Estudo social sobre mulher com transtorno mental presa por furto

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DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO
UNIDADE SÃO BERNARDO
Av. Barão de Mauá , nº 251
CEP 9726000
telefone (11) 4332-9605 / 4332-9693 - http://www.defensoria.sp.gov.br
Ofício CAM n. 081/2011
Assunto: Processo 1536/2011 – 1ª Vara Criminal de Diadema
Ref.: Solicitação de Estudo Social
A/C Dr. Leandro de Castro Gomes – Defensor Público
São Bernardo do Campo, 20 de dezembro de 2011.
ESTUDO SOCIAL
Processo nº: 1536/2011
Ré: Luiza Pereira da Silva Peixe (conforme prontuário hospitalar)
1.
Objetivo do estudo:
Analisar como se apresentam hoje as condições de saúde mental de Sra.
Luiza Peixe, assim como os fatores de vulnerabilidade social que perpassam sobre o
seu cotidiano.
Após identificação desses fatores, indicar o atendimento adequado às
necessidades da senhora em tela, no que se refere às possibilidades de
responsabilização das Políticas Públicas de Saúde e de Assistência Social.
2.
Metodologia:
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Para realização deste estudo foram realizadas as seguintes intervenções:
a. Entrevistas com profissionais do Hospital Quarteirão da Saúde;
b. Entrevista com representante da Secretaria Municipal de Saúde de
Diadema;
c. Entrevista com a ré;
d. Análise de relatórios médicos e da Secretaria Municipal de Saúde;
e. Pesquisa bibliográfica.
3.
Relato das entrevistas com a equipe hospitalar:
Durante as entrevistas com a equipe de profissionais do Hospital Quarteirão
da Saúde e da Secretaria Municipal de Saúde de Diadema foi possível perceber
elementos importantes para análise das possibilidades da paciente, bem como
conhecer as valiosas intervenções do serviço municipal de saúde. Estas informações
serão transcritas abaixo para análise posterior.
De acordo com relatório médico, a paciente recebeu diagnóstico de
Esquizofrenia não especificada (F20.9).
Chegou ao hospital em situação de crise, porém, hoje já se apresenta em
condições de alta médica. Hoje faz uso de medicação exclusivamente por via oral,
que pode ser administrada em ambiente extra-hospitalar.
Com o acompanhamento diário da paciente e sua evolução, o Hospital
conseguiu identificar na sua fala nomes que apareciam com maior frequência
quando a mesma se referia a si, possibilitando que o Hospital a identificasse
respeitando o conhecimento que a paciente trazia de si mesma (Luiza Pereira da
Silva Peixe – Luiza e Peixe são os nomes que mais reproduz, de acordo com a
equipe hospitalar).
Ainda de acordo com a equipe, cessada a crise da paciente a mesma não
apresentou nenhum episódio de comportamento agressivo, pelo contrário, com o
passar do tempo, apresenta sinais de vínculo e respeito com os profissionais que a
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acompanham. Também demonstra boa autonomia, fazendo sua auto-higiene e
alimentação.
O Hospital ainda está fazendo um ótimo trabalho no que se refere à busca
pelo passado da paciente, tendo encontrado comerciantes do município de Mauá
diante dos quais houve reconhecimento mútuo (paciente e comerciantes). Os
comerciantes indicam que a senhora ficava em situação de rua nas proximidades de
seus comércios.
A equipe relatou ainda que estes comerciantes mantém bom vínculo com a
senhora, sendo que eles lhe entregavam comida e inclusive lhe faziam as unhas, o
que denota que a Sra. Luiza não apresentava comportamento inadequado no local
em que costumava ficar em Mauá.
Ademais, com a ajuda dos comerciantes, o Hospital parece estar cada vez
mais próximo de informações sobre possíveis familiares da senhora.
4.
Relato da entrevista com a Sra. Luiza:
Durante visita à Sra. Luiza a mesma demonstrou afeto aos comerciantes que
lhe visitaram, bem como respeito e bom trato com a equipe de profissionais do
Hospital e da Defensoria Pública.
