as medidas sócio-educativas no município de itajaí

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS
CURSO DE DIREITO
AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS NO MUNICÍPIO DE
ITAJAÍ: PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE E
LIBERDADE ASSISTIDA
GRAZYELLE CORADINI DA SILVA
Itajaí (SC), 19 de Novembro de 2009.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS
CURSO DE DIREITO
AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS NO MUNICÍPIO DE
ITAJAÍ: PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE E
LIBERDADE ASSISTIDA
GRAZYELLE CORADINI DA SILVA
Monografia submetida à Universidade
do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Direito.
Orientador: Professora Mestre Patrícia Elias Vieira
Itajaí (SC), 19 de Novembro de 2009.
AGRADECIMENTO
A Deus, pela perseverança e a força a mim confiadas
que sustentam a Fé em jamais desistir e sempre
acreditar.
À minha família e amigos, pelo inestimável apoio nas
horas de cansaço e ansiedade.
À minha orientadora, Professora e Mestre Patrícia
Elias Vieira, pela serenidade e conhecimento com que
conduziu este orientação.
À equipe do Programa de Medidas SócioEducativas em sua atual gestão, bem como à gestão
anterior, zelando sempre pela integridade e eficiência
do atendimento prestado.
DEDICATÓRIA
À minha mãe, Rosângela, presente de Deus que
me concede toda dedicação, ternura e
ensinamento.
A meu pai, Reginaldo, anjo da minha vida que
hoje, mesmo na dor de sua ausência, me faz ser
a continuidade de seu brilho.
Ao meu irmão, Thiago, companhia que me faz
forte.
A todas as crianças e adolescentes que,
independente da situação em que se encontram,
são merecedores da proteção integral.
De um modo geral, a todos aqueles que
contribuíram nesta longa caminhada acadêmica
de grandes conquistas e do conhecimento da
nobreza chamado Direito.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí (SC), 19 de Novembro de 2009.
Grazyelle Coradini da Silva
Graduanda
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Grazyelle Coradini da Silva, sob o
título
AS
MEDIDAS
SÓCIO-EDUCATIVAS
NO
MUNICÍPIO
DE
ITAJAÍ:
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE E LIBERDADE ASSISTIDA, foi
submetida em 19 de novembro de 2009 à banca examinadora composta pelos
seguintes professores: Mestre Patrícia Elias Vieira e Doutora Cláudia Regina
Althoff Figueiredo (examinadora), e aprovada com a nota [Nota] ([nota Extenso]).
Itajaí (SC), 19 de Novembro de 2009.
Professora Mestre Patrícia Elias Vieira
Orientadora e Presidente da Banca
Professor Mestre Antonio Augusto Lapa
Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACCT
AI
AP
Art.
Cap.
CAPS AD
CAPS I
CEJURPS
C. Esp.
CONANDA
CP
CPP
CRFB/88
DJ
DJU
ECA
ESG
FEBEM
FUNABEM
JTJ
L. A
LBA
Min.
n.
p.
PMSE
Publ.
Rel.
REsp.
RHC
RJTJESP
RS
RT
SAM
SC
SIC
SP
STJ
SUS
TJSP
UNICEF
Associação Catarinense de Conselhos Tutelares
Agravo de Instrumento
Apelação
Artigo
Capítulo
Centro de Apoio Psicossocial Anti Drogas
Centro de Atenção Psicossocial para Crianças e
Adolescentes
Centro de Ciências Jurídicas e Sociais
Câmara Especial
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente
Código Penal
Código de Processo Penal
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Diário da Justiça
Diário da Justiça da União
Estatuto da Criança e do Adolescente
Escola Superior de Guerra
Fundação Estadual de Bem-Estar do Menor
Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor
Julgados do Tribunal de Justiça
Liberdade Assistida
Legião Brasileira de Assistência
Ministro
Número
Página
Programa de Medidas Sócio-Educativas
Publicado
Relator
Recurso Especial
Recurso Ordinário em Habeas Corpus
Revista de Julgados do Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo
Rio Grande do Sul
Revista dos Tribunais
Serviço de Assistência ao Menor
Santa Catarina
Segundo informações do cliente
São Paulo
Superior Tribunal de Justiça
Sistema Único de Saúde
Tribunal de Justiça de São Paulo
Fundo das Nações Unidas para a Infância
UNIVALI
Universidade do Vale do Itajaí
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu
trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Adolescente
“Aquele entre doze e dezoito anos de idade”.1
Ato infracional
“Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção
penal”.2
Criança
“Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade
incompletos”.3
Doutrina da Proteção Integral
“[...] é a base configuradora do conjunto de princípios e normas jurídicas voltadas
à efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente, que traz em
sua essência a proteção e a garantia do pleno desenvolvimento humano
reconhecendo a condição peculiar de pessoas em desenvolvimento e a
articulação das responsabilidades entre a família, a sociedade e o Estado para a
sua realização por meio de políticas sociais públicas”.4
1
Art. 2°, parte final. BRASIL. Lei n° 8069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da
Criança
e
do
Adolescente
e
dá
outras
providências.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm>
2
Art. 103. BRASIL. Lei n° 8069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente
e
dá
outras
providências.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm>
3
Art. 2°, primeira parte. BRASIL. Lei n° 8069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da
Criança
e
do
Adolescente
e
dá
outras
providências.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm>
4
CUSTÓDIO, André Viana. A doutrina da proteção integral: da exploração do trabalho precoce
ao ócio criativo. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1642>
Acesso em 01 nov. 2009.
Liberdade Assistida
“Medida sócio-educativa que se destina a acompanhar, auxiliar e orientar o
adolescente, através de orientador nomeado pela autoridade judiciária que poderá
ser recomendado por entidade ou programa de atendimento, ou mesmo tratar-se
de técnico pertencente à equipe multidisciplinar do Juizado da Infância e
Juventude”.5
Medidas Sócio – Educativas
“Medida sócio-educativa adequada, portanto, é aquela cuja instrumentalidade
resultou evidenciada pela simbiose entre seus dois elementos constitutivos, ou
seja, entre o interesse juridicamente protegido de defesa da sociedade de atos
infracionais
e
o
não
menos
subordinante
interesse
em
interferir
no
desenvolvimento do jovem, através de ações pedagógicas, tendo como fito a
aquisição ou desenvolvimento de recursos pessoais e sociais que possibilitem os
mecanismos necessários para a superação das adversidades de forma lícita”.6
Prestação de Serviços à Comunidade
Medida sócio-educativa que “[...] consiste na realização de tarefas gratuitas de
interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades
assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem
como em programas comunitários ou governamentais”.7
Programa de Medidas Sócio – Educativas
“Implantado em março de 1998 pela Secretaria da Criança e do Adolescente tem
por finalidade executar as medidas sócio-educativas aplicadas aos adolescentes
pela autoridade competente, tais como Prestação de Serviços a Comunidade e
Liberdade Assistida, bem como proporcionar a estes e sua família, atividades
5
COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o Direito Penal juvenil: como limite na
aplicação da medida socioeducativa de internação. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p.
84.
6
PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e do adolescente e tutela jurisdicional
diferenciada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 113-114.
7
Art. 117. BRASIL. Lei n° 8069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente
e
dá
outras
providências.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm>
sócio-educativas que desenvolvam ação consciente e transformadora, buscando
melhoria de sua qualidade de vida”.8
Remissão Judicial
“O perdão do ato infracional praticado pelo adolescente”.9
8
Informações retiradas do Projeto Pedagógico – Programa de Medidas Sócio-Educativas –
Resgate a Cidadania.
9
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 7. ed:
Malheiros, 2003, p. 122.
SUMÁRIO
RESUMO ......................................................................................... XIII
INTRODUÇÃO ................................................................................... 1
CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 4
DIREITO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE ........................................... 4
1.1 A HISTÓRIA DO DIREITO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE NO BRASIL ......... 4
1.1.1 A CARTA RÉGIA DE 1639 E AS CASAS DE MISERICÓRDIA .................................... 4
1.1.2 OS MENORES E A ESCRAVIDÃO ......................................................................... 7
1.1.3 O JUIZADO DE MENORES ................................................................................ 12
1.1.4 O CÓDIGO DE MENORES ................................................................................. 13
1.1.5 A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DE 1988 .................................... 19
1.1.6 O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ................................................ 21
1.2 A DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E
DO ADOLESCENTE ............................................................................................. 22
1.3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE ................................................................................................... 29
1.3.1 O DIREITO À VIDA E À SAÚDE ............................................................................ 32
1.3.2 O DIREITO À LIBERDADE, AO RESPEITO E À DIGNIDADE ....................................... 33
1.3.3 O DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA ......................................... 34
1.3.4 O DIREITO À EDUCAÇÃO, À CULTURA, AO ESPORTE E AO LAZER .......................... 35
1.3.5 O DIREITO À PROFISSIONALIZAÇÃO E À PROTEÇÃO NO TRABALHO ....................... 36
1.4 AS MEDIDAS DE PROTEÇÃO DESTINADAS À CRIANÇA E AO
ADOLESCENTE ................................................................................................... 37
CAPÍTULO 2 .................................................................................... 44
ATO INFRACIONAL E SUA APURAÇÃO ....................................... 44
2.1 O ATO INFRACIONAL ................................................................................... 44
2.1.1 O ATO INFRACIONAL COMETIDO POR CRIANÇA ................................................... 47
2.1.2 O ATO INFRACIONAL COMETIDO POR ADOLESCENTE .......................................... 50
2.1.2.1 O procedimento na fase policial ....................................................................... 51
2.1.2.2 O procedimento no Ministério Público ............................................................ 56
2.1.2.3 O procedimento na fase judicial ....................................................................... 58
2.2 OS DIREITOS INDIVIDUAIS E AS GARANTIAS PROCESSUAIS ................ 62
2.3 AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS ............................................................. 68
2.4 REMISSÃO JUDICIAL.................................................................................... 76
CAPÍTULO 3 .................................................................................... 83
O PROGRAMA DE EXECUÇÃO DE MEDIDAS SÓCIOEDUCATIVAS NO MUNICÍPIO DE ITAJAÍ ...................................... 83
3.1 AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS: A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À
COMUNIDADE E A LIBERDADE ASSISTIDA..................................................... 83
3.2 O PROGRAMA DE EXECUÇÃO DE MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS NO
MUNICÍPIO DE ITAJAÍ ......................................................................................... 91
3.2.1 A METODOLOGIA DE ATENDIMENTO DO PMSE ................................................. 94
3.2.1.1 O atendimento da medida de liberdade assistida ........................................... 94
3.2.1.2 O atendimento da medida de prestação de serviços à comunidade ............. 95
3.3 UM DOS CASOS DE SUCESSO DO PROGRAMA DE EXECUÇÃO DE
MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS NO MUNICÍPIO DE ITAJAÍ ............................ 96
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................ 100
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................ 103
RESUMO
A presente pesquisa tem por objeto As Medidas SócioEducativas no Município de Itajaí: Prestação de Serviços à Comunidade e
Liberdade Assistida. Interessante se faz demonstrar à sociedade como são
executadas as medidas sócio-educativas de prestação de serviços à comunidade
e liberdade assistida no Município de Itajaí, aplicadas àqueles menores quando
em conflito com a lei. Para tanto, iniciou-se a abordagem pelo histórico dos
direitos da infância e juventude, verificando-se sua evolução e a ênfase dada nos
assuntos que envolvem estes menores, tanto na garantia de seus direitos, quanto
na violação, por estes, de suas obrigações. Em seguida, de forma mais genérica,
direcionou-se ao estudo do ato infracional. Neste momento, busca-se mostrar
qual o procedimento de apuração deste ato pelas autoridades competentes, cada
qual no seu momento, e a conseqüente aplicação da medida protetiva ou sócioeducativa que se mostrar cabível ao caso concreto. Além dos procedimentos da
apuração, acrescentam-se ainda os direitos individuais e garantias processuais
cabíveis ao estarem sob a interferência de um processamento tanto policial como
judicial. Discorrendo para o tema principal da pesquisa, de maneira mais
específica, buscou-se investigar a fundo de que forma são executadas as
medidas sócio-educativas de prestação de serviços à comunidade e liberdade
assistida no Município de Itajaí. Para a pesquisa, quanto à metodologia
empregada, registra-se que, na Fase de Investigação foi utilizado o Método
Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório
dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica
Indutiva.
Palavras - chaves: Adolescente; Medidas Sócio-Educativas;
Estatuto da Criança e do Adolescente.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto analisar as medidas
sócio-educativas no município de Itajaí, especialmente, a prestação de serviços à
comunidade e a liberdade assistida.
O seu objetivo geral é investigar as medidas sócioeducativas de prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida, bem
como o Programa de Execução destas, no Município de Itajaí/SC.
Os objetivos específicos da pesquisa são:
1) Pesquisar se a criança e o adolescente sempre foram
objeto de proteção integral no Brasil;
2) Buscar um caso de sucesso em que o adolescente em
conflito com a lei pela prática de ato infracional, através do Programa de
Execução de Medidas Sócio-Educativas de prestação de serviços à comunidade
e liberdade assistida do Município de Itajaí, tenha se adaptado efetivamente a
convivência social como cidadão não só de direitos, mas também de obrigações.
Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando do Direito
da Infância e Juventude, discorrendo sobre o histórico que envolve toda a
legislação no Brasil, partindo da origem das primeiras leis, sua evolução, até a
atual ferramenta de tutela dos menores - o Estatuto da Criança e do Adolescente
como doutrina da proteção integral, os seus direitos fundamentais, bem como as
Medidas de Proteção destinadas aos mesmos.
No Capítulo 2, buscou-se investigar o Ato Infracional quando
cometido por criança ou adolescente; sua apuração quanto aos procedimentos da
fase policial, do Ministério Público e posteriormente judicial; seus direitos
individuais e garantias fundamentais durante o procedimento policial ou judicial do
ato; das medidas sócio-educativas; da possibilidade da remissão judicial e
2
conseqüente aplicação da medida cabível a esta população infanto-juvenil quando
encontrar-se em conflito com a lei.
No Capítulo 3, pautou-se pelo estudo das medidas sócioeducativas, em especial, prestação de serviços à comunidade e liberdade
assistida, bem como da pesquisa a campo ao programa que é responsável pela
execução das mesmas no Município de Itajaí, no intuito ainda de se buscar algum
caso de sucesso perante o cumprimento da medida aplicada.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações
Finais,
nas
quais
são
apresentados
pontos
conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre a execução das medidas de prestação de serviços à comunidade e
liberdade assistida no município de Itajaí.
Para a presente monografia foram levantados os seguintes
problemas de pesquisa e, respectivas hipóteses:
1° problema de pesquisa – A criança e o adolescente
sempre foram objeto da proteção integral no Brasil?
Para este problema foi selecionada a seguinte hipótese:
Pouco se conhece, nos dias hodiernos, acerca do histórico
dos direitos da infância e juventude no Brasil, se estes sempre foram amparados
por uma legislação especial, em razão de sua condição de pessoa em
desenvolvimento ou apenas mero objetos de intervenção da norma.
2° problema de pesquisa – Existe algum caso no município
de Itajaí/SC em que o adolescente se adaptou efetivamente a convivência familiar
e social como cidadão de direitos e obrigações com o cumprimento de medida
sócio-educativa?
Para este problema, foi selecionada a seguinte hipótese:
Em razão de os adolescentes hoje em dia estarem cada vez
mais envolvidos com o crime, na prática de atos infracionais, levando a sociedade
3
e a própria família à indignação, bem como ao sentimento de rejeição quanto a
estes, relevante se busca saber se existem casos de sucesso de adolescentes
que vieram a cumprir medidas sócio-educativas decorrentes de sua conduta
ilícita, quando do retorno ao convívio social e familiar.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação10 foi utilizado o Método Indutivo11, na Fase de Tratamento de
Dados o Método Cartesiano12, e, o Relatório dos Resultados expresso na
presente Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas do Referente13, da Categoria14, do Conceito Operacional15 e da
Pesquisa Bibliográfica16.
10
“[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente
estabelecido[...]. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da
pesquisa jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101.
11
“[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma
percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e
Metodologia da pesquisa jurídica. p. 104.
12
Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE,
Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p.
22-26.
13
“[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o
alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma
pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa
jurídica. p. 62.
14
“[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD,
Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 31.
15
“[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja
aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa
jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 45.
16
“Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD,
Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 239.
CAPÍTULO 1
DIREITO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE
1.1 A HISTÓRIA DO DIREITO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE NO BRASIL
Historicamente, verifica-se que a proteção dos sujeitos dos
direitos e obrigações na infância e adolescência, tardou em considerar crianças e
adolescentes como pessoas em desenvolvimento. Paula17 refere que os
interesses desses menores confundiam-se aos interesses dos adultos, figurando
como meros objetos de intervenção destes últimos.
A importância ou valor da criança não ganhava dimensão
suficiente para estimular o reconhecimento de que suas relações com o mundo
adulto pudessem interessar ao mundo do Direito quando do surgimento de
conflitos ou mesmo de certos interesses prevalecentes. Tais interesses ganham
espaço somente quando há o reconhecimento da capacidade desses menores
em relação aos benefícios de sua proteção, explica o autor supracitado18.
Este capítulo transcorrerá em uma exposição do histórico
que envolve toda a legislação no Brasil pertinente a essa população infantojuvenil, desde a origem das primeiras leis, sua evolução até a atual ferramenta
que garante a tutela ao direito desses menores: o Estatuto da Criança e do
Adolescente.
1.1.1 A Carta Régia de 1639 e as Casas de Misericórdia
A primeira legislação que tratou da criança e adolescente no
Brasil foi a Carta Régia de 1639.
17
PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e do adolescente e tutela jurisdicional
diferenciada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 11.
18
PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e do adolescente e tutela jurisdicional
diferenciada. p. 11-12.
5
Engel19 esclarece que em data de 1639, a Carta Régia pode
ser considerada como a primeira inserção de uma norma que põe o Estado como
interventor na vida de crianças e adolescentes, obrigando o governador do Rio de
Janeiro a responsabilizar-se pelas crianças abandonadas daquela cidade.
Em acolhimento aos enfermos e crianças expostas e órfãs
em todo o país surgem as Santas Casas de Misericórdia, irmandade que assistiu
desde o período colonial estes pobres desvalidos, enfatiza Rizzini20.
Estas Casas datam do século XIII na Europa, inicialmente na
Itália, ao qual tinham por doutrina proteger os poderes terrenos (reis, rainhas e
príncipes), os poderes espirituais (papas, cardeais, bispos, clérigos ou membros
de ordens religiosas), estendendo-se ainda a proteção a todos os necessitados
representados por crianças, pobres, doentes e presos. Essa proteção, adotada
pela Misericórdia, era simbolizada pela imagem da Virgem com o manto aberto21.
A primeira Casa de Misericórdia adotada no Brasil foi
fundada em 1543, na capitania de São Vicente (Vila de Santos) pelo fidalgo
português Brás Cubas22, líder deste povoado. Auxiliado pelos moradores da Vila,
inaugurou sua construção em novembro daquele mesmo ano, sendo o mais
antigo hospital brasileiro com quase quinhentos anos de existência. Durante anos
foi responsável pelo acolhimento de crianças abandonadas nas ruas pelos pais,
sendo acolhidas nas suas famosas rodas dos enjeitados23.
19
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. Itajaí,
2006. Dissertação (Mestrado em Ciência Jurídica) – Setor de Pós-Graduação, UNIVALI. p. 8.
20
RIZZINI, Irma; RIZZINI, Irene. A institucionalização de crianças no Brasil: percurso histórico
e desafios do presente. Rio de Janeiro: Edições Loyola, 2004, p. 27. Disponível em:
<http://books.google.com/books?id=e8rcCaoIkY4C&printsec=frontcover&hl=pt-BR> Acesso em:
22 jan. 2009
21
Autor desconhecido. 510 anos de misericórdia. Disponível em: <http://virtualia.blogs.sapo.pt
/5050.html> Acesso em: 23 jan. 2009.
22
Brás Cubas nasceu na cidade de Porto, Portugal, no ano de 1507. Foi fidalgo e explorador
português; fundador da Vila de Santos (hoje cidade); governou por duas vezes a Capitania de
São Vicente. Chegou ao Brasil em 1531 com a expedição de Martim Afonso de Sousa. Faleceu
na cidade de Porto, em 1592. Autor desconhecido. Biografia de Brás Cubas. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Br%C3%A1s_Cubas> Acesso em: 23 jan. 2009.
23
Autor desconhecido. 510 anos de misericórdia. Disponível em: <http://virtualia.blogs.sapo
.pt/5050.html> Acesso em: 23 jan. 2009.
6
As Santas Casas de Misericórdia deram início a Roda dos
Expostos ou Enjeitados no período colonial, seguindo o modelo lusitano24. A
assistência social à infância, enquanto ação do Estado e iniciativa pública faz
nascer no Brasil, em 1738, na Santa Casa do Rio de Janeiro, a primeira Roda dos
Expostos25. Mas, somente em 1806 houve a regulamentação da mesma, por
Portugal, devido às condições precárias ao qual se encontravam tanto os prédios
urbanos que a acolhiam, como a sua própria administração, devendo estas ser
reguladas agora pelo Compromisso da Misericórdia de Lisboa26.
Em decorrência do grande surto de urbanização vivenciado
pelo Brasil desde o início do século XVIII, a triste realidade como doenças,
aumento do número de dependentes, agriculturas desfavoráveis, desestimularam
muitos imigrantes que viam neste país a esperança de uma vida melhor. Com
isso, grande número de crianças eram abandonadas nas ruas ou portas de casas,
conforme Veronese27.
A Roda dos Expostos, extinta apenas na República (meados
do século XX) tinha ainda a finalidade de receber os bebês que eram deixados
pelas mães que geralmente queriam livrar-se da desonra de ter um filho ilegítimo
ou então por não ter condições de criá-lo, mantendo em anonimato o autor ou
autora de tal abandono. A criação destas crianças era realizada por amas-de-leite
contratadas pela Santa Casa de cada cidade, demonstra Rizzini28.
Devido a escassez dos recursos materiais e humanos,
muitas crianças acabavam não resistindo às precárias condições a que eram
24
Da Lusitânia e de seus habitantes. Português. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda.
Minidicionário da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. p. 341.
25
Autor desconhecido. 510 anos de misericórdia. <Disponível em: http://virtualia.blogs.sapo.pt/
5050.html> Acesso em: 23 jan. 2009.
26
Autor desconhecido. História Santa Casa Misericórdia. Disponível em: <http://papelariapapiro.
blogs.sapo.pt/1245.html> Acesso em 24 jan. 2009.
27
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. São Paulo: LTr,
1999, p. 15.
28
RIZZINI, Irma; RIZZINI, Irene. A institucionalização de crianças no Brasil: percurso histórico
e desafios do presente, p. 23-24. Disponível em: <http://books.google.com/books?id=e8rcCao
IkY4C&printsec=frontcover&hl=pt-BR> Acesso em: 24 jan. 2009.
7
submetidas, gerando assim o aumento da mortalidade infantil, explica Moncorvo
citado por Veronese29.
Diante desse contexto, com o crescimento da população e a
falta de infra-estrutura básica nas cidades, agravou-se o surgimento de doenças
infecto-contagiosas
a
partir
de
metade
do
século
XVIII,
aumentando
consideravelmente o abandono de crianças. Assim, várias obras de caridade
começam a se organizar em assistência a essa população, tendo como
precursoras associações civis, religiosas (na figura da Igreja Católica), ações
filantrópicas da aristocracia rural e mercantilista, além de algumas realizações da
Coroa Portuguesa, acrescenta Veronese30.
Elucida a autora31 que de início o atendimento era dado aos
órfãos e abandonados, estendendo-se posteriormente para os considerados
“pervertidos”. Esse tipo de assistência tinha característica predominantemente
caritativa, isto é, bastava dar-lhes casa e comida. O ensino se limitava ao
aprendizado das atividades domésticas e educação familiar, esta fundamentada
no binômio: autoridade – obediência, que geralmente preparava as crianças para
os empregos domésticos.
1.1.2 Os Menores e a Escravidão
No início do século XIX a infância torna-se foco de atenções,
na medida em que o trabalho das famílias deixa de ser junto ao domicílio,
deslocando-se de suas origens, gerando conseqüentemente o abandono de seus
filhos, por acabarem não acompanhando seu desenvolvimento. Com isso, estes
“menores” adquirem característica de “abandonados”, conforme Leite citado por
Ferrandin32.
29
Moncorvo citado por VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do
adolescente. p. 16.
30
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 16-17.
31
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 18.
32
Leite citado por FERRANDIN, Mauro. Princípio constitucional da proteção integral e direito
penal juvenil: possibilidade e conveniência de aplicação dos princípios e garantias do direito
penal aos procedimentos previstos no estatuto da criança e do adolescente. Itajaí, 2008.
Dissertação (Mestrado em Ciência Jurídica) – Setor de Pós-Graduação, UNIVALI. p. 5.
8
Segundo Veronese33, foi na Constituinte de 1823, logo após
sua independência política34, que o Brasil começou a “interessar-se” com a
criança. José Bonifácio35 apresentou um projeto que visava o menor escravo.
Havia na realidade, em sua linguagem, mais uma preocupação com a garantia da
mão-de-obra do que uma preocupação em considerar os direitos humanos da
criança escrava.
