"leishmaniose visceral grave em crianças".

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Tania Hildebrand Paes Barreto
LEISHMANIOSE VISCERAL GRAVE EM CRIANÇAS
Trabalho apresentado para obtenção do
título de Pós Graduação latu senso em
Medicina Intensiva Pediátrica e Neonatal de
Campinas
Orientadora: Dra. Yvone Maia Brustoloni
Campo Grande MS
Faculdade de Medicina UFMS
2012
1
Introdução
No Brasil, a Leishmaniose Visceral (LV), também conhecida por: calazar,
barriga d’água, entre outras denominações menos conhecidas, inicialmente
tinha um caráter eminentemente rural e, mais recentemente, vem se
expandindo para as áreas urbanas de médio e grande porte.
Nos últimos dez anos, apesar das rotinas estabelecidas para tratamento
da LV e dos avanços de terapia intensiva pediátrica, constatou-se aumento na
letalidade da doença em diversas regiões do País. Segundo o Sinan/SVS/MS,
atualizado em julho de 2010, os óbitos confirmados por LV passaram de 155
em 2000 para 216 em 2009, em todo o Brasil. (1)
Em Campo Grande, MS, Oliveira et al (2010) descreveram 55 pacientes
com LV que evoluíram para o óbito, no período de 2003 a 2008, concluindo que
a identificação precoce das características clínicas e laboratoriais no primeiro
atendimento ao paciente é de fundamental importância para se reduzir a
mortalidade por meio da instituição de medidas terapêuticas e profiláticas
eficazes. (3)
Os estudos que relataram os fatores associados à evolução clínica
desfavorável em pacientes com LV são escassos. Werneck et al, em uma
análise multivariada, identificou quatro variáveis capazes de predizer
independentemente a morte entre os pacientes com LV: febre há mais de 60
dias, icterícia, anemia e diarréia. (4) Santos ET al (2002) observam ainda que
crianças com menos de um ano de idade e com co- morbidades ou infecções
bacterianas, apresentam também maior risco de resposta não satisfatória ao
2
tratamento com antimoniato de N- metil glucamina, necessitando de
alternativas a esta conduta. (5)
Geralmente, as complicações infecciosas e as hemorragias são os
principais fatores de risco para a morte na LV (1). Além disso, o acometimento
hepático no calazar, geralmente pouco pronunciado e reversível após
tratamento, pode ocorrer de forma severa, ocasionando também um desfecho
fatal. (3) A LV deve ser considerada no diagnóstico diferencial das hepatites
associadas à febre prolongada, assim como em síndromes colestáticas na
infância, em áreas endêmicas para a enfermidade. (6)
Sampaio e col., num estudo retrospectivo de 546 casos de Leishmaniose
Visceral, com 57 óbitos, concluíram que marcadores para o prognóstico e
severidade podem ser usados para antecipação de recursos avançados como
hemotransfusão
e
antibioticoterapia
de
largo
espectro.
Os
achados
significativos foram: taquipnéia, icterícia, presença de sangramento de mucosa,
infecção bacteriana, neutropenia abaixo de 500 células/mm³ e plaquetopenia
abaixo de 50.000/mm.³(7)
Apesar do elevado número de casos de LV em crianças no Brasil, as
características e o tratamento detalhado dos casos graves são pouco
relatados.
Muitos aspectos clínicos ainda permanecem obscuros, necessitando de
mais estudos para serem esclarecidos. Os mecanismos que levam ao óbito e o
tratamento mais adequado para os casos que evoluem com gravidade ainda
são pouco elucidados.
Na tentativa de esclarecimento destas e outras dúvidas foi realizado o
presente estudo.
3
Objetivos
Geral:
• Estudar os casos de Leishmaniose Visceral Grave em crianças, segundo
os critérios do Programa de Vigilância e Controle da Leishmaniose
Visceral do Ministério da Saúde atendida no Hospital Universitário da
Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, no período de
Janeiro de 2008 a Dezembro de 2011.
Específico
• Caracterizar os critérios indicativos de gravidade nas crianças com LV,
no momento da internação.