Sra. Luiza não entende sobre a acusação que está recebendo e sua vontade
é de que lhe sejam retiradas as algemas e que receba alta do Hospital.
Relatou que mora sozinha numa casa amarela próxima dos comerciantes que
reconheceu, porém, não sabe dizer, por enquanto, o nome da rua.
Em sua fala indicou que não tem familiares, que é filha única de pais
falecidos.
Pelo relato indica ter boa autonomia, fazendo seu auto-cuidado no hospital e
dizendo que cozinhava para si em sua casa. Não apresentou dificuldade para se
expressar.
5.
Análise e considerações:
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Diante do resultado das entrevistas, é preciso fazer uma análise dos dados
para identificar as condições de Sra. Luiza e indicar o encaminhamento adequado
de suas necessidades às instituições que sejam capazes de realizar um trabalho
efetivo com a senhora.
Sra. Luiza é portadora de transtorno mental. A Reforma Psiquiátrica traz
elementos importantes para refletirmos sobre o atendimento adequado às pessoas
que possuem alguma patologia psiquiátrica. Ela traz consigo a premissa da falência
do modelo de internação em instituições psiquiátricas fechadas, devendo ser evitado
ao máximo a utilização deste recurso.
Para fundamentar a exposição acima, é possível demonstrar um pouco o que
o Ministério da Saúde diz sobre a Reforma Psiquiátrica e a Política de Saúde Mental:
“• É a ampla mudança do atendimento público em Saúde
Mental, que garante o acesso da população aos serviços
e o respeito a seus direitos e liberdade;
• É amparada pela lei 10.216/2001, conquista de uma luta
social que durou 12 anos;
• Significa a mudança do modelo de tratamento: no lugar
do isolamento, o convívio com a família e a comunidade;
• O atendimento é feito em Centros de Atenção
Psicossocial
(CAPS),
Residências
Terapêuticas,
Ambulatórios, Hospitais Gerais, Centros de Convivência;
• As internações, quando necessárias, são feitas em
hospitais gerais ou nos Caps/24 horas. Os hospitais
psiquiátricos
de
grande
porte
vão
sendo
progressivamente substituídos.
Política Nacional de Saúde Mental
O Governo brasileiro tem como objetivos:
- reduzir de forma pactuada e programada os leitos
psiquiátricos de baixa qualidade,
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- qualificar, expandir e fortalecer a rede extra-hospitalar
formada pelos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS),
Serviços Residenciais Terapêuticos (SRTs) e Unidades
Psiquiátricas em Hospitais Gerais (UPHG),
- incluir as ações da saúde mental na atenção básica,
- implementar uma política de atenção integral voltada a
usuários de álcool e outras drogas,
- implantar o programa "De Volta Para Casa",
- manter um programa permanente de formação de
recursos humanos para reforma psiquiátrica,
- promover direitos de usuários e familiares incentivando
a participação no cuidado,
- garantir tratamento digno e de qualidade ao louco
infrator (superar o modelo de assistência centrado no
Manicômio Judiciário),
- avaliar continuamente todos os hospitais psiquiátricos
por meio do Programa Nacional de Avaliação dos
Serviços Hospitalares - PNASH/ Psiquiatria.
Cenário atual
• Tendência de reversão do modelo hospitalar para uma
ampliação significativa da rede extra-hospitalar, de base
comunitária;
• Entendimento das questões de álcool e outras drogas
como problema de saúde pública e como prioridade no
atual governo;
• Ratificação das diretrizes do SUS pela Lei Federal
10.216/01 e III Conferência Nacional de Saúde Mental.
Dados importantes
• 3% da população geral sofre com transtornos mentais
severos e persistentes;
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• mais de 6% da população apresenta transtornos
psiquiátricos graves decorrentes do uso de álcool e
outras drogas;
• 12% da população necessita de algum atendimento em
saúde mental, seja ele contínuo ou eventual;
• 2,3% do orçamento anual do SUS é destinado para a
Saúde Mental.”1
Como publicado pelo Ministério da Saúde, as internações, somente quando
necessárias (com indicação médica conforme Lei 10.216/01), deverão ser realizadas
nos CAPS 24h ou em leitos de Hospitais Gerais, ou seja, não há necessidade de
internação em Hospitais Psiquiátricos.