Os atos de violência praticados por crianças e adolescentes
descrevem-se no país desde o século XIX. O Código Criminal de 183036 aboliu as
medidas punitivas dispostas nas Ordenações do Reino de Portugal, que eram
consideradas bárbaras, na qual crianças e jovens recebiam punição em igual grau
de severidade como os adultos. Com a ascensão do Código Criminal do Império
recomendava-se que os menores de 14 anos que tivessem cometido, com
discernimento, atos indesejados pela sociedade, deveriam ser internados em uma
"casa de correção”, aduz Engel37.
A partir do ano de 1860, a questão da escravidão no Brasil
começou a ter relevância no sentido de proibir a venda de escravos sob pregão e
exposição pública, bem como a proibição de, em qualquer venda, separar o filho
do pai e o marido da mulher, esclarece Macedo citado por Veronese38.
Acrescenta Mattoso, citado por Veronese39, que somente em
28 de setembro de 1871, foi aprovada a Lei n° 204040, conhecida como Lei do
33
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 11.
34
A independência política do Brasil ocorre em 7 de setembro de 1822.
35
José Bonifácio de Andrada e Silva, naturalista, estadista, poeta e maçom, nasceu em Santos em
13/06/1763. Inteligente, culto, participou da vida política do País no Primeiro e Segundo
Reinado, sendo então considerado o Patriarca da Independência. Foi tutor de D. Pedro II, depois
da abdicação do pai deste, vindo a falecer em 06/04/1838 em Niterói. SILVA, Zuleika da.
Biografia de José Bonifácio. Disponível em: <http://pt.shvoong.com/humanities/1779731biografia-jose-bonifacio/> Acesso em: 20 jan. 2009.
36
BRASIL. Lei de 16 de dezembro de 1830. Manda executar o Código Criminal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LIM/LIM-16-12-1830.htm> Acesso em: 21 jan. 2009.
37
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 9.
38
Macedo citado por VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do
adolescente. p. 11-12.
39
Mattoso citado por VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do
adolescente. p. 12.
9
Ventre Livre ou Lei Rio Branco, promulgada pela regente do Império Princesa
Isabel, na ausência de seu pai D. Pedro II. Referida lei concedia a liberdade às
crianças nascidas de escravas, tendo por escopo a extinção da escravidão
infantil, assim como a própria escravidão estava ameaçada de extinção após a Lei
Antitráfico, em 1831, com repressão ainda maior da lei Eusébio de Queiroz41,
datada de 1850.
No entanto, a Lei do Ventre Livre possuía muitas restrições,
onde o menor deveria permanecer sob a autoridade do senhor de escravo e de
sua mãe até os oito anos de idade, para educá-lo. Chegada tal idade, o
proprietário da mãe escrava poderia optar por receber uma quantia de 600 mil réis
do Estado, ou então ficar com a criança negra, para utilizar-se de seus serviços
até completar vinte e um anos, o que na maioria das vezes acabava acontecendo.
Nesse caso, não havia lei que determinasse o número de horas de trabalho,
regime sanitário nem alimentação que deveriam ser oferecidas a estes pequenos
“escravos livres”, levando assim ao abuso de tais direitos, informa ainda
Veronese42.
Em uma sociedade onde pessoas de pele escura eram
consideradas escravos, a vida das crianças e adolescentes não era muito
diferente da vida sofrida pelos adultos. Muitas eram abandonadas, outras
entregues às casas de caridade e outras, ainda, por meio de denúncias do
Manifesto da Confederação Abolicionista eram deixadas em casas que
praticavam infanticídios, a baixo preço, sem deixar vestígios, expõe Veronese43.
Tanto os filhos de ricos como os de classe paupérrima eram
educados longe de suas famílias em colégios internos, asilos, educandários,
reformatórios,
dentre
outras
instituições,
atendendo-se
as
tendências
educacionais e assistenciais do século XIX. Após a segunda metade do século
40
BRASIL. Lei n° 2040 de 28 de setembro de 1871. Disponível em: <http://jij.tj.rs.gov.br /jij_
site/docs/legislacao/lei+do+ventre+livre.htm> Acesso em: 21 jan. 2009.
41
BRASIL. Lei n° 581 de 4 de setembro de 1850. Estabelece medidas para a repressão do tráfico
de africanos neste Império. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/ conteudo
/colecoes/Legislacao/Legimp-36_23.pdf> Acesso em: 21 jan. 2009.
42
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 12.
43
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 12-13.
10
XX o modelo de internato cai em desuso para os filhos de ricos, porém, mantido
para os pobres até a atualidade, elucida Rizzini44.
Ainda neste contexto, a realidade dos filhos de não
escravos, ou seja, os filhos de famílias mais cultas era diferente, ao passo que
eram enviados às universidades na Alemanha, França e Inglaterra. Esses pais
acreditavam que deixar seus filhos aos cuidados dos negros torná-los-iam vadios
e mal-criados, como estes, explica Belmann citado por Ferrandin45.
O ensino obrigatório fora regulamentado somente em 1854,
não possuindo aplicação igualitária, uma vez que os filhos de escravos não
tinham a mesma garantia. Aqueles que padeciam de moléstias contagiosas ou
não estavam vacinados, também não mereciam tal prioridade, conforme
Lorenzi46.
Após o advento da República em 1889, foi promulgado em
11 de outubro de 1890 o Código Penal da República47, atribuindo a
inimputabilidade penal aos menores de quatorze anos. Aqueles com idade inferior
e que apresentassem discernimento eram recolhidos a estabelecimentos
industriais, pelo tempo que o juiz julgasse conveniente, desde que não excedesse
dezessete anos, elucida Liberati48.
44
RIZZINI, Irma; RIZZINI, Irene. A institucionalização de crianças no Brasil: percurso histórico
e desafios do presente, p. 22. Disponível em: <http://books.google.com/books?id=e8
rcCaoIkY4C&printsec=frontcover&hl=pt-BR> Acesso em: 22 jan. 2009
45
Belmann citado por FERRANDIN, Mauro. Princípio constitucional da proteção integral e
direito penal juvenil: possibilidade e conveniência de aplicação dos princípios e garantias do
direito penal aos procedimentos previstos no estatuto da criança e do adolescente. p. 5.
46
LORENZI, Gisella Werneck. Uma breve história dos direitos da criança e do adolescente no
Brasil. Disponível em: <http://www.promenino.org.br/Hist%C3%B3riadosdireitosdainf%C3%A2
ncia/tabid/65/Default.aspx> Acesso em 22 jan. 2009.
47
BRASIL. Decreto n° 847 de 11 de outubro de 1890. Promulga o Código Penal. Disponível em:
<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=66049> Acesso em: 25 jan.
2009.
48
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional. São Paulo: Juarez de Oliveira,
2002. p. 28.
11
Estipulou-se, no próximo ano, com o Decreto n° 131349,
apesar de nunca regulamentado, a idade mínima para doze anos ao exercício da
atividade laborativa, com limitações de jornada que, de acordo com a idade, não
passaria de sete ou nove horas de trabalho não consecutivo. No entanto, muitas
leis dessa época não eram cumpridas na forma como eram estabelecidas no
papel. Havia grandes irregularidades que beneficiavam o empregador, em
desfavor do menor, estabelece Veronese50.
Com o surgimento do primeiro surto industrial, fica evidente
a afronta aos direitos humanos desses menores. A idade com que as crianças
ingressavam nas fábricas era cada vez mais precoce. Além dos jovens em idade
de aprendizagem, crianças de até cinco anos de idade eram utilizadas em
pequenos serviços. Aqueles com idade inferior a dez anos eram empregados em
diversos setores que ofereciam riscos à saúde, haja vista a atividade pesada para
sua idade, além de terem que cumprir os horários iguais aos adultos, tanto no
período diurno como noturno51.
Objetivando obter providências por parte dos organismos
governamentais diante de tamanhas atrocidades, os intelectuais da época,
impulsionados por ideais progressistas e nacionalistas, concluíram que assistir
uma criança não significava somente dar-lhe casa e comida. Fazia-se necessário
que as instituições formassem o indivíduo na moral, bons costumes, educação
elementar e que lhe fornecessem ainda uma capacitação profissional, a qual mais
tarde lhe permitiria o seu próprio sustento52.
Devido a situação calamitosa vivenciada no país por estes
pequenos, seja na família, nas ruas ou nos próprios asilos, a infância passa a
correr grandes riscos. Moralmente abandonada, em decorrência da extrema
pobreza, baixa moralidade, doenças e falta de educação, há que se criarem
49
BRASIL. Decreto-Lei n° 1313 de 28 de fevereiro de 1974. Reajusta os vencimentos e salários
dos servidores do Poder Executivo e dá outras providências. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/1965-1988/Del1313.htm> Acesso em: 25 jan. 2009.
50
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p.19-20.
51
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 20.
52
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 21.
12
mecanismos que possam garantir a formação de uma nova mentalidade de
atendimento ao menor. E é com a ajuda de várias ciências que será implantado
um novo modelo de assistência à infância desvalida, através de uma
racionalidade científica que se prioriza sobre o amor e a piedade da assistência
antes caritativa e religiosa, expõe ainda Veronese53.
1.1.3 O Juizado de Menores
Com o advento do Decreto n° 16.272 de 20 de dezembro de
54
1923 , surgiu no ano de 1924 o primeiro Juizado de Menores do Brasil, com sede
na cidade do Rio de Janeiro, sob influências incansáveis do jurista e legislador
Mello Matos55, em favor da criança desvalida. Além da criação deste juizado, o
referido Decreto também aprovava o Regulamento da Assistência e Proteção aos
Menores Abandonados e Delinqüentes, explica Veronese56.
Em seu art. 62, Cap. III57 aduz a autora58 que o citado
Decreto determinava que haveria um abrigo, subordinado ao juizado, que
abrigaria meninos e meninas, por meio de divisões que ainda subdividir-se-iam
em seções de “abandonados” e “delinqüentes”. Esses abrigos possuíam caráter
provisório, uma vez que apenas faria uma triagem desses menores para em
seguida encaminhá-los a outros estabelecimentos.
53
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 22.
54
BRASIL. Decreto n° 16272 de 20 de dezembro de 1923. Aprova o regulamento da assistência e
proteção aos menores abandonados e delinqüentes. Disponível em: <http://www.ciespi.
org.br/base_legis/baselegis_view.php?id=20> Acesso em 25 jan. 2009.
55
José Cândido de Albuquerque Mello Mattos nasceu em Salvador/BA, em 19 de março de 1864.
Formou-se em Direito pela Faculdade de Direito do Recife em novembro de 1887 e atuou como
promotor, advogado criminal e na área do magistério. Na década de 20, passou a elaborar
projetos que culminaram, em 1923, com a criação do Juízo de Menores do Distrito Federal, do
qual tornou-se titular em fevereiro de 1924. Primeiro juiz de menores do Brasil e da América
Latina. Faleceu em 3 de janeiro de 1934, na Cidade do Rio de Janeiro. Autor desconhecido.
Biografia de Mello Matos. Disponível em: <http://www.udemo.org.br/destaque_63.htm> Acesso
em: 25 jan. 2009.
56
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 23.
57
Art. 62: Subordinado ao juizo de menores, haverá um abrigo destinado a receber
provisoriamente, até que tenham destino definitivo, os menores abandonados e delinqüentes”.
58
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 23.
13
Referente ao Juizado de Menores responsabilizava-se este
pela promoção, solicitação, acompanhamento, fiscalização e orientação em
quaisquer ações judiciais que envolvessem os interesses dos menores. O juiz
tinha por determinação educar todos estes, desde os órfãos e abandonados, aos
pervertidos59 e viciados60. Veronese61 cita que apesar da preocupação com o
efetivo atendimento a esta população desvalida, a escassez de estabelecimentos
que executassem e dessem apoio às medidas jurídicas dificultavam a ação deste
juízo.
Como forma de amparo a tal situação, foi criado o Patronato
Nacional de Menores que absorveu todos os estabelecimentos oficiais que
estivessem sob a jurisdição do juizado como a escola de Menores Abandonados,
que
fora
transformada
em
Casa
de
Prevenção.
Ocorre
que
estes
estabelecimentos ficavam cada vez mais abarrotados de menores, gerando
ambientes promíscuos, dificultando assim os cuidados com as necessidades
básicas de cada um, expõe Veronese62.
1.1.4 O Código de Menores
Os anos passaram-se, desde 1921 e Mello Matos continuara
sua luta incessante pela preservação da dignidade do menor. Foi o Decreto n°
5083 de 1° de dezembro de 192663 que aprovou seu projeto, ao qual considerava
bivalente a tutela do menor, sendo o poder do pai sobre o filho regulado, podendo
o Estado intervir nesta relação. Com esta concepção, caberia ao pai educar o
filho, castigá-lo moderadamente ou levar-lhe a juízo quando extrapolasse ao seu
controle, caracterizando assim o pátrio dever, cita Veronese64.
59
Perturbar a ordem ou o estado das coisas; depravar, desvirtuar; tornar-se perverso, corromperse, depravar-se, desmoralizar-se. Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. Disponível em:
<http://www.priberam.pt/dlpo/dlpo.aspx> Acesso em: 25 jan. 2009.
60
Que tem vício. Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. Disponível em: <http://www.priberam.
pt/dlpo/dlpo.aspx> Acesso em: 25 jan. 2009.
61
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 24.
62
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 24.
63
BRASIL. Decreto n° 5083 de 1 de dezembro de 1926. Institui o Código de Menores. Disponível
em: <http://www.ciespi.org.br/base_legis/baselegis_view.php?id=37> Acesso em: 25 jan. 2009.
64
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 25.
14
O Decreto supramencionado, em seu art. 1°65, estabelecia a
organização e elaboração pelo Governo da redação do projeto, e por fim a
publicação do então Código de Menores. O presidente da época, Washington
Luís, delegou este trabalho ao jurista e primeiro juiz de menores brasileiro José
Cândido Albuquerque de Mello Matos, informa Veronese66.
O Decreto n° 17943-A de 12 de outubro de 192767, também
conhecido como Código de Menores de “Mello Mattos”, acrescenta a autora68 que
sintetizou de maneira ampla e aperfeiçoada diversas Leis e Decretos que tinham
como propostas aprovar mecanismos que dessem uma atenção especial à
criança e ao adolescente. Veio ainda substituir concepções que antes atentavam
aos direitos humanos do menor, fazendo surgir uma assistência que lhes daria
condições de se desenvolver ou até mesmo subsistir em situações de extrema
pobreza.
Liberati69 menciona que os menores eram classificados
como abandonados e delinqüentes. Aqueles, carentes, seriam internados em
asilos ou orfanatos, conforme a conveniência do juiz. Estes, autores de atos
infracionais, receberiam medidas mais gravosas, como a de internação,
ressaltando-se que a partir de agora a inimputabilidade penal seria aos menores
de dezoito anos.
Este
código
ainda
proibia
a
Roda
dos
Expostos,
estabelecendo que os bebês fossem entregues diretamente às pessoas destas
65
Art. 1º. O Governo consolidará as leis de assistencia e proteção aos menores, adicionando-lhes
os dispositivos constantes desta lei, adoptando as demais medidas necessarias á guarda, tutela,
vigilancia, educação, preservação e reforma dos abandonados ou delinquentes, dando redação
harmonica e adequada a essa consolidação, que será decretada como o Codigo de Menores”.
66
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 26.
67
BRASIL. Decreto n° 17943-A de 12 de outubro de 1927. Consolida as leis de assistência e
proteção a menores. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1910-1929 /D
17943Aimpressao.htm> Acesso em: 26 jan. 2009.
68
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 26.
69
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional. p. 50.
15
entidades,
mesmo
que
o
anonimato
dos
pais
fosse garantido.
Outra
obrigatoriedade era o registro de cada uma dessas crianças, cita Lorenzi70.
O Código de Menores visava estabelecer diretrizes claras
para o trato da infância e juventude excluídas, regulamentando questões como
trabalho infantil, tutela71 e pátrio poder72, delinqüência e liberdade vigiada73,
conforme esclarecidos logo abaixo.
O trabalho limitava-se aos doze anos, sendo proibido aos
menores de dezoito anos o trabalho noturno; ao pátrio poder consistia a
intervenção do juiz de menores para suspendê-lo ou inibi-lo, impondo normas e
condições aos pais e tutores; para a delinqüência, a instituição de processo
especial aos menores infratores entre catorze e dezoito anos; liberdade vigiada
aplicada aos menores em conflito com a lei da qual deveriam estar sempre em
companhia dos pais, tutor ou curador, ou ainda aos cuidados de um patronato,
sob vigilância do juiz, acrescenta Veronese.74.
Movido por grandes transformações sociais na década de
30, relata Liberati
75
que o país passa a ter uma nova regulamentação ao
atendimento infanto-juvenil. O Governo Federal cria por meio do Decreto-Lei n°
70
LORENZI, Gisella Werneck. Uma breve história dos direitos da criança e do adolescente no
Brasil. Disponível em: <http://www.promenino.org.br/Hist%C3%B3riadosdireitosdainf%C3%A2
ncia/tabid/65/Default.aspx> Acesso em 26 jan. 2009.
71
Encargo ou autoridade conferida a alguém para administrar os bens e dirigir a pessoa de um
menor que está fora do pátrio poder, e para representálo ou assisti-lo nos atos da vida civil.
Proteção, amparo. In FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da língua
portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 1993. p. 553.
72
O antigo Pátrio Poder mudou no novo Código Civil para Poder Familiar. Na época do antigo
Código Civil (1916) quem exercia o poder sobre os filhos era o pai e não se falava no poder do
pai e da mãe (pais). Mas esta situação mudou e hoje a responsabilidade sobre os filhos é de
ambos. SANTOS, Magda Raquel Guimarães Ferreira dos. O Pátrio Poder ou Poder Familiar: a
relação entre os pais e os filhos de um ponto de vista legal. Disponível em:
<http://www.clubedobebe.com.br/Palavra%20dos%20Especialistas/df-12-04.htm> Acesso em:
26 jan. 2009.
Art. 1630 da Lei n° 10.406 de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil: Os filhos estão sujeitos ao
poder familiar, enquanto menores.
73
LORENZI, Gisella Werneck. Uma breve história dos direitos da criança e do adolescente
no Brasil. Disponível em: <http://www.promenino.org.br/Hist%C3%B3riadosdireitosdainf%
C3%A2 ncia/tabid/65/Default.aspx> Acesso em 26 jan. 2009.
74
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 29.
75
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional. p. 60.
16
3799/41, no âmbito do Ministério da Justiça e Negócios Interiores, o SAM –
Serviço de Assistência ao Menor que tinha por missão amparar socialmente os
menores carentes, abandonados e infratores.
Por meio de uma política corretiva-repressiva-assistencial,
cumpria as medidas aplicadas aos infratores pelo juiz, servindo como um sistema
penitenciário para essa população menor de dezoito anos. Contudo, os infratores
eram entregues em internatos e casas de correção, enquanto os abandonados e
carentes aos patronatos agrícolas e estabelecimentos de aprendizagem de
ofícios, lembra o mesmo autor76.
Devido à precariedade que assolou este sistema, que já não
mais respondia às necessidades do atendimento ao menor desvalido, cita
Liberati77 que na data de 1° de dezembro de 1964, a Lei n° 451378 criou a
FUNABEM – Fundação Nacional do Bem – Estar do Menor, estabelecendo uma
política de assistência aos menores em situação irregular que encontravam-se em
estado de necessidade.
O Governo Revolucionário da época da Ditadura Militar
(1964-1985) passou a discussões onde a sensibilização com o drama vivido pela
criança brasileira levaria à criação de uma política que lhes garantisse uma
infância digna. O tema criança agora, não seria da responsabilidade de entes
privados e alguns estatais, mas sim amparados pela Política Nacional do Bem Estar do Menor, de responsabilidade da FUNABEM, que teria toda a sua estrutura
respaldada pela ESG – Escola Superior de Guerra, administrada pelo governo da
época, acrescenta Veronese79.
Este organismo foi responsável pela criação das Febens –
Fundação Estadual de Bem – Estar do Menor que na realidade não alcançava um
76
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional. p. 60-61.
77
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional.p. 68.
78
BRASIL. Lei n° 4513 de 1 de dezembro de 1964. Autoriza o Poder Executivo a criar a Fundação
Nacional do Bem-Estar do Menor, a ela incorporando o patrimônio e as atribuições do Serviço de
Assistência a Menores, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/Leis/1950-1969/L4513.htm> Acesso em: 29 jan. 2009.
79
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 33.
17
resultado positivo de recuperação e reeducação do menor em conflito com a lei. O
atendimento empregado nestas instituições era ineficiente diante do grande
número de crianças marginalizadas que surgiam no país. Um exemplo dessa
ineficácia encontra-se no Estado de São Paulo, onde as Febens80 acabavam
servindo
mais
como
“depósitos”
de
adolescentes
do
que
instituições
81
educacionais, exemplifica Engel .
Cabe ressaltar, segundo Lorenzi82, que além do SAM Serviço de Assistência ao Menor, outras entidades federais de assistência à
infância e juventude também foram criadas, ligadas à figura da primeira dama
Darcy Vargas, esposa de Getúlio Vargas. Trata-se da LBA – Legião Brasileira de
Assistência; Casa do Pequeno Jornaleiro; Casa do Pequeno Lavrador; Casa do
Pequeno Trabalhador e Casa das Meninas.
Criada por Darcy Vargas, a LBA, também intitulada
originalmente de Legião de Caridade Darcy Vargas, voltava-se ao atendimento
primordial de crianças órfãs de guerra. A Casa do Pequeno Jornaleiro apoiava os
jovens de baixa renda baseado no trabalho informal e no apoio social e sócioeducativo, informa a mesma autora83.
Lorenzi84 cita ainda que a Casa do Pequeno Lavrador
destinava-se à assistência e aprendizagem rural às crianças e adolescentes filhos
de camponeses, enquanto a Casa do Pequeno Trabalhador capacitava e
encaminhava ao trabalho adolescentes urbanos de baixa renda. A Casa das
80
A Lei Estadual n° 12.469/06 aprovou a mudança da nomenclatura FEBEM para Fundação
CASA – Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente. Disponível em: <http://www.
casa.sp.gov.br/site/noticias.php?cod=588> Acesso em: 29 jan. 2009.
81
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 11.
82
LORENZI, Gisella Werneck. Uma breve história dos direitos da criança e do adolescente no
Brasil. Disponível em: <http://www.promenino.org.br/Hist%C3%B3riadosdireitosdainf%C3%A2n
cia/tabid/65/Default.aspx> Acesso em 29 jan. 2009.
83
LORENZI, Gisella Werneck. Uma breve história dos direitos da criança e do adolescente no
Brasil. Disponível em: <http://www.promenino.org.br/Hist%C3%B3riadosdireitosdainf%C3%A2n
cia/tabid/65/Default.aspx> Acesso em 29 jan. 2009.
84
LORENZI, Gisella Werneck. Uma breve história dos direitos da criança e do adolescente no
Brasil. Disponível em: <http://www.promenino.org.br/Hist%C3%B3riadosdireitosdainf%C3%A2n
cia/tabid/65/Default.aspx> Acesso em 29 jan. 2009.
18
Meninas consistia no apoio assistencial e sócio-educativo a adolescentes do sexo
feminino com problemas de conduta.
Em 1950 é instalado no Brasil o primeiro escritório da
UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância, liderando e apoiando
algumas das mais importantes transformações na área da infância e da
adolescência no País, como as grandes campanhas de imunização e aleitamento,
a aprovação do artigo 227 da Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do
Adolescente, o movimento pelo acesso universal à educação, os programas de
combate ao trabalho infantil, às ações por uma vida melhor para crianças e
adolescentes em todo o território nacional85.
Ainda sob as diretrizes da Política Nacional do Bem Estar do
Menor, implantadas pela FUNABEM, surge com a Lei n° 6697 de 10 de outubro
de 197986, o Código de Menores, inspirado pela doutrina da situação irregular, no
Ano Internacional da Criança. Tal Código estabelecia um novo termo: “menor em
situação irregular” para os menores de dezoito anos que se encontravam em
abandono, vítimas de maus-tratos, desamparados juridicamente, com desvios de
conduta e ainda, autores de infrações penais, expõe Veronese87.
Em seu art. 2°88, especifica a expressão situação irregular,
no que diz respeito ao abandono pelos pais, carência afetiva, exposição
85
Autor desconhecido. Unicef no Brasil. Disponível em: <http://unicef.org.br/> Acesso em 02 fev.
2009.
86
BRASIL. Lei n° 6697 de 10 de outubro de 1979. Institui o Código de Menores. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/1970-1979/L6697.htm> Acesso em: 03 fev. 2009.
87
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 35.
88
“Art. 2º Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor: I - privado de
condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que
eventualmente, em razão de: a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável; b) manifesta
impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las; Il - vítima de maus tratos ou castigos
imoderados impostos pelos pais ou responsável; III - em perigo moral, devido a: a) encontrar-se,
de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes; b) exploração em atividade
contrária aos bons costumes; IV - privado de representação ou assistência legal, pela falta
eventual dos pais ou responsável; V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação
familiar ou comunitária; VI - autor de infração penal. Parágrafo único. Entende-se por
responsável aquele que, não sendo pai ou mãe, exerce, a qualquer título, vigilância, direção ou
educação de menor, ou voluntariamente o traz em seu poder ou companhia, independentemente
de ato judicial”.
