ARTIGO ORIGINAL Rev. Psiq. Clín. 28 (6):286-287, 2001 Reabilitação neuropsicológica na doença de Alzheimer Ana Maria Alvarez1 Renata Ávila2 Isabel Albuquerque M. de Carvalho3 Recebido: 12/11/2001/Aceito: 12/11/2001 RESUMO A demência na doença de Alzheimer (DA) é uma moléstia neurodegenerativa e caracterizada por perda progressiva de memória e de outras funções cognitivas, principalmente linguagem. Tais déficits vêm comprometer a qualidade de vida do paciente e seus familiares. Os tratamentos vigentes concentram-se nos sintomas cognitivos e comportamentais, por meio de tratamento medicamentoso e reabilitação neuropsicológica. A intervenção precoce se faz importante, uma vez que o paciente é consciente das dificuldades cognitivas que vem enfrentando e, com ela, torna-se capaz de compreender e compensar tais dificuldades. Dessa forma, o trabalho de reabilitação neuropsicológica das funções mnésticas e da linguagem tem mostrado evidências de impacto positivo no tratamento de pacientes com DA, principalmente quando aliado ao tratamento medicamentoso anticolinesterásico. Unitermos: Alzheimer; Reabilitação; Memória; Linguagem; Cognição; Demência. ABSTRACT Alzheimer’s disease neuropsychological rehabilitation Alzheimer’s Disease (AD) is a neurodegenerative disorder characterized by a progressive loss of memory and other cognitive functions, especially language, which cause a worsen in patient’s daily, social, cultural and occupational activities. Early intervention is extremely important, specially in the first level of the disease, when patients are aware of their cognitive decline and they are able to understand and to adjust themselves into a new situation created through the rehabilitation process. Once there is no specific cure for DA, current treatments focus on the cognitive and behavioral symptoms of drug therapy and rehabilitation treatment to enhance patients and families quality of life. Keywords: Alzheimer’s disease; Rehabilitation; Memory; Language; Cognition; Dementia. A demência na doença de Alzheimer (DA) é uma patologia neurodegenerativa, progressiva, com evolução média de oito a dez anos e de etiologia ainda desconhecida. Caracteriza-se por perda progressiva de memória e de outras funções cognitivas, prejudicando o desempenho do indivíduo em suas atividades diárias, sociais e ocupacionais. Na fase inicial, além do déficit de memória, ocorrem, também, as primeiras alterações de linguagem, contribuindo ainda mais para o comprometimento do cotidiano e da qualidade de vida dos portadores dessa doença. Uma vez que ainda não há tratamento que possa curar ou reverter a deterioração causada pela demência, os tratamentos atualmente disponíveis visam aliviar sintomas cognitivos e comportamentais por meio de medicação; técnicas cognitivas de reabilitação; reestruturação do ambiente; e grupos informativos para pacientes, familiares e cuidadores. A reabilitação neuropsicológica tem como objetivo capacitar pacientes e familiares para lidarem melhor com os prejuízos causados pela doença, fazendo com que estes passem a ter uma vida melhor, com menos rupturas nas atividades comumente realizadas. Para tanto, propõe-se a ensinar, aos pacientes e familiares, estratégias compensatórias e organização para a produção de respostas, propiciando tanto melhora das funções cognitivas, como da qualidade de vida. A literatura atual tem se dedicado a verificar a eficiência das técnicas de desenvolvimento de memória, principalmente daquelas que se baseiam na memória implícita, geralmente intacta; na compensação de déficit de memória explícita, por meio de treino do uso de auxílios externos e internos; e na facilitação da memória explícita residual, através de estratégias de suporte estruturado, tanto de codificação como de resgate. O trabalho de reabilitação de linguagem para esses pacientes tem se voltado à reestruturação e à compensação dos processos de compreensão e emissão. No que tange à compreensão, a orientação de cuidadores e familiares tem sido feita dando ênfase à otimização do processo de comunicação, à manutenção do contato visual e ao treino de criação de imagens mentais sobre o assunto tratado, medidas essas que parecem promover maior sucesso na compreensão da mensagem. As orientações e o treino com enfoque no resgate estruturado por meio de pistas específicas, fonológicas ou semânticas, associados à imagem mental, têm mostrado benefícios na facilitação da evocação da informação, interferindo positivamente na emissão do paciente. Pesquisas recentes têm se voltado para o estudo da plasticidade neural em idosos saudáveis e com DA, e seus últimos achados têm sido animadores, pois há a hipótese de que por meio da ativação de áreas seletivas do cérebro durante a vida este pode ter a possibilidade de se proteger contra o processo degenerativo (Rosenzweig e Bennett, 1996). Além disso, há suposições de que certo nível de plasticidade neural persiste durante a terceira idade e na DA. Assim sendo, se exercícios incitam processos plásticos, determinando uma nova forma de interconexão neural, e essa capacidade que o próprio cérebro tem de se auto-organizar está também presente em idosos com DA, exercícios cognitivos feitos na reabilitação poderiam agir positivamente na organização das funções do cérebro desses pacientes (Mirmiram et al., 1996). A reabilitação neuropsicológica das funções mnésticas e da linguagem tem mostrado evidências de trazer impacto positivo no tratamento de pacientes com DA, principalmente quando aliada ao tratamento medicamentoso com anticolinesterásicos. Dessa maneira, a diversidade de técnicas de reabilitação constitui vasto campo para a pesquisa de possíveis efeitos e benefícios, e seus resultados podem proporcionar a oportunidade de que se vislumbre o grande potencial a ser desenvolvido nessa nova abordagem para o tratamento de doenças degenerativas. . . 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Corkin, S.; Growdon, J. – Alzheimer’s Disease: A Report of Progress in Research. Raven Press, New York, 1982. Mirmiram, M. et al. – Is Brain Plasticity Preserved During Aging in Alzheimer’s Disease?. Behavioral Brain Research, Amsterdan, pp 43-8, 1996. Organização Mundial de Saúde – Classificação de Transtornos Mentais de Comportamento da CID-10: Descrições Clínicas e Diretrizes Diagnósticas. Artes Médicas, Porto Alegre, 1993 Rosenzweig, M.R.; Bennett, E.L. – Psychobiology of Plasticity: Effects of Training and Experience on Brain and Behaviour. Behavioral Brain Research, Berkley, pp. 57-65, 1996. Projeto Terceira Idade PROTER Instituto de Psiquiatria HCFMUSP. 1 Fonoaudióloga clínica. Especialista em Linguagem pelo CFFa. Doutoranda em Ciências, área de Fisiopatologia Experimental da FMUSP. Pesquisadora e Colaboradora do Projeto Terceira Idade PROTER Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2 Psicóloga Gerontóloga com aprimoramento em Neuropsicologia. Pós-graduanda em Ciências, área de Fisiopatologia Experimental da FMUSP. Pesquisadora e Colaboradora do Projeto Terceira Idade PROTER Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 3 Fonoaudióloga. Especializanda pelo Cefac. Pesquisadora e Colaboradora do Projeto Terceira Idade PROTER Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Endereço para correspondência: Isabel Albuquerque M. de Carvalho Rua João Moura, 647 cj. 181 São Paulo, SP CEP 05412-911 Fone: (0xx11) 3083-2391 Fax: (0xx11) 3083-2391 E-mail: [email protected]