UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO DAS PROVAS NO PROCESSO PENAL CAMILA MAHIBA PEREIRA FARHAT Itajaí, novembro de 2008. UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO DAS PROVAS NO PROCESSO PENAL CAMILA MAHIBA PEREIRA FARHAT Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Professor MSc. Rogério Ristow Itajaí, novembro de 2008. AGRADECIMENTO Primeiramente a Deus, por nunca ter me deixado falhar. Ao meu pai Hosseim e minha mãe Eleide, pela educação proporcionada, pelo exemplo e lição de vida, e ao grande amor que sempre me deram. As minhas irmãs Jamile e Aline, pelo amor que tenho por elas. A meu noivo Alirio Jr., pela compreensão, paciência, e principalmente por suas palavras de suporte. Ao ilustre Professor Orientador desta monografia Rogério Ristow, que com admirável paciência e tranqüilidade, soube partilhar de sua imensa sabedoria. As valiosas amizades que encontrei durante estes anos de Universidade. E acima de tudo a minha Vó Maud in memoriam. DEDICATÓRIA Dedico este trabalho aos meus pais, Hosseim e Eleide, por terem sido as pessoas que me apoiaram sempre e sem as quais teria sido impossível a conclusão deste curso, e acima de tudo, por serem um exemplo a ser seguido. TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí, novembro de 2008. Camila Mahiba Pereira Farhat Graduando PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Camila Mahiba Pereira Farhat, sob o título Das Provas no Processo Penal, foi submetida em 19 de novembro de 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Rogério Ristow (orientador), Carlos Roberto da Silva (membro da banca) e aprovada com a nota _________, (____________________________________). Itajaí, novembro de 2008. MSc. Rogério Ristow Orientador e Presidente da Banca Professor MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Constituição É a lei fundamental e suprema de um Estado, onde suas normas se referem à estruturação d próprio ordenamento jurídico. Crime É toda atitude tipica e anti-juridíca, praticada por uma ser humano. Prova È o meio pelo qual é possível apresentar os fatos ou atos que irão, posteriormente, lhe dar um direito. Ônus da Prova Todo aquele que alega um fato, tem o dever de prova-lo. Perícia Parecer ou laudo técnico de perito oficial ou pessoa habilitada, que serve para esclarecer o delito. Processo Penal É o ramo que é da Teoria Geral do Processo, é o modo pelo qual atua a jurisdição em matéria penal. Princípios São as normas eleitas pelo constituinte como fundamento ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui. Prova Lícita È toda aquela taxada pelas normas processuais e obtidas pelos meios moralmente legítimos. Prova Ilícita È toda aquela colhida com infringência às normas ou princípios colocados pela Constituição ou Leis. Testemunha Pessoa que viu, ou ouviu alguma coisa, e que é chamada em juízo para prestar depoimento sobre algum fato ocorrido. Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada Prova ilícita por derivação. SUMÁRIO RESUMO ............................................................................................ X INTRODUÇÃO ................................................................................... 1 CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 4 O PROCESSO E AS PROVAS........................................................... 4 1.1 CONCEITO DA PROVA ...................................................................................4 1.2 ASPECTOS HISTÓRICOS DESTACADOS .....................................................5 1.2.1 PROTO-HISTÓRIA .............................................................................................7 1.2.2 CÓDIGO DE HAMURÁBI ......................................................................................7 1.2.3 CÓDIGO DE MANU .............................................................................................8 1.2.4 DIREITO ROMANO .............................................................................................9 1.3 OBJETO DA PROVA .....................................................................................10 1.4 MEIOS E ELEMENTOS DA PROVA ..............................................................12 1.5 CLASSIFICAÇÃO DOS MEIOS PROBATÓRIOS..........................................14 1.5.1 PROVAS DIRETAS OU INDIRETAS ......................................................................14 1.5.2 PROVAS PESSOAIS OU REAIS ..........................................................................15 1.5.3 PROVA PLENA E NÃO PLENA ...........................................................................16 1.5.4 PROVA LÍCITA ................................................................................................16 1.5.5 PROVA ILÍCITA ................................................................................................17 1.6 O PROCESSO ................................................................................................19 1.7 PRODUÇÃO DAS PROVAS...........................................................................20 1.7.1 PRODUÇÃO ANTECIPADA DAS PROVAS .............................................................22 CAPÍTULO 2 .................................................................................... 24 DAS PROVAS EM ESPÉCIE ........................................................... 24 2.1 PROVA TESTEMUNHAL ...............................................................................24 2.1.1 CAPACIDADE PARA TESTEMUNHAR ...................................................................27 2.2 PROVA DOCUMENTAL .................................................................................29 2.3 PROVA PERICIAL..........................................................................................33 2.3.1 DO EXAME DE CORPO E DELITO ......................................................................37 CAPÍTULO 3 .................................................................................... 41 A PROVA COMO FACULDADE PROBATÓRIA DO JUIZ............... 41 3.1 ÔNUS DA PROVA..........................................................................................41 3.1.1 INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA .......................................................................46 3.2 VALORAÇÃO DA PROVA .............................................................................47 3.3 OS PODERES INTRUTÓRIOS DO MAGISTRADO .......................................52 3.4 TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA..................................56 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 61 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 64 RESUMO A presente monografia trata do instituto da prova dentro do Direito Processual Penal brasileiro, tendo como objetivo fazer um apanhado geral da prova e de seus aspectos. O presente trabalho relaciona-se com a teoria geral da prova no Processo Penal brasileiro, onde se encontram destacadas suas principais características, conceitos e classificações que estabelecem limites à cerca da produção probatória, que irá nos proporcionar um entendimento completo do instituto da prova, a fim de fazer uma abordagem, para que se tenha uma visão geral deste instituto. Por fim, pauta-se pela busca de subsídios e fundamentos à produção de prova como elementos de exatidão e convicção na busca da garantia do Direito e da verdade objetivando a paz, certeza e segurança social em acatamento aos liames da legislação processual penal, onde estão presentes nas considerações finais, breves sínteses de cada capítulo, dos quais restam demonstrados se as hipóteses da pesquisa foram ou não confirmadas. INTRODUÇÃO A presente Monografia tem como objeto, a Prova no Processo Penal brasileiro, onde será feito um estudo que vai desde seu conceito até a classificação das provas em espécie admitidas em nosso ordenamento jurídico. Esta pesquisa tem objetivos definidos, sendo o primeiro institucional, com o fim de produzir uma monografia para obtenção de Bacharel em Direito. O seu objetivo é geral é esclarecer a função da prova, que é essencialmente demonstrar que um fato existiu, e de que forma existiu ou como existe e de que forma existe. È, portanto, uma tarefa reconstrutiva, com um só objetivo, a de comprovar em juízo a verdade real e o fato perturbador ou violador de um direito. O objetivo específico do presente trabalho é demonstrar que o direito processual é a ciência que estuda o julgar, e este ato têm como suporte alcançar o justo critério rigoroso do exame de prova, não restando dúvidas à cerca dos fatos. Para tanto, principia–se, no Primeiro Capítulo, tratando do conceito da prova, que é utilizado para comprovar a veracidade dos fatos alegados de um ato jurídico. De início, a primeira etapa busca demonstrar ainda a trajetória das provas ao passar do tempo sob o aspecto jurídico do Direito Penal, desde a formação das primeiras sociedades, onde a prova já existia e se fazia presente como instituto. Será demonstrado ainda seu objeto, finalidade e meios de prova, provas lícitas, ilícitas e demais características que circundam esta entidade jurídica ora em relevo, desta forma proporcionando uma formalização do processo como meio de resolução dos conflitos. No Segundo Capítulo, tratando de abordar a classificação das espécies de prova consideradas mais importantes para o processo, 2 conceituando e exemplificando cada uma, sejam elas; Prova Testemunhal, Documental e Pericial. Respectivamente, a prova testemunhal corresponde à afirmação pessoal, resultante do depoimento prestado por sujeito estranho ao processo, sobre fatos que tenha conhecimento, sobre o delito objeto do litígio; já a prova documental diz respeito quaisquer escritos, instrumentos, papéis públicos ou particulares, que venham a ser utilizados como provas no processo; por fim, a prova pericial que tem a finalidade de obter informações específicas sobre a materialidade do fato, através de exames feitos por profissionais especializados, podendo ser de natureza diversa, tais como exames laboratoriais, grafotécnicos, de insanidade mental, etc. Sendo assim, essas provas produzidas serão utilizadas para levar o conhecimento técnico ao juiz, auxiliando em seu convencimento. No Terceiro Capítulo, far-se-á um estudo do ônus da prova, que é, pois, o encargo que tem os litigantes de provar, pelos meios admissíveis, a verdade dos fatos, que no âmbito do Processo Penal cabe a parte que alega o fato comprovar a materialidade do crime. Trata ainda da possibilidade da inversão do ônus probatório, que amparado pelo princípio constitucional indubio pro reo, não ocorre no Processo Penal, uma vez que ninguém é culpado até que se prove o contrário. Continuamente, o terceiro capítulo, relata o valor da prova e o poder instrutório do magistrado, entendendo que a produção de provas é o momento em que o magistrado começa a declinar sua decisão, e a partir daí proferir sua sentença, porém, sempre devidamente fundamentada. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados sobre as Provas no Processo Penal, bem como as respostas as hipóteses que foram levantadas: È através das provas que se torna possível alegar a veracidade dos fatos que concorreram para formação de um eventual crime. Existe a possibilidade onde o juiz não irá aceitar as prova produzidas no processo. 3 As provas se dividem em espécies, podendo às vezes uma ter um valor maior que a outra. O juiz formará sua decisão a partir de sua livre convicção, sempre devidamente fundamentada. Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva. Por fim, nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica. CAPÍTULO 1 O PROCESSO E AS PROVAS Para a total compreensão deste trabalho, abordaremos neste capítulo o conceito de prova, nele incluindo outros sub-itens, bem como, uma breve retrospectiva histórica, assim como o objeto das provas e seus elementos, tratando em seguida de sua classificação, fazendo assim um levantamento geral do tema. 1.1 CONCEITO DA PROVA PROVA, originária do latim probatio, que por sua vez emana do verbo probare, com o significado de demonstrar, reconhecer, examinar e persuadir, todo elemento que possa levar ao conhecimento de um fato, ou de alguém1. O Código de Processo Penal regulamenta a prova em seu Título VII a partir do artigo 155. Entende-se assim, no sentido jurídico a denominação que se faz, pelos meios legais, da existência ou veracidade de um fato material ou de um ato jurídico, em virtude da qual se conclui por sua existência do fato ou ato demonstrado. 2 Em um estudo aprofundado sobre a prova, pode-se dizer que ela é “a soma dos motivos geradores da certeza” 3, compreendendo em seus conceitos, aspectos, objetivos e subjetivos. Durante a instrução, é feita à apuração de determinados fatos, a fim de convencer o juiz que o acusado deverá ser condenado. “Essa 1 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 239 2 SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico. 24. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 1125. 3 MITTERMAIER, Carl Joseph Anton. Tratado da Prova em Matéria Criminal. Tradução de Herbert Wüntzel Heinrich. 2. ed. São Paulo: Bookseller, 1997. p. 55 5 demonstração a respeito da veracidade ou falsidade da imputação, que deve gerar no juiz a convicção de que necessita para o seu pronunciamento é o que constitui a prova”. 4 O que constitui a prova é saber que todos aqueles fatos, acontecimentos, coisas e circunstâncias relevantes e úteis para formar a convicção do julgado acerca do ocorrido, é a pretensão do autor e aquilo que o réu alega em resistência a essa pretensão, é o que constitui a prova. Quando dados fatos são propostos pelas partes, cabe a estas e ao juiz fazê-las ao processo, segundo a forma determinada na lei. Por isso, o que existe, realmente, é a demonstração, a exibição, a investigação dos fatos, respeitadas as regras processuais. Será bem a apuração dos fatos no processo. Daí pode-se formular uma definição – prova é a soma dos fatos produtores da convicção, apurados no processo. 5 Por fim, a prova é o elemento demonstrativo da autenticidade ou veracidade de um fato, que tem por objetivo formar a convicção do juiz sobre os elementos necessários para a decisão da causa. 1.2 ASPECTOS HISTÓRICOS DESTACADOS A importância das provas é o assunto que remonta as mais antigas civilizações. O Direito Penal surgiu com o Homem, através do desenvolvimento da razão. Podemos afirmar que, através dos tempos o homem tem aprendido a viver numa verdadeira societas criminis, onde nasce o Direito Penal com o intuito de defender a coletividade e promover uma sociedade mais pacífica6. 4 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 453. 5 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova Judicial no Cível e Comercial. 3. ed. São Paulo: Max Limonad, 1961. p. 21. 6 DUARTE, Maércio Falcão. Evolução Histórica do Direito Penal. http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=932. Acesso em 06 abr. 2008. Disponível em 6 Esse Direito não existia nos tempos primitivos, uma vez que, os grupos sociais dessa época eram envoltos em ambiente mágico e religioso, todos os fenômenos naturais maléficos eram tidos como resultante das forças divinas. “Para aplicar a ira dos deuses, criaram-se séries de proibições, conhecidas por tabu, que não obedecidas, acarretavam em castigo”. 