos
projetos. Um dos técnicos, ao referir-se ao trabalho realizado com os jovens na
Educação Sanitária e Ambiental, diz que “normalmente todos os problemas de
depredação condominial são atribuídos a esse público” ( questionário TCC 4) e
menciona que “para as crianças e adolescentes também propomos [...] a discussão
da defesa dos seus direitos”. Entendemos que nesse caso faltou o tratamento da
dimensão jurídica do cidadão, seja ele criança, jovem ou adulto, que implica não
somente o conhecimento e a defesa de seus direitos, mas a exata noção de seus
deveres, repaginando o assistencialismo comum na gestão pública. Mas algumas
respostas trazidas por esse mesmo profissional demonstram uma compreensão
diferenciada acerca do Eixo Educação Ambiental e Patrimonial no qual relaciona a
variável ambiental na perspectiva do “ambiente saudável de viver” e o patrimônio na
perspectiva do coletivo. ( questionário TCC4). Outra percepção desse profissional
que reflete o modelo de trabalho social realizado até então relaciona-se ao eixo do
empreendedorismo, da geração de trabalho e renda e do desenvolvimento
socioeconômico. De acordo com esse profissional, esse “é o eixo mais problemático
127
e de difícil execução”. Segundo ele o tempo do trabalho social não é suficiente para
“desenvolver ações efetivas” ( questionário TCC4).
Cabe ressaltar que, é possível extrapolar o eixo do empreendedorismo de negócio,
onde empreender é apenas engajar-se em uma atividade lucrativa qualquer. No
trabalho social é possível e pertinente trabalhar com a noção de empreendedorismo
cívico e empreendedorismo social 65 que, por sua vez, faz interface com o próprio
empreendedorismo de negócio, pois, para este é necessário antes promover a
formação ética e cívica dos indivíduos e da coletividade. E para a consolidação do
eixo do desenvolvimento socioeconômico, no qual está incluído o empreendedorismo,
está previsto, a partir da publicação da Portaria 21/2014, o Plano de Desenvolvimento
Socioterritorial,
que
deve
ser
construído
de
forma
coletiva,
prevendo
a
complementaridade e a participação dos diversos agentes presentes na macroárea,
inserindo o público alvo da intervenção nas ações e programas implementados pelas
instituições que atuam no território.
Já o Eixo Educação Patrimonial precisa extrapolar a noção do patrimônio enquanto
empreendimento ou unidade habitacional e incorporar a noção de patrimônio em suas
variadas manifestações culturais tangíveis e/ou intangíveis, que reconheçam
memória, história, valores, lugares como fonte de conhecimento, reconhecimento (de
fatos, coisas, vivências), desenvolvimento sócio-organizativo e construções coletivas
a serem apropriadas pelo trabalho social. De acordo com Carter
A Educação Patrimonial objetiva o estabelecimento de uma relação de afeto
da comunidade pelo patrimônio histórico-cultural, sendo a sua metodologia
aplicável aos mais variados grupos sociais e podendo ter como objeto
qualquer tipo de bem cultura. [...] permite à comunidade reapropriar-se de
objetos, lugares e saberes importantes para o reconhecimento de sua
cidadania (CARTER, 2004, p.38-50)
65
Em consonância com um dos conceitos trazidos por Oliveira (2004 ) da Foud Schwab, Suíça: "São agentes de
intercambiação da sociedade por meio de: proposta de criação de idéias úteis para resolver problemas sociais,
combinando práticas e conhecimentos de inovação, criando assim novos procedimentos e serviços; criação de
parcerias e formas/meios de auto-sustentabilidade dos projetos; transformação das comunidades graças às
associações estratégicas; utilização de enfoques baseados no mercado para resolver os problemas sociais;
identificação de novos mercados e oportunidades para financiar uma missão social. [...] características comuns
aos empreendedores sociais: apontam idéias inovadoras e vêem oportunidades onde outros não vêem nada;
combinam risco e valor com critério e sabedoria; estão acostumados a resolver problemas concretos, são
visionários com sentido prático, cuja motivação é a melhoria de vida das pessoas, e trabalham 24 horas do dia
para conseguir seu objetivo social." (OLIVEIRA, E.M, Empreendedorismo social no Brasil: atual configuração,
perspectivas e desafios – notas introdutórias. Rev. FAE, Curitiba, v.7, n.2, p.9-18, jul./dez. 2004).
128
2.4.14 CATEGORIA 14: Monitoramento e avaliação de projeto
A Categoria 14 apresenta as questões relativas ao monitoramento e avaliação de
projetos sociais.
Os técnicos das prefeituras responderam que realizam as avaliações “com relatórios,
avaliações dos beneficiários” (questionário TSP1); “aplicação de questionário de
avaliação das ações” (questionário TSP4); “não somente através do cumprimento de
metas e prazos como também da satisfação dos beneficiários através de
questionários aplicados” (questionário TSP3). Um dos técnicos não respondeu à
questão e outro especificou dizendo que
“Acontece da seguinte forma: 1ª avaliação no início dos trabalhos ( marco
zero); 2ª avaliação no início dos trabalhos ( 50% das ações executadas ) e 3ª
avaliação no último encontro, geralmente uma assembleia para discussão do
projeto como um todo, avaliação final e encerramento do trabalhos”
(questionário TSP2).
Um entre os treze credenciados não realiza monitoramento dos projetos. Nas
respostas dos doze outros foi dito que o monitoramento é realizado por meio de
“avaliações dos beneficiários de todas as ações realizadas” (questionário TCC2);
“pesquisa de monitoramento ao final de cada atividade” (questionário TCC3); “através
de visitas nas casas dos beneficiários e questionários de avaliação dos resultados”
(questionário TCC1); “através de pesquisa com os moradores” (questionário TCC13);
“aplicando avaliação” (questionário TCC5); “pesquisa e avaliação” (questionário
TCC7). Seguem outras respostas extraídas dos questionários, Apêndice II
Pesquisa Ex-Ante (questionário, DRUP, outros ), monitoramento, reuniões de
equipe, reuniões de avaliação com a população, dinâmicas com população,
reuniões com a prefeitura, seminários, oficinas, avaliação pós-ocupação,
pesquisa quantitativa e qualitativa ( geralmente grupo focal ), relatório
(questionário TCC6);
Relatórios e dinâmicas e avaliação após os encontros com os moradores.
Esse é um item que avalio como fraco no meu trabalho. Ainda temos uma
dificuldade de gerar processos avaliativos com os participantes. Se o público
se distancia, temos poucas ferramentas para avaliar os motivos e
reprogramar o trabalho (questionário TCC4);
Nosso monitoramento tem sido pela sistematização das fichas de avaliação
e listas de presença. Por meio de nº de participantes nas atividades, pelo
conceito de avaliação que ele dá à atividade e pelas anotações-avaliação
qualitativa. Além da manifestação da equipe técnica (questionário TCC10).
129
Avaliações feitas com a equipe técnica, contratante e beneficiários verificando
listas de presença, fichas de inscrição, fichas de atendimento do plantão
social, pesquisa final avaliação ( questionário TCC9).
Em relação à percepção dos técnicos sobre o significado da avaliação final dos
projetos sociais em habitação, todas as opções de respostas foram consideradas nos
diferentes questionários, sendo que dois profissionais, um técnico credenciado e um
técnico municipal, marcaram todas as opções, ou seja, entendem-na como um
momento de medir as competências dispensadas ao projeto, os desempenhos, o
êxito, as lições aprendidas, a pertinência das metodologias empregadas, como um
momento de fazer a análise crítica do projeto, de fazer a prestação de contas e zerar
pendências, de verificar a eficácia e se os esforços dispensados foram adequados e
compensadores. Entre os credenciados há o entendimento de que a avaliação final
representa uma oportunidade de “verificar as falhas e excessos e tentar corrigi-los
[...]”(questionário TCC1). “Avalio que todos os itens acima ( referindo-se a todas as
respostas dadas no questionários e que foram acima elencadas ) correspondem à
finalização do projeto, contudo como as ações de monitoramento são fracas, essas
avaliações poderiam ocorrer durante a execução do projeto” (questionário TCC4).
Em todas as respostas é possível verificar que em nenhum momento foi mencionada
a utilização de indicadores de monitoramento e avaliação nem tampouco a
discriminação de métodos relacionados à relação temporal das avaliações face aos
momentos de execução do projeto ou à própria natureza das avaliações. Além disso,
fica explícita a assimilação da avaliação como um instrumento relacionado à
intervenção microespacial, no âmbito do empreendimento, da família, das pessoas,
muitas vezes na intenção de avaliar a “satisfação dos beneficiários” em relação à
intervenção ou às atividades realizadas sem se preocupar com a verificação de seus
impactos no âmbito macroespacial, sem trazer para dentro dessa avaliação a
dimensão socioterritorial. Ainda assim resta a pergunta: satisfação em que nível?
Medida de que forma? Em relação a quê? Como foram estabelecidos os critérios de
participação na “pesquisa” de avaliação? Como foi feita a análise? Com que
profundidade e consistência? A julgar pelo beneficiário que não participou
efetivamente das atividades, mas está feliz por ter sido contemplado com a moradia a
avaliação não serve para medir o trabalho social propriamente dito nem para medir as
transformações sociais geridas no âmbito da família, do empreendimento ou da
130
comunidade. E ainda, a satisfação daquele indivíduo com sua moradia espelha o
contexto em que essa moradia se constituiu? Ou seja, a satisfação está atrelada ao
sentido da gratidão pela oportunidade de se ter obtido um “teto” para si e para sua
família ou pelo fato de que a moradia representou para ele a propriedade de um bem
que se constitui de uma infraestrutura dotada dos equipamentos e serviços
necessários, da qualidade ambiental, controle urbanístico, inserção urbana, vida
social e comunitária? A qualidade dos serviços e equipamentos está implícita nessa
avaliação?
Analisando comparativamente as respostas às questões relativas ao monitoramento
e à avaliação final, parece ser precário o discernimento entre a ação de monitorar e a
ação de avaliar que, embora se complementem e intercedam, cada uma tem suas
“particularidades de sentido, metodologias e estratégias” ( BRASIL, 2010, p.117 ) que
devem ser cuidadas separada e paralelamente para a gestão técnica, política e
gerencial do projeto. E nesse sentido é necessário compreender que a avaliação
engloba o monitoramento, pois para avaliar é preciso monitorar. Nesse sentido, a
avaliação, amparada no monitoramento, é capaz de identificar “processos, resultados
e impactos”, e de comparar “dados de desempenho”, julgar, informar e propor ações,
redirecionamentos, políticas, programas, articulações (BRASIL, 2010, p.117 ).
Ressalta-se que em se tratando de intervenções vinculadas a políticas públicas e
realizadas com recursos públicos a avaliação torna-se
uma obrigação pública, um dever ético, pois envolve recursos que são da
coletividade, exigindo maior probidade no gasto e maior distributividade
social. Por isso, está relacionada à relevância social, ao desempenho,
eficiência, resultados e impactos do projeto no contexto dos objetivos
estabelecidos, sendo um instrumento de gestão pública e de controle social
das políticas públicas (BRASIL, 2010, p. 117).
E é, portanto, esperado na execução dos projetos sociais em programas de provisão
habitacional que as avaliações ocorram durante todo o ciclo de vida de seu processo
de implementação, desde sua concepção ou marco zero ( ex-ante ), passando pelo
monitoramento, ou avaliação ‘intra’, onde se avaliam as atividades do processo
enquanto estas se desenvolvem, identificando os acertos, os erros, as dificuldades de
131
forma a permitir que, tempestivamente, se redirecione ações com vistas à efetividade
do projeto, e pelo post, que coincide com a finalização imediata da execução do
projeto, detectando, registrando e analisando os primeiros resultados (ABDALA,
2004). A avaliação ex-post, realizada tempos após a conclusão do projeto para
verificação dos impactos e resultados consolidados no tempo, pode agora, com a
sistemática da Portaria 21/2014, ser feita ao final do prazo de elaboração e execução
do PDST para verificação do projeto social propriamente dito. Quanto ao ex-post do
próprio PDST, fica a sugestão para o Ministério das Cidades criar condições de sua
realização uma vez que este instrumento pressupõe um prazo de incubação e
maturação.
A aplicação da Portaria 21/2014, com a consistência necessária à materialização do
que acima se expõe, esbarra inevitavelmente nas limitações, e até mesmo na
inexistência, dos métodos e técnicas de gerenciamento dos projetos da intervenção
integrada por parte da gestão municipal e dos projetos sociais elaborados e
implementados pelos profissionais responsáveis pelo trabalho social resultando em
ações
isoladas
e
numa
entrega
dos produtos
descomprometida
com
a
sustentabilidade.
Ressalta-se, entretanto, que o ciclo de vida dos projetos de trabalho social não permite
a avaliação ex-post no rigor do método e de suas premissas. Para um levantamento
mais apurado dos impactos do trabalho social e das intervenções não só na vida das
pessoas, mas no território, seria necessário que os programas fossem constituídos da
prerrogativa do retorno das equipes aos empreendimentos após determinado período
de tempo para os levantamentos necessários ao aprimoramento das ações e políticas
públicas e ao controle social
Considerando que, de acordo com a portaria 21/2014, o Ministério das Cidades,
responsável por definir as diretrizes e procedimentos operacionais de implementação
do trabalho social, tem a atribuição de definir com as instituições financeiras os
instrumentos de avaliação e monitoramento do trabalho social, além de desenvolver
e apoiar ações de capacitação voltadas aos Entes Públicos, fica aqui uma sugestão:
que o Governo Federal/MCidades institua programas e ações de avaliação ex-post
132
das intervenções de habitação de interesse social como uma ação a ser realizada
pelas equipes do trabalho social.
2.4.15 CATEGORIA 15: Como considerar o projeto concluído
A Categoria 15 traz a compreensão dos técnicos acerca do processo de conclusão de
um projeto social no sentido do que isso significa para eles em termos dos objetivos
dos projetos, de como é feita a transição, ou a “transferência” dos bens e serviços à
população para então a equipe deixar a área de intervenção.
Para sete credenciados e dois técnicos municipais, concluir um projeto social em
habitação significa a entrega e aceitação do relatório final do projeto. Para cinco
credenciados e um técnico municipal significa também a conclusão dos contratos
firmados.
Para
cinco
credenciados
e
um
técnico
de
prefeitura,
o
pagamento/recebimento de todos os produtos e serviços entregues e realizados
também representa a conclusão de um projeto. Entre os técnicos das prefeituras
houve dois outros entendimentos além das opções dadas acima: “significa a
possibilidade da realização de muitas famílias terem seu lar, sua casa, com dignidade,
sendo desta forma agentes transformadores tendo assim uma moradia digna”
(questionário TSP1); “significa cumprir todas as ações propostas de forma
minimamente satisfatória, podendo observar na realidade de vida dos beneficiários a
reprodução dos conteúdos trabalhados e discutidos durante o TS 66 ” (questionário
TSP2).
Dois credenciados entendem que a conclusão do projeto seria o momento de realizar
evento de encerramento e desmobilizar a equipe (questionários TCC7 e TCC 13), o
momento em que a comunidade encontra-se “organizada” (questionário TCC 7).
Houve quem dissesse que “o prazo de execução define o encerramento do trabalho e
assim acaba sendo um elemento limitador do projeto” (questionário TCC4). Alguns
deles se expressaram além das opções dadas afirmando
66
Trabalho Social
133
Concluir um trabalho social é realizar todas as atividades, ações programadas
e contratadas, tendo avaliado todo o trabalho ( equipe e comunidade ), tendo
a segurança de deixar a comunidade com bom nível de organização
(questionário TCC6).
Ao final de uma execução, pessoalmente, busco avaliar e identificar um
legado, algo que o TS possa ter deixado naquele bairro/residencial/polígono
ou público alvo. Com poucos anos de experiência que tenho na área,
infelizmente o legado não é tão significativo quantitativamente, mas o é
qualitativamente. Exemplo do curso de manicure e pedicure e cabeleireiro,
em Campo Belo (MG), formou-se um salão comunitário junto a associação
de moradores. Em Itaúna, houve maior utilização dos serviços de cata-treco,
pois os móveis eram deixados na rua do residencial Santa Edwirges. Em
Nova Serrana estamos deixando uma associação de moradores bastante
ativa, especialmente com diálogo com o poder público municipal. Em Araguari
o que comoveu e envolveu os moradores foram as mudas de plantas
frutíferas que foram distribuídas. Como também a escolhinha de futebol e o
curso de fotografia. Enfim, não são em todos os eixos do TS que os
beneficiários se envolvem e interessam. E a conclusão do projeto pra mim é
quando consigo identificar um item, uma atividade que deixou um legado ao
bairro (questionário TCC 10).
Ao serem perguntados sobre como percebem que o projeto atingiu seus objetivos, Os
credenciados responderam: quando “possibilitou modificação no comportamento dos
beneficiários” (questionário TCC2); quando os moradores estão “organizados”
(questionário TCC7); “quando as avaliações realizadas, principalmente pela
população beneficiada, foram positivas nas atividades realizadas, demonstrando que
a metodologia foi adequada” (questionário TCC9); “quando houve compreensão das
famílias de tudo o que foi trabalhado, e conhecimento para a realização de mudandas”
(questionário TCC1); Quando os beneficiários entendem qual é o verdadeiro objetivo
do trabalho e quando o mesmo modifica por completo a vida das famílias envolvidas
( questionário TCC13). Outras respostas dos credenciados acerca do que significa
para eles concluir um projeto seguem transcritas
Consegue implantar uma equipe administrativa que consegue atuar de forma
objetiva e defendendo os interesses da comunidade (questionário TCC8);
Quando houve mudança de comportamentos e atitudes frente à moradia;
consolidaram-se atitudes em direção à autogestão; representantes da
comunidade conseguem conduzir e solucionar problemas coletivos,
encaminhando-os (questionário TCC6);
Pelo grau de satisfação demonstrado pelos beneficiários durante a execução
do projeto e avaliação final (questionário TCC11);.
Quando repassou informações úteis aos mutuários/beneficiários.
Esclacreceu e informou sobre os serviços públicos, atendimentos e horários;
conversou e conscientizou sobre o patrimônio adquirido. Conscientizou sobre
134
a manutenção e conservação do território e seus equipamentos (questionário
TCC10);
“quando os objetivos propostos são alcançados e verifica-se o envolvimento
e participação de todos os agentes envolvidos no processo. Quando todos
estão informados e conscientes de seus deveres e obrigações” (questionário
TCC3)
Quando o mesmo contribui e viabiliza a promoção da qualidade de vida das
famílias beneficiárias. Fator de grande relevância para diminuição do déficit
habitacional e controle social ( questionário TCC5).
Quando é possível identificar um nível de organização dos moradores
reconhecido pela maioria da pop67 (sic) do empreendimento ( questionário
TCC4).
Para os técnicos dos municípios o projeto atingiu seus objetivos quando “a população
se apoderou das informações repassadas e discutidas durante o TS e passou a agir
na realidade de forma consciente e efetiva, fazendo com que estes conteúdos sejam
usados no dia-a-dia [...]” (questionário TSP2); quando “todas as famílias estão
morando no empreendimento, respeitando o outro, que é
público e privado, e
principalmente tendo sua autonomia com direito a educação, saúde e lazer”
(questionário TSP1); “quando os beneficiários ou maioria deles compreenderam o
objetivo das ações realizadas e no seu cotidiano usufruem do que foi aprendido”
(questionário TSP4); “pelo grau de satisfação demonstrado pelos beneficiários
durante a execução do projeto e avaliação final” (questionário TSP3);
Sobre o momento de transição e entrega, ou seja, o momento em que a equipe técnica
irá “sair de campo” pela conclusão do trabalho social, os técnicos das prefeituras
dizem consistir:
Dos beneficiários terem sua autonomia, enfim de se verem como
responsáveis pelo empreendimento e pelas suas casas (questionário TSP1);
No início de uma nova etapa dos gestores da política de assistência social
junto aos beneficiários objetivando a sustentabilidade do empreendimento
(questionário TSP3);
Em conscientizar os beneficiários que desse momento em diante eles devem
assumir seus imóveis de forma responsável e consciente, pois todo o TS foi
realizado para dar suporte a este momento de assumir as responsabilidades
sobre a UH, sobre outros bens que por ventura foram construídos no projeto
e sobre as atribuições de cada pessoa em seu meio comunitário (questionário
TSP2);
67
População
135
Consiste em ‘sair de campo’ sabendo que o trabalho contribuiu com a
melhora da qualidade de vida dos beneficiários. Ter a consciência que eles
poderão repassar o que foi aprendido aos seus familiares, amigos, entre
outros e principalmente a valorização do bem adquirido ( questionário TSP4).