• Caracterizar a presença de sinais de alerta, indicativos de possível
evolução para gravidade na admissão.
• Descrever as características clínicas, laboratoriais e evolutivas dos
pacientes com LV grave, que necessitaram de tratamento intensivo.
• Descrever detalhadamente os aspectos relativos ao tratamento das
crianças que necessitaram de cuidados intensivos.
4
Materiais e método
O estudo foi realizado de forma retrospectiva, através da análise de prontuários
de crianças com LV admitidas para tratamento no Hospital Universitário da
UFMS, no período de Janeiro de 2008 a Dezembro de 2011, e que
necessitaram de internação na Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica.
Critérios de inclusão:
Foi considerada população de estudo, pacientes com 13 anos incompletos
portadores de LV confirmada através de microscopia direta/ ou cultura e/ou
cultura e/ou DNA de leishmania detectado por PCR de aspirado medular, e/ou
sorologia através da reação de imunofluorescência indireta (RIFI) para
anticorpos antileishmania (considerados títulos positivos > 1:80).
Para caracterizar a gravidade, foram pesquisados os seguintes critérios
instituídos por técnicos do Ministério da Saúde para a detecção de casos
graves em crianças brasileiras (1):
• Pacientes com idade inferior a 6 meses,
• Desnutrição grave
• Co-morbidades (incluindo infecção bacteriana)
• Icterícia
• Fenômenos hemorrágicos (exceto epistaxe),
• Edema generalizado
5
• Sinais de toxemia: letargia, má perfusão, cianose, taquicardia ou
bradicardia,
hipoventilação
ou
hiperventilação
e
instabilidade
hemodinâmica.
Critérios de exclusão:
As crianças com diagnóstico de LV, que não necessitaram de internação na
Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica, dentro do período proposto, foram
excluídas do estudo.
Na admissão, foram coletados os seguintes dados:
• Identificação do paciente: sexo, idade, raça e procedência.
• Identificação dos sinais e sintomas e exame físico: tempo de duração,
presença e duração da febre, aumento do volume abdominal, tamanho
do fígado e do baço medido do centro do rebordo costal esquerdo até o
seu maior diâmetro, diarréia, vômitos, tosse, sangramentos, edema
localizado ou generalizado, icterícia, infecção confirmada ou suspeita,
presença de desnutrição (peso)
• Dados laboratoriais de entrada no hospital: valores de hemoglobina,
hematócrito, leucometria global e diferencial, contagem de plaquetas,
presença de granulações tóxicas em neutrófilos, dosagem das
transaminases hepáticas, valores das bilirrubinas totais e frações,
dosagem de albumina sérica e globulinas, creatinina, amilase, TAP.
6
Durante a internação e evolução, foram verificados:
• Local de tratamento:
o Enfermaria
o UTI
• Indicações de admissão na UTI:
o Infecção
o Sangramento
o Insuficiência hepática
o Insuficiência respiratória, cardíaca ou renal
• Aspectos relativos ao tratamento instituído:
o
Esquema terapêutico escolhido
o Doses utilizadas
o
Mudanças de esquemas terapêuticos com justificativa
o Utilização de:
Hemotransfusão
Transfusão de plaquetas
Utilização de plasma
Crio precipitado
Medidas para insuficiência hepática (quais)
• Restrição hídrica (volume basal)
• Descontaminação intestinal
• Enemas
• Lactulose
7
• Uso de albumina
• Uso de antibióticos
• Transfusões
• Uso de aporte ventilatório
Medidas para insuficiência renal (quais)
• Restrição hídrica
• Diuréticos
• Diálise
Uso de inotrópicos (tipo, dose)
Uso de albumina (dose)
Uso de ventilação mecânica (dias)
Intercorrências na UTI
Para
a
coleta
de
dados,
será
utilizado
confeccionado para o estudo
8
questionário
especialmente
Resultados
No período de Janeiro de 2008 a Dezembro de 2011, dezesseis crianças
forma admitidas na Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica do Núcleo do
Hospital Universitário da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul com
diagnóstico de Leishmaniose Visceral Grave, confirmado por sorologia e ou
identificação do parasita em aspirado de medula óssea.
