UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO KARLA DIAS ANTUNES DIABETES MELLITUS EM CÃES E GATOS: REVISÃO DE LITERATURA SALVADOR – BA 2009 KARLA DIAS ANTUNES DIABETES MELLITUS EM CÃES E GATOS: REVISÃO DE LITERATURA Monografia apresentada à Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), como pré-requisito para obtenção do título de especialista em Clínica Médica de Pequenos Animais. Orientadora: Dra. Suyiene Cordeiro Falcão – AECF Pio Décimo. Co-orientadora: Msc. Laura Cristina Pinho de Oliveira – Equalis. SALVADOR – BA 2009 KARLA DIAS ANTUNES DIABETES MELLITUS EM CÃES E GATOS: REVISÃO DE LITERATURA Monografia apresentada à Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), como exigência final para obtenção do título de especialização em Clínica Médica de Pequenos Animais. APROVADO EM 25 /04/2009 BANCA EXAMINADORA ___________________________________________ Profo. D.Sc. Eraldo Barbosa Calado UFERSA ___________________________________________ Profo. M.Sc. Laura Cristina Pinho de Oliveira Equalis ___________________________________________ Profo. MSc. Marcus Vinicius Fróes Barbosa UNIMEP A meu avô José Dias da Costa, um homem inteligente e bem sucedido que me apoiou com muito carinho e preocupação nesta trajetória árdua. DEDICO AGRADECIMENTOS À Deus por me encorajar nos momentos em que me sentia fragilizada, por nunca me desamparar e por me amar tanto, e por me guiar à conclusão de mais uma preciosa etapa de minha vida; A meus pais Joscelina Dias Antunes e Raimundo Nonato Antunes, que me orientaram para a vida e que, com dedicação, confiança e amor, proporcionaram-me a realização deste sonho: AMO VOCÊS! Aos meus irmãos, Erick Dias Antunes e Fabricio Dias Antunes pelo apoio quando precisei e incentivo em todos os momentos; MUITO OBRIGADA! A minha orientadora Suyiene e a minha Co-orientadora Laura Cristina que com seus conhecimentos souberam me guiar pelo melhor caminho, colaborando para a minha formação e qualificação profissional, muito obrigada por tamanha dedicação; Ao meu noivo Osório por ter me ajudado na preparação dessa monografia, pelos bons momentos e por estar sempre presente nessa árdua caminhada; TE AMO! A minha tia Joscélia e ao meu avô materno José Dias da Costa por torcerem por mim em todos os momentos da minha vida; Ao corpo docente da Equalis pelos ensinamentos passados em sala de aula me proporcionando um amadurecimento profissional; Aos meus colegas de turma que se tornaram meus grandes amigos, em especial a Sharlenne Monteiro, Emily Porto, Carlão, Gustavo, Ilka, Luciana e Tatiana pelos momentos de provas, trabalhos em equipe e pelos momentos de descontração muito obrigada pela amizade de vocês; As minhas amigas pessoais Caroline Maia, Heline Rocha e Lucélia Santos por me acompanharem nesta trajetória me dando bons incentivos e estando do meu lado neste importante momento; A todos que fariam enriquecer com seus nomes essa relação que, de uma forma ou de outra, contribuíram para meu êxito; “O justo importa-se com a alma do seu animal doméstico, mas as misericórdias dos iníquos são cruéis”. (Provérbios 12:10) RESUMO A diabetes mellitus é uma doença endócrina freqüente em cães e gatos, esta é uma doença complexa de ser tratada devido as suas etiologias e complicações advindas, pois, não temos uma patogenia elucidada. A maioria desses animais responde melhor à insulinoterapia, pois esta opção é que vai controlar da melhor forma os sinais clínicos, ajudar o animal a retomar a qualidade de vida e principalmente, evitar a cetoacidose. É fundamental o conhecimento do médico veterinário diante desta doença para que possa ser tratada com maior rapidez e eficácia. No decorrer da terapia insulínica se observa uma melhora na condição corpórea do cão ou do gato, tornando-os mais ágeis com apetite e sede normais. Aliado a isto, é necessária a participação efetiva do proprietário para que o animal possa ter uma vida sem complicações, sendo necessário o manejo nutricional, exercícios físicos regulares e controlados, favorecendo uma qualidade de vida desde que controlada a glicemia, evitando-se assim complicações inerentes a essa doença quando não tratada. O presente trabalho tem como principais objetivos informar a etiopatogenia para auxílio do protocolo terapêutico da enfermidade, descrever a forma clínica da doença, explicar as formas de diagnóstico da diabetes mellitus e comparar os tratamentos utilizados na doença em cães e gatos. Palavras-chave: pequenos animais, diabetes mellitus, cães, gatos ABSTRACT Diabetes mellitus is an endocrine disease that happens frequently in dogs and cats, this is a condition difficult to treat because it involves different etiologies and pathogenesis have not elucidated. The most of this animals respond better to insulin therapy, because this option will control better clinical signs, helping the animal to return the best quality of life and especially, avoiding ketoacidosis. It is fundamental the veterinarian knows about this disease because he can treat more quickly and effectively these animals. Along time, the insulin therapy shows a better body state in dogs and cats that become faster with normal appetite and thirst. Allied to this is the owner's interest in taking care of your animal, then, so that it can lead a healthy life close to normal nutritional management is necessary, regular exercise and controlled promoting a better life´s quality if glycemia, goes controlled avoiding complications that are bound this ill when it doesn´t go treated. This work has as main goals to help inform the pathogenesis of the therapeutic protocol of the disease, describe the clinical form of the disease, explain the ways of diagnosis of diabetes mellitus; compare the treatments used in the disease in dogs and cats. Keywords: small animals, diabetes mellitus, dogs, cats LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Cão da raça poodle com catarata ___________________________________ 19 Figura 2 – Cirurgia de catarata num cão ______________________________________ 19 Figura 3 – Gato com catarata _______________________________________________ 20 Figura 4 - Catarata diabética inicial em um cão, com vacúolos se estendendo do equador da lente _________________________________________________________ 20 Figura 5 - Postura plantígrada num gato com diabetes mellitus e insuficiência Pancreática exócrina _____________________________________________________ 21 Figura 6 – Gato obeso ____________________________________________________ 24 Figura 7 – Beagle obeso ___________________________________________________ 25 Figura 8 - Tiras de teste apropriadas para medir a glicose no sangue ________________ 26 Figura 9 - Tiras de teste apropriadas para medir a glicose na urina __________________ 26 Figura 10 – Glicosímetros _________________________________________________ 30 Figura 11 - Caninsulin® ___________________________________________________ 38 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ______________________________________________________ 10 2 OBJETIVOS ________________________________________________________ 2.1 OBJETIVO GERAL__________________________________________________ 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ___________________________________________ 12 12 12 3 REVISÃO DE LITERATURA _________________________________________ 3.1 CLASSIFICAÇÃO E ETIOLOGIA _____________________________________ 3.2 FISIOPATOLOGIA __________________________________________________ 3.2.1 Diabete mellitus não cetoacidótico ____________________________________ 3.2.2 Cetoacidose ______________________________________________________ 3.2.3 Diabete mellitus não-cetósico hiperosmolar (SHNC) ____________________ 3.3 EPIDEMIOLOGIA __________________________________________________ 3.4 SINAIS CLÍNICOS __________________________________________________ 3.5 DIAGNÓSTICO ____________________________________________________ 3.5.1 Anamnese ________________________________________________________ 3.5.2 Exame físico ______________________________________________________ 3.5.3 Estabelecimento do diagnóstico ______________________________________ 3.5.4 Avaliação do paciente ______________________________________________ 3.6 TRATAMENTO ____________________________________________________ 3.6.1 Tratamento da cetoacidose diabética _________________________________ 3.6.2 Tratamento do diabetes mellitus descomplicado ________________________ 3.7 INVESTIGAÇÃO DE UMA INSTABILIDADE ___________________________ 3.8 PROGNÓSTICO ____________________________________________________ 13 13 14 14 15 17 17 18 22 23 24 26 27 28 28 33 40 42 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ___________________________________________ 43 REFERÊNCIAS _______________________________________________________ 44 1 INTRODUÇÃO A diabetes mellitus é uma doença endócrina freqüente em cães e gatos e o seu diagnóstico, embora seja fácil, costuma também ser tardio, já que muitos donos não dão importância a pequenas alterações no cotidiano dos seus animais. (VELAZ, 2008). Essa doença caracteriza-se por deficiência relativa ou absoluta de produção e secreção insulínica das células ß das ilhotas de Langerhans pancreáticas, podendo ser classificada como: insulino-dependente ou não insulino-dependente, de modo similar ao que é descrito em humanos (HERRTAGE, 2001) (JONES et al., 2000) (MINAKATA, 2005). Na maioria das vezes a causa de diabetes não é muito clara. Alguns fatores que podem predispor um animal a esta doença incluem fatores hereditários, progestágenos, corticosteróides, pancreatite ou outras condições que afetam o pâncreas (VELAZ, 2008). Os sinais clínicos são polidipsia, poliúria, polifagia, má condição da pelagem, intolerância ao exercício e perda de peso apesar