19
inadequada, conduta delinqüente, desviada e infratora, segundo a mesma
autora89.
Contudo, o referido Código acabou por ferir o caráter tutelar
ao qual estava disposto, fazendo surgir um sistema que não levava em
consideração somente a infração cometida pelo menor, atribuindo o mesmo
destino àquele abandonado materialmente pelos pais. Saraiva citado por Engel90
destaca o seguinte:
Nesse tempo, de vigência do Código de Menores, a grande
maioria da população infanto-juvenil recolhida às entidades de
internação do sistema FEBEM no Brasil, na ordem de 80%, era
formada por crianças e adolescentes “menores”, que não eram
autores de fatos definidos como crime na legislação penal
brasileira. Estava consagrado um sistema de controle da pobreza,
que Emílio Garcia Mendes define como sociopenal, na medida em
que se aplicavam sanções de privação de liberdade a situações
não tipificadas como delito, subtraindo-se garantias processuais.
Prendiam a vítima [...].
De tal forma, o menor não era considerado sujeito de
direitos, possuindo as garantias que deveriam lhe ser aplicada segundo uma lei
específica, mas sim, tornavam-se todos meros objetos da norma, que
independentemente de terem cometido infrações ou serem abandonados pela
família, eram privados de sua liberdade, acrescenta Engel91.
1.1.5 A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Foi com a promulgação da Constituição da República
Federativa do Brasil em 5 de outubro de 198892, que de forma democrática, toda a
sociedade junto da Assembléia Nacional Constituinte participara de maneira ativa
89
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 36.
90
Saraiva citado por ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas
sócioeducativas: uma leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios
constitucionais. p. 14.
91
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 15.
92
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em: 03 fev. 2009.
20
na elaboração de novos direitos atinentes à criança e ao adolescente, lembra
Veronese93.
O primeiro deles vem descrito no art. 6° da CRFB/88, que
trata como sociais os direitos à educação, saúde, trabalho, segurança,
previdência social, proteção à maternidade e à infância, bem como assistir aos
desamparados. Já o art. 7º, em seu inciso XXXIII, proíbe ao menor de dezoito
anos o trabalho noturno, perigoso ou insalubre, e aos menores de dezesseis anos
de trabalhar em qualquer tipo de atividade, salvo na condição de aprendiz, a partir
dos quatorze anos94.
Dallari citado por Cury95 acrescenta que o art. 227 dispõe
que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com prioridade máxima, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de salvaguardá-los de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Além do caput96 deste artigo, seus incisos também trazem
mais direitos que devem ser garantidos ao menor de dezoito anos, tais como:
assistência integral à saúde da criança e do adolescente; idade mínima de
quatorze anos para admissão em trabalho; garantias processuais quando da
prática do ato infracional; acolhimento, na forma da lei, dos menores órfãos ou
abandonados, atendimento especializado aos dependentes de drogas ou afins;
punição ao abuso e violência sexual praticado contra estes, exemplifica
Veronese97.
Denota-se um grande diferencial se comparada à doutrina
de situação irregular admitida pelo Código de Menores de 1979. Nesta época o
93
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 44.
94
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 45.
95
Dallari citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 37-38.
96
Tópico superior do artigo – tradução livre da autora da pesquisa.
97
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 45.
21
jovem considerado infrator era visto de forma estigmatizada, onde sua conduta
desviante dos padrões de comportamentos estabelecidos dava ensejo à adoção
de medidas repressivas como prisão em internatos, o que o descaracterizava
mais ainda como cidadão, explica Braga citado por Cury98.
A concepção de infância e adolescência era menorizada,
não incorporando a idéia de cidadania. Sua vida familiar, escolar e profissional
não era vista em sua realidade, mas sim de forma ideal. E o ideal para um Estado
centralizador e autoritário como do Brasil dos anos 70, era conservador.
Conservar certos modelos de família, educação, política que mantivessem a
ordem e o progresso da Nação; conservar em prisões os marginais desviantes
daqueles modelos, acrescenta a autora supracitada99.
Desta forma, verifica-se que com a ascensão da CRFB/88,
todos os direitos da criança e do adolescente estão sendo levados em
consideração, haja vista que somente com a aplicação efetiva destes é que
poderão tornar-se cidadãos de direito, beneficiando-se de tudo aquilo que lhe é
garantido por meio desta norma.
1.1.6 O Estatuto da Criança e do Adolescente
Objetivando efetivar de fato os direitos pertencentes à
população infanto-juvenil, surge em 13 de julho de 1990 a Lei n° 8069100,
conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente, com a tarefa de viabilizar
a proteção integral, rompendo com todas as barreiras antes presentes. Agora, a
criança e o adolescente passaram a ser sujeitos de direitos, tornando-se uma
realidade jurídica no país, e não mais apenas discursos teóricos e políticos que
não surtiam quaisquer efeitos, sintetiza Veronese101.
98
Braga citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 369.
99
Braga citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 369.
100
BRASIL. Lei n° 8069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_
03/Leis/L8069.htm> Acesso em: 30 jan. 2009.
101
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. p. 47.
22
Engel102 esclarece que passaram a ter total prioridade aos
direitos fundamentais já expostos no art. 227 da CRFB/88, livre acesso à recente
Justiça da Infância e Juventude, assim como se violar as normas penais, receberá
medida protetiva a criança e ao adolescente será permitido o contraditório,
sempre na presença de um advogado em todas as fases de apuração do ato
infracional.
A inimputabilidade penal continua até os dezoito anos,
sendo que os adolescentes autores de ato infracional estão sujeitos à aplicação
das medidas sócio-educativas. Tais medidas aplicadas não possuem caráter
punitivo, mas sim promovem a reeducação e a ressocialização do menor na
sociedade, cita Engel103.
Há de se considerar que a partir da vigência do Estatuto da
Criança e do Adolescente, o menor passou a ter prioridade na sociedade,
rompendo-se com a doutrina de situação irregular e criando uma doutrina de
proteção integral que o tutela em todas as esferas.
1.2 A DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E
DO ADOLESCENTE
Historicamente, a proteção do menor no Brasil era
impulsionada apenas por uma boa vontade, um espírito de bondade ou
compaixão que movia algumas pessoas. A desigualdade era natural, a
negligência sofrida por parte da família e da sociedade eram evidentes, além de
serem as crianças “aproveitadas” para o trabalho, sem qualquer preocupação
com a exposição a que eram submetidas, pelo fato de serem gravemente
prejudicadas pela sua condição de imaturidade física e intelectual.
A doutrina da proteção integral dos direitos da criança e do
adolescente surgiu como um clamor às tamanhas irregularidades e indignações
102
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 16.
103
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 16.
23
sofridas pelo menor neste país. A doutrina da situação irregular, conforme
mencionada no Capítulo anterior atentou quanto aos direitos previstos em lei, não
reconhecendo o menor como sujeito de direitos, mas sim, apenas meros objetos
desse direito.
Visto como um ser em plena fase de desenvolvimento,
totalmente vulnerável às mudanças que surgem ao longo dessa fase da vida, a
criança e o adolescente não podem mais ficar a mercê do que os “adultos”
pensam ou acreditam que pode ou não ser melhor para elas. Precisam de um
amparo jurídico, que lhes dê toda a garantia necessária quando da busca pelo
seu direito, necessitam da certeza de que poderão exercer sua cidadania de
forma correta sem serem perseguidos por isso, precisam ainda de quem acredite
e que confie neles, expõe Saut104.
É sob esta ótica que surge a doutrina da proteção integral
dos direitos da criança e do adolescente, dando prioridade absoluta em tudo que
diga respeito ao tema infanto-juvenil, levando em consideração seus interesses,
assim como sua condição de pessoa em desenvolvimento, acrescenta o autor105.
Nesse entender, esclarece Dussel citado por Saut106:
[...] a criança e o adolescente não podem mais estar em nenhuma
circunstância sob o critério relativo do que o adulto acha,
pretende, impõe e pensa, mas sim ao critério da sua condição
peculiar de ser em desenvolvimento, em procura de sua
passagem ao ser adulto, em suas necessidades e desejos, em
sua historicidade, em sua ética do ser em vida, em seus plenos
direitos de ser humano integral, portanto, em sua prioridade
absoluta. Criança não se relativiza, criança se absolutiza, na sua
perspectiva de ser humano, e não de ser menor-vitima, mas tão
quanto significativo, expressivo, existencial e sujeito de libertação
enquanto outro [...].
104
SAUT, Roberto Diniz. O novo direito da criança e do adolescente: uma abordagem possível.
Blumenau: Edifurb, 2008. p. 26.
105
SAUT, Roberto Diniz. O novo direito da criança e do adolescente: uma abordagem possível.
p. 58.
106
Dussel citado por SAUT, Roberto Diniz. O novo direito da criança e do adolescente: uma
abordagem possível. p. 26.
24
A doutrina da proteção integral fora materializada por
tratados e convenções, tendo por premissa, especificamente, os seguintes
documentos: a CRFB/88; a Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações
Unidas de 1989; Regras Mínimas das Nações Unidas para Administração da
Justiça da Infância e da Juventude (Regras de Beijing); Regras Mínimas das
Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade; Diretrizes das
Nações Unidas para a Proteção da Delinqüência Juvenil (Diretrizes de Riad) e,
por fim, o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990, citam Cury,
Garrido e Marçura107.
Completam Cury, Garrido e Marçura108 ainda que o
comprometimento dos novos atores pelo nascimento deste novo direito, fez com
que o menor passasse a ser detentor dessa garantia que o torna sujeito de
direitos, passando a dispor de uma proteção integral que lhes assegure prioridade
absoluta, bem como considerar sua peculiar condição de pessoa em
desenvolvimento.
Explica Custódio109 que a doutrina da proteção integral é a
base configuradora do conjunto de princípios e normas jurídicas voltadas à
efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente, que traz em
sua essência a proteção e a garantia do pleno desenvolvimento humano
reconhecendo a condição peculiar de pessoas em desenvolvimento e a
articulação das responsabilidades entre a família, a sociedade e o Estado para a
sua realização por meio de políticas sociais públicas.
Evidente que a transição para um novo direito não é uma
tarefa das mais simples, e com o direito infanto-juvenil não foi diferente. Houve
grande resistência por parte da cultura patrimonialista, centralizadora, paternalista
e autoritária que comandava nesta época, haja vista o conservadorismo que estes
107
CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e
do adolescente anotado. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 21.
108
CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e
do adolescente anotado. p. 21.
109
CUSTÓDIO, André Viana. A doutrina da proteção integral: da exploração do trabalho
precoce ao ócio criativo. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?Id
=1642> Acesso em: 01 de nov. de 2009.
25
sustentavam. O domínio que era exercido perante a sociedade não se pautava no
interesse da população, mas sim no interesse exclusivo desses “donos” do poder,
que eram representados por grandes proprietários e elites dirigentes corruptas e
sem caráter, assevera Saut110.
Para Seda citado por Saut111, a sociedade só adaptar-se-á
ao novo direito desde que participe de maneira efetiva desse processo alternativo
que envolve descentralização, mobilização, proteção integral e prioridade
absoluta ao menor. Somente com esse novo aprendizado é que a população
poderá desvincular-se do velho direito que desrespeitava a cidadania do menor,
passando assim a viver esse novo paradigma que permeia o direito infantojuvenil.
A doutrina de proteção integral dos direitos da criança e do
adolescente, responsável por orientar todo o Direito da Criança e do Adolescente,
vem disposta no art. 1° do ECA112, como conseqüência natural da CRFB/88.
Fundamenta-se na condição de que criança e adolescente
são sujeitos de direitos frente à família, à sociedade e ao Estado, ultrapassando a
idéia de serem apenas objetos de intervenção dos adultos, levando em conta o
superior interesse da criança, buscando colocá-los a salvo de toda negligência,
exploração e crueldade e, quando no caso do menor infrator, permite-lhe as
garantias processuais, assinala Milano113.
Foi o art. 227114 da CRFB/88 o marco para o rompimento da
arcaica doutrina de situação irregular e o surgimento de uma nova política de
110
SAUT, Roberto Diniz. O novo direito da criança e do adolescente: uma abordagem possível.
p. 26.
111
Seda citado por SAUT, Roberto Diniz. O novo direito da criança e do adolescente: uma
abordagem possível. p. 26.
112
“Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente”.
113
MILANO FILHO, Nazir David; MILANO, Rodolfo César. Estatuto da criança e do adolescente
comentado e interpretado de acordo com o novo código civil. 2. ed. São Paulo: Livraria e
Editora Universitária de Direito, 2004. p. 18.
114
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente,
com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
26
atendimento ao direito da criança e do adolescente. No entanto, tais direitos
fundamentais, que nada mais são do que extensão dos direitos humanos,
necessitam ser efetivados, de tal forma que não fiquem apenas no papel, mas
satisfaçam aos seus detentores, acrescenta Machado115.
E para que esta efetividade ocorra, torna-se indispensável a
implementação de políticas públicas que disponibilizem um atendimento imediato
e seguro ao menor e sua família, assim como de políticas sociais básicas que
envolvam quaisquer
crianças
ou adolescentes,
e não apenas
aqueles
economicamente necessitados, fazendo com que a proteção integral alcance a
todas as classes garantindo-lhes direitos fundamentais, continua a autora116.
Por serem sujeitos vulneráveis, Machado117 afirma que
merecem uma tutela jurisdicional que lhes ampare como sujeitos de prevenção,
de proteção, de dignidade e acima de tudo, em pleno exercício de sua cidadania.
Ocorre que essa vulnerabilidade não pode ser o fator determinante da criação
desta norma, até porque não se tratam de sujeitos “fracos”, mas sim da força e da
importância que eles representam para uma nação, por serem o futuro dela.
Portanto, o ECA não merece ser interpretado como mais
uma lei sem aplicabilidade nem resultados concretos. Sua doutrina é embasada
em uma proposta pedagógica, metodológica, política e ética, que permite aos
cidadãos e aos próprios municípios fazerem valer esses direitos fundamentais,
através de uma revolução que interfira tanto na criação de novas políticas
públicas de atenção ao menor, bem como reestruturar o funcionamento dos
organismos que atuam na área118.
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão”.
115
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. Barueri: Manole, 2003. p. 136.
116
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 137.
117
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 141.
118
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 141.
27
Assim sendo, a união das políticas públicas, da tutela
jurisdicional e da própria participação popular acabam por gerar mecanismos
capazes de fazer valer essa doutrina de proteção integral. O já mencionado art.
227 da CRFB/88 expõe que é dever da família, da sociedade e do Estado, ou
seja, dos “adultos”, de colocarem a salvo todos os direitos inerentes à criança e
ao adolescente119.
Nesse ínterim, percebe-se a relevância da sociedade civil,
ou seja, da participação popular, no que diz respeito ao asseguramento dos
direitos
fundamentais
jurisdicional
120
infanto-juvenis,
de
modo
que
provoque
a
tutela
em favor dos direitos fundamentais, conforme disposto no art. 129,
§ 1° da CRFB/88 que diz que “a legitimação do Ministério Público para as ações
civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses,
segundo o disposto nesta Constituição e na lei, explica Machado”121.
Segundo a autora supracitada122, o Ministério Público tem
legitimidade para propor a ação civil pública, dentre outras várias medidas que
considere cabíveis, conforme o disposto em seus incisos. Ademais, o seu
parágrafo 1° legitima também a terceiros, ou seja, a qualquer indivíduo para que
promova também essas ações quando necessário.
Além da participação ativa permitida na cobrança da tutela
jurisdicional, lembra Machado123 que a sociedade civil também deve se fazer
presente na esfera das políticas públicas, conforme destaca o art. 227 da
119
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 141.
120
Tutela jurisdicional consiste na proteção estatal aos direitos não reconhecidos
espontaneamente, esvaziados na sua eficácia ou dependentes de um aval. Sua finalidade
pública, reitere-se, é assegurar a paz social, impedindo a supremacia da força ou a constituição
de situações jurídicas em desacordo com a lei, validando as normas prescritivas do estado
definido na Constituição da República. PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e
do adolescente e tutela jurisdicional diferenciada. p. 72.
121
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 141.
122
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 141.
123
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 141.
28
CRFB/88 em seu parágrafo 7°, que por sua vez deve ser remetido ao art. 204,
inciso II do mesmo dispositivo: Art. 227, §7°: “No atendimento dos direitos da
criança e do adolescente levar-se-á em consideração o disposto no art. 204”.
Expõe assim, o art. 204, II:
“As ações governamentais na área da assistência social serão
realizadas com recursos do orçamento da seguridade social,
previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas com
base nas seguintes diretrizes:
II - participação da população, por meio de organizações
representativas, na formulação das políticas e no controle das
ações em todos os níveis”.
Infere-se, portanto, que a CRFB/88 ampara a comunidade
no sentido da atuação na formulação, assim como no controle da execução das
políticas públicas que dizem respeito também à proteção de crianças e
adolescentes, aduz Machado124.
A idéia da presença da sociedade civil nessas ações acaba
por reforçar a proteção integral, haja vista a proximidade e a convivência com
estes menores detentores de uma legislação que veio para protegê-los em todas
as situações. Assim sendo, a percepção de qualquer situação que atente ao
direito infanto-juvenil pode ser reclamada por qualquer indivíduo da comunidade,
fazendo valer seus deveres de cidadão, zelando então pela integridade do
menor125.
Diante do comprometimento da sociedade política e civil em
fazer acontecer esses novos paradigmas que tutelam os direitos da infância e
juventude trazidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, assim como a luta
pela sua efetividade, quando desrespeitados esses direitos, assevera a autora126,
pode-se dizer que o menor estará protegido em sua condição de ser em
124
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 141.
125
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 141.
126
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 141.
29
desenvolvimento, que só quer a atenção e o carinho do “adulto”, muitas vezes
tendo-o como referência de vida.
É chegada a hora de a sociedade abandonar o antigo
sistema, autoritário e precário que envolvia o comando das legislações e
caminhar para essa nova proposta de garantia da proteção integral aos direitos da
criança e do adolescente que são o futuro da nação brasileira, finaliza
Machado127.
1.3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE
Os direitos fundamentais assegurados a qualquer cidadão
por meio do amparo constitucional, também se estendem, em maior gama, às
crianças e aos adolescentes.
No entanto, por serem especiais e viverem uma fase de
desenvolvimento de sua personalidade, possuem dispositivo legal próprio,
segundo dispõe o art. 3° do ECA:
Art. 3°: A criança e o adolescente gozam de todos os direitos
fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da
proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por
lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim
de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual
e social, em condições de liberdade e dignidade.
Assim sendo, são intrínsecos aos direitos fundamentais o
direito à vida e à saúde, o direito à liberdade, ao respeito e à dignidade, o direito à
convivência familiar e comunitária, o direito à educação, à cultura, ao esporte e ao
lazer, o direito à profissionalização e à proteção no trabalho. Ademais, ainda no
mesmo dispositivo, exemplifica-se que esses direitos devem ser assegurados por
Lei ou qualquer outro meio, de modo a garantir toda a forma de desenvolvimento
vivida por estes menores.
127
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 141.
30
Conforme acrescenta Machado128, a nação brasileira sofre
grandes desigualdades sociais, que acabam interferindo no viver da criança e do
adolescente, por serem sujeitos vulneráveis diante de um mundo conturbado
pelas diferenças. Entretanto, um Direito sempre possui a função de organizar a
sociedade, reconhecendo a existência do Estado Democrático de Direito,
transformando toda a realidade que for possível a fim de que seja assegurada a
dignidade humana.
E para que tais valores se façam presentes, a CRFB/88 vem
reestruturar todo o ordenamento jurídico vigente, inclusive no que diz respeito aos
direitos infanto-juvenis, superando toda desigualdade avassaladora existente
desde a formação histórica da humanidade, construindo assim uma sociedade
mais justa e democrática129.
Para Saut130, o ECA mantém uma forte dimensão por nascer
de parâmetros constitucionais para a sua validade, caracterizando-se uma
obediência possível. É uma Lei-revolução que, apesar do atraso, chega para se
sobrepor ao conservadorismo injusto e inadequado da doutrina de situação
irregular, postulando pela criação de um sistema de direito distinto dos adultos,
zelando pela igualdade jurídica entre todas as crianças e adolescentes,
independente do meio em que vivem.
O autor131 expõe ainda:
O Estatuto estabelece, como Lei-proposta, que os direitos da
criança e do adolescente, declarados e próprios do ser humano,
não podem ficar apenas no declarado, mas devem integrar e
concretizar o direito subjetivo do sujeito de direito, a criança e o
adolescente, com absoluta prioridade, sem a relativização desses
direitos pela omissão ou pela ação de desrespeito. Para tanto,
pode-se ver que o ECA tem intrinsecamente uma metodologia
128
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 130-131.
129
MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. p. 132.
130
SAUT, Roberto Diniz. O novo direito da criança e do adolescente: uma abordagem possível.
p. 66.
131
SAUT, Roberto Diniz. O novo direito da criança e do adolescente: uma abordagem possível.
p. 71.
31
operativo-responsabilizadora, ou em outros termos, o como fazer
acontecer, e por quem, os direitos da proteção integral.
Preconiza ainda o art. 4°132 do mesmo dispositivo, o qual
praticamente transcreve o art. 227 da CRFB/88 já citado anteriormente, que todos
os direitos inerentes da pessoa humana, em especial o infanto-juvenil, deve ser
resguardado em primeiro lugar pela família, que é o alicerce da criação do menor
e que, sem ela ou sem seu apoio, estará totalmente vulnerável às situações de
carência e abandono, enfatiza Engel133.
Por conseguinte, continua o autor134, vem o Estado e a
sociedade civil desempenhando a política de atendimento, onde se fazem
presentes até mesmo os juízes e promotores na aplicação efetiva da Lei,
resguardando-se a tutela aos direitos fundamentais desses pequenos cidadãos.
Nesse contexto, assevera Liberati citado por Engel135:
Por absoluta prioridade, devemos entender que a criança e o
adolescente deverão estar em primeiro lugar na escala de
preocupação dos governantes; devemos entender que, primeiro,
devem ser atendidas todas as necessidades das crianças e dos
adolescentes. [...] entende-se que, na área administrativa,
enquanto não existem creches, escolas, postos de saúde,
atendimento preventivo e emergencial às gestante, dignas
moradias e trabalho, não se deveriam asfaltar ruas, construir
praças, sambódromos, monumentos artísticos, etc., porque a vida,
a saúde, o lar, a prevenção de doenças são mais importantes que
as obras de concreto que ficam para demonstrar o poder do
governante.
Denota-se, no entanto, que os recursos públicos destinados
à administração das políticas públicas, merecem ser investido, com maior
132
Art. 4° do ECA: É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público
assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
133
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 19.
134
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 19.
135
Liberati citado por ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas
sócioeducativas: uma leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios
constitucionais. p. 19.
32
destaque, àquele que carecer de maior proteção, ou seja, a saúde, educação e
moradia desses indivíduos frágeis, que têm seus interesses prevalecentes sobre
qualquer outro interesse.
1.3.1 O direito à vida e à saúde
Sendo assim, o ECA estabelece por primeiro, o direito à vida
e à saúde, primordiais ao desenvolvimento de todo ser humano. Tais direitos
podem ser considerados os mais relevantes dentre todos os demais direitos
fundamentais, conforme dispõe seu art. 7°, a saber:
Art. 7°: A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à
saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que
permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso,
em condições dignas de existência.
Tal dispositivo afirma que todo ser humano é digno de um
nascimento e desenvolvimento sadio, devendo tais pressupostos serem
assegurados por meio do Estado, propiciando as condições mínimas de
assistência realizadas nos hospitais, postos de saúde, serviço social, entre outros
segmentos. São assegurados à gestante o atendimento pré e perinatal perante o
Sistema Único de Saúde, de preferência com o mesmo médico, além de receber
todo o apoio em relação à alimentação quando gestante ou nutriz, assim como
dos medicamentos que necessitar, salienta Engel136.
O Poder Público, por sua vez, tem o dever de prestar ao
menor atendimento médico, especializado, se necessário, medicamentos,
próteses, vacinação e demais recursos por meio do SUS. E havendo confirmação
ou suspeitas de que está a criança ou o adolescente sofrendo maus-tratos, alude
Milano137 que caberá a qualquer cidadão, imediatamente comunicar ao órgão
competente, o Conselho Tutelar, ou, na falta deste, à Vara da Infância e
Juventude.
136
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 21.
137
MILANO FILHO, Nazir David; MILANO, Rodolfo César. Estatuto da criança e do adolescente
comentado e interpretado de acordo com o novo código civil. p. 33-34.
33
1.3.2 O direito à liberdade, ao respeito e à dignidade
O direito à liberdade, ao respeito e à dignidade são trazidos
pelo art. 15 do ECA:
Art. 15: A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao
respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de
desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e
sociais garantidos na Constituição e nas leis.
O direito à liberdade permite à criança e ao adolescente ir e
vir, estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, obedecendo às
restrições legais; expressar sua opinião livremente; professar a própria religião ou
crença, dentro das limitações legais; direito ao lazer, brincando, praticando
esportes, fazendo parte da vida cultural e artística de sua comunidade, acrescenta
Cury138.