Os técnicos das prefeituras afirmaram que preparam os beneficiários para esse
momento ao longo da execução do projeto “com palestras, encontros pertinentes, já
tratando do assunto” (questionário TSP1); Um dos técnicos disse que “esse momento
já vem sendo trabalhado desde o início do projeto com os beneficiários, através de
informações aos mesmos que o TTS (Trabalho Técnico Social) será finalizado,
visando o protagonismo dos usuários” (questionário TSP4); Um dos técnicos afirmou
durante os trabalhos os beneficiários são constantemente lembrados que
quando receberem seus imóveis devem zelar dos (sic) mesmos, devem
assumir a responsabilidade sobre os mesmos por si só, sabendo que não
mais contarão com o apoio das equipes técnicas, que estarão trabalhando
em novos projetos e não cuidando constantemente de projetos já encerrados
(questionário TSP2);
Para os credenciados, a transição do projeto, “significa cortar os laços com o público
alvo deixando a certeza de uma intervenção bem feita e uma comunidade mais
madura” (questionário TCC3); “consiste na autonomia dos beneficiários em relação
ao protagonismo de suas vidas” (questionário TCC13); consiste no “momento de
finalização do projeto” (questionário TCC2); na “avaliação final e a certeza da
população organizada” (questionário TCC7); na avaliação final do trabalho e definição
de um plano compartilhado para o futuro” (questionário TCC6); “momento importante
para ocorrer o empoderamento da população (questionário TCC9); “desde o início
[...] a população é preparada [...].No final ]...] essa etapa é considerada normal pelos
moradores, fazendo parte de uma sequência” (questionário TCC6); “oportunidade de
empoderamento da sustentabilidade habitacional à população atendida” (questionário
TCC5). Outros três credenciados responderam
No programa Minha Casa Minha Vida, sinto que a transferência é penosa. A
equipe administrativa, nem os moradores estão (sic) preparados, ainda,
devido a vários fatores, à ‘saída de campo’ da equipe técnica (questionário
TCC8);
Um momento de avaliação do que foi realizado, e a definição de uma nova
agenda para os grupos que foram criados/formados. A elaboração de um
pequeno plano de ação para o grupo (questionário TCC4);
136
Penso que seja o momento de um grupo gestor ou associação de moradores
já estar constituído, e a equipe repas sar as informações sobre articulações
realizadas, órgãos e entidades/instituições de relevância para o bairro
(questionário TCC10);
A partir do momento que a família tem a capacidade de escolher o caminho
pelo qual quer seguir, tendo conhecimento de todas as possibilidades que
foram apresentadas (questionário TCC1).
Ao analisar o conjunto das respostas, percebe-se que preparar os beneficiários para
o momento da conclusão do projeto significa informar o prazo da intervenção, realizar
“capacitação, dinâmica na qual o objetivo principal é o fortalecimento da equipe
administrativa” (questionário TCC8);. Um credenciado afirmou que realiza “grupo focal
para a avaliação do que foi realizado e elaboramos conjuntamente um plano de ação
para o grupo desenvolver” (questionário TCC4); outro disse que os prepara
“transmitindo informações dos locais e pessoas que eles podem procurar para ajudálos a resolver os problemas que surgem no dia-a-dia e me colocando à disposição
quando há dúvidas permitindo que eles liguem, enviem e-mail e dando orientações
para eles” (questionário TCC1); “[...] informando [...] durante todo o projeto que o
mesmo vai ter fim e as pessoas precisam se apropriar do que for oferecido no TS”
(questionário TCC9).
Percebe-se o aspecto formal e tecnocrático dispensado ao trabalho realizado pelos
profissionais do trabalho social ao responderem que concluir um projeto significa
principalmente a entrega e aceitação do relatório final do projeto, conclusão dos
contratos firmados e o pagamento/recebimento de todos os produtos e serviços
entregues e realizados. Na conclusão dos projetos de trabalho social os técnicos
devem antes ter a certeza do que se legou ao território, à área de intervenção, às
comunidades, às pessoas, e a si próprios enquanto parte das relações que se
estabeleceram no processo de implementação dos projetos, que por sua natureza é
dialética - ao trabalhar no e com o território, esse técnico modifica a si mesmo.
Portanto, ter a certeza de que o trabalho social foi capaz de contribuir na subversão
da ordem patrimonialista e clientelista enraizada na gestão pública, criou condições e
espaços de vocalização, instaurou capacidades de problematização e transformação
das relações para uma práxis social transformadora (QUARESMA, 2012, p. 198 ), e,
ressalte-se, foi dito ‘contribuir’, pois essa obra será sempre inacabada e em contínua
construção - é minimamente aí que o trabalho social poderá ser considerado concluído
137
enquanto projeto de intervenção, mas outras e novas e contínuas intervenções serão
necessárias.
Não é o caso de ignorar a importância das questões práticas, administrativas,
operacionais, racionais e objetivas desse momento como romper os laços
construídos, desmobilizar as equipes, preparar as pessoas para seguirem seus
caminhos aplicando os conhecimentos adquiridos, que são parte integrante do
processo, mas estas sucedem àquelas, caso contrário, as metodologias de avaliação,
se aplicadas, indicariam a necessidade de redirecionar alguma ação para que os
objetivos e metas do trabalho social se concretizassem.
E hoje, considerando a normatização do trabalho social vigente, é preciso levar em
consideração o Plano de Desenvolvimento Socioterritorial (PDST) que pressupõe a
aproximação do setor privado e do terceiro setor atuantes na macroárea com o
trabalho social. Implica inserir projetos e proposições desses segmentos no
cronograma de desenvolvimento do território. Nesse sentido, encerrar o projeto social
poderia significar a entrega da comunidade, do empreendimento, à outro segmento
para a continuidade de uma intervenção potencializadora das ações iniciadas pelo
trabalho social visto que o setor privado e as entidades do terceiro setor lidam com o
princípio da responsabilidade social tendo equipes e departamentos exclusivamente
voltados à elaboração e execução de projetos nas comunidades com as quais se
relacionada direta ou indiretamente e trabalham com fundos incentivados como o
Fundo a Infância e da Adolescência ( FIA ), leis de incentivo à cultura, ao esporte e à
aprendizagem ( BRASIL, 2010, p.268-273 ).
2.4.16 CATEGORIA 16: Identificação de problemas após a saída de técnico
Nesta Categoria buscou-se identificar o conhecimento dos técnicos acerca de
problemas ocorridos nos empreendimentos após o término do trabalho social ou
mesmo durante sua realização que não tenham sido solucionados ao longo do período
de execução do projeto de intervenção.
138
Treze técnicos, entre os municipais e os credenciados afirmaram ter tido
conhecimento de problemas que não tenham sido solucionados ou encaminhados
pela equipe técnica ou seus respectivos responsáveis. Entre os problemas relatados
pelos credenciados encontram-se aqueles relativos às questões construtivas, falta de
equipamentos e serviços públicos (escola, creche, transporte, posto de saúde ),
segurança, violência, “violência relacionada à droga”(questionário TCC7). Seguem
transcritas algumas colocações dos técnicos credenciados
Geralmente problemas de violência são constantes durante o trabalho social
e em muitos casos costumam piorar com a saída dos técnicos sociais (de
campo/conclusão dos trabalhos). São problemas estruturais que fogem a
competência com o trabalho social. Geralmente ligados a grupo a margem da
lei, ligados ao tráfico, em suas diversas formas (questionário TCC6);
Depredação das áreas coletivas/do salão comunitário; as denúncias de
imóveis alugados; os vícios construtivos dos imóveis sem solução pela
construtora (questionário TCC4);
Relacionados à segurança: assassinato e estupro. Também invasão, roubo
ao escritório social. Vícios construtivos que não são respondidos pela
ouvidoria do MCMV. Assassinato: uma mutuaria alugou o imóvel para
traficantes. Após buscar o pagamento do aluguel, que teve dificuldades em
receber, ela foi encontrada enterrada de cabeça para baixo próximo ao
imóvel, o fato aconteceu no residencial Geraldo Veloso em Formiga/MG. O
caso referente ao estupro foi no Portal de Fátima em Araguari/MG. A equipe
do TS identificou nas reuniões informativas, por meio de desenhos de
moradores, problema da sujeira em áreas institucionais e áreas não
capinadas, sujas, em que a CEMIG 68 dizia que era responsabilidade da
prefeitura e vice-versa. Em Janeiro/14 a equipe comunicou às secretarias
pertinentes. Nada foi feito. Em fevereiro comunicou novamente. No final de
março uma senhora foi estuprada na área de matagal. Em abril o secretário
de limpeza urbana visitou o escritório social (questionário TCC10);
Nas respostas dos técnicos dos municípios encontram-se relatados “alguns conflitos
entre vizinhos e interesse em comercialização do imóvel” (questionário TSP3);
“abandono do apartamento, “moradores irregulares” 69 (questionário TSP1). Dois
relatos desses técnicos merecem destaque
68
69
Centrais Elétricas de Minas Gerais.
Moradores que residem nos imóveis sem terem sido os destinatários originais dos subsídios e que, portanto,
são desprovidos de contrato formal com a CAIXA. De acordo com a regulamentação do programa e as condições
contratuais, a destinação dos imóveis é única e exclusivamente para a moradia da família beneficiária não havendo
a possibilidade, por exemplo, da utilização do imóvel para fins comerciais e o prazo para mudança do para os
imóveis, que antes era de 30 dias, agora deve ser imediatamente após o recebimento das chaves. Como os
subsídios financeiros concedidos para a aquisição da unidade habitacional são pessoais e intransferíveis, o
beneficiário não pode vender o imóvel até a quitação do valor do financiamento. Muitos, entretanto o fazem,
descumprindo cláusulas contratuais. Mas há também o caso de unidades habitacionais invadidas, cedidas, doadas
e dominadas pelo crime organizado ( como o caso do Residencial Guadalupe no subúrbio do Rio de janeiro que
ficou nacionalmente conhecido pela veiculação na grande mídia que foi invadido pelos traficantes em Novembro
de 2014 que necessitou de intervenção do Estado para reintegração de posse).
139
Venda de UH (unidades habitacionais) para terceiros pouco tempo depois da
entrega da mesma; invasão da UH antes do término da obra ou mesmo antes
da entrega destas ao beneficiário de direito, roubo de materiais das UH
durante de depois da conclusão das obras; locação de UH. Inadimplência nos
programas de financiamento; desistência de beneficiário durante o processo
(questionário TSP2).
A entrada dos técnicos em campo já é precedida de uma carga de problemas,
dificuldades e obstáculos que as equipes precisam enfrentar para criar as condições
mínimas de trabalho. Alguns absolutamente insolúveis pelas mãos do trabalho social.
Estes, relacionados aos problemas construtivos, para os quais a equipe técnica tem
no máximo, hoje, a prerrogativa de prover as condições para os encaminhamentos
necessários, trabalhando, claro, paralelamente, como lhe é atribuição, a formação de
consciências, a capacidade de mobilização social em torno da questão, para criar
meios de conduzir o enfrentamento aos interesses políticos e às leis de mercado que
até então legitimaram o princípio de que se é os pobres pode ser de qualquer jeito e
em qualquer lugar.
Outras condições antepostas, que prejudicam o legado do trabalho social e que lhe
fogem ao controle por serem objeto de interlocução entre políticas públicas, alinhamse às condições macroeconômicas e sociais. Os empreendimentos em sua grande
maioria localizam-se em áreas de periferia, onde facções criminosas constituem um
“terceiro poder” contra o qual trabalho social não tem forças, capacidade e nem
autoridade para enfrentar, não lhe sendo também atribuição direta. Promover a
inserção social, econômica, cultural e política das comunidades constitui o
enfrentamento a longo prazo da questão da droga, da ociosidade, da marginalidade,
da criminalidade, da adição, mas isso é ação indireta prevista no trabalho social. As
outras ações cabem ao poder público, às políticas públicas.
Resta ainda o enfrentamento à falta de civismo, de vontade coletiva. O trabalho social
aqui consegue apenas contribuir na construção de comunidades cívicas, compostas
de cidadãos com obrigações a cumprir, “virtuosos e imbuídos de espírito público”
(PUTNAM, 2006, PP.100-101 ). Essas, a longo prazo, serão capazes de combater a
140
outra vertente que dificulta a ação eficiente do trabalho social: o patrimonialismo e a
cultura do favor.
Putnam utiliza a expressão “familismo amoral”, de “Edward Banfield”70, para elucidar
a falta de virtude cívica existente na intenção de “maximizar a vantagem material e
imediata da família nuclear”; supondo “que todos os outros agirão da mesma forma”
(BANFIELD, 1958, p. 85 apud PUTNAM, 2006, p. 102 ). Seria falta de virtude cívica,
portanto, as questões elucidadas pelos técnicos de depredação dos espaços coletivos
(a pedra que se joga para o alto ), aquelas situações já ditas, em que as famílias,
ainda que reconheçam não preencher os requisitos previstos nos programas, invistam
na tentativa de deles se beneficiar ou, uma vez beneficiadas, não se apropriam daquilo
que lhes foi concedido, como nos programas de habitação de interesse social, em que
não utilizam o imóvel para sua própria moradia e fazem desse imóvel um objeto de
reserva patrimonial.
Não se espera altruísmo das comunidades beneficiárias dos programas de habitação
de interesse social ou das políticas públicas de um modo geral, mas um mínimo de
civismo e compreensão do que lhe é atribuído enquanto cidadãos que, ao se
apropriarem de direitos, lhe são reservadas expectativas de cumprimento de deveres.
Como diz Putnam que nos convida a uma análise bastante interessante
Pode muito bem haver um exagero na dicotomia entre interesses próprios e
altruísmo, pois nenhum mortal e nenhuma sociedade bem-sucedida podem (
sic ) prescindir do poderoso estímulo do interesse próprio. Os cidadãos da
comunidade cívica não têm que ser altruístas. Mas na comunidade cívica os
cidadãos buscam o que Tocqueville (1996) chamava de “interesse próprio
corretamente entendido”, isto é, o interesse próprio definido no contexto das
necessidades públicas gerais, o interesse próprio que é “esclarecido” e não
“míope”, o interesse próprio que é sempre sensível aos interesses dos outros
[...].Os cidadãos de uma comunidade cívica não são santos abnegados, mas
consideram o domínio público algo mais do que um campo de batalha para a
afirmação do interesse pessoal ( PUTNAM, 2006, p. 102 ).
Essa foi a base inspiradora da realização do presente estudo e é nela que se acredita
que o trabalho social realizado nas intervenções do desenvolvimento urbano deve se
apoiar para a construir o caminho da superação de toda a estrutura que emperra a
consolidação da gestão social, governança e governabilidade.
70
BANFIELD, EDWARD C. The moral basis of a backward society. Chicago Free Press, 1958, p. 85.
141
2.4.17 CATEGORIA 17: Papel transformador do trabalho social
Nesta categoria objetivou-se verificar se os técnicos do trabalho social reconhecem
nele algum potencial transformador da realidade. Primeiramente, cabe destacar que
todos os técnicos respondentes dos questionários desta pesquisa consideraram que
o trabalho social tem um papel transformador.
De acordo com Carvalho (2014), referindo-se aos idos dos anos de 1960, quando “a
ênfase era colocada nas metodologias de educação popular [...] sob influência das
proposições de Paulo Freire” (CARVALHO, 2014, p. 18), o trabalho social
[...] era compreendido como ação sociopedagógica que requeria a
combinação de saberes múltiplos convertidos em processo, argumento,
instrumento, conteúdo, relação. Abarcava processos políticos de mobilização
e, igualmente, aqueles processos clássicos do trabalho social
consubstanciados no trato psicossocial, na pedagogia emancipatória, na
afetividade, no cuidado. [...]
Na década de 1990, de acordo com a autora, o trabalho social atravessou momentos
de uma “razão instrumental” baseada em controles técnicos, e hoje vem resgatando
seu papel de mediação no processo de implementação das políticas públicas e
promotor de processos participativos “associados à transformação e à emancipação
social” (CARVALHO, 2014, p. 18). É possível dizer que, a julgar pelo número de
programas de desenvolvimento urbano com exigência de sua realização a exemplo
das ações de provisão habitacional, saneamento, urbanização de assentamentos
precários, regularização fundiária, seu o lugar de reconhecimento está posto. A
consagração da premissa de que a disponibilização de bens e serviços por si só,
apesar de essenciais, não promove inclusão social nem emancipa se feita sem as
mediações necessárias que o trabalho social é capaz de fazer, é condição essencial
à sua consolidação.
O trabalho social tem, portanto, um grande poder de transformar a realidade das
comunidades/pessoas destinatárias dos programas e políticas públicas, de contribuir
na promoção da mobilidade social, de despertar nas pessoas atitudes cívicas, de
promover mobilização social e abrir trincheiras para o desenvolvimento socioterritorial.
142
Sua concepção avançou significativamente no sentido de incorporar a macroárea
como seu campo de atuação, de ser objeto de maiores percentuais de recursos para
sua execução, de considerar a educação patrimonial e ambiental e o desenvolvimento
socioeconômico como eixos de ação, falta entretanto o apoio institucional e político,
logístico, operacional e instrucional para que o reconhecimento suplante as
dificuldades de sua efetiva aplicação, pois o fato de estar normatizado, ser parte
integrante dos programas e ser potencialmente viabilizador da gestão social, não
garante sua concretude.
2.4.18 CATEGORIA 18:
Grau de intensidade e objeto central do poder
transformador do trabalho social
A Categoria 18 teve o propósito de verificar junto aos profissionais onde reside o maior
poder transformador do trabalho social e em que intensidade. De acordo com as
análises todos os técnicos das prefeituras acreditam que o trabalho social tem um
intenso poder de transformar a realidade. Entre os técnicos credenciados esse
entendimento, entretanto não é unânime. Oito credenciados acreditam ser intensa
essa capacidade do trabalho social de mediar as políticas públicas e promover
transformações importantes. Um deles acredita ser “intensa em alguns casos” e
“pouco intensa em outros” ( questionário TCC6). Dois acreditam ser pouco intensa e
dois acreditam ser muito intensa.
Entre os técnicos das prefeituras, quatro acreditam na perspectiva socioeducativa e
de formação política para a construção da cidadania presente no trabalho social. Dez
credenciados também o creem. Outras perspectivas presentes no trabalho social
consideradas pelos técnicos: portunidade de se colocar profissionais da área social
em campo atuando como agentes desta transformação ( 03 credenciados e 03
técnicos municipais ); proposição de ações voltadas à informação e formação a partir
de metodologias adequadas ao tipo de intervenção a que se vincula o trabalho social(
02 técnicos municipais e 4 credenciados ). Entre esses técnicos, dois técnicos
municipais atribuíram ao trabalho social o poder de transformar a realidade a partir
das ações de educação ambiental e quatro credenciados, sendo que um destes
credita essa possibilidade ao “público infanto-juvenil” e à possibilidade da “venda do
143
óleo de cozinha usado [...] ou na coleta de móveis e utensílios domésticos”
(questionário TCC10), na oportunidade de reunir pessoas explanando sobre temas
importantes relacionados à saúde e à higiene (02 credenciados e 02 técnicos
municipais). Enquanto quatro técnicos municipais acreditam que esse poder se
concentra também na oportunidade de agir no território, somente três, dos treze
credenciados, atribuem a essa possibilidade o potencial transformador do trabalho
social.
Cabe ressaltar que as dificuldades relacionadas ao trabalho social vão além da
capacidade de se propor e executar projetos. Devem levar em consideração também
a precária inserção urbana dos empreendimentos, a falta de conexão do trabalho
social com a intervenção física que impacta sobremaneira a efetividade do trabalho
social, as deficiências na capacidade governativa dos municípios, que assumiram pelo
Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social novas atribuições, mas não
promoveram seu desenvolvimento institucional. Além disso, há falhas importantes no
encadeamento do processo produtivo que precisam ser corrigidas, a começar do
momento da concepção da intervenção quando os gestores institucionais se reúnem,
deliberam, a equipe de engenharia é convocada a elaborar o projeto sem a
participação das equipes sociais e, consequentemente, sem considerar as variáveis
sociais implícitas no processo e na implantação do empreendimento. A
implementação dos programas de habitação de interesse social ainda é feita sem
garantia dos princípios da intersetorialidade e da interdisciplinaride necessária,
consequentemente fica deficitária a articulação com outras políticas setoriais.
A Portaria 21/2014 estabelece alguns parâmetros de governança na relação do
trabalho social com as obras ao propor marcos temporais que determinam o momento
de iniciar a seleção das famílias e de elaborar e executar cada um dos instrumentos
do trabalho social – PTS-P, PTS e PDST. Entretanto, a sistemática exige uma
capacidade de gestão e comunicação entre todos os agentes envolvidos no processo
– CAIXA, prefeituras, construtoras, equipes técnicas e gerenciais, órgãos de
licenciamentos, cartórios. Essa conexão ainda não chegou a um nível de precisão que
permita um fluxo satisfatório de execução e até que as equipes do trabalho social se
organizem (visto que sua inserção no processo é tardia) para entregar os produtos
do trabalho social – projetos e seleção das famílias, as obras tomaram seu curso de
144
forma descompassada as ações sociais. O resultado acaba sendo muitas vezes
desastroso ao ponto dos empreendimentos serem concluídos sem a relação de
beneficiários estar definida ou sem que o próprio trabalho social tenha iniciado
sujeitando o empreendimento a invasões e outros problemas como desistências de
beneficiários, destinação irregular das unidades habitacionais, etc.