No caso específico da Sra. Luiza, não existe indicação médica para
internação, nem em CAPS ou Hospital Geral, tampouco em Hospitais Psiquiátricos.
De acordo com relatório da Secretaria Municipal de Saúde o tratamento adequado
para sua condição atual de saúde é o modelo ambulatorial, sendo ofertado o CAPS
24h não em regime de internação, mas sim em regime de atenção para busca de
projeto terapêutico individualizado, sendo o CAPS utilizado inicialmente e
temporariamente como ambiente de moradia, uma vez que a senhora não tem no
momento possibilidade de retorno ao convívio familiar ou comunitário sem
contribuição do poder público.
É importante ainda destacar que o SUS, através de sua atual Política de
Saúde Mental se propõe, inclusive, a se responsabilizar com o atendimento
adequado ao “louco infrator” (superando o modelo de atendimento através dos
Manicômios Judiciários).
O atendimento da senhora em Hospital Psiquiátrico ou de Custódia vai à
contramão da Política Nacional de Saúde Mental, contrariando ainda a Lei
10.216/01, não se apresentando, portanto, como modelo adequado de tratamento
em casos que envolvem situação de transtorno mental, conforme disposto:
Art. 2º Nos atendimentos de saúde mental, de qualquer
natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis
1
http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=33929 – acessado em 19/12/2011, às 15h54.
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serão formalmente cientificados dos direitos enumerados
no parágrafo único deste artigo.
Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de
transtorno mental:
I – ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde,
consentâneo às suas necessidades;
...
VIII – ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios
menos invasivos possíveis;
IX – ser tratada, preferencialmente,
comunitários de saúde mental.2
em
serviços
Toda pessoa com qualquer doença sem cura tem o direito de receber o
atendimento hospitalar em regime de internação nos momentos de crise de sua
doença, voltando logo em seguida ao convívio familiar e comunitário. É importante
conceber a Saúde Mental sob a mesma ótica. Diante do exposto, entende-se que é
necessário compreender o ato da Sra. Luiza como uma crise de transtorno mental,
pontual, que já foi devidamente cuidada em ambiente hospitalar e sanada.
O paciente sem crise, em condições de tratamento ambulatorial, também
conta com a rede de serviços dos CAPS, ao qual apresenta-se:
“Seu objetivo é oferecer atendimento à população,
realizar o acompanhamento clínico e a reinserção social
dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos
direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e
comunitários.
Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), entre todos
os dispositivos de atenção à saúde mental, têm valor
estratégico para a Reforma Psiquiátrica Brasileira. Com a
criação desses centros, possibilita-se a organização de
uma rede substitutiva ao Hospital Psiquiátrico no país. Os
2
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10216.htm - acessado em 20/12/2011, às 11h06.
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CAPS são serviços de saúde municipais, abertos,
comunitários que oferecem atendimento diário.
É função dos CAPS:
- prestar atendimento clínico em regime de atenção
diária, evitando as internações em hospitais psiquiátricos;
- acolher e atender as pessoas com transtornos mentais
graves e persistentes, procurando preservar e fortalecer
os laços sociais do usuário em seu território;
- promover a inserção social das pessoas com
transtornos mentais por meio de ações intersetoriais;
- regular a porta de entrada da rede de assistência em
saúde mental na sua área de atuação;
- dar suporte a atenção à saúde mental na rede básica;
- organizar a rede de atenção às pessoas com
transtornos mentais nos municípios;
- articular estrategicamente a rede e a política de saúde
mental num determinado território
- promover a reinserção social do indivíduo através do
acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e
fortalecimento dos laços familiares e comunitários.
Estes serviços devem ser substitutivos e não
complementares ao hospital psiquiátrico. De fato, o CAPS
é o núcleo de uma nova clínica, produtora de autonomia,
que convida o usuário à responsabilização e ao
protagonismo em toda a trajetória do seu tratamento.
Os projetos desses serviços, muitas vezes, ultrapassam a
própria estrutura física, em busca da rede de suporte
social, potencializadora de suas ações, preocupando-se
com o sujeito e a singularidade, sua história, sua cultura e
sua vida cotidiana.