Permite ainda participar da vida familiar, nas discussões e
decisões que ocorrerem, assim como na vida comunitária, socializando-se com os
demais, respeitando a condição de cada um; participar da vida política,
expressando sua opinião por meio do voto facultativo a partir dos dezesseis anos
de idade até os dezoito; e por fim, buscar por refúgio, auxílio e orientação quando
achar necessário139.
No que consiste o direito ao respeito, a integridade física,
psíquica e moral do menor devem ser invioláveis, de modo a preservar sua
imagem, identidade, autonomia, valores, idéias e crenças, além dos espaços e
objetos pessoais. A criança e o adolescente merecem ser tutelados em sua
integridade, a fim de que seja preservado seu desenvolvimento, alcançando uma
138
CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e
do adolescente anotado, p. 16.
139
CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e
do adolescente anotado, p. 16.
34
maturidade sadia, criando valores morais e éticos necessários à vida comunitária,
conforme prescreve o art. 17 do ECA140.
Concernente à dignidade, todos devem velar por ela,
colocando a criança e o adolescente a salvo de qualquer tratamento desumano,
violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. Assim, a violação de tais
preceitos acaba por comprometer a honra e o desenvolvimento harmonioso desse
indivíduo, leciona Cury141.
1.3.3 O direito à convivência familiar e comunitária
Os direitos à convivência familiar e comunitária vêm
especificados no art.19:
Art. 19: Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e
educado no seio da sua família natural e, excepcionalmente, em
família substituta, assegurada a convivência familiar e
comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas
dependentes de substâncias entorpecentes.
A família natural142, segundo Cury143, é o primeiro lugar de
convivência da criança. É nela que são recebidos os primeiros ensinamentos e a
proteção necessária para um desenvolvimento sadio. Os filhos devem
permanecer com os pais biológicos, a não ser que tal separação seja necessária
para a proteção dos interesses deste menor. Aqueles filhos havidos ou não da
relação do casamento ou por adoção passam a ter os mesmos direitos e
qualificações, proibidas quaisquer discriminações.
140
Art. 17 do ECA: O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e
moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da
autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
141
CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e
do adolescente anotado. p. 30.
142
Art. 25 do ECA: “Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer
deles e seus descendentes”.
143
CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e
do adolescente anotado. p. 32-33.
35
Para Cury citado por Machado144, o direito fundamental da
criança de ser criado e educado no seio da família possui grande relevância:
Não basta pôr um ser biológico no mundo, é fundamental
complementar a sua criação com a ambiência, o aconchego, o
carinho e o afeto indispensáveis ao ser humano, sem o que
qualquer alimentação, medicamento ou cuidado se torna ineficaz
[...] A família é o lugar normal e natural de se efetuar a educação,
de se aprender o uso adequado da liberdade [...] É onde o ser
humano em desenvolvimento se sente protegido e de onde é
lançado para a sociedade e para o universo...
Prevê ainda o art. 23 do ECA: “A falta ou a carência de
recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do
pátrio poder”, hoje poder de família, cabendo ao Estado, em caso de carência
material, a inserção da família em programas oficiais de auxílio, segundo Engel145.
A colocação em família substituta é medida de proteção, de
caráter excepcional, por meio da guarda, tutela ou adoção, segundo dispõe o art.
28146 do ECA. Essa substituição deve proporcionar-lhes vida comunitária,
integração saudável na sociedade, além de serem levadas em consideração suas
opiniões, expressões e a relação de afinidade ou afetividade evitando-se
conseqüências futuras indesejáveis, aduz Milano147.
1.3.4 O direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer
Já o direito à educação, cultura, esporte e lazer preconizamse no Capítulo IV do ECA. O art. 53 estabelece que a criança e o adolescente
devam ter acesso à educação, visando seu pleno desenvolvimento, preparandolhes para o exercício de sua cidadania, assim como qualificação para o mercado
de trabalho. A educação, sem dúvidas é um direito fundamental que deve ser
intrínseco à formação do ser humano, pois só assim ele poderá tornar-se um
144
Cury citado por MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e
adolescentes e os direitos humanos. p. 156.
145
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 28.
146
Art. 28 do ECA: “A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção,
independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desta Lei”.
147
MILANO FILHO, Nazir David; MILANO, Rodolfo César. Estatuto da criança e do adolescente
comentado e interpretado de acordo com o novo código civil. p. 47.
36
cidadão de honra, fazendo valer seus direitos, mas também cumprindo com os
seus deveres, acrescenta Milano148.
Reza o art. 54 do mesmo dispositivo, que o Estado deve
assegurar à criança e ao adolescente o ensino fundamental e médio obrigatório
gratuito, mesmo àqueles que não tiveram acesso na idade própria, oferecer
atendimento educacional especializado ao portador de deficiência, além de outras
prioridades que permitam ao menor o acesso e permanência a este direito tão
fundamental e necessário, a escola, afirma Liberati 149.
Caberá ainda aos Municípios, com o apoio dos Estados e da
União, conforme consta no art. 59 do ECA, estimular e facilitar a destinação de
recursos e espaços para as programações culturais, esportivas e de lazer
voltadas para a infância e juventude. Portanto, lembra Cury150, o patrimônio
cultural brasileiro, assim como as manifestações desportivas e o incentivo ao
lazer deve ser explorado de forma a manter a promoção social.
Estes são direitos que devem ser tratados com absoluta
seriedade, os quais têm a função de formar uma geração saudável, pautando-se
pela incidência cada vez menor da população infanto-juvenil ser envolvida nas
problemáticas sociais.
1.3.5 O direito à profissionalização e à proteção no trabalho
Quanto ao direito à profissionalização e à proteção no
trabalho, são indispensáveis ao progresso e bem estar do ser humano. Preceitua
o art. 60 do ECA: “ É proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de
idade, salvo na condição de aprendiz”. Este dispositivo vem escrito nos termos da
Emenda Constitucional n° 20: “proibição de trabalho noturno, perigoso ou
insalubre a menor de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis,
148
MILANO FILHO, Nazir David; MILANO, Rodolfo César. Estatuto da criança e do adolescente
comentado e interpretado de acordo com o novo código civil. p. 67.
149
150
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional. p. 52-54.
CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e
do adolescente anotado. p. 65-68.
37
salvo na condição de aprendiz, a partir dos quatorze anos”, sendo-lhe
assegurados os direitos trabalhistas e previdenciários, lembra Milano151.
Com a doutrina de proteção integral zelando pela efetividade
dos direitos fundamentais relacionados à criança e ao adolescente, acredita-se
que estes terão condições de ser um futuro muito promissor para a sociedade
brasileira. Resguardando-se sua saúde, respeitando sua condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento, protegido em seu âmbito familiar, inserido nos
bancos escolares, usufruindo de toda forma de lazer e cultura que sua
comunidade pode oferecer, além da oportunização ao mercado de trabalho, este
menor só tem a crescer, tornar-se um adulto de caráter, que conviva dignamente
numa sociedade que o ampara desde a sua concepção.
1.4 AS MEDIDAS DE PROTEÇÃO DESTINADAS À CRIANÇA E AO
ADOLESCENTE
As medidas de proteção vêm elencadas na Parte Especial
do Estatuto da Criança e do Adolescente em seu Título II, principiando-se pelo art.
98:
Art. 98: As medidas de proteção à criança e ao adolescente são
aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem
ameaçados ou violados:
I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II – por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis;
III – em razão de sua conduta.
Com base neste dispositivo legal, Seda citado por Liberati152
define que as medidas de proteção são aquelas providências tomadas pela
autoridade com poderes especiais sempre que crianças e adolescentes tiverem
ameaçados ou violados seus direitos. Estes, por sua vez, antes de amparados
151
MILANO FILHO, Nazir David; MILANO, Rodolfo César. Estatuto da criança e do adolescente
comentado e interpretado de acordo com o novo código civil. p. 71.
152
Seda citado por LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do
adolescente. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 63.
38
pela doutrina da proteção integral, possuem uma lei suprema, ou seja, a CRFB/88
que os resguarda no concernente aos direitos fundamentais, já expostos no
Subtítulo anterior.
Continua o autor153 que a partir do momento que estes
menores encontrarem-se em situação de vulnerabilidade, essas medidas de
proteção devem ser aplicadas com o intuito de restabelecer a situação de
regularidade, por serem detentores de um tratamento todo especial.
A sociedade e o Estado, citados no inciso I do art. 98 tem o
dever de prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos fundamentais
da criança e do adolescente, segundo reza o art. 4° do ECA, já citado, elucida
Liberati154.
Deve assegurar, por meio do Sistema Único de Saúde, o
atendimento médico e odontológico à gestante, à criança e ao adolescente; o
ensino obrigatório e gratuito do fundamental ao médio; oferecer uma política de
atendimento social protetiva e educativa, dentre outras garantias. No entanto,
quando por qualquer motivo a sociedade e o Estado não assegurarem mais esses
direitos, ou se o fizerem, utilizar-se de forma irregular, estarão deste modo
ameaçando ou violando os direitos infanto-juvenis155.
Em análise ao inciso II, a falta, a omissão ou o abuso dos
pais ou responsáveis também acabam por violar os direitos desses menores. A
falta caracteriza-se pela morte ou ausência do maior, o que não se configura pela
simples distância física156.
Essa falta da figura responsável, o alguém que lhe sirva de
exemplo ou até mesmo o carinho e atenção que deixa de receber pode abalar
fortemente o desenvolvimento qualquer criança. A omissão também pode gerar a
153
Seda citado por LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do
adolescente. p. 63.
154
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 64.
155
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 64.
156
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 64.
39
situação de risco, identificada no desamparo do ser que necessita ser protegido,
assim como na negligência que acaba gerando o descuido, a desatenção, o
menosprezo, que por sua vez acarretam na vulnerabilidade destes menores157.
Pode ocorrer ainda o abuso por parte destes pais ou
responsáveis, interpretado de diversas formas: a exorbitância das atribuições do
poder paterno; a violência sexual como o estupro; e ainda maus-tratos, colocando
em perigo a vida ou a saúde daquele que se ache sob sua autoridade, segundo
reza o art. 136158 do Código Penal159 160.
Quanto ao inciso III, Liberati161 acrescenta que o menor pode
tornar-se merecedor da aplicação da medida de proteção quando, em razão da
sua própria conduta, ameaçar ou violar seus direitos, infringindo as leis,
enveredando-se pelo caminho das drogas, da violência, dentre outros fatores.
Tais comportamentos podem dar ensejo à prática de atos infracionais, gerando,
portanto, uma ação judiciária ou tutelar que deverá impor a medida protetiva que
se adequar ao caso.
Ocorrendo quaisquer das hipóteses elencadas nos incisos
do art. em comento, verifica-se a situação de risco, referida pelas expressões
“ameaçados” e “violados”, antes inexistentes na doutrina da situação irregular que
se utilizava de termos como “menor abandonado”, “carente”, “delinqüente” etc.
Caberá deste modo à autoridade judiciária competente ou ao próprio Conselho
Tutelar tomar as devidas providências trazidas pelo art. 101 do ECA, que será
mencionado adiante162.
157
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 64.
158
“Art. 136 CP: Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou
vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de
alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado,
quer abusando de meios de correção ou disciplina: Pena - detenção, de dois meses a um ano,
ou multa”.
159
BRASIL. Decreto-Lei n° 2848 de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: <http://
www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del2848.htm> Acesso em: 03 fev. 2009.
160
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 64.
161
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 64.
162
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 64.
40
Ressalta-se
que
“o
Conselho
Tutelar
é
um
órgão
permanente e autônomo, não jurisdicional encarregado pela sociedade de zelar
pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente”, conforme traz o art.
131 do ECA. Os responsáveis pela formação deste órgão é a própria comunidade
local, que elege cinco membros para o mandato de três anos, podendo ser
reeleitos por mais uma vez.
Saut163 esclarece que o Conselho Tutelar:
[...] é a voz, é a advocacia do superior interesse da criança e do
adolescente. Um órgão eleito pela sociedade civil organizada para
constituir-se no controle social e no interesse da própria sociedade
em proteger em sua integralidade o sujeito de direitos
criança/adolescente e conceder-lhe prioridade absoluta em todas
as circunstâncias. Além disso, deve zelar pela condição peculiar
da criança e do adolescente, com defesa radical dos seus “direitos
humanos e da sua dignidade humana [...]”.
Por sua estabilidade, seus membros são renovados, porém,
o órgão nunca pode deixar de existir. Sua autonomia lhe dá condições de decidir
e aplicar as medidas protetivas que considerar mais adequadas, sem a
necessidade de determinação judicial para tanto. É fiscalizado pelo Conselho
Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, pela autoridade judiciária,
pelo Ministério Público e demais entidades que atuam com a população infantojuvenil, explica Liberati164.
Porém, por não ser jurisdicional não pode fazer cumprir
determinações legais ou punir quando infringidas, devendo, portanto, encaminhar
ao Ministério Público quaisquer infrações em relação aos direitos da criança e do
adolescente, conforme dispõe o art. 136 do ECA165.
163
SAUT, Roberto Diniz. O novo direito da criança e do adolescente: uma abordagem possível.
p. 74.
164
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 7. ed.
São Paulo: Malheiros, 2003. p. 134.
165
Art. 136 do ECA: “São atribuições do Conselho Tutelar: IV - encaminhar ao Ministério Público
notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou
adolescente”.
41
Poderá ainda, segundo aduz Liberati166, fiscalizar as
entidades governamentais e não governamentais de atendimento à criança e ao
adolescente, como é o caso das execuções dos programas de proteção e das
medidas sócio-educativas167. Havendo irregularidades em tais atendimentos,
poderá representar judicialmente168 ou mediante auto de infração169.
No Estado de Santa Catarina existe
a Associação
Catarinense de Conselhos Tutelares - ACCT, criada na década de 90, em defesa
da luta pela operacionalização do ECA no Estado. Promovem a formação e
capacitação dos Conselhos Tutelares, dos Conselhos de Direitos, além dos
profissionais sociais através de seminários de formação realizados anualmente,
informa Saut170.
Em virtude da vulnerabilidade sofrida pela criança ou
adolescente em razão de omissão do Estado, falta, abuso dos pais ou até mesmo
em razão da sua própria conduta, a autoridade competente determinará a
aplicação das medidas de proteção expostas no art. 101171 do ECA.
166
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
134.
167
Art. 95 do ECA: “As entidades governamentais e não-governamentais referidas no art. 90 serão
fiscalizadas pelo Judiciário, pelo Ministério Público e pelos Conselhos Tutelares”.
168
Art. 191 do ECA: “O procedimento de apuração de irregularidades em entidade governamental
e não-governamental terá início mediante portaria da autoridade judiciária ou representação do
Ministério Público ou do Conselho Tutelar, onde conste, necessariamente, resumo dos fatos”.
169
Art. 194 do ECA: “O procedimento para imposição de penalidade administrativa por infração às
normas de proteção à criança e ao adolescente terá início por representação do Ministério
Público, ou do Conselho Tutelar, ou auto de infração elaborado por servidor efetivo ou voluntário
credenciado, e assinado por duas testemunhas, se possível”.
170
SAUT, Roberto Diniz. O novo direito da criança e do adolescente: uma abordagem possível.
p. 75.
171
“Art. 101 do ECA: Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade
competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: I - encaminhamento aos
pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II - orientação, apoio e
acompanhamento temporários; III - matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento
oficial de ensino fundamental; IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à
família, à criança e ao adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou
psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou
comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; VII - abrigo em
entidade; VIII - colocação em família substituta. Parágrafo único. O abrigo é medida provisória e
excepcional, utilizável como forma de transição para a colocação em família substituta, não
implicando privação de liberdade”.
42
Por autoridade competente, entende-se o Conselho Tutelar,
nas hipóteses dos incisos I a VII e a autoridade judiciária172, quando da ocorrência
do inciso VIII do artigo em comento. Será ainda competente a autoridade
judiciária para aplicar as medidas dos incisos I a VI, quando se tratar de
adolescente autor de ato infracional, elucida Cury173.
No que concerne às medidas de proteção, o inciso I destaca
a relevância da família como sendo o ambiente mais propício para a formação e
integração comunitária do menor. Contudo, antes de devolvê-lo à família,
necessário realizar-se um estudo social de modo a verificar se esta estará apta a
recebê-lo,
sem
conflitos
de
interesses
desenvolvimento, acrescenta Liberati
Esse
estudo
174
que
possam
prejudicar
seu
.
ainda
permite
verificar
que
tipo
de
acompanhamento necessita essa criança ou adolescente, segundo determinam
os incisos II e IV. No inciso III, toda criança deve estar matriculada em
estabelecimento de ensino, pois a escola tem a missão de formá-la e prepará-la
para a vida, cabendo aos professores, pais ou responsáveis atestarem sua
freqüência175.
Já o inciso V trata da prioridade ao tratamento médico,
psicológico ou psiquiátrico em regime hospitalar ou ambulatorial na rede pública
de
atendimento,
devendo
a
própria
escola
também
estar
apta
ao
encaminhamento devido quando necessário. A grande incidência do uso de
substâncias tóxicas pelas crianças e adolescentes, torna necessária a inclusão
172
Art. 146 do ECA: A autoridade a que se refere esta Lei é o juiz da infância e da juventude, ou o
juiz que exerce essa função, na forma da lei de organização judiciária local.
173
CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e
do adolescente anotado. p. 91.
174
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
85.
175
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
85.
43
em programa oficial para orientação e tratamento quando alcoólatras ou
toxicômanos, conforme expõe o inciso VI, cita Milano176.
Discorre o autor177 que os incisos VII e VIII estão
relacionados, de maneira que o abrigo em entidade seria uma forma de
passagem para a colocação em família substituta. Porém, na grande maioria dos
casos não é o que ocorre, já que muitas crianças e adolescentes permanecem
nos abrigos por um lapso temporal muito superior ao devido, pelo fato de faltarlhes a família, quer a de origem, que a substituta, fazendo com que este abrigo
seja sua própria casa, e seus ocupantes, sua família.
Assim sendo, verifica-se que violados ou ameaçados os
direitos fundamentais de toda criança ou adolescente, caberá a aplicação das
medidas de proteção, como forma de assegurar seu pleno desenvolvimento, ou
então reconstruir aquilo que fora violado por falha ou negligência de alguém.
Contudo, esse menor também pode ser o responsável por
violar ou por em risco seu próprio direito, quando infringe as leis, vindo a praticar
atos infracionais.
Sobre os atos infracionais, tratará o Capítulo seguinte
abordando sua apuração e conseqüente aplicação da medida que se considerar
cabível.
176
MILANO FILHO, Nazir David; MILANO, Rodolfo César. Estatuto da criança e do adolescente
comentado e interpretado de acordo com o novo código civil. p. 108.
177
MILANO FILHO, Nazir David; MILANO, Rodolfo César. Estatuto da criança e do adolescente
comentado e interpretado de acordo com o novo código civil. p. 108-109.
44
CAPÍTULO 2
ATO INFRACIONAL E SUA APURAÇÃO
2.1 O ATO INFRACIONAL
Após acompanhar a trajetória do desenvolvimento histórico
do direito infanto-juvenil e do surgimento de uma doutrina de proteção integral que
têm por premissa garantir às crianças e adolescentes um desenvolvimento mais
digno, seguro e respeitável, diferente do que ocorria na ultrapassada doutrina de
situação irregular, convém tratar este Capítulo dos menores quando em conflito
com a lei, na prática de atos infracionais.
O conceito de ato infracional, prescreve o art. 103 do ECA:
“Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção
penal”.
Como se pode verificar, a legislação em comento vale-se de
alguns preceitos estabelecidos na lei penal, quando cita o crime e a contravenção
penal como condutas que, praticadas pelo menor, resultam em ato infracional.
Assim sendo, necessário se faz conceituar crime e contravenção penal.
Por primeiro, busca-se o conceito na Lei de Introdução ao
Código Penal e à Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei n° 3.914 de 09 de
dezembro de 1941)178, em seu art. 1°:
Art. 1°: Considera-se crime a infração penal a que a lei comina
pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer
cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração
penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou
de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.
178
BRASIL. Código penal, código de processo penal, legislação penal e processual,
Constituição Federal. Organização Luiz Flávio Gomes. 11. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2009. p. 215.
45
No conceito de Mirabete179, crime necessita ser analisado
sob três aspectos diversos, quais sejam: formal, material e analítico. O primeiro,
formal, refere-se ao aspecto externo, puramente nominal do fato, pautando-se na
concepção de que crime é ilícito penal que gera contradição a uma norma do
direito, ou seja, sua ilegalidade como fato contrário à norma penal. O segundo
aspecto, material, leva em conta o conteúdo do fato punível, assim sendo, “crime
é a conduta humana que lesa ou expõe a perigo um bem jurídico protegido pela
lei penal”. Por fim, examinando-se as características ou aspectos do crime tem-se
o caráter analítico, que define crime como a “ação típica, antijurídica e culpável”.
Quanto às contravenções penais, considera o autor
180
supracitado
que não existe diferença intrínseca, substancial ou qualitativa entre
elas e o crime, sendo ambas as espécies de infração penal.
Para Falconi181, crime é um fato considerado injusto punível,
provocado pelo homem, de relevância jurídica, típico, tendo por componentes o
agente e a ilicitude, devendo ser apurada a culpabilidade, da qual deriva a
punibilidade.
Concernente
às
contravenções
penais,
relata
serem
“condutas inconvenientes, mas que pouco refletem no ordenamento social,
merecendo destarte represália de somenos importância”. Cita ainda alguns
exemplos de tais infrações como dirigir veículo sem habilitação, a prática de jogo
de bicho, a vadiagem, o porte de arma, entre outras meras condutas182.
Portanto, nota-se que ato infracional não deixa de ser um
crime ou contravenção penal, por ser também uma conduta contrária à lei, porém,
praticado por menor de dezoito anos, sujeitos a penalidade, só que de caráter
educativo e mais brando, o que difere daquelas às quais se submetem os adultos,
por levar-se em conta sua peculiar condição de pessoa em desenvolvimento.
179
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 81-82.
180
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 117.
181
FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal. 3. ed. São Paulo: Ícone, 2002. p. 152.
182
FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal. p. 166.
46
Esclarecidos os conceitos determinantes para o ato
infracional, verifica-se agora de maneira mais aprofundada quando este é
praticado por criança ou adolescente.
O art. 104 do ECA vem estabelecer o seguinte:
Art. 104: São penalmente inimputáveis os menores de dezoito
anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei.
Parágrafo único: Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a
idade do adolescente à data do fato.
Tal preceito já tem seu embasamento na CRFB/88, quando
em seu art. 228 reza que “são penalmente inimputáveis os menores de dezoito
anos, sujeitos às normas da legislação especial”.
Embora trate o ECA dos menores de dezoito anos como
seres inimputáveis penalmente, tal preceito não se remete à impunidade, devendo
os mesmos ser responsabilizados pelas suas atitudes que colidirem com a
legislação penal, expõe Ferrandin183.
Só podem ser penalizados pela prática de crime e
contravenção penal os imputáveis, ou seja, aqueles maiores de dezoito anos de
idade à época do fato. Nos casos em que a autoria da conduta típica for de
criança ou adolescente, não haverá crime ou contravenção penal, mas sim ato
infracional, em decorrência da ausência de culpabilidade, assim como da
punibilidade, explica Engel184.
Ainda neste entender, a Exposição de Motivos da Parte
Geral do Código Penal (Lei n° 7.209 de 11 de julho de 1984)185, em seu item n.
183
FERRANDIN, Mauro. Princípio constitucional da proteção integral e direito penal juvenil:
possibilidade e conveniência de aplicação dos princípios e garantias do direito penal aos
procedimentos previstos no estatuto da criança e do adolescente. p.33.
184
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 39.
185
BRASIL. Código penal, código de processo penal, legislação penal e processual,
Constituição Federal. Organização Luiz Flávio Gomes. p. 222.
47
23, prevê a permanência da inimputabilidade penal ao menor de dezoito anos, ou
seja:
[...] Os que preconizam a redução do limite, sob a justificativa da
criminalidade crescente, que a cada dia recruta maior número de
menores, não consideram a circunstância de que o menor, ser
ainda incompleto, é naturalmente anti-social na medida em que
não é socializado ou instruído. O reajustamento do processo de
formação do caráter deve ser cometido à educação, não à pena
criminal. De resto, com a legislação de menores recentemente
editada, dispõe o Estado dos instrumentos necessários ao
afastamento do jovem delinqüente, menor de 18 (dezoito) ano, do
convívio social, sem sua necessária submissão ao tratamento do
delinqüente adulto, expondo-o à contaminação carcerária.
Ao menor em conflito com a lei não se aplicam penas,
contudo, sujeitam-se às medidas protetivas quando criança, e às medidas sócioeducativas quando adolescente. Tais medidas possuem caráter educativo e
protetivo, sem critérios rígidos de duração, sendo necessário para sua aplicação,
levar-se em consideração não somente sua conduta transgressora, mas também
todas as circunstâncias, condições e peculiaridades ensejadoras de tal conduta
como sua condição social, referência familiar, dano causado pelo delito, etc,
esclarece Mousnier186.