Por oportuno ainda é importante lembrar que no Programa Minha Casa Minha Vida, a
obrigação de selecionar as famílias é do Ente Público seguindo a orientações
normativas da Portaria 595/2013, a qual estabelece três critérios de priorização do
público alvo: famílias residentes em áreas de risco ou insalubres ou que tenham sido
desabrigadas; famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar; e famílias
de que façam parte pessoas com deficiência. De forma a complementar os critérios
nacionais; Distrito Federal, estados, municípios e entidades organizadoras poderão
estabelecer até três critérios adicionais de priorização. Os critérios adicionais deverão
harmonizar-se com os nacionais, estabelecidos no subitem 4.1 da Portaria 595/2013.
2.4. 19 CATEGORIA 19: Sentidos do trabalho social nos PHIS
Na Categoria 19 a pergunta norteadora foi relativa às possibilidades contidas no
desenvolvimento do trabalho social.
Para onze dos treze técnicos credenciados e três técnicos das prefeituras, o trabalho
social contribui para o fortalecimento das relações de vizinhança, familiares e o vínculo
patrimonial garantindo assim a sustentabilidade das intervenções. Dez técnicos
credenciados e três municipais acreditam que o trabalho social estimula o
envolvimento das pessoas com as questões sociopolíticas vinculadas ao seu território;
promove a cidadania e o protagonismo social. Seis credenciados acreditam que o
trabalho social garante a participação ativa, a mobilização e a organização
comunitárias. Interessante é que nenhum técnico municipal atribuiu essa perspectiva
ao trabalho social. Sete, dos treze credenciados, e quatro, dos cinco técnicos das
prefeituras, disseram que o trabalho social realmente provoca mudanças de
comportamento das pessoas em relação à saúde, ao meio ambiente, aos bens e
serviços disponibilizados nas intervenções, à moradia.
145
Com a fala de Dirce Koga é possível apreender o potencial que o trabalho social tem
enquanto um conjunto de ações capaz de viabilizar o que se apresenta em suas
colocações
faz parte da cidadania a incorporação do território como espaço não somente
de habitação, mas também de vivência e convivência. Significa morar bem,
passear com prazer e segurança, usufruir bem dos serviços. A cidadania
significa vida ativa no território [....]. Assim, parece se fazerem necessárias
novas formas de resgatar o pertencimento ao lugar à cidade. [...] é preciso
que estes territórios exerçam um papel de sujeito e não apenas de objeto das
políticas públicas. [...].
território permite esta consideração das totalidades dos lugares e das
pessoas, das diferenças e das desigualdades, das necessidades e das
potencialidades. Esta visão traz consequentemente à tona a questão da
intersetorialidade não simplesmente como uma soma de programas e
projetos, mas fundamentalmente como um instrumento de mobilização de
recursos e potências locais considerados na sua totalidade territorial (KOGA,
2011, p.117-118 e p. 296 ).
2.4.20 CATEGORIA 20:
Sugestões para incremento do trabalho social no
desenvolvimento urbano
Essa categoria teve o propósito de identificar as observações e sugestões dos
técnicos para o incremento do trabalho social no desenvolvimento urbano. Pressentiase obter desse espaço concedido aos técnicos uma gama de colocações importantes,
de sugestões para o aprimoramento das intervenções sociais e da relação do técnico
com seu objeto de ação. Entre os técnicos credenciados, cinco não fizeram uso do
espaço.
As colocações dos participantes apresentam-se no quadro abaixo.
Quadro 3
Considerações gerais e sugestões dos profissionais para o incremento do trabalho social
CREDENCIADOS
PREFEITURAS
Percebo ao longo de minha experiência que os verdadeiros
efeitos do trabalho social só são realmente sentidos a longo
prazo. Temos um público em programas de habitação
voltados a vida de maneira muito informal e a adaptação a
esta realidade mais formal com normas, regras, deveres e
obrigações dificulta no entendimento de que qualidade de
vida e moradia melhor exige o cumprimento de várias
normas e combinados estabelecidos. A maior dificuldade do
trabalho social nestes programas consiste em favorecer a
Sinto a necessidade dos técnicos sociais terem mais
cursos de capacitação, mais ferramentas de trabalho, e
menos burocracia para a realização efetiva do trabalho
social. Afinal de contas trabalham com pessoas (seres
humanos), fragilizados pois se a família não tem nem
uma moradia digna, ela não tem educação, não tem
saúde, e muitas vezes nem o que comer, já que uma
casa é muito mais do que quatro paredes e um teto.
Desta forma trabalhamos com sonhos, com
146
apreensão destes novos valores e criar neste público novos
hábitos de vida (questionário TCC3).
Uma questão que dificulta o trabalho social é a burocracia.
Tanto na elaboração, como na execução. Diferentes critérios
de acordo com os técnicos que analisam os projetos, demora
na análise dos relatórios parciais e final e consequente
demora no repasse dos recursos (questionário TCC2).
Uma investigação com maior tempo para verificar a real
necessidade da família, mais visitas e orientações; durante
o tempo de pagamento do imóvel durante o tempo de
pagamento deveria ocorrer fiscalização ao menos uma vez
por ano e nessa visita verificar a situação da família e
quando necessário convidá-la a participar dos grupos de
T.T.S novamente, instituir encontros trimestrais com o grupo
de beneficiários 1 ano após a finalização do projeto. Ter a
possibilidade de mais tempo e recurso financeiro para
acompanhar as famílias mais de perto (questionário TCC1).
O programa minha casa minha vida, é um programa que
atende uma população de baixa renda. Uma população sem
acesso a moradia digna, a saúde, a educação, a segurança,
ao transporte, ao lazer. Para a efetivação deste programa
tem-se vários agentes envolvidos. Se estes agentes
cumprirem com os seus compromissos, com certeza este
programa será a menina dos olhos (questionário TCC8)
Penso que não há uma maneira uniforme de se avaliar os
projetos sociais. Relatórios são analisados diferentemente
de acordo com a capacidade técnica do contratante. Uns são
mais exigentes do que outros, muitas vezes despendendose muito tempo para as questões burocráticas, de formatos
de relatórios, do que na realização in loco das ações e
atividades em contato direto com os beneficiários. Muito
obrigado, é muito importante essa pesquisa para uma
melhor qualificação dos profissionais que desenvolvem TS
(questionário TCC9).
possibilidades, e o trabalho social acompanha essas
famílias, desde a visita na sua "casa" , até a casa nova,
é um grande potencializador de mudança na vida
dessas pessoas (questionário TSP1).
Investimento em capacitações para técnicos devido as
dificuldades encontradas na elaboração e execução do
projeto técnico social em habitação. Outro ponto
relevante que precisa ser pensado a nível municipal é a
criação de uma Secretaria e/ou setor específico para
habitação evitando a fragilização do trabalho
(questionário TSP3).
É essencial ao TS que os beneficiários só sejam
incluídos no CADMUT quando receberam as UH por
conta das desistências e problemas para retirar os
beneficiários deste cadastro quando não receberam a
U.H; seria muito proveitoso se o ministério das cidades
montasse uma "equipe itinerante" para visitar as
cidades periodicamente para dar suporte aos técnicos
sociais em seus trabalhos; outra ideia é que a primeira
fase do TS - seleção de famílias parte informativa de
assinatura de contrato, etc; esteja executada e seja
condição para a emissão da ordem de serviço (para o
inicio da obra), e que a partir disso, todas as medições
de obras não ultrapassem percentual de TS realizado;
seria interessante também uma maior quantidade de
eventos como simpósios, congressos, cursos de
capacitação, entre outros. para melhorar a capacidade
profissional dos técnicos e disseminar as trocas de
experiência entre os mesmos e também que fosse
firmado um calendário anual para estes eventos, para
que os técnicos pudessem se preparar para os mesmos
(questionário TSP2).
No decorrer das avaliações sociais das famílias
inscritas no Programa MCMV, foi observado um grande
número de candidatos que possuem imóveis, sendo
constatado, inclusive, que uma pessoa possuía 7 (sete)
imóveis. Outra situação também observada, foi a
omissão de companheiros/cônjuge por um grande
número de mulheres, no intuito de serem incluídas no
critério (de seleção) “mulheres chefes de família”,
sendo tal omissão confirmada em loco/visita domiciliar.
Com essa constatação sugere-se que o quesito “mulher
chefe de família” seja excluído como critério
classificatório, mas observado na avaliação social. Em
relação ao programa como um todo, é de extrema valia
que se tenha mais capacitações e exigência de uma
equipe multiprofissional ( setor de habitação ) por parte
das prefeituras para um bom desenvolvimento do
programa (questionário TSP5).
147
Fator dificultador de maior relevância tem sido a falta de
comprometimento do poder público municipal e despreparo
técnico. Sugestões: estabelecer a co-participação dos
municípios e capacitação técnica conforme os normativos
dos programas (questionário TCC5).
O item do questionário que deu origem a esta categoria constituiu-se de um espaço
para os técnicos fazerem suas considerações, sugestões para o incremento do
trabalho social no desenvolvimento urbano, apontamentos importantes, enfim,
colocações que julgassem pertinentes e necessárias. Mais de uma resposta refletiu o
clamor por capacitação e apontamentos acerca das dificuldades tecnocráticas do
trabalho social que foram atribuídas à “burocracia”, à “falta de comprometimento do
poder público municipal e despreparo técnico” e falta de uniformidade nas análises
dos projetos e relatórios. Reflete aí também um clamor em relação à atenção da
instituição financeira no sentido de oferecer melhor assistência técnica e às prefeituras
o apoio necessário. A ambos, melhor condição de realização do trabalho social no que
tange à descomplexificação de processos. Os apontamentos do questionário TSP5
ratificam as considerações apresentadas nesse artigo relativos aos familismos
amorais e à falta de atitude cívica e à necessidade de se instituir mecanismos de
controle e gestão das políticas públicas. Também ratificam a centralidade da família,
do beneficiário e a ausência de foco no “binômio família-território” ( CARVALHO, 2014,
p. 71).
2.5 Considerações Finais
A discussão aqui proposto teve início com os questionamentos acerca das
potencialidades do trabalho social e das condições institucionais, logísticas,
instrucionais, técnicas e políticas para sua realização no âmbito das políticas de
habitação de interesse social. Pretendia-se responder a algumas questões
relacionadas à sua capacidade de concretizar no território da ação aquilo que lhe é
prescrito, notadamente no que tange ao desenvolvimento sócio-organizativo e à
participação social
e, então, por pertinência indagava-se acerca da capacidade
técnica dos profissionais por ele responsáveis. Mas também nos perguntávamos de
que forma seria possível contribuir na proposição de melhores projetos. Já nos
148
antecipando na certeza de que a pouca efetividade do trabalho social amarra-se a
várias condicionantes, queríamos também saber se as instituições estão preparadas
para um fazer intersetorial, interdisciplinar e aberto à noção de território como
requerido na implementação dos programas de provisão habitacional e do trabalho
social.
Importante resgatar em que contexto esse trabalho se coloca e então caminhar para
algumas considerações que não pretendem e não devem ser conclusivas e sim
alusivas ao desejo de continuar na busca de novas perguntas e novas respostas que
conduzam a novas ações. Esse contexto, do SNHIS e da PNH, abarca mecanismos
de governança e governabilidade que são essenciais à efetividade do trabalho social
como foi dito no capítulo anterior. Pressupõe coparticipação, responsabilidades
compartilhadas, conselhos municipais de habitação atuantes, transparência.
Os mecanismos de governança e governabilidade previstos no SNHIS não se
consolidaram. A gestão do programa é segmentada. Assim, é parte essencial, com
lugar de destaque, a necessidade urgente de que se promova o desenvolvimento
institucional dos municípios, compreendendo conhecimento, processos, pessoas e
logística. As distâncias entre sociedade e governos devem ser encurtadas, os
servidores públicos devem unir seus conhecimentos aos conhecimentos que
genuinamente emergem da sociedade promovendo juntos, governos e sociedade, a
“praxis produtiva” e a “práxis social ou política” transformando “a realidade natural,
física, humana e social a partir do trabalho” e a sociedade por meio dela própria e do
Estado (QUARESMA, 2012, p. 185). Conduzir a gestão social e a gestão pública por
esse caminho, sem assistencialismo e patrimonialismo, rompendo a cultura do favor,
é conciliar técnica, conhecimento e política de maneira construtiva e estruturante em
proveito da democracia e de projetos societários.
Quanto aos profissionais do trabalho social? Suas dificuldades foram expostas.
Constituiu-se aqui um espaço de vocalização de suas angústias, expectativas, visões,
percepções. De seu fazer social. São muitos os obstáculos a superar. Seu campo de
atuação exige esforço hercúleo. Algum investimento no incremento da preparação
técnica dos responsáveis pelo trabalho social está sendo feito a exemplo dos cursos
149
do Programa Capacidades do Ministério das Cidades, gratuitos, na modalidade à
distância. É incipiente essa oferta, mas é aberta à participação.
Cabe-lhes a busca. Inovar, conhecer, estudar, investigar, melhorar sua capacidade
técnica. Se lhes oferece como resultado de sua contribuição nesse estudo, um Guia
de Orientações Metodológicas Para a Intervenção Social para mais um passo nessa
direção. Aos demais agentes cabe a responsabilidade pela governança e o
reconhecimento de que investir no trabalho social é investir na complementaridade de
políticas
e
ações,
nos
arranjos
intersetoriais,
na
interdisciplinaridade,
no
desenvolvimento socioterritorial.
Portanto, tentando responder à pergunta inicial, é possível dizer, de acordo com os
dados da pesquisa, que há no trabalho social um intenso potencial de mediação entre
a norma e o concreto, a prescrição e realidade, de incentivo ao protagonismo, de
mitigador das condições de privação e intercessor na preparação das comunidades
para o exercício do controle social e a formação de comunidades cívicas, para o
incremento dos programas e políticas públicas e acesso a uma cidade democrática,
de direitos e deveres consolidados. O Plano de Desenvolvimento Socioterritorial
proposto na Portaria 21/2014, incorpora a variável território na definição do escopo
dos projetos e traz para o trabalho social uma perspectiva de fortalecimento de sua
capacidade de intervir na realidade e consolidar suas premissas a partir do princípio
da complementaridade de ações em parcerias estabelecidas com outros atores
presentes no território. Os técnicos e as entidades executoras precisam compreender
essa proposta, descobrir e estruturar mecanismos para viabilizá-la.
Existem inúmeros obstáculos a transpor e que devem ser reconhecidos por todos os
agentes que integram o complexo processo de elaboração e implementação de
políticas públicas. A intersetorialidade, a interdisciplinaridade, a complementaridade
dessas políticas e a governança constituem as condições mínimas necessárias à
consolidação do trabalho social como promotor da gestão social e da governabilidade.
Reconhecê-lo dotado das capacidades aqui mencionadas, disponibilizando as
condições mínimas de realização é um passo importante na direção dessa
consolidação. A participação, ponto nodal do trabalho social, é um outro enfoque dado
pela portaria. A comunicação também ganha centralidade quando a questão do
150
trabalho esbarra na necessidade de inovação. É preciso começar a inserir no trabalho
social a perspectiva de utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação,
encurtar tempo e distância, trabalhar com ferramentas visuais.
Nas mãos dos técnicos estão os desafios da criatividade, adaptabilidade, inovação e
metodologias apropriadas. Aos outros agentes envolvidos, resta o apoio e a
estruturação das condições necessárias à sua materialização. Buscar pontos de
intercessão
entre
mercado,
Estado
e
sociedade
para
viabilização
de
empreendimentos melhor inseridos, mais acessíveis, com menor incidência de
verticalização também torna-se questão central.
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156
Capítulo 3
Produto Técnico – Guia de Orientações Metodológicas para o trabalho social
em intervenções de habitação
MITRE, Maristela Jorge1
ARAÚJO, Wânia Maria de2
RESUMO
Este capítulo foi reservado ao produto técnico resultante da pesquisa realizada com
técnicos sociais municipais e técnicos sociais credenciados pela Caixa Econômica
Federal para prestação de serviços técnicos especializados. A pesquisa teve por
objetivo identificar os limites e potencialidades do trabalho social enquanto elemento
integrante dos programas de habitação de interesse social composto por um conjunto
de ações estratégicas voltadas ao desenvolvimento socioterritorial e à
sustentabilidade das intervenções. Este artigo acrescenta algumas considerações
teóricas focalizando as reflexões no campo das práticas sociais daqueles profissionais
e apresenta um Guia de Orientações Metodológicas para Intervenções Sociais. Este
Guia foi elaborada a partir da revisão da literatura, das percepções pessoais da autora
enquanto Assistente de Projetos Sociais na área de habitação da Caixa Econômica
Federal e nos dados apurados na pesquisa de campo. Não há uma pretensão em
dizer que o trabalho social seja uma prática austera, rígida, inflexível, engessada em
ferramentas e metodologias preconcebidas, prescritas por agentes externos à sua
realização. O Guia tem como propósito apresentar modos de intervir na realidadecampo do trabalho social de forma a contribuir com os profissionais do trabalho social.
Embora esteja contextualizado no âmbito dos programas de habitação de interesse
social que integram a Política Nacional de Habitação, espera-se que sua aplicação
seja atemporal e que possa ser estendida a construção de diagnósticos e apreensão
da realidade em toda intervenção urbana que se pretenda emancipatória, mediadora
e construtora de processos participativos e aprendizados coletivos.
Palavras-chave: Trabalho Social, Metodologias de Intervenção social, Projeto Social.
Habitação de Interesse Social.Diagnóstico socioterritorial. Gestão Social.
157
ABSTRACT
This chapter was reserved to the technical product resulting from the research carried
out with municipal social technicians and social technicians authorized by “Caixa
Econômica Federal” for the provision of specialized technical services. The research
aimed to identify the limits and potentialities of social work as a component element of
the social housing interest programs composed by a set of strategic actions towards
the social-territorial development and the interventions sustainability. The article which
composes the chapter adds some theoretical considerations to the ones brought in the
previous articles focusing the reflections in the field of social practices from those
professionals, and presents one Methodological Guideline for Social Interventions.
Aware about the impossibility of exhausting the theme, on the contrary, knowing that
this debate is emerging, it was searched in literature, in the author’s personal
perceptions as Assistent of Social Projects in the housing area of “Caixa Econômica
Federal” and in the data abtained in the research, the theoretical and conceptual basis
to sketch a proprosal which is applicable to the social practice and it’s expected that
other reflections can be expressed and aggregated to this one in a continuous building
process. There’s not a pretension in saying that social work is an austere, strict,
inflexible practice plastered in preconceived tools and methodologies, precribed by
external agents to its accomplishment. Definitely not. The choice of the best
methodology is up to the executor of the intervention in perfect harmony and interaction
with their object, territory, and the people who compose it, with views to the objectives
and goals to reach from constructive processes. Carvalho says that “in the condition
of prescription, the methodology puts on second place and even kills the intentionality;
standardizes and infantilizes the professionals who move the action. Its application
subdues to the context in which it is applied.” (CARVALHO, 2014, p.172). It’s expected,
however, that this guide, structured in the process of completion of the Professional
Master course from the Post-graduation Program of UNA University Centre, can be
put into service of this process of apprehension of the ways to intervene in the social
work’s field-reality. It’s ended in the instrument the objective of contributing with the
professionals in the difficult task of recognizing the best way to do it, making sure that,
even so, the choices may inhabit the threshold of uncertainties which reflect attempts
and mistakes characteristic of relational and dynamic processes found in the reality
and that may require correction of paths and adequacies. Although it is contextualized
in the ambit of the social interest housing programs that integrate the National Housing
Policy, it is expected that its application is timeless and can be extended to the
construction of diagnosis and aprehension of reality in the whole urban intervention
that intends to be emancipatory, mediator, and builder of participative processes and
collective learning can be extended.
Key-words: Social Work, Social Project. Social Interest Housing. Social-territorial
Diagnosis. Social Management.
158
3.1 INTRODUÇÃO
O trabalho social nos programas de habitação de interesse social encontra-se sob a
regência da Portaria 21/2014, publicada em 22 de janeiro de 2014 pelo Ministério das
Cidades. Como componente da política pública de habitação, o trabalho social de que
trata a norma constitui-se de ações a serem realizadas nos territórios onde os
empreendimentos habitacionais são construídos. Dessa forma, estrutura-se em torno
de estratégias que viabilizem, mais do que ações informacionais unidirecionais, a
inserção dos beneficiários71 no processo de produção dos empreendimentos numa
perspectiva socioeducativa voltada ao fortalecimento da capacidade participativa e
sócio-organizativa das comunidades em articulação com outras políticas públicas para
a defesa de direitos, a consolidação de atitudes cívicas, o desenvolvimento
socioterritorial e a sustentabilidade das intervenções.
De acordo com a portaria as ações devem ser realizadas “a partir de diagnósticos
integrados e participativos compreendendo as dimensões social, econômica,
produtiva, ambiental e politico-institucional do território e da população beneficiária”
(BRASIL, 2014, p.5). Almeja-se não só desenvolver entre os beneficiários a
capacidade de acompanhar a implantação dos bens e serviços disponibilizados, como
forma de melhor adequá-los à realidade local e às necessidades identificadas, mas
sua manutenção, ao longo prazo, e a continuidade do processo de defesa de direitos
e exercício dos deveres em todas as dimensões acima citadas.