de um bom apetite. A diabetes mellitus é comumente associada à formação de catarata bilateral de desenvolvimento rápido, no cão, que resulta de alterações bem descritas nas vias metabólicas da lente. Esta manifestação ocular mais consistente e precoce é a catarata (GELATT, 2003) (MINAKATA, 2005) (NELSON, 1997). O diagnóstico da diabetes é feito pela dosagem de glicose no sangue e na urina. (MELKI, 2008). A determinação de hiperglicemia em jejum e glicosúria, detectada no exame da urina, permite a rápida confirmação do diabetes mellitus em cães (MINAKATA, 2005). O único tratamento para esta doença endócrina é a terapia insulínica contínua, já que a perda da função das células beta do pâncreas (responsáveis pela produção normal de insulina) é, na maioria das vezes, irreversível, exigindo aplicações diárias de insulina (MINAKATA, 2005). Os tipos de insulina disponíveis na indústria farmacêutica variam de acordo com o início e duração de sua ação, e são classificados em insulina de ação rápida (insulina regular), intermediária (insulina Lenta e a NPH) e de longa (ultralenta, protamina zinco [PZI]) (MINAKATA, 2005). As doses iniciais de insulina variam de 0,25 a 1 U/kg a cada 12 horas. A insulinoterapia e os horários de alimentação são individualizados e baseados na correção da poliúria e polidipsia e a manutenção do peso corpóreo ideal, além da mensuração periódica da glicemia e da avaliação de proteínas glicadas. Quaisquer recomendações para o tratamento do animal devem ser avaliadas levando em consideração o estilo de vida do proprietário e sua disposição e habilidade em aderir ao plano de tratamento (DUARTE, 2004). O controle da glicemia pode ser mantido em alguns gatos diabéticos com tratamento dietético e com medicamentos hipoglicemiantes orais (NELSON, 1997). Embora a maioria dos gatos necessitem de injeções de insulina (MELKI, 2008). A diabetes mellitus nos animais, tal como nos humanos, não tem cura, mas um tratamento correto pode proporcionar ao animal uma maior longevidade com uma boa qualidade de vida. A manutenção do cão ou gato diabético assenta em 3 bases essenciais: uma dieta adequada, a monitorização da glicemia e o exercício físico (VELAZ, 2008). Atualmente, devido ao auxílio diagnóstico com exames complementares evidenciando uma maior casuística de diabetes mellitus na clínica de pequenos animais, justifica-se esta revisão para uma maior elucidação da fisiopatologia, diagnóstico e tratamento em cães e gatos. 2 OBJETIVOS 2.1 OBJETIVO GERAL: Relatar a diabetes mellitus em cães e gatos. 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS: Informar a etiopatogenia para auxílio do protocolo terapêutico da enfermidade; Descrever a forma clínica da doença; Explicar as formas de diagnóstico da diabetes mellitus; Comparar os tratamentos utilizados na doença em cães e gatos. 3 REVISÃO DE LITERATURA 3.1 CLASSIFICAÇÃO E ETIOLOGIA A diabetes mellitus é classificada como tipo I ou II, com base nos mecanismos fisiopatológicos e alterações patogênicas que afetam as células beta (NELSON, 1997) (VELAZ, 2008). A diabetes mellitus do tipo I caracteriza-se pela destruição de células beta, com perda progressiva e eventualmente completa da secreção de insulina (FENNER, 2000) (JONES et al., 2000) (NELSON, 1997) (VELAZ, 2008). Cães e gatos que adquiriram este tipo de diabetes podem apresentar-se com surgimento súbito dos sinais, em decorrência da queda abrupta na secreção de insulina (NELSON, 1997). Estes animais necessitam de tratamento com insulina desde o momento do diagnóstico (isto é, diabetes mellitus dependente de insulina [DMDI]) (NELSON; COUTO, 2006) (FENNER, 2000) (JONES et al., 2000) (NELSON, 1997). Alternativamente, cães e gatos podem sofrer redução gradual da secreção de insulina, à medida que as células beta vão sendo lentamente destruídas. Estes animais podem apresentar período inicial em que a hiperglicemia pode ser branda, ou facilmente controlada com pequenas doses de insulina (isto é, diabetes mellitus não dependente de insulina (DMNDI)); contudo, com o passar do tempo, a deficiência de insulina torna-se absoluta, ocorrendo então DMDI (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). A diabetes mellitus do tipo II caracteriza-se pela resistência e/ou por células beta disfuncionais (VELAZ, 2008) (FENNER, 2000) (JONES et al., 2000) (NELSON, 1997). Os diabéticos do tipo II podem ser DMDI ou DMNDI, dependendo da gravidade da resistência à insulina e do estado funcional das células beta. O diabetes mellitus dos tipos I e II foi identificado tanto em cães quanto em gatos (NELSON, 1997). O diabetes mellitus secundário envolve os cães e gatos diabéticos que desenvolvem intolerância aos carboidratos secundária à afecção resistente à insulina concomitante. Os exemplos são: cadela em diestro, hiperadrenocorticismo, e acromegalia (NELSON; COUTO, 2006) (KERR, 2003) (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). Gatos com diabetes temporário têm as necessidades de insulina aumentadas e diminuídas em aproximadamente 20%, e estão subclínicos até que o pâncreas endócrino seja posto sob tensão pela inflamação, por afecção sistêmica, ou pela administração de medicamento antagonista da insulina. Esta espécie talvez nunca necessite de insulinoterapia ou torne-se permanentemente dependente da insulina semanas a meses após a resolução de estado prévio de diabetes (NELSON; COUTO, 2006) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). Em cães, a causa de diabetes mellitus ainda não está bem caracterizada, mas sem dúvida é multifatorial. Os fatores que promovem o desenvolvimento de diabetes mellitus incluem predisposição genética, infecção, doenças e antagonistas de insulina, obesidade, insulite imunomediada e pancreatite (MACINTIRE et al., 2007) (ROYAL CANIN, 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON, 1997). Já nos gatos os fatores incluem a amiloidose das ilhotas, obesidade, infecção, enfermidade concomitante, medicamentos como o acetato de megestrol ou outros progestágenos e pancreatite crônica (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (KERR, 2003) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). 3.2 FISIOPATOLOGIA As formas clínicas do diabetes são classificadas como não cetótica, cetoacidóticas e hiperosmolares não cetóticas (CHASTAIN, 1999). 3.2.1 Diabetes mellitus não cetoacidótico Uma deficiência relativa ou absoluta da insulina resulta numa diminuição da utilização da glicose, aminoácidos, e ácidos graxos pelos tecidos periféricos, por exemplo: hepatócitos, miócitos e adipócitos. A glicose obtida da dieta ou da gliconeogênese hepática, que ocorre num grau modesto diante de quadro de hipoinsulinemia, acumula-se na circulação, causando hiperglicemia. À medida que aumenta a concentração plasmática da glicose, é excedida a capacidade de reabsorção das células tubulares renais para a glicose presente no ultrafiltrado glomerular, o que resulta em glicosúria. Isto ocorre quando a concentração plasmática de glicose excede 180 a 220 mg/dl no cão. O limiar renal para a glicose não é tão evidente no gato. O limiar médio relatado para gatos normais é de 290 mg/dl; entretanto, os gatos diabéticos parecem, subjetivamente, ter limiar renal para glicose de aproximadamente 200 a 240 mg/dl. A glicosúria cria diurese osmótica, causando poliúria. A polidipsia compensatória impede a desidratação. A glicosúria também representa a perda calórica e, conjuntamente com a diminuição do metabolismo da glicose ingerida no tecido periférico, resultará em perda de peso (MACINTIRE et al., 2007) (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). O centro da saciedade na região ventromedial do hipotálamo é responsável pelo controle da quantidade de alimento ingerido. A quantidade de glicose que ingressa nas células nesta região do cérebro afeta diretamente a sensação de fome; quanto mais glicose ingressa nestas células, menor é a sensação de fome, e maior a inibição do centro da saciedade. A capacidade da glicose em ingressar nestas células está sob a influência da insulina. No diabetes mellitus com a ausência relativa absoluta de insulina, a glicose não ingressa nestas células, o centro da saciedade não é inibido, e o indivíduo torna-se polifágico, a despeito da presença de hiperglicemia (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). 