Doze crianças foram descartadas por não ter sido possível confirmar o
diagnóstico ou por ser confirmado tratar-se de outra doença. O grupo de
pacientes estudados constituiu-se de nove meninas (56%) e 7 meninos (44%).
A idade dos pacientes variou de 5 a 48 meses, média de 18,3 meses de idade.
Sete crianças (44%) tinham menos de 1 ano de idade; apenas uma delas
apresentava idade inferior a 6meses (5meses), (6,3%).
Quatro pacientes foram a óbito (25%). A idade dos mesmos variou de 5
a 32 meses, com média de 16,5 meses (1ano e quatro meses). A causa dos
óbitos foram: parada cardio- respiratória durante a intubação orotraqueal,
insuficiência hepática, edema agudo de pulmão e síndrome hepatorrenal.
Em relação à procedência, dos 16 casos analisados, 10 casos foram
procedentes de Campo Grande, de bairros não coincidentes e os outros 6 do
interior do estado, sendo cada um de uma cidade diferente (Brasilândia, Bonito,
Sonora, Rio Verde de Mato Grosso, Aquidauana e Três Lagoas).
A febre, palidez e aumento do volume abdominal estiveram
presentes na maioria das crianças (14/16, 87,5%), seguidos de tosse, edema,
9
hiporexia e vômitos, conforme o demonstrado na tabela 1. A febre durou em
média 24 dias (0-90) antes da entrada do paciente no hospital. O volume
hepático foi em média de 5cm (3-9) e o volume esplênico foi de 7,1cm (2-12),
no início do tratamento.
Tabela 1 – Frequência dos sinais e sintomas apresentados pelos pacientes
com leishmaniose visceral grave internados na UTI Pediátrica do NHU UFMS,
2008 – 2011.
SINAIS E SINTOMAS
%
(N)
Esplenomegalia
93,8
15
Hepatomegalia
87,5
14
Aumento do volume abdominal
87,5
14
Febre
87,5
14
Palidez
81,3
13
Tosse
56,3
9
Letargia
50,0
8
Fenômenos hemorrágicos
50.0
8
Edema
43,8
7
Hiporexia
37,5
6
Vômitos
37,5
6
Icterícia
18,8
6
Sudorese
12,5
2
Diarréia
12,5
2
Perda de peso
12,5
2
10
Os critérios de gravidade identificados nas crianças do estudo estão
descritas na tabela 2. Toxemia esteve presente em 14 das dezesseis crianças
87,5(%) e 11crianças (68,75%) apresentaram mais de um diagnóstico de comorbidade.
Tabela 2- Ocorrência de critérios de gravidade em pacientes internados na UTI
Pediátrica do NHU UFMS, 2008- 2011.
Ocorrências
Óbitos
N (16)
N (4)
Desnutrição grave
1
0
Idade inferior a 6 meses
1
0
Icterícia à admissão
1
3
Edema generalizado
6
4
Fenômenos hemorrágicos (exceto epistaxe)
7
4
Sinais de toxemia
14
4
Pacientes com co- morbidades
16
4
Critérios
As principais co-morbidades identificadas estão descritas na tabela 3.
Todas as crianças apresentaram infecção como co- morbidade, sendo o sítio
pulmonar identificado em 13 dos 16 pacientes ( 81,25%).
11
Tabela 3 – Frequência de co-morbidades em pacientes com leishmaniose
visceral grave, sobreviventes e nos que evoluíram para óbito, internados na
UTI Pediátrica do NHU UFMS, 2008- 2011.
Co-morbidades
Sobreviventes
Óbitos
(n=12)
(n=4)
N
%
N
%
13
81,3
4
100
Insuficiência cardíaca
06
37,5
1
25
Crise convulsiva
3
18,8
2
50
Pericardite
2
12,5
0
0
Hemorragia
2
12,5
1
25
Parasitose
2
12,5
0
0
Celulite
1
6,3
0
0
Infecção bacteriana
confirmada ou
suspeita
intracraniana
12
O tempo de internação variou de 4 a 49 dias, média de 22 dias de
internação desde a admissão no hospital até a alta, sendo que os pacientes
que sobreviveram permaneceram em média 26,5 dias internados e os que
morreram permaneceram em média 6 dias internados. O período de internação
na Unidade de Terapia Intensiva foi em média de 10 dias, houve um tempo
médio de 4 dias desde a entrada do paciente no hospital até a admissão na
UTI com intervalo de 1 a 20 dias no máximo. No grupo de óbitos o tempo de
entrada no hospital até a admissão na UTI, foi em média de 24 horas.