2.1.1 O ato infracional cometido por criança
No que concerne à idade do menor quando da prática do ato
infracional, convém distinguir criança e adolescente, na medida em que sua
sanção é diferenciada.
O art. 105 do ECA trata do ato infracional cometido por
criança: “Ao ato infracional praticado por criança corresponderão as medidas
previstas no art. 101”.
Considera-se criança, pela legislação em comento, a pessoa
de até doze anos de idade incompletos. A faixa etária nessa legislação segue a
critérios estabelecidos pela política legislativa, que leva em conta a média das
186
MOUSNIER, Conceição A. O ato infracional à luz da Constituição Federal, do estatuto da
criança e do adolescente e das regras mínimas de Beijing. Líber Júris, 1991. p. 17.
48
classificações existentes em outros ramos do conhecimento a respeito da época
provável da passagem da infância para a adolescência. Tal critério adotado pelo
legislador preconiza a proteção integral da criança ou adolescente que é devida
em função de sua faixa etária, pouco importando se adquiriu capacidade civil,
refere Cury187.
Para Albergaria citado por Liberati188, a distinção etária se
faz importante, uma vez que a infância é o período decisivo para o
desenvolvimento da pessoa humana, onde a socialização que inicia nessa fase
prossegue à adolescência, contribuindo na aquisição de sua consciência moral.
Farinetti citado por Cury189 atribui ao conceito de infância a
importância da influência do processo interativo com o meio social e cultural onde
está inserido esse indivíduo, ou seja:
[...] por infância entende-se um vasto e diversificado período da
vida, em que tem lugar um processo de formação de estruturas
básicas bio-psico-sociais, caracterizado, principalmente, pela
acentuada dependência e vulnerabilidade dos fatores ambientais.
Por ser a infância uma fase de extrema relevância para o
desenvolvimento da personalidade humana, onde o caráter e personalidade estão
ainda em formação, a possibilidade de cometimento de ato infracional por criança
se faz presente.
Quando isso ocorrer, não merecem ser processados, sequer
punidos como os adolescentes e adultos. O procedimento a ser tomado diante de
tal conduta inicia-se com a apreensão pela polícia, que a conduz ao Conselho
Tutelar, órgão já referido no Capítulo anterior, ou então à autoridade judiciária,
que fará juízo de valor acerca do ato praticado, aplicando umas das medidas
protetivas previstas no art. 101 do ECA, também já citado no Capítulo anterior.
187
CURY, Munir; PAULA, Paulo Afonso Garrido de; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da
criança e do adolescente anotado. p. 21-22.
188
Albergaria citado por LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do
adolescente, 2003. p. 16.
189
Farinetti citado por CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto.
Estatuto da criança e do adolescente anotado. p. 33.
49
Liberati190 acrescenta acerca deste procedimento:
Por mais “hediondo” que seja o ato infracional praticado pela
criança, ela não poderá ser conduzida à delegacia de polícia. A
autoridade policial não tem competência para investigar e apurar
as provas do ato criminoso praticado pela criança. A competência
originária é do Conselho Tutelar; a subsidiária é da autoridade
judiciária, por força do disposto no art. 262191 do ECA.
Ainda neste ínterim, cabem citações jurisprudenciais a fim
de ilustrar como ocorre na prática tal procedimento. Cury, Paula e Marçura192
citam que:
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), em seu
art. 2°, distingue a criança (menor de 12 anos) do adolescente
(entre 12 e 18 anos). Somente para este último é que prevê
garantias processuais (art. 110). Para a criança, só fala em
medidas de proteção (arts. 99 a 102 e 105). Logo, abusiva foi a
intimação do juiz para que a criança viesse formalmente a juízo e
perante ele e advogados prestasse declarações, assinando o
respectivo termo. Tal atitude, que demonstra insensibilidade, foi
abusiva e podia ser corrigida pela via do habeas corpus193. (RT
707/374).
No mesmo sentido:
Infração – Medida sócio-educativa – Inaplicabilidade – Ato
praticado por criança e não por adolescente – Arts. 2° e 112 do
ECA – Ineficácia da sentença declarada. Sendo criança, por
definição legal, ao menor não se aplicam os dispositivos que
regem a prática de atos por adolescentes (JTJ 146/130)194.
Diante de tal apontamento, verifica-se que a criança não
sujeitar-se-á aos mesmos procedimentos judiciais que destinam-se aos
adolescentes, ou seja, às medidas sócio-educativas, conforme será analisado a
190
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 74.
191
Art. 262 do ECA: “Enquanto não instalados os Conselhos Tutelares, as atribuições a eles
conferidas serão exercidas pela autoridade judiciária.”
192
CURY, Munir; PAULA, Paulo Afonso Garrido de; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da
criança e do adolescente anotado. p. 95/96.
193
Art. 5°, LXVIII da CRFB/88: Conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se
achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade
ou abuso de poder;
194
CURY, Munir; PAULA, Paulo Afonso Garrido de; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da
criança e do adolescente anotado. p. 96.
50
seguir, mas sim, às medidas de proteção abordadas no subtítulo 1.4 do Capítulo
anterior.
Verificados os conceitos de criança, assim como o
procedimento judicial a ser tomado diante da prática de um ato infracional por
esta, parte-se então para a fase posterior, da adolescência, sua definição e o
referido procedimento quando este encontrar-se em conflito com a lei.
2.1.2 O ato infracional cometido por adolescente
Preconiza o art. 2° do ECA que adolescente é aquela
pessoa entre doze e dezoito anos de idade.
Para Paula citado por Garrido195, a adolescência representa:
(...) uma fase do desenvolvimento cognitivo, iniciada na infância e
que se estende até a idade adulta, caracterizada principalmente
pelo raciocínio hipotético, capacidade de pensar sobre problemas
e realidades, assimilação de padrões e normas adultos (...). A
adolescência termina, portanto, com o completar do processo de
aquisição de mecanismos mentais relacionados ao pensamento,
percepção, reconhecimento, classificação etc. (...).
Questão que muito se discute é aquela que determina o
exato momento em que o adolescente atinge a idade delimitadora tanto para a
adolescência quanto para a maioridade. Há aqueles que consideram o horário do
dia do nascimento, outros que levam em conta o término do dia em que a idade é
alcançada. Contudo, a tese mais aceita é aquela que considera o primeiro
instante do dia em que o menor festeja seu aniversário, pois neste dia conta com
a idade limite, estando apto, portanto, a responder pelos seus atos, assim como
receber benefícios, conforme dispõe a Lei, expõe Milano196.
O já mencionado art. 104 do ECA, em seu parágrafo único,
traça a teoria da atividade do ato infracional, ou seja, deve ser considerada a
195
Paula citado por PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e do adolescente e
tutela jurisdicional diferenciada. p. 33.
196
MILANO FILHO, Nazir David. Estatuto da criança e do adolescente comentado e
interpretado de acordo com o novo código civil. p. 22.
51
idade do adolescente à data do fato, acrescenta o autor197. Assim sendo, mais
uma vez se faz presente a legislação penal, mais precisamente, o Código Penal,
que em seu art. 4° que adota a referida teoria, considera praticado o crime no
momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado, ou
seja, o que vale é o momento da ação ou omissão, a conduta.
Há de se verificar então que a Lei 8069/90 – ECA, também
comporta teorias que embasam o ordenamento jurídico penal. Praticada a
conduta delitiva descrita em dispositivo de lei penal, verificar-se-á de imediato a
idade do indivíduo, a fim de identificar a sanção ao qual este será submetido.
O Superior Tribunal de Justiça preconiza o seguinte:
Na aplicação de medidas sócio-educativas previstas no Estatuto
da Criança e do Adolescente – ECA, leva-se em consideração a
idade do menor ao tempo da prática do fato, sendo irrelevante,
para efeito de cumprimento da sanção, a circunstância de atingir a
maioridade (STJ, RHC 7.308/98-SP, DJU 27.04.1998, p. 217)198.
Em análise ao disposto, entende-se que se um adolescente
comete um delito aos dezessete anos, onze meses e vinte e nove dias e esse
delito só vem a ser descoberto quando contar com 18 anos de idade, não
responderá criminalmente, mas sim, por ter cometido ato infracional, estando
sujeito à legislação especial – ECA, conforme Ishida199. Comprova-se assim a
Teoria da Atividade que leva em conta a época da prática do fato, como
exemplificado acima, não importando se fora descoberto tal delito apenas quando
já completados seus dezoito anos, e sim quando o cometeu o ato, mesmo prestes
a atingir a maioridade penal.
2.1.2.1 O procedimento na fase policial
Concernente ao procedimento judicial
em
relação à
apuração do ato infracional atribuído ao adolescente, convém destacar, segundo
197
MILANO FILHO, Nazir David. Estatuto da criança e do adolescente comentado e
interpretado de acordo com o novo código civil. p. 22.
198
CURY, Munir; PAULA, Paulo Afonso Garrido de; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da
criança e do adolescente anotado. p. 95.
199
ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e jurisprudência. 5. ed.
São Paulo: Atlas, 2004. p. 178.
52
o art. 106 do ECA, que “nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão
em flagrante delito de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada de
autoridade judiciária competente”, enfatiza Liberati200.
Referido
artigo
denota
a
assegurada a este menor, emanada do art. 5°, LXI
garantia
201
individual
que
é
da CRFB/88, aduz Marçura
citado por Cury202.
Liberati203, manifesta-se a respeito:
Em três momentos distintos esse adolescente verá o
processamento de seu ato: o primeiro, realizado pela Polícia
Judiciária, quando o apreende ao produto e os instrumentos da
infração e determina diligências investigatórias (arts. 171-178); o
segundo, ao ser apresentado ao Ministério Público, para a
audiência informal, com os seus responsáveis, testemunhas e
vítimas (arts. 179-182); o terceiro momento ocorre na fase judicial,
quando o adolescente será ouvido pelo juiz, na presença de seus
pais ou responsável e de seu advogado (arts. 183-190).
A ordem escrita e fundamentada deve emanar de autoridade
judiciária competente, que nos moldes do art. 146 do ECA é o juiz da infância e
da juventude, acrescenta Marçura citado por Cury204.
Cabe ressaltar que o Ministério Público detém a titularidade
da ação sócio-educativa pública, cabendo, com exclusividade, representar à
autoridade judiciária para instaurar o devido procedimento para a apuração do ato
infracional. A autoridade policial apenas lavrará o auto de apreensão ou boletim
200
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
177.
201
Art. 5°, LXI da CRFB/88: Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou
crime propriamente militar, definidos em lei.
202
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 532.
203
204
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 151.
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 532.
53
de ocorrência ao Ministério Público, que, com base nas informações contidas
decidirá sobre a conveniência ou não da requisição da abertura do inquérito205.
Havendo a apreensão em razão de ordem judicial, deve o
adolescente de imediato ser encaminhado à autoridade judiciária ou entidade de
atendimento estabelecida no mandado, continua Marçura citado por Cury206.
Ainda em relação ao procedimento na fase policial, poderá o
adolescente ser apreendido em flagrante207, devendo imediatamente ser
encaminhado à autoridade competente, conforme expressa o art. 172208 do ECA.
Evidenciado o flagrante delito, ou seja, a certeza de sua
existência e autoria deve o agente policial que efetuou a apreensão encaminhar
imediatamente o adolescente à autoridade policial competente, devendo ser
observada a proibição da condução deste em veículo policial de compartimento
fechado209, conhecido popularmente por camburão, bem como ser evitado o uso
de algemas, cabível somente nas hipóteses que se configurarem necessárias a
contenção e segurança, elucida Liberati210.
Consumada a apreensão em flagrante, cabe à autoridade
policial distinguir se o ato infracional foi cometido com violência ou grave ameaça
a pessoa. Em caso afirmativo, deverá lavrar o auto de apreensão, sendo que no
caso de co-autoria com um maior poderá ser lavrado um único auto, de prisão em
205
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 532-540.
206
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 532.
207
Art. 302. do CPP: Considera-se em flagrante delito quem: I - está cometendo a infração penal;
II - acaba de cometê-la; III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por
qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV - é encontrado, logo
depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da
infração.
208
Art. 172 do ECA: O adolescente apreendido em flagrante de ato infracional será, desde logo,
encaminhado à autoridade policial competente.
209
Art. 178 do ECA: O adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional não poderá ser
conduzido ou transportado em compartimento fechado de veículo policial, em condições
atentatórias à sua dignidade, ou que implique risco à sua integridade física ou mental, sob pena
de responsabilidade.
210
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2003, p.
179-183.
54
flagrante e apreensão. Não sendo o ato praticado com violência ou grave
ameaça, será facultada a lavratura do auto de apreensão, podendo ser
substituído por boletim de ocorrência circunstanciado que contenha a descrição
do fato, acrescenta Marçura citado por Cury 211.
Havendo co-autoria de adolescente com outro maior de
dezoito anos, serão todos encaminhados à Delegacia de Polícia Especializada da
Criança e do Adolescente, se houver. Lá, o delegado procederá às diligências
determinadas no art. 173 do ECA212, sendo que conclusos os procedimentos
referente ao adolescente, entregá-lo-á a seus responsáveis, remetendo o maior à
delegacia de polícia distrital com as informações colhidas nesta fase inicial,
assevera Liberati213.
Lavrado ou não o auto de apreensão, a autoridade policial
deverá proceder a todas as diligências necessárias a fim de comprovar a
materialidade bem como a autoria da infração, uma vez que a aplicação das
medidas sócio-educativas requer prova suficiente da autoria e materialidade do
ato infracional, conforme prevê o art. 112 do ECA, lembra Marçura citado por
Cury214.
Portanto, verificando a autoridade policial que a conduta
atribuída ao adolescente não constitui ato infracional deverá ordenar sua imediata
liberação, sob pena de incidir no disposto no art. 234 do ECA, que comina
detenção de seis meses a dois anos àquele que infringir tal preceito215.
211
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 534.
212
At. 173 do ECA: Em caso de flagrante de ato infracional cometido mediante violência ou grave
ameaça a pessoa, a autoridade policial, sem prejuízo do disposto nos arts. 106, parágrafo único,
e 107, deverá: I - lavrar auto de apreensão, ouvidos as testemunhas e o adolescente; II apreender o produto e os instrumentos da infração; III - requisitar os exames ou perícias
necessários à comprovação da materialidade e autoria da infração.
213
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
179.
214
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 534.
215
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 535.
55
Cumpridas as diligências previstas no art. 173 do ECA, a
autoridade policial deverá liberar o adolescente, desde que na presença dos pais
ou
responsáveis.
Neste
ato,
será
firmado
termo
de
compromisso
e
responsabilidade a fim de que o adolescente seja apresentado ao promotor de
justiça neste mesmo dia, ou o mais rápido possível, enfatiza Liberati216.
Cometido o ato mediante violência ou grave ameaça à
pessoa, segundo dispõe o art. 174 do ECA217, poderá este não ser liberado, mas
encaminhado
à
entidade
de
atendimento
que
mantenha
programa
de
internação218.
A gravidade do ato infracional se caracteriza pela sua forma
de penalidade, ou seja, de acordo com a lei penal vigente no país, os crimes
considerados graves são apenados com reclusão, regime de cumprimento de
pena que será cumprido em regime fechado ou semi-aberto, exemplifica Marçura
citado por Cury219.
Concernente ao ato infracional de repercussão social, podese dizer, segundo o autor supracitado220:
[...] é aquele que provoca clamor público, gerando nas pessoas
sentimento de indignação, como só acontece, em regra, nos
crimes cometidos mediante violência ou grave ameaça contra a
pessoa, sendo exemplos notórios os crimes de extorsão mediante
seqüestro, estupro, atentado violento ao pudor, roubo, latrocínio e
homicídio qualificado.
216
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 7. ed.
São Paulo: Malheiros, 2003. p. 181.
217
“Art. 174 do ECA: Comparecendo qualquer dos pais ou responsáveis, o adolescente será
prontamente liberado pela autoridade policial, sob termo de compromisso e responsabilidade de
sua apresentação ao representante do Ministério Público, no mesmo dia ou, sendo impossível,
no primeiro dia útil imediato, exceto quando, pela gravidade do ato infracional e sua repercussão
social, deva o adolescente permanecer sob internação para garantia de sua segurança pessoal
ou manutenção da ordem pública”.
218
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
181.
219
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 535.
220
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 535-536.
56
Os critérios adotados para o estabelecimento da internação
são diversos. Preocupa-se o legislador em garantir a segurança pessoal do
adolescente, bem como a manutenção da ordem pública. A medida de internação
deve atender, portanto, as necessidades pedagógicas deste, mediante regular
instrução, assegurados o contraditório e a ampla defesa221.
“Em
caso
de
não
liberação,
a
autoridade
policial
encaminhará, desde logo, o adolescente ao representante do Ministério Público,
juntamente com cópia do auto de apreensão ou boletim de ocorrência”, prevê o
art. 175 do ECA.
Evidente se faz a importância da apresentação do
adolescente ao representante do Ministério Público, titular da ação, que somente
tomará as providências cabíveis segundo o que lhe é apresentado no auto de
apreensão ou boletim de ocorrência requisitado à autoridade policial.
2.1.2.2 O procedimento no Ministério Público
Realizadas as diligências investigatórias na fase policial,
necessárias à confirmação da autoria e materialidade da infração, parte-se para o
procedimento no Ministério Público, que receberá o adolescente, procederá à
imediata e informal oitiva deste, assim como de seus pais ou responsáveis, da
vítima e das testemunhas, se possível, segundo reza o art. 179 do ECA, cita
LIberati222.
Em caráter ilustrativo, julgado do TJSP refere que, a dita
audiência informal, que dispensa a necessidade de reduzir a termo as
declarações, pode ser feita verbalmente, buscando os seguintes quesitos:
informações e elementos diversos dos já colhidos que possibilitem o Promotor de
Justiça promover o arquivamento ou conceder a remissão, o que leva a extinção
221
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 536.
222
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
184.
57
processual,
bem
como,
possibilitar
ao
adolescente
discutir
seus
atos,
convencendo o Promotor a conceder-lhe o perdão judicial223.
Recebidos os elementos indispensáveis para a formação de
seu juízo crítico referente ao caso, o representante do Ministério Público adotará
um das seguintes alternativas: promoverá o arquivamento dos autos; concederá a
remissão; representará à autoridade judiciária para aplicação de medida sócioeducativa, nos moldes do art. 180 do ECA, enfatiza Marçura citado por Cury224.
Todos estes atos, exige a Lei que sejam fundamentados
pelo Ministério Público, resumindo-se os fatos e indicando os fundamentos
jurídicos pelos quais formou sua convicção, obedecendo o disposto no art. 205225
do ECA226.
O arquivamento dos autos será promovido quando inexistir o
fato, não constituir ele ato infracional ou não for o adolescente seu autor, devendo
ser homologado pela autoridade judiciária. Poderá também o Promotor de Justiça
conceder a remissão, ato pela qual importará na extinção do processo. Essa
forma
de
perdão
independe
de
comprovação
ou
reconhecimento
da
responsabilidade do ato, ou seja, de que existem provas suficientes da autoria e
materialidade, lembra Liberati227.
Por fim, poderá ainda oferecer a representação228 à
autoridade judiciária, a fim de que seja instaurado o procedimento para a
223
TJSP, ACv 17.743-0, Rel. Lair Loureiro citado por LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao
estatuto da criança e do adolescente, 2003. p. 185.
224
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 547.
225
Art. 205 do ECA: As manifestações processuais do representante do Ministério Público deverão
ser fundamentadas.
226
Marçura citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 549.
227
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
186.
228
Representação é a peça formal que dá início à ação sócio-educativa pública. A ação recebe
esta nomenclatura por invocar a tutela jurisdicional no efeito de aplicação da medida. É pública
porque somente pode ser iniciada mediante representação do Ministério Público. CURY, Munir.
Estatuto da criança e do adolescente comentado: comentários jurídicos e sociais, p. 549.
58
aplicação da medida sócio-educativa que se configurar mais adequada à
situação229.
A representação conterá breve resumo dos fatos, a
classificação do ato infracional, e quando necessário, o rol de testemunhas,
acrescenta Paula citado por Cury230.
2.1.2.3 O procedimento na fase judicial
Decorridos
os
procedimentos
no
Ministério
Público,
necessária a conclusão processual na fase judicial. A presença da autoridade
judiciária no processo tutelar representa garantia e proteção dos direitos da
criança e do adolescente, lembra Liberati231.
Caso o adolescente esteja internado provisoriamente, o
procedimento judicial deverá concluir-se em quarenta e cinco dias. Essa privação
de liberdade somente ocorrerá nos casos de apreensão em flagrante ou
determinação judicial, ambas com fundamento na gravidade do ato infracional e
sua repercussão social. Deve haver indícios suficientes de autoria e materialidade
do fato, além da excepcional necessidade desse instrumento coercitivo, enfatiza
Paula citado por Cury232.
Referida
internação
não
poderá
ser
cumprida
em
estabelecimento prisional, mas sim em entidade exclusiva para adolescentes,
distinta do local destinado ao abrigo, obedecendo a separação por critérios de
idade, característica física e gravidade da infração, segundo dispõe o art. 123 do
ECA.
Oferecida a representação, o juiz designará audiência de
apresentação citando o adolescente, bem como seus pais a comparecerem
229
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
186-187.
230
Paula citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 557.
231
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
190.
232
Paula citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 560-561.
59
acompanhados de advogado. Caso o adolescente não seja encontrado,
determinará a autoridade judiciária que seja expedido mandado de busca
apreensão, até a efetiva apresentação deste, conforme preceitua o art. 184 do
ECA em seu parágrafo 3°, esclarece Liberati233.
Presentes em audiência o adolescente, seus pais, advogado
e Promotor de Justiça, tomará conhecimento o juiz das características da
personalidade deste menor, sua situação familiar e social, a extensão e gravidade
do ato infracional praticado, aferindo assim suas conclusões234.
A oitiva do adolescente assemelha-se ao interrogatório do
réu em processo penal, observadas as distinções decorrentes de sua condição
peculiar de pessoa em desenvolvimento. Poderá valer-se ainda este Magistrado
de opiniões diversas de profissionais qualificados, acrescenta Paula citado por
Cury235.
Terminadas as oitivas dos presentes em audiência, poderá o
juiz aplicar a remissão como forma de extinção ou suspensão do processo,
acrescenta o autor supracitado236. Sobre o instituto da remissão, tratará esta
Monografia mais adiante neste Capítulo.
Não sendo concedida a remissão, por necessitar a
autoridade judiciária de novas diligências e estudo do caso por equipe
interprofissional a fim de proporcionar maior conhecimento do ato cometido, será
suspensa a audiência, designando-se nova data para sua continuação237. Será
notificado ainda o advogado ou defensor nomeado, caso o adolescente não o
233
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
191.
234
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
192.
235
Paula citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 573-574.
236
Paula citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 574.
237
Art. 186 §2° do ECA: Sendo o fato grave, passível de aplicação de medida de internação ou
colocação em regime de semiliberdade, a autoridade judiciária, verificando que o adolescente
não possui advogado constituído, nomeará defensor, designando, desde logo, audiência em
continuação, podendo determinar a realização de diligências e estudo do caso.
60
constitua, para que apresente, no prazo de três dias, defesa prévia e rol de
testemunhas, elucida Paula citado por Cury238.
Na audiência de continuação promove-se a instrução e
julgamento do feito. Serão ouvidas a vítima e as testemunhas arroladas na
representação e na defesa prévia, importantes para a elucidação dos fatos.
Findas as oitivas, a palavra será dada ao Promotor de Justiça e ao defensor,
sucessivamente, por vinte minutos para cada um, prorrogável por mais dez, para
as alegações finais239.
Produzidas as alegações finais, deverá o juiz prolatar a
sentença oralmente. O procedimento para apuração da autoria do ato infracional
observará os princípios da oralidade e da brevidade, devendo quaisquer
incidentes ser resolvidos na própria audiência, explica Liberati240.
Ademais, quanto à função jurisdicional, ressalta Rosa241:
O processo infracional por ser uma atividade cognitiva242 nunca é
carente de dúvidas, afinal, não se pode reconstruir os fatos, mas
acolher-se uma hipótese em face da outra, cabendo uma escolha.
Quando a dúvida é significativa, claro, absolve-se. Esta escolha
deve se dar em face dos significantes probatórios entranhados, os
quais podem justificar o acolhimento (ou não) da representação.
A atividade jurisdicional, portanto, tem a função de julgar
devidamente o caso infracional, aplicando a medida sócio-educativa, desde que
cabível, somente a partir de sua decisão jurisdicional, devendo ser observada a
238
Paula citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 575.
239
Paula citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 576.
240
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
194.
241
ROSA, Alexandre Morais da. Introdução crítica ao ato infracional: Princípio e Garantias
Constitucionais. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 142.
242
Relativa ao conhecimento. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da língua
portuguesa. p. 128.
61
garantia do adolescente quanto ao contraditório, característica fundamental do
procedimento, acrescenta o autor supracitado243.
Não aplicará a autoridade judiciária qualquer medida desde
que reconheça: estar provada a inexistência do fato; não haver prova da
existência do fato; não constituir o fato ato infracional; não existir prova de ter o
adolescente concorrido para o ato infracional, conforme art. 189 do ECA, cita
Liberati244.