3.2.2 Cetoacidose Acredita-se que quatro alterações principais sejam responsáveis pelo aumento na cetogênese e na gliconeogênese: deficiência de insulina, excesso dos hormônios diabetogênicos, jejum, e desidratação. Virtualmente todos os cães e gatos com cetoacidose diabética (CAD) apresentam deficiência de insulina relativa ou absoluta (MACINTIRE et al., 2007) (GRAVES, 2006) (NELSON, 1997). A deficiência de insulina é essencial para o início da lipólise. Os ácidos graxos não-esterificados liberados do tecido adiposo são utilizados extra-hepaticamente como combustíveis oxidativos, e também são assimilados pelo fígado, numa velocidade dependente de sua concentração plasmática. Com a insulina presente, os ácidos graxos são incorporados nos triglicérides no fígado. Com deficiência de insulina, estes ácidos graxos são convertidos até acil-CoA (um derivado da coenzima A [CoA]), que, por sua vez, é oxidado até acetil CoA. No caso de diabetes grave, acetil-CoA é desviado quase que inteiramente para a formação de acetoacetil-CoA, e assim até ácido acetoacético. O ácido acetoacético é ainda metabolizado até ácido beta-hidroxibutírico. Acetona se forma pela descarboxilação espontânea do acetoacetato. Estes corpos cetônicos – ácido acetoacético, ácido beta-hidroxibutírico, e acetona – causam a cetose e a acidose da cetoacidose (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). A cetogênese é promovida pelo excesso de hormônios diabetogênicos e por fatores não-hormonais, mais notavelmente o jejum e a desidratação. As propriedades antagonistas à insulina dos hormônios diabetogênicos (isto é, glucagon, catecolaminas, cortisol, hormônio do crescimento) pioram a hiperglicemia e a cetonemia em curso, provocando acidose, depleção de líquidos, e hipotensão. O corpo aumenta a produção dos hormônios diabetogênicos em resposta a ampla variedade de situações de tensão (física ou mental). Distúrbios coexistentes, como a pancreatite e a infecção, são comuns em cães e gatos com CAD, e estes distúrbios têm o potencial de aumento da secreção dos hormônios diabetogênicos (NELSON, 1997). No caso de deficiência de glicose, os corpos cetônicos podem ser utilizados como fonte de energia por muitos tecidos. Numa situação de curto prazo, a conversão de ácidos graxos livres até corpos cetônicos é medida de segurança. A velocidade da cetogênese está ligada à velocidade de gliconeogênese e da lipólise; quanto mais rápidos estes últimos fatores, mais rapidamente ocorrerá a produção de corpos cetônicos (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON, 1997). A deficiência de insulina também prejudica a utilização de corpos cetônicos pelos tecidos periféricos. Isto, conjuntamente com seu aumento de produção, resulta num acúmulo de corpos cetônicos no sangue. Corpos cetônicos excessivos podem superar o sistema de tamponamento do corpo, provocando aumento na concentração dos íons hidrogênio arteriais e decréscimo no bicarbonato sérico (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). As crescentes concentrações séricas de glicose e corpos cetônicos nos casos de diabetes terminam resultando em sua excreção na urina, criando diurese osmótica. Além disto, a natureza aniônica dos corpos cetônicos, mesmo num pH urinário maximamente ácido, obriga à excreção de íons positivamente carregados, como o sódio e o potássio. A perda urinária de líquidos e sais é importante fator contributivo para a ocorrência da desidratação (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). A desidratação causa a contração do espaço do líquido intravascular, levando à azotemia pré-renal e a declínio na velocidade de filtração glomerular. Pacientes hiperglicêmicos com velocidades de filtração glomerular reduzidas perdem sua capacidade de excreção da glicose e, em menor grau, dos íons hidrogênio. Então, ocorre acúmulo de glicose e corpos cetônicos no espaço vascular, numa velocidade mais rápida. O resultado é o aumento da hiperglicemia e da cetonemia, o que predispõe o paciente diabético a CAD mais séria (NELSON, 1997). 3.2.3 Diabetes melitus não-cetósico hiperosmolar (SHNC) A hiperglicemia e a diurese osmótica e uremia pré-renal associadas que ocorrem em alguns cães diabéticos, e provavelmente em alguns gatos, têm o potencial de causar uma hiperosmolaridade grave do líquido extracelular e o desenvolvimento da síndrome hiperosmolar não-cetósica (SHNC). Esta síndrome caracteriza-se por: (1) hiperglicemia grave (glicemia>600 mg/dl), (2) hiperosmolaridade (>350 mOsm/kg), (3) desidratação clínica grave, (4) ausência de corpos cetônicos na urina ou no soro, (5) acidose metabólica inexistente, ou apenas moderada, e (6) alguma depressão do sistema nervoso central (SNC), pelo menos até o ponto da letargia. Como ocorre com CAD, uma condição precipitante como a insuficiência renal, pneumonia, ou outro estado de tensão grave está associado à SHNC (MACINTIRE et al., 2007) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Certos medicamentos, a exemplo dos anticonvulsivantes, glicocorticóides, e diuréticos do grupo das tiazidas, também podem precipitar ou contribuir para a progressão desta síndrome (NELSON, 1997). A patogênese da SHNC é deficientemente compreendida, mas acredita-se que envolva funcionamento deficiente do SNC ou a interferência com a ingestão de líquidos induzida pelo aumento da osmolaridade, azotemia, e náusea (NELSON, 1997). A hiperosmolaridade causa confusão mental, contribuindo ainda mais para a redução ou ausência da ingestão de líquidos, o que aumentará a complexidade global do problema (NELSON, 1997). Não se encontra presente uma cetonemia (CHASTAIN, 1999). A ausência de Cetose não está bem compreendida (NELSON, 1997). 3.3 EPIDEMIOLOGIA Cães com diabetes mellitus comumente situam-se na faixa etária entre 4 e 14 anos, com pico de incidência aos 7 a 9 anos (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (KERR, 2003) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). O diabetes juvenil ocorre em cães < 1 ano de idade, mas é raro (NARDO et al., 2006). As fêmeas são afetadas aproximadamente duas vezes mais que os machos (ROYAL CANIN, 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (KERR, 2003) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). Os cães com predisposição genética são os da raça australian terriers, bichon frise, cairn terriers, chow-chow, fox terriers, golden retrievers, husky siberiano e raças mistas, keeshonds, labrador retriever, lhasa apso, old english sheepdog, pinschers miniatura, pulik, samoyeda, spitz e yorkshire terriers (VELAZ, 2008) (MACINTIRE et al., 2007) (NARDO, 2006) (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (JONES et al., 2000) (NELSON, 1997). Já as raças frequentemente afetadas são beagles, dachshunds, poodles e schnauzers miniatura (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997) Embora o diabetes mellitus possa ser diagnosticado em gatos de qualquer idade, a maioria dos gatos diabéticos pesquisados encontravam-se acima de 6 anos de idade (ROYAL CANIN, 2007) (KERR, 2003) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). O diabetes mellitus ocorre predominantemente em gatos machos castrados (ROYAL CANIN, 2007) (KERR, 2003) (HERRTAGE, 2001), e aparentemente não há predisposição racial (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). 3.4 SINAIS CLÍNICOS Os sinais clínicos do diabetes mellitus dependem do tipo de insuficiência insulínica, do grau dessa insuficiência e das situações que precedem o início da insuficiência (CHASTAIN, 1999). Os quatro sinais clássicos de diabetes mellitus no cão e no gato são: poliúria, polidipsia, polifagia e perda de peso (MELKI, 2008) (VELAZ, 2008) (MACINTIRE et al., 2007) (ROYAL CANIN, 2007) (NARDO, 2006) (NELSON; COUTO, 2006) (MINAKATA, 2005) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Também há má condição da pelagem e intolerância ao exercício (ROYAL CANIN, 2007) (NELSON; COUTO, 2006). Nas fases mais avançadas da doença, e naquelas em que, por vezes, existe risco de vida, os animais podem ficar muito apáticos, vomitar, apresentar um decréscimo de apetite e uma respiração ofegante (taquipnéia) (ROYAL CANIN, 2007). Nas complicações crônicas do diabetes mellitus há o aparecimento de catarata (figura1), retinopatia diabética, neuropatia diabética, nefropatia diabética (NELSON, 1997). Figura 1 - Cão da raça poodle com catarata. Fonte: PIGATTO et al, 2009. Na formação de cataratas (figura 1) (VELAZ, 2008) (CHASTAIN, 1999), os animais deixam de ver, pois é um processo irreversível pelo que deve ser evitado a todo custo. A única solução quando estas já estão instaladas é recorrer à cirurgia (figura 2) e a visão é restaurada em 75 a 80% dos cães (VELAZ, 2008) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). Figura 2 - Cirurgia de catarata num cão. Fonte: CLÍNICA VETERINÁRIA LIEBERKNECHT. Cataratas são uma das mais prevalentes – e importantes – complicações da diabetes mellitus canina; um estudo retrospectivo (envolvendo relativamente poucos animais) citou uma taxa de prevalência de 68% (NARDO, 2006) (GELATT, 2003) (JONES et al., 2000) (NELSON, 1997), mas essa lesão raramente é encontrada em gatos (figura 3) (ROYAL CANIN, 2007) (FENNER, 2000) (JONES et al., 2000) (NELSON, 1997). Cataratas diabéticas caninas frequentemente são tão rapidamente progressivas e osmoticamente ativas que a intumescência da lente bem como a perda de proteínas da lente (resultando em uveíte) comumente ocorre (GELATT, 2003) (NELSON; COUTO, 2001). Figura 3 - Gato com catarata. Fonte: ESTEVES, 2007. A formação da catarata diabética varia entre as espécies de acordo com vários fatores como a predisposição racial no cão, a idade do cão, o tempo de ocorrência da doença e a gravidade da hiperglicemia (figura 4). O cão jovem é muito suscetível à formação da catarata diabética. Tais cataratas estão presentes no exame inicial de quase 60% das diabetes caninas espontâneas também (GELATT, 2003). Figura 4 – Catarata diabética inicial em um cão com vacúolos se estendendo do equador da lente. Fonte: GELATT, 2003. A retinopatia diabética é complicação clínica rara no cão e no gato. Existe correlação muito próxima entre a retinopatia diabética e o controle glicêmico sub-ótimo. Infelizmente, o rápido desenvolvimento da catarata frequentemente inibe a capacidade de avaliação da retina no cão com diabetes mellitus. A remoção do cristalino não se justificaria num cão diabético com alterações retinianas suficientemente graves a ponto delas próprias, resultarem em cegueira (NELSON, 1997). Também pode ser utilizado eletrorretinograma, na avaliação do funcionamento da retina, antes da cirurgia para tratamento da catarata (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). A diabetes pode causar neuropatia (MELKI, 2008) (NELSON; COUTO, 2006) (JONES et al., 2000) (NELSON, 1997) e fraqueza dos membros posteriores, assim como problemas circulatórios como embolias, que ocorrem quando o hipertiroidismo causa cardiomiopatia e pressão alta. Algumas vezes os problemas circulatórios ocorrem como conseqüência direta da diabetes (MELKI, 2008). A neuropatia diabética é um distúrbio raramente relatado no cão e no gato. A neuropatia subclínica é provavelmente mais