1 INTRODUÇÃO Aula 1: O problema moral É comum às pessoas enfrentarem problemas, todos os dias nas suas relações pessoais. Esses problemas decorrem da convivência com os seus semelhantes e, até, com aqueles que não são tão semelhantes (uma árvore, um animal, um objeto, etc). Diante desses problemas, cada ser humano deve decidir qual a melhor maneira de se comportar, de solucionar tal problema, de agir de modo a resolvê-lo. Ao fazê-lo, este ser humano se vê na condição de juiz e avaliador dos seus próprios atos. Ele pode dizer se agiu certo ou se agiu errado. Mas, também, ele se expõe aos demais seres humanos, que também julgarão e avaliarão os seus atos. É comum que, em sociedade, e devido à repetição dos mesmos problemas, já existam certas normas que orientem o comportamento e a ação de cada ser humano, como também facilitem o julgamento e a avaliação pelos demais da ação que é realizada. Assim, o ser humano tem ao seu dispor um conjunto de normas, comuns a qualquer membro da sociedade em que se encontra, que indicam o que ele deve fazer em determinadas ocasiões. A esse comportamento chamamos: prático-moral. É comum, também, às pessoas, não apenas comportar-se moralmente, mas, também, refletir acerca do seu comportamento moral. Elas não apenas agem, mas justificam, fundamentam, constroem argumentos para suas ações. Quando isso acontece, já estamos perante um comportamento que chamamos: teórico-moral ou ético. Este comportamento reflexivo gera certo conhecimento: o conhecimento ético. Não cabe a este conhecimento dizer a cada pessoa se sua ação foi certa ou errada, boa ou má em uma situação concreta. Mas, ele pode ajudá-la, seja mostrando-lhe qual o melhor fim para o seu comportamento, ou mostrando-lhe quais os desejos, as aspirações corretas que devem motivar suas ações. 1 2 O conhecimento ético procura ajudar o ser humano nas questões morais que envolvem o seu agir no mundo, entendendo que todo agir humano é sempre um agir moral. Assim, é parte do estudo da ética: a ação humana que contribui para uma finalidade boa; os motivos, desejos e aspirações que move a ação humana enquanto justa, correta e conveniente; a ação humana de um indivíduo que deve ser acompanhada de responsabilidade, liberdade, intenção e vontade, diante de duas ou mais alternativas; a ação humana em uma sociedade que deve refletir a obrigatoriedade de agir ou não conforme suas normas e códigos, a fim de contribuir para o bem-estar desta sociedade; a forma como esses códigos e normas são elaborados pela sociedade, na forma de frases que determinam o comportamento moral, e como cada frase se organiza, funciona e se justifica naquela sociedade; as sociedades, diferentes uma das outras, com diferentes códigos e normas reguladoras, definindo o que é válido para todos os seres humanos, em qualquer sociedade, e o que é restrito a uma determinada sociedade, e como agir para com esta sociedade particular se o comportamento moral que ela aprova é muito diferente do aceitável em outras sociedades. A Ética procura, a partir das questões bastante concretas das relações humanas em sociedade, teorizar, isto é: explicar, esclarecer ou investigar a realidade do agir moral do ser humano, procurando fornecer-lhe meios de conhecer e agir moralmente na sociedade. Com a ajuda da Ética, o ser humano consegue compreender seu agir moral relacionando-o a um propósito mais amplo além da exigência imediata, comparando-o com outras formas de comportamento semelhante de outras pessoas em outras sociedades, sendo capaz até de explicar, discutir e recomendar ou não seu comportamento perante outros que agem de forma diferente dele mesmo. 2 3 Para ilustrar o que está sendo dito, leia alguns exemplos que Marilena Chauí (1999:334,335) oferece: Um pai de família desempregado, com vários filhos pequenos e a esposa doente, recebe uma oferta de emprego, mas que exige que seja desonesto e cometa irregularidades que beneficiem seu patrão. Sabe que o trabalho lhe permitirá sustentar os filhos e pagar o tratamento da esposa. Pode aceitar o emprego, mesmo sabendo o que será exigido dele? Ou deve recusá-lo e ver os filhos com fome e a mulher morrendo? Uma mulher vê um roubo. Vê uma criança maltrapilha e esfomeada roubar frutas e pães numa mercearia. Sabe que o dono da mercearia está passando por muitas dificuldades e que o roubo fará diferença para ele. Mas também vê a miséria e a fome da criança. Deve denunciá-la, julgando que com isso a criança não se tornará um adulto ladrão e o proprietário da mercearia não terá prejuízo? Ou deverá silenciar, pois a criança corre o risco de receber punição excessiva, ser levada para a polícia, ser jogada novamente às ruas e, agora, revoltada, passar do furto ao homicídio? Que fazer? Marilena Chauí conclui assim (1999:338): O campo ético é, portanto, constituído por dois pólos internamente relacionados: o agente ou sujeito moral e os valores morais ou virtudes éticas. Do ponto de vista do agente ou sujeito moral, a ética faz uma exigência essencial, qual seja, a diferença entre passividade e atividade. Passivo é aquele que se deixa governar e arrastar por seus impulsos, inclinações e paixões, pelas circunstâncias, pela boa ou má sorte, pela opinião alheia, pelo medo dos outros, pela vontade do outro, não exercendo sua própria consciência, vontade, liberdade e responsabilidade. Ao contrário, é ativo ou virtuoso aquele que controla interiormente seus impulsos, suas inclinações e suas paixões, discute consigo mesmo e com os outros o sentido dos valores e dos fins estabelecidos, indaga se devem e como devem ser 3 4 respeitados ou transgredidos por outros valores e fins superiores aos existentes, consulta sua razão e sua vontade antes de agir, tem consideração pelos outros sem subordinar-se nem submeterse cegamente a eles, responde pelo que faz, julga suas próprias intenções e recusa a violência contra si e contra os outros. E a Bíblia diz assim: Meu filho, tenha sempre estas duas coisas em vista: a verdadeira sabedoria é a capacidade de tomar decisões certas. Se você possuir essas duas qualidades, terá sempre forças renovadas. Elas são como uma medalha de honra. Elas o levarão por caminhos seguros, onde você não tropeçará. Elas lhe darão um sono tranqüilo à noite. Não precisará ter medo de problemas inesperados nem dos planos de homens maus, porque o Senhor mesmo vai proteger você. Ele não deixará que você caia em qualquer armadilha. (Provérbios 3:21-26, Bíblia Viva). 4