7 O Homem que infringisse ou desobedece às regras, era punido, o que modernamente denominamos de crime e pena. Os povos antigos, mesmo aqueles de civilizações mais rudimentares, possuíam certa noção de prova. Contudo, nessa época, predominava a chamada prova mística, que sujeitava os acusados a determinados processos bárbaros e desumanos. Tais processos recorriam ao juízo dos deuses para a indicação do culpado. Para tanto, os suspeitos tinham que suportar toda sorte de sofrimentos, pois, se resistissem a eles, provariam sua inocência. Esse meio primitivo denominava-se ordália. 8 A ordália era é um tipo de prova judiciária, utilizada para determinar a culpa ou a inocência do acusado por meio da participação de elementos da natureza, cujo resultado é interpretado como um juízo divino. As práticas mais utilizadas, eram as que envolviam o acusado fazendo com que ele se submetesse a uma prova dolorosa, se após a prova não houvessem nenhum ferimento ou se as feridas eram rapidamente curadas, o acusado era considerado inocente, uma vez que, fundavam-se na premissa de que Deus protegia o inocente. Esse método foi extinto no final da idade média, sendo substituído pela confissão mediante tortura, mas a prática caiu em desuso apenas no século XVI9. 7 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 35. 8 AQUINO, José Carlos G. Xavier. A Prova testemunhal no Processo Penal Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1987. p. 3 9 VOLD, George B. BERNARD, Thomas J. SNIPES, Jeffrey B. Ordália. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Ord%C3%A1lia. Acesso em 06 abr. 2008. 7 1.2.1 Proto-História A Bíblia contém a presença da prova testemunhal, como meio de atestar a realidade de um fato. Ninguém poderia ser acusado, se o fato não fosse provado por uma testemunha. Também, se observava a presença de normas práticas para evitar a mentira, pois quem prestasse um falso testemunho recebia uma punição. As testemunhas de um fato criminoso eram obrigadas, por lei, a mostrar que não puderam evitar o crime e socorrer a vítima, além disso eram obrigadas a denunciar o crime e prosseguir na acusação, sob pena de umas tantas bastonadas. O acusador, convencido de calúnia, sofria a pena do crime que imputou. Havia ali um caso único de acusação e defesa orais: era o processo e julgamento dos mortos perante os curiosos reunidos às margens do Lago Moeris. Mas este processo era, em geral, destinado ao exame da conduta dos reis e grandes do Estado no dia destinado às suas exéquias, as demais testemunhas que mentissem eram torturadas.10 A apreciação da prova nessa época, era tomada pelas necessidades biológicas, as paixões, as emoções e os fatores sociais, freqüentemente foram os réus absolvidos pelos juízes devido a erro, provocado por tais sentimentos, ou ainda, por belas palavras proferidas nos discursos dos oradores. 1.2.2 Código de Hamurábi Khammu-rabi, foi rei da Babilônia no 18º século A.C., estendeu grandemente o seu império e governou uma confederação de cidadesestado. Erigiu, no final do seu reinado, uma enorme estela em diorito, na qual, ele é retratado recebendo a insígnia do reinado e da justiça do rei Marduk. Abaixo 10 ALTAVILA, Jayme de. A Testemunha na História e no Direito. São Paulo: Melhoramentos, 1992. p. 17. 8 mandou escreverem 21 colunas, 282 cláusulas, que ficaram conhecidas como Código de Hamurábi11. Na Babilônia, aquele que acusasse e não provasse a culpabilidade do imputado, sofreria a mesma pena que a este seria infligida, caso a acusação fosse verdadeira. Quanto às leis criminais, vigorava a lex talionis: a pena de morte era largamente aplicada, seja na fogueira, na forca, seja por afogamento ou empalação. A mutilação era infligida de acordo com a natureza da ofensa. 1º - Se alguém acusa um outro, lhe imputa um sortilégio, mas não pode dar a prova disso, aquele que acusou, deverá ser morto. 2º - Se alguém avança uma imputação de sortilégio contra um outro e não a pode provar e aquele contra o qual a imputação de sortilégio foi feita, vai ao rio, salta no rio, se o rio o traga, aquele que acusou deverá receber em posse à sua casa. Mas, se o rio o demonstra inocente e ele fica ileso, aquele que avançou a imputação deverá ser morto àquele que saltou no rio deverá receber em posse a casa do seu acusador. 3º - Se alguém em um processo se apresenta como testemunha de acusação e, não prova o que disse, se o processo importa perda de vida, ele deverá ser morto... 12 O Código de Hamurábi ficou conhecido pela sua severidade e repressão em seus dispositivos, fazendo com que a prática do crime fosse desencorajada. 1.2.3 Código de Manu Na Índia antiga preservou-se um código atribuído a Manu, personagem mítico, considerado Filho de Brama e Pai dos Homens. Manu, segundo a lenda é progênie de Brahma, podendo ser considerado como o mais 11 PINSKY, Jaime. Código de Hamurábi. Disponível em http://www.culturabrasil.org.br. Acesso em 25 maio 2008. 12 PINSKY, Jaime. Código de Hamurábi. Disponível em http://www.culturabrasil.org.br. Acesso em 25 maio 2008. 9 antigo legislador do mundo. A data de promulgação de seu código não é certa, calculam que seja aproximadamente entre os anos 1300 e 800 a.C. Apesar de ser tão antigo, é valido lembrar que o Código de Hamurabi, é mais antigo que o de Manu em pelo menos 1500 anos, não se trata de um verdadeiro código no sentido técnico da palavra, mas de uma coletânea de normas que abrange vários assuntos e preceitos. 13 As regras no Código de Manu são expostas em versos. Cada regra consta de dois versos, cuja metrificação, segundo os indianos era composto por mais de cem mil dísticos (grupo de dois versos) e que, através de manipulações e cortes feitos em épocas diferentes, nas edições hoje conhecidas constam 2.685 dísticos distribuídos em doze livros. As provas são citadas no Livro Oitavo, em seu capítulo II, Dos meios de Prova, que vai do artigo 47 ao 114. Os dados processuais que se baseiam sobre credibilidade dos testemunhos, atribuem diferente validade à palavra dos homens, conforme a classe a que pertencem. A mulher se acha sempre em extrema desvantagem e em condição totalmente passiva dentro da sociedade. A honra das pessoas e sua situação dentro da aplicação do direito, dependiam da condição de sua classe. 14 Além de injusto, o Código de Manú era obscuro e impregnado de artificialismo. Somente homens de confiança e sem cobiça poderiam testemunhar, isentando as classes inferiores do direito de defesa. 1.2.4 Direito Romano O Direito Romano muito contribuiu para a evolução do Direito Penal, quando foi criado princípio penal ao erro, culpa, legitima defesa, agravantes entre outros. 13 Código de Manu. Disponível em http:www.inforjur.ufsc.br/aires/arquivos/código_%manu.pdf Acesso em 27 maio 2008. 14 MIRANDA, Pontes de. Fontes e Evolução do Direito Civil Brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981. p. 245. 10 Os Romanos constituíram um autêntico e vasto Império. Para manter, durante séculos, o domínio sobre as regiões e povos dominados, não bastava apenas à força física dos seus exércitos. Era necessária a criação de um sistema jurídico complexo e eficiente, que contribuísse de forma decisiva e duradoura para manutenção da ordem, chamada pax romana, nas mais longínquas regiões dominadas. Foi essa necessidade de natureza socioeconômica e política, possivelmente, o fator determinante da monumental obra jurídica construída pelos romanos, cujos institutos, práticas e entendimentos doutrinários perduraram através dos tempos e constituem, ainda hoje, a base histórica dos sistemas jurídicos modernos. 15 O ônus da prova surgiu nesse período, posto que o encargo da prova não se transferisse à parte ré, mesmo que negasse os fatos alegados pelo autor. Prevalecia a regra de que o ônus da prova incumbe a quem afirma ou age. Logo caberia ao autor afirmar o fato, salvo quando a defesa afirmasse fato novo. 1.3 OBJETO DA PROVA Provar é demonstrar a verdade, ou uma afirmação de um fato. “Aquilo sobre o que o juiz deve adquirir o conhecimento necessário para resolver o litígio processual será denominado o objeto da prova” 16 . Portanto, o objeto da prova são os fatos, todos aqueles acontecimentos, coisas e circunstâncias relevantes e úteis para formar a convicção do julgado a cerca do ocorrido, isto é, aquilo sobre o que versa o litígio. Aquilo sobre o que o juiz deve adquirir o conhecimento necessário para resolver o litígio processual é o objeto da prova, que abrange não só o fato delituoso, mas também todas suas circunstâncias objetivas e subjetivas que possam influenciar na responsabilidade penal e na fixação da pena ou imposição de medida de segurança. 17 15 LEAL, João José. Direito Penal Geral. 3. ed. Florianópolis: OAB/SC, 2004. p. 71 16 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. p. 453. 17 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. p. 237. 11 Entende-se, dessa forma, que a prova no plano jurídico, é o meio através do qual obter-se-á a demonstração ou veracidade dos fatos alegados no processo judicial. Ou seja, a partir do momento em que a parte formula sua pretensão, independente seja ela estatal ou privada, cível ou penal, a prova é que demonstrará a veracidade das bases que compõem as razões do direito que se quer defender. Como o juiz se presume instruído sobre o direito a aplicar, os atos instrutórios só se referem à prova das quaestiones facti. O juiz deve conhecer o Direito, obrigação essa que é elementar para o exercício da jurisdição (jura novit curia). Donde se segue que, abstratamente falando, constitui objeto de prova tão-só o que diz respeito às questões de fato surgidas no processo. 18 Inclui-se, portanto, como objeto da prova, não só o fato criminoso e sua autoria, “mas também todas as circunstâncias objetivas e subjetivas que circundam e que possam influir na responsabilidade penal e na fixação da pena ou imposição de medida de segurança”. 19 Como regra geral, os fatos presumidos pela lei, independem de prova, excepcionalmente o direito que poderá ser objeto de prova, não se tratando de direito federal. “O direito municipal, estadual estrangeiro ou consuetudinário, se assim exigir o juiz, devem ser provados”. 20 Temos ainda o chamado, fato incontroverso ou fato admitido, que não devem ser excluído no Processo Penal. O julgador deverá chegar à verdade dos fatos, tal como ocorreu historicamente, e não como querem as partes. Assim, a confissão, por exemplo, que elimina a controvérsia sobre a autoria, não dispensa a necessidade de outras provas sobre ela21. 18 MARQUES, José Frederico. Elementos de Direito Processual Penal. Campinas: Bookseller, 1997. 1 e 2v. p. 254. 19 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 14. ed. São Paulo: Ed. Atlas, 2003. p. 249. 20 GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 176. 21 BERTRAND, Antonio. Processo Penal. Disponível em http://www.bertrand.com.br/provas.doc. Acesso em 26 abr. 2008. 12 O objeto poderá ser direto, caso referir-se imediatamente ao fato probando, ou, ao fato cuja prova desejada. Ou ainda poderá ser indireto, caso afirme outro fato do qual, por via do raciocínio, se chega ao que de deseja provar, necessitando, destarte, para sua apreciação, um trabalho de raciocínio indutivo22. Alguns fatos não precisam ser provados, tais como os fatos intuitivos ou evidentes, os quais se têm certeza dos conhecimentos nos quais o cunho de verdade se impõe, dispensando assim qualquer prova. Não há necessidade de quando a presunção legal é a conclusão decorrente da lei, podendo ser absoluta ou condicionada. Os fatos inúteis serão aqueles que não resultarem proveito, já que deles não se podem tirar proveito jurídico. Por fim, os fatos notórios também não necessitam de prova, uma vez que, faz parte da cultura normal e própria de determinada sociedade23. Todos os fatos restantes deverão ser provados, obedecendo ao princípio do ônus da prova. Podendo as provas ser admissíveis, ou permitidas por lei, pertinentes que são relacionadas ao processo, concludentes que visam esclarecer determinados pontos e por fim as provas possíveis, que possibilitam ou não o esclarecimento do fato24. 1.4 MEIOS E ELEMENTOS DA PROVA O Direito Processual regula os meios de prova, que são os instrumentos que trazem os elementos de provas aos autos, são as técnicas destinadas à investigação de fatos relevantes para a causa. As denominadas fontes probantes, ou os meios pelos qual o juiz recebe esses elementos ou 22 ARANHA, Adalberto José Q.T. de Camargo. Da Prova no Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 23. 23 Teoria Geral das Provas no Processo Penal. Disponível em http://meumaterialdeconcurso.blogspot.com/2008/05/teoria-geral-das-provas-no-processo.htm. Acesso em 25 maio 2008. 24 Teoria Geral das Provas no Processo Penal. Disponível em http://meumaterialdeconcurso.blogspot.com/2008/05/teoria-geral-das-provas-no-processo.htm. Acesso em 25 maio 2008. 13 motivos de prova que poderão ser apresentados através de documentos, testemunhas, depoimentos das partes, etc. Na verdade, enquanto o juiz “não penal” deve satisfazer-se com a verdade formal ou convencional que surja das manifestações formuladas pelas partes, e a sua indagação deve circunscrever-se aos fatos por elas debatidos, no Processo Penal o Juiz tem o dever de investigar a verdade real, procurar saber como os fatos se passaram na realidade, quem realmente praticou a infração e em que condições a perpetrou, para dar base à cerca da justiça25. O Código de Processo Penal, traz vários meios de provas em seus artigos 158 a 250. São os meios úteis para formação, direta ou indireta, da verdade real, ou seja, tudo quanto possa comprovar o fato ou a afirmação. São fenômenos internos do processo e do procedimento, realizados na forma regulada pela lei, que prevê como se desenvolve cada uma das técnicas utilizadas. Serão admitidas todas as provas obtidas por meio lícito e, não somente aquelas insertas no CPP. “São os instrumentos pessoais ou materiais aptos a trazer ao processo a convicção da existência ou inexistência de um fato”. 26 Existem espécies de provas que são proibidas por lei, tais como as provas ilícitas e as derivas das ilícitas. Respectivamente, são aquelas obtidas com a violação de norma de direito material, tais como provas obtidas mediante as práticas de delitos criminais, civis, comerciais ou administrativos ou que são contrárias aos princípios constitucionais. Ou ainda aquelas obtidas por derivação das ilícitas, conhecidas como Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada27. 25 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 20. ed. São Paulo: Ed. Saraiva,1998. 1v. p. 41. 26 GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. pP. 197. 27 PINHO, Marco Antonio Garcia de. Breve Ensaio das Provas Ilícitas e Ilegítimas no Direito Processual Penal. Disponível em http://ultimainstancia.uol.com.br/ensaios/ler_noticia.php?idNo Ticia=34917. Acesso em 18 jun. 2008. 14 1.5 CLASSIFICAÇÃO DOS MEIOS PROBATÓRIOS Na busca pela verdade processual, devem ser utilizadas todas as espécies de provas existentes e possíveis para o caso, de forma a permitir ao juiz um conhecimento amplo a cerca do mérito da ação. As provas podem ser classificadas sob vários aspectos, porém, a de maior importância para o fulcro do presente estudo é a que distingue os meios probatórios, pelo qual o julgador adquire o conhecimento do objeto de prova. ”Não há prova sem percepção do juiz, uma vez que ela pode recair diretamente sobre o objeto ou sobre um fato do qual se possa concluir, segundo a experiência, a existência de um outro fato”. 