ASSISTÊNCIA AO PUERPÉRIO E ESTADO FEBRIL PUERPERAL Dra.Márcia S.Sousa Coord.Clinica Ginecológica Chefe de Centro Obstétrico HU-UFMA Puérpera (latim puerperae) adj. f. s. f. Diz-se de mulher que deu à luz muito recentemente Puerpério Período cronologicamente variável, de âmbito impreciso durante o qual ocorre todo o processo involutivo das modificações fisiológicas da gravidez Início O puerpério inicia-se após a dequitação da placenta ou pela cessação de sua função endócrina nos casos de morte ovular (Vokaer, 1955; Rezende 1987) Divisão Divide-se em três etapas Puerpério imediato (1º ao 10º dia) Puerpério tardio (11º ao 45º dia) Puerpério remoto (após o 45º dia) Quanto tempo leva essa involução? Depende do vulto das transformações sofridas Da duração a gestação Da idade materna Da paridade Determinismo Biológico do Puerpério É regido por duas funções bem demarcadas: Crise genital Involução da musculatura uterina e da mucosa vaginal Recuperação genital Regeneração das mucosas uterina e vaginal Parto Normal Em outras palavras... Com a dequitação da placenta a mulher perde, subitamente, a sua fonte produtora de estrógenos, uma vez que os ovários tinham sua função bloqueada durante a gravidez, após cumprida a função do corpo lúteo A queda dos hormônios esteróides que inibiam o efeito da prolactina, aliada a uma liberação aumentada da prolactina como efeito da sucção, determina o início da lactação Por conta do hipoestrogenismo a puérpera irá experimentar um período de atrofia genital, denominado de "crise genital“, até que os ovários retornem a sua função endócrina plena, período variável e dependente do tempo de lactação Involução Uterina Manutenção da contractilidade uterina após a dequitação da placenta promoverá a involução do útero, bem como a hemóstase do sítio de inserção placentária (globo de segurança de Pinard), que será sucedido pela trombose local dos vasos (fase de trombotamponagem) Nas primeiras 24 horas o útero alcança a cicatriz umbilical, mantendo um dextrodesvio, e apresentando-se de consistência firme A involução far-se-á em ritmo irregular, a uma razão aproximada de 1 cm por dia, de modo que no 10º dia do puerpério já não será mais palpado acima da sínfise púbica, e seu peso que era de 1.000g estará reduzido a menos da metade, sendo que o processo de involução continuará por cerca de cinco a seis semanas Involução Uterina A cavidade uterina por sua vez sofre um processo de necrose e eliminação da decídua parietal, passando a regenerar-se pela proliferação do epitélio glandular, por ação estrogênica, após o 25º dia O sítio de inserção placentária será regenerado progressivamente a partir do endométrio vizinho por um período que se prolonga até o puerpério remoto Lóquios Ao fluxo genital decorrente da drenagem uterina puerperal denomina-se lóquios De início o fluxo é sangüíneo (lochia rubra) de volume variável, normalmente não ultrapassando o de um fluxo menstrual A partir do 5º dia de acastanhados (lochia fusca) puerpério tornam-se por volta do 10º dia tornando-se gradativamente serossangüíneos (lochia flava) E finalmente tornam-se apenas serosos (lochia alva) Lóquios O odor é característico e depende da flora vaginal da mulher, podendo tornar-se fétido quando da ocorrência de infecção Nas nutrizes ou nas mulheres submetidas à operação cesariana com limpeza abundante da cavidade uterina, os lóquios costumam ser de menor intensidade Colo uterino Imediatamente após o parto o colo apresenta-se com bordos edemaciados, limites imprecisos e com pequenas lacerações que terão resolução espontânea A regressão do diâmetro cervical é progressiva, e por volta do 10º dia já se apresenta impérvio, com orifício em fenda na maioria das mulheres que tiveram parto vaginal Colo Uterino Vagina No pós-parto imediato a vagina encontra-se edemaciada, congesta, e com grande relaxamento das paredes vaginais, alterações que regridem após os dois primeiros dias Ocorre nas primíparas, lacerações do hímen, que após carúnculas cicatrizado, constituirão as mirtiformes Vagina A alteração mais importante é a atrofia da mucosa vaginal resultante do hipoestrogenismo, é a crise vaginal, que inicia sua recuperação por volta do 25º dia, fato comum às que tiveram parto vaginal ou cesáreo O retorno do esfregaço vaginal à normalidade é individual e habitualmente retardado nas nutrizes Embora a rugosidade da mucosa retorne gradativamente, a redução da mesma é evidente a cada parto Vulva e Períneo Apresentam-se edemaciadas e congestas, retornando à normalidade rapidamente, lacerações pequenas são freqüentes e cicatrizam espontaneamente A ocorrência de botões hemorroidários é freqüente, pela congestão venosa e pela compressão do plexo