ARTIGO DE REVISÃO A Participação de Oligonutrientes na Insuficiência Cardíaca Trace Elements in Heart Failure SÉRGIO DA CUNHA Coordenador Clínico da Equipe Multidisciplinar de Terapia Nutricional do Hospital Universitário Pedro Ernesto Especialista em Nutrição Enteral e Parenteral (SBNPE) Endereço Rua Hermengarda, 20, sala 405 - Méier - R.J. - CEP: 20710-010 e-mail [email protected] - Tel: (021) 593-8639 PALAVRAS CHAVE Oligoelementos, insuficiência cardíaca, selênio, cobre KEYWORDS Trace elements, heart failure. selenium, copper. INTRODUÇÃO A Insuficiência Cardíaca (IC) é uma síndrome sistêmica complexa que altera o estado nutricional (1,2,3) A deficiência calórico-protéica está freqüentemente associada a de micronutrientes, que influenciam o bom desempenho da função miocárdica, como a vitamina B" sódio. pOtáSSIO,cálcio, fósforo, magnésio, selênio e cobre. Sabemos que a deficiência de potássio, cálcio, magnésio e selênio podem desencadear destruição miofibrilar com necrose miocárdica focal (4). São escassos OS trabalhos referentes ao papel dos oligoelementos na função cardíaca. Grande parte dos estudos é experimental e poucos se referem a aval i186 Jul/Aga/Set - 1998 ações clínicas. As dificuldades vão desde a falta de um conhecimento preciso da participação de cada elemento na função celular até as dificuldades técnicas para as dosagens destes micronutrientes nos diversos materiais orgãnicos (sangue, plasma, urina, líquor, etc), exigindo equipamentos sofisticados e muito onerosos. A reposição empírica de oligoelementos, em especial do selênio, tem sido adotada por alguns profissionais, em pacientes com cardiomiopatia dilatada grave não responsiva à terapêutica usual, para os quais a dosagem sérica é economicamente inviável. Este é um exemplo do quanto ainda temos que caminhar no sentido do melhor conhecimento do perfil nutricional dos nossos pacientes, o que inclui o estabelecimento dos níveis séricos normais desses elementos na população brasileira, a partir dos quais possamos inferir suas deficiências nos cardiopatas, assim como a relação entre essas deficiências e a etiologia da insuficiência cardíaca. Rev SOCERJ Vai XI W 3 QUEM SÃO OS OLlGOELEMENTOS ? sto - Os oligoelementos são também chamados de elementos-traço ou microminerais. São nutrientes que existem em quantidades mínimas no nosso organismo (menos que 0,01 % do peso corporal total), porém sua deficiência pode resultar em distúrbios metabólicos importantes. Um elemento químico é definido como oligoelemento quando apresenta as seguintes características (5): estar presente em tecido vivo e sadio; ser encontrado no feto e no recém nascido; ter controle homeostático sobre a taxa de captação ou excreção pelo sangue ou tecidos; apresentar alterações consistentes nos níveis sanguíneos, nas concentrações teciduais e na distribuição do processo metabólico como resultado da atividade fisiológica; identificá-Io em uma enzima ou como ativador de enzima; caracterizar sinais e sintomas específicos como resultado de sua carência total ou parcial, que podem ser revertidos com a administração do mesmo elemento e que este processo possa ser reproduzido em experimentação animal. São dez os oligoelementos mais importantes para a saúde do homem ferro (Fe), zinco (Zn), cobre (Cu), cromo (Cr ), selênio (Se), cobalto (Co), iodo (I), manganês (Mn). molibdênio (Mo) e flúor (F). Desses, encontramos relatos na literatura sobre uma possível participação do Se, Cu, Zn, Cr, Fe e Mn como nutrientes importantes para a preservação da função rniocárdica. Também se destaca o cobalto, não por seu papel nutricional, mas por sua ação