28 1.5.1 Provas Diretas ou Indiretas Dentre as várias classificações de provas adotadas pela doutrina, umas delas as classificam em meio de prova direta e meio de prova indireta. O meio de prova direta ocorre quando, o juiz mediante percepção direta do objeto, obtém o seu conhecimento. Elas referem-se diretamente ao fato probando, relatando-o ou representando-o. O juiz deve entender que, em virtude das características de sua função jurisdicional, não pode exercer a judicatura. Em outros termos a própria prova consegue demonstrar o fato a ser provado, como por exemplo, a testemunha presencial, o exame de corpo de delito, etc. 29 Já os meios de provas indiretas, diz-se haver quando o magistrado adquire o conhecimento do objeto da prova por meio de terceiros. São as provas que se chega à conclusão com base no raciocínio, como as presunções e indícios, nessas não há referência ao fato probando diretamente, mas sim a 28 29 MENDES. João de Castro. Do Conceito de Prova. Lisboa: Ática, 1961. p. 176. Teoria Geral das Provas no Processo Penal. Disponível em http://meumaterialdeconcurso.blogspot.com/2008/05/teoria-geral-das-provas-no-processo.htm. Acesso em 25 maio 2008. 15 outros fatos que induzem à prova deste. Podemos dizer que neste caso acontece quando o fato é demonstrado por meio de raciocínio lógico-dedutivo30. A prova indireta é também chamada de circunstancial, ou seja, aquela que se deduz da existência de um fato ou de um grupo de fatos, que, aplicando-se imediatamente ao fato principal, levam a concluir que este fato existiu. Poderá ser exemplificada ainda, através do álibi apresentado pelo acusado. 1.5.2 Provas Pessoais ou Reais Outro tipo de classificação é em relação ao sujeito da prova, aquele que afirma ou atesta a existência do fato probando, que se divide em prova pessoal ou real, respectivamente representadas por uma pessoa, e a outra por uma coisa. A presunção da veracidade humana, inspirando a fé na firmação de pessoa, faz com que seja procurada e aceita como prova pessoal, do mesmo modo que a presunção da veracidade das coisas, inspirando fé na afirmação de coisa, faz com que ela seja procurada e aceita como prova real. 31 No que tange a prova pessoal, ela deverá ser obtida por meio da manifestação humana, devendo ter afirmação pessoal consciente, destinada a fazer fé dos fatos afirmados, por exemplo, o testemunho, o interrogatório e o depoimento32. Diz-se da prova real, quando emerge do próprio fato, quando há atestação inconsciente a exibição de uma arma ou de uma fotografia, 30 DUARTE, Liza. Desafios do Direito. http://www.conjur.com.br/static/text/45406,1. Acesso em 12 abr. 2008. 31 32 Disponível em: MALATESTA, Nicola Flamarino dei. A Lógica das Provas em Matéria Criminal. 6. ed. São Paulo: Bookseller, 2005. p. 319. MAGNO, Alexandre. Direito Processual Penal. http://alexandremagno.com/read.php?n_id=99. Acesso em 05 maio 2008. Disponível em 16 por exemplo. Esse tipo de prova é obtido por meio de apreciação de elementos físicos, distintos da pessoa humana, por exemplo, o desespero e o terror real33. 1.5.3 Prova Plena e Não Plena Ainda podemos fazer uma classificação das provas quanto aos seus efeitos, através das provas plenas e não plenas. No que se refere à prova plena, é a que conduz a um juízo de certeza, é a prova convincente ou necessária para a formação do processo. A prova plena é o equivalente lógico-jurídico ao não repúdio, expressão oriunda da comunidade técnica informática que, juridicamente, não passa de uma falácia (visto que o repúdio sempre poderá ocorrer num incidente de falsidade). A prova plena é o máximo de validade e eficácia que o direito vigente nas democracias liberais admite como força probatória. 34 Já a prova não plena, é a prova que conduz a um juízo de probabilidade acerca do fato e de sua autoria, indica alguma circunstância (como a prova judiciária) e é suficiente para alguns procedimentos, como o arresto de bens.35 Para a decisão de pronúncia aceita-se a prova não plena, mas para a condenação é necessária a prova plena. 1.5.4 Prova Lícita Tanto no âmbito do Direito Processual Civil como no Direito Processual Penal, há uma previsão das provas, que podem ser produzidas e consequentemente aceitas. Porém, nem toda prova poderá ser produzida pelas partes, ainda que de grande importância para a solução do litígio. A sua produção tem 33 MAGNO, Alexandre. Direito Processual Penal. http://alexandremagno.com/read.php?n_id=99. Acesso em 05 maio 2008. Disponível em 34 FERREIRA, Paulo Roberto G. Autenticidade e Privacidade na ICP-Brasil. Disponível em http://www.iti.gov.br/twiki/bin/view/OLD/Forum/ArtigoD203. Acesso em 22 set. 2008. 35 ALBERTO, Octavio Manuel Gomes. Princípios Gerais do Processo Penal. Disponível em http://octalberto.no.sapo.pt/principios_gerais_do_processo_penal.htm. Acesso em 22 set. 2008. 17 um limite dentro da lei, que não pode ser desrespeitado, mesmo no caso do Direito Penal, onde a busca pela verdade real é algo árduo e incessante. Mirabete36 ensina a cerca das provas lícitas: A busca da verdade real e o sistema de livre convencimento do juiz, que conduzem ao principio da liberdade probatória, levam também a doutrinar a concluir que não se esgotam nos artigos 158 a 202 do Código de Processo Penal, os meios de prova permitidos na nossa legislação. A previsão legal não é, portanto exaustiva, mas exemplificativa, sendo admitidas às chamadas provas inominadas, aquelas não previstas expressamente na legislação. Entretanto, essa ampla liberdade da prova encontra limites além daqueles estabelecidos no art. 155 do CPP e em outros dispositivos da lei processual. Segundo a doutrina, são também inadmissíveis as provas que sejam incompatíveis com os principio de respeito ao direito de defesa e à dignidade humana, aos meios cuja utilização se opõem às normas reguladoras do direito que, com caráter geral, regem a vida social de um povo. Lembra-se também a proibição de invocação ao sobrenatural. Desta forma, prova lícita é aquela que não contraria o estabelecido em lei nem a moralidade. 1.5.5 Prova Ilícita No caput do artigo 157 do Código de Processo Penal, verifica-se a não admissão de provas ilícitas, sendo que demonstrado sua ocorrência, estas não serão admitidas no processo. Foi nos Estados Unidos que primeiro se fixou o princípio da inadmissibilidade das provas obtidas ilicitamente, e assim, reconhecido tal defeito da prova, esta não poderia ser aceita no processo. Anteriormente, existiam quatro correntes em relação à questão da inadmissibilidade da prova ilícita propriamente dita. Pela primeira, em não havendo impedimento em nível da lei processual, somente a prova ilegítima poderia ser excluída do processo, já que, no que tange à prova ilícita, ficaria reconhecido 36 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 206. 18 o vício material, punindo-se o autor de sua produção, mas a prova permaneceria válida no processo. Três outras correntes dão por inadmissíveis as prova ilícitas no processo penal: uma sob o fundamento de que, se o direito é uno e se a prova é ilícita, não pode ser reconhecida no processo; outra baseia-se no fato de que o Estado deve se ater ao princípio da moralidade, não podendo se utilizar de meios ilícitos, nem para combater o crime, e, ainda, a quem defende a prova ilícita ofende a Constituição, atingindo valores fundamentais do indivíduo e as garantias individuais37. A prova ilícita fere o direito material, podendo ser conceituada no sentido de que abrange não apenas as provas que afrontam a Constituição, como também as contrárias às leis ordinárias e aos bons costumes, assim, como dizem respeito àquelas ofensivas às disposições legais e constitucionais. Em outras palavras, são aquelas vedadas e inadmissíveis no processo. Nesta linha de raciocínio, a renomada processualista Ada Pellegrini Grinover38 entende por prova ilícita, em sentido estrito: A prova colhida com infringência às normas ou princípios colocados pela Constituição e pelas leis, freqüentemente para a proteção das liberdades públicas e especialmente dos direitos de personalidade e mais especificamente do direito à intimidade. São as provas ilícitas espécie das chamadas provas vedadas, porque por disposição de lei é que não podem ser trazidas a juízo ou invocadas como fundamento de um direito. Desse modo, vê-se que serão ilícitas todas as provas produzidas mediante a prática de crime ou contravenção, as que violem normas de direito civil, comercial, administrativo, bem como aquelas que afrontem princípios constitucionais. 37 FERREIRA, Ruy Barbosa Marinho. Alterações do Código de Processo Penal comentado. São Paulo: Jurídica, 2008. p.123-124. 38 GRINOVER, Ada Pellegrini. As nulidades no processo penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva 1996. p. 131. 19 Observa-se que para se descobrir se uma prova é ilícita ou é o locus da sua obtenção: dentro ou fora do processo. De qualquer maneira, combinando-se o que diz a CRFB/88, art. 5º, inc. LVI "São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”, com o que ficou assentado no novo art. 157 do CPP "ilícitas são as provas obtidas em violação a normas constitucionais ou legais” 39 , se vê que umas e outras passaram a ter um mesmo e único regramento jurídico: são inadmissíveis. 1.6 O PROCESSO “O processo, oriundo do latim procedere, tem entre alguns dos seus significados, o de seguir adiante, caminhar, avançar, fenômeno de desenvolvimento” 40. O processo abrange os instrumentos de que se utiliza os três poderes do Estado (Executivo, Legislativo e Judiciário), cada qual desempenhando funções diversas, utilizando-se de processos próprios cuja fonte criadora é a própria Constituição. O Processo Penal está subordinado à Lei Maior, que é a Constitucional, em princípio, no art. 5º inc. LVI. Ele tornou inadmissível, no processo as provas obtidas por meios ilícitos, razão por que o juiz não pode admiti-la como fundamento de sua decisão, sob pena de nulidade da sentença. Com a formalização do processo como meio de resolução dos conflitos, viu-se a necessidade cada vez maior de se materializar uma previsão legal das provas, um processo dotado dos princípios fundamentais sujeito a normas e regras especificadamente delineadas, legalmente e formalmente possibilitar ao julgador critérios objetivos e subjetivos específicos na valoração das provas obtidas, atendendo assim um julgamento justo. 39 MENDONÇA, Andrey Borges de. Reforma do Código de Processo Penal. São Paulo: Método, 2008. p. 157 40 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de Processo Civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. 1v. p. 01. 20 Por isso, passou-se a atentar para a formulação de legislações mais adequadas, bem como a idéia de “fazer do processo um meio efetivo para a realização da justiça” 41 . Uma vez que o processo “é o encadeamento necessário e ordenado de atos e fatos destinados à formação ou execução de atos jurídicos cujos fins são juridicamente regulados” 42. No caso do Direito, o processo “é o meio pelo qual o Estado procede à composição da lide, aplicando o direito ao caso concreto e dirimindo os conflitos de interesse” 43. Nesse caminho, pode-se entender como processo, todo meio pelo qual, após, uma sucessão de atos e fatos chega-se ao resultado perseguido. 1.7 PRODUÇÃO DAS PROVAS Na visão de Jacinto Nelson de Miranda Coutinho44 A produção da prova no processo penal tem por objetivo formar a convicção do juiz a respeito da existência ou inexistência dos fatos e situações relevantes para a sentença. É, em verdade, o que possibilita o desenvolvimento do processo enquanto reconstrução de um fato pretérito, conforme restou demonstrado. Tem a prova à finalidade de “formar a convicção do juiz sobre os elementos necessários para a decisão da causa. Para julgar o litígio precisa o juiz ficar conhecendo a existência do fato sobre o qual versa a lide”. 45 41 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Candido R. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 37. 42 SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos do Direito Público. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 91. 43 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 13. 44 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Crítica à Teoria Geral do Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 03. 45 DUCLERC, Elmir. Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005. 1v. p. 229. 21 Tendo o autor de provar aquilo que constitui seu direito, poderíamos dizer que a prova não é somente um direito, mas um ônus. É como se diz: o ônus da prova cabe a quem alega. Esse adágio é conseqüência do princípio dispositivo, pelo qual o Juiz está impedido, para manter sua imparcialidade. No entanto, em nosso ordenamento jurídico esse princípio é mitigado, pois, o Juiz pode determinar a produção de prova, não pedida pelas partes, desde que relevante para a reconstituição do fato. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público, mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo, disposto no art. 24 do CPP. Por sua vez a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 129, preceitua: São funções institucionais no Ministério Público: I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei. Conclui-se, desse modo, que o Ministério Público é uma instituição pública, à qual compete, com exclusividade, buscar a satisfação do poder de punir do Estado sempre que ocorrer crime cuja gravidade transcenda aos interesses do ofendido. No entanto, não tem o dever de postular sempre a condenação, orientando sua atuação de modo a buscar sempre a solução mais justa para o processo. O objeto da prova, no entanto, deve ultrapassar a seara concernente ao crime, e abranger, inclusive, situações objetivas ou subjetivas que, de certa maneira, podem intervir na resolução do feito. Deve abarcar todos os fatos, principais ou secundários, que reclamem uma apreciação judicial e exijam uma comprovação. Assim, no processo penal, em que a busca da verdade processual e a observância de princípios como o devido processo legal tem acentuada pertinência, caso o fato seja controvertido ou não, deverão restar 22 provados. Até mesmo a confissão do réu, que não tem valor absoluto, devendo ser confrontado com o restante das provas produzidas no processo. 1.7.1 Produção antecipada das provas As provas produzidas perante a autoridade judicial, antes do seu momento processual oportuno ou até mesmo antes de iniciado o processo, em situações de urgência e relevância e observado o contraditório real são consideradas como antecipadas. O Código de Processo Penal em seu artigo 225 prevê a possibilidade de o juiz antecipar a produção da prova testemunhal nos seguintes termos: Se qualquer testemunha houver de ausentar-se, ou, por enfermidade ou por velhice, inspirar receio de que ao tempo da instrução criminal já não exista, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, tomar-lhe antecipadamente o depoimento. Assim como a Lei nº. 11.690 de 09 de junho de 2008 em seu art. 159, inciso I, permite a possibilidade da produção antecipada da prova, que se dará desde que considerada urgente e deverá ser acompanhada pelo Ministério Público e pelo defensor dativo. A produção antecipada de provas é medida que a sensatez abona e a prudência recomenda, em face da imprevisibilidade do momento em que o processo retomará seu curso. Se próximo, caberá na ocasião deferir à Defesa a renovação da prova. Se distante, ter-se-á acertadamente obviado à eventualidade de apresentar-se dificuldade intransponível na produção longamente protelada. Em ambos os casos, ver-se-á assegurada à perquirição da verdade, objetivo último do esforço processual. 