Nesse sentido, o trabalho social tem a participação como meio e fim de sua
concretude. Entretanto, a defesa que se faz aqui é que esta participação seja
construtiva, engajada e responsável, promotora da gestão social, do controle social e
da gestão democrática, como preceito constitucional. Essa participação pelo viés do
trabalho social não deve ser apenas consultiva e deliberativa, mas voltada a uma
aproximação dos sujeitos numa perspectiva relacional direcionada ao conhecimento,
E assim, promover a ressignificação de “beneficiário” para “destinatário” das políticas públicas de
habitação que na condição de direito, não devem ser postas como benefício, vinculado a uma noção
assistencialista e estigmatizante.
71
159
reconhecimento e construção dos espaços de vivência e convivência (VILLANOVA72,
2013) e consecução de processos cognitivos.
As estratégias de ação do trabalho social, portanto, devem incorporar o componente
territorial pensando-o para além do beneficiário buscando substituir a ação
patrimonialista do Estado para com os destinatários das políticas por relações
horizontais que possam se estabelecer nesse território e que promovam
governabilidade, construções coletivas, processos societários e emancipatórios. Em
se tratando de programas de provisão habitacional, é preciso levar em consideração
as escalas, pois, de acordo com Villanova (2013), “o espaço de morar” se coloca entre
o “espaço monumental” e as “ relações entre os homens” e cria um movimento
dialético de produção e reprodução desses espaços e das relações.
Carlos (2012), ao analisar a “espacialidade como imanente à existência constitutiva
da sociedade” afirma
Tal enfoque aponta para a ideia de que a sociedade, ao produzir-se, o faz
num espaço determinado, como condição de sua existência, mas através
dessa ação, ela também produz, consequentemente, um espaço que lhe é
próprio e que, portanto, tem uma dimensão histórica com especificidades ao
longo do tempo e das diferentes escalas e lugares do globo [...]. A sociedade
se apropria do mundo, enquanto apropriação do espaço-tempo determinado.
Nesse contexto, a reprodução continuada do espaço se realiza como aspecto
fundamental da reprodução ininterrupta da vida. Nessa perspectiva, revelase uma prática social que é e se realiza espacialmente, o que implica pensar
a relação dialética sociedade/espaço ( um se realiza no outro e através do
outro ) e as mediações entre eles (CARLOS, 2012, p.53).
Apreende-se, portanto, a importância de focalizar a ação nas relações e atividades
dos grupos humanos em espaços e realidades mutantes, numa articulação da “teoria
(a produção do conhecimento como ato de compreensão do mundo) e prática (práxis)
em sua indissociabilidade [...]” ( CARLOS, 2012, p.55). De acordo com a autora, tornase então essencial apropriar-se da realidade buscando entender o que seria passível
de transformação como perspectiva de futuro da sociedade.
72
In DUARTE, C.R; VILLANOVA, R.de. Novos olhares sobre o lugar: ferramentas e metodologias,
da arquitetura à antropologia.
160
Portanto, o território ganhou centralidade no trabalho social e com ele vem a ideia dos
sujeitos que o usam e o transformam em seu cotidiano imputando-lhes uma
apropriação interventiva de criação e recriação de significados. Koga busca em Guy
de Méo (1998) um significado para essa ‘territorialidade’ “Ela nos leva à sua lógica
pessoal, ao seu espaço vivido, feito de relatos íntimos, reais ou imaginários junto aos
lugares, relatos enriquecidos por suas experiências, por suas aprendizagens sociais
e espaciais (MÉO, 1998 apud KOGA, 2011, p. 39).
Para consolidar o território como centralidade no trabalho social é preciso, entretanto,
o ajuste das engrenagens que comandam seu funcionamento, ou seja, para a questão
em pauta, seus atores, representados aqui pelos diversos segmentos presentes na
macroárea, devem buscar minimamente uma convergência de objetivos, um ponto de
intercessão que permita direcionar parte de suas ações ao reordenamento social
desse território num propósito de gestão compartilhada capaz de instituir a
complementaridade como princípio essencial da mudança para a universalização de
direitos.
Nesse sentido, este artigo, resultante da conclusão do Mestrado em Gestão Social,
Educação e Desenvolvimento Local, do Programa de Pós-Graduação do Centro
Universitário UNA objetiva apresentar algumas orientações metodológicas voltadas
ao trabalho social como componente dos programas de habitação de interesse social.
Partiu-se da premissa de que o ajuste da engrenagem depende, não só da
interlocução dos diversos agentes, colocando o trabalho social como mediador nesse
processo, mas da premissa de que antes, esse trabalho social deve imbuir-se de sua
capacidade de gerar conhecimento, de provocar uma dinâmica de consolidação das
intercessões (de objetivos, políticas, ações, recursos, saberes ) na promoção de
projetos societários.
3.1 Pré-Produção e contratação do empreendimento
3.1.1 Concepção da intervenção
Reza a norma e o bom entendimento do que seja premissa de sustentabilidade, que
a participação dos beneficiários no processo de concepção e implantação dos
161
empreendimentos de habitação de interesse social seja fundamental para que o
sentimento de pertencer ao processo dê lugar à correta apropriação dos bens e
serviços que serão disponibilizados. Garantir espaços de discussão e proposições
nesse decurso, de forma tempestiva, desde as primeiras tratativas, não será garantia
de atender a todos os interesses, em especial em um contexto de forças antagônicas
sob a autoridade soberana do mercado e das relações patrimonialistas e clientelistas,
mas seguramente promoverá uma melhor adequação das propostas/projetos às
necessidades e expectativas das partes interessadas, conduzindo o processo no
caminho da correta apropriação dos bens e serviços que serão disponibilizados.
Pertencer torna-se condição da apropriação que se quer.
Em se tratando de programas de provisão habitacional, aos moldes de algumas
modalidades do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), em que os beneficiários
ainda não tenham sido definidos 73 , a participação destes logicamente não será
possível. Caberá então aos gestores e à equipe técnica do trabalho social (esta sim,
já deve estar definida e constituída de forma interdisciplinar) garantir a participação
dos grupos representativos dos interesses do público alvo, da população e da
comunidade onde o empreendimento será implantado. Nesse sentido, a orientação
deve ser a de convocar a participação do Conselho Municipal de Habitação,
constituído por determinação da Política Nacional de Habitação exatamente para fazer
essa representação, dos demais conselhos municipais, entidades de interesse,
associações de moradores e movimentos sociais, estes obrigatoriamente com ¼ dos
assentos no conselho, presentes na área do empreendimento e entorno.
O que se propõe nesse modelo de gestão interinstitucional é, mais do que uma
simples “conversa sobre projetos”, mas uma pactuação de princípios, uma
corresponsabilidade, um compartilhamento de interesses, a busca da intercessão,
pois, como a pedra que se joga para o alto, os impactos daquilo que não se planejou
recai sobre todos que com eles não se preocuparam. Na questão urbana, sobre todos
os citadinos. Mais do que mitigar, é precaver, mais do que remediar, é cuidar,
preventivamente, envolver-se com, ao invés de ignorar, afastar-se pensando não ser
73
No PMCMV- Recursos FAR ( Fundo de Arrendamento Residencial ) cabe ao poder público local a
seleção dos beneficiários a qual não se conclui antes do início das obras.
162
parte. Esse é o espírito, essa é a condição para a formação de uma sociedade mais
igualitária, justa, democrática, evoluída e cívica.
Temos um histórico de elaboração de instrumentos de gestão urbana que não são
postos em prática em toda a sua plenitude: Estatuto das cidades, com seus vários
mecanismos de acesso à cidade, os planos diretores, a própria Constituição Federal
com seus capítulos 182 e 183, o Sistema Nacional de Habitação e Política Nacional
de Habitação, ambos com capítulos exclusivos direcionados à habitação de interesse
social, Fundos Locais de Habitação de Interesse Social e Conselho Local de
Habitação de Interesse Social. Todos elaborados com a participação e em
atendimento às demandas dos movimentos sociais.
Enquanto isso, continuamos produzindo cidades espraiadas que, para atender a
interesses privados, não só oneram os cofres públicos na ação de estender a
infraestrutura aos seus confins, como na destinação das periferias dessas cidades aos
mais despossuídos, consolidando o “ urbanismo de risco” (ROLNIK, 2002, p.2). A
estes, não se dá o direito de estar próximo dos polos geradores de renda, de se
locomover com facilidade da casa para o trabalho e do trabalho para a casa. As áreas
que lhes são destinadas para moradia são destituídas dos serviços e equipamentos
necessários ao bom uso e ocupação do território. Nesse sentido, esse território se
fragmenta em seu caráter de espaço do vivido, quase se restringindo ao espaço
geográfico de onde as pessoas se deslocam bem cedo para o trabalho e voltam à
noite, privando-se das relações que ali deveriam estar estabelecidas.
O passo primeiro para fazer frente a esse cenário de segregação socioespacial é
trabalhar para a aplicação concreta dos instrumentos de regulação do uso e
destinação do solo urbano, a exemplo dos supracitados, dialogando com os diversos
segmentos sociais na busca das intercessões diante de tão conflitantes interesses. O
outro, e este sim, se constitui em objeto primeiro do presente estudo, é fazer com que
as pessoas que habitam aqueles territórios longínquos se reconheçam neles. Esse é
um dos grandes objetivos do trabalho social nas intervenções do desenvolvimento
urbano. Na habitação de interesse social, esse trabalho social incorpora esse grande
desafio, o de não só fazer a mediação entre as premissas dos programas de
desenvolvimento urbano, entre a norma e a realidade, mas a remediação naquilo que
163
se consolidou ou poderá se consolidar como problema, dificuldade, carência,
necessidade, demanda.
Assegurar a participação dos diversos segmentos que em algum momento farão parte
da implementação dos empreendimentos habitacionais, ou de intervenção urbana, de
um modo geral, é uma condição premente na busca da inserção social e do
desenvolvimento socioterritorial. As construtoras, loteadores e incorporadores,
instituição financeira, concessionárias, cartórios, prestadores de serviços, executivo,
legislativo, movimentos sociais, conselhos municipais, população, sociedade civil,
todos esses atores precisam iniciar um diálogo urgente para a mitigação dos grandes
problemas urbanos que estamos enfrentando, mas principalmente para a busca de
soluções locais. Sem o caráter tecnocrático como foi o processo de discussão do
estatuto das cidades, ou de elaboração dos planos diretores municipais e dos Planos
Locais de Habitação de Interesse Social (este último determinado pelo Sistema
Nacional de Habitação de Interesse Social (BRASIL. Lei nº 11.124, 2005, Art.12).
De acordo com Paugam ( 2003, p. 9)
Hoje, as orientações da intervenção social ultrapassam a esfera tradicional
da assistência. Pelo fato de elas abordarem o problema da integração, no
sentido sociológico, e consequentemente o problema do vínculo social,
revelam uma das dimensões essenciais das sociedades contemporâneas
[...]. Constata-se, hoje, tentativas de promover um outro modo de intervenção
na realidade que não se baseia exclusivamente no “trabalho social
personalizado”, ou seja, numa abordagem psicologizante da pobreza e das
dificuldades das populações atendidas pelos serviços sociais [...]. Uma nova
concepção da intervenção social esforça-se hoje em completar a ação
individual por uma ação dita “global”, favorecendo a negociação entre
diferentes parceiros para tratar de situações complexas. Sem entrar em
detalhes, é possível afirmar que esse modelo consiste em agir mais sobre o
meio social do que sobre os indivíduos ou grupos. A ação volta-se, então para
o espaço vital, os esquipamentos coletivos dos bairros urbanos socialmente
desqualificados, por exemplo [...], para a animação sociocultural, baseandose frequentemente numa política conjunta de urbanização, de ordenamento
do território [...] (PAUGAM, 2003, p. 276).
Diante da “incompletude do Estado” (CARVALHO, 2014, p. 44) torna-se necessário
chamar as organizações sociais presentes na macroárea, trazê-las para dentro do
trabalho social valorizando as forças endógenas e incentivando hábitos de
cooperação. Mobilizar recursos, conhecimentos, objetivos comuns, e compartilhar
responsabilidades, no rigor do princípio da interinstitucionalidade, é a premissa básica
164
da complementaridade das políticas e ações pela realização de projetos societários
(mais do que comunitários).
Seguramente, esta busca da intercessão permitirá costurar análises e discussões
para a proposição de melhores empreendimentos viabilizando as condicionantes de
sua implantação – localização, projeto de implantação, projetos executivos,
acessibilidades, adequação de serviços e equipamentos necessários, garantias de
preservação da cultura local e de disponibilização de áreas de convívio e lazer da
população destinatária, minimização de impactos e maximização das potencialidades
existentes, fluxo e gestão do processo. Inovar nas propostas de moradia para a baixa
renda e garantir o atendimento daquelas condicionantes para promoção da inserção
social, é premência na hierarquia dos problemas decorrentes das intervenções dos
programas de provisão habitacional.
Não se está, nesse sentido, tratando apenas do universo que se resume ao
empreendimento, conjunto de casas ou apartamentos, mas da escala que se relaciona
à produção do espaço que produz e reproduz as relações que, como diz Carlos,
[...] importa conteúdos e determinações, obriga-nos a considerar os vários
níveis da realidade como momentos diferenciados da reprodução geral da
sociedade em sua complexidade. Obriga-nos a considerar o sujeito da ação:
O Estado, como aquele da dominação política; o capital, com suas
estratégias objetivando sua reprodução continuada ([...] e suas articulações
com os demais setores da economia, como o mercado imobiliário); os sujeitos
sociais que, com suas necessidades e seus desejos vinculados à realização
da vida humana, têm o espaço como condição, meio e produto de sua ação
( CARLOS, 2012, p. 64 ).
Pelo exposto, tão logo se tenha o grupo de beneficiários definido, deve-se providenciar
sua inserção no processo começando por apresentar a metodologia de concepção do
empreendimento, os mecanismos de representatividade adotados, as questões que
foram consideradas para a definição dos produtos que lhes serão entregues (visto que
nesta modalidade de intervenção, em especial, sua participação neste processo não
se fez possível. Quando o é, assim o deve ser). Paralelamente, deve-se organizar um
momento especificamente para que a instituição financeira, que tem atribuições
relativas à liberação de recursos financeiros, acompanhamento das obras e do
trabalho social, assistência técnica, análise de documentos e projetos e geração de
contratos, preste os esclarecimentos necessários acerca do programa, das condições
165
contratuais, das obrigações e direitos das partes no processo desde sua produção até
o pós-obra (BRASIL, 2014; BRASIL, 2005)
Nesse sentido, toda estrutura e mecanismos para garantir transparência, fluxo de
informações, interação e participação é necessária. Quanto antes for possível inserir
as pessoas no processo, melhor. Sugere-se por exemplo um “escritório social”
(BRASIL,
2014,
p.
36)
na
área
de
intervenção
com
assento
para
a
interdisciplinaridade. Nele deve ser colocada a maquete do empreendimento
(sinalizando todo o seu entorno e que, entende-se, foi utilizada como ferramenta do
planejamento), pois, de acordo com Villanova (2013, p. 11, 12)
A maquete para o sociólogo ou para o antropólogo é uma representação fria,
estanque, de formas construídas em que o vivo está ausente, enquanto para
o arquiteto ela diz muita coisa: representação do espaço em sua globalidade,
ela suscita o devaneio, desenvolve sua totalidade, enfrentando o espaço
praticado, vivido [...]. Ela pode ser então uma ferramenta de discussão sobre
o projeto urbano, um suporte para exprimir os usos [...]. Uma ferramenta
buscada pelas oficinas de discussão envolvendo o poder público, os técnicos
planejadores e os habitantes em situações de motivação ou participação. Ela
pode favorecer novos modos de acesso às representações dos atores nas
intervenções urbanas [...]. Ela pode suscitar, para os moradores,
representações que escapam habitualmente a nossos modos de
conhecimento [...] levando [...] à reflexão da microescala, do subjetivo, do
sensível e, no melhor dos casos, do papel ativo do habitante.
A equipe técnica do trabalho social, em interlocução com a equipe de engenharia,
deve integrar-se ao grupo de planejamento e execução desde as fases de concepção,
alinhada também, nos casos de empreendimentos com mais de 500 unidades, com
Grupo de Análise de Empreendimentos, responsável pelo Relatório de Diagnóstico da
Demanda por Equipamentos e Serviços Públicos e Urbanos, previstos na Portaria
518/2013, do Ministério das Cidades, trabalhando de forma integrada ( BRASIL,
2013).
3.1.2 Diagnóstico socioeconômico e seleção de beneficiários
Qual o sentido do diagnóstico? Por que empregar um termo médico para as atividades
de planejamento das políticas urbanas? Por que seu uso pelos profissionais do
trabalho social, pelos arquitetos e urbanistas.
Villanova (2013) apresenta esses
166
questionamentos que lhe foram feitos por Francois Laplatine e ela própria traz
importantes considerações acerca da questão no sentido de que esse emprego
representa “tão somente a continuidade de uma longa história entre o pensamento
higienista e a arquitetura” [...] que “faz do habitat degradado um corpo doente” (
VILLANOVA, 2013, p. 209 ). A autora então complementa dizendo que “a mobilização
de um saber especializado na realização de um diagnóstico instaura, de imediato, uma
relação assimétrica entre o sujeito doente e aquele que sabe nomear e prescrever
medicamentos” (VILLANOVA, 2013, p. 209 ).
Nesse sentido, para conhecer os destinatários das políticas públicas é necessário que
eles próprios se apresentem. Deixar que eles contem suas histórias de vida, sua
relação consigo mesmos, com a família, com a comunidade, com o trabalho, com seus
sonhos e frustrações, com suas doenças e suas vocações, com o bairro, a cidade, é
portanto horizontalizar a relação e despertar seres adormecidos na ação
assistencialista e patrimonialista, na discriminação e na segregação social que
reprimem os espaços de vocalização. É buscar a “legitimidade do diagnóstico” (
VILLANOVA, 2013, p. 2011 ).
De acordo com Paugam ( 2003 ), muitas famílias frequentam os serviços de
assistência social contra sua vontade74, às vezes por desemprego prolongado e falta
de perspectiva de recolocação e “precariedade das condições de vida”. De acordo
com o autor, “o sentimento de serem inúteis podem levar algumas dessas pessoas a
romper totalmente com a sociedade” ( PAUGAM, 2003, p. 31 ). Nesse sentido,
ratificando as ponderações acerca da legitimidade do diagnóstico, é necessário que
os indivíduos que compõem o público alvo das políticas de habitação expressem
“sentimentos subjetivos acerca da própria situação que
esses indivíduos
experimentaram no decorrer de suas experiências sociais, e, enfim, as relações
sociais que mantém entre si e com o outro” ( PAUGAM, 2003, p. 47 ). É o que o autor
chama de “sentido vivido, ou seja, o sentido que essas populações atribuem à sua
existência e ao lugar que ocupam na sociedade” (PAUGAM, 2003, p. 47 ).
74
Em uma pesquisa que o autor realizou na França, ele estabelece três tipos de população segundo a relação
mantida com a assistência social: “os fragilizados, os assistidos e os marginalizados”, distinguindo as respectivas
experiências vividas.
167
Apreender que a moradia tem primazia na escala de valor, que um endereço
referencia, o endereço tem o poder de inserir ou reinserir indivíduos na sociedade, e
que o seu fim último é exatamente promover o sentimento da segurança como
premissa da autonomia, não cabe no diagnóstico para provisão habitacional uma
relação de perpetuação da condição de dependência e manutenção da assistência,
mas uma possibilidade de alavancagem de processos de rompimento dos indivíduos
com a condição de assistidos. Favorecer a implementação de um novo modelo de
intervenção, em substituição ao que Paugam ( 2003 ) chama de “trabalho social
personalizado ( Paugam, 2003, 276), é “[...]atenuar os efeitos indesejáveis da
assistência, sobretudo os que se referem à atomização e à rotulação das famílias
desfavorecidas” (PAUGAM, 2003, p. 276 ).
Paugam (2003) apresenta os instrumentos que utilizou em sua pesquisa realizada na
França sobre o perfil da nova pobreza indicando um agrupamento dos dados
levantados junto às famílias que pode ser incorporado aos nossos diagnósticos
habitacionais e que abordam “a trajetória residencial; a trajetória socioprofissional; a
vida familiar; as relações de vizinhança; os ritmos cotidianos; o tempo livre”; a
“reputação” da comunidade” (reputação da cité) ( PAUGAM, 2003, p. 75 ). No grupo
de perguntas direcionado às relações do entrevistado com o território ele focaliza
questões relacionadas com eventuais conflitos entre os habitantes da comunidade,
porque razões elas ocorrem e se são duradouras; existência de pequenos grupos no
interior da comunidade, como se formaram, comportamentos dos membros da
comunidade, usufruto de equipamentos, participação do entrevistado em associações
de moradores (PAUGAM,2003, p.314). Essas perguntas ajudam a suscitar a
percepção do beneficiário em relação ao seu bairro, à sua comunidade e a construir
proposições de intervenção.