tóxica sobre o miocárdio SELÊNIO (Se) .a de .ada 3cninos .rina, os e )ecissiograiuais ste é mhar .erf I esta; ele~uais atas, se a XI As necessidades diárias de Se variam de 50 a 200 g/ dia. As principais fontes naturais da dieta são: trigo, milho. arroz e grãos de soja. O nível de Se nesses produtos agrícolas é proporcional ao teor do elemento no solo onde são cultivados. Existem regiões onde a composição geoquímica revela deficiências do Se no solo, como na Finlândia, Nova Zelândia, costa leste dos EUA e China. Essa é a razão pela qual os estudos realizados em vários países que pesquisaram o seu nível sérico normal revelaram valores que oscilaram de 0,53 moi / L (Finlândia) a 2,01 moi / L (Canadá). Não temos conhecimento de que estudos semelhantes tenham sido feitos na população brasileira. com o agravante das regiões geográficas em nosso país serem tão diferentes quanto à riqueza de seus solos. Os eventos celulares que levam à miopatia e cardiomiopatia como resultado da deficiência de Se têm sido motivo de muitos estudos. O Se é parte integrante da enzima glutationa peroxidase, que catalisa a redução de grande número de hidroperóxidos de lipí- dias e do peróxido de hidrogênio (radical livre de oxigênio). Em primeiro lugar, o Se na glutationa peroxidase pode controlar os níveis intracelulares de peróxido de hidrogênio, que afetam a formação de metabolitos ativos de oxigênio, que podem servir como iniciadores de- peroxidação lipídica, com conseqüente dano nas membranas celulares. Este papel do Se está relacionado ao das superóxido desmutases, que controlam os níveis intracelulares do ânion superóxido. Em segundo lugar, a vitamina E pode controlar a formação de hidroperóxidos lipídicos através de sua função antioxidante, possivelmente, entrando na estrutura dos fosfolipídeos da membrana. Terceiro, a glutationa peroxidose pode catalisar a redução dos hidroperóxidos lipídeos, iormados dos lipídeos da membrana, a hidroácidos. sem detrimento para a economia celular (6). Outros mecanismos descritos para a ação do Se illcluem a modulação da síntese de prostaglandinas e agregação plaquetária e proteção contra metais pesados tóxicos (7). Numerosos trabalhos têm sido publicados sobre cardiomiopatia induzida pela deficiência do Se (8,9,10,11), como os casos da doença de Keshan. cardiomiopatia endêmica observada na China, controlada com a reposição oral de selenito de sódio. Os outros casos relatados se-referem, em sua maioria. a pacientes submetidos à nutrição parenteral prolongada sem reposição deste elemento, ou pacientes com síndrome de imunodeficiência adquirida e desnutrição grave. Entretanto a evidência, a partir de estudos prospectivos caso-controle, da associação entre níveis baixos de Se e doenças cardiovasculares. se mantém controversa. Várias condições clínicas estão associadas à redução nos níveis de Se no soro e tecidos, entre elas: síndrome de imunodeficiência adquirida, alcoolismo, hepatite crônica ativa, cirrose biliar primária, colite ulcerativa extensa, doença deCrohn, doença de Whipple, câncer, leucemia linfocítica crônica e outras (12). Estudos analisando o Se nas cardiomiopatias são numerosos e com resultados convincentes. Um deles mostrou menores níveis de Se em pacientes com cardiorniopatia dilatada, 25% dos quais tinham história de uso abusivo de álcool (13 ). Nesse estudo os níveis séricos do Se se correlacionaram com a fração de ejeção ventricular esquerda .0 valor médio do Se no soro do grupo controle foi 80,1 g /L, com faixa de 53 a 1179 IL. O valor médio do Se sérico dos 14 pacientes foi 47,8g / L, com variação de 23 a 70 g/L. Concluiu-se que