comum que a neuropatia grave resultando em sinais clínicos. Os sinais clínicos que apóiam uma neuropatia coexistente no cão ou gato diabético são: debilitação, “ajoelhamento” (talípede), atrofia muscular, depressão dos reflexos dos membros, e deficiências nos testes para a reação postural. Frequentemente os gatos apresentam postura plantígrada (figura 5) em que os tarsos tocam o solo quando o gato caminha. No cão, ocorre basicamente polineuropatia distal, caracterizada por desmielinização/remielinização segmentada e degeneração/regeneração axonal (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). Figura 5 – Postura plantígrada num gato com diabete melito e insuficiência pancreática exócrina. Fonte: NELSON, 1997. A causa da neuropatia diabética não é conhecida (NELSON, 1997). Não há tratamento específico para a neuropatia diabética. A glicorregulação agressiva com a insulina pode melhorar a condução nervosa, e em gatos, promove a reversão da debilitação posterior e a postura plantígrada (figura 5). Contudo, a resposta à terapia é variável (NELSON; COUTO, 2006) (NELSON, COUTO, 2001) (NELSON, 1997). Embora a nefropatia diabética tenha sido ocasionalmente relatada no cão, sua identificação clínica parece ser baixa. O mecanismo patogênico da nefropatia diabética é desconhecido, mas provavelmente esta complicação resulta de diversas causas. Os sinais clínicos dependem da gravidade da glomerulosclerose e da capacidade funcional do rim, em excretar os restos metabólicos. Inicialmente, a nefropatia diabética se manifesta como proteinúria grave, basicamente albuminúria, em decorrência da disfunção glomerular. À medida que progridem as alterações glomerulares, a filtração glomerular torna-se cada vez mais deficiente, resultando na ocorrência de azotemia e, finalmente, uremia. No caso de fibrose grave dos glomérulos, ocorre insuficiência renal oligúrica e, em seguida, anúrica. Não há tratamento específico da nefropatia diabética, afora o controle metabólico meticuloso do estado diabético, o tratamento clínico conservador da insuficiência renal, e o controle da hipertensão sistêmica. A progressão da glomerulosclerose está relacionada ao grau de controle sistêmico. Parece ocorrer decréscimo definido na incidência das alterações microvasculares glomerulares, com o aumento do controle glicêmico (NELSON, 1997). 3.5 DIAGNÓSTICO Por ocasião do diagnóstico todos os cães e gatos diabéticos apresentam com hiperglicemia em jejum e glicosúria, independentemente do tipo de diabetes mellitus que possa estar presente (MACINTIRE et al., 2007) (NARDO, 2006) (MINAKATA, 2005) (NELSON, 1997). Assim que tenha estabelecido o diagnóstico de diabetes mellitus, o clínico deverá considerar então a possibilidade de DMNDI e a necessidade de insulinoterapia. Os cães devem ser considerados como sofrendo DMDI, devendo ser tratados com insulina, a menos que haja forte suspeita de diabetes mellitus secundário (por exemplo, cadela intacta em diestro) (NELSON, 1997). O controle da glicemia pode ser mantido em alguns gatos diabéticos com tratamento dietético e com medicamentos hipoglicemiantes orais. Obviamente, seria vantajosa a possibilidade de diferenciação prospectiva entre DMDI e DMNDI. Testes com secretagogos da insulina têm sido aplicados em seres humanos, com esta finalidade. Infelizmente, a determinação da concentração sérica basal da insulina, ou a da concentração sérica deste hormônio em seguida à administração de secretagogo específico não se mostrou meio auxiliar consistente para a diferenciação entre DMDI e DMNDI no gato. Devido aos problemas com os testes com secretagogos da insulina, na identificação do funcionamento das células beta, com freqüência a diferenciação final entre DMDI e DMNDI é feita retrospectivamente, depois que o clínico teve diversas semanas para avaliar a resposta do gato ao tratamento, e para determinar a necessidade de insulina do gato. A decisão inicial concernente à insulinoterapia versus medicamentos hipoglicemiantes orais baseia-se na gravidade dos sinais clínicos, presença ou ausência de cetoacidose, saúde geral do gato, e dos desejos do dono do paciente. (NELSON, 1997). 3.5.1 Anamnese A história em virtualmente todos os diabéticos consiste das alterações clássicas de polidipsia, poilúria, polifagia, e perda de peso (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). Uma anamnese completa é extremamente importante, mesmo no caso do chamado “diabético nítido”, porque o clínico deve tomar ciência de qualquer problema complicador ou concomitante no paciente (NELSON, 1997). Ocasionalmente, um dono apresentará seu cão devido à cegueira súbita causada pela formação de catarata (figura 1), ou um gato devido à fraqueza dos membros pélvicos, e postura plantígrada (figura 5) (NELSON; COUTO, 2006) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). Se os sinais clínicos associados ao diabetes não complicado não são observados pelo dono, e se não ocorre catarata ou astenia dos membros pélvicos, um cão ou gato diabético estará sob risco de apresentar os sinais sistêmicos da enfermidade, à medida que se desenvolvem cetonemia e acidose metabólica progressivas (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). 3.5.2 Exame físico Os achados do exame físico dependem da presença e gravidade da cetoacidose diabética (CAD) e da natureza de qualquer distúrbio concomitante. No diabético não cetoacidótico, não há achados físicos clássicos. Muitos cães e gatos diabéticos são obesos (figura 6 e figura 7), mas, sob outros aspectos, encontram-se em boas condições físicas. Cães e gatos com diabetes não tratado de longa duração podem ter perdido peso, mas raramente estarão emaciados, a menos que esteja presente afecção concomitante (por exemplo, insuficiência pancreática exócrina, hipertiroidismo). A hepatomegalia induzida pela lipidose hepática (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (ROTHUIZEN; HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (JONES et al., 2000) (NELSON, 1997), e a ocorrência de catarata são achados comuns (figura 2) (NELSON; COUTO, 2006) (FENNER, 2000) (JONES, 2000) (NELSON, 1997). Figura 6 – Gato obeso. Fonte: IAMS, 2007. Figura 7 – Beagle obeso. Fonte: ADFER, 2007. Os gatos diabéticos que passam a ter postura plantígrada (figura 5) acredita-se que seja causada por neuropatia diabética, não é comum; esta ambulação e/ou postura foi também observada em gatos com poliartrite crônica (MELKI, 2008) (VELAZ, 2008) (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). Eles podem voltar a andar normalmente com o uso de insulina (MELKI, 2008) (VELAZ, 2008). No cão ou gato diabético cetoacidótico, os achados físicos são: desidratação, depressão, astenia, taquipnéia, vômito, e algumas vezes hálito com intenso odor de acetona. No caso de acidose metabólica grave, poderá ser observada respiração lenta e profunda (isto é, respiração de Kussmaul) (GRAVES, 2006) (HERRTAGE, 2001). Os sinais gastrintestinais de vômito e de dor e distensão abdominal são comuns na CAD, devendo ser diferenciados dos sinais similares associados à pancreatite, peritonite, ou outros distúrbios intra-abdominais (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). Os donos de animais de companhia acometidos pela síndrome hiperosmolar nãocetósica (SHNC) do diabetes em geral observam os sinais clássicos do diabetes mellitus (isto é, polidipsia, poliúria, polifagia e perda de peso). Estes sinais precedem a debilitação progressiva, anorexia, vômito, e letargia que podem acometer o animal. Com freqüência, o exame físico revelará desidratação profunda. Tipicamente estes animais estão letárgicos, extremamente deprimidos, ou realmente comatosos. São comuns a ocorrência de hipertermia e a detecção de tempo de repleção capilar lento (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON, 1997). As lesões dermatológicas associadas aos diabetes mellitus são incomuns. Nos cães com diabetes mellitus, pode-se observar um eritema migratório necrolítico (também conhecido como síndrome hepatocutânea, dermatite necrolítica superficial ou necrose epidérmica metabólica) (MERCHANT, 1999). 3.5.3 Estabelecimento do diagnóstico O diagnóstico de diabetes mellitus depende da presença dos sinais clínicos apropriados e da documentação da hiperglicemia de jejum e glicosúria persistentes. A determinação da glicemia e de glicosúria com tiras de teste apropriadas para o sangue (chemstrip bG) e urina (ketodiastix) (figura 8 e figura 9) permite a rápida confirmação do diabetes mellitus, tanto em cães quanto em gatos. A documentação concomitante da cetonúria estabelece cetoacidose diabética (CAD) (MACINTIRE et al., 2007) (GRAVES, 2006) (NELSON; COUTO, 2006) (KERR, 2003) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). Figura 8 - Tiras de teste apropriadas Para medir a glicose no sangue. Fonte: QUADMED. Figura 9 – Tiras de teste apropriadas para medir a glicose na urina. Fonte: PETICIOUS. A hiperglicemia diferencia o diabetes mellitus da glicosúria renal primária, enquanto que a glicosúria diferencia o diabetes mellitus de outras causas de hiperglicemia (NELSON; COUTO, 2006) (NELSON, 1997), especialmente a hiperglicemia induzida por estresse (NELSON; COUTO, 2006). Uma leve hiperglicemia (isto é, faixa de 130 a 180 mg/dl) é clinicamente silenciosa e pode ocorrer até 2 horas pós-prandialmente em alguns cães e gatos, em seguida ao consumo de alimentos moles e hidratados, em cães e gatos “sob tensão”, no início do diabetes mellitus, e diante de distúrbios causadores da ineficácia da insulina. Nestes animais, não está indicada insulinoterapia, visto não estar presente um diabetes mellitus clínico (NELSON, 1997). Pode-se diagnosticar diabetes mellitus claro se valores sanguíneos de glicose em jejum repetidos excederem 140 mg/dl ou se um valor sanguíneo de glicose em jejum ou pósprandial único exceder 200 mg/dl. Ocasionalmente, os valores sanguíneos de glicose em jejum podem exceder apenas periódica ou transitoriamente 140 mg/dl; isso pode ser causado por prejuízo leve a moderado nos cães que apresentam tolerância à glicose ou hiperglicemia relacionada com estresse (CHASTAIN, 1999). 