Dos dezesseis pacientes estudados, 3 deram entrada diretamente na UTI
e 13 foram admitidos posteriormente. Do grupo que foi admitido diretamente na
UTI, apenas 1 teve êxito letal após 4 dias de tratamento. A causa da admissão
na UTI foi predominantemente por infecção e insuficiência respiratória
conforme representado no gráfico 1, embora os diagnósticos de hipotermia,
anasarca, e convulsão também estivessem presentes.
Gráfico 1- Principal causa isolada de admissão na UTI Pediátrica do NHU
UFMS dos pacientes com leishmaniose visceral grave, 2008- 2011.
Fenômenos
hemorrágicos
2
Insuficiência
cardíaca
2
Insuficiência
hepática
4
11
Insuficiência
respiratória
A disfunção hepática esteve presente em 15 dos 16 pacientes
estudados.
Insuficiência hepática foi diagnosticada em 3 pacientes. Os 16
dados
Infecção suspeita
ou confirmada
13
laboratoriais
alterados e sua frequência estão representados no gráfico 2,
onde observa-se que a disfunção hepática esteve presente em 15 pacientes,
sendo que a insuficiência hepática foi diagnosticada em 3 pacientes.
Gráfico 2- Aspectos laboratoriais da disfunção hepática dos pacientes com
leishmaniose visceral grave, internados na UTI Pediátrica do NHU UFMS,
2008- 2011.
GGT
FA
INR
3
7
3
10
3
10
4
TAP/TTPA
11
Óbitos
Albumina
Bilirrubinas
13
3
7
4
ALT
AST
N
4
13
3
15
14
Os aspectos laboratoriais apresentados pelos pacientes ao serem
admitidos no hospital e depois na UTI estão representados na tabela 4.
As enzimas hepáticas e bilirrubinas totais quando comparadas na
admissão hospitalar e na admissão na UTI, apresentaram aumento expressivo.
Tabela 4- Dados hematológicos e principais parâmetros bioquímicos à
admissão dos pacientes por leishmaniose visceral grave no NHU UFMS, 20082011 (n=16).
Admissão hospitalar Admissão UTI
Exames laboratoriais
Média (N) Mínimo-
Média (N)
Maximo
MínimoMaximo
Hemoglobina (g/dl)
6,4 (13)
2,8- 8,9
7,5(16)
2,8- 11,6
Hematócrito (%)
19,9 (13)
10- 26
23 (16)
10- 36
Plaquetas (U/mm)
32.385
3.000-
25.400
3.000-
(13)
182.000
(16)
90.000
3543 (13)
1900-
3296 (16)
1380- 6200
Leucometria global
7000
(céls./mm)
Neutrófilos (céls./mm)
25,4 (13)
04- 52
32 (16)
08- 55
Linfócitos (céls./mm)
59( 13)
20- 83
62,3( 16)
40- 82
Uréia(mg/dL)
23,6 (12)
6- 47
24,6 (14)
8- 68
Creatinina (mg/dL)
0,24(12)
0,2- 0,7
0,3(14)
0,2- 0,5
15
AST (mg/dL)
195(12)
37- 487
407,4(14)
34- 2236
ALT (mg/dL)
62,5(12)
23- 160
112(14)
15- 397
Bilirrubinas totais (mg/dL)
2,2 (13)
0,18- 11,9
4,72 (9)
0,12- 15,72
Albumina sérica (gr/dL)
2,6 (13)
1,6- 4,1
2,4 (14)
1,6- 4,0
Globulina sérica (gr/dL)
3,5 (12)
3,1- 5,2
2,9 (8)
2,4- 3,5
Amilase (U/L)
25,9 (11)
12- 67
24,6 (10)
11- 62
Lipase (U/L)
58,3 (7)
6,2- 149
49,4(9)
0,2- 62
Em relação ao tratamento específico para leishmaniose, 8 pacientes
foram tratados inicialmente com antimoniato de N metilglucamina, com duração
média de 7 dias
( 2-20). Nos pacientes que evoluíram para óbito, dois
iniciaram com esta medicação, usando-a por 2 e 5 dias.