nesses pacientes com car~ diomiopatia dilatada idiopática o Se encontrado fOI cerca de 40% inferior ao dos controles sadios. Um caso de cardiomiopatia responsiva ao Se foi descrito em uma menina de dois anos, associado a dieta inadequada. Sua ingestão foi estimada em 10 g / dia, o Nº3 Rev SOCERJ Vol XI Nº 3 JullAgo/Set - 1998 187 Se sé rico era 0,44mol 1 L. Após oferta oral de selenito de sódio, 2 mg 1 dia, o nível sérico subiu para 1,33 moi! L e melhorou a condição clínica (14). COBRE (CU) A restrição de eu na dieta de ratos também resulta em cardiomiopatia (15) Alguns autores estimam essa ingestão, em americanos, em 1,55mg ! dia, em média. O Conselho Nacional de Pesquisa dos Estados Unidos da América estabeleceu o nível seguro de ingestão diária entre 1,5 e 3,Omg 1 dia. Tem sido questionada a adequação da ingestão de Cu na população sadia (16,17). A deficiência de eu parece promover estímulo para o desenvolvimento de hipertrofia cardíaca compensatória, caracterizada por mudanças funcionais e ultra-estruturais, com alta morbidade e mortalidade (17,18). Uma questão não respondida é se a ingestão pouco abaixo do preconizado na dieta pode tarnbern levar a quadro semelhante, em exposição prolongada. Os mecanismos exatos da agressão ainda não foram esclarecidos, porém, uma vez que a atividade da enzima superóxido desmutase se reduz com a deficiência de eu, podemos supor que as lesões encontradas na membrana basal miocárdica são o resultado da perda da proteção contra os radicais livres de oxigênio produzidos O tratamento de ratos com doença cardíaca induzida por deficiência de Cu com antioxidantes resultou em redução da hipertrofia cardíaca e menor dano mitocondrial (18). Em porcos com quinze dias de vida alimentados com dieta pobre em Cu por oito semanas, observou-se: aumento da relação peso do coração! peso corporal e alterações eletrocardiográficas, confirmando achados já observados em ratos (19). Estudos em humanos com deficiência experimental de cobre revelaram aumento do colesterol total e LDL - colesterol e alterações no ECG em homem após quinze semanas em dieta com oferta de 0.8mg de Cul dia (20); aumento do LDL - colesterol e redução do HDL - colesterol, sem alteração do colesterol total em 24 homens com ingestão de eu de 1mg ! dia (17); nenhuma alteração no colesterol e função cardíaca em 11 homens após 6 semanas de dieta com 0,8mg Cu! dia (21). Mudança no conteúdo sangüíneo de Cu foi analisada em dez pacientes com doença cardíaca isquêmica submetidos a cirurgia de revascularização miocárdica (22). Foi visto que as concentrações dos oligoelementos reduzem significativamente durante a cirurgia. A variação nos níveis sangüíneos poderia se dever à hemodiluição causada pela administração de colóides e çristalóides, que não continham nenhum oligoelemento que estava sendo estudado. Essas soluções eram usadas para preencher o equipamento de circulação extracorpórea. No entanto acredita-se que não se deveria esperar tamanha diluição, considerando o volume de líquido usado, e, após retorno 188 Jul/Ago/Set - 1998 do hematócrito ao nível normal, somente o ferro sérico retornava aos níveis pré-operatórios. Foi demonstrado que as concentrações sangüíneas de Cu eram consideravelmente mais baixas nos pacientes que desenvolveram insuficiência cardíaca precocemente após a revascularização quando comparadas às dos pacientes que evoluíram sem complicações .: Observou-se que o grau das mudanças nos níveis de Cu no sangue do seio coronário durante a cirurgia cardíaca pode ser avaliado pelas mudanças no seu conteúdo no sangue arterial (22). Outra questão a ser esclarecida é a