A decisão que resolverá o mérito da causa, solucionando a
lide
sócio-educativa,
intitulada
de
sentença,
deverá
conter
relatório,
245
do Código
fundamentação e conclusão, preenchendo os requisitos do art. 381
de Processo Penal, enfatiza Paula citado por Cury
246
.
Terá cunho sancionatório quando julgada procedente a
pretensão sócio-educativa deduzida na representação, impondo ao adolescente
qualquer das medidas sócio-educativas descritas no art. 112 do ECA, abordadas
posteriormente. Julgada improcedente tal pretensão, presente se faz o caráter
absolutório, que torna isento o adolescente de qualquer sanção estatal247.
Assim sendo, conclui-se o procedimento de apuração do ato
infracional atribuído ao adolescente, com a devida aplicação ou não de medida
sócio-educativa cabível. No subtítulo a seguir a abordagem será em relação aos
direitos individuais e garantias processuais concernentes a este adolescente em
conflito com a Lei.
243
ROSA, Alexandre Morais da. Introdução crítica ao ato infracional: princípio e garantias
constitucionais. p. 141-144.
244
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
194.
245
Art. 381 do CPP: A sentença conterá: I - os nomes das partes ou, quando não possível, as
indicações necessárias paraidentificá-las; II - a exposição sucinta da acusação e da defesa; III a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão; IV - a indicação dos
artigos de lei aplicados; V - o dispositivo; VI - a data e a assinatura do juiz.
246
Paula citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 582.
247
Paula citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 582.
62
2.2 OS DIREITOS INDIVIDUAIS E AS GARANTIAS PROCESSUAIS
Os procedimentos processuais para a apuração do ato
infracional cometido por menor diferem-se em regra daqueles aplicados aos
adultos autores de crime na legislação penal, na medida em que deve ser
observada sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, de modo a
tomar conhecimento da sanção a que o Estado está disposto a acometê-lo, assim
como ter o direito de defender-se de tal imputação.
Acerca das normas garantidoras que levam à validação da
tutela jurisdicional diferenciada, Paula248 faz o seguinte apontamento:
O escopo do Direito da Criança e do Adolescente é a proteção
integral. Ela se revela através dos desideratos do
desenvolvimento saudável e da integridade da criança e do
adolescente, para atingir tais objetivos o legislador manda
observar os princípios-garantia do respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento e da prioridade absoluta no
atendimento aos seus direitos.
Denota-se neste ínterim que esta proteção diferenciada
pauta-se pela prevenção e urgência, por meio de um procedimento mais célere,
invertendo a situação de marginalidade para a de cidadania, continua o autor249.
Os direitos individuais estão disposto no Capítulo II do Título
III do ECA, trazendo em seu art. 106 uma garantia constitucional prevista no art.
5°, LXI250 da CRFB/88:
Art. 106: Nenhum adolescente será privado de sua liberdade
senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da
autoridade judiciária competente.
Parágrafo único: O adolescente tem direito à identificação dos
responsáveis pela sua apreensão, devendo ser informado acerca
de seus direitos.
248
PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e do adolescente e tutela jurisdicional
diferenciada. p. 83.
249
PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e do adolescente e tutela jurisdicional
diferenciada. p. 90.
250
Art. 5°, LXI da CRFB/88: “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada da autoridade judiciária competente (...)”.
63
Esta garantia processual a todo e qualquer cidadão
brasileiro deverá ser emanada da autoridade competente, nesse caso, o juiz da
infância e juventude, aduz Liberati251. O adolescente, por ser inimputável não é
preso em flagrante delito, havendo somente flagrância de ato infracional. Não há
voz de prisão neste momento, sendo o adolescente apenas conduzido à
delegacia, sem nota de culpa e lavratura do auto, para devido encaminhamento
ao juiz competente, enfatiza Prade citado por Cury252.
Portanto, não são os adolescentes equiparados aos réus,
adultos e imputáveis, recebendo apenas medida sócio-educativa de caráter
educativo, e não de apenação. O disposto no art. 106 refere-se à adolescente e
não criança, razão pela qual pratiquem ato infracional, jamais serão apreendidas,
mas sim encaminhadas ao Conselho Tutelar que aplicará as medidas de proteção
referidas no art. 101 do ECA, continua o autor253.
Já o parágrafo único do art. 106 prevê nova garantia
constitucional quando refere-se ao art. 5°, LXIV da CRFB/88254, evitando ainda os
abusos de autoridade, propiciando que os procedimentos sejam tomados às
claras, valorizando os meios de proteção e o respeito à dignidade humana, expõe
Tavares255. Logicamente o dispositivo constitucional adaptou-se à realidade
menorista, trasladando a palavra preso por adolescente e prisão por apreensão,
suprimindo a expressão “por seu interrogatório policial, acrescenta Prade citado
por Cury”256.
251
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
94.
252
Prade citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 352.
253
CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado: comentários jurídicos e
sociais. p. 352-354.
254
Art. 5°, LXIV da CRFB/88: “o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão
ou por seu interrogatório policial”.
255
TAVARES, José de Farias. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 6. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2006. p. 114.
256
Prade citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 354.
64
Os direitos a que alude a parte final do parágrafo único deste
artigo diz respeito ao asseguramento de ser assistido por sua família e por seu
advogado, bem como o de permanecer calado, enfatiza Liberati257.
A redação do art. 107 do ECA expressa a relevância de
quando praticada a apreensão do adolescente, que por flagrante delito, quer por
ordem escrita do juiz competente, imediatamente deve ser feita a comunicação
deste feito ao juiz da infância e juventude ou o magistrado designado pela lei de
organização judiciária local, assim como à sua família ou pessoa por ele
indicada258.
Novamente outro dispositivo constitucional se faz presente
acerca desse direito, quando remete ao art. 5°, LXIII da CRFB/88259 a
comunicabilidade do adolescente que se encontra constrito em sua liberdade
física. Tal apontamento denota ainda o aspecto imediatista, ou seja, mais que
logo, tornando-se inconstitucional a apreensão sem a observância a esse
preceito, aduz Prade citado por Cury260.
A comunicação imediata não deve ser interpretada como
requisito para uma prisão de caráter legal, haja vista que ela apenas configura um
meio de se evitarem prisões ilegais, denota Maluf citado por Liberati261.
Antes de prolatada a sentença, o adolescente que estiver
privado de sua liberdade, ou seja, em regime de internação provisória, não poderá
ali permanecer mais de quarenta e cinco dias, como explicita o art. 108 do
ECA262. Tal determinação possui caráter preventivo, uma vez que visa assegurar
257
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
93.
258
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
95.
259
Art. 5°, LXIII da CRFB/88: “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de
permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”.
260
Prade citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 357.
261
Maluf citado por LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do
adolescente, 2003. p. 95.
262
Art. 108 do ECA: A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de
quarenta e cinco dias.
65
a integridade física e moral do adolescente, bem como, há quem diga proteger a
sociedade. Serve como garantia de vida deste, possibilitando investigar
profundamente o fato, exemplifica Prade citado por Cury263.
O artigo supramencionado, em seu parágrafo único264, vem
trazer que o magistrado, ao tomar conhecimento da representação feita pelo
Ministério Público requerendo tal medida segregativa, deve fundamentar sua
decisão com base em indícios suficientes de autoria e materialidade do fato, onde
esteja demonstrada a imperiosa necessidade desta, segundo Liberati265.
Assim, faz-se presente mais um precedente constitucional,
previsto no Título IV, capítulo III da CRFB/88, em seu art. 93, IX, discorrendo
acerca das decisões do Poder Judiciário: “todos os julgamentos dos órgãos do
Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de
nulidade, acrescenta Prade citado por Cury”266.
A obediência a este quesito é preceito fundamental da
autoridade judiciária, por tratar-se a internação provisória de medida excepcional,
de modo que só deve ser aplicada quando não restarem dúvidas à sua aplicação.
Embora privativa de liberdade, submete-se aos princípios de brevidade,
excepcionalidade e respeito à condição peculiar do adolescente267.
Na sequência, o art. 109 estabelece precedente já amparado
na CRFB/88 em seu art. 5º, LVIII268, ao trazer que a exigência da identificação
constitui vexame, caracterizando constrangimento ilegal. O fato de exigir o policial
identificação para efeito de confrontação, havendo dúvida fundada, deverá ocorrer
263
CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado: comentários jurídicos e
sociais. p. 360-362.
264
Art. 108, § único: A decisão deverá ser fundamentada e basear-se em indícios suficientes de
autoria e materialidade, demonstrada a necessidade imperiosa da medida.
265
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
95-96.
266
Prade citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 361.
267
CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado: comentários jurídicos e
sociais. p. 361-362.
268
Art. 5º, LVIII da CRFB/88: “o civilmente identificado não será submetido à identificação criminal,
salvo nas hipóteses previstas em lei.”
66
somente no caso de excepcionalidade. Essa dúvida não se deve confundir, pois,
com preconceitos ou juízos preconcebidos, segundo aponta Volpi citado por
Cury269.
Por fim, a identificação desnecessária, conforme aponta Del
Campo
270
, pode configurar o delito previsto no art. 232 do ECA: “Submeter
criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a
constrangimento: Pena – detenção de seis meses a dois anos”.
Trabalhados os direitos individuais elencados na doutrina de
proteção integral, segue-se para as garantias processuais atinentes aos menores
em conflito com a Lei, ao deparar-se com o todo o procedimento de apuração do
ato infracional já tratado acima.
No Título III, o Capítulo III do ECA prescreve em seu art.
110: “Nenhum adolescente será privado de sua liberdade sem o devido processo
legal.”
Tal dispositivo equipara-se ao disposto no art. 5º, LIV da
CRFB/88 que trata: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o
devido processo legal”, no que diz respeito à privação da liberdade somente,
conforme entendimento de Prade citado por Cury271.
A garantia do devido processo legal faz-se materializada no
entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça, em caráter ilustrativo:
Nenhum adolescente será privado de sua liberdade sem o devido
processo legal. Do contrário, admitir-se-á a aplicação de uma
medida tão grave como a internação ou mesmo simples
reavaliação, sem o pressuposto da verificação da existência do
próprio fato que há de configurar, nos termos do art. 102 do
269
Volpi citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais, p. 362-363.
270
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p.
169.
271
Prade citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais, p. 366.
67
Estatuto da Criança e do Adolescente, crime ou contravenção”
(TJSP – C. Esp. – AI 16.652-0 – Rel. Lair Loureiro – 4-3-93)272.
O devido processo legal, como forma de regular o curso da
administração da justiça pelos juízes e tribunais abrange os seguintes
precedentes legais: direito à citação; ao arrolamento de testemunhas, ao
procedimento contraditório; de não ser processado por leis após o fato; de
igualdade com a acusação; ser julgado mediante provas e evidência legal
legitimamente obtidas; de privilégio contra a auto-incriminação; aos recursos,
dentre outra gama de princípios existentes, acrescenta Prade citado por Cury273.
Seguindo a tutela processual de direito a quaisquer
indivíduos, aponta Nogueira citado por Liberati274 que o processo legal
compreende o respeito aos direitos constitucionais, votados para serem
devidamente observados, sob pena de nulidade processual. Assim, o referido art.
110, para Braga citado por Cury275, denota a imposição jurídica de estender esses
direitos processuais básicos ao adolescente, conservando sua identidade
enquanto cidadão e limitando o poderio jurisdicional.
Assevera-se, portanto, que o adolescente autor de ato
infracional possui todas as garantias constitucionais do devido processo legal; da
gratuidade do direito à assistência judiciária através de defensor público ou
advogado nomeado; legitimidade do Ministério Público para defesa de todo e
qualquer direito da criança e do adolescente; direito a ser ouvido pessoalmente
pela autoridade competente e, quando privado da liberdade, entrevistar-se
pessoalmente com o representante do Ministério Público, peticionar diretamente,
além de avistar-se com seu defensor; gratuidade dos serviços judiciários276.
272
ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e jurisprudência. p. 167.
273
Prade citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 367.
274
Nogueira citado por LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do
adolescente, 2003. p. 97.
275
Braga citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 369.
276
PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e do adolescente e tutela jurisdicional
diferenciada. p. 80-81.
68
2.3 AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS
Concluso o procedimento que apura o cometimento da
infração por parte daquele ser que ainda não completara seus dezoito anos de
idade a data dos fatos, a autoridade competente verificará as medidas sócioeducativas pertinentes a este.
Paula277 discorre acerca das características da tutela sócioeducativa e expõe o conceito da medida sócio-educativa adequada:
Medida sócio-educativa adequada, portanto, é aquela cuja
instrumentalidade resultou evidenciada pela simbiose entre seus
dois elementos constitutivos, ou seja, entre o interesse
juridicamente protegido de defesa da sociedade de atos
infracionais e o não menos subordinante interesse em interferir no
desenvolvimento do jovem, através de ações pedagógicas, tendo
como fito a aquisição ou desenvolvimento de recursos pessoais e
sociais que possibilitem os mecanismos necessários para a
superação das adversidades de forma lícita.
As medidas supracitadas são de caráter sócio-educativo e
também protetivo, sendo o rol deste artigo taxativo e não apenas simplificativo o
que significa dizer que é vedada a imposição de medidas diversas das
enunciadas no artigo 112 do ECA, segundo apontamento de Maior, citado por
Cury278.
Portanto, esclarecidos os interesses envolvidos na situação
infracional, necessária se faz a aplicação da medida sócio-educativa, pela
autoridade competente (juiz ou promotor da infância e juventude), que se figurar
mais adequada ao caso. O art. 112279 do ECA prescreve tais medidas, além das
características pertinentes a aplicação das mesmas.
277
PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e do adolescente e tutela jurisdicional
diferenciada. p. 113-114.
278
Maior citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 378.
279
Art. 112 do ECA: Verificada a prática do ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar
ao adolescente as seguintes medidas: I – advertência; II – obrigação de reparar o dano; III –
prestação de serviços à comunidade; IV – liberdade assistida; V – inserção em regime de
semiliberdade; VI – internação em estabelecimento educacional; VII – qualquer uma das
previstas no art. 101, I a VI. § 1° - A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua
69
Importante salientar que as medidas sócio-educativas a
serem executadas devem sempre levar em conta a capacidade do adolescente de
cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração, conforme dispõe o art. 112
do ECA em seu parágrafo 1°.
A primeira medida elencada no referido artigo é de
advertência. Em seu art. 115, o diploma legal traz o seguinte: “A advertência
consistirá em admoestação verbal, que será reduzida a termo e assinada”.
Perante seus pais ou responsável, a imposição desta
medida será aplicada ao adolescente em audiência e reduzida a termo próprio,
onde constarão as exigências e orientações que devem ser cumpridas por este,
sendo assinado pelo juiz, pelo promotor, pelo próprio adolescente e seus pais ou
responsável, conforme Liberati280.
Em caráter ilustrativo, verifica-se que o Tribunal de Justiça
de São Paulo assinalou o seguinte entendimento:
Menor – Medida socioeducativa – Semiliberdade –
Inadmissibilidade – Adolescente que tem passado aceitável –
Família bem estruturada socioeconomicamente – Medida de
advertência que se apresenta como mais compatível – Recurso
parcialmente provido. (Rel. Ney Almada – Apelação Cível n°
17.673-0 – Itaquaquecetuba/Poá – 19-5-94)281.
Referida medida exige, para ser aplicada, a prova da
materialidade do fato e indícios suficientes de autoria, conforme estabelece o
parágrafo único do art. 114282 do ECA.
Para Lima citado por Cury283, na aplicação da medida de
advertência deve ser observado o equilíbrio entre a disciplina (regime de
capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração. § 2° - Em hipótese alguma
e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado; § 3° - Os adolescentes
portadores de doenças ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado,
em local adequado às suas condições.
280
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
104.
281
282
ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e jurisprudência. p. 178.
Art. 114 – Parágrafo único do ECA: A advertência poderá ser aplicada sempre que houver
prova da materialidade e indícios suficientes da autoria.
70
autoridade) e a liberdade (regime de direitos e liberdade do adolescente). O papel
da autoridade é de um verdadeiro educador facilitador do crescimento do
educando, ao passo que este deve ser atingido pela medida aplicada, mas não
desestimulado quanto a sua condição de sujeito de direitos.
O mesmo autor284 enfatiza que esta medida destinar-se-á,
de regra, aos adolescentes que não registrarem antecedentes infracionais, ou
então às infrações de pequena gravidade (lesões corporais leves ou furto de coisa
de pouco valor, por exemplo). Pode ser aplicada pelo órgão do Ministério Público
antes de instaurado o procedimento apuratório, juntamente com a remissão ou
então pela autoridade judiciária no curso da instrução ou da sentença final.
A segunda medida presente no disposto no art. 112 é a
obrigação de reparar o dano. Tem sua definição no art. 116 do mesmo diploma
legal: “Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade
poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o
ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima”.
Ferrandin285 esclarece os fundamentos do disposto acima:
restituir a coisa consiste na sua devolução ao proprietário, pressupondo a
existência do objeto subtraído no ato; ressarcir o dano significa suprir a dor moral
ou material da vítima, por meio de valor pecuniário submetido à homologação
judicial; e por fim a compensação do prejuízo ganha lugar quando incabíveis as
primeiras soluções, sendo aplicada mediante critérios de conveniência e
oportunidade a cada caso.
Tal obrigação deve respeitar o procedimento contraditório,
assegurados ao adolescente infrator os direitos constitucionais de ampla defesa,
283
Lima citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 390.
284
Lima citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 391.
285
FERRANDIN, Mauro. Princípio constitucional da proteção integral e direito penal juvenil:
possibilidade e conveniência de aplicação dos princípios e garantias do direito penal aos
procedimentos previstos no estatuto da criança e do adolescente. p. 65.
71
de igualdade processual, de presunção de inocência além de assistência técnica
de advogado, expõe LIberati286.
Colhe-se da jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça de
São Paulo, entendimento acerca de sua aplicabilidade em fase pré-processual
pelo Ministério Público, em caráter ilustrativo:
Apelação – Sentença que concedeu remissão a adolescente
infratora, cumulada com medida sócio-educativa de advertência –
Atos infracionais continuados equivalentes a estelionato – Medida
de obrigação de reparar o dano mais adequado – Recurso provido
para esse fim. (TJSP, AP. 28.888.0/. rel. Cerqueira Leite).287
Ao prejuízo causado por ato ilícito, pelo menor de dezesseis
anos, com exceção daqueles praticados em legítima defesa ou no exercício
regular de um direito, além da deterioração ou destruição da coisa para remover
perigo eminente, responderão pela reparação, exclusivamente, os pais, ou se for
o caso, o tutor ou curador. Entre dezesseis e vinte e um anos, responderá
juntamente com seus responsáveis pelas obrigações resultantes de seu ato,
conforme anota Lima288.
Referida medida, para o autor em epígrafe, tem caráter
facultativo, já que a redação do artigo que a conceitua traz como expressões “a
autoridade poderá determinar, se for o caso...”
Para alguns doutrinadores a aplicação desta medida seria
pouco recomendável, ao passo que na maioria dos casos a punição financeira
recai sobre os pais, que também muitas das vezes encontra-se em situação
econômica inviável, aduz Pietrocolla, Sinhoretto e Castro citado por Ferrandin289.
286
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
105.
287
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 87.
288
Lima citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 392.
289
Pietrocolla; Sinhoretto; Castro citado por FERRANDIN, Mauro. Princípio constitucional da
proteção integral e direito penal juvenil: possibilidade e conveniência de aplicação dos
princípios e garantias do direito penal aos procedimentos previstos no estatuto da criança e do
adolescente. p. 64.
72
Assim sendo, por ser uma medida facultativa, como já mencionado acima,
estabelece o parágrafo único do art. 116: “Havendo manifesta impossibilidade, a
medida poderá ser substituída por outra adequada”.
Portanto, tornando-se incabível a aplicação de reparação do
dano, a autoridade competente (Ministério Público, autoridade judiciária), deverá
agir sob o caráter sócio-educativo da medida, podendo estabelecer formas de
reparação mais ou menos viáveis a cada interessado. Assim, entende Lima290 que
estarão atendidos os interesses da vítima em ter seu prejuízo reparado, bem
como aplicado ao adolescente um processamento e julgamento adequado à sua
condição de pessoa humana e não como mero objeto passivo de intervenção.
As medidas sócio-educativas elencadas nos incisos III e IV
do art. 112 não serão abordadas neste Capítulo, mas sim, serão objeto de estudo
mais aprofundado no Capítulo 3.
Discorrendo ainda sobre o referido artigo, seu inciso V traz a
medida de inserção em regime de semiliberdade que encontra seu conceito no
art. 120 do mesmo Estatuto: “O regime de semiliberdade pode ser determinado
desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a
realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial”.
Tal medida constitui-se em alternativa mais branda do que a
internação, sendo, pois, a que mais restringe a liberdade depois desta. Consiste
no regime de recolhimento noturno e realização de atividades externas durante o
dia, sob supervisão de equipe multidisciplinar, segundo aponta Del Campo291.
Engel292 vem destacar que a aplicação dessa medida
restritiva de liberdade é recomendada somente nos casos em que as não
privativas se mostrarem infrutíferas e, por conseqüência da ocorrência do ato
290
Lima citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 397.
291
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 182.
292
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 94.
73
infracional venha indicar a necessidade da segregação parcial objetivando
proteger a sociedade, bem como o próprio infrator.
As atividades externas consistem em freqüência escolar e
relações de emprego. Essa é a finalidade do exposto no § 1° do art. 120 do ECA,
a saber: “É obrigatória a escolarização e a profissionalização, devendo, sempre
que possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade”, aponta
Liberati293.
Costa e Lopes, citado por Liberati294 asseveram acerca da
necessidade de exame científico do menor candidato ao regime:
O regime de semiliberdade destina-se, sobretudo, aos menores
cuja agressividade, oposição ou instabilidade se explicam por
frustrações afetivas, traumatismos da afetividade ou sentimentos
de inferioridade; (...) Daí a necessidade do exame médicopsicológico e social do menor candidato ao regime de semiinternato, que não será permitido sem prévia observação científica
do menor.
Referida medida não comporta ainda prazo determinado,
devendo o adolescente ser reavaliado no máximo semestralmente ou em menor
tempo, a critério do juízo, seguindo-se, no que couberem, as disposições relativas
à internação, que será abordada em seguida. Pode ainda excepcionalmente ser
aplicada entre os dezoito e vinte e um anos de idade pelos fatos cometidos antes
de alcançada a maioridade penal, revela Del Campo295.
Destaca-se
ainda
que
todo
acompanhamento
sócio-
educativo pelos técnicos sociais devem ser apresentados em forma de relatório
circunstanciado à autoridade judiciária, conforme dispõe o parágrafo único do art.
293
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
111.
294
Costa e Lopes citado por LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e
do adolescente. 2003, p. 111.
295
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 182.
74
2° da Resolução n° 47 de 05.12.1996 do CONANDA – Conselho Nacional dos
Direitos da Criança e do Adolescente296.
Por fim, em situações excepcionais, será aplicada ao
adolescente em conflito com a lei a medida sócio-educativa mais rígida prevista
no Estatuto. Trata-se da internação em estabelecimento educacional, transcrita no
art. 121 do ECA: “A internação constitui medida privativa de liberdade, sujeita aos
princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento”.
É a medida que possui maior previsão legal sobre critérios
para sua aplicação e execução. Destina-se restritivamente àqueles adolescentes
que cometeram atos infracionais mediante violência ou grave ameaça à pessoa
(ex. roubo, latrocínio, homicídio, estupro, etc.), tornou a cometê-los ou deixou de
cumprir as medidas já referidas anteriormente, que é o caso da regressão do
meio-aberto, prevista pelo prazo máximo de 90 dias, segundo destaca Costa297.
Os princípios consistentes da aplicação da medida existem
para torná-la constitucionalmente possível, haja vista seu caráter repressivo e
limitador da liberdade do adolescente. O princípio da brevidade vem ponderar que
esta medida deve possuir tempo determinado, de no mínimo seis meses e de no
máximo três anos298, com exceção do descumprimento reiterado e injustificável299
onde a internação-sanção será pelo máximo de três meses, destaca Liberati300.
296
Art. 2° da Resolução n° 47 do CONANDA: A convivência familiar e comunitária do adolescente
sob o regime de semiliberdade deverá ser, igualmente, supervisionada pela mesma equipe
multidisciplinar. § único: A equipe multidisciplinar especializada incumbida do atendimento ao
adolescente, na execução da medida de que trata este artigo, deverá encaminhar,
semestralmente, relatório circunstanciado e propositivo ao Juiz da Infância e Juventude
competente. ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e
jurisprudência. p. 187
297
COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o direito penal juvenil: como limite na
aplicação da medida socioeducativa de internação. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p.
87.
298
Art. 121, § 3° do ECA: Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três
anos.
299
Art. 122 do ECA: A medida de internação só poderá ser aplicada quando: III – por
descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta. § 1° - O prazo de
internação na hipótese do inciso III deste artigo não poderá ser superior a três meses.
300
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional. p. 114.