Ressalta-se a importância de se realizar a análise e interpretação dos dados obtidos
nas entrevistas, questionários e observações de forma interdisciplinar com a
participação dos conselhos municipais de habitação e de assistência social. E nesse
sentido, os técnicos precisam estar atentos não às respostas que se irá ouvir, mas à
escuta, ao processo, aos contornos da relação que se está estabelecendo entre quem
pergunta, quem responde, como responde, e o que o ambiente diz sobre aquilo que
168
se está perguntando, buscando perceber “os sentidos atribuídos pelos indivíduos
entrevistados às suas condutas e às suas experiências” ( PAUGAM, 2003, p. 85).
Para Paugam (2003), muitas vezes os sujeitos não dizem o que querem dizer, mas
aquilo que acreditam que os entrevistadores gostariam de ouvir. O componente
relativo à trajetória de vida e a variável territorial presentes nos grupos de perguntas
propostos por Paugam permitem estabelecer um outro olhar sobre a condição do
indivíduo e da família na comunidade. Com atenção no processo de análise, os
técnicos tormam-se capazes de identificar como ele a vê, mas sobretudo de instigar
um processo de reflexão sobre como também o indivíduo e a família se veem nela.
3.2 Diagnóstico socioterritorial
Sob regência da Portaria 21/2014, publicada pelo Ministério das Cidades, o trabalho
social nos programas de habitação de interesse social passa a incorporar o
componente territorial no escopo de seus instrumentos de execução. Nesse sentido
as equipes técnicas precisam verter seu olhar sobre a macroárea da intervenção que,
de acordo com a portaria, engloba
a poligonal dos empreendimentos compreende todo o território da
intervenção e constitui-se de “região relativamente homogênea de
vulnerabilidades e riscos sociais, que inclui uma ou mais áreas de intervenção
física, próximas e seu entorno com o qual tal(ais) área(s) de intervenção
interage(m) para acesso a serviços e equipamentos públicos, ao mercado de
trabalho, a organizações sociais (comunitárias, ONGs e movimentos
sociais)”. BRASIL, 2014, P. 54.
Trazer a macroárea para dentro do trabalho social significa aproximar os diversos
setores que ali atuam para pensarem um projeto societário comum, e de forma
conjunta, numa perspectiva de retotalização da ação ( CARVALHO, 2014, p.169 ) e
integração do território. Mas isso não é tarefa fácil, requer sinergia e amplitude de
visão. Olhar para além dos beneficiários, para fora dos projetos, para fora do
empreendimento, e de seu núcleo executor.
O Plano de Desenvolvimento Socioterritorial ( PDST ) previsto na Portaria 21 tem esse
propósito de reconhecer na macroárea as potencialidades do território, considerando
169
“as dimensões social, econômica, produtiva, ambiental e político-institucional”
(BRASIL, 2014, p. 5) e promover arranjos intersetoriais e interinstitucionais para a
articulação e a integração de recursos, políticas e ações. Seu propósito é o de
conjugar ações durante a execução do trabalho social e garantir a entrega dos
produtos desse trabalho a outras instituições existentes na macroárea e que possam
dar continuidade às intervenções como uma estratégia voltada ao desenvolvimento
contínuo das comunidades.
A ideia é inserir no cronograma do trabalho social os projetos e ações desenvolvidos
por outras instituições presentes no território e que permitam a continuidade da
intervenção iniciada no trabalho social, visto que o setor privado e as entidades do
terceiro setor investem em ações de responsabilidade social com estrutura própria
para tal objetivo e recursos oriundos de leis de incentivo e outros fundos (como Fundo
a Infância e da Adolescência ( FIA ), leis de incentivo à cultura, ao esporte e à
aprendizagem) ( BRASIL, 2010, p.268-273 ), além de recursos próprios. Muitas vezes
faltam-lhes projetos e comunidades aptas ao investimento.
Entretanto, tais premissas exigem a realização de um criterioso diagnóstico
socioterritorial que não deve ser realizado sob o olhar exclusivo da equipe técnica,
mas a partir de uma construção coletiva que valorize a perspectiva sociorrelacional
presente no território. Identificar quais os segmentos estão presentes ali, qual sua
política de relacionamento com as comunidades nas quais estão inseridas, quais os
projetos e ações são realizados em favor dessas comunidades, com que recursos e
garantir os arranjos intersetoriais e interinstitucionais torna-se premissa da
consolidação do PDST no território.
Por sua vez, é preciso também inserir as próprias comunidades no processo. Os
beneficiários devem trazer suas impressões, suas expectativas, suas visões. Construir
o olhar compartilhado é a grande missão do diagnóstico socioterritorial. Como afirma
Villanova,
o diagnóstico deixou de ser o apanágio de governantes e especialistas, pois
pode ser realizado também pelos moradores, que têm um papel a
desempenhar. Estes se tornam sujeitos e não mais objeto do diagnóstico,
aprisionados numa relação de dependência (VILLANOVA, 2013, p. 210 ).
170
O compartilhamento do olhar na realização de diagnóstico socioterritorial participativo
é eficaz do ponto de vista da concertation, do aspecto dialógico intrínseco. Permite a
apropriação e a “reapropriação do espaço com que o habitante se identifica” (
VILLANOVA, 2013, p.224 ). Um desafio que demanda método, comprometimento,
interdisciplinaridade e cuidado. Trata-se de abrir espaço à fala, à vocalização,
portanto, saber ouvir, saber ‘fazer a leitura’ do que se fala com os olhos, nas
percepções dos participantes, nas manifestações que emergem em suas mais
diversas formas requer sensibilidade.
As metodologias de intervenção neste caso devem voltar-se à percepção da
necessidade de uma interação do indivíduo com o território e vice-versa, dos
indivíduos entre si, dos indivíduos com as equipes, das equipes com os indivíduos,
dos segmentos e atores, num processo dialético e dialógico. Os profissionais devem
estar atentos para perceber as posturas políticas, as atitudes cívicas e não cívicas, os
desejos, as expectativas, os sonhos, as relações, as frustrações, as interações e,
sobretudo, as potencialidades que emergem do processo. A sensibilidade do
profissional que irá empregá-las é que instituirá seu valor enquanto instrumento da
intervenção social.
De acordo com Duarte75 ( 2013 ), ao adotar determinados métodos de intervenção
arrisca-se a que os participantes ajam ou respondam o que suponham que o
profissional queira ver e ouvir, ao tempo em que todo o resto diz diferente. A autora
afirma
‘O que você espera, o que você gosta, como gostaria que fosse?’
perguntávamos a nossos informantes, que imbuídos de boa vontade,
pareciam por vezes responder o que supunham que o pesquisador gostaria
de ouvir. Ao mesmo tempo, os móveis de suas casas, seus objetos, suas
paredes, seus telhados ‘falavam’ junto, exigindo também uma leitura e,
consequentemente, abordagens e métodos para essa ‘escuta ( DUARTE,
2013, p. 32 ).
Essa tarefa exige muito da equipe técnica. Exige olhar atento, exige método,
ferramentas próprias, interdisciplinaridade e capacidade dialógica. Certamente não
será uma tarefa fácil, como também não se deve ter a expectativa de solucionar tudo
75
In DUARTE, C.R; VILLANOVA, R.de. Novos olhares sobre o lugar: ferramentas e metodologias,
da arquitetura à antropologia.
171
em um único tempo. É uma construção, um processo de desenvolvimento da
capacidade de reflexão, de conhecimento e reconhecimento de si, do outro, do
ambiente e de si no ambiente. Essa é, sem dúvida, premissa essencial para despertar
nos indivíduos as percepções de pertencimento que geram comprometimento,
confiança, responsabilidades e condição indivisível para a consecução da gestão
social e da governabilidade. Demanda a superação de muitos obstáculos, inclusive
aqueles relacionados à necessidade de transparência, gestão da informação, apoio
institucional, governança e capacidade técnica.
Como contribuição técnica ao desenvolvimento das capacidades, apresenta-se neste
artigo um conjunto de ferramentas que, pretende-se, possa ser empregado pelos
profissionais do trabalho social na difícil tarefa de promover o desenvolvimento
socioterritorial, a participação e a gestão social. Este guia foi elaborado a partir da
análise comparativa das normativas e dos resultados da pesquisa de conclusão de
Mestrado do Programa de Pós-Graduação do Centro Universitário UNA, a qual
permitiu conhecer as limitações técnicas e as dificuldades enfrentadas pelos
profissionais e o que vem sendo realizado na prática. Vislumbra a adoção de métodos
e técnicas mais condizentes com o fortalecimento de processos participativos e
cognitivos, fazendo-os coesos e consistentes, e promotores da sustentabilidade das
intervenções, fim supremo do trabalho social.
3.3 Ferramentas para a intervenção social
O trabalho social como componente dos programas de habitação de interesse social
tem no território seu campo de ação e nos destinatários dos programas sua finalidade.
Conjugar esses dois elementos torna-se então objeto do trabalho social. Nesta
perspectiva, o trabalho social abre-se para uma ação totalizante de fortalecimento das
potencialidades locais e de construção coletiva que tem aproximação direta com a
práxis social como ação política de dimensão dialógica. O trabalho social nesse
sentido, adquire, de forma dialética, a capacidade de fomentar a gestão social e a
proposição de projetos societários ao tempo em que promove no território espaços de
cidadania que por sua vez regam os caminhos da gestão social. Resta então a
pergunta: Como materializar essa capacidade do trabalho social de promover esses
processos construtivos no âmbito de sua área de atuação? Que metodologias adotar?
172
Como intervir na realidade garantindo a consecução de suas premissas e seus
objetivos?
A escolha dos métodos, técnicas e ferramentas a empregar nas intervenções sociais
é arbitrada ao agente executor e isso está claro, não só no senso comum, mas nas
orientações normativas que regulamentam o trabalho social. A equipe técnica,
conhecendo a realidade, a dinâmica do território, o perfil da população envolvida, as
características da intervenção, objetivos do projeto, recursos e prazos disponíveis é
que irá definir que caminho seguir. Não cabe a agentes externos tentar propor as
metodologias próprias. Presume-se, entretanto, que nenhum técnico se negaria a
conhecer ou ter a seu dispor uma “caixa de ferramentas” em apoio ao seu trabalho,
principalmente quando se tem em mãos dados que demonstram as dificuldades que
os técnicos sociais têm em relação à definição das metodologias de intervenção social
voltadas ao trabalho social em habitação.
Ressalta-se que não se tem a pretensão de engessar a prática social, transformá-la
em um receituário transmutável, replicável em qualquer território, de forma estéril e
fechada em si mesma, transformando o meio em fim. Pretende-se sim, disponibilizar
uma caixa de ferramentas que podem ser utilizadas em determinadas situações sob
a condição de sua adaptabilidade ao seu objeto.
Este guia pretende, portanto, visa a contribuir no sentido de apresentar orientações
metodológicas e ferramentas para a intervenção social em programas de provisão
habitacional com foco na realização de atividades dialogadas, diagnósticos
participativos e na implementação de atividades socioeducativas voltadas ao
desenvolvimento do território, ao tempo em que se ressalta toda metodologia é sujeita
a adaptações ao contexto no qual se pretende empregá-las.
O segmento que deu origem às orientações aqui contidas foi o do trabalho social
desenvolvido nos programas de habitação de interesse social contidos na Política
Nacional de Habitação, sob a regência da Portaria 21/2014. Entretanto, espera-se que
as orientações metodológicas e as ferramentas disponibilizadas neste guia, possam
ser aplicadas em outros programas de intencionalidades.
173
O trabalho social no contexto aqui proposto assume um caráter de promoção de
processos cognitivos acreditando que a experiência do vivido promove a percepção
de sentidos e, portanto, de significados. Essa percepção muito se aproxima do
princípio da etnografia, que tem como objeto um “conjunto de significantes com que
os eventos, fatos, ações e contextos são produzidos, percebidos e interpretados [...]
(DUARTE, 2013, P. 31).
As proposições relacionadas à etnografia no sentido de “captar a dimensão da cidade
sensível” (DUARTE; VILLANOVA, 2013, p; 9 )
muito se aproximam das novas
perspectivas do trabalho social que demandam uma incursão de “experiência
sensorial” ( DUARTE; VILLANOVA, 2013, p; 9 ) do território não só para identificá-lo
mas para promover sua integração e seu desenvolvimento como propõe a Portaria
21/2014. As autoras fazem uma aproximação da antropologia com a arquitetura, num
convite à interdisciplinaridade e a interação da técnica com os saberes genuínos, da
teoria com a prática, dentro das possibilidades existentes nas localidades da
intervenção. De acordo com Duarte; Villanova (2013),
as ferramentas “foram concebidas” [...] “para agir sobre o espaço construído
com seus usurários [...] na intenção de renovar o olhar sobre os espaços de
vida, o espaço doméstico, a morada, o bairro, a cidade em interação do vivido
com o construído” [...]. Apresenta técnicas de compilação de narrativas,
desvendando os desdobramentos possíveis da cidade – da objetivação
formal ao sensível subjetivo, do programado ao espontâneo – e consiste num
convite à multiplicidade de olhares.
Entretanto, para garantir a eficácia das metodologias adotadas, é preciso que se tenha
“um amplo conhecimento da realidade territorial, um conhecimento sobre o perfil da
população e de suas relações no território, um amplo levantamento dos serviços e
programas [...]” ( TABOADA, 2006, p.2). É necessário também que o profissional
garanta o conhecimento teórico necessário à aplicação dos métodos e técnicas
escolhidos e não abdique da dimensão ético-política, valorizando os saberes
constituídos. De acordo com Carvalho ( CARVALHO, 2014, p.170-173).
é a metodologia que costura e assegura a intencionalidade e a efetividade
social almejada e estabelece um ordenamento da ação, sustentado por um
quadro referencial constituído de aportes teóricos e da experiência
acumulada [...]. O rigor da construção metodológica e a construção de
percursos objetivos da ação não podem estar dissociados da realidade [...].
Uma metodologia de ação reconhece totalidades e particularidades exigindo
174
um olhar dialógico entre o todo e as partes, entre o singular e o coletivo.
Pressupõe, assim, pensar a realidade como processo [...]
É nessa perspectiva da aproximação dialética entre teoria e prática, singular e
coletivo, produção e reprodução das relações, do território, na dimensão micro e
macro, que então se apresentam as ferramentas de intervenção social para a prática
do trabalho social nos programas de desenvolvimento urbano, considerando os
sujeitos inseridos em seu contexto, na vida coletiva e cotidiana em dado território (
CARVALHO, 2014, p. 176).
3.3.1 Maquetes
A maquete do empreendimento (sinalizando todo o seu entorno e que, entende-se, foi
utilizada como ferramenta do planejamento), é uma ferramenta de representação e de
significação do espaço. Construída de forma dialogada conjuga o imaginário das
pessoas e provoca a reflexão acerca de desejos, possibilidades, limites. Deve ser
trabalhada em espaços que permitam uma movimentação das pessoas em torno dela.
Sugere-se a adoção do “Escritório Social” ( BRASIL, 2014, p.17) como seu ponto de
apoio. De acordo com Villanova (2013, p. 11, 12)
A maquete para o sociólogo ou para o antropólogo é uma representação fria,
estanque, de formas construídas em que o vivo está ausente, enquanto para
o arquiteto ela diz muita coisa: representação do espaço em sua globalidade,
ela suscita o devaneio, desenvolve sua totalidade, enfrentando o espaço
praticado, vivido [...]. Ela pode ser então uma ferramenta de discussão sobre
o projeto urbano, um suporte para exprimir os usos [...]. Uma ferramenta
buscada pelas oficinas de discussão envolvendo o poder público, os técnicos
planejadores e os habitantes em situações de motivação ou participação. Ela
pode favorecer novos modos de acesso às representações dos atores nas
intervenções urbanas [...]. Ela pode suscitar, para os moradores,
representações que escapam habitualmente a nossos modos de
conhecimento [...] levando [...] à reflexão da microescala, do subjetivo, do
sensível e, no melhor dos casos, do papel ativo do habitante.
3.3.2 Croqui de campo
O “Croqui de Campo é uma ferramenta utilizada na pesquisa etnográfica por
arquitetos, antropólogos, sociólogos, é, de acordo com Duarte ( 2013 ), “muito mais
do que ilustração. Ele se transforma na própria descrição” ( DUARTE, 2013, p. 35),
uma vez que permite ao observador registrar suas impressões enquanto desenha,
175
conscientizando-se do que lhe chama a atenção. Mais utilizada por arquitetos “para a
descrição espacial dos eventos e sua verificação física no ambiente” ( DUARTE, 2013,
p. 36),
essa ferramenta pode ser utilizada tanto no trabalho de observação quanto
de interpretação imediata” ( DUARTE, 2013, p. 36), De acordo com a autora, o Croqui
de Campo consiste em um produto gráfico da observação, constituído de desenhos
arqutetônicos, rabiscos, esquemas [...] é muito mais do que ilustração.
Sua adaptação para o trabalho social deve ser feita com a participação de equipes
interdisciplinares, com participação notadamente de arquitetos.
3.3.3 Arquivo mnemônico do lugar
De acordo com Duarte (2013),
essa metodologia privilegia as narrativas dos moradores da cidade que, ao
falar sobre ela, remexem em suas lembranças e externam suas percepções
e lógicas de inserção e interpretação do meio urbano. [...] todas as narrativas
coletadas [...] são encerradas em um mesmo quadro, identificando-se, em
seguida, tanto as metáforas que delas emergem, quanto os esquecimentos,
as lacunas [...]. A cada metáfora, é atribuída uma cor, o que transforma as
narrativas em gráficos coloridos, que poderão [...] ser comparados em termos
de frequência do aparecimento das metáforas, repetição do tema ou
ressignificação do lugar ( DUARTE, 2013, p.38).
3.3.4 Mapeamento de manifestações
Essa ferramenta foi aplicada por Duarte (1993) para o mapeamento das
manifestações de afeto ou desafeto de vizinhos em conjunto habitacional
comprovando a relação entre “excessiva aglomeração e stress urbano” (DUARTE,
2013, p. 41). A metodologia consiste “na espacialização em planta baixa das
manifestações de afeto [...] ou outro evento social ocorrido em campo” (DUARTE,
2013, p. 41).
O método das visitas guiadas, também chamado de método dos itinerários
ou de diagnóstico em processo, é frequentemente utilizado [...]. Ele repousa
sobre o reconhecimento da equivalência da fala do outro, razão pela qual se
consideram a relação que os moradores mantêm com o meio ambiente, o que
relatam como experiências pessoais ou coletivas, e as emoções no momento
em que efetuam o percurso proposto.[...] Alguns percursos se constituem em
uma das maneiras de apreender as grandes sociabilidades de bairro e as
176
relações entre os moradores 76 [...] permite observações comparativas dos
comportamentos sobre, por exemplo, calçadas e pracinhas ( VILLANOVA,
2013, p. 220 ).
3.3.4. Diagnóstico Rápido Urbano Participativo
O Diagnóstico Rápido Participativo-DRUP tem por objetivo identificar, de forma breve
e rápida, informações, sentimentos, expectativas, angústias, percepções, e a partir
dos dados levantados construir, de forma coletiva as proposições para a mudanças
que se deseja implementar. Não se deve atribuir um caráter de “participação
concedida” (SOUZA, 2009, p.36), em que os parâmetros da participação são dados
por uma equipe técnica detentora de uma sabe , mas promover a dinamização do
processo participativo. De acordo com Souza (2009)
Um processo participativo deve proporcionar a oportunidade de autoavaliação de si e da cultura do grupo a que pertence, capacidade reflexiva
sobre os efeitos de vida cotidianos, capacidade de criar e recriar não somente
objetivos materiais, mas, também, e, fundamentalmente, criar e recriar formas
novas de vida e de convivência social. As técnicas de diagnóstico e
planejamento participativo devem valorizar, por sua vez, o processo de
obtenção de informações. É importante que este processo seja, ele mesmo,
um fator de formação e discussão política no seio no seio da comunidade. Os
dados devem ser utilizados, principalmente, pela própria comunidade
(SOUZA, 2009, p.36)
O emprego do DRP como metodologia participativa é o processo de construção do
diagnóstico que deve ser valorizado. Tudo deve ser observado e apropriado pelo
técnico que deve se colocar atento a todos os eventos que se estabelecem durante
sua realização. A comunidade envolvida não tem um papel apenas de fornecer
informações, mas de suscitá-las e participar do processo de interpretação dos dados
e informações. Esse processo pode ser implementado por meio de diversas
ferramentas e técnicas. Entre elas o “Diagrama de Venn”, “Técnica da
realidade/desejo”.
A autora cita aqui a complementação da ação com “observação participante em inúmeras reuniões,
festas e visitas [...] (VILANOVA, 2013, p. 221 ).