aparente seletividade da toxicidade ao coração. Visando a análise desse aspecto, Chen e cais. examinaram a relação entre a gravidade do dano oxidativo induzido pela deficiência de eu e a capacidade de defesa antioxidante no coração e fígado(23). Dois grupos de ratos foram estudados, o primeiro com dieta pobre em Cu (0.4 g/g de dieta) e o segundo com reposição adequada do elemento (6,0 g/g de dieta) por quatro semanas. A deficiência de Cu induziu ao aumento de duas vezes na peroxidação lipídica no coração, mas não alterou a peroxidação no fígado. As atividades antioxidantes das enzimas superóxido desmutase, catalase e glutatione-peroxidase estavam mais baixas no coração do que no fígado, respectivamente, 3, 50 e 1,5 vezes, muito embora reduzidas nos dois órgãos. A atividade da glutatione redutase estava 4 vezes mais baixa no coração que no fígado. Concluíram que o sistema antioxidante enfraquecido é responsável pelo alto grau de dano oxidativo dos corações deficientes em Cu. ZINCO (Zn) O Zn desempenha importante papel no crescimento tecidual e no seu reparo. Está preferencialmente concentrado nos locais de lesão tecidual e várias enzimas dependentes do Zn aumentam sua atividade durante a ruptura dos tecidos. Está envolvido na síntese de DNA. RNA e proteínas. Ratos alimentados com rações deficientes em Zn foram avaliados quanto ao ritmo de crescimento, conteúdo tecidual de Zn e sínteseprotéica (24) A incorporação de leucina marcada nos músculos esquelético e cardíaco foi reduzida em 57 a 64% quando comparada a dos animais nutridos adequadamente com Zn. O conteúdo de Zn no músculo esquelético dos animais alimentados com deficiência de Zn não estava reduzido, mas havia pequena e significativa perda de Zn no coração. Concluiu-se que o organismo sadio é muito sensível a deficiências dietéticas de Zn, mas a redução no crescimento e síntese protéica não podem ser facilmente atribuídos à redução tecidual deste elemento. Isto aponta para a existência de outros mecanismos de controle mediando a regulação do crescimento e síntese protéica em resposta a ofertas reduzidas do Zn. Estudo realizado em corações de pacientes que faRev SOCERJ Vol XI N23 érico istraeram , que men3.S às 5es .: iíveis urgia ) seu ente do a am a duzietesa )s de .obre s.ção .iatro lento ação. vida.xido avam oectizidas .itase )ado .ueciJativo nento -:con- zunas 'uranse de m ra.to ao e síniarcauzida is nuje Zn scom havia . Con- .ivel a ' leceram por cardiopatia congênita cianótica e cardiopatia reumática aguda não revelou concentração de Zn diferente da encontrada em corações de indivíduos sem cardiopatia. Os autores explicaram o fato por estar o Zn envolvido com reparo tecidual (25). O mesmo estudo mostrou níveis reduzidos de Cu, Mg e Ca no miocárdio dos cardiopatas, e uma relação Mg++ / Ca ++semelhante à relatada em modelos experimentais em zonas peri-infarto. O Zn foi analisado em pacientes com Diabetes mellitus (DM) e Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC). Foram criados três grupos de paCientes: grupo 1: 15 pacientes com DM e ICC: Grupo 2: 20 pacientes com DM isolado; grupo 3: 9 pacientes com ICC isolada. Os grupos 1 e 3 foram tratados com captopril e diuréticos Foram observados níveis plasmáticos de Zn estatisticamente semelhantes nos três grupos, mas o urinário foi significativamente maior no grupo de pacientes com DM e ICC (grupo 1) Concluiu-se que esses pacientes podem eventualmente desenvolver deficiência de Zn devido a essa maior excreção urinária (26) Também cabe ressaltar que a deficiência de Zn pode estar associada a alterações na absorção e metabolismo do Cu. Estudo experimental