O desoxicolato sódico de anfotericina B foi usado por 7 pacientes, com
duração de tratamento em média de 16 dias (7- 20), sendo que no grupo de
óbitos, dois pacientes o utilizaram por 6 e 4 dias.
A anfotericina lipossomal foi usada somente em 3 pacientes, com média
de 7,3 dias de tratamento (5- 10) e todos concluíram o tratamento.
A anfotericina B de dispersão coloidal foi utilizada em 4 pacientes, com
média de 12 dias (5- 18) e em 3 dos pacientes que morreram, foi usada de 4 a
6 dias.
16
A causa principal de troca de esquema
terapêutico foi piora da
infecção ou choque séptico, presença de alteração hepática ou edema.
Apenas em dois pacientes não houve mudança do esquema
terapêutico, sendo que um deles completou o tratamento e outro foi a óbito.
Os esquemas antimicrobianos utilizados incluíram associação de:
ceftriaxone e oxacilina (12/16); cefotaxima e vancomicina (11/16); meropenem
e vancomicina (4/16).
Outros
individualizados
antimicrobianos
para
cada
utilizados
paciente
nos
esquemas
terapêuticos,
foram:
amicacina,
gentamicina,
sulfametoxazol, penicilina cristalina, metronidazol, ceftazidime, clindamicina e
cefalotina, todos com apenas um registro cada, exceto a clindamicina que foi
utilizada em dois pacientes. As drogas foram usadas em doses habituais e o
tempo de utilização total acompanhou o tempo de internação dos pacientes até
a alta.
O principal motivo de troca de esquema terapêutico foi a piora clínicolaboratorial, que aconteceu em 12 dos 16 pacientes. No grupo de pacientes
que morreram, apenas em um não houve troca de esquema antimicrobiano,
que usou o mesmo esquema por 24 horas até o óbito.
Os pacientes necessitaram de apoio inotrópico e drogas vasoativas
como representado no gráfico 3. Outras drogas utilizadas foram: atropina,
dipirona, hidrocortisona, terbutalina, omeprazol, aldactone, prometazina,
lactulose, reposição de volume com solução cristalóide, reposição de
bicarbonato de sódio, reposição de potássio via oral, reposição de vitamina K.
17
Gráfico 3- Representação do uso de inotrópicos e drogas vasoativas nos
pacientes com leishmaniose visceral grave internados na UTI Pediátrica do
NHU UFMS, 2008- 2011.
3
3
10
3
4
8
Dopamina
Dobutamina
Noradrenalina
Adrenalina
Nitroprussiato
Milrinona
18
A necessidade de utilização de hemoderivados e hemocomponentes
está representada na tabela a 5.
Tabela 5- Transfusão de hemocomponentes e hemoderivados realizados nos
pacientes com Leishmaniose Visceral Grave internados na UTI Pediátrica do
NHU UFMS, 2008- 2011.
Hemoderivados
Número total
de transfusões
Mínimo- Média
Máximo
por Média por
paciente geral óbito(n=4)
(n= 16)
Concentrado de
114
1 -21
7,13
6,3
72
1-13
4,5
4,8
Plasma
68
2-21
4,3
6,7
Albumina
63
1-21
4,0
5,0
Criopreciptado
7
1-2
0,44
0,8
plaquetas
Concentrado de
hemácias
A intubação orotraqueal foi necessária em 6 pacientes, sendo que 1
paciente morreu durante este procedimento. A causa da escolha deste
procedimento foi Insuficiência respiratória em 5 deles e convulsão em 1.
O tempo médio de duração da ventilação mecânica invasiva foi de 7,4
dias (2- 16) e 4 pacientes evoluíram para óbito em 3,6 dias, em média. Todos
os pacientes submetidos à ventilação mecânica foram ventilados á pressão.