3.5.4 Avaliação do paciente A base mínima de avaliação laboratorial em qualquer diabético não-cetósico “sadio” deve constar de: hemograma completo, painel bioquímico, lipase sérica, tiroxina sérica (gato), e urinálise com cultura bacteriana (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (POPPL, 2006) (DUNN, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). A concentração de progesterona sérica deve ser determinada se o diabetes mellitus for diagnosticado em uma cadela intacta (NELSON; COUTO, 2006). Outros testes adicionais podem justificar-se, após a obtenção da anamnese e da conclusão do exame físico (NELSON; COUTO, 2006) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). A insulinoterapia pode ser iniciada enquanto são aguardados os resultados laboratoriais (NELSON; COUTO, 2006). A avaliação laboratorial de cães e gatos aparentemente sadios que demonstraram a presença de glicose e corpos cetônicos na urina (pela urinálise) é similar à para o diabético não cetósico (NELSON, 1997). Em contraste, cães e gatos diabéticos cetoacidóticos que se apresentam com letargia, inapetência, vômito, diarréia, e desidratação são emergências metabólicas críticas, que demandam plano terapêutico muito mais agressivo. Os testes minimamente necessários são: urinálise, hematócrito, concentração plasmática das proteínas totais, glicemia, dióxido de carbono total venoso ou avaliação ácido-básica arterial, nitrogênio sanguíneo derivado da uréia (BUN) ou creatinina sérica, eletrólitos séricos (Na, K, Ca, PO 4), e eletrocardiograma (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON, 1997). Estes estudos fazem-se necessários para a imediata avaliação/terapia intensiva do paciente. Talvez haja necessidade de outros dados, como radiografias ou estudos clinicopatológicos adicionais, para a avaliação clínica completa do paciente (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON, 1997). Todavia, o “perfil de cetoacidose” fornece a informação necessária para que seja dado início ao tratamento de emergência apropriado (NELSON, 1997). A ultrassonografia abdominal é indicada para avaliar a possibilidade de pancreatite, adrenomegalia, piometra (cadelas intactas) e anormalidades do fígado e trato urinário (p.ex., alterações consistentes com pielonefrite ou cistite) (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON; COUTO, 2006). A mensuração da insulina sérica basal, bem como os testes de resposta à insulina, não são realizados rotineiramente (NELSON; COUTO, 2006). 3.6 TRATAMENTO O tratamento pode ser dividido em tratamento agudo da cetoacidose diabética e estabilização do diabético descontrolado. Um cão cetoacidótico pode ficar estabilizado como no caso não complicado, uma vez que tenha começado a se alimentar normalmente (HERRTAGE, 2001). O objetivo do tratamento agudo do paciente com CAD é corrigir o desarranjo metabólico de modo que o paciente fique estável (MACINTIRE et al., 2007). 3.6.1 Tratamento da cetoacidose diabética Embora o diabético cetótico saudável possa ser geralmente tratado conservativamente, sem fluidoterapia ou terapia intensiva, a cetoacidose diabética caracterizada por hiperglicemia, cetonemia, acidose metabólica, desidratação e desequilíbrio eletrolítico constitui uma emergência médica associada com taxa de mortalidade alta (HERRTAGE, 2001). O tratamento deve consistir na reposição hídrica e eletrolítica, na redução da concentração sanguínea de glicose, na correção da acidose e na identificação das causas precipitantes (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). A reposição intravenosa de fluido e eletrólitos torna-se essencial para um tratamento bem-sucedido da cetoacidose diabética. A menos que os eletrólitos séricos sugiram outra maneira, o cloreto de sódio a 0,9% constitui o fluido inicial de escolha (MACINTIRE et al., 2007) (GRAVES, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). Pode-se alternar o cloreto de sódio com solução de Ringer lactato ou, se a glicose sanguínea cair abaixo de 180mgl/dl, com uma solução que contenha cloreto de sódio a 0,18% e glicose a 4%. Deve-se medir a produção urinária e, se for possível, deve-se utilizar catéter venoso central para monitorar a pressão venosa central durante a fluidoterapia (HERRTAGE, 2001) (NELSON, 1997). As insulinas comumente utilizadas para o tratamento prolongado dos diabéticos são: regular, semilenta, protamina neutra hagedorn (NPH), lenta, ultralenta, e zinco-protamina (PZI). Há também as insulinas misturadas com 70% NPH e 30% regular ou 50% NPH e 50% regular (NELSON, 1997). Elas se classificam baseando-se no início e duração da ação (MINAKA, 2005) (DUARTE, 2004) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000). Tipo de insulina/Via regular, semilenta/ Ação da insulina IV, curta Duração da insulina até 8h IM, SC NPH, lenta/ SC intermediária até 24h ultralenta, PZI/ SC longa mais de 24h IV, intravenosa; IM, intramuscular; SC, subcutânea. Na insulinoterapia deve ser utilizada insulina com rápido início de ação e breve duração do seu efeito, para que sejam permitidos rápidos ajustes na dose e frequência de administração deste agente, de modo a atender às necessidades do cão ou gato especificamente tratado. A insulina cristalina regular de rápida ação atende a estes critérios, sendo recomendada para o tratamento da CAD (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON, 1997). O coma hiperosmolar não cetótico também deve ser tratado com insulina regular (CHASTAIN, 1999). Os protocolos da insulina para o tratamento da CAD são a técnica intramuscular (IM) intermitente, a técnica de infusão contínua intravenosa (IV) a baixas doses, e a injeção IM inicial, seguida por técnica subcutânea (SC) intermitente (GRAVES, 2006) (HOENIG, 2003) (NELSON, 1997). Todas as vias de administração (intravenosa-IV, intramuscular-IM, subcutânea-SC) de insulina são eficazes no sentido de reduzir as concentrações plasmáticas de glicose e cetona (NELSON; COUTO, 2001). São abundantes os argumentos concernentes à via mais apropriada para a administração inicial da insulina. O protocolo intramuscular é simples, confiável, e consistente, evitando ainda as dificuldades inerentes dos regimes intravenosos e subcutâneos (HOENIG, 2003) (NELSON, 1997). Cães e gatos com CAD grave devem receber dose de insulina regular inicial de 0,2 U/kg, seguida por 0,1 U/kg a cada hora. A insulina deve ser administrada nos músculos dos membros pélvicos, para que haja garantia que as injeções são intramusculares, e não irão ser aplicadas no tecido adiposo ou subcutâneo (MACINTIRE et al., 2007) (GRAVES, 2006) (NELSON; COUTO, 2006) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). Desde que passada a fase crítica a glicemia deve ser medida na casa do cliente, esta deve ser medida a cada 1-2 horas, com tiras reagentes para a glicose (chemstrip bG, biodynamics, indianapolis, ind.) ou com glicôsimetro (figura 10) (KERR, 2003) (NELSON; COUTO, 2001) (NELSON, 1997). O objetivo da insulinoterapia inicial consiste na redução lenta da glicemia até a faixa de 200 a 250 mg/dl, preferivelmente ao longo do período de 8 a 10 horas. É ideal o declínio de 50 a 100 mg/dl na glicemia. Em geral, a hiperglicemia é corrigida em 4 a 8 horas, mas a cetose leva 10 a 30 horas para ser resolvida (NELSON, 1997). Figura 10 – Glicosímetros. Fonte: ACCU-CHEK. Assim que o tratamento inicial com insulina tenha levado a glicemia para menos de 250mg/dl, deverá ser suspensa a administração horária do hormônio; então deveremos administrar insulina regular a cada 4-6 horas por via intramuscular (NELSON; COUTO, 2006) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997), ou, se o estado de hidratação do paciente é bom, por via subcutânea a cada 6-8 horas (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (NELSON, 1997). Geralmente a dose inicial é de 0,1 a 0,4 U/kg, com ajustes subseqüentes baseados nas glicemias obtidas (NELSON, 1997). Além disto, neste ponto a solução de infusão intravenosa deve receber suficiente dextrose a 50% para que seja obtida solução de dextrose a 5% (100 ml de dextrose a 50% acrescentados a cada litro de líquido). A glicemia deverá ser mantida entre 150 e 300 mg/dl, até que o paciente esteja estável e comendo. Em geral, a solução de dextrose a 5% é adequada para a manutenção da glicemia desejada. Se a glicemia cai para menos de 150 mg/dl ou se eleva para mais de 300 mg/dl, a dose de insulina deverá ser diminuída ou aumentada concomitantemente (NELSON, COUTO, 2001) (NELSON, 1997) (CHASTAIN, 1999). Insulinas de ação mais prolongada (por exemplo, lenta, ultralenta) não devem ser iniciadas até que o cão ou gato se encontre estável, comendo, não vomitando, mantendo equilíbrio dos líquidos sem qualquer infusão intravenosa, e não mais acidótico, azotêmico, ou deficiente em eletrólitos. A dose inicial destas insulinas de ação mais prolongada é similar à dose de insulina regular utilizada imediatamente antes da troca de produto, para as insulinas de ação mais prolongada. Os ajustes subseqüentes na dose de insulina de ação mais prolongada devem tomar por base a determinação seriada das concentrações glicêmicas (MACINTIRE et al., 2007) (HOENIG, 2003) (NELSON, COUTO, 2001) (NELSON, 1997). A infusão de insulina intravenosa em dose baixa (utilizando 0,1 unidade/kg/h) é eficaz e parece se associar com bem menos efeitos colaterais, tais como hipocalemia e hipoglicemia. Esta