46 Cabe ao Juiz, dentro de seu prudente arbítrio, decidir sobre a conveniência e oportunidade da produção antecipada de provas, quando 46 MARCÃO, Renato. A produção antecipada da prova no art. 366 do Código de Processo Penal. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4118. Acesso em 30 jun. 2008. 23 incontestável o seu caráter urgente, não configuradas na espécie, uma vez que o fundamento utilizado consiste na mitigação ou perda de memória dos fatos. Para que a produção de prova seja possível, são necessários dois pressupostos: fumus boni iuris (relevância) e periculum in mora (urgência). A relevância se verifica pela urgência – ou seja, que a prova diga respeito aos fatos de eventual processo futuro ou do próprio processo já instaurado. (...) A urgência, por sua vez, caracteriza-se pelo risco de desaparecimento da prova, ou seja, pela presença do periculum in mora. 47 Por fim, entendemos que o magistrado somente pode determinar a produção antecipada de provas no curso do processo. Fora disto, ou seja, antes de iniciada a ação penal, não pode fazê-lo de ofício. Somente poderá agir a partir do requerimento do Ministério Público ou do ofendido, do investigado ou, ainda, de representação da autoridade policial. Esgotada a discussão da prova no contexto geral, trataremos no capítulo a seguir, Das Provas em Espécie. 47 MENDONÇA, Andrey Borges de. Reforma do Código de Processo Penal. P. 163. CAPÍTULO 2 DAS PROVAS EM ESPÉCIE Neste capítulo, o estudo será concentrado nas em algumas das espécies de provas, dentre todas as apresentadas no Código de Processo Penal, entre elas testemunhal, documental e pericial, para as quais será dado o devido enfoque sob o prisma do direito processual brasileiro. 2.1 PROVA TESTEMUNHAL No referente à sua forma, a prova poderá ser classificada como testemunhal que corresponde à afirmação pessoal, resultante do depoimento prestado por sujeito estranho ao processo sobre fatos que tenha conhecimento sobre o delito objeto do litígio. Consiste ainda, em uma reprodução oral do que se encontra na memória daqueles que, não sendo parte, presenciaram ou tiveram notícia dos fatos da demanda. 48 O testemunho é um meio de prova disciplinado pelos arts. 202 a 225 do CPP. O Juiz, tendo em vista o sistema de apreciação de provas do livre convencimento, pode valorá-lo livremente à luz das demais provas produzidas. No antigo sistema da certeza legal ou da prova legal, prevalecia o brocardo testis unus/ testis nullus, onde uma só testemunha não valia como prova. Hoje se admite até uma condenação com base em um único testemunho, desde que, corroborado com os demais meios probatórios colacionados aos autos. Por outro lado, muitas vezes vários testemunhos não são suficientes para uma sentença condenatória. Portanto, o que importa não é o número de 48 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 14. p. 268. 25 testemunhas, mas a credibilidade do respectivo depoimento e o critério com que o julgador o aferirá. 49 Arruda Alvim50 explica, prova testemunhal “é aquela produzida oralmente perante o Juiz, através de depoimento espontâneo de pessoa estranha à lide, exceto nos casos em que a lei vede esse meio de prova”. A testemunha poderá ser considerada a pessoa que presta depoimento sobre fatos relevantes para a apuração de uma infração penal, de que tomou conhecimento por meio de sua percepção sensorial, sendo constituída por pessoas que presenciaram ou que tiveram ciência do fato probando. A presunção da veracidade humana, inspirando fé na afirmação de pessoa, faz com que seja procurada e aceita como prova pessoal, do mesmo modo que a presunção da veracidade das coisas faz com que ela seja procurada e aceita como prova real. 51 A prova testemunhal, chamada por muitos autores como “a prostituta das provas”, tem essa fama por seu grande grau de falibilidade. É muito difícil discernir o comportamento humano, até porque quem irá avaliar é um magistrado, graduado em direito, e não em psicologia. O jurista não possui domínio sobre a psique humana, tendo um conhecimento vulgar sobre o assunto. Como indaga Dietrich, “como, então, evitar os erros, já que se está diante de tantas peculiaridades afetas à psicologia? Como saber o Juiz, se a testemunha sofre de histeria, ou de qualquer outro distúrbio da mente” 52 ? Frederico Marques53 esclarece: No processo penal, não há as limitações criadas pelo processo civil a respeito da prova testemunhal. Ao revés, de largo uso é 49 AQUINO, José Carlos G. Xavier de. A prova testemunhal no Processo Penal Brasileiro. p. 19. 50 ALVIM NETTO, José Manoel de Arruda. Manual de Direito Processual Civil. 6. ed. São Revista dos Tribunais, 1997. 2v. p. 32. 51 MALATESTA, Nicola Flamarino dei. A Lógica das Provas em Matéria Criminal. p. 319. 52 DIETRICH, Gustavo Henrique. A Verdade no processo penal moderno.Disponível em http://www.dietrich.adv.br/i_ler_artigos.asp?id=15. Acesso em 03 ago. 2008. 53 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. p. 404. Paulo: 26 essa prova, a qual, além disso, pode supor a produção de outras mais adequadas para o caso, como se verifica, verbi gratia, nas hipóteses previstas nos arts. 167 e 168, § 3º, respectivamente, do Código de Processo Penal. Não discute o autor a questão da falibilidade do testemunho, mas raciocina com elementos de que a prova testemunhal tenha o condão de dar início a novas provas. Certo estaria o autor se, e apenas se, na prática conseguíssemos verificar que o testemunho pudesse produzir novas provas. Mas acontece que, na realidade o testemunho é tomado como forma definitiva, como elemento que vai compor o convencimento do magistrado, que por “n” motivos (celeridade, excesso de trabalho, etc.) acaba por não derivar a prova testemunhal da forma que o autor imagina. Capez 54 faz uma classificação muito pertinente no tocante às características da prova testemunhal, sendo que para o mesmo suas características são: a) Judicialidade: tecnicamente, só é prova testemunhal aquela produzida em juízo; b) Oralidade: a prova testemunhal deve ser colhida por meio de uma narrativa verbal prestada em contato direto com o juiz e as partes e seus representantes. O depoimento será oral (Art. 204 do CPP), salvo o caso do mudo, do surdo e do surdo-mudo (Art. 192 c/c Art. 233 parágrafo único do CPP). A lei veda que a testemunha traga o depoimento por escrito porque falta a este espontaneidade necessária revelada em depoimento oral. Além disso, o depoimento por escrito não permitiria reperguntas, violando-se o princípio do contraditório. Há uma exceção prevista na Lei de Abuso de Autoridade (Art. 14, §1º da Lei nº. 4898/65), segundo a qual a materialidade delitiva no crime de lesões corporais poderá ser comprovada mediante depoimento do perito e das testemunhas, hipóteses em que a lei permite seja o mesmo trazido por escrito e lido em audiência; c) 0bjetividade: a testemunha deve depor sobre os fatos sem externar opiniões ou emitir juízos valorativos. A exceção é admitida quando a reprodução exigir necessariamente um juízo 54 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 282. 27 de valor. Por exemplo: a testemunha afirma que o causador do acidente automobilístico dirigia em velocidade incompatível com o local, comportando-se de forma perigosa. Tal apreciação subjetiva é indestacavél da narrativa, devendo, portanto, ser mantida pelo juiz. Outra exceção é a dos peritos, cujo depoimento, por sua natureza, tem caráter opinativo; d) Retrospectividade: o testemunho dá-se sobre todos fatos passados. Testemunha depõe sobre o que assistiu e não sobre o que acha que vai acontecer; e) Imediação: a testemunha deve dizer aquilo que captou imediatamente através dos sentidos; f) Individualidade: cada testemunha presta o seu depoimento isolada da outra. Por fim, a prova testemunhal constitui uma das formas de prova mais antigas, não sendo possível imaginar a atividade probatória sem ela, onde, muitas vezes, é o único meio de provar os fatos alegados. 2.1.1 Capacidade para testemunhar A capacidade para ser testemunha, se encontra estabelecida no art. 202 e seguintes do Código de Processo Penal, segundo o qual “toda pessoa poderá ser testemunha”. Em suma toda pessoa possui capacidade indistintamente, a condição da pessoa, em verdade, é que pode influir nos deveres a que estão sujeita as testemunhas, determinando ou afastando a incidência de algum ou alguns desses deveres. Portanto, embora o testemunho seja um ato devido, só é para as pessoas que tenham condições de se tornarem sujeitos de tal dever, pessoas que tenham capacidade de perceber ou deduzir os fatos e transmití-los a outrem. A capacidade para ser testemunha não se confunde com a capacidade civil, eis que o cego e o surdo, bem como o enfermo, não são incapazes civilmente, mas o são para testemunhar, se a debilidade apresentada resultar na impossibilidade de percepção sensorial do fato a ser narrado. Todavia, 28 o surdo mudo capaz de comunicar-se por sinais pode servir de testemunha sobre os fatos que tenha presenciado. O maior de dezesseis e menor de dezoito anos pode testemunhar, porém, fica impossibilitada a ocorrência de crime por falso testemunho, eis que este é inimputável criminalmente. Na esfera do direito de família, é comum o menor ser ouvido como informante, cujo valor probatório é menor do que a prova testemunhal. 55 A testemunha não poderá ter interesse no litígio, não se confundindo com a parte da causa ou com o perito da causa, que deve limitar-se a utilizar seus conhecimentos técnicos para explicar ao Juiz algo sobre os fatos da causa. A princípio, todas as pessoas devem testemunhar, sob pena de serem conduzidas coercitivamente ao juízo e a responder processo-crime por desobediência. O Código de Processo Penal, afirma que estão dispensados de depor o cônjuge, o ascendente, o descendente ou o irmão, e os afins em linha reta do acusado (Art. 206, CPP). Assim, entende-se que estas testemunhas, se quiserem, podem prestar o depoimento, pois estão dispensadas e não proibidas. São estas denominadas informantes. Segundo Capez56: São proibidas de depor, contudo, as pessoas apontadas no art. 207 do CPP: as pessoas que devem guardar sigilo em razão de função, ministério, ofício ou profissão. Função é o exercício de atividade de natureza publica ou assemelhada (juiz, delegado, promotor, sindico de massa falida, jurado, comissário de menores, escrivão de cartório, diretor escolar). Ministério é o encargo de natureza religiosa ou social (sacerdotes e assistentes sociais). Oficio é a atividade manual (marceneiro, costureiro etc.). Profissão é a atividade predominantemente intelectual (médicos, advogados e os profissionais liberais, de um modo geral). Quase 55 MACHADO, Ângela C. Cangiano. JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. FULLER, Paulo Henrique Aranda. Elementos do Direito. Processo Penal. 5. ed. São Paulo: Premier: 2006. p. 141 56 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 207. 29 todos os códigos de ética relativos a uma profissão impedem a revelação de sigilo profissional. O Cânone 1.550,§ 2º, inciso II, do Codex luris Canonici considera o sacerdote como testemunha incapaz em relação ao que ficou sabendo em função de seu ministério. A parte final permite o depoimento se o interessado dispensar o sigilo (interessado aqui não é só quem passou a informação, ou acusado, mas também o órgão de classe ao qual pertence o profissional). Os deputados e senadores também não estão obrigados a testemunhar sobre informações recebidas em função do mandato (art. 53, § 5º da CRF/88 – em regra extensível aos deputados estaduais, se assim dispuser a Carta Estadual). Também não podem depor como testemunha o membro do Ministério Público e o juiz que oficiaram no inquérito policial ou na própria ação penal. O advogado, mesmo com o consentimento do titular do segredo, está sempre impedido de depor a respeito do segredo profissional, pois o cliente não tem suficientes conhecimentos técnicos para avalia as conseqüências gravosas que lhe pode advir da quebra do sigilo. Assim, entende-se que estas testemunhas estão proibidas de depor, diferente das denominadas declarantes, que são as elencadas no art. 206 do CPP, que se quiserem podem prestar depoimento. 2.2 PROVA DOCUMENTAL Consideram-se documentos, “quaisquer escritos, instrumentos, papéis públicos ou particulares” (art. 232 do CPP). É o documento a afirmação pessoal consciente, escrita e irreprodutível oralmente, destinada a fazer fé sobre a verdade dos fatos afirmados. Capez57, define Documento é a coisa que representa um fato, destinado a fixá-lo de modo permanente e idôneo, reproduzindo-o em juízo. Instrumentos são os escritos confeccionados já com finalidade de provar determinados fatos, enquanto papéis são os escritos não produzidos com o fim determinado de provar um fato, mas que, 57 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 280. 30 eventualmente, podem servir como prova. Em sentido estrito, documento é o escrito que condensa graficamente o pensamento de alguém podendo provar um fato ou a realização de algum ato de relevância jurídica. É a coisa ou papel sobre o qual o homem insere, mediante qualquer expressão gráfica, um pensamento. Documento, em sentido amplo ou lato, são todos os objetos que servem para mostrar ao Juiz a verdade de um acerto, como escritos, fotografias, pinturas, etc. Em sentido estrito somente os escritos poderão ser utilizados como prova em juízo. 58 No âmbito jurídico, a palavra documento adota um sentido mais restrito, podendo ser tratada como todo meio de prova pelo qual a representação se faz pela escrita, por sinais da palavra falada, ou pela reprodução de um fato ou acontecimento em objeto físico, passível hipoteticamente de servir como prova em juízo. No campo penal, a prova documental não tem a mesma relevância que no âmbito civil, embora seja elemento essencial em alguns crimes, como sonegação fiscal, estelionato, falimentar, etc.59 Neste mesmo entendimento doutrina Marques60, O documento no processo penal pode ser objeto de prova ou, então, meio de prova. É ele objeto de prova quando tem de ser determinado como fato representativo, em seus aspectos externos e no tocante ao que representa como o seu conteúdo material, notadamente para se lhe determinar a autenticidade. Os documentos são divididos conforme a sua proveniência, em públicos e particulares. Públicos aqueles provenientes de funcionário público, dentro dos ditames da lei e confeccionado no exercício da função do funcionário. Particulares são os efeitos ou assinados por particulares sem a intervenção de funcionário público no exercício de suas atribuições. 58 MACHADO, Ângela C. Cangiano. JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. FULLER, Paulo Henrique Aranda. Elementos do Direito. Processo Penal. p. 149 59 MALATESTA, Nicola Flamarino dei. A Lógica das Provas em Matéria Criminal. p. 543. 60 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. p. 417. 