em ratos observou que os animais alimentados com rações pobres em Zn mostraram sinais bioquímicos de deficiência de Cu (medidas as atividades da superóxido desmutase e citocromo c oxidase no coração e fígado e ceruloplasmina no soro) (27). A participação da relação Zn/Cu na etiologia da doença cardíaca coronariana tem sido aventada (28,29) O desequilíbrio metabólico poderia ser por deficiência absoluta ou relativa de Cu caracterizada por alta taxa Zn/Cu. Resulta em hipercolesterolemia e aumento de mortalidade por doença coronariana (28). Pode ser uma conseqüência das quantidades de Zn e Cu nos alimentos, falta de substâncias protetoras nos mesmos ou na água ou por alterações no 'estado fisiológico que promoveriam mudanças nas suas distribuições nos órgãos Essa chamada "hipótese Zn/Cu", que relaciona a deficiência absoluta ou relativa de Cu à etiologia da cardiopatia isquêmica, foi analisada em outro estudo, que considerou a possibilidade do Ca (e talvez o Mg) presente na água ser o responsável pela proteção contra a cardiopatia isquêmica alterando o metabolismo do Cu e Zn (29). Os estudos citados nos mostram que existe muito a ser pesquisado e concluído sobre o verdadeiro papel da deficiência desse elemento, assim como sua relação com os demais micronutrientes na etiologia da ICC. cres- FERRO (Fe) nente Isto os de j e síndoZn. 1ue fa- O. Pacientes com bom estado nutricional têm reservas substanciais de Fe, sendo necessária a privação prolongada para que surjam os sinais clínicos de sua deficiência. - Rev SOCERJ Vai XI Nº 3 A participação da deficiência de Fe no desenvolvimento de descompensação cardíaca é conhecida de longa data e continua sendo abordada em estudos recentes. Petering e cols. estudaram essa deficiência como causa do desenvolvimento de cardiomiopatia em ratos (30). Analisaram o peso dos corações e fíg'ados, o crescimento dos animais, hemoglobina e hematócrito, assim como os dados histopatológicos cardíacos. Os animais alimentados com rações pobres em Fe estavam gravemente anêmicos e com cardiomegalia. O estudo histopatológico mostrou alterações características de carciorniopatia dilatada. Este grupo tinha 27% menos Fe no coração quando comparado aos animais com dieta adequada pm Fe. A deficiência de Fe parece também influenciar os níveis de outros minerais em vários tecidos de ratos (31), inclusive redução dos níveis sanguíneos de Zn, podendo, portanto, participar de forma indireta no aparecimento de distúrbios do metabolismo desse micronutriente. Trabalho recente (32) avaliou o efeito da deficiência experimental de Fe na função cardíaca. Foram observadas alterações eletrofisiológicas e mecânicas no miocárdio dos ratos estudados, tais como menor duração do potencial de ação, menor contração ventricular e maior resposta inotrópica ao isoproterenol, refletindo maior reatividade à estimulação ~-adrenérgica. A gravidade das alterações microcirculatórias e da função ventricular esquerda compensatórias de pacientes com anemia por deficiência crônica de Fe foi investigada em 299 mulheres. Foram observadas alterações significativas na área venular e capilar da microcirculação, por biomicroscopia corijuntival. Verificaram aumento do diâmetro venular, focos de microcongestão, microhemorragias, aumento da irregularidade de vênulas e capilares. A ecocardiografia revelou aumentos das dimensões sistólica e diastólica finais do ventrículo esquerdo, estado hiperdinâmico, com aumento do débito e volume sistólicos. Uma pequena redução da contratilidade miocárdica só foi observada em graus acentuados de anemia. O tratamento com Fe parenteral resultou em