hemorroidário provocado pela passagem do feto no canal de parto A regressão costuma ser espontânea Vulva e Períneo Aparelho Circulatório Nas primeiras horas e dias do puerpério, ocorre um aumento do débito cardíaco, provocado pela incorporação de 1.000 a 1.200 ml de sangue represado ao nível da pelve e membros inferiores O diafragma desce permitindo o desaparecimento da alcalose respiratória. e retorno do coração à sua posição original, e conseqüente normalização do seu eixo elétrico Diminui a pressão venosa dos membros inferiores, com conseqüente melhora das varizes e edemas A ausculta cardíaca tende a normalizar-se após o 10º dia, desaparecendo o sopro sistólico de hiperfluxo em foco mitral Aparelho Digestivo Com o retorno progressivo das vísceras abdominais ao seu sítio anatômico de origem, e a diminuição da ação progesterônica na musculatura lisa do tubo digestivo, diminui o peristaltismo, regredindo o quadro de obstipação freqüente durante a gestação O tempo de esvaziamento gástrico que se encontrava aumentado, tende a normalizar-se O relaxamento da musculatura abdominal e perineal, a episiotomia e hemorróidas, podem retardar a primeira evacuação pós-parto Nas pacientes submetidas a operação cesariana, a ocorrência temporária de íleo paralítico pode causar distensão,abdominal e obstipação por 48 ou 72 horas Aparelho Digestivo Aparelho urinário Nos primeiros dias de puerpério a bexiga puerperal fica com a capacidade aumentada e pode reter grandes volumes de urina, por conta do edema e lesões traumáticas do trígono vesical e da uretra Incontinência urinária devido a lesões traumáticas ou atonia esfincteriana pode ocorrer nos primeiros dias e raramente perpetuar-se A maior capacidade vesical, a retenção urinária, e a cateterização vesical predispõem à ocorrência de infecção nesse período A dilatação ureteral e sua posição anatômica tendem à normalidade num período de quatro a seis semanas Alterações Sanguíneas Na primeira semana do puerpério ocorre uma leucocitose que pode chegar a mais de 20.000 leucócitos, sem, contudo haver desvio à esquerda Os níveis de fibrinogênio e a quantidade de plaquetas elevam-se nas primeiras semanas, que associados a elevação do fator VIII ocorrido na gestação, e que persiste nesse período aumentam o risco de complicações tromboembólicas, embora haja um aumento da atividade fibrinolítica no período Desvio para a Esquerda? O que é mesmo isso??? Consiste no aparecimento de elementos situados à esquerda dos bastonetes; formas imaturas, bastões e metamielócitos O desvio será mais intenso quanto maior o número desses elementos imaturos no sangue periférico Aparece principalmente nos processos infecciosos agudos, geralmente indica início do processo Alterações Psíquicas A experiência da maternidade, o início da lactação, o manuseio do recém-nascido, a alteração do ritmo do sono, trazem alterações psíquicas que podem variar de crises de choro, crise depressiva, instabilidade emocional, até a um quadro patológico de psicose puerperal que exigirá atenção especializada Coloca-se aqui um peso ainda maior para a puérpera (a mulher que deu a luz), que se sente culpada por estar deprimida e não corresponder às expectativas de todos Como cuidamos de uma puérpera com puerpério normal? A puérpera necessita uma higiene correta e uma vigilância medica especial Apoio psicológico Apoio familiar Apoio jurídico A vigilância da puérpera significa observar os seguintes parâmetros: O controle da temperatura de manha e ao anoitecer – normalmente ela tem que oscilar em volta de 36,5 – 37,5o O controle do pulso (normal entre 50-70/minuto) ATENÇÃO ! O pulso acelerado, em ausência da febre... O controle da PA A altura do fundo do útero – ele tem que diminuir com 1 - 1,5 cm /dia, isto é, no 10º dia ele tem que voltar a ser um órgão pélvico ATENÇÂO aos lóquios!!! Anotar diário o volume, a cor, o odor A função excretora e o volume da urina, diário O transito intestinal – se a puérpera não evacuou em 48 horas ela vai receber um laxante leve. Se a puérpera sofreu episiotomia, ela vai receber dieta branda Tem que fazer asseio vulvo-perineal cada 12 horas, usando soluções anti-sépticas A dieta: tem que ser sem restrições Primeiro dia e segundo dia – alimentação branda: chá, leite, sucos,sopas,mingaus Terceiro dia passará já a uma alimentação normal Se a puérpera amamentar, ela tem que ter uma dieta rica em calorias Os seios – higiene adequada (lavar os seios antes e após as mamadas ou ordenhas) O leite é excelente meio de cultura agravando as fissuras do início do aleitamento Cada 3-4 horas tem que ser feita a evacuação do seio, para evitar a sobrecarga e manter a secreção do leite Se aparecerem rachaduras ou