76
177
3.3.4.1 Diagrama de Venn
O diagrama de Venn consiste em identificar os atores presentes no território e sua
relação com a comunidade. De acordo com Souza ( 2009 ) nessa técnica as pessoas
vão identificando as entidades que de alguma forma se relacionam com a
comunidade. Uma vez identificadas todas elas, o grupo discute suas atribuições, sua
relação com a comunidade e esses papéis são representados graficamente. Quanto
mais próxima da comunidade, que na representação gráfica deve estar no centro, a
entidade estiver, maior a sua relação com essa comunidade. A dimensão dessa
proximidade também pode ser representada graficamente a partir do uso de figuras
maiores ou menores para cada uma delas (SOUZA, 2009)
Essa é uma ferramenta que pode ser utilizada no processo de elaboração do Plano
de Desenvolvimento Socioterritorial Previsto na Portaria 21/2014.
3.3.4.2 Mapa da Realidade/Desejo ou Realidade/Sonhos
Essa técnica consiste em discutir, a partir de temas previamente acordados, as
expectativas, desejos, sonhos, e os obstáculos à sua concretização. Um mediador é
fundamental para que o processo se construa na confrontação com a realidade. Um
painel deve representar o resultado da construção coletiva buscando a partir disso
refletir sobre as possibilidades de mobilização em torno das expectativas do grupo e
da percepção dos limitadores tangíveis e intangíveis, sobre os quais se tem ou não
gestão e a quem compete fazê-la.
No contexto do DRUP e da realização de diagnósticos socioeconômicos e
socioterritoriais ampliados, existem ainda outras técnicas voltadas à mediação e à
consolidação de processos de cognição e reflexão, como os “Mapas Conceituais,
Nuvens de Palavras e construção de Mapas Colaborativos” “Rodas de Conversa” ou
“Rodas de Diálogo”, Observação Participante, todas mediadoras no processo de
reflexão e cognição em que podem ser abordados diversos temas como “cidadania e
direitos humanos; gênero e direitos humanos; trabalho, cidadania e direitos humanos;
Direitos de cidadania e ciclos de vida (infância, adolescência, idade adulta e terceira
178
idade); Etnia, raça e direitos humanos” (AFONSO; ABADE, 2008, p.5). As visitas
guiadas, o “método ‘dos percursos comentados’ ou do “diagnósticos ao caminhar”,
que permitem o “cruzamento de olhares” técnicos e comunitários para leitura de
determinada realidade, também consistem em metodologias muito adequadas aos
objetivos dos diagnósticos socioterritoriais (como também às ações da Educação
Patrimonial prevista na Portaria 21/2014).
Aos profissionais responsáveis pelas intervenções cabe o olhar crítico e sensível para
identificar qual a técnica que melhor se aproxima das percepções que se deseja
abstrair em cada situação ou etapa da intervenção, responsabilizando-se sempre por
realizá-la de forma sistematizada, compartilhada e de forma interdisciplinar. Garantir
o ‘diálogo’ entre a leitura técnica e a leitura comunitária na construção das percepções
torna-se premissa básica para consolidação dos processos cognitivos e socioafetivos
necessários às mudanças que se deseja implementar. Ressalta-se entretanto a
necessidade de se adotar nas intervenções sociais a utilização das tecnologias de
informação e comunicação (TIC)77.
3.3.4.3 Planejamento Estratégico Situacional
O PES é uma ferramenta de planejamento de ações intersetoriais (e por isso, bem
empregado no Plano de Desenvolvimento Socioterritorial Previsto na portaria
21/2013) que pode ser empregada de forma complementar aos diagnósticos. O PES
tem centralidade na subjetividade dos indivíduos que dotada de características
próprias influencia a forma como esses indivíduos interpretam determinada situação.
Dada a pessoalidade dessas percepções, o método preconiza que a realidade não
pode ser explicada por uma simples descrição (diagnóstico), mas pelas diferentes
interpretações dadas pelos atores envolvidos (apreciação situacional).
A exemplo da proposta de construção de “Cenários Motivacionais” com “interface de aplicativos,
utilizando o Google Maps, apresenta-se, a partir de diagnósticos realizados, as tendências de
transformação urbana do contexto estudado [...]”, com “sobreposição de objetos virtuais ao espaço
real ou físico” (MEDVEDOVSKI; SILVA; SOPEÑA, 2014 , p. 2876).
77
179
De acordo com Teixeira e Paim (2000), no PES deve-se primeiramente identificar e
analisar o problema, definindo os objetivos a alcançar. A partir daí deve-se elaborar
“módulos operacionais” avaliando a “viabilidade de implementação das propostas e
Definição dos indicadores de acompanhamento e avaliação” (TEIXEIRA; PAIM, 2000,
p. 74). Os autores complementam afirmando que
do ponto de vista metodológico inclui análise dos problemas, o desenho da
situação-objetivo [...] que se pretende alcançar no médio e longo prazos, a
definição dos cenários prováveis nos quais se estará atuando no curto prazo
e a formulação dos objetivos propriamente ditos; o desenho das estratégias,
que inclui a definição das linhas de ação, a análise de viabilidade das ações
propostas e a elaboração de projetos dinamizadores para a construção da
viabilidade; a programação, o gerenciamento da execução e a avaliação, o
que corresponde à programação detalhada das ações a serem realizadas,
concomitantemente à condução e ao estabelecimento dos mecanismos de
acompanhamento e avaliação periódica dos resultados alcançados e à
gerência cotidiana da execução das ações propostas ( TEIXEIRA; PAIM,
2000, 72 )
É uma ferramenta que pode ser utilizada para avaliação dos problemas existentes no
território e a forma como esses problemas afetam a coletividade, verificando em que
grau essa comunidade é atingida e quais são as possibilidades de enfrentamento. Sua
aplicabilidade deve ser feita de acordo com a ilustração da figura 2.
Figura 2: Os quatro momentos do PES
180
Fonte: RIEJ;FILHO, 2002, 165.
3.5. Gerenciamento de projetos
3.5.1 Método ZOPP
O Método Zopp (planejamento de projetos orientado para resultados) trabalha com o
princípio da moderação tomando a comunicação como o ponto alto no processo de
gerenciamento de projetos ( Pfeiffer, 2005 ). De acordo com Pfeiffer, “a participação é
facilitada por uma boa comunicação. E se a participação funciona, as decisões são
mais facilmente compreendidas e compartilhadas, o que por sua vez leva a um
compromisso maior com o projeto” ( PFEIFFER, 2005 p. 144).
De acordo com Pfeiffer, No Método Zopp, o Quadro Lógico, ou Matriz de Marco Lógico
ou ainda Martriz de Planejamento de Projeto ( MPP) , pressupõe um planejamento
que toma por base uma análise da situação que se deseja mudar com a intervenção
e deve ser usado desde a fase de concepção do projeto com o objetivo de descrever
os aspectos mais importantes do projeto. Essa ferramenta permite ao técnico avaliar
181
se o projeto está bem estruturado, permitindo um acompanhamento sistemático e uma
avaliação mais objetiva do projeto ( PFEIFFER, 2005).
3.6 Educação patrimonial
Eixo Educação Patrimonial previsto na regulamentação do trabalho social deve
extrapolar a noção do patrimônio enquanto empreendimento ou unidade habitacional
e incorporar a noção de patrimônio em suas variadas manifestações culturais
tangíveis e/ou intangíveis, que reconheçam memória, história, valores, lugares como
fonte
de
conhecimento,
reconhecimento
(de
fatos,
coisas,
vivências),
desenvolvimento sócio-organizativo e construções coletivas a serem apropriadas pelo
trabalho social. De acordo com Carter
A Educação Patrimonial objetiva o estabelecimento de uma relação de afeto
da comunidade pelo patrimônio histórico-cultural, sendo a sua metodologia
aplicável aos mais variados grupos sociais e podendo ter como objeto
qualquer tipo de bem cultura. [...] permite à comunidade reapropriar-se de
objetos, lugares e saberes importantes para o reconhecimento de sua
cidadania (CARTER, 2004, p.38-50)
Nessa perspectiva, além de ações que despertem o sentimento de apropriação dos
bens e serviços disponibilizados pela intervenção, o técnico deverá também realizar
outras que promovam o resgate ou a consolidação das manifestações culturais,
artísticas, hábitos e costumes. Cabe nessa ação atividades que permitam a união de
grupos identitários, que compartilham interesses, vocações, habilidades e que se
identifiquem entre si. Nessa “identificação” compartilhada o grupo é levado a
compartilhar também o aprendizado e desenvolver objetivos comuns (grupalização,
agremiações, rodas de conversa). Essas ações podem evoluir para um projeto maior
de empreendedorismo, gestão social, de criação de espaços para divulgação da arte,
de desenvolvimento socioterritorial.
182
3.7 Desenvolvimento socioeconômico e empreendedorismo
No senso comum, o empreendedorismo está relacionado apenas com a geração de
pequenos negócios, onde empreender é apenas engajar-se em uma atividade
lucrativa qualquer. No trabalho social é possível e pertinente trabalhar com a noção
de empreendedorismo cívico e empreendedorismo social que, por sua vez, faz
interface com o próprio empreendedorismo de negócio, uma vez que, para este é
necessário antes promover a formação ética e cívica dos indivíduos e da coletividade.
Esse empreendedorismo cívico, de acordo com um dos conceitos trazidos por Oliveira
(2004 ) da Foud Schwab, Suíça: "São agentes de intercambiação da sociedade por
meio de proposta de criação de ideias úteis para resolver problemas sociais,
combinando práticas e conhecimentos de inovação, criando assim novos
procedimentos e serviços; criação de parcerias e formas/meios de auto
sustentabilidade
dos
projetos;
transformação
das
comunidades
graças
às
associações estratégicas; utilização de enfoques baseados no mercado para resolver
os problemas sociais; identificação de novos mercados e oportunidades para financiar
uma missão social. [...] características comuns aos empreendedores sociais: apontam
ideias inovadoras e vêem oportunidades onde outros não vêem nada; combinam risco
e valor com critério e sabedoria; estão acostumados a resolver problemas concretos,
são visionários com sentido prático, cuja motivação é a melhoria de vida das pessoas,
e trabalham 24 horas do dia para conseguir seu objetivo social." (OLIVEIRA. 2004,
p.11).
4 Considerações finais
De acordo com Carvalho ( 2014 ) as metodologias de intervenção social não podem
ser reduzidas a meras prescrições para uma aplicação apartada da realidade ,
desconectada do território da ação. Citando GATTI, a autora complementa afirmando
que
nas intervenções de caráter social, há de se considerar o contexto de
implementação e desenvolvimento dos programas em um território que
possui identidade, histórias, relações, necessidades e demandas, porta
experiências e potências, porta projetos. Portanto, exige o reconhecimento
de identidades e trajetórias, exige interlocução com ações simultâneas
183
desenvolvidas por vários outros setores e sujeitos sociais no mesmo território
( GATTI, 2004, apud CARVALHO, 2014, p. 172)
O importante é ter a compreensão de que a construção de espaços comunitários ricos
de conhecimento, sentimentos de pertença e apropriação, postura cívica, enfim, que
a promoção da gestão social requer o olhar atento dos profissionais (com ênfase no
plural para reforçar a necessidade da interdisciplinaridade ) que fazem a mediação
no processo cuidando para que as trocas entre os saberes genuínos, “de quem vive
a realidade” ( CARVALHO, 2014, p.99) e as leituras técnicas sejam totalizantes e
geradoras e aprendizagens ( Carvalho, 2014).
Longe da intenção de esgotar o universo de possibilidades, de métodos e técnicas de
intervenção social, esse guia, modesto, se coloca apenas como um instrumento de
incentivo à curiosidade e à busca de novos caminhos para o fazer social, levando em
consideração que cada ferramenta que se apresenta pode ser adaptada e se
desdobrar em outras técnicas desenvolvidas no calor da própria intervenção e no
processo de interação com o grupo.
Neste artigo foram sugeridas algumas ferramentas, mas não foram disponibilizados
os procedimentos necessários à sua aplicação, deixando assim aos profissionais a
possibilidade da investigação. Desvendar os meios de sua aplicação é algo, portanto
que se coloca aos técnicos, entendendo não haver, apesar de seus preceitos, uma
liturgia para sua aplicação uma vez que, na escolha da metodologia para uma ação
que almeja-se transformadora, os profissionais deverão ter sempre em mente que
“não é possível avançar na intervenção social sem a proximidade dialética entre teoria
e prática. Inovação e compromisso se constroem nesta cumplicidade reflexão-açãoreflexão” (CARVALHO, 2015, p. 174).
Conclusão
No contexto das cidades, onde o processo de produção e reprodução do espaço
urbano reforça as condições de exclusão e vulnerabilidade social impondo aos grupos
sociais menos favorecidos a condição de habitar o longínquo, destituído de espaços
de participação e sem opção de usufruir dos bens e serviços produzidos, torna-se
184
premente garantir a complementaridade de programas e políticas públicas para que
se possa minimamente mitigar as condições de privação advindas desse contexto
socioeconômico que lhes são impostas. Nessa perspectiva o trabalho social constituise num elemento agregador, capaz de promover a intersetorialidade,
a
interdisciplinaridade e a complementaridade das políticas e ações, a participação e a
mobilização social, buscando a intercessão de práticas, objetivos, recursos, para
orquestrar as transformações que se deseja implementar nos territórios.
Para isso, as metodologias de intervenção social que o trabalho social precisa adotar
devem ter centralidade na intencionalidade da ação, consequentemente, nas relações
que se estabelecem no território, valorizando o processo de construção de saberes
para que delas resulte governabilidade e gestão social, tendo como fim último a
consolidação de comunidades cívicas, atuantes e participantes da vida política da
cidade, do bairro, do lugar de moradia. Nesse sentido, a gestão social que o trabalho
social é capaz de instituir permite que os atores repensem suas relações para a
construção de projetos políticos societários contra-hegemônicos e formação de
protagonistas
para
a
sustentabilidade
das
intervenções
e
promoção
do
desenvolvimento socioterritorial contínuo.
A pesquisa que encerra a presente dissertação buscou analisar os desafios e
possibilidades do trabalho social, enquanto elemento integrante e essencial nos
programas de habitação de interesse social, de colocar-se como mediador nessas
premissas. Identificou-se muitas de suas potencialidades e foram reconhecidos seus
limites. Estes residem nas dificuldades enfrentadas pelos profissionais na aplicação
prática dos conhecimentos, e da própria falta de conhecimento teórico e das
metodologias que se aplicam nas intervenções em questão, na aplicação das
metodologias adequadas, na capacidade de gerenciar os projetos de intervenção, na
falta de interesse dos destinatários das políticas em participar das atividades, na falta
de apoio institucional. Verificou-se pelas informações extraídas das pesquisas, a
necessidade de capacitação técnica dos profissionais para o incremento do fazer
social.
Uma grande dificuldade enfrentada pelos profissionais do trabalho social reside na
falta de governança, na ausência de intersetorialidade nas gestões públicas
185
municipais, na postura patrimonialista e assistencialista, centrada na família fora de
seu contexto social, ainda presentes na gestão pública. Mas o executivo não é o único
poder responsável pela governança e pela interface das políticas com a sociedade. É
igual e essencialmente importante que as casas legislativas da esfera municipal,
estadual e federal, como ágoras contemporâneas, se consolidem como espaços de
cidadania, abertas ao debate político, incentivando a participação formal, deliberativa,
organizada, delegando à sociedade, de forma responsável, a faculdade de agir na
discussão e na construção das políticas públicas aproximando-se de suas bases no
pleno exercício de seus papéis e atribuições. Agir como representantes de sua ordem
maior: a comunidade na qual estão inseridas – sem favoritismos, sem clientelismo ou
patrimonialismo, sem o uso do prestígio ou poder político local como fonte de arranjos
políticos e privilégios pessoais. Promover a educação legislativa da população,
portanto, integra esse processo.
Reforça-se ainda a necessidade de se dar mais sentido aos fóruns, conferências,
órgãos colegiados, conselhos para que se consolidem como espaços permanentes
de discussão e proposições na promoção de uma gestão democrática e de
construções coletivas. Os movimentos sociais devem voltar-se às suas bases e
instigar a participação e uma interlocução contínua com o legislativo e o executivo
locais. Essas, são estruturas essenciais para a consolidação da gestão social e do
exercício do controle social sobre as políticas públicas para que os programas, planos,
projetos e o próprio arcabouço legal sejam representativos das demandas territoriais
e objeto de melhoria contínua em prol do desenvolvimento com sustentabilidade.
Cabe ressaltar, entretanto, que essas instâncias, a dos conselhos em especial,
embora estejam no papel de “servir ao Estado”, devem ser mais pragmáticas,
cuidando daquilo que pertence ao comunitário, e menos voluntariosas, pois se está a
serviço primeiro da própria sociedade. E assim ocuparem-se mais de conhecer,
reconhecer e discutir de forma continuada as causas dos problemas, seus
antecedentes e consequências possíveis, buscando fazer a gestão das condições em
que estes se apresentam. Esse exercício relativo ao que é de interesse comunitário
ou de Estado permitirá aos seus agentes, com o tempo, a antecipação de demandas
vindouras contribuindo para promover a eficiência do Estado.
186
A defesa que se faz aqui muito se assemelha àquela experimentada pela ex Secretaria
de Habitação e Desenvolvimento Urbano dirigida por Ermínia Maricato, no nascedouro
do MCidades, entre os anos de 1989 e 1992. Naquela gestão lançou-se o mote
“inverter
prioridades”,
procedimentos
em
referindo-se
realmente
à
transformação
públicos,
“incluindo
do
orçamento
corações,
e
dos
mentes
e
‘especializações’ dos servidores da máquina ‘pública’” (MARICATO, 2011, p.21-22)
para que a cidadania não seja tratada como um “privilégio de classe fazendo-a ser
uma concessão regulada e periódica da classe dominante às demais classes sociais,
podendo ser-lhes retirada [...]” (CHAUI78, 1986, p.54-54, apud KOGA, 2011, p.41).
Para uma sociedade atuante e uma cidadania deliberante, capaz de empreender
reflexões e discussões importantes, é preciso haver um Estado organizado, aberto à
participação popular e sensível às causas sociais provocando de modo contínuo o
“empoderamento social nas decisões coletivas que sustenta a própria democracia”
(SILVA, 2012, p. 22 ). Não um empoderamento concedido por uma benevolência
superior e oriundo de relações hierarquizadas típicas das sociedades patriarcais e
autoritárias, mas resultante de uma repactuação social por meio do qual o cidadão
possa ocupar o centro das relações
e de onde suas demandas, desejos e
necessidades possam reverberar no enfrentamento ao patrimonialismo que institui a
cultura do favor “intrínseco ao próprio funcionamento institucional” ( KOGA, 2011, p.
43).
A superação do clientelismo e do princípio da exceção, que privilegiam o
favorecimento em lugar da universalização do direito e que segmentam o público-alvo
das políticas públicas ( KOGA, 2011 ), depende fundamentalmente de uma profunda
reformulação da cultura institucional no sentido de torná-la capaz de gerir os
processos de tomada de decisão “em nível das partes em conflito” e não em nível dos
elos ( DaMATTA79, 1997, p.107, apud KOGA, 2011, p. 43 ).
Dirce Koga afirma que
78
CHAUI, Marilena. Conformismo e resistência. São Paulo:Brasiliense, 1986.
79
DaMATTA, Roberto. A casa e a rua. 5.ed. Rio de Janeiro, Rocco, 1997.
187
Na cultura institucional presente em organismos governamentais, nãogovernamentais, empresariais, partidários, eclesiais, de movimentos
sociais... enfim, nas formas organizacionais mais diversas, é comum
encontrarmos a prevalência do aspecto relacional sobre o aspecto racional.
Trata-se de um enraizamento tão forte nas relações que chega a naturalizar
práticas iníquas, do ponto de vista da cidadania e dos direitos humanos.
Essa tendência poderia ser observada, como uma alternativa explicativa da
naturalização do clientelismo e do favor na realidade brasileira (KOGA, 2011,
43-44).
Nesse
sentido, é recomendável quebrar paradigmas, Subverter a ordem
patrimonialista enraizada na gestão pública, enxergar a complexidade da questão
urbana e inovar de forma cuidadosa para que o território, constituído de relações, não
se transforme no território da ação estratégica, que reproduz as formas de dominação
do próprio Estado e das grandes corporações e que está cada vez mais presente e
constituindo o arcabouço das políticas públicas e programas habitacionais. Um
cenário no qual “em vez da ação que [...] procura compreender o Outro em suas
circunstâncias, adotam-se intervenções que buscam a rendição do Outro” (RIBEIRO,
2011, p.27 )80 muito presente na formatação dos programas de habitação de interesse
social sobre os quais se desenha essa discussão.
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República, Casa Civil.
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RIBEIRO, A.C.T. Território da sociedade: por uma cartografia da ação. In SILVA, C.A, da (Org.).
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188
Interesse Social – FNHIS e institui o Conselho Gestor do FNHIS. Presidência da
República, Casa Civil.
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_______. Ministério das Cidades. Secretaria Nacional de Habitação. Portaria nº 21,
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de ações intersetoriais para a promoção da saúde e da qualidade de vidaRevi st a
de Administração Pública 6/2000.