75
O mesmo autor301 ressalta que é estabelecido o prazo
mínimo de seis meses, embora não haja previsão legal, pelo fato de ser a
reavaliação302 necessária a cada seis meses. Assim, evitando-se violação ao
princípio da legalidade, deve a autoridade judiciária fixar em seis meses o prazo
mínimo.
Seguindo
tais
princípios
o
próximo
seria
o
da
excepcionalidade. Por ser excepcional, traz Del Campo303 que deve ser aplicada
como último recurso, somente quando cometido com gravidade do ato infracional,
ou então sua capacidade de reincidência em meio livre for muito grande.
O
respeito
à
condição
peculiar
de
pessoa
em
desenvolvimento, fecha a rol de princípios inerentes à aplicação desta medida. É
dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhe
adotar todas as medidas de contenção e segurança, segundo dispõe o art. 125 do
ECA. Contudo, de forma alguma, as autoridades encarregadas não poderão
praticar abusos ou submeter esses indivíduos a vexame ou constrangimentos,
expõe LIberati304.
Há a possibilidade ainda da realização de atividades
externas pelo adolescente em regime de internação305. Mendez citado por Cury306
enfoca que tais atividades servem para preparar o jovem quando da sua
reinserção na sociedade, revertendo a concepção de que o caráter total da
internação, ou seja, seu isolamento, retrata o fracasso da sua readaptação.
301
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional. p. 114.
302
“A reavaliação do adolescente após o prazo previsto de 6 meses preconizado na Lei de
Regência, não é uma faculdade, traduz direito do menor”. TJSP – C. Esp. HC 26.301-0 – Rel.
Yussef Cahali – 13-7-95. ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina
e jurisprudência. p. 189.
303
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 183.
304
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional. p. 116.
305
Art. 121, § 1° do ECA: Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe
técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário.
306
Mendez citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 415.
76
Oportuno transcrever o entendimento do Tribunal de Justiça
de São Paulo, em caráter ilustrativo:
Medida sócio-educativa – Aplicação à pessoa com idade entre 18
e 21 anos – Admissibilidade – Ato infracional praticado quando
ainda menor de idade – Prescrição da pretensão educativa e
executória da medida que somente se opera com os 21 anos
completos. (TJSP, AP; 24.045-0/0, Rel. Lair Loureiro)307.
Uma vez findo o prazo para a internação, atenta Del
Campo
308
que deverá o adolescente ser posto imediatamente em medida mais
branda, quais sejam, semiliberdade ou liberdade assistida, caracterizando a
progressão309 da mesma. Ressalta-se ainda que tal medida só possa ser
executada antes de atingida a maioridade penal, ou seja, antes dos dezoito anos.
Persistindo após os dezoito, não poderá exceder quando completados vinte e um
anos de idade, havendo sua liberação compulsória.
2.4 REMISSÃO JUDICIAL
Para Liberati310, define-se remissão como o perdão do ato
infracional praticado pelo adolescente.
O instituto da remissão judicial encontra previsão no art. 126
do Capítulo V, Título III, Parte Especial do ECA:
Art. 126 do ECA: Antes de iniciado o procedimento judicial para
apuração de ato infracional, o representante do Ministério Público
poderá conceder a remissão, como forma de exclusão do
processo, atendendo às circunstancias e conseqüências do fato,
ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e
sua maior ou menor participação no ato infracional.
307
ENGEL, Norival Acácio. Prática de ato infracional e as medidas sócioeducativas: uma
leitura a partir do estatuto da criança e do adolescente e dos princípios constitucionais. p. 100.
308
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 184.
309
Art. 121, § 4° do ECA: Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente
deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida.
310
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
122.
77
Parágrafo único: Iniciado o procedimento judicial, a concessão da
remissão pela autoridade judiciária importará na suspensão ou
extinção do processo.
Para Mirabete citado por Cury311, remissão vem do latim
remissio, de remittere, que significa clemência, misericórdia, indulgência, perdão,
renúncia, mas também falta ou diminuição de rigor, de força, de intensidade. Tal
instituto assemelha-se ao princípio da oportunidade do processo penal que evita a
instauração
do
procedimento,
suspende
ou
extingue-o,
atendendo
as
circunstâncias e conseqüências do fato, ao contexto social, bem como à
personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato
infracional.
O Estatuto prevê três modalidades de remissão. A primeira
delas, mais conhecida por remissão ministerial, ocorre quando o representante do
Ministério Público a concede antes de iniciado o procedimento judicial. Deverá
esta ser reduzida a termo, constando do resumo dos fatos e da fundamentação
da aplicação desta. Referida peça irá conclusa para o juiz, que deverá homologála caso assim entender. Acatada a medida, exclui-se o feito, expõe Liberati312.
O autor313 ainda pontua que caso discorde o juiz da
remissão concedida, remeterá os autos ao Procurador-Geral de Justiça que
poderá oferecer representação, caso entenda inadequada a medida ou então
nomear outro membro do Ministério Público para apresentá-la. Caso ratifique a
remissão, a autoridade judiciária é obrigada a homologá-la.
A natureza jurídica da remissão feita pelo Ministério Público
é considerada ato administrativo, na senda do Egrégio Tribunal de Justiça de São
Paulo:
Ao conceder a remissão como forma de exclusão do processo, o
Ministério Público não pratica ato jurisdicional, mas pleiteia que
311
Mirabete citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 426.
312
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
123.
313
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
123/124.
78
não se instaure o procedimento. É o que sucede, em termos
assemelhados, no processo penal, com o arquivamento do
inquérito. (TJSP – C. Esp. – AI 21.870-0 – Rel. Lair Loureiro – 1°12-94)314.
Além desta hipótese, Mirabete315 preleciona que a remissão
ainda pode ocorrer depois de instaurado o procedimento judicial, como forma de
suspensão ou extinção do processo. A competência nestes casos é da autoridade
judiciária316, que ouvirá também o Ministério Público317. É aplicável em qualquer
fase do procedimento antes da sentença, desde que seja fundamentada.
Necessária se faz a representação do Ministério Público
neste caso:
O representante do Ministério Público deve ser previamente
ouvido sobre a possibilidade de remissão como forma de extinção
ou suspensão do processo, sob pena de nulidade (art. 204318).
Nesse sentido: “Remissão – Intervenção do Ministério Público –
Falta – Inadmissibilidade – Nulidade do processo – Art. 204 do
ECA – Recurso provido para esse fim”. (RJTJESP 137/364)319.
A remissão como forma de extinção do processo equivale a
perdão judicial, possuindo natureza de sentença declaratória, semelhante ao que
ocorre no processo penal. Já a suspensão do processo equipara-se à suspensão
condicional (anterior até àquela prevista na Lei 9099/95320), somente tendo
314
ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e jurisprudência. p. 207.
315
Mirabete citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 427.
316
Art. 148 do ECA: A Justiça da Infância e da Juventude é competente para: II – conceder a
remissão, como forma de suspensão ou extinção do processo.
317
Art. 186 do ECA: Comparecendo o adolescente, seus pais ou responsáveis, a autoridade
judiciária procederá à oitiva dos mesmos, podendo solicitar opinião de profissional qualificado. §
1°: Se a autoridade judiciária entender adequada a remissão, ouvirá o representante do
Ministério Público, proferindo a decisão.
318
Art. 204 do ECA: A falta de intervenção do Ministério Público acarreta a nulidade do feito, que
será declarada de ofício pelo juiz ou a requerimento de qualquer interessado.
319
CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e
do adolescente anotado. p. 168.
320
BRASIL. Lei n. 9099 de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e
Criminais e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/
L9099.htm> Acesso em: 14 jul. 2009.
79
eficácia e sentido quando cumulada com medida sócio-educativa, visando coagir
o adolescente infrator ao seu cumprimento, segundo Del Campo321.
Iniciado o procedimento, ao constatar que o caso em
epígrafe comporta o perdão, a autoridade judiciária suspende o procedimento
mediante o cumprimento de uma das medidas sócio-educativas elencadas no art.
112 do ECA, com exceção da semiliberdade e da internação. Já a extinção
também pode ser concedida pelo Magistrado neste ínterim, quando constituir
perdão puro e simples ou vier acompanhada de medida sócio-educativa que se
esgote em si mesma, como é o caso da advertência, lembra Liberati322.
Tanto a suspensão como a extinção são aconselháveis em
se tratando de infração de pequena gravidade, de menor participação do
adolescente na prática do ato, de confissão e comprovado arrependimento, de
primariedade, dentre outras situações atenuantes, exemplifica Mirabete citado por
Cury323.
O art. 127324 do Estatuto em estudo vem trazer que a
aplicação do instituto da remissão não caracteriza a figura de antecedentes na
trajetória de vida do adolescente em conflito com a lei. No entanto, pode ser
aplicada em conjunto com medidas sócio-educativas em meio aberto, onde pode
ser dispensado o procedimento de apuração do ato infracional, conforme cita
Costa325.
Ressalta-se
que,
embora
não
seja
necessário
o
procedimento de apuração do ato infracional (provas cabais do cometimento a
321
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 194.
322
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
124.
323
Mirabete citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 427.
324
Art. 127 do ECA: A remissão não implica necessariamente o reconhecimento ou comprovação
da responsabilidade, nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo incluir eventualmente
a aplicação de qualquer das medidas previstas em lei, exceto a colocação em regime de
semiliberdade e a internação.
325
COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o direito penal juvenil: como limite na
aplicação da medida socioeducativa de internação. p. 91.
80
infração), é preciso que existam ao menos indícios de materialidade e autoria,
acrescenta Del Campo326.
Ademais, continua o autor327 que a remissão pelo
Magistrado pode ser concedida após oitiva do adolescente infrator e do Ministério
Público, para que se possa traçar um perfil do adolescente, de sua estrutura
familiar e do ato praticado, decidindo assim pela conveniência do beneficio e qual
medida cumulativa a ser aplicada.
Vem admitindo o Superior Tribunal de Justiça pelo
cabimento da cumulação da remissão com medida sócio-educativa:
Criminal. Resp. Eca. Remissão. Aplicação de Medida
Socioeducativa. Cumulação. Possibilidade. Recurso Provido.
(REsp 331.241-SP, 5ª Turma do STJ, Rel. Min. Gilson Dipp, 20-303)328.
Oportuno distinguir, para Valente329 que, embora o Ministério
Público tenha competência para aplicar a remissão, a cumulação de medida
sócio-educativa só terá validade após homologação por parte da autoridade
judiciária, que na verdade é quem realmente a impôs, seguindo-se o que
prescreve a Súmula n° 108 do STJ: “A aplicação de medidas sócio-educativas ao
adolescente pela prática de ato infracional é de competência exclusiva do Juiz.
Para ilustrar tal assertiva, cita-se o acórdão a seguir, em
caráter exemplificativo:
Estatuto da Criança e do Adolescente. Prática de ato infracional.
Medida sócio-educativa. Aplicação. Ministério Público. Sobre
permitir ao Ministério Público a concessão da remissão, sujeita a
homologação judicial, não significa que a Lei 8069/90, arts. 127 e
181, § 1° também lhe permita a imposição de medida sócioeducativa, cuja aplicação reservou ao poder jurisdicional
326
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 194.
327
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 194.
328
329
ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e jurisprudência. p. 209.
VALENTE, José Jacob. Estatuto da criança e do adolescente: apuração do ato infracional à
luz da jurisprudência. São Paulo: Atlas, 2002. p. 44.
81
especificado nos seus arts. 146 e 148, I. (RMS n. 1.967-6/SP,
Publ. no DJ, de 23.9.92, Rel. Min. José Dantas)330.
Poderá ainda a medida aplicada por força de remissão ser
discutida judicialmente, conforme o disposto no art. 128 do Estatuto em comento:
“A medida aplicada por força da remissão poderá ser revista judicialmente, a
qualquer tempo, mediante pedido expresso do adolescente ou de seu
representante legal, ou do Ministério Público”.
O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do
Sul tem se manifestado do seguinte, conforme julgado em caráter exemplificativo:
Agravo de Instrumento. Oitiva de infrator jovem adulto quando das
audiências de REVISÃO DE MEDIDA SÓCIO EDUCATIVA. A
previsão legal, consubstanciada na Constituição Federal de 88, no
Estatuto da Criança e do Adolescente e na Convenção dos
Direitos da Criança proclamada pela ONU e da qual o Brasil é
signatário, assegura a todos os adolescentes, inclusive os
institucionalizados no Centro do Jovem Adulto, desta capital, o
direito de serem ouvidos pelo Juiz, em audiência, quando da
revisão de medidas sócio educativas impostas. Agravo provido.
(Agravo de Instrumento n° 70002541605, Oitava Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira
Trindade, Julgado em 24/05/2001)331.
O referido disposto encontra respaldo constitucional no art.
5°, XXXV da CRFB/88: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão
ou ameaça a direito”. Assim, o pedido de revisão pode ser proposto a qualquer
tempo, pelas partes supracitadas, uma vez ser requisito primordial assegurar o
consentimento do adolescente, de seus pais ou tutores quanto às medidas de
remissão aplicadas, segundo Mirabete citado por Cury332.
Quando da revisão das medidas, Cury citado por Liberati333
asseguram que a autoridade judiciária poderá: cancelar a medida aplicada, com
330
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente, 2003. p.
125.
331
Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/site_php/jprud2/ementa.php> Acesso em: 29 jul. 2009.
332
Mirabete citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 428-429.
333
Cury, Garrido e Marçura citado por LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da
criança e do adolescente, 2003. p. 125.
82
retorno à situação processual anterior; substituí-la por outra, com exclusão do
regime de semiliberdade e da internação; e convertê-la em perdão puro e simples.
A revisão prevista não implica em qualquer poder de
coerção ou possibilidade de substituição por medida mais severa, adequando-se
apenas às realidades existentes em cada caso. Seja pela extinção ou suspensão
do feito, somente será admissível o benefício a fatos de pequena ou no máximo
média gravidade, conforme entendimento de Del Campo334.
Discorrido, por fim, acerca da revisão da medida sócioeducativa aplicada por força de remissão, conclui-se aqui o Capítulo 2, que se
ocupou do ato infracional cometido por criança ou adolescente, sua apuração, das
medidas sócio-educativas em espécie e sua aplicação.
A seguir, o próximo Capítulo dará ênfase à execução das
medidas sócio-educativas em meio aberto, quais sejam, Prestação de Serviços à
Comunidade e Liberdade Assistida, pelo Programa de Medidas Sócio-Educativas
do município de Itajaí, no Estado de Santa Catarina.
334
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 195-196.
83
CAPÍTULO 3
O PROGRAMA DE EXECUÇÃO DE MEDIDAS SÓCIOEDUCATIVAS NO MUNICÍPIO DE ITAJAÍ
3.1 AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS: A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À
COMUNIDADE E A LIBERDADE ASSISTIDA
Conforme já trabalhado no Capítulo anterior, o art. 112 do
ECA abrange o rol de medidas sócio-educativas aplicáveis aos adolescentes em
conflito com a lei.
Seus incisos III e IV tratam, respectivamente, das medidas
de prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida não abordadas
anteriormente, visto que são objeto principal desta pesquisa, motivo pela qual
tratará este subtítulo do tema.
Por serem estas medidas sócio-educativas aplicáveis
através de programas de execução em meio aberto, sem restrição ou privação de
liberdade, pode-se dizer que sua aplicação destina-se a atos infracionais de
natureza leve, sem violência ou grave ameaça à pessoa, bem como àqueles não
reincidentes, explica Costa335.
O art. 117 do ECA prescreve o conceito de prestação de
serviços à comunidade, a saber:
Art. 117: A prestação de serviços comunitários consiste na
realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não
excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais,
escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em
programas comunitários ou governamentais.
335
COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o direito penal juvenil: como limite na
aplicação da medida socioeducativa de internação. p. 83.
84
Parágrafo único: As tarefas serão distribuídas conforme as
aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada
máxima de oito horas semanais, aos sábados, domingos e
feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a freqüência à
escola ou à jornada normal de trabalho.
Elias336 enfatiza que esta, sem dúvida, é uma medida que
possui efeito de ordem moral, onde o adolescente que agride a sociedade com
seus atos, tenha a oportunidade de, com seu trabalho, nela se redimir.
Cavalcante citado por Cury337 acrescenta a relevância social
desta medida:
Inserida num contexto comunitário abrangente (...), a medida
possibilita o alargamento da própria visão do bem público e do
valor da relação comunitária, cujo contexto deve estar inserido
numa verdadeira práxis, onde os valores de dignidade, cidadania,
trabalho, escola, relação comunitária e justiça social não para
alguns, mas para todos, sejam cultivados durante sua aplicação.
A prestação de serviços à comunidade, além de dignificar
quem trabalha, tem ainda um sentido social, que é servir e ser útil à sociedade.
Ademais, indispensável torna-se a colaboração da comunidade na sua aplicação,
pois a simples imposição, sem a correspondente fiscalização do seu
cumprimento, torna-se uma medida sem qualquer resultado, salienta Nogueira338.
As tarefas realizadas devem ser gratuitas, levadas a efeito
em estabelecimentos prestadores de serviços públicos ou de relevância pública,
governamentais ou não, federais, estaduais ou municipais. Normalmente podem
ser hospitais, escolas, orfanatos e demais entidades conveniadas com a Vara da
Infância e Juventude, explica Del Campo339.
336
ELIAS, Roberto João. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2. ed. São
Paulo: Saraiva, 2004. p. 126.
337
Cavalcante citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 402.
338
NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Estatuto da criança e do adolescente comentado. 4. ed. São
Paulo: Saraiva, 1998. p. 182.
339
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 178-179.
85
A medida não poderá ainda, em hipótese alguma, exceder o
prazo de seis meses340. No entanto, caso tenha o adolescente cometido outro ato
infracional no período, nada impede que possa sofrer medida idêntica, devendo
ser cumprida em seguida à primeira, aduz Elias341.
Optando o julgador pela medida de prestação de serviços,
deverá atentar para as aptidões do adolescente, assim como para o tipo de ato
infracional praticado. Por exemplo, não é razoável encaminhar um adolescente
representado pela prática de tráfico de entorpecentes para prestar serviços em
uma escola, acrescenta Del Campo342.
Observadas as aptidões, deverá ser também obedecida a
restrição quanto à obrigatoriedade das oito horas semanais. Tais horários devem
ser estabelecidos de modo a não prejudicar a freqüência à escola e se caso
trabalhar, sua jornada normal de trabalho. Para isso, poderá, portanto, ser
executada aos sábados, domingos e feriados, elucida Elias343.
Cumpre ressaltar que os Códigos de Menores de 1927 e
1979 não contemplavam esse tipo de medida. Qualquer atividade exercida pelos
menores estava associada aos estabelecimentos onde se encontravam
internados. Tais Leis os consideravam absolutamente incapazes de assumir
responsabilidade pelos atos que praticavam. Os que estivessem em situação
irregular eram retirados do convívio social, para não sentirem a influência do
mundo dos “adultos”, afirma Liberati344.
Nos dias hodiernos, a medida sócio-educativa de prestação
de serviços a comunidade acaba por constituir uma medida de excelência tanto
para o jovem que comete infrações quanto para a comunidade. A esta, quanto à
responsabilização pelo desenvolvimento integral do adolescente. Já àquele,
340
O já referido artigo 117 do ECA prescreve que o cumprimento da medida de prestação de
serviços à comunidade não exceda o período de seis meses.
341
ELIAS, Roberto João. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 126.
342
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 179.
343
ELIAS, Roberto João. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 126.
344
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional. p. 109.
86
valerá como experiência de vida comunitária, de aprendizado de valores e
compromissos sociais, leciona Liberati345.
Há de se considerar que o cumprimento da medida em um
contexto familiar e comunitário possibilita ao adolescente o reexame sua conduta,
as conseqüências que desta derivaram e uma possível proposta de mudança de
seu comportamento, não tornando a reincidir em atos infracionais.
A medida sócio-educativa subseqüente ao inciso III do art.
112 é a de liberdade assistida, amparada no art. 118 do ECA:
Art. 118: A liberdade assistida será adotada sempre que se
afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar,
auxiliar e orientar o adolescente.
§1°: A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar
o caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa
de atendimento.
§2°: A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis
meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou
substituída por outra medida, ouvido o orientador, o Ministério
Público e o defensor.
A liberdade assistida é considerada a medida sócioeducativa que maior alcança sucesso quando aplicada adequadamente, por
destinar-se a acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente. Para tal, é nomeado
pela autoridade judiciária um orientador, que poderá ser recomendado por
entidade ou programa de atendimento, ou mesmo tratar-se de técnico pertencente
à equipe multidisciplinar do Juizado da Infância e Juventude, explica Costa346.
A ênfase dada pelo artigo à palavra “assistida” traz o
entendimento de que os adolescentes já não são mais vistos como objetos de
vigilância e controle – como era no caso de liberdade vigiada conhecida na
legislação menorista desde o Código de Mello Mattos de 1927 – mas sim sujeitos
livres e em desenvolvimento, que requerem apoio ou assistência no exercício de
345
346
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e o ato infracional. p. 108.
COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o direito penal juvenil: como limite na
aplicação da medida socioeducativa de internação. p. 84.
87
sua liberdade para se desenvolverem a plenitude, acrescenta Carranza citado por
Cury347.
Normalmente esta medida é aplica a menores reincidentes
em infrações mais leves como pequenos furtos, agressões leves ou porte de
entorpecentes para uso próprio. Pode ainda ser aplicada àqueles que cometeram
infrações mais graves, no entanto, efetuado o estudo social, verifica-se que é
melhor deixá-lo com a família para reintegrar-se à sociedade, aduz Elias348.
Há entendimento, em caráter exemplificativo, do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo pela admissibilidade de liberdade assistida nos
seguintes termos:
Menor – Ato infracional – Roubo e direção de veículo sem
habilitação – Imposição de medida socioeducativa de liberdade
assistida – Pretendida conversão da medida para a de internação
– Inadmissibilidade – Menor primário, que conta com amparo
familiar e laudo psicossocial favorável – Natureza do ato que por
si só não enseja necessariamente a internação – Recurso não
provido. (Apelação Cível n° 23.683-0 – São Paulo – Câmara
Especial – Rel. Lair Loureiro – 25-5-95)349.
Igualmente, aplica-se àqueles que anteriormente estavam
em regime de semiliberdade ou de internação, quando verificado que os mesmos
já se recuperaram em parte e não representam perigo à sociedade, afirma
Elias350.
O prazo mínimo para sua aplicação é de seis meses,
podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra
medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor. Se ao final do
prazo estipulado inicialmente for provada a necessidade de continuidade do
acompanhamento, a medida pode ser prorrogada. Não comporta ainda a fixação
347
Carranza citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 404.
348
ELIAS, Roberto João. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 127.
349
ISHIDA, Valter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e jurisprudência. p. 184.
350
ELIAS, Roberto João. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 127.
88
de prazo máximo, devendo ser aplicada enquanto houver necessidade de
assistência, afirma Nogueira351.
Mostrando-se ainda inadequada ao caso concreto, poderá a
medida de liberdade assistida ser substituída por outra a qualquer tempo,
segundo disposto no art. 99352 do ECA, lembra Del Campo353.
O art. 119 do diploma em comento traz os parâmetros a
serem cumpridos pelo orientador de liberdade assistida354.
Art. 119: Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão da
autoridade competente, a realização dos seguintes encargos,
entre outros:
I – promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendolhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial
ou comunitário de auxilio e assistência social;
II – supervisionar a freqüência e o aproveitamento escolar do
adolescente, promovendo, inclusive, sua matricula;
III – diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e
de sua inserção no mercado de trabalho;
IV – apresentar relatório do caso.
A figura do orientador de liberdade assistida é de suma
relevância, uma vez que ele torna-se o elo entre o adolescente em conflito com a
lei que precisa de ajuda, e o Juiz da Infância e da Juventude, que deposita a
confiança em alguém para prestar esta ajuda, salienta Elias355.
351
NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Estatuto da criança e do adolescente comentado. p. 184.
352
Art. 99 do ECA: As medidas previstas neste Capítulo poderão ser aplicadas isolada ou
cumulativamente, bem como substituídas a qualquer tempo.
353
DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cézar de. Estatuto da criança e
do adolescente: série leituras jurídicas: provas e concursos. p. 181.
354
A função de orientador de liberdade assistida é exercida pelo ocupante do cargo de educador
social do Programa de Medidas Sócio-Educativas, este, servidor público municipal regido pelo
Estatuto do Servidor Público. BRASIL. Lei Municipal n° 2960 de 03 de abril de 1995. Dispõe
sobre o regime jurídico único dos servidores públicos civis da administração direta, das
autarquias e fundações públicas do Município de Itajaí, e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.leismunicipais.com.br/cgi-local/forpgs/showinglaw.pl> Acesso em: 17 out. 2009.
355
ELIAS, Roberto João. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 129.
89
Ao orientador cabe o desempenho das atividades que levam
o orientando a modificar o seu modo de proceder, tornando-o socialmente aceito
sem perder a própria individualidade. O objetivo é fazer com que este evolua e
supere as dificuldades da fase da vida, de modo a exercitar seus direitos de
cidadão e optar por quais caminhos deseja seguir, comenta Freitas citado por
Cury356.