também proporciona uma redução gradual e uniforme das concentrações sanguíneas de glicose e cetonas, e é menos provável de causar aumentos no glucagon, no cortisol e no hormônio do crescimento que podem ocorrer com a administração intermitente de um volume de insulina (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001). Deve-se monitorar a glicose sanguínea a cada 2h. Deve-se introduzir fluidos que contêm glicose quando a concentração sanguínea de glicose cai abaixo de 180mg/dl, e devese parar a infusão de insulina quando a glicose sanguínea atinge 108mg/dl. Quando se pára com a infusão de insulina, a concentração sanguínea de glicose aumentará, de maneira que se poderá exigir infusão de insulina adicional se o paciente não estiver comendo ou se poderá exigir a preparação de insulina de ação mais longa se o apetite tiver retornado (HERRTAGE,2001). A acidose metabólica, a falta de insulina, e a hipertonicidade sérica se combinam para causar desvio do potássio das células do meio intracelular para o meio extracelular (NELSON, 1997). A princípio, muitos dos cães e gatos com CAD apresentam-se com concentrações séricas de potássio normais ou diminuídas (NELSON, 1997). Inicialmente, um déficit no potássio corporal total é mascarado geralmente pela acidose, o que faz com que o potássio se mova extracelularmente. A concentração sérica de potássio pode diminuir rapidamente, à medida que a função renal diminui e a insulinoterapia faz com que o potássio volte para o interior das células (MACINTIRE et al., 2007) (GRAVES, 2006) (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Embora a hipocalemia fique menos provável de ocorrer com infusão de insulina em dose baixa, deve-se iniciar à terapia de reposição dentro de poucas horas após o empreendimento da fluidoterapia e da insulinoterapia (HERRTAGE, 2001) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Na ausência da medição do potássio sérico, deve-se acrescentar 15mEq de cloreto de potássio (ou 5,88ml de cloreto de potássio) para cada 500 ml de solução de fluido intravenoso administrados após o início da insulinoterapia (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999). Cinquenta por cento do potássio adicionado deve estar na forma de cloreto de potássio, e os, outros 50%, como fosfato de potássio, como ajuda para que não ocorra hipofosfatemia (GRAVES, 2006) (NELSON, COUTO, 2001). Se forem obtidos eletrocardiograma (ECG) e determinação do potássio sérico antes do tratamento, o ECG se torna técnica segura, barata, e relativamente confiável para a detecção de alterações perturbadoras na concentração sérica do potássio. Os sinais eletrocardiográficos de hipocalemia incluem prolongamento do intervalo QT, depressão do segmento ST e diminuição da amplitude da onda T (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). O fosfato se move entre os compartimentos intra e extracelular, da mesma maneira que o potássio. A hipofosfatemia, que ocorre mais comumente nos gatos, pode causar anemia hemolítica, fraqueza, ataxia e convulsões (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Exige-se suplementação de fosfato geralmente em animais com cetoacidose diabética grave. Para corrigir a hipofosfatemia, recomenda-se fosfato de potássio (na dose de 0,01 a 0,03mmol/kg/h, IV) (MACINTIRE et al., 2007) (GRAVES, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON, COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). A suplementação com fósforo não está indicada em cães ou gatos com hipercalcemia, hiperfosfatemia, oligúria, ou suspeita de necrose tecidual (NELSON, 1997). O uso de bicarbonato de sódio (NaHCO3) para corrigir a acidose na cetoacidose diabética é controverso. A correção rápida da acidose com bicarbonato pode levar à alcalose metabólica, à anóxia tecidual devida a um desvio à esquerda da curva de dissociação de hemoglobina-oxigênio, e à acidose cerebral paradoxal devida ao CO 2 atravessar a barreira hematocerebral mais rapidamente que os íons de bicarbonato. Por essas razões, só se deve utilizar o bicarbonato na acidose de risco de vida (pH arterial < 7), neste caso, dar preferência ao bicarbonato de sódio 12 a 14mEq/L adicionado nos fluidos para administração intravenosa [a fórmula é, mEq NaHCO3= 0,4 x peso corporal, em kg, x (12 – HCO3 do paciente, em mEq/L)]. Contanto que a função renal normal seja restaurada e se administre a fluidoterapia adequada, a acidose resolver-se-á sem a administração de bicarbonato (MACINTIRE et al., 2007) (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000). O tratamento para a CAD frequentemente envolve o tratamento também de outra enfermidade concomitante, frequentemente séria (por exemplo, insuficiência pancreática exócrina, hipertiroidismo) (NELSON, 1997). Nos cães e gatos, outras enfermidades intercorrentes comuns no caso da cetoacidose diabética incluem pancreatite, insuficiência renal, insuficiência cardíaca congestiva, hiperadrecorticismo e piometra. As cadelas intactas podem ficar resistentes à insulinoterapia durante a fase do metaestro de seu ciclo estral (HERRTAGE, 2001) (NELSON, 1997). Exige-se antibioticoterapia de largo espectro, pois a infecção bacteriana constitui frequentemente um fator precipitante comum para cetoacidose diabética, e o uso de catéteres intravenosos e urinários pode predispor o paciente à infecção (HERRTAGE, 2001). 3.6.2 Tratamento do diabetes mellitus descomplicado O objetivo primário da terapia do diabetes é manter a normoglicemia e, com isso, controlar os sinais que ocorrem secundariamente à hiperglicemia e à glicosúria, que resultam no desenvolvimento de complicações como hipoglicemia, cetoacidose, formação de catarata, lipidose hepátia, pancreatite, infecções, retinopatia, nefropatia diabética, neuropatia diabética, dermatopatia (ROYAL CANIN, 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (HOENIG, 2003) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). O essencial de uma boa estabilização do diabetes mellitus requer a compreensão do proprietário e a adesão à rotina diária regular (HERRTAGE, 2001), que envolve dieta, administração de insulina e exercícios controlados e regulares (ROYAL CANIN, 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001), e medicamentos hipoglicemiantes por via oral (VELAZ, 2008) (NELSON; COUTO, 2006) (NELSON, 1997). Pode-se empreender uma estabilização satisfatoriamente em casa, mas particularmente se o cão se encontrar cetótico, poderá ser preferível internar o animal durante a estabilização, pois é mais fácil monitorar a glicose sanguínea mais proximamente (HERRTAGE, 2001). O tratamento dietético apropriado deve ser introduzido em todos os cães e gatos diabéticos, independente do tipo de diabetes presente. A terapia dietética apropriada constitui parte essencial do tratamento de diabetes. A dieta deve ser bem balanceada e constante, tanto na composição quanto na quantidade oferecida em cada refeição. Portanto, torna-se mais conveniente utilizar ração comercial. Deve-se oferecer rações enlatadas ou secas que contêm carboidratos complexos, pois digestão e absorção lentas minimizam as flutuações na concentração sanguínea de glicose pós-prandial. Deve-se evitar as rações semi-úmidas que contêm uma predominância de carboidratos facilmente assimilados na forma de dissacarídeos e propilenoglicol, devido à hiperglicemia pós-prandial acentuada (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Há evidências de que dietas com um alto teor de fibras melhoram o controle glicêmico pelo retardamento na hidrólise de amido e na absorção de glicose e, com isso, reduzindo a flutuação pós-prandial na glicose sanguínea. As dietas ricas em fibras também são benéficas na correção da obesidade (MACINTIRE et al., 2007) (NELSON; COUTO, 2006) (MINAKATA, 2005) (HERRTAGE, 2001). No entanto, podem ocorrer desvantagens no uso de dietas ricas em fibras, tais como redução na palatabilidade e o fato de que a densidade calórica baixa pode fazer com que o paciente perca peso excessivamente ou falhe em ganhar peso se já se encontrar abaixo do peso corporal ideal (NELSON, 1997). Não se deve oferecer rações ricas em fibras para cães e gatos diabéticos caquéticos e sim, reservar as dietas ricas em fibras aos pacientes difíceis de estabilizar e/ou obesos (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (CHASTAIN, 1999). Finalmente, deve-se projetar o esquema de alimentação para potencializar a ação da insulina e minimizar a hiperglicemia pós-prandial. O consumo calórico diário deve acontecer quando se encontra presente insulina na circulação e esta é capaz de lidar com a glicose absorvida do intestino. São preferíveis várias refeições pequenas em vez de grande alimentação, pois aquelas ajudarão a controlar as flutuações na glicose sanguínea. Recomenda-se sempre duas refeições equivalentes oferecidas em momentos coincidentes com a atividade insulínica. Os casos que se mostram difíceis de estabilizar, deve-se oferecer três ou quatro refeições menores durante o dia (HERRTAGE, 2001) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Deve-se evitar os petiscos e o remeximento no lixo, pois estes tendem a desestabilizar os pacientes diabéticos (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001). Se as rações ricas em fibras e o controle de calorias sozinho não forem efetivos na normalização dos níveis sanguíneos de glicose dentro de 1 semana, devem-se tentar drogas hipoglicemiantes (CHASTAIN, 1999). Os felinos com sinais clínicos brandos e que não estão apresentando cetose (especialmente se obesos) podem ser considerados a receber terapia hipoglicemiante oral (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999). Medicamentos hipoglicemiantes à base de sulfoniluréia administrados por via oral podem ser efetivos em alguns