31 Malatesta61, afirma que: Tem sucedido, por vezes, querer alguém estabelecer como critério racional, determinado a publicidade de um escrito, a natureza do interesse que ele tem por objetivo; em outros termos, tem sucedido, por vezes, querer alguém considerar como pública um escritura, só por que seu objeto é um interesse público. Todo vêem sem esforço quanto é falaz tal critério. Um escrito, embora tendo por objetivo o interesse de todos os cidadãos, será sempre escrito particular, se foi redigido de forma privada; e vice-versa, tendo embora por objeto um interesse completamente privado, será público quando redigido de forma pública. O critério objetivo do interesse público é, portanto, absolutamente sem valor para a determinação da qualidade de público no escrito. Os documentos, segundo o art. 231, do Código de Processo Penal, poderão, em regra, ser juntados em qualquer fase do processo, exceto em casos especiais (art. 406, § 2º, do CPP: os documentos no júri não poderão ser juntados nas alegações finais; art. 475 do CPP: os documentos a serem lidos no plenário do júri deverão ser juntados com pelo menos três dias de antecedência). A princípio, qualquer documento pode ser juntado aos autos. Não poderão ser juntados, porém, documentos que configurem provas proibidas (art. 233 do CPP). Segundo o art. 233, parágrafo único, do Código de Processo Penal, as cartas particulares, interceptadas ou obtidas por meios criminosos, não serão admitidas em juízo, exceto se apresentadas pelo destinatário para defesa de seu direito. Para Capez62, cabe ao Juiz indagar a cerca de um documento juntado: a) Se o momento da proposição é tardia ou não; em caso afirmativo, recusará, salvo se houver razões que justifiquem o atraso; 61 MALATESTA, Nicola Flamarino dei. A Lógica das Provas em Matéria Criminal. p. 549. 62 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 288. 32 b) Em regra, cabe às partes oferecer os documentos, salvo: - o juiz poderá ordenar, de ofício, que terceiro exiba documento que interesse à causa; - referindo-se uma testemunha a documento, eu poder, ou exibindo-o para confirmar o seu depoimento, ao juiz é lícito tomar a referencia ou a exibição como oferta do documento e determinar a juntada aos autos; - os peritos poderão trazer aos autos documento que esclareçam os seus pareceres; c) Todo documento oferecido sem a finalidade de provar fatos e circunstancias da causa deverá ser repelido; d) Impõe-se, no ato da admissão, a verificação das condições exteriores do documento (os escritos em língua estrangeira, para que tenham validade, devem vir acompanhados de tradução oficial, feita por tradutor juramentado); e) Oferecido um documento, sobre ele deverá ouvir-se a parte adversária do proponente; esta deverá, o prazo legal, contestar ou não a veracidade do contexto do documento ou a autenticidade da assinatura – uma vez impugnado, cabe ao juiz resolver o impasse. Acerca do conceito de documento, entende-se que nem toda escritura é documento, que os escritos que são considerados como documentais pela sua irreprodutibilidade oral, reduzem-se a quatro classes: I- Escritos autênticos; que são as provas que não são lícitas impugnar livremente com provas contrárias; destinam-se a impor a todas as conseqüências, compreendida a dos magistrados, a fé no seu conteúdo, que só pode ser abalada pela queixa de falsidade; II- Escritos antilitigiosos, é a legítima prova pessoal, e sua forma escritural é natural, não substituível pela oral. O homem se utiliza dessa prova, duvidando da memória alheia, e por vezes da sua, e, ainda, duvidando da boa-fé alheia, prefere sempre consagrar em escrito, para que não sejam postos em dúvida, os fatos civis que ocorram entre si e os outros; III- Escritos casuais pelos interessados em causa, são os escritos que não foram redigidos para prevenir controvérsias, nem são destinados ao fim do julgamento que se debate, tendo a razão da sua existência fora disso; 33 IV- Testemunhos escritos causais que não podem mais reproduzi-los oralmente em razão de supervenientes condições, ocorrem no caso em que a testemunha deixou uma declaração escrita e veio a falecer, desapareceu ou enlouqueceu tal declaração escrita não pode ser oralmente reproduzida por uma impossibilidade material ou psíquica, e torna-se assim verdadeiro o documento, cuja leitura do mesmo é admissível, como a de qualquer outro escrito probatório não substituível pela oralidade. 63 Observa-se, portanto, que a avaliação das provas no processo é feita com obediência a um sistema, cujas regras são estabelecidas com o sentido de, valorizar o juízo crítico emitido pela autoridade judiciária aproximando-o o máximo possível da verdade. 2.3 PROVA PERICIAL Estudando as formas em que se pode exteriorizar a afirmação de pessoa, vimos que elas se reduzem a duas, a forma testemunhal e a documental, cabe agora discorrer das formas das quais pode exteriorizar-se a afirmação da coisa, ou seja, a prova material. Quanto à sua forma consiste justamente em qualquer materialidade da prova do fato probando, refere-se especificamente a objetos como, por exemplo, instrumentos utilizados para a execução do crime, os exames, vistorias, perícias, instrumentos do crime e outros. 64 Cada vez mais, com a finalidade de obter informações específicas sobre a materialidade do fato, o Juiz se utiliza da prova pericial e denota sua importância para o deslinde de controvérsias carecedoras de pareceres técnicos, com o escopo primordial de assegurar ao magistrado a segurança de informações acerca do objeto do conflito que se quer provar. 63 MALATESTA, Nicola Flamarino dei. A Lógica das Provas em Matéria Criminal. p. 559/ 564/569. 64 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. 2v. p. 329. 34 Silva 65 conceitua perícia da seguinte forma: Em sentido lato, a diligência realizada ou executada por peritos, a fim de que se esclareçam ou se evidenciem certos fatos. Significa, portanto, a pesquisa, o exame, a verificação, acerca da verdade ou da realidade de certos fatos, por pessoas que tenham reconhecida habilidade técnica ou experiência na matéria de que se trata (...). A perícia, segundo princípio da lei processual, é, portanto à medida que vem mostrar o fato, quando não haja meio de prova documental para mostrá-lo, ou quando se quer esclarecer circunstâncias, a respeito do mesmo, que não se acham perfeitamente definidas. Esses exames deverão ser feitos por um perito/técnico, habilitado que será o auxiliar da Justiça, pessoa hábil que tenha conhecimento em determinada área técnica ou científica. O Código de Processo Penal, em seu art. 159, caput, estabelece que a perícia deverá ser realizado pelo perito oficial, portador de diploma de curso superior, no entanto, na falta destes, o §1º prevê que possa ser realizado por duas pessoas idôneas portadoras de diploma de curso superior, preferencialmente na área específica. Após a nomeação do perito feita pela autoridade competente, deverá este esclarecer um fato de natureza duradoura ou permanente. Afirma Mirabete66que: Não possuindo o juiz conhecimentos enciclopédicos e tendo de julgar causas das mais diversas e complexas, surge à necessidade de se recorrer a técnicos e especialistas que, por meio de exames periciais, com suas descrições e afirmações relativas a fatos que exigem conhecimento especiais, elucidam e auxiliam no julgamento. Entende-se perícia o exame procedido por pessoa que tenha determinados conhecimentos técnicos, científicos, artísticos ou condições pessoais inerentes ao fato punível a fim de comprová-los. A perícia então, além de estar adstrita à circunstância ou situação relevante ao processo, caracteriza-se por ser um meio de auxílio ao Juiz 65 SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico. p. 602 66 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 267. 35 durante a elucidação de fatos sob tutela jurisdicional do Estado, dos quais o julgador não tem conhecimento técnico específico. Nestes termos, Camargo Aranha67 aduz: O termo “perícia” tem sua origem etimológica no vocábulo latino perícia, significando habilidade, saber, capacidade, sendo que, no decorrer do tempo, a própria habilidade especial exigida passou a distinguir a ação ou a investigação praticada por outrem e para a qual colocou seu conhecimento ou saber altamente especializado. Em regra, cabe à autoridade policial requerer a perícia, entretanto, ela ainda pode ser determinada pelo magistrado ou requerida pelas partes. Alguns exames feitos pelos técnicos poderão ser de natureza diversa, tais como exames laboratoriais, grafotécnicos, de insanidade mental, dos instrumentos utilizados no crime, do local do crime, etc.68 Podemos classificar a perícia em 10 modalidades69. a) Judicial – é determinada pela justiça de ofício ou a pedido das partes envolvidas; b) Extrajudicial – é feita a pedido das partes, particularmente; c) Necessária (ou obrigatória) – imposta por lei ou pela natureza do fato, quando a materialidade do fato se prova pela perícia. Se não for feita, o processo é passível de nulidade; d) Facultativa – quando se faz prova por outros meios, sem necessidade da perícia; e) Oficial – determinada pelo juiz; f) Requerida – solicitada pelas partes envolvidas no litígio; 67 ARANHA, Adalberto Jose Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. p. 155. 68 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. p. 121. 69 Perícia. Disponível em http://www.direitonet.com.br/resumos/x/82/22/82/. Acesso em 01 set. 2008. 36 g) Contemporânea ao processo – feita no decorrer do processo; h) Cautelar – realizada na fase preparatória da ação, quando realizada antes do processo (ad perpetuam rei memorian); i) Direta – tendo presente o objeto da perícia; j) Indireta – feita pelos indícios ou seqüelas deixadas. Entende-se que, a perícia é utilizada para levar conhecimento técnico ao juiz, produzindo prova para auxiliá-lo em seu livre convencimento, e levar ao processo a documentação técnica do fato, o qual é feito através de documentos legais. O Laudo será o documento apresentado pelo perito, após finalizar seu trabalho. Este documento deverá ser escrito e redigido da seguinte maneira: 70 I - preâmbulo – que contém nome do perito, seus títulos, nome da autoridade que o nomeou, motivo da perícia, nome e qualificação do indivíduo a ser examinado; II - histórico – que é a anamnese do caso, colheita de informações do fato, local, envolvidos, etc; III - descrição – que é a parte mais importante, deve ser minuciosa ao relatar as lesões e sinais do indivíduo, e se envolver cadáver tem que constar os sinais da morte, identidade, exame interno e externo; IV - discussão – que é o diagnóstico onde o perito externará sua opinião, relatório dos critérios utilizados; V - conclusão – que é o resumo do ponto de vista do perito, baseando-se nos elementos objetivos e comprovadores de forma segura; VI - respostas aos quesitos – eventualmente oferecidos pelas partes ou juízo. 70 Perícia. Disponível em http://www.direitonet.com.br/resumos/x/82/22/82/. Acesso em 01 set. 2008. 37 O Laudo Pericial deverá então conter as conclusões do perito, uma vez que, ele é prova de fato e depende de conhecimento especial. O art. 159, em seu parágrafo terceiro do CPP prevê a formulação dos quesitos, pelo Ministério Público assistente de acusação, ofendido, ao acusado e ao querelante. Os quesitos são as perguntas técnicas que as partes querem ver respondidas pelo profissional perito, que além de auxiliar o trabalho deste, ainda deixa bem clara a objetividade pretendida. Uma boa elaboração de quesitos é parte essencial na boa produção da prova pericial, e serão mais ricos quando elaborados conjuntamente por advogados e profissionais especialistas71. 2.3.1 Do Exame de Corpo e Delito O estudo dos meios de prova no âmbito processual penal, é de importante relevo, uma vez que, um dos pressupostos para que se comprove a existência do crime é que seja bem definida a autoria e materialidade. Para isso, nos casos em que o delito deixe vestígios, materialmente comprovados, faz-se necessária a realização do exame de corpo de delito, que tem o escopo de, através de peritos, verificarem a contundência de tais vestígios e se os mesmos possam trazer luzes ao deslinde do processo crime. 72 Uma das mais importantes perícias, o exame de corpo e delito está previsto no art. 158 do CPP; “quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado”, sua falta ainda poderá acarretar nulidade do processo (art. 564, III, do CPP). Conforme dispõe o artigo, ele poderá ser direto ou indireto, respectivamente no caso a análise pessoal dos peritos, tendo o contato direto com os vestígios ou materiais do crime, indiretamente os peritos deverão analisar 71 Perícia.Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Per%C3%ADcia. Acesso em 03 out. 2008. 72 HENRIQUES, Henrique Toscano. O exame de corpo de delito e a dignidade da pessoa humana. Disponível em http://www.wiki-iuspedia.com.br/article.php?story=20080212113343176. Acesso em 03 out. 2008. 38 os vestígios materiais do crime, sem contato pessoal por meio de documentos, podendo ser prontuários médicos, fotografias, filmes, entre outros73. O exame de corpo de delito, na acepção de Guilherme de Souza Nucci, é a verificação da prova da existência do crime feita por peritos, diretamente, ou por intermédio de outras evidências quando os vestígios, ainda que materiais desapareçam 74. Esta prova só é passível de ser aferida, nos crimes que, por sua natureza, deixarem vestígios, o que impõe a dicção do artigo 158 do Código de Processo Penal, não suprindo a confissão do acusado, pois, dentro do processo penal, vige o instituto da verdade real. Caso ocorra o desaparecimento dos vestígios materiais, que fique impossibilitada a realização do exame de corpo e delito, o Juiz poderá se valer da prova testemunhal, podendo ela ser admita para a comprovação da existência da infração penal, na qualidade de prova supletiva (art. 167 do CPP) 75. Quanto à natureza dessa prova testemunhal supridora do exame de corpo de delito, para alguns, esta será diligenciada pelo próprio Juiz da causa, que tomará o depoimento das testemunhas. De outro modo, alguns acreditam que a prova testemunhal colhida nessas hipóteses vem inserida dentro do exame de corpo de delito indireto, ou seja, os peritos é que colheriam os depoimentos das testemunhas do crime no local onde ocorrera o mesmo76. Para Capez77 ,neste caso, entende que a lei ao enunciar o suprimento da prova testemunhal, o diz exclusivamente ao juiz que proceda à coleta dos depoimentos e não que os mesmos sejam realizados de forma indireta através dos peritos. 73 MACHADO, Ângela C. Cangiano. JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. FULLER, Paulo Henrique Aranda. Elementos do Direito. Processo Penal. p. 121. 74 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 2. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 22. 75 JUNIOR, Aldo Batista dos Santos. A Prova no Direito Brasileiro. Disponível em http://www.neofito.com.br/artigos/art01/ppenal35.htm. Acesso em: 03 out. 2008. 76 HENRIQUES, Henrique Toscano. O exame de corpo de delito e a dignidade da pessoa humana. Disponível em http://www.wiki-iuspedia.com.br/article.php?story=20080212113343176. Acesso em 03 out. 2008. 77 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p. 323. 