19
Discussão
No período de Janeiro de2008 a Dezembro de 2011, a média de idade
das crianças internadas na unidade de terapia intensiva pediátrica do presente
estudo (18,3 meses) coincide com a faixa etária em que a leishmaniose
visceral pode ter sua apresentação mais grave e com maior número de
complicações (1).
No grupo dos que evoluíram para óbito, esta média foi ainda menor
(16,5 meses) corroborando o conceito de maior gravidade nos lactentes. A
frequência de 1 menina para 0,8 meninos discorda de publicações como de
Rey et al (2), na qual o grupo de meninos foi predominante. Maior número de
casos se faz necessário para esclarecer essa variável.
Dentre os sintomas apresentados à admissão, destacou-se a febre,
palidez e aumento do volume abdominal, relacionado à hepatomegalia e
esplenomegalia, como os mais frequentes concordantes com outros estudos
como o relatado por Rey et al, 2005(2) e Pastorino, et al, 2002(8)
Em relação aos critérios de gravidade estabelecidos pelo Ministério da
Saúde(1), a única criança com idade inferior a 6 meses evoluiu para óbito em 5
dias de internação. Outros dados que compõem os critérios para gravidade
como fenômenos hemorrágicos e edema generalizado, também apresentaram
importante frequência no grupo de óbitos (1:0,75 e 1:0, 5 respectivamente),
corroborando a importância desses sintomas para definir o paciente que tem
maior potencial de letalidade.
20
Alguma co- morbidade esteve relatada em 100% dos pacientes
estudados e foi mais frequente no grupo que evoluiu para óbito. A cada quatro
pacientes com alguma co- morbidade, um paciente morreu. Igualmente em
relação aos sinais de toxemia que esteve presente em 87,5% dos pacientes e
cada grupo de 3,5 pacientes, um foi a óbito com sinais de toxemia.
Analisando o sinal febre para avaliar o tempo de demora de admissão
dos pacientes no hospital, obtivemos que a febre teve duração média de 24
dias antes da admissão dos pacientes. Esse tempo de febre prévio denuncia
demora na suspeição do diagnóstico e necessidade de melhora nos serviços
básicos de saúde, ainda mais considerando tratar-se o estado de Mato Grosso
do Sul como área endêmica para leishmaniose. Outros projetos de pesquisa
em áreas endêmicas também denunciam a demora da suspeição entre o início
dos sintomas e a confirmação diagnóstica (4).
O aparelho respiratório foi o principal sítio de infecção (81,3%) nos
pacientes com infecção confirmada. A insuficiência cardíaca esteve presente
em 37,5% dos pacientes. Esses dois sistemas associados são os principais
motivos de complicações e necessidade de cuidados intensivos, demonstrando
que
pacientes
com
estas
manifestações
devem
ser
imediatamente
referenciados para centros de alta complexidade. Estes dados foram
observados por Braga,2007 (9), quando relata que houve maior chance de
evolução insatisfatória aquele paciente que apresentou entre outros, alteração
do aparelho respiratório.
Houve internação mais imediata (média de 24 horas) e permanência
mais curta na unidade de terapia intensiva no grupo de pacientes que
21
evoluíram para óbito, quando comparados aos que sobreviveram. Este fato
indica maior gravidade à admissão, associada ou não à maior tempo entre os
primeiros sintomas e o estabelecimento de critérios de gravidade.
Os pacientes foram admitidos principalmente por infecção ou
insuficiência respiratória na unidade de terapia intensiva, entretanto 15 dos 16
pacientes apresentavam também disfunção hepática, sendo as transaminases
e a albumina os parâmetros mais frequentemente alterados. Braga, 2007(9),
observou em amostra de 250 pacientes, aumento predominantemente de AST
e hipoalbuminemia, o que também foi observado neste grupo de pacientes, nos
quais a AST tinha seu valor duplicado no momento da admissão na UTI em
comparação com a admissão no hospital.
