Introdução e apresentação geral do metabolismo da glicose; Rui Fontes Introdução e apresentação geral do metabolismo da glicose Índice 1- O transporte transmembranar e a fosforilação da glicose .............................................................................1 2- A glicólise e a oxidação da glicose a CO2 ....................................................................................................1 3- A oxidação da glicose-6-fosfato pelo NADP+ e a via das pentoses-fosfato .................................................2 4- A conversão da glicose-6-fosfato em UDP-glicose e a síntese de glicogénio ..............................................2 5- Outros destinos metabólicos da UDP-glicose: UDP-glicuronato, UDP-xilose e UDP-galactose ................2 6- Outros destinos metabólicos da frutose-6-fosfato: UDP-N-acetil-glicosamina, UDP-N-acetilgalactosamina, CMP-N-acetil-neuramínico, GDP-manose e GDP-fucose. .........................................................2 7- A síntese de frutose nas vesículas seminais..................................................................................................2 8- A gliconeogénese e a conversão de glicose-6-fosfato em glicose ................................................................3 9- Na via da glicogenólise hepática também há conversão de glicose-6-fosfato em glicose............................3 10- O destino metabólico da frutose e da galactose da dieta ..........................................................................3 Antes de começar a estudar vias específicas do metabolismo da glicose pode ser útil ter uma visão geral dos diferentes destinos metabólicos da glicose. No entanto, um texto escrito com o objetivo de sumariar estes destinos tem limitações de rigor que só uma explicação pormenorizada de cada uma das vias metabólicas pode colmatar. 1- O transporte transmembranar e a fosforilação da glicose O transporte transmembranar de glicose é, na maioria das células, catalisada por ação de uniportes que se designam por GLUTs. Na maioria dos casos, o processo ocorre no sentido da entrada da glicose para dentro das células porque a glicose que entra é imediatamente fosforilada por ação catalítica de hexocínases (em diferentes tecidos diversas isoenzimas; ver Equação 1) o que cria, na glicose, um gradiente de concentrações transmembranar. A glicose-6-fosfato formada tem vários destinos possíveis e a relevância relativa de cada um deles depende do tipo celular em questão e também do estado metabólico do organismo. Equação 1 glicose + ATP → glicose-6-fosfato + ADP 2- A glicólise e a oxidação da glicose a CO2 Um dos destinos maioritários da glicose-6-fosfafo, e que ocorre em todas as células do organismo, é a sua conversão em frutose-6-fosfato por ação da isomérase das hexoses (Equação 2). Esta reação dá início a uma via metabólica designada por glicólise. Na glicólise, a frutose-6-fosfato vai sofrer a ação sequenciada de várias enzimas até que se converte em piruvato. O processo glicolítico é exergónico e oxidativo: concomitantemente com a conversão de uma molécula de glicose em duas de piruvato ocorre a redução de duas moléculas de NAD+ a NADH e também a fosforilação de duas moléculas de ADP que se convertem em ATP. A equação soma que descreve este processo é a Equação 3. Equação 2 Equação 3 glicose-6-fosfato ↔ frutose-6-fosfato glicose + 2NAD+ + 2ADP + 2Pi → 2 piruvato + 2NADH + 2ATP + 2H2O Um dos destinos possíveis do piruvato é ser reduzido pelo NADH a lactato (por ação da desidrogénase do lactato); quando isto acontece a via metabólica que começa numa molécula de glicose e termina com a formação de duas moléculas de lactato designa-se por glicólise anaeróbica. A equação soma que descreve a cisão da glicose na glicólise anaeróbica é a Equação 4. Equação 4 glicose + 2ADP + 2Pi → 2 lactato + 2ATP + 2H2O Página 1 de 5 Introdução e apresentação geral do metabolismo da glicose; Rui Fontes Se pensarmos no organismo como um todo o destino mais relevante do piruvato não é a sua conversão em lactato, mas sim a sua oxidação pelo NAD+ a acetil-CoA por ação da desidrogénase do piruvato (ver Equação 5). O resíduo acetilo do acetil-CoA é oxidado a CO2 por ação das enzimas do ciclo de Krebs e também aqui ocorre redução de NAD+ a NADH (ver Equação 6). Em última análise, os eletrões que foram sendo transferidos da glicose para o NAD+ originando o NADH acabam por reduzir o O2 a água por ação das enzimas da cadeia respiratória mitocondrial. O processo global de oxidação da glicose pelo O2 é um processo exergónico que liberta energia utilizada na fosforilação do ADP a ATP. (No ciclo de Krebs também há redução do grupo prostético da desidrogénase do succinato, o FAD; na cadeia respiratória dois eletrões do FADH2 formado acabam por reduzir o oxigénio regenerando FAD). Equação 5 Equação 6 piruvato + CoA + NAD+ → acetil-CoA + CO2 + NADH Acetil-CoA + 2 H2O + 3 NAD+ + FAD + ADP + Pi → 2 CO2 + CoA + 3 NADH + FADH2 + ATP 3- A oxidação da glicose-6-fosfato pelo NADP+ e a via das pentoses-fosfato Para além da via glicolítica, a glicose-6-fosfato pode seguir uma outra via oxidativa quantitativamente minoritária e que só ocorre em algumas células do organismo: a via das pentosesfosfato. Neste caso, a enzima que interage diretamente com a glicose-6-fosfato é a desidrogénase da glicose-6-fosfato (ver Equação 7) e o agente oxidante é o NADP+ (que se reduz a NADPH). Na via das pentoses-fosfato a glicose