gatos com DMNDI. A administração da sulfoniluréia de segunda geração, glipizida (Glucotrol, Pfizer), estimula a secreção de insulina em gatos diabéticos sem compicações (GRAVES, 2006) (NELSON; COUTO, 2006) (HOENIG, 2003) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). É comercializada em comprimidos de 5 e 10mg (HOENIG, 2003). Não foram identificados parâmetros consistentes que permitam ao clínico determinar prospectivamente quais os gatos que responderão ao tratamento com a glipizida (NELSON; COUTO, 2006) (NELSON, 1997). A seleção de gatos diabéticos para tratamento com glipizida deve basear-se vigorosamente na avaliação do veterinário quanto à saúde do gato, gravidade dos sinais clínicos, presença ou ausência de cetoacidose, outras complicações diabéticas (por exemplo, neuropatia), e os desejos do proprietário (NELSON, 1997). As reações adversas do tratamento com glipizida em gatos são: hipoglicemia, vômito logo após a administração do medicamento, alterações das enzimas hepáticas, e icterícia. A incidência de reações adversas é inferior a 15% (HOENIG, 2003) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Atualmente, administramos glipizida, 2,5 mg via oral duas vezes ao dia, juntamente com refeição, a gatos diabéticos não cetósicos e relativamente sadios, pelo exame físico. Cada gato é examinado semanalmente durante o primeiro mês de terapia com glipizida. Caso não tenha ocorrido vômito, icterícia, e euglicemia após 2 semanas de tratamento, a dose de glipizida é aumentada para 5,0 mg duas vezes ao dia. O tratamento terá continuidade enquanto o gato estiver estável. Se ocorrer euglicemia ou hipoglicemia, a dose de glipizida poderá ser gradativamente diminuída ou mesmo suspensa, e as concentrações glicêmicas serão reavaliadas uma semana depois, para que se tenha idéia da oportunidade de continuar, ou não, com este medicamento. Caso haja recidiva da hiperglicemia, a dose será aumentada, ou será retomada a medicação com a glipizida, com redução na dose dos gatos que, previamente, haviam apresentado hipoglicemia (NELSON; COUTO, 2006) (HOENIG, 2003) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Glipizida será interrompida, e iniciada a insulinoterapia, se (1) os sinais clínicos continuam a piorar, (2) o gato torna-se enfermo ou passa a apresentar cetoacidose, (3) as concentrações glicêmicas permanecem acima do patamar de 300 mg/dl após 1 ou 2 meses de tratamento, ou (4) os donos demonstram estar insatisfeitos com o tratamento (NELSON; COUTO, 2006) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Caso inicie-se a insulinoterapia no felino diabético não complicado a dose inicial típica é de 1 a 3U/kg de insulina ultralenta na forma de injeção matinal simples. A NPH ou a insulina lenta (1 a 2U/kg) também podem ser utilizados. Estes devem ser alimentados em pequenas refeições várias vezes ao dia, no sentido de minimizar a hiperglicemia pós-prandial (NELSON; COUTO, 2006) (FENNER, 2000). Alguns felinos possuem absorção inconsistente da insulina ultralenta recombinante humana, requerendo relativamente doses mais altas para exercerem seus efeitos (mais do que 1U/kg) (FENNER, 2000). Nos cães, para uma estabilização rotineira, a suspensão de insulina zíncica (lenta) que contém uma mistura de 30% de suspensão de insulina zíncica (amorfa) e 70% de suspensão de insulina zíncica (cristalina) constitui a preparação de escolha. Quando administrada por injeção subcutânea, essa preparação constitui uma insulina de ação intermediária, com início de atividade em 1 à 2h, pico de atividade ao redor de 6 à 12h e duração de ação entre 18 e 26h nos cães. Os momentos para o pico de atividade e a duração da ação variam com o indivíduo, mas na maioria dos casos, a administração uma vez ao dia é adequada (MINAKATA, 2005) (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). A insulina lenta deve ser administrada geralmente como uma injeção matinal única ao mesmo tempo ou imediatamente antes da primeira refeição, com a segunda refeição sendo administrada 6 a 8h mais tarde, para coincidir com o pico de atividade da insulina. Deve-se administrar uma dose inicial de 0,5 a 1 UI/kg (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Os cães pequenos (< 15kg) tendem a exigir 1 UI/kg, e os cães maiores (> 25kg) devem receber 0,5 UI/kg. Embora a via subcutânea seja ideal para uso a longo prazo, pode-se utilizar inicialmente a via IM, especialmente em animais moderadamente desidratados ou cetóticos, pois a absorção de depósitos subcutâneos nesses pacientes pode ficar lenta e errática (HERRTAGE, 2001) (NELSON, 1997). No mercado já existe insulina específica para cães e gatos que é o Caninsulin® (figura 11), esta é uma suspensão aquosa de insulina que contém 40 UI/ml de insulina suína de alta purificação, sendo composta por 30% de insulina de zinco amorfa e 70% de insulina de zinco cristalina, é uma preparação de insulina de ação intermediária que deve ser administrado em cães 1 vez ao dia, entretanto, dependendo da resposta individual de alguns animais, pode ser necessário realizar 2 aplicações diárias. Para gatos, administrar 2 vezes ao dia em dosagem ajustada individualmente e determinada em um período inicial de estabilização. A sua via de administração é a subcutânea. A dose inicial diária é de 1 UI/kg e mais a dose suplementar por peso (INTERVET): 1 UI para cães com menos de 10 kg. 2 UI para cães com cerca de 10 kg. 3 UI para cães entre 12 e 20 kg. 4 UI para cães acima de 20 kg. A dose inicial para gatos é de 0,5 UI/kg - 2 vezes ao dia se a concentração de glicose no sangue for 20 mmol/L (isso é 3,6 g/L ou 360 mg/dL) ou superior e 0,25 UI/kg duas vezes ao dia se a linha de base da concentração de glicose no sangue for inferior a 20 mmol/L (isso é 3,6 g/L ou 360 mg/dL). Essa dose é ajustada individualmente, dependendo da resposta do tratamento (INTERVET). O objetivo desta insulina é alcançar concentrações de glicose no sangue entre 1 e 3 g/L (isso é 100-300 mg/dL ou 5-17 mmol/L) para alcançar e/ou manter o peso corporal normal e para minimizar e/ou eliminar a polidipsia, poliúria e a polifagia (se presente). No gato, a remissão da diabete clínica pode ser possível (INTERVET). O caninsulin® é contra-indicado para o tratamento inicial de animais que têm diabetes mellitus aguda e severa que são apresentados em um estado cetoacidótico. Nenhum efeito indesejável associado com à administração de insulina suína foi relatado no cão e no gato (INTERVET). Figura 11 – Caninsulin®. Fonte: INTERVET INTERNACIONAL WEBSITE, 2006. No geral, os gatos parecem metabolizar a insulina mais rapidamente que os cães; portanto, para evitar as complicações de injeções de insulina duas vezes ao dia, é melhor utilizar uma preparação de insulina zíncica-protamina. Recomenda-se uma dose inicial semelhante de 0,5 a 1 UI/kg (HERRTAGE, 2001) (NELSON, 1997). A insulina deve ser administrada utilizando seringas específicas de 0,5 ou 1ml, calibradas em unidades (100 unidades/ml). As preparações de insulina devem ser guardadas em um refrigerador a 2 a 80C, pois elas são afetadas adversamente por calor ou congelamento. As preparações devem ser roladas suavemente para ressuspender as partículas antes do uso (VELAZ, 2008) (DUARTE, 2004) (HERRTAGE, 2001) (INTERVET). Um paciente levará geralmente 2 a 4 dias para responder completamente a uma dose de insulina ou uma mudança na preparação. Torna-se importante evitar o aumento da dose rapidamente, antes de ter ocorrido um equilíbrio, pois isso pode levar à queda súbita e acentuada da glicose sanguínea devida à superdosagem com insulina. Na maior parte dos casos, deve-se realizar ajustes na dose de insulina em alterações pequenas de não mais que 2 a 4 unidades por injeção (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (INTERVET). O tipo de preparação e a frequência de administração podem exigir alteração nos pacientes que se mostram difíceis de estabilizar com essa rotina padronizada. No entanto, é bom que o clínico se familiarize com um tipo de preparação insulínica e só troque essa preparação se a insulina for a causa da instabilidade (HERRTAGE, 2001). A rotina diária padronizada é a seguinte: 8:00h administre subcutaneamente uma injeção de insulina lenta; 8:30h ofereça metade da ração diária medida; 14:30h ofereça a segunda metade da ração diária; mantenha uma rotina diária constante, que inclua exercícios e evite petiscos e remeximento de lixo (HERRTAGE, 2001) Idealmente, a monitoração da terapia deve consistir em medições de glicose sanguínea seriadas realizadas, todo dia, pois pode-se obter assim um controle diabético mais firme do que com estimativas de glicose urinária. Inicialmente, deve-se realizar pelo menos duas estimativas de glicose sanguínea: uma antes de se administrar insulina e a segunda antes da segunda alimentação. Quando o cão parece razoavelmente estável, devem-se coletar amostras sanguíneas mais freqüentes (a cada 2 a 3h) durante todo o dia, para avaliar o grau de estabilização (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (INTERVET). A avaliação do consumo hídrico diário também pode proporcionar informações úteis acerca do grau de controle diabético (KERR, 2003) (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000). Deve-se manter a concentração sanguínea de glicose entre 100 e 162mg/dl. A concentração sanguínea de glicose ficará geralmente mais alta pela manhã (antes de se administrar a insulina) e mais baixa antes da segunda alimentação. Um vestígio de glicose na amostra urinária matinal pode ser aceitável, mas a urina deve ficar negativa em outros momentos do dia. No entanto, é importante lembrar que a glicose urinária pode não refletir a concentração sanguínea de glicose no mesmo ponto no tempo e, se a glicose urinária for negativa, a