Anemia, plaquetopenia e leucopenia são alterações características da
doença em vários estudos (Braga, 2007; Rey, 2005; Pedrosa, 2004; Queiroz,
2004). Entretanto a anemia foi o achado mais comum, podendo sofrer
contribuição da carência de ferro e verminose, que se somariam aos fatores da
própria leishmaniose, como hiperesplenismo, maior catabolismo e distúrbios da
absorção de micronutrientes.
Em relação ao tratamento específico para leishmaniose, destaca-se
que os pacientes que iniciaram o tratamento com anfotericina lipossomal
concluíram o protocolo sem necessidade de troca de esquema terapêutico, o
que não foi observado no grupo que iniciou o esquema terapêutico com
antimoniato de N metilglucamina, o que já foi descrito por Santos et al , 2002
(5).
22
A anfotericina B de dispersão coloidal foi usada em 4 pacientes, sendo
que 3 deles foram a óbito. Este estudo não permitiu a conclusão sobre os
efeitos colaterais devido ao grande número de alterações envolvendo a
condição de
sepse, insuficiência renal, cardíaca e respiratória, alguns
concomitantes. Outro desenho deve ser realizado com isolamento de variáveis
que permitam o estudo e a conclusão dos efeitos colaterais das drogas
específicas do tratamento da LV em pacientes internados em UTI.
A frequência de troca de esquema terapêutico foi de 14 pacientes em
16, sempre levando- se em consideração piora clínica, insuficiência renal,
hepática, cardíaca ou combinação de duas ou mais alterações.
Os pacientes necessitaram usar em maior frequência dopamina e
dobutamina como suporte inotrópico, mas conforme a presença de choque
aconteceu, houve necessidade de uso de adrenalina ,noradrenalina e
milrinona.
Os 4 pacientes que foram a óbito usaram uma combinação de
inotrópicos e drogas vasoativas. Apenas 1 paciente necessitou apenas de
dopamina em dose de 5mcg/kg/min.
O número de transfusões de hemocomponentes e hemoderivados
somados foi de 324 transfusões em 16 pacientes, divididos entre plaquetas
(35%), hemáceas (22,2%), plasma (21%), albumina (19,4%) e criopreciptado
(2%). O grande número de transfusões de plaquetas se deveu à tentativa de
reposição deste hemocomponente já que as plaquetas caíram a níveis críticos
como 3.000/mm3. A preocupação com os fenômenos hemorrágicos centrais e
23
pulmonares que podem levar rapidamente ao óbito justificam o uso mais liberal
de transfusão de plaquetas, em detrimento dos outros hemocomponentes.
De maneira geral os pacientes que evoluíram para óbito tiveram
médias
maiores
de
transfusão
de
hemáceas,
plasma,
albumina
e
criopreciptado quando comparados aos sobreviventes, demonstrando maior
grau de complexidade em seu tratamento.
A insuficiência respiratória motivou a escolha da assistência ventila
tória mecânica invasiva em 6 (37,5%) dos 16 pacientes, sendo que em apenas
1 destes, a falência respiratória esteve associada à hemorragia intracraniana,
sem relação com causa pulmonar. A evolução para óbito em 4 desses
pacientes num prazo de 2 a 16 dias( média de 3,6 dias), demonstra o grau de
comprometimento e gravidade quando o aparelho pulmonar está comprometido
e a grande necessidade de terapêutica agressiva para se tentar impedir uma
evolução catastrófica.
Detalhes da ventilação mecânica não puderam ser estudados nesses
pacientes por ausência de informações consistentes nos prontuários que
permitissem conclusões. Apenas pode- se ressaltar que quando a falência
respiratória se instala, a chance de óbito parece ser mais evidente, visto que,
todos os pacientes que morreram estavam utilizando ou iniciando a assistência
ventilatória invasiva.
24
Conclusões
O estudo das crianças com diagnóstico confirmado de leishmaniose
visceral grave internadas na Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica do
Hospital Universitário de Campo Grande/ MS no período de Janeiro de 2008 a
Dezembro de 2011, permitiu as seguintes conclusões:
1- A maior parte dos pacientes foi procedente de Campo Grande, com
média de idade de 18,3 meses.