39 No caso da necessidade da realização do exame de corpo e delito, ele será feito por um perito, conforme vimos anteriormente. O legista que geralmente é um médico, funcionário do Instituto Médico Legal, que fará o exame dependendo do caso. Existem seis tipos de exames que o legista poderá fazer78; I - Lesão corporal: é feito quando envolve um episódio de violência e classifica em que ponto a integridade física foi afetada. A vítima relata o ocorrido e o legista procura sinais que comprovem ou não o que foi dito. Se num acidente, um osso foi quebrado, o legista verifica o quanto essa fratura impossibilita os movimentos da pessoa. II - Exame de imputabilidade penal: para avaliar se o acusado é ou não, capaz de responder pelo crime que cometeu. Pela lei, uma criança não pode responder por um crime, porém se o crime foi cometido contra uma criança, o exame também é realizado para incriminar o agressor. Exames psiquiátricos também são válidos para se considerar a imputabilidade. III – Embriaguez: além do bafômetro, que mede a quantidade de álcool no sangue (mas não determina se a pessoa está ou não embriagada), são feitas perguntas passíveis de reações exaltadas pelo médico legista para a avaliação emocional. Após esta fase, passa-se para testes de equilíbrio. IV- Violência sexual: exame composto por três pontos: sinais de violência (no corpo de quem sofreu a agressão), presença de material genético masculino e, se a vítima for uma mulher, diagnosticam a possibilidade de gravidez. Nestes exames, o legista é especialista em ginecologia. V- Exame psiquiátrico: é realizado para saber se quem cometeu o crime estava sob influência de drogas ou para avaliar uma pessoa fora de seu estado normal. O legista neste caso é um especialista em psiquiatria. Os trabalhos podem ser iniciados por um psicólogo. VI- Exame cautelar em detentos: feito por precaução para a verificação de lesões recentes no preso. O legista examina se a integridade física do indivíduo foi mantida durante seu transporte 78 Revista Galileu e Centro de Exames, Análises e Pesquisas do IML. Como são realizados os exames de corpo e delito. Disponível em http://www.curiosando.com.br/index.php/2008/comoe-o-exame-de-corpo-de-delito/. Acesso em 07 out. 2008. 40 a caminho da delegacia, tribunal ou em uma transferência de presídio, por exemplo. É realizado sempre que os presos entram e saem da prisão. Entende-se, portanto, que o exame poderá ser realizado, dependendo do caso, na vítima viva, no corpo da vítima em caso de morte, e poderá ainda ser realizado no criminoso, para que se constate ou não a materialidade do delito. Com o fim da análise a cerca de alguma das espécies de provas, trataremos no capítulo a seguir do ônus da prova, sua valoração, bem como o seu valor para que o magistrado forme sua convicção, e ao final a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada. CAPÍTULO 3 A PROVA COMO FACULDADE PROBATÓRIA DO JUIZ Neste capítulo, trataremos do ônus da prova, bem como sua valoração como fonte do juízo criminal. Ao final abordaremos ainda a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada. 3.1 ÔNUS DA PROVA A palavra ônus, como a maioria das derivações de nossos brocardos jurídicos, é de origem latina e advém da palavra onus, que significa fardo, carga, peso, imposição etc.79 Na lição de Capez80 “ônus da prova é, pois, o encargo que tem os litigantes de provar, pelos meios admissíveis, a verdade dos fatos”. Desse modo, explica-se porque nos referimos ao ônus da prova, como o trabalho de se provar algo. Especifica que a pessoa responsável por uma determinada afirmação, é também aquela que deve oferecer as provas necessárias para sustentá-la81. Afrânio S. Jardim82 a cerca da matéria discorre: Ônus da prova é a faculdade que tem a parte de demonstrar no processo a real ocorrência de um fato que alegou em seu 79 WIKCIONÁRIO. Ônus. Disponível em http://pt.wiktionary.org/wiki%C3%B4nus. Acesso em 08 de out. de 2008. 80 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 268. 81 MACHADO, Ângela C. Cangiano. JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. FULLER, Paulo Henrique Aranda. Elementos do Direito. Processo Penal. p. 120. 82 JARDIM, Afrânio Silva. Direito processual penal: revista e atualizada. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 199-200 42 interesse, o qual se apresenta como relevante para o julgamento da pretensão deduzida pelo autor da ação penal. Consideramos portanto, a prova não como uma obrigação, e sim um ônus, como sua própria nomenclatura a define. Camargo Aranha83 esclarece melhor as desigualdades entre ônus e obrigação. A diferença entre ônus e obrigação está, pois, no meu entender, na circunstância de que o adimplemento do ônus é deixado livremente à vontade da parte onerada ao contrário do que ocorre com a obrigação, qualquer que seja a reação provocada pelo seu inadimplemento. Pertence, pois, à essência da obrigação a necessidade de ser cumprida. Uma obrigação cujo adimplemento fique ao arbítrio do acusado, constitui uma contradição in se ipsa. Disto resulta que, enquanto o não-cumprimento do ônus não se apresenta como ato contra o direito, visto que o comportamento da parte à sua escolha, o inadimplemento de uma obrigação é fato em contradição com a ordem jurídica e importa em consequencias adequadas. O art. 156 do Código de Processo Penal contempla a regra, “ônus da prova é de quem alega”, pois seguindo o princípio constitucional, ninguém deverá ser acusado de um delito até que se prove o contrário. Na seqüência do mesmo artigo, ainda existe a possibilidade do Juiz de ofício contemplar a atividade probatória das partes no curso da instrução criminal. Com a alteração do art. 156, através da Lei nº. 11.690/2008, a regra de que, o encargo de provar incube a parte que alegar o fato permaneceu aparentemente igual à anterior. Realmente, verifica-se que o legislador tratou do ônus da prova em relação às causas que excluam o crime ou isentem o réu de pena no art. 386, inc. VI, do CPP. Parte da doutrina afirmava que o ônus da prova destas causas seria da defesa, pois, como as alegou, deveria comprovar a sua efetiva ocorrência, nos termos do art. 156 do CPP. Neste sentido, afirmavam, a defesa deveria demonstrar inequivocamente os requisitos da legítima defesa, por exemplo, para que fosse possível a absolvição do acusado. Todavia, o legislador, colocando uma pá de cal sobre a questão, 83 ARANHA, Adalberto Jose Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. p. 07. 43 alterou o inc. VI do art. 386, para determinar que o ônus da prova da defesa é impróprio em relação às causas que excluem o crime ou isentem de pena, pois basta, para absolvição, que haja fundada dúvida sobre sua existência.84 Assim, com a reforma, o código demonstra que, na hipótese de dúvida razoável sobre a ocorrência de alguma das causas excludentes do crime ou da culpabilidade, haverá a absolvição do réu. Como sabido, a regra de distribuição do ônus da prova indica que aquele que alegar deve provar. Assim sendo, enquanto a acusação deve comprovar a ocorrência de um fato típico, à defesa incumbe comprovar as causas excludentes do crime e da culpabilidade. (...) Parte da doutrina entendia que, existindo dúvida sobre a causa excludente da ilicitude ou da culpabilidade alegada, deveria ser prolatada sentença condenatória. Todavia, o descumprimento do ônus, contudo, por parte do réu, não acarreta necessariamente a procedência da imputação, porque para a defesa é um ônus imperfeito, ou diminuído, em virtude do princípio indubio pro reo, que leva à absolvição, no caso de dúvida quanto à procedência da imputação. Assim, em princípio, à defesa incumbe a iniciativa da prova das excludentes, mas basta-lhe a prova que suscite uma dúvida razoável, por que a dúvida milita em seu favor85. Portanto, com a reforma do art. 386 na Lei nº. 11.690/08, agora, não apenas a comprovada presença das referidas circunstâncias deve determinar a absolvição do réu, mas também quando houver dúvida fundada sobre a existência de situação que exclua o crime ou isente o réu de pena, deve o juiz proferir sentença absolutória. Assim, prestigia-se o princípio in dubio pro reo, pois da mesma forma que a existência de dúvidas sobre a autoria delitiva deve inclinar a balança a favor do acusado, também a existência de dúvidas sobre circunstâncias excludentes do crime ou da pena deve beneficiá-lo. 84 MENDONÇA, Andrey Borges de. Reforma do Código de Processo Penal. p. 161-162. 85 MENDONÇA, Andrey Borges de. Reforma do Código de Processo Penal. p. 203. 44 Em uma linha de raciocínio, vamos entender o funcionamento do ônus da prova. Para isso vamos partir do princípio de que tudo começa com uma afirmação, podendo ou não ser baseada em fatos. O ônus irá recair sobre quem afirmou a existência de um “fato”, e mesmo a outra parte alegando a existência ou não dessa afirmação, o dever de prová-la será de quem primeiro a alegou. Então somente a partir da comprovação através de provas de que realmente o “fato” ocorreu, o ônus será transferido a outra pessoa, que fará a defesa, devendo provar também sua tese86. Neste mesmo sentido ensina Capez87: A prova incumbe a quem alega, se o MP alega que você furtou um objeto, cabe ao MP provar o alegado. O próprio tema tem tudo a ver com o Princípio da Presunção de Inocência, garantido pela nossa Constituição brasileira, assim como pela Convenção Americana de Direitos Humanos, mais especificamente em seu artigo 8º. Esse princípio garante ao réu uma vantagem processual inicial nesse campo probatório, ou seja, é como se fosse um placar de um jogo, e esse placar fosse 01 x 00 para o acusado. Isso ocorre devido à presunção de inocência, para inverter esse placar e, portanto, para que haja condenação, quem alega tem que provar que aquele sujeito se envolveu com determinado delito, ou seja, tem que inverter essa presunção de inocência, produzindo provas válidas e devidamente admitidas pela Constituição e Leis brasileiras. A prova da alegação incumbe a quem a fizer, portanto, o ônus da prova é da acusação, ou seja, o réu não tem o ônus de prova sua inocência, por que essa inocência é presumida, sobre tudo por força do artigo 8º da Convenção Americana de Direitos Internacionais. È importante salientar que, a regra de que o ônus da prova “incumbirá a quem alega” não é absoluta, uma vez que o art. 156 do Código de 86 WIKIPEDIA. Ônus da Prova. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%94nus_da_prova. Acesso em 08 out. de 2008. 87 GOMES, Luiz Flavio. Lei 11.690/08: a quem incumbe o ônus da prova no processo penal brasileiro. Disponível em http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080703115049962. Acesso em 08 out. 2008. 45 Processo Penal, em sua segunda parte reza que a alegação é “facultado ao juiz de ofício” 88. Entretanto, não podemos deixar de analisar a situação do réu, pois diante do princípio in dubio pro reo, jamais poderá ser prejudicado na existência de dúvida relevante. Neste mesmo sentido preconiza o Egrégio Supremo Tribunal 89 Federal ; O processo penal condenatório não é um instrumento de arbítrio do Estado. Ele representa, antes, um poderoso meio de contenção e de delimitação dos poderes que dispõem os órgãos incumbidos da persecução penal. Ao delinear um círculo de proteção em torno da pessoa do réu – que jamais se presume culpado, até que sobrevenha irrecorrível sentença condenatória – o processo penal revela-se instrumento que inibe a opressão judicial e que, condicionado por parâmetros ético-jurídicos, impõe ao órgão acusador o ônus integral da prova, ao mesmo tempo em que faculta ao acusado, que jamais necessita demonstrar a sua inocência, o direito de defender-se e de questionar, criticamente, sob a égide do contraditório, todos os elementos probatórios produzidos pelo Ministério Público. Assim, a produção probatória por parte do magistrado é supletiva, devendo ser cometida a sua intervenção. Devendo apenas, intervir em casos sui generis, em casos considerados urgentes e relevantes, requerendo diligencias para dirimir dúvida sobre ponto relevante. 90 Por fim, fica demonstrado que, a comprovação da existência e da veracidade dos fatos, através da produção de provas, no âmbito do Processo Penal, é o que vem a ser o ônus da prova. 88 MENDONÇA, Andrey Borges de. Reforma do Código de Processo Penal. p. 161. 89 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Processual Penal. Hábeas Corpus. Constrangimento Ilegal. Hábeas Corpus nº. 73.338-7, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Brasília, DF. 1ª Turma, Rel. Min. Celso de Mello, j. 7/11/89, DJU de 17 ago. 1992. P. 12.225. 90 MENDONÇA, Andrey Borges de. Reforma do Código de Processo Penal. p. 161. 46 3.1.1 Inversão do Ônus da Prova Via de regra, no Direito Penal vige o princípio de que cabe a quem alega, provar os fatos constitutivos de seu direito. Por sua vez, cabe ao Réu a prova dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito de quem os alega. Todavia, em algumas ocasiões, a lei atribui ao Réu à responsabilidade de provar o erro das alegações do Autor, no que denominamos neste momento de Inversão do Ônus da Prova91. Sabemos que no mundo do Processo Penal essa inversão é um argumento logicamente inconsistente, inválido ou falho, que se remete a várias discussões filosóficas, ciêntificas e jurídicas. Por isso, cabe ao julgador ter uma atenção especial, a quem deve ser o responsável de um determinado argumento92. Diante das divergências doutrinárias e jurisprudenciais, a respeito das relações que o ônus probatório estabelece, acredita-se na impossibilidade de sua inversão em face dos conflitos que decorrem do reconhecimento do princípio constitucional da presunção de inocência e da pretensão punitiva num Estado Democrático de Direito, devendo o acusado ter seu direito de liberdade preservado, cabendo somente ao órgão acusador a comprovação dos fatos que fundamentam a alegação de ocorrência da conduta criminosa93. Neste mesmo sentido entende o Egrégio Superior Tribunal de Justiça94 91 WIKIPEDIA. Ônus da prova. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%94nus_da_prova. Acesso em 08 out. 2008. 92 WIKIPEDIA. Ônus da prova. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%94nus_da_prova. Acesso em 08 out. 2008. 93 MORAIS, Sabrina. Atividade probatória e inversão do ônus da prova no direito processual penal. Disponível em http://biblioteca.universia.net/ficha.do?id=6880821. Acesso em 09 out. 2008. 94 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Processual Penal. Hábeas Corpus. Constrangimento Ilegal. Hábeas Corpus nº. 27.684. Tribunal de Justiça do Amazonas, Brasília, DF. 5ª Turma, Rel. Min. Paulo Medina, DJU de 09 abr. 2007. p. 267. 47 No processo penal não pode ocorrer à inversão do ônus da prova, de maneira que o órgão acusador se abstenha da obrigação jurídica de provar o alegado enquanto o réu tenha que demonstrar sua inocência. Acórdão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator o Ministro Paulo Medina. Contudo, na visão da divergência, deveria caber ao acusado provar tais alegações, porém, como uma das conseqüências do princípio da presunção de inocência é que cabe ao acusador provar a culpa do réu. Novamente nos reportando ao art. 156 do CPP, que aduz, prova da alegação incumbirá a quem a fizer, assim, provar a culpabilidade do réu é ônus do órgão acusador, no caso de alegação por parte da defesa de qualquer causa excludente da ilicitude, de culpabilidade ou extinção da punibilidade95. Assim, entende-se que não há inversão do ônus da prova uma vez que cabe a quem alega provar que se o acusado cometeu o delito ou transgressão a que lhe foi imputado, em todos os termos. 3.2 VALORAÇÃO DA PROVA A pesquisa ora desenvolvida chega a um ponto de grande relevância, qual seja demonstrar o valor probatório da prova como subsídio para a fundamentação de convicção e decisão do Juiz ao prolatar a sentença. Sendo o processo o instrumento utilizado pela justiça para determinar a culpabilidade de uma pessoa suspeita da prática de uma infração penal, a sua essência é exatamente a atividade probatória96. Entende-se, que a produção de provas é o momento em que o magistrado começa a declinar sua decisão. Após instaurado o processo, este se 95 FERNANDES, Fabiano Samartin. Aplicação do Princípio da presunção de inocência no processo administrativo disciplinar. Disponível em http://www.agepol.org.br/novo/arquivo/presuncao_inocencia_e_pad.pdf. Acesso em 09 out. 2008. 