é oxidada a CO2 pelo NADP+ (que se reduz a NADPH) e é também nesta via que se forma a ribose-5-fosfato, um composto que participa na síntese endógena de nucleotídeos. Equação 7 glicose-6-fosfato + NADP+ → 6-fosfogliconolactona + NADPH 4- A conversão da glicose-6-fosfato em UDP-glicose e a síntese de glicogénio A seguir a uma refeição que contenha glicose a concentração de glicogénio aumenta nas células. O glicogénio é um polímero de glicose que constitui uma substância de reserva convertendo-se de novo em glicose no intervalo entre refeições. Na glicogénese (a via de conversão da glicose em glicogénio) a enzima que interage diretamente com a glicose-6-fosfato é a fosfoglicomútase, uma isomérase que leva à formação de glicose-1-fosfato (ver Equação 8). Na reação seguinte a glicose-1-fosfato converte-se em UDP-glicose que é o substrato dador de resíduos de glicose na síntese do glicogénio. Neste processo, a síntase do glicogénio é a enzima que interage diretamente com a UDP-glicose. Equação 8 glicose-6-fosfato ↔ glicose-1-fosfato 5- Outros destinos metabólicos da UDP-glicose: UDP-glicuronato, UDP-xilose e UDP-galactose Para além de ser substrato da síntase do glicogénio, a UDP-glicose também é substrato de outras duas enzimas: a desidrogénase da UDP-glicose que leva à formação de UDP-glicuronato e a epimérase da UDP-glicose que leva à formação de UDP-galactose. Por ação de uma descarboxilase a UDPglicuronato converte-se em UDP-xilose. Em termos quantitativos estas conversões da glicose em UDPglicuronato, UDP-xilose e UDP-galactose são processos minoritários. 6- Outros destinos metabólicos da frutose-6-fosfato: UDP-N-acetil-glicosamina, UDP-N-acetilgalactosamina, CMP-N-acetil-neuramínico, GDP-manose e GDP-fucose. Outros processos que também são quantitativamente minoritários são as vias de conversão da frutose-6-fosfato (um intermediário da glicólise que se origina na glicose-6-fosfato; ver Equação 2) em UDP-N-acetil-glicosamina, UDP-N-acetil-galactosamina, CMP-N-acetil-neuramínico, GDP-manose e GDP-fucose. 7- A síntese de frutose nas vesículas seminais Na realidade, a cínase da glicose não é a única enzima que interage diretamente com a glicose. Embora só tenha relevância nas vesículas seminais existe uma outra enzima que também tem a glicose como um dos substratos: a redútase das aldoses. A redútase das aldoses (ver Equação 9) catalisa a redução da glicose ao poliálcool correspondente (sorbitol) sendo este o primeiro passo da conversão de glicose na frutose que está presente no sémen. Página 2 de 5 Introdução e apresentação geral do metabolismo da glicose; Rui Fontes Equação 9 glicose + NADPH ↔ sorbitol + NADP+ 8- A gliconeogénese e a conversão de glicose-6-fosfato em glicose Não existe nenhuma condição metabólica em que o organismo não esteja a oxidar glicose a CO2. Mesmo se jejuarmos durante vários dias uma parte substancial do ATP “gasto” pelo cérebro contínua a ser sintetizado por processos que envolvem a energia libertada na oxidação da glicose nos neurónios. Porque nestas condições já não existe glicogénio no organismo, toda a glicose formada resulta de um conjunto de processos que permitem a conversão de várias substâncias (como aminoácidos, glicerol e lactato) em glicose e que se designam coletivamente por gliconeogénese 1 . Os passos metabólicos e as enzimas que são relevantes na conversão de um determinado precursor da gliconeogénese em glicose variam com o precursor, mas existem vários passos que são comuns. A gliconeogénese só ocorre em dois órgãos (o fígado e o rim) porque é nestes órgãos que existe uma enzima indispensável à formação de glicose: a glicose-6-fosfátase (ver Equação 10). Equação 10 glicose-6-fosfato + H2O → glicose + Pi Assim, a par com a isomérase das hexoses (Equação 2), com a desidrogénase da glicose-6-fosfato (ver Equação 7) e com a fosfoglicomútase (ver Equação 8), a glicose-6-fosfátase é uma outra enzima que tem como um dos seus substratos a glicose-6-fosfato. 9- Na via da glicogenólise hepática também há conversão de glicose-6-fosfato em glicose Num jejum que dura há poucas horas, a maioria das moléculas de glicose que estão a ser libertadas para o sangue (e a ser oxidadas pelas células) provêm maioritariamente do fígado e resultam da degradação do glicogénio. A via metabólica em que os resíduos de glicose do glicogénio acabam por se converter em glicose livre designa-se de glicogenólise. O último passo é comum à gliconeogénese; ou seja, envolve a ação catalítica da glicose-6-fosfátase (ver Equação 10). 10- O destino metabólico da frutose e da galactose da dieta A frutose e a galactose são nutrientes que são absorvidos quando a sacarose e a lactose fazem parte da dieta. As vias metabólicas pertinentes iniciam-se com a fosforilação destes monossacarídeos no carbono 1 por ação catalítica de cínases específicas: a cínase da frutose (ver Equação 11) e a cínase da galactose (ver Equação 12). Quer a frutose-1-fosfato quer a galactose-1-fosfato podem, em vias específicas, gerar glicose-6-fosfato e, portanto (ver Equação 10) contribuir para a síntese endógena de glicose. Equação 11 Equação 12 frutose + ATP → frutose-1-fosfato + ADP galactose + ATP → galactose-1-fosfato + ADP 1 Embora a relevância metabólica da gliconeogénese seja mais fácil de entender se o indivíduo estiver em jejum, de facto, a gliconeogénese é um processo que existe em todas as condições metabólicas. 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