fissuras a amamentação deve ser feita com auxílio de bicos de silicone devidamente higienizados Morbidade Febril Puerperal É a temperatura de, no mínimo, 38ºC durante dois dias quaisquer, dos primeiros 10 dias pósparto, excluídas as 24 horas iniciais Infecção puerperal É aquela que se origina do aparelho genital após parto recente Há necessidade de complementar o conceito de infecção puerperal com o de morbidade febril puerperal, pela eventual dificuldade de caracterizar a infecção que ocorre após o parto Infecção Puerperal A infecção puerperal é polimicrobiana e os agentes etiopatogênicos são germes aeróbios e anaeróbios da flora do trato geniturinário e intestinal PRINCIPAIS BACTÉRIAS ENVOLVIDAS NA INFECÇÃO PUERPERAL Aeróbios Gram positivos ESTREPTOCOCOS Β HEMOLÍTICO DO GRUPO A S.pyogenes ESTREPTOCOCOS Β HEMOLÍTICO DO GRUPO B S.agalactieS.mastidistis Anaeróbios Gram positivos COCOS ANAERÓBICOS Peptococcus, Peptostreptococcus BACILOS ANAERÓBICOS C.perfringes, C.welchi ENTEROCOCOS S.faecalis, S.faecium ESTAFILOCOCOS S.aureus,S.epidermidis Gram negativos Gram negativos ENTEROBACTERIAS BACILOS ANAERÓBICOS E.colo,Klebsiella Enterobacter,Proteus Pseudomonas Haemophilus influenzae Gardnerella vaginalis B.fragilis, B.bivius Fusobacterium Outros Mycoplasma hominis Chlamydia trachomatis Infeccção Puerperal Principais fatores de risco: RPM e/ou trabalho de parto prolongados Desnutrição ou obesidade Manipulação vaginal excessiva (toques) Traumas cirúrgicos Más condições de assepsia Operação cesariana Debilidade imunológica Retenção de restos ovulares Infecção Puerperal Formas Clínicas Localizada Propagada Generalizada Vulvoperineal Miofascites Endomiometrite Peritonite Vaginite Salpingite Sepse Cervicite Anexite Sepse Endometrite Parede abdominal Parametrite Pelviperitonite Tromboflebite pélvica Choque séptico Diagnóstico diferencial da febre puerperal persistente Condição Teste diagnóstico Resistência bacteriana Cultura de secreção endometrial e sangue Infecção da incisão Exame físico, ultra-sonografia, aspiração com agulha, exploração cirúrgica Abscesso pélvico ou de parede Exame físico, US, TC, RM Tromboflebite pélvica séptica Predominantemente clínico US, TC, RM e teste terapêutico com heparina Mastite Exame físico Pielonefrite Exame físico, urina tipo I e urocultura HIV (+) Sorologia ,carga viral e CD4 Exames Laboratoriais Hemograma Hemocultura – deve se colher o material antes de começar a antibioticoterapia Urocultura _ pode ocorrer a bacterúria assintomática por enterobacteria US - é fundamental no diagnóstico de retenção de restos ovulares, abscessos e hematomas intracavitários e de parede abdominal CONDUTA Baseia-se na antibioticoterapia assim que o diagnóstico tenha sido estabelecido e os materiais para cultura colhidos Como a infecção é polimicrobiana, com bactérias aeróbicas e anaeróbicas proveniente da flora intestinal e genital a terapêutica antibiótica deve ser abrangente Esquema Terapêutico Esquema 1: Ampicilina, penicilina ou cefalotina associada a aminoglicosideo ( gentamicina ou amicacina) e metronidazol Esquema 2: Clindamicina em aminoglicosideo associação com Atenção!!! Em pacientes com função renal comprometida substituir o aminoglicosideo por cefalosporina de terceira geração (ceftriaxona) ou por aztreonam O esquema 1 é ineficaz contra estafilococos produtores de penicilase, neste caso deve se administrar medicação especifica (oxacilina, clindamicina ou vancomicina), na dependência do antiobiograma ou da gravidade do caso Atenção!!! Contra o enterococos a combinação 2 não é efetiva, deve se associar ampicilina ou penicilina Em endometrite não complicada, a antiobioticoterapia deve ser administrada até a paciente tornar-se afebril ou assintomática por pelo menos 48 h, podendo a paciente ser liberada para controle ambulatorial ANTIBIÓTICOS E DOSAGENS HABITUAIS EMPREGADOS NA INFECÇÃO PUERPERAL Agente Ampicilina Penicilina G cristalina Gentamicina Dose- Intervalo/Via de administração 1g a 2g cada6h/EV 4 milhões UI cada 4h/EV 1.5mg/Kg cada 8h/ Cada 24h/EV Amicacina 7.5mg/kg cada 12h/EV Aztreonam 2g cada 8h/EV Ceftriaxona 1g cada 12h/EV Metronidazol 500mg cada 8 h/EV Clindamicina 600mg cada 6h ou 900mg cada 8h/EV Profilaxia Cuidados de assepsia e anti-sepsia devem ser rigorosamente obedecidos Deve se recomendar administração profilática de antibiótico nos casos de partos prolongados, rotura de membranas há longo tempo e submetidas a toques excessivos Tem sido utilizado ampicilina e a cefalosporina durante o ato operatório e por mais 24-48 h., ou cloranfenicol- 2g até 48h. pós-parto Profilaxia Parto em local apropriado Ambiente humanizado Redução máxima do estress para mãe e concepto Obrigada! Thau!!