96 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Sobre a valoração das provas penais. Disponível em http://promotordejustica.blogspot.com/2007/07/sobre-valorao-das-provas-penais.html. Acesso em 09 out. 2008. 48 findará com a produção de provas, momento a partir do qual, assiste ao magistrado o dever de a elas atribuir valor, posto que não pode declinar da jurisdição. Uma vez que, “não existem limites e regras abstratas de valoração (como no sistema legal de provas), mas tampouco há a possibilidade de formar sua convicção sem fundamentá-la (como na íntima convicção)”. 97 Entretanto, segundo RANGEL98: O indício constitui meio de prova, o qual pode ser corroborado com as informações contidas no inquérito policial, estando o magistrado livre para decidir fundamentando-se nos meios de prova constantes dos autos. Já a condenação calcada exclusivamente em informações contidas no inquérito, necessita da comprovação em juízo, sob pena de incidir nas previsões do art. 386 do CPP. Assim, a equiparação de valores, no entanto, descarta a substituição da prova jurídica pela prova moral, considera legítima somente a prova produzida no processo, desprezando a convicção baseada em atos de investigação, na inquisição do inquérito policial99. Mirabete100 assinala: O Juiz está adstrito às provas carreadas aos autos, não podendo fundamentar qualquer decisão em elementos estranhos a eles: o que não está nos autos não esta no mundo (quod non est in actis non est in mundo). Seus domínios são exclusivamente os das provas no processo, porém, na eleição ou avaliação delas, ele é livre, guiando-se pela crítica sã e racional: a lógica, o raciocínio, a experiência etc., o conduzirão nesse exame e apreciação. 97 LOPES JR, Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008. p. 507. 98 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 10. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005. p. 449. 99 CRISTINO, Fernanda da Rosa. SILVA, Fábio Pereira da. O valor probatório das provas provenientes de atos de investigação. Disponível em http://jusvi.com/artigos/36286. Acesso em 13 out. 2008. 100 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. p. 266. 49 Destaca-se, portanto, que para decidir a causa, o Juiz não aplicará tão somente a técnica jurídica, mas certamente julgará amparado pelas características que envolvem sua estrutura de homem e cidadão. A respeito da livre apreciação do magistrado, ainda cumpre transcrever os ensinamentos de Capez101. O Juiz, portanto, decide livremente de acordo com a sua consciência, devendo, contudo, explicitar motivadamente as razões de sua opção e obedecer a certos balizamentos legais, ainda que flexíveis. (...) Trata-se, na realidade, do sistema que conduz ao princípio da sociabilidade do convencimento, pois a convicção do Juiz em relação aos fatos e às provas não pode ser diferente da de qualquer pessoa que, desinteressadamente, examine e analise tais elementos. Vale dizer, o convencimento do Juiz deve ser tal que produza o mesmo resultado na maior parte das pessoas que, porventura, examinem o conteúdo probatório. Por outro lado, já que não existe distinção de valores, deduzse que a convicção e decisão do magistrado podem ser sustentadas por todas as provas lícitas, eis que Demercian102 assinala: Todos os métodos que não encontrem vedação nas regras de direito material e processual são plenamente aptos a conduzir à certeza moral, como critério da verdade para o juiz, ao entregar a prestação jurisdicional do Estado (...). Partindo dessa premissa, e do estudo anterior feito, sabemos que as provas são avaliadas sob um conjunto e não individualmente. Desta avaliação, também já sabemos que o juiz atribuirá a cada prova um valor, com sua devida fundamentação. 101 102 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 259. DEMERCIAN, Pedro Henrique. MALULY, Jorge Assaf. Curso de processo penal. São Paulo: Atlas. 1999. p. 286 50 Em uma melhor visão da adoção diferenciada de valores, podemos exemplificar com a prova pericial, uma vez que é caracterizada por sua grande importância para o processo, principalmente no que se refere ao quesito segurança. Martins103, no mesmo sentido, discorre a cerca importância da prova pericial. A prova pericial reveste-se de relevância, em virtude da evolução tecnológica, vez que atualmente se pode obter a confirmação da presença física do agente no local do fato, ou mesmo da autoria por exame de DNA, sendo possível confirmar-se a voz de um interlocutor em conversa telefônica acoplados a aparelhos sofisticados que medem a graduação das ondas vocais, enfim, existe todo um aparato técnico e tecnológico apto a dirimir dúvidas importantes em um processo. Aranha104 dissertou oportunamente sobre o mesmo tema: (...) embora situada como uma prova nominada idêntica às demais, pra nós, numa afirmativa arrojada, tem a perícia uma natureza jurídica toda especial que extravasa a condição de simples meio probatório, para atingir uma posição intermediária entre a prova e a sentença. (...) o perito emite um juízo de valor. Apurado, o fato entra em conjecturas sobre o relacionamento entre ele e um princípio técnico-científico para, por meio da experiência, da probabilidade ou de uma constatação, fornecer o diagnóstico e, às vezes, o prognóstico (...) o que excede à simples condição de mera prova. (...) a perícia é sempre prospectiva enquanto as provas são retrospectivas. E finalmente complementa o autor, (...) todas as provas serem objetivas, ao passo que a perícia é eminentemente subjetiva. O que caracteriza a perícia é a formulação de um juízo de valor, um julgamento técnico, artístico científico, ou a avaliação de um fato, elementos que importam na afirmativa de que, indiscutivelmente, tem o seu conteúdo 103 MARTINS, Jorge Henrique Schaefer.Prova Criminal: Retrospectiva Histórica, modalidades, valoração. Curitiba: Juruá, 1996. p. 41. 104 ARANHA, Adalberto Jose Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. p. 156-157. 51 subjetivo, o que contraria todas as outras provas. (...) a perícia não é um simples meio de prova, mas um plus em relação à prova, porém, um minus quanto ao decisio, portanto, em posição intermediária entre a prova e a sentença. Portanto, é inegável a valoração da prova pericial, uma vez que ela exime um caráter de segurança ao magistrado. Bem como o laudo pericial é utilizado como base da decisão, no amparo à convicção em razão da responsabilidade atribuída ao juiz. Entende-se que esse valor maior dado à prova pericial é facilmente distinto dos outros meios de provas, já que os demais estão suscetíveis às situações que possam prejudicá-las. Observando o caso das testemunhas, por exemplo, que como discutido anteriormente, apesar de terem o dever de não faltar com a verdade, tem medo de expor a real situação por coação de criminosos ou por má fé decorrente de interesse na causa. Ou mesmo onde a testemunha, mesmo que de boa-fé por algum fator, como perda de memória, deformidade física e até mesmo decorrente de sua idade, seu testemunho não terá o mesmo peso. Desta forma, a fim de compreendermos o valor das provas no âmbito do Processo Penal, e, a fim de elucidar as entrelinhas da difícil, mas majestosa função desenvolvida pelo magistrado, utilizamo-nos, das palavras de Tornaghi105. A grande aspiração do jurista, sobretudo em matéria criminal, é a justiça. O juiz, mais que qualquer outra pessoa, é quem a realiza. Isso, entretanto, não é fácil. Julgar não é apenas tarefa de ciência nem somente de arte, mas de religião, de execução de uma obra que só Deus pode efetuar perfeitamente. O 'juízo é de Deus', está dito no Deuteronômio (I 17). 'Que homem é suficientemente Deus para julgar outro?'. Uma coisa é certa: a missão do juiz é sobrehumana e ultrapassa os limites deste mundo. É, na verdade, uma tarefa religiosa. De todos os encargos cometidos às pobres criaturas, o mais difícil e mais espinhoso, o de maior responsabilidade moral, é o do juiz. Não lhe basta avaliar um fato, 105 TORNAGHI, Hélio. Curso de Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 1980. 1v. p. 272. 52 o que já não seria pouco; incumbe-lhe penetrar no mais íntimo da alma, revolver os profundos e obscuros escaninhos da mente, por vezes não apenas sombrios, mas tenebrosos; importa-lhe conhecer e ponderar as taras e os defeitos herdados ao acusado pelos ancestrais; o temperamento e o caráter; as emoções, as paixões e tudo que pode influir na inteligência e na vontade; tem de fazer a síntese desses dados para chegar a uma noção sobre a personalidade. E ainda assim não pode estar seguro de haver conhecido o homem, o grau de liberdade interior com que agiu e, conseqüentemente a medida da responsabilidade. Assim, conseguimos esclarecer o porquê do valor probatório, da prova como subsídio para a fundamentação de convicção e decisão do juiz ao prolatar a decisão. Pois para emiti-la, ele deverá ser valer de seus conhecimentos, e acima de tudo do seu poder de julgar, promovendo com segurança a prestação jurisdicional do Estado Democrático de Direito e agindo sob lastro da justiça. 3.3 OS PODERES INTRUTÓRIOS DO MAGISTRADO O nosso processo é basicamente um processo que promove a desigualdade entre as partes, eis que à acusação são conferidas uma série de prerrogativas, que não são conferidas ao acusado, bem como há uma série de dispositivos, que atribuem poderes instrutórios ao Juiz ou até mesmo a possibilidade de praticar atos tipicamente da parte acusadora. Com efeito, conforme já foi mencionado, exemplo disto é o famigerado artigo 156 do CPP, que possibilita ao Juiz a produção de provas; ou, ainda, os artigos 311, 242, 127, 209 e 196 que permitem que o Juiz determine de ofício, respectivamente: a prisão preventiva, busca e apreensão, o seqüestro, a oitiva de testemunhas além das indicadas pelas partes e o interrogatório do réu a qualquer tempo. Assim, resta claro que o papel das partes é quase inexistente, pois suas alegações só ganham respaldo probatório se o Juiz entendê-las pertinentes, eis que, ante a atribuição de poderes instrutórios ao Juiz, 53 ele se torna o “senhor do processo” e passa a conduzir a produção de provas de acordo com as suas convicções, isto é, o magistrado se influencia na interpretação do direito e da vida social, tendendo a atribuir a veste de ‘criminoso’ àqueles que são estigmatizados, sendo que esta atribuição não ocorre somente a partir da subsunção dos fatos a uma figura abstrata do direito penal, mas também conforme as regras tomadas no seu sentido objetivo106. Assim, o Juiz se vê como aquele que, sozinho, deve acertar o caso penal, tendo como premissa a busca pela verdade, seja a verdade material ou a verdade formal, pois, de qualquer forma, a verdade, na sua totalidade, é inatingível e, para tanto, ele faz uso dos meios que lhe são oferecidos em lei, como o domínio da gestão das provas, os quais fulminam a possibilidade de um processo democrático107. Desta forma entende Coutinho108: Compreende-se, então, quão solitário e penoso (porque angustiante) é o labor do juiz, ciente de que deve chegar à verdade pelos caminhos que escolher. O crime (...) é dado histórico e à realidade apresenta-se multifário, razão pela qual, para reconstituí-lo – senão de forma absoluta (porque impossível), mas ao menos aceitável – seria conveniente e lógico verificar cada um dos aspectos, pelo menos os principais. A lógica deformada do sistema, porém, não o permite, porque privilegia o mecanismo “natural” do pensamento da civilização ocidental (e aí seu grande valor estratégico e, talvez, o motivo da sua manutenção até hoje), ou seja, a lógica dedutiva, que deixa ao inquisidor a escolha da premissa maior, razão pela qual pode decidir antes e, depois, buscar, quiçá obsessivamente, a prova necessária para justificar a decisão. Estamos diante daquilo de Cordero, com genialidade, chamou de primatto dell’ipotesi sui fatti: o ponto central do sistema e sem o qual não possível compreendê-lo na essência. Por isto que, partindo de premissa 106 BORGES, Clara Maria Roman. Processo Penal e Tortura. Jornal Estado do Paraná, Curitiba, 21 de agosto de 2005. Caderno Direito e Justiça. p. 09. 107 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Glosas ao “Verdade, Dúvida e Certeza”, de Francesco Carnelutti, para os operadores do direito. Revista de Estudos Criminais, Porto Alegre, a. 4, n. 14, p. 81, 2004 108 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. O papel do novo juiz no processo penal. Crítica à Teoria Geral do Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 25-26. 54 falsa, não poucas vezes assentada em um lugar comum (do gato preto induz-se bruxaria; do funcionário da empresa o autor do seqüestro; do mordomo o homicida, e assim por diante), chegase a uma conclusão também falsa, transmudada em verdade constituída. Ao Juiz, é dado o poder de livre apreciação das provas para que este venha a formar a sua livre convicção, individualizada e fundamentada, através da qual ele irá exteriorizá-la, para proferir decisão, descrevendo todos os motivos, a que este chegou, para tomar tal decisão. O livre convencimento, a livre convicção, ou a persuasão racional, são sistemas vigentes nos sistemas processuais contemporâneos, nas palavras de Bacila109: Este sistema não contém regras abstratas de valoração das provas. O julgador pode ter preferência pelas provas que entender cabíveis ao caso. Não está preso em critérios fixos, mas, por outro lado, a opção não é isenta de fundamentação ‘racional’. É um sistema intermediário entre a prova legal e a íntima convicção. Neste sistema, o Juiz possui liberdade de apreciação da prova, mas tem o dever de fundamentar sua decisão com base somente nos elementos que fazem parte dos autos. “O Juiz deve pesar o valor das provas segundo aquilo que lhe pareça a melhor solução, devendo, porém, explicitar os motivos que o levaram a tal decisão.” 110 Assim, o livre convencimento não é absoluto, eis que ele é limitado pelo dever de motivação da decisão. Ademais, há outros limites ao livre convencimento que deveriam ser respeitados, como o embasamento da convicção do julgador, somente em provas produzidas, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, isto resultaria na impossibilidade de motivação com base em provas produzidas no inquérito policial brasileiro, por exemplo. 109 BACILA, Carlos Roberto. Os Princípios de Avaliação das Provas no Processo Penal e as Garantias Fundamentais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 102-103. 110 HARTMANN, Érica de Oliveira. Os sistemas de avaliação da prova e o processo penal brasileiro. Revista da Universidade Federal do Paraná. p. 115. 55 Este é ó sistema adotado pelo Código de Processo Penal Brasileiro, no artigo 155, que estabelece: “O Juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova”. Todavia note-se que a necessidade de motivação da sentença é prevista expressamente na lei processual penal, no artigo 381, III. Estes dispositivos devem ser analisados sob o prisma do artigo 93, IX da Constituição Federal, que prevê que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público o exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes.” Desta forma, o princípio da motivação das decisões de apresenta como uma garantia política, de controle do povo sobre as decisões judiciais, mas também de uma garantia processual (endoprocessual), que assegura a ampla transparência no exercício do poder jurisdicional e garante às partes o acesso às razões da decisão, permitindo-lhes plena impugnação. 