reversão completa tanto das alterações miocárdicas quanto das microcirculatórias, nas deficiências leve e moderada, com recuperação mais lenta no grave (33). Cabe investigar até que ponto as alterações observadas nesses estudos são apenas reflexo das manifestações sistêmicas da deficiência de Fe, tais como anemia, alteração no metabolismo das catecolaminas e hormônios tireoidianos, diminuição da viscosidade sanguínea e resistência periférica, ou uma possível influência direta do elemento sobre o estado elétrico e mecânico do miocárdio. Jul/Aga/Set - 1998 189 CROMO (Cr) É descrito como essencial ao organismo humano desde o final da década de sessenta (34). Age primariamente regulando a ação da insulina. Na sua presença menor quantidade de insulina é necessária. O envelhecimento está associado à elevação da glicose e insulina circulantes, diminuição da eficiência da insulina. elevação de colesterol e triglicerídios, diminuição do HDL-colestel'Ol, rnenoi condução nervosa e diminuição da massa corporal magra. Todas essas alterações também acontecem na deficiência de Cr. Pacientes com DM tipo II têm menor Cr sérico que não diabéticos (35), e suplementação com Cr em diabéticos mostrou melhorar a tolerância à glicose, dirninu« cúieslsíoi e lrigiicerícJios séricos. e aumentar HDL-colesterol (36-39) Níveis séricos de Cr foram menores nos pacientes com doença arterial coronariana demonstrada por ançioqratia, quando comparados aos de grupo controle com angiografia normal (4041) Foi observada. cor Davies e cols. (42). redução significativa relaci-; 'lada à idade, nos níveis de Cr, tanto no cabelo qU&::~ono suor e no soro. de mais de 40.000 pacientes ana-sacos. Foi evidenciado o papel desses níveis baixos de Cr no maior risco de desenvolvimento. com c avançar da idade. ca intolerância à glicose. alteraçces do metabolismc lipídico, doença coronariana. ér:sriosclerose e DM tipo 11. Observaram redução vcgressiva nos níveis sé ricos de cromo com o avar.car da idade, de tal ordem que aos 75 anos esses nlves foram 42% rneno.es que os observados na faixa de 1 a 4 anos de idade Os homens tiveram níveis ~2is baixos que as mulheres. A menor média ocorreu ros homens na faixa de 30 a 59 anos, ocasião da vica onde existe maior ciíerença homem/ mulher na oreva.éncia de morbidade e mortalidade por doença cc.cnariana. A maior ingest2.o de carboidratos refinados pela sociedade mccerna pode ser a responsável pela queda progressiva dos níveis de Cr ao longo da vida, uma vez que o refinamento do carboidrato remove mais ds 90% do Cu natural As necessidades diárias tcr arn estimadas em 25!lg na Inglaterra, e 50 a 200!lg nos Estados Unidos. Neste último, o conteúdo médio de Cr na dieta por 1000 calorias em 216 refeições de 22 mulheres e 10 homens. coletaccs em 7 dias consecutivos foi de, aproximadamente. 15!lg (43). Assim, os pacientes teriam que ingerir mais de 3000 Kcal para atingir os 50!lg estabelecidos como mínimo desejado O chamado "paradoxo francês", descrito como baixa incidência de doença coronariana em país em que a ingestão de gordura é elevada, tem sido explicado pelo consumo regular de vinho por aquela população Em 1980 foi sugerido que o alto conteúdo de Cr do vinho poderia .3er o responsável pela menor mortalidade por doença coronariana na França (44). Tra190 Jul/Ago/Set - 1998 balhos mais recentes também sugerem um efeito cardioprotetor do vinho (45-47). Vários trabalhos citados sugerem uma correlação entre os níveis de Cr no organismo humano e fatores de risco associados a cardiopatias. O possível papel de nutrientes enriquecidos com Cr na prevenção desses fatores de risco