concentração sanguínea de glicose poderia ficar hipoglicêmica (< 54mg/dl), normoglicêmica ou hiperglicêmica (> 99mg/dl) (HERRTAGE, 2001). Não se deve fazer o ajuste diário das dosagens de insulina com base nas medições de glicose urinária matinal. Em vez disso, é preferível continuar com uma dosagem de insulina fixa, a menos que o paciente permaneça instável por vários dias (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Nos cães e nos gatos, tem-se utilizado crescentemente a medição de proteínas glicadas, tais como a frutosamina e a hemoglobina glicosilada, para monitorar a resposta ao tratamento. Essas medições refletem a concentração sanguínea de glicose média nas primeira a segunda semanas precedentes, no caso da frutosamina sérica, e nos dois a três meses no caso da hemoglobina glicosilada (KERR, 2003) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). A concentração de frutosamina com menos de 400mmol/L indica um bom controle glicêmico, enquanto se descobre uma concentração acima de 500mmol/L em diabéticos recém-diagnosticados ou mal controlados (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). A hemoglobina glicosilada encontra-se menos disponível como ensaio. Os cães diabéticos bem controlados apresentam entre 4 e 6% de hemoglobina glicosilada, enquanto os diabéticos mal controlados apresentam concentrações maiores que 7% (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). O proprietário deve manter registros glicêmicos para cada paciente, pois as alterações à estabilidade podem ser avaliadas mais facilmente por um período de tempo. As exigências de insulina aumentarão devido à infecção, ao estro (particularmente a fase do metaestro do ciclo), à prenhez e à cetoacidose (HERRTAGE, 2001). Recomenda-se que as cadelas intactas devam sofrer uma ovário-histerectomia para evitar a resistência à insulina durante estações subseqüentes (POPPL, 2006) (MINAKATA, 2005) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000). 3.7 INVESTIGAÇÃO DE UMA INSTABILIDADE Se um paciente parecer fracamente estabilizado em casa, apesar de tentativas repetidas para proporcionar um controle glicêmico adequado, confira o registro glicêmico e examine o paciente quanto a sinais de doença que poderiam causar resistência à insulina (por exemplo, infecção, estro, prenhez, cetoacidose ou hiperadrenocorticismo). Repasse a rotina diária com o proprietário para se certificar de que a dieta encontra-se constante e medida e de que não há nenhum acesso a petiscos ou a lixo. Confira a preparação insulínica quanto ao tipo, à data de expiração e ao armazenamento, e também a capacidade do proprietário em administrar insulina (mistura adequada, dosagem correta e técnica de injeção) (HERRTAGE, 2001) (NELSON, 1997). Se não se conseguir determinar uma causa óbvia, dever-se-á internar o cão em sua rotina diária e realizar determinações de glicose sanguínea seriada a cada 1 a 2h, durante todo o dia. As determinações feitas com fitas reagentes para glicose e um glicosímetro (figura 10) são simples, rápidas e suficientemente precisas para esse propósito. Esses resultados devem ser então projetados sobre um gráfico contra o tempo, embora seja importante perceber que as curvas de glicose precisas podem variar de um dia para o outro, em qualquer paciente diabético (HERRTAGE, 2001) (NELSON, 1997). Podem-se determinar três causas principais de instabilidade a partir do gráfico de determinações de glicose sanguínea seriada. A primeira causa é uma hiperglicemia induzida por insulina (fenômeno Somogyi). A concentração sanguínea de glicose fica alta pela manhã, antes de se administrar insulina, mas cai acentuadamente para concentrações hipoglicêmicas (< 63mg/dl), após a administração de insulina. O período hipoglicêmico tem uma duração curta e não se associa com sinais de hipoglicemia. Na verdade, se não se realizar uma amostragem freqüente, poder-se-á perder facilmente o ponto mais baixo. Uma concentração sanguínea de glicose baixa estimula a liberação de hormônios antagonistas da insulina, tais como o glucagon, o cortisol e as catecolaminas, e estes fazem com que a concentração de glicose reboteie rapidamente para níveis altos. Caso se meçam as concentrações sanguínea e ou urinária de glicose somente antes da insulina e antes da segunda alimentação, estas ficariam altas e isso poderia ser facilmente mal-interpretado com uma razão para aumentar a dose diária de insulina, quando, na verdade, o cão já se encontrava sob uma superdosagem. O tratamento da hiperglicemia induzida por insulina consiste em reduzir a dose diária de insulina para evitar a hipoglicemia, que causa a oscilação drástica na concentração sanguínea de glicose (GRAVES, 2006) (HERRTAGE, 2001) (NELSON; COUTO, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). A segunda causa de instabilidade se deve ao metabolismo rápido da insulina, o que significa que uma preparação de insulina de ação intermediária não dura 24h completas. Em tais casos, a concentração sanguínea de glicose fica alta pela manhã, antes de se administrar a insulina, mas cai para concentrações normais na maior parte do dia. No entanto, após a segunda alimentação, a concentração sanguínea de glicose, sobe e permanece alta pelo restante do dia. Isso resulta em um período de hiperglicemia considerável que, por sua vez, ocasiona glicosúria pela manhã e frequentemente polidipsia e poliúria noturnas. O tratamento do metabolismo rápido da insulina consiste em experimentar uma preparação de insulina de ação mais longa (por exemplo a insulina zíncica-protamina ou ultralenta) ou em administrar duas doses de insulina lenta em um intervalo de 12h, com quatro refeições pequenas oferecidas em intervalos de aproximadamente 6h (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (NELSON, 1997). A terceira causa de instabilidade se associa com a resistência à insulina. Nesses casos, o animal permanece persistentemente hiperglicêmico, apesar de uma dosagem de insulina de mais de 2,2 UI/kg/dia. Embora alguns pacientes possam se estabilizar satisfatoriamente com doses mais altas que estas, será provável a presença de um antagonismo periférico à atividade de insulina (GRAVES, 2006) (KERR, 2003) (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Nos casos em que uma estabilização adequada não é possível, exige-se investigação completa do paciente para experimentar e identificar a causa precisa da resistência à insulina (como obesidade, hiperadrenocorticismo, administração de glicocorticóide exógeno, fase do metaestro do ciclo estral, administração de progestágeno exógeno, acromegalia, hipotireoidismo, hipertireoidismo, prejuízo na absorção de insulina, formação excessiva de anticorpos antiinsulina, feocromocitoma, glucagonoma). A correção ou o tratamento da causa subjacente permitirão, em geral, que o paciente seja estabilizado com uma dose de insulina mais baixa, com melhora no controle glicêmico (GRAVES, 2006) (NELSON; COUTO, 2006) (HERRTAGE, 2001) (FENNER, 2000) (CHASTAIN, 1999) (NELSON, 1997). Doença periodontal é extremamente comum em gatos, e pode contribuir para resistência à insulina em diabéticos (GRAVES, 2006). 3.8 PROGNÓSTICO A diabetes mellitus nos animais, tal como nos humanos, não tem cura, mas um tratamento correto pode proporcionar ao seu animal uma maior longevidade com uma boa qualidade de vida (VELAZ, 2008). O prognóstico é reservado para o DM complicado. Se o animal puder ser estabilizado, este normalmente segue bem com um proprietário consciente (NELSON, COUTO, 2001) (FENNER, 2000). O prognóstico também depende da presença e reversibilidade de doenças concomitantes, facilidade de regulação do estado diabético com insulina e comprometimento do proprietário com o tratamento. O tempo de sobrevida média nos cães e gatos diabéticos é de aproximadamente 3 anos a partir do diagnóstico, mas cães diabéticos que sobrevivem aos 6 primeiros meses podem facilmente viver > 5 anos com a doença (NELSON; COUTO, 2006). 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Durante esse trabalho pudemos concluir que a diabetes mellitus em cães e gatos é uma patologia complexa de ser tratada, devido as suas etiologias e complicações advindas, pois, não temos uma patogenia elucidada. A maioria desses animais respondem melhor a insulinoterapia, pois esta opção é que vai controlar da melhor forma os sinais clínicos, ajudar o animal a retomar a qualidade de vida e principalmente, evitar a cetoacidose. É fundamental o conhecimento do médico veterinário diante desta doença para que possa ser tratada com maior rapidez e eficácia. No decorrer da terapia insulínica se observa uma melhora na condição corpórea do cão ou do gato, tornando-os mais ágeis com apetite e sede normais. Aliado a isto é necessária a participação efetiva do proprietário para que o animal possa ter uma vida sem complicações, sendo necessário o manejo nutricional, exercícios físicos regulares e controlados, favorecendo uma qualidade de vida desde que controlada a glicemia evitando-se assim complicações inerentes a essa patologia quando não tratada. REFERÊNCIAS ACCU-CHEK. Escolha o glicosímetro certo. Disponível em: <http://www.accuchek.com.br> Acesso em: 05 de fevereiro de 2009. ADFER. Poner a dieta a tu perro. 14 de julho de 2007. Disponível em: <http//www.perrosbeagle.com/.../poner-a-dieta-a-tu-perro/> Acesso em: 05 de fevereiro de 2009. CHASTAIN, C. B. Sistemas endócrino e metabólico. In: GOLDSTON, R. T.; HOSKINS, J. D. (Org). Geriatria e gerontologia do cão e do gato. São Paulo: Roca, 1999. p. 338-344, 359-361. CLÍNICA VETERINÁRIA LIEBERKNECHT. Cataratas em cães. Porto Alegre. Disponível em: <http//www.clinicalieberknecht.com.br> Acesso em: 05 de fevereiro de 2009. DUARTE, R. 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