As "de dentro" e as "de fora": olhares sobre a prostituição em São Carlos-SP Domila do Prado Pazzini (1), Aline R. Barbosa (2), Gabriel S. Feltran (orientador) Universidade Federal de São Carlos, Centro de Educação e Ciências Humanas, Departamento de Sociologia email: [email protected] Apresentação Neste trabalho são estudadas as prostitutas que trabalham nas casas noturnas de São Carlos, cidade do interior do São Paulo. As interlocutoras da pesquisa são mulheres que, além de trabalharem nas casas e a utilizarem como moradia, passam ali os seus dias, se arrumando e voltando ao salão à noite. Isso porque, geralmente, essas mulheres migram de tempos em tempos de uma cidade para outra, e utilizam essa opção de estadia oferecida pelas casas. Uma condição imposta pelos donos das casas é que todas as mulheres tenham mais de 18 anos. O estudo é realizado numa Avenida que se localiza na região periférica da cidade, onde quase não há residências; esse território é cercado por barracões comerciais voltados em sua maioria para veículos, que faz com que a região seja ocupada por muito mais homens do que mulheres. Objetivos Essa pesquisa tem como objetivos gerais pensar como a prostituição na rua é vista pelas prostitutas que optam pelo trabalho em estabelecimento fechado. Os objetivos específicos são: (1) conhecer as prostitutas de casas noturnas, buscando (i) identificar os motivos da escolha da prostituição na casa em relação à rua; (ii) entender quais os fatores que interferiram nessa escolha; afim de, (2) a partir da visão dessas mulheres do espaço privado, caracterizar suas representações acerca da prostituição exercida na rua. Metodologia e Discussão A participação no Grupo de Estudos Trabalho Sexual (GETS) e os encontros e discussões com o Núcleo de Pesquisas Urbanas (NaMargem) ajudaram a pensar como lidar com o campo, ajudando a desenvolver técnicas de pesquisa, por exemplo, o modo de se vestir e a criação de laços de convivência com prostitutas e funcionários fixos (segurança, cozinheiro, auxiliar de limpeza). A entrada nas casas foi possível a partir do contato com o GETS, pois outros pesquisadores integrantes do grupo já faziam pesquisas em algumas dessas casas. Esta pesquisa é feita através de visitas realizadas em algumas casas durante à tarde, isso porque é o período em que as mulheres descansam e não estão ocupadas com o exercício da profissão. Em campo, observações são feitas do território, da casa em si, dos funcionários, e das próprias prostitutas. Toda observação feita é relatada descritivamente em notas de campo. As conversas realizadas são informais, mas seguindo um modelo semi-estruturado de perguntas. As visitas acontecem semanalmente, mas nem sempre esse contato ocorre com sucesso, e entre os motivos estão: não ter ninguém presente na casa, não ter a permissão para conversar com as mulheres e a indisposição das próprias prostitutas. As inserções com sucesso permitiram algumas reflexões sobre a relação das “de dentro”, ou seja, as prostitutas que trabalham nas casas; com as “de fora”, as prostitutas que trabalham na rua. Da mesma forma que Néstor Perlongher encontra uma imensa heterogeneidade nas formas masculinas de prostituição, existe também uma heterogeneidade na prostituição feminina e por categorias possíveis de distinção criam-se hierarquias entre elas. Essas categorias são relacionadas ao local de trabalho (casa de luxo, casa simples ou rua); aparência física (atraente ou menos atraente); o preço do programa que é pago pelo cliente; a quantidade de clientes; se usa drogas ou não. Resultados obtidos Esta pesquisa se encontra em andamento. Todavia, como resultados parciais, podemos apresentar algumas questões que já foram percebidos em campo. De uma perspectiva mais geral, a opção pela prostituição não se reduz apenas às questões econômicas (rentabilidade financeira proveniente da atividade). Além da questão do sustento, a independência social também aparece como fator preponderante: é através da prostituição que estas mulheres conseguem se desvencilhar da dependência dos maridos ou dos pais, o que lhes garante maior independência para tomar suas decisões, inclusive, de optar por ficar ou não em uma casa de prostituição, já que elas não estão presas às casas. Mais especificamente, acerca das diferenças entre “as de fora” e “as de dentro”, alguns motivos foram destacados para a preferência pela prostituição nas casas: preço, segurança, anonimato e proteção em relação ao preconceito. O preço na casa já é estipulado a priori, nas ruas pode acontecer uma relação de pechincha, o que, normalmente, joga o preço do programa para baixo. Além disso, a casa é associada à segurança, porque, mesmo que em determinados pontos da rua seja possível ganhar melhor pelo programa, na casa há homens que trabalham como seguranças, que garantem a proteção das mulheres. Também, como a casa é um local fechado, as prostitutas não precisam ficar expostas nas ruas, o que lhes garante determinado anonimato, pois somente as pessoas que procuram os serviços entram nas casas, diferentemente da situação da rua, onde qualquer pessoa que passe por ali pode vê-las esperando pelo próximo programa. Conseqüentemente, este anonimato as protege do preconceito relacionado à profissão, quanto menos pessoas as associarem à prostituição, menos pessoas poderão discriminá-las. Referências PERLONGHER, Néstor. O negócio do michê: a prostituição viril em São Paulo. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2008. SOUSA, Fabiana Rodrigues de. Saberes da vida da noite: percepções de mulheres que prestam serviços sexuais sobre o educar-se nas relações com seus clientes. Dissertação. Programa de Pós- Graduação em Educação. Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2007. Figura: Pintura de parede da Casa Centenária em Pompéia (1) Graduanda em Ciências Sociais (UFSCar) (2) Mestre em Ciência Política (PPGPol/UFSCar)