e, consequentemente, da ICC, ainda requer estudos mais amplos. d( COBALTO (CO) a A única função cqnhecida do Co, como nutriente, é como componente da vitamina B 12' e, portanto, importante na prevenção da anemia megaloblástica. Quanto a sua influência sobre a função cardíaca muito tem sido deSCI iiu sobre sua ação tóxica sobre o miocárdio. Heggtveit e cols. (48) sugeriram o provável mecanismo da cardiotoxicidade do Co. Ele deprime a utilização do oxigênio na mitocôndria cardíaca. Este efeito se deveria à formação de complexo do Co com grupos sulíidrila do ácido alfa-lipóico, impedindo a oxidação do alfa-cetoglutarato e piruvato, respectivamente, a succinil-CoA e acetil-CoA no cicio do ácido cítrico. A tiamina age como cofator nos mesmos pontos do ciclo, talvez sendo esta a razão para a sernelhança clínica da cardiomiopatia pelo Co e a doença cardíaca por deficiência de tiamina. Estudo recente em ratos submetidos a injeções subcutãneas de cloreto de Co em quatro doses (1 mg/Kg de peso, 5 mg/Kg, 20 mg/Kg e 50 mg/Kg) observou acúmulo e dose dependente do Co no miocárdio dos animais (49). Houve redução da atividade da manganês-superóxido-desmutase no miocárdio, tendo os autores concluído que a ação cardiotóxica do Co poderia estar relacionada à vulnerabilidade do miocárdio aos radicais livres de oxigênio provocada pela menor ação da enzima. Os primeiros casos de ICC associados à cardiomiopatia induzida pelo Co foram relatados no meio da década de sessenta, inicialmente no Canadá e depois nos Estados Unidos e Europa (50,51). A doença ocorreu em indivíduos que ingeriram cerveja em cuja produção foi utilizado sulfato de Co como estabilizador Desde a retirada desse agente da composição da cerveja, nenhum outro caso ligado à ingestão da bebida foi relatado. Desde então, vem sendo estudado o possível papel da exposição industrial ao Co como causa de cardiomiopatia (50,52). O Co é utilizado, juntamente com o tungstênio, na produção de ligas de metais pesados de elevada resistência, inclusive ao calor. Não está claro se os casos isolados de cardiomiopatia associados à exposição industrial ao Co representam a chance de ocorrer cardiorniopatia congestiva idiopática em trabalhadores expostos ao Co ou se a exposição ocupacional é um fator causal. Existe evidência de que a absorção sistêmica de Co pode ocorrer através dos pulmões Dois trabalhadores de laboratórios Rev SOCERJ Vai XI NQ3 1~ gl gl çi tr: Si d( n( E V' ç' ri b H ç ç q s s p ti C C r E efeito dação atores papel 3nção 3.ICC, nte, é im- J, rca. muito are o .rováfepriJíaca. <O do mpevato, ;0 cir nos azão ioCo 3.. Es.bcug/Kg -rvou ) dos e da tena do .:; do :ada .mioa da :: deença cuja amO comdo à vem o in;52). na fada ,e os '1 ex·s de I tra.ição a de l, atraórios XI NQ3 de ensaios COm minerais, Um COm 27 e o outro COm 19 anos, desenvolveram quadros de ICC graves, exigindo hospitalização e até transplante cardíaco (segundo caso), tendo sido ambos atribuídos à exposição à poeira rica em Co, presente nos seus locais de trabalho, o que foi confirmado pelas autoridades da Saúde Pública de Nevada (EUA). Foram encontrados níveis altos de Co no cabelo (primeiro caso) e no rniocárdio (segundo caso) quando comparados a controles Em estudo envolvendo trinta trabalhadores expostos ao Co por um tempo médio de 9,9 ± 5,3 anos foi feita ventriculografia COmradioisótopo para avaliar as frações dE:8J8ção ventriculares direita e esquerda, em repouso e exercício (53) Em todos a função biventricular em repouso e em exercício foi normal. Houve. no entanto, uma fraca, mas significativa relação inversa entre a duração da exposição e a função ventricular