190
X. ANEXO
X.1 Anexo I - Parecer consubstanciado do Comitê de Ética em Pesquisa –
CONEP
191
APÊNDICE II
QUESTIONÁRIO AOS TÉCNICOS SOCIAIS DAS PREFEITURAS
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento
Local
Projeto de Pesquisa:
TRABALHO SOCIAL NOS PROGRAMAS DE HABITAÇÃO DE INTERESSE
SOCIAL: análise e proposições para adequações metodológicas
Prezado colaborador, este formulário é parte integrante da pesquisa de conclusão do curso
de mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local, que está
sendo realizado por mim no Centro Universitário UNA, em Belo Horizonte, sob orientação da
professora Dra. Wânia Maria de Araújo. Sua participação neste processo irá contribuir na
identificação das formas como o trabalho social vem sendo conduzido junto aos programas
de Desenvolvimento Urbano e na construção e consolidação deste conceito para uma prática
mais coerente com as diretrizes e premissas dos programas de governo, em especial aqueles
voltados à Habitação de Interesse Social. O conteúdo do formulário está relacionado ao
gerenciamento de projetos e aos métodos e técnicas de intervenção social para a construção
de processos participativos. Aproveite esta oportunidade e contribua. Busque ser verdadeiro
pensando no que efetivamente você realiza e não o que deveria ser realizado por você para
que possamos identificar onde o trabalho social precisa e pode melhorar para a consecução
dos objetivos dos programas de desenvolvimento urbano.
Não é necessário se identificar, basta responder às perguntas abaixo.
Quando julgar pertinente, poderá marcar mais de uma resposta.
192
I – FORMAÇÃO E EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL
1. Sua formação acadêmica
( ) Ciências Sociais
( ) Sociologia
( ) Pedagogia
( ) Serviço Social
( ) Psicologia
( ) Outra. Qual: _______________________________________
2. Você tem especialização?
( ) Não. Se não, pule para a questão 4.
( ) Sim. Se sim responda a questão 3
3. Seu nível de especialização
( ) MBA. Curso: _________________________________________________
( ) Especialização Lato Sensu. Curso: ________________________________
( ) Mestrado. Curso: ______________________________________________
( ) Doutorado
( ) Pós-Doutorado.
4. Na Prefeitura você
( ) é assistente social do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) ou Centro
de Referência Especializado de Assistência Social ( CREAS) e presta serviços para o
setor de habitação quando é necessário elaborar e executar projetos sociais
( ) é assistente social da secretaria de assistência social e presta serviços para o setor
de habitação quando é necessário elaborar e executar projetos sociais;
( ) trabalha com os programas de transferência de renda e dá apoio ao setor de
habitação na elaboração e execução de projetos sociais;
( ) é sociólogo, pedagogo ou psicólogo de setores da Assistência Social e presta
serviços ao setor de habitação na elaboração e execução de projetos sociais;
193
( ) é sociólogo, pedagogo, psicólogo ou assistente social atuando na secretaria de
educação ou outro departamento da prefeitura com função distinta de sua formação e
quando necessário presta serviços na elaboração e execução de projetos sociais na
habitação;
( ) é técnico social com uma das formações acima e atua nos programas de habitação;
( ) é contratado pela prefeitura sempre que é necessário elaborar e executar projetos
sociais para o setor de habitação;
( ) outros. Especifique __________________________________________
_____________________________________________________________.
5. Se trabalha no CRAS ou outro setor da prefeitura, quando é chamado a elaborar
e executar projetos sociais no setor de habitação, você
( ) acumula as atribuições;
( ) fica com dedicação exclusiva ao projeto social e tem equipe de apoio;
( ) acumula atribuições mas tem uma equipe técnica de apoio;
( ) fica com dedicação exclusiva ao projeto mas atua sozinho(a) desde o
diagnóstico
até a conclusão do projeto;
( ) fica com dedicação exclusiva ao projeto, tem equipe de apoio e trabalha de forma
interdisciplinar e intersetorial.
6. Quantos anos de experiência na área de Desenvolvimento Urbano/habitação?
( ) Menos de 01 ano
( ) De 01 a 05 anos
( ) De 05 a 10 anos
( ) Mais de 10 anos
7. Você considera que o seu curso de graduação e especialização lhe
proporcionaram
( ) conhecimento na área de gestão urbana;
( ) conhecimento na área de gestão de projetos sociais;
( ) conhecimento em gestão urbana e projetos sociais;
( ) compreensão da complexidade dos fenômenos sociais;
194
( ) a formação necessária para elaboração e execução de projetos sociais na área de
desenvolvimento urbano;
( ) os conhecimentos necessários para gerenciar projetos sociais;
( ) O conhecimento em gestão urbana e em gerenciamento de projetos sociais foi
adquirido na prática.
( ) não proporcionou conhecimento em nenhuma das áreas.
8. Você considera que o conhecimento relacionado à questão urbana adquirido na
prática ou nos cursos realizados é suficiente para elaborar, executar e gerenciar
projetos sociais de habitação?
( ) Sim.
( ) Não.
9. Você acredita que falta algo para melhor capacitar a atuação dos técnicos
sociais?
( ) Sim. Se sim, responda a questão 10
( ) Não.
10. No seu entendimento lhe falta ou falta aos técnicos sociais em geral
( ) conhecimento teórico;
( ) conhecimento prático, experiência profissional;
(
)conhecimento acerca de métodos e técnicas de intervenção social/mediação
específicos para projetos em habitação;
( ) conhecimento específico relacionado a gerenciamento de projetos;
( ) desvinculação dos métodos e técnicas de cunho mais assistencialistas adotados
na assistência social e nos programas de transferência de renda.
( ) outros. Especifique
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
11. Sente-se mais apto e possui maior experiência em
( ) diagnóstico socioeconômico e territorial;
( ) seleção de demanda/beneficiários;
( ) elaboração de projetos sociais;
195
( ) execução de projetos sociais;
( ) elaboração de relatórios e sistematização de processos;
( ) mobilização e organização comunitária/Processos participativos;
( ) acompanhamento e avaliação de projetos sociais;
(
) gerenciamento, elaboração e execução de projetos sociais com experiência
equivalente em todas as ações acima descritas;
( ) outros.______________________________________________________
II – ELABORAÇÃO E EXECUÇÃO DOS PROJETOS SOCIAIS
12. Quais são suas fontes de consulta para a elaboração e execução de projetos?
( ) leis, decretos, portarias e normas do Ministério das Cidades;
( ) livros didáticos/livros técnicos;
( ) textos, artigos e cartilhas;
( ) assistência técnica da CAIXA
( ) outras consultorias;
( ) projetos elaborados por outros colegas/profissionais da área/de outras
prefeituras;
( ) costumo replicar o mesmo projeto em intervenções diferentes mudando apenas
alguns itens do escopo/conteúdo;
( ) nenhuma;
( ) outros. Quais_____________________________________________________.
13. Qual a sua inspiração para a elaboração do escopo dos projetos?
( ) normalmente busco reproduzir ou adaptar cronogramas de outros projetos já
realizados uma vez que a estrutura e os eixos de atuação não variam. Replico o que
já deu certo em outras experiências;
( ) sigo as instruções e os roteiros predefinidos pelo Ministério das Cidades;
( ) Realizo palestras e outras atividades expositivas aos moldes do que é adotado em
outros trabalhos comunitários executados pelos CRAS e CREAS; não aplico
196
metodologias de intervenção/mediação específicas para projetos sociais em
habitação;
( ) elaboro escopo e cronogramas curtos e “enxutos” pois os projetos baseiam-se
sempre em atividades expositivas que cansam as pessoas;
( ) não sigo roteiros. Busco inspiração na comunidade e na realidade onde o projeto
será implementado. Oriento-me pelo diagnóstico o qual inspira possíveis inovações
metodológicas;
( ) Vou seguindo as determinações contidas nas normas para elaboração dos projetos
propondo ações informativas dentro dos eixos de ação previstos;
( ) construo o projeto em conjunto com as comunidades. Os beneficiários auxiliam no
diagnóstico e na proposição das ações e participam de forma ativa nas etapas do
processo desenvolvendo a própria dinâmica do projeto;
14. Sua maior ênfase na elaboração e implementação dos projetos sociais está
relacionada a
(
) cumprir as formalidades relativas às exigências normativas do Ministério das
Cidades/CAIXA;
( ) cumprir os prazos para garantir a liberação dos recursos financeiros de forma
tempestiva;
( ) cumprir as funções de controle do tipo elaborar atas, relatórios, listas de presença,
fotografias de eventos e atividades para encaminhar à CAIXA;
( ) elaborar e executar projetos simplificados com um mínimo de ações em cada etapa
prevista priorizando a realização de palestras e outras atividades expositivas;
( ) conhecer o projeto construtivo, a área de intervenção, seu entorno e o programa
antes de pensar o projeto social atuando de forma interdisciplinar e intersetorial;
( ) fazer um diagnóstico geral, privilegiando fontes secundárias e a partir daí elaborar
o projeto social;
( ) fazer devolutivas às comunidades envolvidas, se reportar a elas apresentando o
diagnóstico realizado, informando sobre a intervenção, sobre as ações do projeto, o
plano de ação e o cronograma estabelecido;
( ) construir um bom diagnóstico, de forma participativa, discuti-lo com a comunidade
envolvida e, a partir dele, desenvolver de forma coletiva o projeto;
15. Como costuma realizar o diagnóstico?
197
( ) faço o levantamento socioeconômico das famílias por meio do CADÚNICO e outras
informações existentes na prefeitura local;
( ) faço visitas amostrais para levantamento socioeconômico das famílias;
( ) visito todas as famílias para levantamento socioeconômico;
( ) busco parceria com o CRAS/CREAS local para preenchimento de ficha
socioeconômica e me baseio nesses dados;
( ) faço levantamento socioeconômico e territorial a partir de metodologias de
intervenção/mediação para a construção coletiva do diagnóstico;
( ) outros. Especifique.
16. Sente dificuldades na aplicação prática do conhecimento na hora de pensar os
projetos sociais?
( ) Sim
( ) Não
17. Quais as maiores dificuldades na elaboração dos projetos?
( ) falta orientação técnica;
( ) falta conhecimento e experiência;
( ) falta apoio logístico, instrucional e institucional por parte dos demandantes;
( ) roteiros de projetos confusos e complexos;
( ) dificuldades na definição dos itens de custo. Normalmente há mais recursos do que
o necessário para os escopos propostos e por isso nunca sei onde aplicá-los;
( ) é difícil pensar em ações estruturantes para compor o cronograma no contexto dos
projetos, por isso me restrinjo a palestras;
( ) apenas cumpro a exigência e aposto no aspecto tecnocrático do projeto (
executar, registrar as ações com fotos e listas de presença e elaborar os relatórios ).
18. Acredita que a(s) metodologia(s) adotada(s) nos projetos que realiza auxilia(m)
na promoção de qual(is) dos objetivos relacionados ao Trabalho Social abaixo
descritos
( ) participação dos beneficiários nos processos de decisão, implantação e
manutenção dos bens e serviços;
( ) mobilização comunitária;
198
( ) desenvolvimento da cidadania;
( ) articulação de políticas sociais;
( ) inclusão produtiva coerente com o potencial econômico e as características
culturais da região/área de intervenção;
( ) fomento ao diálogo e controle social;
( ) implantação de processos socioeducativos;
( ) parcialmente todos os objetivos acima descritos;
( ) parcialmente alguns dos objetivos acima descritos. Neste caso, quais?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
19. Sente dificuldades na aplicação do conhecimento e das orientações
técnico/normativas na hora de executar os projetos sociais?
( ) Sim.
( ) Não
20. Quais as maiores dificuldades na execução dos projetos sociais?
( ) as comunidades não colaboram, não se interessam pelas questões propostas, só
comparecem nas primeiras reuniões;
( ) falta compromisso das pessoas com a própria cidadania e interesse pelas questões
da coletividade;
( ) desconhecimento das metodologias de intervenção e mediação adequadas ao
trabalho vinculado a programas habitacionais;
( ) faltam mecanismos de promoção da intersetorialidade e interdisciplinaridade e
acabo executando os projetos sozinho (a) ou com um pequeno apoio de mais alguns
funcionários ( o que não chega a ser uma equipe);
( ) as responsabilidades não são compartilhadas;
( ) falta interlocução com a equipe de engenharia e qualquer atraso e/ou paralisação
das obras interfere significativamente no trabalho social dificultando sua execução pois
os beneficiários ficam inseguros com relação ao seu término;
( ) é difícil gerenciar prazos e recursos;
199
( ) é difícil atrair o interesse do público beneficiário ao longo da execução do projeto,
promover processos participativos e mobilização social;
( ) enfrento grandes dificuldades na adoção de mecanismos de comunicação eficazes.
É difícil produzir e fazer chegar à população beneficiária de forma adequada as
informações necessárias.
( ) Só elaboro os projetos e outros técnicos executam.
21. Quais os mecanismos de comunicação você utiliza na execução dos projetos?
( ) carro de som;
( ) faixas em pontos estratégicos da área de intervenção e entorno;
( ) Cartazes em pontos estratégicos da área de intervenção e entorno;
( ) envio cartas aos beneficiários;
( ) envio bilhetes às famílias;
( ) utilizo panfletos e flyers;
( ) celular;
( ) internet;
( ) uso as missas, cultos e eventos locais para as comunicações
necessárias;
( )outros. Quais__________________________________________________.
22. Costuma verificar se as informações estão chegando às pessoas de forma
adequada e tempestiva verificando e cuidando de possíveis ruídos de
comunicação?
( ) Não
( ) Sim; Se sim, de que forma?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
23. Você acredita que o Trabalho Social tenha um potencial transformador?
( ) Sim. Se sim, responda a questão 24 e 25;
200
( ) Não. Se não, pule a questão 24 e 25;
24. Para você, qual a intensidade do poder de transformação de uma realidade por
meio do Trabalho Social
( ) muito intensa
( ) intensa
( ) pouco intensa
25. Onde você acredita que esteja centrado o maior poder transformador do
Trabalho Social?
( ) na oportunidade de se colocar os profissionais da área social em campo atuando
como agentes desta transformação;
( ) nas ações de educação ambiental;
( ) na oportunidade de reunir pessoas explanando sobre temas importantes
relacionados à saúde e higiene;
( ) na proposição de ações voltadas à informação e formação a partir de metodologias
adequadas ao tipo de intervenção a que se vincula o trabalho;
( ) na perspectiva socioeducativa e de formação política para a construção do
protagonismo e da cidadania;
( ) na oportunidade de agir no território.
26. Para você o Trabalho Social nos programas de habitação
( ) de fato promove a cidadania e o protagonismo social;
( ) garante a participação ativa, a mobilização e a organização comunitárias;
( ) estimula o envolvimento das pessoas com as questões sociopolíticas vinculadas
ao seu território;
( ) realmente provoca a mudança de comportamento das pessoas em relação à saúde,
ao meio ambiente, aos bens e serviços disponibilizados nas intervenções, à moradia;
( ) contribui para o fortalecimento das relações de vizinhança e familiar e o vínculo
patrimonial garantindo assim a sustentabilidade das intervenções;
201
( ) não promove participação ativa, não provoca mudanças e não estimula o exercício
do controle social.
27. Nas intervenções de desenvolvimento urbano voltadas à habitação de interesse
social quais as metodologias você considera mais adequadas?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
28. Quais as ferramentas e técnicas costuma usar?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
29. Como busca motivar e envolver o público beneficiário nas atividades, ou seja,
como incentiva a participação, o engajamento e a coesão do público beneficiário
durante todas as etapas do projeto
( ) anunciando que haverá lanche em todas as atividades;
( ) informando que haverá distribuição ou sorteio de brindes;
( ) Outros. Especificar_________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
30. Costuma buscar apoio das pessoas do próprio grupo e/ou entidades locais
para a realização das atividades?
( ) Sim, de pessoas do próprio grupo;
( ) Sim, de entidades locais;
( ) Sim, de pessoas do grupo e de entidades locais;
( ) Não. Porque ______________________________________________________
202
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
31. Você conhece as metodologias de intervenção/mediação mais adequadas aos
objetivos dos projetos sociais e premissas dos programas voltados à
habitação?
( ) Não
( ) Sim. Se sim, quais utiliza e considera mais eficientes?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
32. Que ferramentas utiliza para estabelecer a relação causa e efeito entre os
problemas mais relevantes do diagnóstico?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
33. Que atividades costuma realizar na implementação dos projetos sociais? Tente
responder por eixo de atuação. Se não for possível, responda de forma geral. (
Se for necessário utilize o verso da folha identificando o nº da questão)
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
___________________________________________________________________.
34. Você realiza o monitoramento dos projetos verificando a produção dos
resultados almejados e de impactos?
( ) Não
( ) Sim. De que forma?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
203
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
35. Para você, o que significa concluir um projeto social em habitação?
( ) a entrega e aceitação do relatório final do projeto;
( ) o pagamento/recebimento de todos os produtos e serviços entregues e realizados
( ) a conclusão dos contratos firmados
( ) a desmobilização da equipe
( ) a realização de evento de encerramento
( ) outros.
Especifique___________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
36. Como você enxerga a avaliação final de um projeto social em habitação?
( ) oportunidade de analisar a pertinência das metodologias envolvidas no curso do
projeto;
( ) oportunidade de realizar a prestação de contas e zerar pendências
( ) oportunidade de verificar o que foi alcançado
( ) oportunidade de verificar o grau de eficácia do que foi alcançado
( ) oportunidade de analisar se os esforços aplicados foram adequados e
compensadores
( ) momento de medir as competências dispensadas ao projeto, os desempenhos, o
êxito, as lições aprendidas. Momento de fazer a análise crítica do projeto.
( ) outros. Especifique _________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
37. Para você um projeto social em programas habitacionais atingiu seus objetivos
quando
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
204
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
38. Como todo projeto é finito, há sempre o momento em que a equipe técnica irá
“sair de campo”. É o momento da “transferência” dos bens e serviços
realizados à população beneficiária. Para você, no que consiste esse
momento?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
39. Você prepara e trabalha esse momento da transferência? Se sim, como o faz?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
40. Você tem informação sobre algum tipo de problema que tenha ocorrido nos
empreendimentos após o término do Trabalho Social ou mesmo durante sua
realização que não tenha sido solucionado durante sua realização?
( ) Não;
( ) Sim. Quais?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
___________________________________________________________________.
205
41. Este espaço está reservado para suas considerações, sugestões apontamentos
importantes, enfim, colocações que julgar pertinentes e necessárias.
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
Muito obrigada por sua valiosíssima colaboração!
206
APÊNDICE III
QUESTIONÁRIO PARA OS TÉCNICOS SOCIAIS CREDENCIADOS CAIXA
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento
Local
Projeto de Pesquisa:
TRABALHO SOCIAL NOS PROGRAMAS DE HABITAÇÃO DE INTERESSE
SOCIAL: Análise e proposições para adequações metodológicas
Prezado colaborador, este formulário é parte integrante da pesquisa de conclusão do
curso de mestrado profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local
que está sendo realizado por mim no Centro Universitário UNA, em Belo Horizonte, sob
orientação da professora Dra. Wânia Maria de Araújo. Sua participação neste processo
irá contribuir na identificação das formas como o trabalho social vem sendo conduzido
junto aos programas de Desenvolvimento Urbano e na construção e consolidação
deste conceito para uma prática mais coerente com as diretrizes e premissas dos
programas de governo, em especial aqueles voltados à Habitação de Interesse Social.
O conteúdo do formulário está relacionado ao gerenciamento de projetos e aos
métodos e técnicas de intervenção social para a construção de processos
participativos. Aproveite esta oportunidade e contribua pensando no que efetivamente
você realiza e não o que deveria ser realizado por você para que possamos identificar
onde o Trabalho Social precisa e pode melhorar para a consecução dos objetivos dos
programas de desenvolvimento urbano e como ele já vem contribuindo para a
sustentabilidade das intervenções.
Não é necessário se identificar, basta responder às perguntas abaixo.
Quando julgar pertinente, poderá marcar mais de uma resposta.
207
I – FORMAÇÃO E EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL
1. Sua formação acadêmica
( ) Ciências Sociais
( ) Sociologia
( ) Pedagogia
( ) Serviço Social
( ) Psicologia
( ) Outra. Qual: _______________________________________
2. Você tem especialização?
( ) Não. Se não, pule para a questão 4.
( ) Sim. Se sim responda a questão 3
3. Seu nível de especialização
( ) MBA. Curso: _________________________________________________
( ) Especialização Lato Sensu. Curso: ________________________________
( ) Mestrado. Curso: ______________________________________________
( ) Doutorado.
( ) Pós-Doutorado
4. A empresa foi credenciada
( ) em âmbito municipal. Se marcou esta opção, pule a questão 5.