O perfil populacional dos municípios é sem dúvida um
dos principais critérios para o planejamento da rede de
atenção à saúde mental nas cidades, e para a
implantação de centros de Atenção Psicossocial. O
critério populacional, no entanto, deve ser compreendido
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apenas como um orientador para o planejamento das
ações de saúde. De fato, é o gestor local, articulado com
as outras instâncias de gestão do SUS, que terá as
condições mais adequadas para definir os equipamentos
que melhor respondem às demandas de saúde mental de
seu município.”3
A Sra. Luiza hoje não faz uso de nenhum medicamento intravenoso, que
necessitaria de profissional da saúde para realizar sua aplicação. Fazendo uso
apenas de medicamento via oral, a sua administração pode ser realizada pela
própria paciente ou por pessoa que exerça o papel de cuidador.
A ausência de familiar que acompanhe a situação de doença e a falta de
alcance do poder executivo à senhora pode ter contribuído para o ocorrido, fazendose necessário o imediato acompanhamento do poder público no que diz respeito à
tentativa de identificação de familiar e, na sua ausência, que o Estado se
responsabilize, além da oferta de tratamento médico, também pelo seu
acompanhamento no processo de estabilização da condição de saúde e na
reintegração comunitária da senhora, utilizando-se para tanto de diversos recursos.
Vale ressaltar ainda que o devido acompanhamento do poder executivo
através das políticas de saúde e de assistência social tende a diminuir a frequência
de crises, além de diminuir os efeitos negativos das mesmas. O contrário também é
verdadeiro. Uma pessoa com transtorno mental que não recebe o atendimento
adequado pode vir a ter crises em maior quantidade e intensidade.
Desta forma, vale recolocar que no caso de Sra. Luiza, o atendimento
indicado foi o modelo ambulatorial, sendo assim, sua inserção em Hospitais
Psiquiátricos ou de Custódia, pode desencadear em efeitos negativos para sua
saúde.
Além disso, destaca-se que diante do acompanhamento oferecido pelo
Hospital Quarteirão da Saúde, Sra. Luiza não apresentou nenhum indício de
agressividade, ao contrário, mostrou-se bastante cordial e disponível para o diálogo,
o que reforça que o devido acompanhamento dos equipamentos de saúde pode
trazer efeitos positivos e imediatos à sua condição de saúde mental.
3
http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=29797&janela=1 – consultado em 19/12/2011, às 15h37.
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Existe ainda a preocupação além do modelo de tratamento adequado, sobre
um local que pudesse receber a senhora, com todas as suas especificidades, que
garantisse sua proteção social e dignidade, como um modelo de moradia.
Para essa questão, também o SUS nos dá uma resposta adequada, através
do Serviço Residencial Terapêutico (SRT):
“são casas localizadas no espaço urbano, constituídas
para responder às necessidades de moradias de pessoas
portadoras
de
transtornos
mentais
graves,
institucionalizadas ou não.
O suporte de caráter interdisciplinar (seja o CAPS de
referência, seja uma equipe da atenção básica, sejam
outros profissionais) deverá considerar a singularidade de
cada um dos moradores, e não apenas projetos e ações
baseadas no coletivo de moradores. O acompanhamento
a um morador deve prosseguir, mesmo que ele mude de
endereço ou eventualmente seja hospitalizado.
O processo de reabilitação psicossocial deve buscar de
modo especial a inserção do usuário na rede de serviços,
organizações e relações sociais da comunidade. Ou seja,
a inserção em um SRT é o início de longo processo de
reabilitação que deverá buscar a progressiva inclusão
social do morador.”4
Podemos ainda avaliar os possíveis beneficiários do serviço:
“Portadores de transtornos mentais, egressos de
internação psiquiátrica em hospitais cadastrados no
SIH/SUS, que permanecem no hospital por falta de
alternativas que viabilizem sua reinserção no espaço
comunitário.