esquerda em repouso, concluindo-se que a s/posição industrial prolongada ao Co pode ser um 2.gente indutor fraco de cardiomiopatia não se conr S~S:ldo as repercussões a longo prazo. A íuncãc cardíaca foi estudada também (54) em 31 trabalhadores expostos ao Co por 10,4 anos (faixa de 1 a 2')) com níveis ambientais de exposição de 0,09 a ; 3.6 mg/cm:; de Co. com e sem doença pulmonar induzida por metais pesados. Foram feitos: ECG. teste de esforço, ecocardiograma e angiocardiogre.::::; CO", radioisótopo (Tc99) Os objetivos eram. a) fv1os:'2.( 2. existência de cardiomiopatia induzida pelo Cc <os trabalhadores analisados; b) Achar um indicacc- crecoce da disfunção cardíaca que pudesse ser usado no exame clínico dos trabalhadores submetidos 2. essa exposição Os achados revelaram casos ci", cardiorniopatia de etiologia duvidosa no grupo G~ pacientes com doença pulmonar induzida por m",::::s cesados. Os índices cardíacos obtidos COmar.ç.ccaroioçratia revelaram disfunção ventricular nos ~'2c2ihadores sem doença pulmonar, que poderia se' ~n12 manifestação de hipertensão arterial pulrnona: inicial ou um cor pulmonale oculto inicial, devido e. ccença pulmonar fibrótica desconhecida. MANGANÊS (Mn) É outrc ~!emento envolvido com a ação de enzima ligada;:; proteção do organismo contra os radicais livres ce 2x:gÊnlo. Malecki demonstrou, experimentalmente que a deficiência de Mn resulta em redução da superóxido-desrnutase cardíaca e, mais recentems-ue. que a oferta dietética do elemento protege as membranas mitocondriais cardíacas de processo de oxidação in vivo (55). Quandc se analisou o efeito da oferta na dieta de oíiqoelerneruos anti-oxidantes (Zn. Cu, Mil, Se) na tolerância cardíaca à isquemia-reperfusão, em ratos, observou-se que a) a atividade das enzimas antioxidantes aumentava e diminuía significativamente Rev SOCERJ Vol XI NQ 3 COm dietas suplementadas e deficientes em oliooelernentos. respectivamente, mas não era modificada por episódio isquemia-reperfusão; b) a recuperação da função cardíaca durante a reperfusão e a uirraestrutura ventricular miocárdica melhoraram sig nificativamente sob a influência da suplementação dos oligoelementos, quando comparada ao grupo controle e ao grupo COm oferta deficiente (56) O estudo ilustra o efeito protetor desses oligoelementos ccrno co-fatores de enzimas antioxidantes na limitação da lesão induzida por isquemia-reperfusão rniocároca sugerindo um possível campo na terapia anti-isquérrtca e, consecuenternente. na prevenção de uma das cmcipais causas de insuficiência cardíaca. COMENTÁRIOS FINAIS Todos os trabalhos estudados nos mostram i.na tendência à valorização dos oligoelementos CCIIO agentes capazes de induzir e/ou agravar a ins.rficiência cardíaca. C estabelecimento de causa eeito entre essas variáveis ainda depende de mu-ros esclarecimentos. Precisamos definir níveis séricos normais desses micronutrientes nas diversas rt';;)iões do Brasii, comparar esses valores com os 211contrados nos nossos pacientes e correlaciona: os níveis séricos com a gravidade da disfunção c 3rdíaca. Uma vez estabelecida uma relação positiva, caberá, então, a busca pelos mecanismos: siopatológicos e bioquímicos e o uso desses micronutrientes em estudos duplo-ceço, randomizados e em larga escala, visando esctaecer o que realmente importa nessa questão: a '8posição de oligoelementos pode mudar a evcução clínica da insuficiência cardíaca? REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Pittman JG, Cohen P The pathogenesis of cero.ec cachexia. N Eng/. J Med, 1964; 271: 403-408. 2. Rossi MA. 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