ÉTICA E PROFISSÃO * JAYME PAVIANI Não restam dúvidas de que a profissão de um homem marca profundamente sua existência, especialmente quando ele se integra no trabalho com toda sua inteligência e efetividade. O homem não pode agir como um autômato, sem intenções e sem interesses. A autenticidade ou inautenticidade de suas atitudes e do seu discurso tem uma íntima relação com o exercício profissional. Não é possível libertar-se dessa condição humana. Mesmo os profissionais que alegam agir independentemente do mundo pessoal e familiar acabam escolhendo este dualismo entre o trabalho e a vida particular. Mesmo na omissão, o homem continua escolhendo. Mesmo os que agem por simples hábito, mecanicamente – sem assumir as exigências da consciência profissional – optam pro uma atitude alienada e eticamente dúbia. De qualquer maneira, separar a profissão da vida pessoal e social é uma espécie de tentativa de negação do humano que somente se realiza e atinge seus fins na ação, na atividade lúdica e produtiva. Só o homem pode profissionalizar-se. A profissão, aqui, entendida como ato de professar, de exercer publicamente uma função ou modo de ser habitual, torna efetiva e visível a nossa condição social. Pois a profissão antes de ser um emprego, uma atividade especializada de caráter permanente, implica um compromisso social e encerra vínculos tanto de aspecto jurídico como existencial. A profissão hoje, sem dúvida, é uma das modalidades importantes do existir humano. A relação entre o ético e a ética profissional remonta à distinção aristotélica que considerou como ético aquilo que é relativo às virtudes práticas, ao comportamento do homem virtuoso, e ética, em conseqüência, a ciência que investiga os problemas éticos. Deste modo, a ética profissional, a partir de pressupostos éticos gerais e básicos, tenta legitimar princípios morais aceitos em determinada comunidade como sendo de validade comum. A ética profissional estuda códigos de ética específicos a cada área de aplicação e que na realidade seriam mais códigos morais, pois se limitam a normas que possibilitam um melhor relacionamento interpessoal. Mas, ao mesmo tempo que é preciso reconhecer os limites de tais normas, dependentes de uma situação social e histórica, também é preciso reconhecer o problema genuinamente filosófico presente na tentativa de fundamentar o ético e nele os sistemas sociais e políticos. Vivemos numa situação em que, tanto no plano do discurso como no plano da realidade, a ética está em crise. Em qualquer tipo de relação, os valores consagrados e os princípios norteadores da vida social e pessoal estão sendo superados por interesses que contradizem o bem comum e os direitos fundamentais do homem. Mas, se de um lado não possuímos uma resposta definitiva à pergunta sobre a natureza do bem e do mal, sobre o melhor modo de agir e sobre os valores que podem determinar um verdadeiro padrão de comportamento etc., por outro lado, ainda tentamos buscar uma solução para o problema ético, apesar de se perceber que ele consiste essencialmente numa experiência de ambigüidade. Dito de outro modo, a crise ética e uma experiência universal, isto é, de todos os homens, de todas as classes sociais e profissões, em todas as épocas. Ninguém pode se livrar do ético, isto é, da constante necessidade de escolher, de decidir, do deve ser, do agir ou do saber prudencial. * PAVIANI,Jaime. IN: PROBLEMAS DE FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO. 6.ed. Petrópolis: Vozes, 1991. p.107-109.