4
Residências terapêuticas: o que são, para que servem / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento
de Ações Programáticas Estratégicas. – Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
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Egressos de internação em Hospital de Custódia e
Tratamento Psiquiátrico, em conformidade com decisão
judicial (Juízo de Execução Penal).
Pessoas em acompanhamento nos Centros de Atenção
Psicossocial (CAPS), para as quais o problema da
moradia é identificado, por sua equipe de referência,
como especialmente estratégico no seu projeto
terapêutico. Aqui se encontram aquelas localidades que,
a despeito de não possuírem hospitais psiquiátricos,
freqüentemente se defrontam com questões ligadas à
falta de espaços residenciais para alguns usuários de
serviços de saúde mental.
Moradores de rua com transtornos mentais severos,
quando inseridos em projetos terapêuticos especiais
acompanhados nos CAPS.”5
Este serviço conhecido pela rede de serviços socioassistenciais como
Residências Terapêuticas, tem como caráter primordial a substituição dos Hospitais
Psiquiátricos que acabavam por cumprir a função de moradia para os portadores de
transtornos mentais severos que perdiam os vínculos familiares.
Sendo assim, com a implementação de um serviço inovador que se propõe a
suprir cada vez mais o déficit de moradia para pessoas com transtornos mentais
graves, que precisam de um acompanhante nas suas tarefas diárias, faz-se
necessário usufruir cada vez mais deste serviço para possibilitar a efetiva Reforma
Psiquiátrica, que garante o tratamento em Saúde Mental, fortalecendo o convívio
familiar e comunitário e exercitando toda a sociedade a conhecer e lidar com as
questões que envolvem o antigo estigma sobre a população com transtorno mental.
A Sra. Luiza, por sua vez, apresenta significativo grau de autonomia para
seus cuidados, além de respeito para com as pessoas ao seu redor, o que denota a
possibilidade de projeto terapêutico individualizado com reintegração comunitária.
A senhora apresentou indícios de vínculo territorial com a cidade de Mauá,
além, de vínculos afetivos com munícipes da cidade, o que demonstra a importância
de que a senhora fique o mais próximo possível do local.
5
Residências terapêuticas: o que são, para que servem / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento
de Ações Programáticas Estratégicas. – Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
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O estabelecimento de vínculos nas relações sociais é condição importante
para a manutenção da saúde de todas as pessoas, necessário ainda no caso
específico de Sra. Luiza, que por conta de sua patologia, tem dificuldade em
recordar de seu passado. Sendo assim, é preciso dar condições para que a senhora
fortaleça os vínculos estabelecidos, aos quais ela se recorda, como parte do
acompanhamento social e de saúde.
O Hospital Quarteirão da Saúde efetua importante trabalho na busca do
passado de Sra. Luiza, o que não deve ser interrompido até que se esgotem as
possibilidades de intervenção do local.
Outro ponto que vale destacar neste estudo é a condição de vulnerabilidade
social de Sra. Luiza. Identificada como uma pessoa que estava em situação de rua,
sem documentos que viabilizem o exercício de sua cidadania, sem vínculos
familiares, sem fonte de renda e sem acompanhamento por parte do poder público.
Desta forma é imprescindível o referenciamento da senhora, além dos
serviços de saúde, também nos serviços socioassistenciais, que com
acompanhamento ordinário, poderão identificar outras necessidades e encontrar
estratégias para superação de possíveis violações de direitos.
Cabe mencionar que de acordo com a Lei Orgânica da Assistência Social:
Art. 1º - A Assistência Social, direito do cidadão e dever
do Estado, é Política de Seguridade Social não
contributiva, que prevê os mínimos sociais, realizada
através de um conjunto integrado de ações de iniciativa
pública e da sociedade, para garantir o atendimento às
necessidades básicas.6
Como a situação da Sra. Luiza deixou de ser um caso de prevenção de risco,
já estando numa condição de rompimento total de vínculos familiares, vivência de
situação de rua e de não-acesso a programas públicos, entende-se que é
necessário um acompanhamento individual com caráter protetivo e com capacidade
de flexibilização dos recursos que possam vir a dar resultados positivos na busca
pela autonomia e protagonismo social da Sra. Luiza.
6
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm - acessado em 20/12/2011, às 10h27.