2- Febre, palidez, hepatomegalia e esplenomegalia foram os principais
achados clínicos à admissão dos pacientes.
3- Além de co- morbidades, os sinais de toxemia, fenômenos
hemorrágicos e edema generalizado foram os principais critérios de gravidade
encontrados nos pacientes deste estudo.
4- A infecção bacteriana confirmada ou suspeita foi a co- morbidade
mais freqüente e também a principal causa de admissão na unidade de terapia
intensiva.
5- A maioria dos pacientes apresentou algum grau de disfunção
hepática
6- A insuficiência hepática estava presente em 75% dos pacientes que
evoluíram para o óbito.
7- Anemia, plaquetopenia e leucopenia foram os achados laboratoriais
mais comuns.
25
8- O diagnóstico foi realizado através de critérios epidemiológicos e
clínicos, além de exames complementares inespecíficos associados à sorologia
positiva ou identificação direta do parasito.
9- O antimoniato de N metilglucamina
e o desoxicolato sódico de
anfotericina B foram as medicações de escolha para
iniciar o tratamento
específico dos pacientes.
10- A transfusão de plaquetas foi o procedimento mais freqüente em
relação à terapêutica coadjuvante.
11- Os pacientes com insuficiência respiratória que necessitaram de
ventilação mecânica tiveram pior evolução.
26
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Universidade Federal de Minas Gerais.2007 (78 pg).
29
Anexo
Instrumento de coleta
Prontuário:
Identificação do paciente:
DN:
Peso:
Idade:
anos e
meses
Sexo: m
f
Kg
Dados relacionados aos sintomas e sinais:
Sintomas e sinais
Admissão hosp.
Sim Não
Febre(duração)
Tosse
Palidez
Aumento vol. Abd.
duração
Fígado
Baço
Icterícia
Perda de peso
Vômitos
Diarréia
Hemorragias
Epistaxe
Gengivorragia
Sangramento em locais
de punção
Hemorragia gástrica
Hemorragia intestinal
outros
Edema
localizado
generalizado
Letargia
Cianose
Perfusão ( em seg.)
FC
FR
PA
Co- morbidade
Infecção suspeita ou
confirmada (qual)
30
Admissão UTI
Sim
Não
Dados relacionados ao local de tratamento:
Enfermaria
Isolamento □sim □não
Centro de Terapia Intensiva
Isolamento □sim □não
Dados relacionados à causa de admissão no Centro de Terapia Intensiva:
Infecção □
Insuficiência hepática □
Hemorragias □
Insuficiência cardíaca □
Insuficiência respiratória □
Insuficiência renal □
Dados relacionados aos exames laboratoriais:
Variáveis
Admissão no
hospital
Admissão na UTI
Hemoglobina
Hematócrito
Leucometria global
Mielócitos
Metamielócitos
Bastonetes
Segmentados
Eosinófilos
Linfócitos
Linfócitos atípicos
Basófilos
Monócitos
Granulações tóxicas
AST
ALT
Bilirrubina direta
Bilirrubina Indireta
Bilir. Totais
Albumina sérica
Globulinas
Uréia
Creatinina
Amilase
TAP
INR
Hemocultura
Outros
31
Dados relacionados ao tratamento específico:
Droga
Dose
diária
Dias de
tratamento
Troca de
terapêutica
Observações
Antimoniato de N
metil glucamina
Desoxicolato
sódico de
anfotericina B
Anfotericina
lipossomal
Ambisome
Anforericina B
dispersão coloidal
Amphocil
Dados relacionados ao tratamento coadjuvante:
Terapêutica
Dose
..............
Início dia
índice
Hemotransfusão
Plaquetas
Plasma
Criopreciptado
Albumina
Dopamina
Noradrenalina
Adrenalina
Vasodilatadores
Nitroprussiato
Nifedipina
Nutrição enteral
Nutrição parenteral
Fator estimulante de
col. De granul.
32
Número de
transf.
Observações
Dados relacionados à ventilação mecânica( VM):
Indicação:
Tipo de VM:
Intercorrências devido a VM
Dias de tratamento
Particularidades do desmame e extubação
33
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