De início, é indispensável a criação de vínculo entre o
técnico, o adolescente e seus familiares, a fim de criar condições de
desenvolvimento de uma relação honesta e produtiva, por meio de um plano de
trabalho a ser proposto e debatido, acrescenta a autora supracitada357.
Importante a atuação do orientador também na família, já
que é sempre possível se identificar nela as crises vividas pelo menor, sendo
necessário fortalecê-la para resolvê-los. Cita ainda Elias358 que no Congresso
Nacional de Proteção Integral do Menor em Mar Del Plata chegou-se à conclusão
de que a função do Estado na proteção do menor e da família constitui uma
obrigação indeclinável, um poder indelegável, que deve assumir para assegurar
permanentemente a satisfação do conjunto de necessidades dos menores para
seu pleno desenvolvimento.
Os incisos II e III do artigo supracitado exigem do orientador
uma ação mais objetiva e necessária. No inciso II recomenda-se supervisionar a
matrícula escolar, freqüência e rendimento do adolescente. Já o inciso III
recomenda o orientador a cooperar para que o adolescente se habilite
profissionalmente e consiga inserir-se no mercado de trabalho em condições
igualitárias e estimulantes para o seu projeto de vida, evitando-se assim
356
Freitas citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 407.
357
Freitas citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 406.
358
ELIAS, Roberto João. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 129.
90
condições de trabalho prematuro e de exploração, enfatiza Carranza citado por
Cury359.
Durante a execução da liberdade assistida, considera-se que
a escolaridade é ponto relevante para o pleno desenvolvimento do adolescente e
não pode ser deixada a plano secundário. Ademais, a inserção no mercado de
trabalho faz também parte da proteção integral que lhe é devida, expõe Elias360.
O relatório do caso a ser apresentado, conforme dispõe o
inciso IV do art. 119 incluirá todos os dados relevantes com as conclusões
aconselhadas (encerramento, prorrogação, substituição, etc.). Aconselhável ainda
ser apresentado aos poucos, a fim de que possa ser dado um melhor
aproveitamento na execução da medida, aduz Freitas citado por Cury361.
Maior citado por Costa362 enfatiza a relevância da aplicação
da medida sócio-educativa de liberdade assistida:
A liberdade assistida oferece melhores condições de êxito porque
se desenvolve direcionada a interferir na realidade familiar e social
do adolescente, buscando resgatar, mediante apoio técnico, suas
potencialidades. Ou seja, o adolescente permanece no contexto
de sua comunidade, no entanto sujeito a determinadas regras, as
quais têm por objetivo auxiliá-lo na construção de um projeto de
vida diferente da “carreira infracional”.
Busca-se, portanto, com a execução da liberdade assistida,
estabelecer vínculos com o adolescente, bem como com sua família, objetivando
reparar as fragmentações que deram ensejo a tais condutas infracionais,
colocando-o a par de seus direitos fundamentais, seus compromissos e
conseqüentemente levá-lo à reflexão quanto à condução do seu destino.
359
Carranza citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 408.
360
ELIAS, Roberto João. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p. 130.
361
Freitas citado por CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado:
comentários jurídicos e sociais. p. 407.
362
Maior citado por COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o direito penal
juvenil: como limite na aplicação da medida socioeducativa de internação. p. 85.
91
Assim sendo, verifica-se a análise genérica quanto à
aplicação das medidas sócio-educativas elencadas no art. 112 do ECA, partindose para o estudo da execução das mesmas no município de Itajaí, mais
especificamente aquelas em meio aberto, quais sejam, prestação de serviços à
comunidade e liberdade assistida.
3.2 O PROGRAMA DE EXECUÇÃO DE MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS NO
MUNICÍPIO DE ITAJAÍ363
A Prefeitura Municipal de Itajaí criou em fevereiro de 1997 a
Secretaria da Criança e do Adolescente objetivando desenvolver uma política de
atendimento, com diretrizes capazes de abranger mais amplamente sua
população infanto-juvenil, em sintonia com o Estatuto da Criança e do
Adolescente, quando este preconiza, em seu artigo 4°:
Art. 4°: É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral
e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a
efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação,
à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária.
O conflito com a Lei, a falta de assistência e orientação são
fatores que fazem parte da realidade de milhares de crianças e adolescentes de
todo Brasil. Por isto, uma equipe composta por psicólogos, pedagogos,
educadores e assistentes sociais, trabalha de forma integrada, sempre na busca
de uma cidade ainda mais amiga da criança e do adolescente.
A Secretaria tem o dever de desenvolver e administrar
Programas voltados à garantia e a promoção dos direitos da criança e do
adolescente. Para tanto, desenvolve atualmente quatro Programas: Programa de
Medidas Sócio-Educativas (objeto de estudo do presente trabalho); Programa de
Apoio ao Serviço Social do Poder Judiciário (composto por assistentes sociais
municipais que auxiliam a Vara da Infância e Juventude do Fórum da Comarca de
Itajaí no andamento dos processos); Centro de Convivência da Criança e do
363
Informações retiradas do Projeto Pedagógico – Programa de Medidas Sócio-Educativas –
Resgate a Cidadania.
92
Adolescente (recebe crianças e adolescentes em seu contra-turno escolar);
Programa de Acolhimento Institucional (composto pelo Abrigo Novo Amanhecer e
pela Casa de Passagem).
O PMSE364 foi implantado em março de 1998 por esta
Secretaria, instalado em suas dependências, articulando-se desde então com o
Poder Judiciário, Ministério Público e Secretaria de Estado da Justiça e
Cidadania. Em março do ano de 2003, o Programa passou a manter suas
instalações no Fórum da Comarca de Itajaí, ao qual cedeu duas salas, em razão
da facilidade do acesso às questões atinentes aos adolescentes que eram
encaminhados a cumprir ou então já cumpriam medidas sócio-educativas.
Tem por finalidade executar as medidas sócio-educativas
aplicadas aos adolescentes pela autoridade competente (conforme já tratado no
Capítulo anterior), tais como Prestação de Serviços a Comunidade e Liberdade
Assistida, bem como proporcionar a estes e sua família, atividades sócioeducativas que desenvolvam ação consciente e transformadora, buscando
melhoria de sua qualidade de vida.
Estando ainda o adolescente comprometido com o uso de
substâncias
psicoativas,
será
este
encaminhado
para
recuperação
e
desintoxicação ao Centro de Apoio Psico Social Anti Drogas (CAPS AD) ou ao
Centro de Atenção Psicossocial para Crianças e Adolescentes (CAPS I),
oferecidos pelo Município, bem como nos casos de internação, encaminhados às
Instituições Terapêuticas conveniadas ao Estado.
Outro fator fundamental para que as ações mostrem-se
eficazes, é o trabalho realizado com as famílias desses adolescentes, uma vez
que este se torna mero reprodutor do meio familiar vulnerabilizado. Assim como o
adolescente,
a família também
deve
envolver-se para
que
haja uma
transformação positiva. Como base para o trabalho, o Programa conta com a
tríade adolescente-família-sociedade, com a finalidade de projetar um futuro mais
promissor para esse jovem no âmbito social, tendo a família como participante
364
Programa de Medidas Sócio-Educativas
93
fundamental
decisivamente
neste
processo
nas
sócio-educativo,
condições
de
já
que
desenvolvimento
a
e
mesma
incide
construção
da
responsabilidade social do adolescente.
Atualmente
o
PMSE
atende
aproximadamente
180
adolescentes que estão em conflito com a lei cumprindo determinação judicial de
medida sócio-educativa de Prestação de Serviços â Comunidade e/ou Liberdade
Assistida365.
Tem por objetivo geral orientar o adolescente autor de ato
infracional no processo de formação da sua cidadania, possibilitando-lhe a
construção de um projeto de vida, incentivando seu retorno à escola e
profissionalização, permitindo-lhe a reflexão sobre seus objetivos e expectativas
futuras.
Por objetivos específicos, trabalha com os seguintes
aspectos: agir de forma integrada na esfera adolescente/família/sociedade;
contribuir para a redução e não-reincidência do ato infracional praticado pelos
adolescentes; formar parcerias com instituições e órgãos públicos e privados para
auxiliar na ressocialização do adolescente; promover a integração do adolescente
à família, à comunidade e à sociedade; criar condições para inserção e
permanência do adolescente na escola; desenvolver ações que facilitem a
integração do adolescente e sua inserção no mercado de trabalho, além de
encaminhar este e/ou sua família, quando necessário, para a rede de políticas
públicas
de
atendimento
(de
assistência
social,
saúde,
educação
e
profissionalização).
Os objetivos específicos vêm acompanhados de ações como
palestras educativas em escolas, visitas às entidades e instituições para formação
de parcerias, visitas domiciliares, capacitação dos agentes envolvidos com o
cumprimento
da
medida,
encaminhamento
de
adolescentes
a
cursos
profissionalizantes e mercado de trabalho.
365
Dado levantado pela pesquisadora desta Monografia, educadora social do PMSE, em
levantamento realizado no mês de outubro de 2009.
94
Ressalta-se que as parcerias com as instituições e
organizações são de suma importância para um cumprimento efetivo das medidas
aplicadas, tornando a sociedade civil parceira na co-responsabilidade para com
os adolescentes do município de Itajaí.
3.2.1 A Metodologia de Atendimento do PMSE
Quanto à metodologia de atendimento, todo adolescente que
chegar ao PMSE para sua admissão será acolhido por um técnico que lhe
fornecerá todas as informações acerca do cumprimento da medida a ser
cumprida, bem como sobre o funcionamento do Programa, assumindo este um
contrato de responsabilidade para sua reintegração social.
Em seguida, será agendado com este e sua família a
realização do estudo social que dará subsídio para que possa ser iniciada a
medida a ele aplicada, assim como sejam providenciados os encaminhamentos à
rede pública de atendimento, caso necessário, como por exemplo, realização de
matrícula escolar, confecção de documentos, inserção da família em Programas
da Assistência Social, tratamento de saúde, etc.
3.2.1.1 O atendimento da medida de liberdade assistida
A
medida
de
liberdade
assistida
consiste
em
um
acompanhamento sistemático ao adolescente. O mesmo comparece em horário
agendado, quinzenalmente ou mensalmente (de acordo com a necessidade de
acompanhamento), sendo informado por sua orientadora dos requisitos a serem
alcançados com a medida, de acordo com o estabelecido no artigo 119 do ECA.
Portanto, será trabalhado com este acerca de temas como família, saúde,
cidadania, escolaridade, profissionalização, ato infracional, suas habilidades,
objetivos para o futuro, enfim, criar condições que possibilitem sua reintegração
familiar e comunitária.
De todo o acompanhamento realizado a este adolescente
durante o período estabelecido (seis meses a um ano), será confeccionado
relatório à autoridade judiciária, contendo todas as informações pertinentes ao
caso.
95
3.2.1.2 O atendimento da medida de prestação de serviços à comunidade366
Em relação à Prestação de Serviços à Comunidade, o
Programa conta com a parceria do Instituto Fala Guri, organização nãogovernamental, que através de projeto aprovado pelo Conselho Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente, atua exclusivamente na execução desta
medida, voltada especificamente para o atendimento de adolescentes autores de
ato infracional.
O
Instituto,
ao
desenvolver
suas
atividades
com
adolescentes, preconiza um trabalho de reflexão-ação, no intuito de levá-lo a
formação de um senso crítico necessário para a sua atuação na sociedade.
Busca ainda trazer linhas de temas baseados nos direitos da criança e do
adolescente inscritos no já mencionado artigo 4° do ECA. A cada mês são
realizadas oficinas com os adolescentes com temáticas chaves, que integram
uma reflexão da realidade, produção de produtos e conseqüentemente à
prestação de serviço a comunidade.
Assim sendo, o Instituto Fala Guri acredita que a prestação
de serviços à comunidade não é somente a própria ida à comunidade, mas sim a
preparação do material, a discussão (reflexão-ação) e por fim a prestação em si.
O trabalho do adolescente começa com oficinas realizadas
de forma lúdica, levando este a refletir acerca do tema do mês. Neste momento,
ocorre um trabalho de integração entre educador e educando, fazendo com que
aos poucos aquele se torne uma referência para este. Com as oficinas o jovem é
estimulado a pensar sobre sua vida, sociedade, bem como a realidade local. Com
isto, não pensará de forma egocêntrica, mas sim no mundo ao seu redor. A
metodologia utilizada até esta etapa configura-se no VER-JULGAR.
Por intermédio destas oficinas, os adolescentes são
estimulados a pensar em propostas de atividades com questões-problemas que
nada mais são do que perguntas chaves a serem aplicadas na comunidade com
parcerias locais tais como postos de saúde, igrejas, associações de moradores,
366
Informações fornecidas pelo educador do Instituto Fala Guri.
96
etc. Assim, os adolescentes passam a construir produtos que serão destinados ao
público da prestação de serviço. Esta etapa consiste na metodologia do AGIR.
Nesse sentido, o Instituto Fala Guri trabalha com a
metodologia VER-JULGAR-AGIR, fazendo com que estas três etapas aconteçam
de forma integrada e harmoniosa durante o cumprimento da medida de prestação
de serviços à comunidade.
3.3 UM DOS CASOS DE SUCESSO DO PROGRAMA DE EXECUÇÃO DE
MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS NO MUNICÍPIO DE ITAJAÍ
A fim de demonstrar a efetividade do PMSE do município de
Itajaí, tomou-se por referencia um dos casos de sucesso do programa. As
informações têm por fonte, os fatos relatados pelo adolescente D.S à
pesquisadora desta Monografia, educadora social do referido programa.
O adolescente D.S foi admitido no PMSE em novembro de
2007, após aplicação pelo Juiz da Vara da Infância e Juventude de medida sócioeducativa de liberdade assistida pelo prazo de 1 ano e 6 meses, em virtude da
prática do ato infracional capitulado no art. 157, §2°, I e II367 do Código Penal.
Hoje, aproximadamente 2 anos após seu ingresso no PMSE,
o adolescente relata com detalhes como passou a fazer parte do sombrio mundo
do crime e das drogas.
De início começou a traficar, imbuído da ambição de
conquistar as coisas que gostaria sem muito esforço. O imediatismo em
conquistar bens materiais que satisfizessem seu ego levou o mesmo a entrar no
mundo do tráfico, como forma de obter rapidamente e cada vez mais, aquilo que
tivesse vontade. A prática do tráfico começou a instigar em D.S o desejo de não
367
Art. 157 do CP - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça
ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de
resistência: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. § 2º - A pena aumenta-se de um
terço até metade: I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma; II - se há o
concurso de duas ou mais pessoas;
97
só vender, mas também fazer uso das substâncias psicoativas368 ao qual
comercializava. Assim, passou a fazer uso de cigarro, logo após maconha,
seguido das mais devastadoras como cocaína, ecstasy e LSD.
Tendo em vista sua forte dependência pelas drogas,
começou a fazer assaltos para sustentar seu vício, estando cada vez mais
envolvido no mundo do crime. Relata que sua vida resumia-se em “usar para viver
e viver para usar” (SIC).
Menciona o adolescente que adquiriu muitos bens de forma
rápida, mas também os perdia de forma mais rápida ainda. O consumismo
exacerbado
das
drogas
aumentava
ainda
mais
suas
dívidas,
levando
conseqüentemente à perda daquilo que até então conquistara com o dinheiro do
tráfico.
Tudo isso acabava por destruir aos poucos a vida de D.S,
que só vivia para o mundo das drogas e do crime. Sua família não suportava mais
esta situação, inclusive as ameaças de morte que o mesmo enfrentara. Sua mãe,
que até então sempre o acolhera quando aparecia em casa drogado, chegou ao
ponto de mandar entregar-se à polícia, do contrário perderia sua família. Foi
assim que o adolescente, querendo fugir do meio em que se encontrava, assim
como da vida medíocre pela qual passava, resolveu entregar-se e ao mesmo
tempo pedir ajuda para internar-se, no intuito de se livrar do vício das drogas.
Ao dar início ao seu primeiro atendimento de L.A, o mesmo
residia com a família. Sua orientadora, verificando quais as necessidades
apresentadas pelo adolescente, cientificou-o da importância de freqüentar
tratamento ambulatorial para livrar-se do vício das drogas, realizar sua matrícula
escolar, bem como freqüentar curso profissionalizante.
368
Substância psicoativa ou psicotrópica: aquela que causa modificações no funcionamento do
Sistema nervoso Central. Drogadição. Elaboração: Núcleo de Estudos da Saúde do
adolescente. Apoio: Ministério da Saúde e Fundação W. K. Kellog. Disponível em:
<http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/multimedia/adolescente/drogas2.swf> Acesso em: 17
out. 2009.
98
Poucos meses depois, a família do adolescente procurou
pelo PMSE, no intuito de solicitar internação para o tratamento da dependência
química de D.S, relatando sua dependência de substâncias psicoativas, mais
especificamente cocaína e maconha. Com isso, foi novamente sugerido ao
adolescente tratamento ambulatorial, contudo, devido às ameaças de morte ao
qual vinha sofrendo não lhe permitiam sair de casa.
Foi então que o PMSE, por meio de ofício relatando o caso e
solicitando internação ao Juiz da Vara da Infância e Juventude, obteve
autorização judicial para acompanhar D.S em uma avaliação psiquiátrica para,
posteriormente, providenciar sua internação em Casa de Recuperação. Assim
sendo, o adolescente fora internado em um Centro de Recuperação, onde
permaneceu por aproximadamente um ano, concluindo com êxito o tratamento,
estando apto para o retorno à família e à sociedade.
Refere que o tratamento permitiu-lhe se conhecer, enxergar
também seus erros, e não somente o do próximo. Foi adaptando-se aos poucos,
de início chegou até a fugir, mas foi pego pelos monitores e retornou para a
Instituição. Chegou até a trabalhar algum tempo como monitor, em razão do
sucesso de sua permanência.
Quando questionado se tinha receio em voltar para a sua
casa aqui em Itajaí depois do tratamento, diz que não sentia medo algum e que já
estava preparado para dar início a uma nova vida. Relata o seguinte: “a
consciência da pessoa é que manda, e ela só entra nessa vida se quiser. Não é
porque a mãe morreu ou não tem dinheiro, por exemplo, que precisa entrar nesse
mundo” (SIC).
Ao voltar para Itajaí, logo em seguida já conseguiu ser
admitido no mercado de trabalho. Tem o apoio de sua família e especialmente do
PMSE, onde retornou ao cumprimento de sua medida de L.A.
Com este o PMSE fez orientações em relação à confecção
de alguns documentos pessoais, realizou com este seu currículo profissional, bem
como efetuou sua matrícula escolar, esta, que segundo o adolescente, não tinha
99
vontade nenhuma de realizar, porém, com o apoio e iniciativa do PMSE, achou
por bem fazer e não se arrepende nem um pouco. “Pensei que seria chato, como
antes na escola, mas lá é bom, as pessoas são mais velhas e a gente aprende
muito um com o outro. A vida é uma troca de experiências” (SIC).
D.S considera o PMSE uma referência, pois comparece ao
mesmo com habitualidade, sempre relatando acerca dos assuntos que lhe são
pertinentes. Refere que as pessoas que estão na vida das drogas e do crime não
possuem incentivo de ninguém, e quando mais precisam, são deixados para trás.
Contudo, o PMSE mostra que há alguém preocupado com eles e sempre disposto
a ajudá-los a sair dessa vida e contribuir para que possamos seguir o caminho
certo.
Até o momento não teve nenhuma recaída. Sua vida hoje,
segundo ele, é um milagre, se considera muito feliz, “nasci de novo” (SIC). Relata
não querer mais envolver-se no mundo das drogas e do crime, haja vista ele
mesmo e sua família terem sofrido muito com isso. Acredita que o melhor
caminho agora é trabalhar com dignidade e concluir seus estudos.
Quando indagado se tem algum sonho, menciona que vive
por cada dia, sem se preocupar com o amanhã. “É do sonho que a gente tem
força para viver... conforme vão abrindo-se as portas, vamos conquistando” (SIC).
D.S hoje vê o valor que se deve dar à família e
principalmente à vida. É muito grato por todos aqueles que tiverem ao seu lado
nos momentos mais difíceis, demonstra ter um grande afeto pela equipe do
PMSE, preocupação em cumprir sua medida sócio-educativa de L.A e finaliza
com a frase: “a felicidade não é ter aquilo que se ama, mas amar aquilo que se
tem”. (SIC)
Findo o relato da pesquisa, seguem as consideração finais
desta monografia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo deste trabalho foi tratar das medidas sócioeducativas de prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida pelo
Município de Itajaí, assunto este pouco abordado e conhecido pela sociedade,
diante da tamanha valoração que lhe deve ser dada.
Para uma melhor compreensão do tema pesquisado, dividiuse a presente Monografia em três capítulos.
No primeiro Capítulo, tratou-se do histórico da legislação
responsável pela aplicação do direito à infância e juventude no Brasil. Verificou-se
que nem sempre tais direitos eram garantidos plenamente aos menores. Seus
precedentes históricos revelam que os interesses dos “adultos” possuíam maior
relevância do que de fato a criança ou adolescente envolvidos. Apesar da boa
vontade e do espírito de compaixão que movia algumas pessoas, a negligência
sofrida por parte da família e da sociedade eram evidentes. Exemplo evidente
desta violação reflete-se com O Código de Menores de 1979, pautado na doutrina
da situação irregular onde o menor, independente de ser abandonado ou ter
cometido infrações era privado de sua liberdade.
Foi então que o atual Estatuto da Criança e do Adolescente,
decorrente dos direitos à infância e juventude garantidos pela Constituição da
República Federativa do Brasil de 1998, surge pautado na doutrina da proteção
integral, objetivando efetivar definitivamente todos e quaisquer direitos inerentes à
população infanto-juvenil, passando a ter prioridade na sociedade e rompendo
definitivamente com a doutrina da situação irregular. Foram trazidos ainda seus
direitos fundamentais, bem como as medidas de proteção aplicáveis àqueles em
conflito com a lei.
O segundo Capítulo discorreu de maneira técnica e
sintetizada sobre os procedimentos responsáveis pela apuração de um ato
infracional quando cometido por criança ou adolescente.
Os direitos
101
fundamentais e as garantias individuais revelam que estes menores possuem
resguardados os direitos inerentes a sua formação diante da adequação ao
sistema tanto jurídico, quanto social, ao cometer um ato infracional.
E,
tratou-se
também
das
medidas
sócio-educativas
aplicáveis a criança e ao adolescente, bem como o instituto da remissão judicial,
ou seja, o perdão do ato infracional, antes de iniciado o procedimento judicial
pode se fazer presente, levando à suspensão ou extinção processual,
dependendo de cada caso.
No terceiro e último Capítulo, o tema de estudo da pesquisa
revelou a forma como são executadas as medidas sócio-educativas de prestação
de serviços à comunidade e liberdade assistida no município de Itajaí. Ademais,
além do aspecto metodológico da execução, um caso de sucesso do Programa
de Medidas Sócio-Educativas foi relatado, demonstrando o êxito do retorno do
adolescente ao convívio familiar e social durante o cumprimento de medida sócioeducativa imposta pela prática de ato infracional.
Por fim, retomam-se as hipóteses levantadas na introdução:
A 1ª hipótese restou parcialmente confirmada, uma vez que
a criança e o adolescente nem sempre foram objeto da proteção integral no
Brasil. Os precedentes históricos estudados revelam que não eram considerados
sujeitos de direitos, mas sim apenas objetos de intervenção de uma norma que
não tutelava com integridade sua condição de pessoa em desenvolvimento. Com
a ascensão da doutrina da proteção integral dos direitos da criança e do
adolescente, materializada por tratados, convenções internacionais e pela própria
CRFB/88, passaram a ter prioridade absoluta em tudo que diga respeito ao tema
infanto-juvenil, levando em consideração seus interesses, bem como sua
condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, além de romper com a doutrina
da situação irregular.
A 2ª hipótese, por sua vez, restou confirmada, quando
apresentado um caso de sucesso de um adolescente que se adaptou
efetivamente à convivência familiar e social como cidadão de direitos e
102
obrigações com o cumprimento da medida sócio-educativa. Elucida-se através
deste caso de sucesso, dentre muitos outros existentes, que é possível a
reintegração do adolescente em conflito com a lei ao seu convívio, mesmo depois
de envolvido no mundo do crime e das drogas. O trabalho executado pelo PMSE
é relevante no sentido de servir de referência para aqueles que transgredirem a
lei, contribuindo na sua ressocialização.
Por fim, necessário que todos, sem distinção, vençam o
desafio de lutar pela criação de condições materiais e jurídicas que tornem
possível para todas as crianças e adolescentes uma vida digna, em respeito a sua
condição.
E, para tanto, que seja ainda respeitada e colocada em prática a
mensagem lançada ao Brasil e ao mundo pelo artigo 227 da Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988.
Ressalta a pesquisadora que não se propôs a esgotar o
tema, mas que pretendeu discorrer sobre o mesmo, a fim de demonstrar que a
doutrina da proteção integral propicia a criança e ao adolescente a possibilidade
de serem adultos engajados na sociedade. Estimular novas pesquisas e
principalmente contribuir para a reflexão da sociedade na efetividade deste
processo, ou seja, o fortalecimento do vínculo entre a criança e o adolescente em
desenvolvimento e o meio em que vivem – a sociedade.
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