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Sendo assim, a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), nos
apresenta como alternativa o Centro de Referência Especializado de Assistência
Social:
“O Centro de Referência Especializado de Assistência
Social (Creas) configura-se como uma unidade pública e
estatal, que oferta serviços especializados e continuados
a famílias e indivíduos em situação de ameaça ou
violação de direitos (violência física, psicológica, sexual,
tráfico de pessoas, cumprimento de medidas
socioeducativas em meio aberto, etc.).
A oferta de atenção especializada e continuada deve ter
como foco a família e a situação vivenciada. Essa
atenção especializada tem como foco o acesso da família
a direitos socioassistenciais, por meio da potencialização
de recursos e capacidade de proteção.
O Creas deve, ainda, buscar a construção de um espaço
de acolhida e escuta qualificada, fortalecendo vínculos
familiares e comunitários, priorizando a reconstrução de
suas relações familiares. Dentro de seu contexto social,
deve focar no fortalecimento dos recursos para a
superação da situação apresentada.
Para o exercício de suas atividades, os serviços
ofertados nos Creas devem ser desenvolvidos de modo
articulado com a rede de serviços da assistência social,
órgãos de defesa de direitos e das demais políticas
públicas. A articulação no território é fundamental para
fortalecer as possibilidades de inclusão da família em
uma organização de proteção que possa contribuir para a
reconstrução da situação vivida.
Os Creas podem ter abrangência tanto local (municipal
ou do Distrito Federal) quanto regional, abrangendo,
neste caso, um conjunto de municípios, de modo a
assegurar maior cobertura e eficiência na oferta do
atendimento.”7
7
http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/protecaoespecial/creas - consultado em 19/12/2011, às 15h42.
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Portanto, compreende-se que os equipamentos públicos de saúde e de
assistência social preconizados hoje, se apresentam como os meios mais
adequados de atendimento a Sra. Luiza, que por sua condição de saúde, deve ser
prioritariamente tratada pelos serviços públicos de saúde e de assistência social,
evitando-se a criminalização da saúde mental.
É o estudo.
6.
Conclusão
Diante do exposto anteriormente, sugere-se:
1) Que a senhora seja encaminhada imediatamente para um Serviço
Residencial Terapêutico na região do ABC, preferencialmente em Santo
André ou Ribeirão Pires (cidades próximas à Mauá, considerando que
Mauá não disponibiliza o referido serviço). No local ela poderá ser
acompanhada por profissional acompanhante terapêutico 24h/dia, além de
ser proposto projeto terapêutico individualizado, garantindo-se também
meios para realização de tratamento ambulatorial. Também poderá dar
continuidade ao trabalho realizado pelo Hospital Quarteirão da Saúde no
que diz respeito à busca pelo seu passado;
2) Imediato referenciamento em CAPS III do mesmo município do Serviço
Residencial Terapêutico em que estiver inserida, a fim de garantir o
tratamento ambulatorial em Saúde Mental. O CAPS também poderá dar
continuidade ao trabalho realizado pelo Hospital Quarteirão da Saúde no
que diz respeito à busca pelo seu passado;
3) Referenciamento no CREAS do mesmo município dos serviços acima,
para que possam avaliar o tipo de acompanhamento necessário para
superação da condição de vulnerabilidade social da senhora, além de
contribuir para a inserção em benefícios à que teria direito, como Benefício
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de Prestação Continuada ou outros, que venham a promover seu
protagonismo social. O serviço poderá também dar continuidade ao
trabalho realizado pelo Hospital Quarteirão da Saúde no que diz respeito à
busca pelo seu passado;
4) Solicitação de nova documentação para a senhora, que acompanhe a
identidade adquirida durante internação no Hospital Quarteirão da Saúde,
para que possa exercer seus direitos e deveres enquanto cidadã, após
serem esgotadas as possibilidades de localização de familiar ou de serviço
que conheça a sua identidade.
Sem mais.
Na oportunidade, renovam-se os votos de estima e distinta consideração.
Safira Bonilha de Oliveira
Agente de Defensoria Pública
Assistente Social – CRESS 41.901
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