( ) em âmbito regional. Se marcou esta opção, responda à próxima questão
5. Para a elaboração e execução de projetos em âmbito regional sua empresa
( ) subcontrata outras empresas em âmbito local para todas as fases do projeto;
( ) subcontrata empresas locais para a fase de diagnóstico e posteriormente elabora
e executa o projeto com equipe própria;
( ) elabora o diagnóstico com equipe própria e subcontrata empresas para elaborar e
executar o projeto;
208
( ) subcontrata profissionais autônomos/prestadores de serviços para todas as etapas
do projeto;
(
) subcontrata profissionais autônomos/prestadores de serviços para a fase de
diagnóstico e posteriormente elabora e executa o projeto com equipe própria;
( ) elabora o diagnóstico com equipe própria e subcontrata profissionais
autônomos/prestadores de serviços para elaborar e executar o projeto;
( ) Permanece com equipe própria no município da intervenção para elaboração e
execução do projeto durante todas as etapas desde o diagnóstico até o pós-obra/pósocupação;
( ) Desloca-se para o município e lá seleciona empresa ou profissionais autônomos
para a elaboração e execução do projeto inclusive diagnóstico. retorna ao município
sede da empresa e faz o acompanhamento da execução à distância;
(
) adota outras formas. Especifique
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
6. Há quanto tempo a empresa foi credenciada?
( ) Menos de 01 ano
( ) De 01 a 05 anos
( ) De 05 a 10 anos
( ) Mais de 10 anos
7. Quantos anos de experiência na área de Desenvolvimento Urbano/habitação
você tem?
( ) Menos de 01 ano
( ) De 01 a 05 anos
( ) De 05 a 10 anos
( ) Mais de 10 anos
8. Você responde pela empresa e atua na elaboração e execução de projetos
sociais como Responsável Técnico?
( ) Sim, respondo pela empresa e pela responsabilidade técnica nos projetos sociais;
209
(
) Sim, respondo pela empresa, atuo nos projetos mas não como responsável
técnica;
( ) Sim, sou Responsável Técnico nos projetos mas não respondo pela empresa;
( ) Apenas componho a equipe técnica mas não respondo nem pela empresa, nem
pela responsabilidade técnica nos projetos;
9. Você como Responsável Técnico pela elaboração e execução dos projetos
sociais
(
) elabora e executa os projetos;
( ) elabora e assina os projetos para uma equipe técnica constituída executar;
( ) elabora e assina os relatórios das atividades que a equipe realizou;
( ) recebe da equipe técnica os relatórios de execução e assina junto com elas os
relatórios;
( ) acompanha a execução do projeto fazendo intervenções e pontos de controle com
a equipe quando necessário;
( ) mesmo não executando o projeto vai a campo, participa de algumas atividades,
verifica resultados, impactos, cumprimento satisfatório do escopo e do cronograma
aprovado
10. Na empresa credenciada você
( ) é sócio-proprietário, coordenador/gestor, coordenador de equipe
( ) contratado por projeto
( ) é o responsável técnico respondendo pelos projetos sociais
( ) atua em outros projetos e quando necessário presta serviços na elaboração e
execução de projetos sociais na habitação compondo a equipe;
( ) outros. Especifique _________________________________________________
____________________________________________________________________
11. Você considera que o seu curso de graduação e especialização(ões) lhe
proporcionaram
( ) conhecimento na área de gestão urbana;
( ) conhecimento em gestão urbana e projetos sociais;
( ) compreensão da complexidade dos fenômenos sociais;
( ) a formação necessária para elaboração e execução de projetos sociais na área de
desenvolvimento urbano;
( ) conhecimentos necessários para gerenciar projetos sociais;
210
( ) conhecimento em gestão urbana e gerenciamento de projetos sociais foi
adquirido na prática.
12. Você acredita que falta algo para melhor capacitar a atuação dos técnicos
sociais?
( ) Sim. Se sim, responda a questão 13
( ) Não
13. No seu entendimento, o que lhe falta ou falta aos técnicos sociais em geral?
( ) conhecimento teórico;
( ) conhecimento prático, experiência profissional;
( ) conhecimento acerca de métodos e técnicas de intervenção social/mediação
específicos para projetos em habitação;
( ) conhecimento específico relacionado a gerenciamento de projetos;
( ) desvinculação dos métodos e técnicas de cunho mais assistencialistas adotados
na assistência social e nos programas de transferência de renda;
( ) outros. Especifique
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
14. Sente-se mais apto e possui maior experiência em
( ) diagnóstico socioeconômico e territorial;
( ) seleção de demanda/beneficiários;
( ) elaboração de projetos sociais;
( ) execução de projetos sociais;
( ) elaboração de relatórios e sistematização de processos;
( ) mobilização e organização comunitária/Processos participativos;
( ) acompanhamento e avaliação de projetos sociais;
(
) gerenciamento, elaboração e execução de projetos sociais com experiência
equivalente em todas as ações acima descritas;
( ) outros.______________________________________________________
211
II – ELABORAÇÃO E EXECUÇÃO DOS PROJETOS SOCIAIS
15. Quais são suas fontes de consulta para a elaboração e execução de projetos?
( ) leis, decretos, portarias e normas;
( ) livros didáticos/livros técnicos;
( ) textos, artigos e cartilhas;
( ) assistência técnica da CAIXA ou outras consultorias;
( ) projetos elaborados por outros colegas/profissionais da área/de outras
prefeituras;
( ) costumo replicar o mesmo projeto em intervenções diferentes mudando apenas
alguns itens do escopo/conteúdo;
( ) nenhuma;
( ) outros. Quais_____________________________________________________.
16. Como elabora o escopo dos projetos ( e/ou, caso seja o responsável
técnico/coordenador ) como orienta sua equipe na elaboração)?
( ) normalmente busco reproduzir ou adaptar outros cronogramas de outros projetos
já realizados uma vez que a estrutura e os eixos de atuação não variam. Replico o
que já deu certo em outras experiências;
( ) sigo as instruções e os roteiros predefinidos pelo Ministério das Cidades;
( ) Realizo palestras e outras atividades expositivas aos moldes do que é adotado em
outros trabalhos comunitários executados pelos CRAS e CREAS das prefeituras onde
atuo; não aplico metodologias de intervenção/mediação específicas para projetos
sociais em habitação;
( ) construo o projeto em conjunto com as comunidades. Os beneficiários auxiliam no
diagnóstico e na proposição das ações e participam de forma ativa nas etapas do
processo desenvolvendo a própria dinâmica do projeto;
( ) elaboro escopo e cronogramas curtos e “enxutos” pois os projetos baseiam-se
sempre em atividades expositivas que cansam as pessoas;
( ) não sigo roteiros. Busco inspiração na comunidade e na realidade onde o projeto
será implementado. Oriento-me pelo diagnóstico o qual inspira possíveis inovações
metodológicas.
212
17. Sua maior ênfase na elaboração e implementação dos projetos sociais está
relacionada a
(
) cumprir as formalidades relativas às exigências normativas do Ministério das
Cidades/Caixa Econômica Federal;
( ) cumprir os prazos para garantir a liberação dos recursos financeiros;
( ) cumprir as funções de controle do tipo elaborar atas, relatórios, listas de presença,
fotografias de eventos e atividades para encaminhar à Caixa Econômica Federal;
( ) elaborar e executar projetos simplificados com um mínimo de ações em cada etapa
prevista priorizando a realização de palestras e outras atividades expositivas;
( ) conhecer o projeto construtivo, a área de intervenção, seu entorno e o programa
antes de pensar o projeto social atuando de forma interdisciplinar e intersetorial;
( ) fazer um diagnóstico geral, privilegiando fontes secundárias e a partir daí elaborar
o projeto social;
( ) fazer devolutivas às comunidades envolvidas, se reportar a elas apresentando o
diagnóstico realizado, informando sobre a intervenção, sobre as ações do projeto, o
plano de ação e o cronograma estabelecido;
( ) construir um bom diagnóstico, de forma participativa, discuti-lo com a comunidade
envolvida e, a partir dele, desenvolver de forma coletiva o projeto;
18. Como costuma realizar o diagnóstico?
( ) faço o levantamento socioeconômico das famílias por meio do CADÚNICO e outras
informações existentes na prefeitura local;
( ) faço visitas amostrais para levantamento socioeconômico das famílias;
( ) visito todas as famílias para levantamento socioeconômico;
( ) busco parceria com o CRAS/CREAS local para preenchimento de ficha
socioeconômica e me baseio nesses dados;
( ) faço levantamento socioeconômico e territorial a partir de metodologias de
intervenção/mediação para a construção coletiva do diagnóstico;
( ) Outros. Especifique
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
19. Sente dificuldades na aplicação prática do conhecimento na hora de pensar os
projetos sociais?
213
( ) Sim
( ) Não
20. Quais as maiores dificuldades na elaboração dos projetos?
( ) falta orientação técnica;
( ) falta conhecimento e experiência;
( ) falta apoio logístico, instrucional e institucional por parte dos demandantes;
( ) roteiros de projetos confusos e complexos;
( ) dificuldades na definição dos itens de custo
( ) é difícil pensar em ações estruturantes para compor o cronograma no contexto dos
projetos por isso me restrinjo a palestras;
( ) apenas cumpro a exigência e aposto no aspecto tecnocrático do projeto (
executar, registrar as ações com fotos e listas de presença e elaborar os relatórios ).
21. Acredita que as metodologias adotadas nos projetos que realiza garantem o
alcance de qual (is) dos objetivos relacionados ao Trabalho Social abaixo
descritos.
( ) participação dos beneficiários nos processos de decisão, implantação e
manutenção dos bens e serviços;
( ) mobilização comunitária;
( ) desenvolvimento da cidadania;
( ) articulação de políticas sociais;
(
) inclusão produtiva coerente com o potencial econômico e as características
culturais da região/área de intervenção;
( ) fomento ao diálogo e controle social;
( ) implantação de processos socioeducativos.
( ) parcialmente todos os objetivos acima descritos;
( ) parcialmente alguns dos objetivos acima descritos. Neste caso, quais?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
22. Sente dificuldades na aplicação do conhecimento e das orientações
técnico/normativas na hora de executar os projetos sociais?
214
( ) Sim.
( ) Não
23. Quais as maiores dificuldades na execução dos projetos sociais?
( ) as comunidades não colaboram, não se interessam pelas questões propostas, só
comparecem nas primeiras reuniões;
( ) falta compromisso das pessoas com a própria cidadania e interesse pelas questões
da coletividade;
( ) desconhecimento das metodologias de intervenção e mediação adequadas ao
trabalho vinculado a programas habitacionais;
( ) falta interlocução com a equipe de engenharia e qualquer atraso e/ou paralisação
das obras interfere significativamente no trabalho social dificultando sua execução pois
os beneficiários ficam inseguros com relação ao seu término;
( ) É difícil gerenciar prazos e recursos;
( ) É difícil atrair o interesse do público beneficiário ao longo da execução do projeto,
promover processos participativos e mobilização social;
( ) enfrento grandes dificuldades na adoção de mecanismos de comunicação eficazes.
É difícil produzir e fazer chegar à população beneficiária de forma adequada as
informações necessárias.
24. Quais os mecanismos de comunicação você utiliza na execução dos projetos?
( ) carro de som;
( ) faixas em pontos estratégicos da área de intervenção e entorno;
( ) Cartazes em pontos estratégicos da área de intervenção e entorno;
( ) envio cartas aos beneficiários;
( ) envio bilhetes às famílias;
( ) utilizo panfletos e flyers;
( ) celular;
( ) internet;
( ) missas, cultos e eventos locais para as comunicações
necessárias;
215
( )outros. Quais______________________________________________________.
25. Costuma verificar se as informações estão chegando às pessoas de forma
adequada e tempestiva verificando e cuidando de possíveis ruídos de
comunicação?
( ) Não
( )Sim. Se sim, de que forma?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
26. Você acredita no potencial transformador do Trabalho Social?
( ) Sim. Se sim, responda a questão 27 e 28;
( ) Não. Se não, pule as questões 27 e 28.
27. Para você, qual a intensidade do poder de transformação de uma realidade por
meio do Trabalho Social
( ) muito intensa
( ) intensa
( ) pouco intensa
28. Onde você acredita que esteja centrado o maior poder transformador do
Trabalho Social?
( ) na oportunidade de se colocar os profissionais da área social em campo atuando
como agentes desta transformação;
( ) nas ações de educação ambiental;
( ) na oportunidade de reunir pessoas explanando sobre temas importantes
relacionados à saúde e higiene;
( ) na proposição de ações voltadas à informação e formação a partir de metodologias
adequadas ao tipo de intervenção a que se vincula o trabalho;
216
( ) na perspectiva socioeducativa e de formação política para a construção do
protagonismo e da cidadania.
( ) na oportunidade de agir no território.
29. Para você o Trabalho Social nos programas de habitação
( ) promove a cidadania e o protagonismo social
( ) garante a participação ativa, a mobilização e a organização comunitárias
( ) estimula o envolvimento das pessoas com as questões sociopolíticas vinculadas
ao seu território
( ) realmente provoca a mudança de comportamento das pessoas em relação à saúde,
ao meio ambiente, aos bens e serviços disponibilizados nas intervenções, à moradia
( ) contribui para o fortalecimento das relações de vizinhança e familiar e o vínculo
patrimonial garantindo assim a sustentabilidade das intervenções;
( ) não promove participação ativa, não provoca mudanças e não estimula o exercício
do controle social
30. Nas intervenções de desenvolvimento urbano voltadas à habitação de interesse
social quais as metodologias você considera mais adequadas?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
31. Quais as ferramentas e técnicas costuma usar?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
217
32. Como busca motivar e envolver o público beneficiário nas atividades, ou seja,
como incentiva a participação, o engajamento e a coesão do público beneficiário
durante todas as etapas do projeto
( ) anunciando que haverá lanche em todas as atividades;
( ) informando que haverá distribuição ou sorteio de brindes;
( ) Outros. Especificar_______________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
33. Costuma buscar apoio das pessoas do próprio grupo e/ou de entidades locais
para a realização das atividades?
( ) Sim, de pessoas do próprio grupo;
( ) Sim, das entidades locais;
( ) Sim, das pessoas do grupo e de entidades locais;
( ) Sim, de lideranças locais constituídas ou natas;
( ) Não. Explique porque _______________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
34. Você conhece as metodologias de intervenção/mediação mais adequadas aos
objetivos dos projetos sociais e premissas dos programas voltados à
habitação?
( ) Sim
( ) Não
( ) Se sim, cite a(s) que considera mais adequada(s)
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
35. Que ferramentas utiliza para estabelecer a relação causa e efeito entre os
problemas mais relevantes do diagnóstico?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
218
36. Que atividades costuma realizar na implementação dos projetos sociais? Tente
responder por eixo de atuação. Se não for possível, responda de forma geral.
( Se for necessário utilize o verso da folha identificando o nº da questão)
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
37. Você realiza o monitoramento dos projetos verificando a produção dos
resultados almejados e impactos?
( ) Não
( ) Sim. De que forma?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
38. Para você, o que significa concluir um projeto social em habitação?
( ) a entrega e aceitação do relatório final do projeto;
( ) o pagamento/recebimento de todos os produtos e serviços entregues e realizados
( ) a conclusão dos contratos firmados
( ) a desmobilização da equipe
( ) a realização de evento de encerramento
( ) outros.
Especifique___________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
39. Como você enxerga a avaliação final de um projeto social em habitação?
( ) oportunidade de analisar a pertinência das metodologias envolvidas no curso do
projeto;
( ) oportunidade de realizar a prestação de contas e zerar pendências
( ) oportunidade de verificar o que foi alcançado
( ) oportunidade de analisar se os esforços aplicados foram adequados e
compensadores
( ) momento de medir as competências dispensadas ao projeto, os desempenhos, o
êxito, as lições aprendidas. Momento de fazer a análise crítica do projeto.
( ) outros. Especifique
219
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
40. Para você um projeto social em programas habitacionais atingiu seus objetivos
quando
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
41. Como todo projeto é finito, há sempre o momento em que a equipe técnica irá
“sair de campo”. É o momento da “transferência” dos bens e serviços
realizados à população beneficiária. Para você, no que consiste esse momento?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
42. Você prepara e trabalha esse momento da transferência? Se sim, como o faz?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
43. Você tem informação sobre algum tipo de problema que tenha ocorrido nos
empreendimentos após o término do Trabalho Social ou mesmo durante sua
realização que não tenha sido solucionado durante sua realização?
( ) Não;
( ) Sim. Quais?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________.
220
44. Este espaço está reservado para suas considerações, sugestões para o
incremento do Trabalho Social no desenvolvimento urbano, apontamentos
importantes, enfim, colocações que julgar pertinentes e necessárias ( utilize o
verso da folha, se necessário).
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
Muito obrigada por sua valiosíssima colaboração!
221
APÊNDICE III
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Trabalho Social nos Programas de Habitação de Interesse Social: análise e
proposições para adequações metodológicas
Maristela Jorge Mitre
Prezado Técnico Social, você está sendo convidado a participar desta pesquisa que
tem como finalidade conhecer os limites e potencialidade do Trabalho Social no
desenvolvimento urbano, em especial nos programas de Habitação de Interesse
Social. A pesquisa consistirá da análise das normas a partir das metodologias de
intervenção social adotadas pelos profissionais na implementação de projetos e,
como resultado, pretende-se criar proposições para um melhor desempenho
profissional a serem disponibilizadas como contribuição técnica, que se constituirá de
orientações teórico-metodológicas para o fazer social no contexto em questão.
Além de revisão bibliográfica e pesquisa documental, a pesquisa irá se valer de
questionário autoaplicado contendo questões abertas e fechadas, os quais serão
aplicados junto aos técnicos sociais de prefeituras municipais e profissionais que
prestam serviços para a Caixa Econômica Federal na elaboração e execução de
projetos sociais. Espera-se que esses questionários forneçam algumas respostas que
possam auxiliar na elaboração das orientações teórico-metodológicas pretendidas.
A sua participação nessa pesquisa permitirá ao pesquisador conhecer um pouco mais
acerca das metodologias empregadas pelos profissionais na implementação de
projetos sociais nos programas de provisão habitacional, suas dificuldades na
aplicação prática do conhecimento e das normas e orientações técnicas para a
elaboração e execução dos projetos e os limites e possibilidades do Trabalho Social
na consecução dos objetivos e premissas desses programas.
Antecipadamente lhe será assegurada a liberdade de se recusar a participar ou de
suspender sua participação em qualquer fase da pesquisa, sem lhe acarretar qualquer
prejuízo, e, sempre que desejar poderá solicitar mais informações sobre a pesquisa
222
por meio do telefone (35 ) 9961.4846 ou (3729.6600) ou ainda, se necessário, pelo
telefone do Comitê de Ética em Pesquisa ( 31 ) 35089110.
Esclarece-se que todas as informações coletadas nesta pesquisa serão de
conhecimento apenas do pesquisador e seu orientador. Neste sentido, serão
assegurados todos os procedimentos que garantam a confidencialidade e privacidade
das respostas de forma a resguardar o respondente de todo e qualquer tipo de
constrangimento, desconforto ou risco à sua dignidade, zelando para que as
informações obtidas por meio do questionário não sejam utilizadas de forma
prejudicial aos participantes ou mesmo à categoria profissional dos técnicos sociais.
Tais procedimentos obedecem aos Critérios da Ética em Pesquisa com Seres
Humanos conforme Resolução no. 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.
Reconhece-se que, ao participar dessa pesquisa, não lhe serão concedidos benefícios
diretos, entretanto espera-se que os conhecimentos construídos a partir das
informações obtidas por meio dos questionários e dos estudos realizados permitam
sistematizar os pontos negativos e positivos, limitadores e possibilidades do Trabalho
Social nos programas habitacionais viabilizando proposições que possam ser
colocadas à serviço dos técnicos sociais para uma atuação mais satisfatória e
realizadora na área do desenvolvimento urbano.
Em tempo, esclarece-se que não há qualquer tipo de despesa ou remuneração por
sua participação e, caso seja de seu interesse, poderá obter mais informações acerca
das diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos
na Resolução nº 466, de 12 de Dezembro, de 2012.
Após estes esclarecimentos, solicitamos o seu consentimento de forma livre para
participar desta pesquisa. Portanto preencha, por favor, os dados abaixo solicitados.
Obs: Não assine esse termo se ainda tiver dúvida a respeito.
223
Consentimento Livre e Esclarecido
Tendo
em
vista
os
itens
acima
apresentados,
eu,
__________________________________________________, de forma livre e
esclarecida, manifesto meu consentimento em participar da pesquisa. Declaro que
recebi cópia deste termo de consentimento, e autorizo a realização da pesquisa e a
divulgação dos dados obtidos neste estudo.
__________________________________
Nome:
__________________________________
Pesquisador: Maristela Jorge Mitre
CPF: 489.526.216-20
___________________________________
Orientadora: Dra. Wânia Maria de Araújo
Orientadora
Dúvidas, esclarecimentos, informações, entre em contato com:
Maristela Jorge Mitre - ( 35 ) 3729.6600 - ( 35 ) 9961.4846
Ou
Comitê de Ética em Pesquisa Una: Rua Guajajaras, 175, 4º andar – Belo Horizonte/MG
Telefone: ( 31 ) 3508.9110.
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