111 Ademais, deve-se ter em mente que: A motivação (...) está relacionada com a justificação da decisão: ela é um discurso justificativo da decisão judicial. Ela não só compreende a indicação dos motivos que levaram a tal decisão, mas também, e, sobretudo, a explicitação das razões que justificam a escolha realizada. A motivação, enquanto justificação presta-se a demonstrar a justiça e a racionalidade da decisão. 112 No entanto, deve-se reconhecer que este princípio/garantia constitucional da imprescindibilidade de motivação das decisões judiciais pode ser manipulado pelo julgador, o que de fato ocorre com muita freqüência. 111 HARTMANN, Érica de Oliveira. A motivação das decisões penais e a garantia do artigo 93, IX, da Constituição da República. Revista da Universidade Federal do Paraná. Porto Alegre: Síntese, v. 38. p 133, 2003. 112 HARTMANN, Érica de Oliveira. A motivação das decisões penais e a garantia do artigo 93, IX, da Constituição da República. p. 134-135. 56 3.4 TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA Chegando ao final deste trabalho, temos por dever abordar a questão das provas ilícitas por derivação, chamada de Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada. Num primeiro momento devemos analisar o art. 157, §1º do nosso Código de Processo Penal, “são também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas (...)”. Assim nesta derivação, de não somente não aceitar as provas ilícitas, mas também não aceitar as provas advindas da mesma. Neste ponto, advindo do Direito Norte Americano, surge essa teoria, conhecida por Fruits of the Poisinous Tree.113 A propósito, Marco Antônio Garcia de Pinho114 afirma que: A questão das provas ilícitas por derivação, isto é, aquelas provas e matérias processualmente válidas, mas angariadas a partir de uma prova ilicitamente obtida é, sem dúvida, uma das mais tormentosas na doutrina e jurisprudência. Trata-se da prova que, conquanto isoladamente considerada possa ser lícita, decorra de informações provenientes da prova ilícita. Nesse caso, hoje, nossos tribunais vêm tomando por base a solução da Fruits of the Poisonous Tree, adotada pela US Supreme Court. Esse entendimento, na doutrina pátria, é adotado, dentre outros autores, por Grinover e Gomes Filho. Já Avolio, também tratando com maestria sobre o assunto, concluiu não ser possível a utilização das provas ilícitas por derivação no nosso direito pátrio. Há pouco mais de dez anos, em maio de 1996, o STF confirmou sua posição quanto à inadmissibilidade das provas derivadas das ilícitas, posicionamento, hoje, ainda mais pacífico tendo à frente a ministra Ellen Gracie e os ministros como Gilmar Mendes, Peluzo e Joaquim Barbosa. A prova ilícita por derivação se trata da prova lícita em si mesma, mas cuja produção decorreu ou derivou de outra prova, tida por ilícita. Assim, a prova originária, ilícita, 113 114 MENDONÇA, Andrey Borges de. Reforma do Código de Processo Penal. p. 172. PINHO, Marco Antonio de. Breve ensaio das provas ilícitas e ilegítimas no direito processual penal. Disponível em http://ultimainstancia.uol.com.br/ensaios/ler_noticia.php?idNoticia=34917#13. Acesso em 10 out. 2008. 57 contamina a prova derivada, tornando-a também ilícita. É tradicional a doutrina cunhada pela Suprema Corte norteamericana dos “Frutos da Árvore Envenenada” — Fruits of the Poisonous Tree — que explica adequadamente a proibição da prova ilícita por derivação. Assim, em questão ao que diz respeito à chamada prova ilícita por derivação, ela ocorreria nos casos em que à prova, mesmo lícita, deriva de outra obtida ilicitamente, isto é, provas que são lícitas em si mesmas, mas que são oriundas de alguma informação extraída de outra ilicitamente colhida. Neste ponto é valido transcrever, o conceito de prova ilícita apresentado no primeiro capítulo deste trabalho, onde são aquelas provas colhidas com infringência às normas ou princípios colocados pela Constituição e por leis. Cumpre destacar os ensinamentos de Luiz Flávio Gomes115 Especificamente, a teoria dos frutos envenenados repreende a obtenção de provas ilícitas por derivação. Esta prova contamina as provas subseqüentes, por efeito de repercussão causal, o efeito é a nulidade do processo penal, eis que jamais se admite condenar o agente da infração penal sem observar as garantias constitucionais. As provas, portanto, derivadas das ilícitas, serão consideradas vedadas, uma vez que segundo a teoria, a prova ilícita por derivação contaminaria todo o processo. Para um entendimento prático, vejamos o seguinte: Pela limitação da fonte independente, a ilicitude da prova fica afastada se demonstrar que a prova não é decorrente da prova ilícita, ou seja, se comprovado que não há nexo de causa e efeito com a prova ilícita. Deverá o magistrado verificar se a prova é originada ou não de fonte independente da prova ilícita. No caso 115 GOMES, Luiz Flavio. Que se entende pela teoria dos frutos da árvore envenenada. Disponível em http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080908113236726&query=enad. Acesso em 07 out. 2008. 58 Bynum v. U.S (1960), um acusado fora preso ilegalmente e, nesta oportunidade, foram tiradas suas impressões digitais, que demonstravam o seu envolvimento com o delito de roubo investigado. Em razão disso a prova foi considerada ilícita, por derivar-se da prisão ilegal. No entanto, em um segundo julgamento, foram juntadas novas impressões digitais para comparação, mas obtidas de um acervo mais antigo do FBI, sem nenhuma vinculação com a anterior detenção ilegal. Nesta situação, a Suprema Corte entendeu válida a prova neste segundo julgamento, por ser independente da prova ilícita anterior.116 È valido ressaltar da atenção do magistrado, para analisar neste momento quais os limites da prova ilícita por derivação, ou seja, quando é possível afirmar que uma prova não é contaminada por outra. Da mesma forma, quanto às provas ilícitas por derivação, conforme demonstrado, devem ser avaliadas para que seja analisada a admissibilidade ou não no processo. O Supremo Tribunal Federal, embora ainda exista divergência entre seus Ministros, acolheu expressamente a teoria das provas ilícitas por derivação utilizando-se da doutrina norte-americana: É ilícita a prova produzida mediante escuta telefônica autorizada por magistrado, antes do advento da Lei nº. 9.296, de 24.07.96, que regulamentou o art. 5º, XII, da Constituição Federal; são igualmente ilícitas, por contaminação, as dela decorrentes: aplicação da doutrina norte-americana dos "frutos da árvore venenosa". Inexistência de prova autônoma. Precedente do Plenário: HC nº. 72.588-1-PB. Habeas-corpus conhecido e deferido por empate na votação (RI-STF, art.150, § 3º), para anular o processo ab initio, inclusive a denúncia, e determinar a expedição de alvará de soltura em favor do paciente117. Assim, o Supremo decidiu com base na teoria, que a decretação de invalidade das provas ilícitas legitimamente obtidas constantes dos 116 117 MENDONÇA, Andrey Borges de. Reforma do Código de Processo Penal. p. 174. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Processual Penal. Hábeas Corpus. Constrangimento Ilegal. Hábeas Corpus nº.74116, Tribunal de Justiça de São Paulo, Brasília, DF. 2ª Turma de Recurso.Rel. para o acórdão Min. Maurício Corrêa, DJU de 14 mar. 1997. P. 06903 59 autos tornou-se impossível, porque foram conquistadas através de outras provas inquinadas pelo vício da ilegalidade. Podemos dizer ainda que essa teoria, para grande parte dos doutrinadores, está incorporada à regra de exclusão, sendo acessória do inciso LVI, art. 5º da CRFB/88. É dizer, o vício que macula essencialmente o principal objeto probatório, transmite-se aos demais dele resultantes. Luiz Flávio Gomes118, assim ensina: A CRFB/88, no art. 5.º, LVI, somente seria aplicável às provas ilícitas ou ilícitas e ilegítimas ao mesmo tempo, ou seja, não se aplicaria para as provas (exclusivamente) ilegítimas. Para esta última valeria o sistema da nulidade, enquanto para as primeiras vigoraria o sistema da inadmissibilidade. Ambas as provas (ilícitas ou ilegítimas), em princípio, não valem (há exceções, como veremos), mas os sistemas seriam distintos. Essa doutrina já não pode ser acolhida (diante da nova regulamentação legal do assunto). Quando o art. 157 (do CPP) fala em violação a normas constitucionais ou legais, não distingue se a norma legal é material ou processual. Qualquer violação ao devido processo legal, em síntese, conduz à ilicitude da prova (cf. Mendes, Gilmar Ferreira et all, Curso de Direito constitucional, São Paulo: Saraiva: 2007, p. 604-605, que sublinham: “A obtenção de provas sem a observância das garantias previstas na ordem constitucional ou em contrariedade ao disposto em normas fundamentais de procedimento configurará afronta ao princípio do devido processo legal”). Paralelamente às normas constitucionais e legais existem também as normas internacionais (previstas em tratados de direitos humanos). Por exemplo: Convenção Americana sobre Direitos Humanos. No seu art. 8.º ela cuida de uma série (enorme) de garantias. Provas colhidas com violação dessas garantias são provas que colidem com o devido processo legal. Logo, são obtidas de forma ilícita. Uma das garantias previstas no art. 8º diz respeito à necessidade de o réu se comunicar livre e reservadamente com seu advogado. Caso essa garantia não seja observada no momento da obtenção da prova (depoimento de uma testemunha, v.g.), não há dúvida que se 118 GOMES, Luiz Flávio. Lei 11.690/2008 e provas ilícitas: conceito e inadmissibilidade. Disponível em http://www.parana-online.com.br/canal/direito-e-justica/news/309964/.Acesso em 05 out. 2008. 60 trata de uma prova ilícita (porque violadora de uma garantia processual prevista na citada Convenção). Não importa, como se vê, se a norma violada é constitucional ou internacional ou legal, se material ou processual: caso venha a prova a ser obtida em violação a qualquer uma dessas normas, não há como deixar de concluir pela sua ilicitude (que conduz, automaticamente, ao sistema da inadmissibilidade). A Constituição Federal, bem como o Código de Processo Penal, prevêem a garantia da pessoa humana, amparados no princípio in dubio pro reo, no sentido de inadmitir as provas ilícitas por derivação, dando a chance de liberdade ao acusado. Por fim, observou-se neste capítulo que, o ônus da prova incumbe a quem alega, e que no âmbito do Processo não ocorre uma inversão deste ônus. Observou-se ainda que a decisão tomada pelo julgador, deverá ter a base em suas convicções, e sempre será condicionada a sua devida fundamentação legal. Ao final estudou-se a teoria fruit of the poisonous tree sendo a única capaz de dar eficácia à garantia constitucional da inadmissibilidade da derivação da prova ilícita, proporcionando ao magistrado agir dentro do devido processo legal. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho teve como objetivo, o estudo geral do instituto da prova no processo penal brasileiro. Foi abordado o tema destacando seus aspectos históricos, bem como seu conceito até sua classificação e especiais particularidades. No primeiro capítulo a prova foi avaliada em seu sentido mais clássico, ou seja, como meio através do qual o julgador se busca demonstrar a verdade dos fatos, fazendo com que, ele se convença ou não da existência do fato que procurou ser demonstrado. Constatou-se ainda que, a prova é um instrumento do qual o Juiz se utiliza para formar seu livre convencimento acerca da ocorrência ou não dos fatos controvertidos no processo. Em uma breve retrospectiva histórica, observou-se que o Direito Penal surgiu com o Homem através do desenvolvimento da razão e que até os povos mais antigos, mesmo aqueles de civilização mais rudimentar, possuíam certa noção de prova. Ainda na busca de esclarecer os pontos mais importantes acerca da prova, constatou-se que ela se divide em várias categorias, que comprovaram que o processo penal brasileiro prima pela busca da verdade real, com a reconstrução dos fatos, e para isso estabelece regras que evitam a má-fé de partes mal intencionadas, restringindo assim limites a produção probatória e fornecendo ao processo as devidas garantias constitucionais. No segundo capítulo para um aprendizado mais aprofundado as provas foram divididas em três espécies, tais como a prova testemunhal, documental e pericial. Notou-se as peculiaridades de cada tipo, partindo de seus conceitos e observando-as na prática. Constatou-se que as provas são muito importantes para o processo, desde que apresentem um considerável grau de confiabilidade, grau esse que deverá ser comprovado através de determinados tipos de prova. Ficou comprovado ainda, que a atividade probatória realizada em conformidade com o processo penal visa aproveitar qualquer fato útil à apuração da Verdade Real, se valendo de documentos, testemunhas e exames para a possível identificação dos fatos. 62 No terceiro e último capítulo foi possível esclarecer principais aspectos da prova, demonstrando e conceituando o ônus da prova e sua inversão, assim como pudemos observar o seu real valor no processo penal, bem como o papel do magistrado diante do processo. Através do art. 156 do Código de Processo Penal observou-se que o ônus da prova é de quem alega, e a lei atribui ao Réu à responsabilidade de provar o erro das alegações do Autor, todavia, com o intuito de não ferir o princípio constitucional, no processo penal essa inversão não será válida, uma vez que ninguém deverá ser acusado de um delito até que se prove o contrário. Comprovou-se ainda que, sendo o processo o instrumento utilizado pela justiça para determinar a culpabilidade de uma pessoa suspeita da prática de uma infração penal, a sua essência é exatamente a atividade probatória, trazendo assim o valor e a importância da prova para o processo. E a partir desse valor probatório o Juiz terá liberdade de apreciação da prova, mas terá o dever de fundamentar sua decisão com base nos elementos que fazem parte dos autos, formando a partir daí sua convicção. Por fim, foi abordado ainda a hipótese da derivação da prova ilícita através da teoria dos frutos da árvore envenenada, que restou comprovada não ser aceita no processo, uma vez que essa prova deriva de um ato ilícito. Assim, diante da pesquisa elaborada faz-se necessário comentar as hipóteses levantadas na introdução deste trabalho, que possibilitou confecção do mesmo. Restou demonstrada que, é necessária a produção de provas no processo, pois só assim o fato alegado poderá ou não ser comprovado, só através das provas que se poderá alegar a veracidade dos fatos que concorreram para a formação de um eventual crime. Apesar da produção de provas ser imprescindível para a alegação do fato, nem todas as provas poderão ser aceitas, a lei não permite e não admite qualquer prova que tenha sido obtida ilegalmente, bem como não irá aceitar também as provas obtidas derivadas das ilegais. 63 Comprovou-se ainda, que cada prova produzida terá sua importância no processo, porém umas terão valores maiores que as outras, pois advém de fontes seguras e exames técnicos. A função do magistrado no processo será de formar sua convicção, e ele é quem dirá que o fato alegado restou comprovado ou não, através do livre convencimento, com uma ressalva, de que sua decisão sempre deverá ser devidamente fundamentada. Faze-se oportuno mencionar ainda que as dificuldades na elaboração do presente trabalho foram muitas, porém, a satisfação em realizá-lo foi muito grande tendo em vista que o processo penal e mais precisamente a prova são temas de enorme importância dentro de nosso ordenamento jurídico. 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