ELEMENTOS PARA A ANÁLISE DO TRABALHO DO PROFISSIONAL DE ENSINO COM FORMAÇÃO DE BACHARELADO NO ÂMBITO DE CURSOS DE PEDAGOGIA1 Ludmila de Almeida Freire Jacques Therrien RESUMO Situando a formação para a docência universitária nos contextos da sociedade contemporânea e dos debates sobre os impasses gerados pelo isolamento entre a competência docente e a competência científica na universidade, o ensaio identifica diversos elementos heurísticos que integram a análise da docência sob o prisma do parâmetro da epistemologia da prática. O quadro de categorias propostas como referencial teórico-metodológico de análise passa pela abordagem desta na perspectiva da ergonômica do trabalho docente. Tendo por objetivo estabelecer parâmetros centrais para o estudo da prática docente do professor universitário com formação básica de bacharelado, e focando questões relativas à prática situada desse profissional principalmente no âmbito da pedagogia, o ensaio é desenvolvido sob o pressuposto da epistemologia da prática tendo a racionalidade pedagógica, a práxis, o saber da experiência, a transformação pedagógica da matéria, a gestão escolar, a dialogicidade, a competência, a ergonomia docente como fatores, entre outros, de apreensão da identidade do sujeito observado. Finaliza reforçando que os debates e estudos sobre a formação para a docência universitária hão de valorizar e ressignificar o saber prático do professor constantemente reconstruído em situações de trabalho intersubjectivo de dialogicidade, reconhecendo na sua práxis a dialeticidade da relação teoria e prática. INTRODUÇÃO A complexidade que caracteriza a sociedade globalizada estabelece nova óptica de atuação para o trabalho profissional. As mudanças sócio-econômicas, políticas, epistemológicas impostas pelo ritmo de mudança acelerada têm gerado recorrentes discussões em torno dos paradigmas de formação profissional nas diversas áreas da ciência no intuito de responder às novas demandas econômico-sociais que surgem. Indagações são dirigidas à universidade não somente em relação aos seus projetos político-pedagógicos, como em relação aos „modos operandi‟ de seus docentes. Não resta dúvida que entre as metas da universidade brasileira tem destaque o desenvolvimento de recursos humanos qualificados para a sociedade do conhecimento, economicamente competitiva. A partir das últimas décadas do século XX, e com maior intensificação a partir dos anos de 1990, são notórias no cenário dos debates em torno do trabalho docente novas tendências epistemológicas à base da formação do educador propondo mudanças em direção ao delineamento de um novo paradigma pedagógico de formação. Contudo, esse movimento não vem se dando de forma homogênea. Os múltiplos olhares sobre os contextos da modernidade vêm constituindo um mosaico multifacetado de concepções, disputas e tensões. O resultado legal dessa busca em traçar uma nova configuração de ensino manifesta-se nos documentos oficiais, como a LDBEN 9394/96, as DCNs para Formação de Professores da Educação Básica e, mais recentemente, as DCNs para o Curso de Pedagogia. Ressaltam-se ainda as contribuições e reivindicações trazidas pelas diversas entidades representativas do movimento dos educadores. 1 In: I Colóquio Internacional sobre Ensino Superior, 2008, Feira de Santana. I Colóquio Internacional sobre Ensino Superior. Feira de Santana : UEFS, 2008. v. 1. p. 1-10. 1 Neste cenário, indagações são dirigidas acerca da formação dos educadores com formação de „bachareis‟ que atuam na docência universitária. Não se questiona tanto o domínio de conhecimento de suas áreas disciplinares específicas como principalmente a pedagogia que fundamenta o seu trabalho como docentes. É reconhecido que cabe aos profissionais de pedagogia a produção de uma importante parcela de reflexão científica relativa aos processos de ensino-aprendizagem situados neste contexto de pós-modernidade. Contudo, esse empreendimento não pode prescindir de profissionais de outras áreas de domínio dos saberes que compõem o acervo de compreensão do mundo dos seres humanos. Durante décadas vem se discutindo a formação de professores no âmbito das licenciaturas, os saberes necessários à sua prática, o papel dos mesmos na sociedade, a configuração das licenciaturas, os pólos a serem privilegiados nos cursos (Libanêo, 2002; Pimenta, 1997; Saviani, 1996; Schon, 2000; Tardif, 2002), porém, a preocupação com a formação para a docência dos formadores universitários das diversas categorias de profissionais que atuam na sociedade não tem ocupado os debates com a mesma intensidade. Prioriza-se a formação para a pesquisa e predomina a dissociação entre teoria e prática e a fragmentação entre pesquisa e ensino. A prática do professor universitário é valorizada em relação ao domínio dos conteúdos específicos e à produção científica. A formação para a docência tornou-se objeto de consenso cada vez mais generalizado no contexto universitário constituído de profissionais que dominam seus diversos campos do saber, mas tradicionalmente sem uma formação para o trabalho pedagógico, esse considerado fundante de uma prática que se distingue das atividades de pesquisa e de extensão. Mesmo quando essa formação existe, ela tem se resumido, muitas vezes, a uma disciplina de Didática no Ensino Superior ou a estágios de curta duração na graduação. Grande parte dos professores, especialmente em início de carreira, não possuem clareza a respeito da racionalidade pedagógica que perpassa a docência, calcando muitas vezes sua prática profissional numa perspectiva conteudista, tecnicista. Podemos observar isso de uma maneira mais acentuada com profissionais não licenciados, ou seja bacharéis, oriundos das mais diversas áreas da ciência que optam pela docência. Esses profissionais, embora com ampla experiência em suas áreas específicas, encontram-se muitas vezes despreparados para exercer o magistério (Pimenta e Anastasiou, 2002). A transformação do conhecimento científico numa linguagem pedagógica de compreensão dos significados e sentidos da matéria não acontece com tranqüilidade para o aluno o que afeta a articulação entre àquele conhecimento e a prática profissional a qual se destina (Isaia, 2005). A isto se acrescenta uma concepção técnicoinstrumental da docência, além de que não revelam compreensão do que seja o currículo por competência proposto pelas diretrizes nacionais de formação. Os Centros e Faculdades de Educação, espaço de formação dos profissionais de pedagogia são também reconhecidos e solicitados a oferecer apoio e suporte pedagógico a outros cursos e instâncias da universidade. Neste particular, suas contribuições são dirigidas aos cursos de licenciatura ou não e aos docentes das diversas áreas da ciência. Estes últimos, apesar de trazerem consigo uma imensa bagagem de conhecimentos das suas áreas específicas, muitas vezes nunca se questionaram sobre o que significa ser professor (Pimenta e Anastasiou 2002). Tanto é que em relação a eles forjou-se a expressão de que esse profissional „dorme pesquisador e acorda professor‟! Um número cada vez maior de estudos vem focalizando a docência universitária, abordando suas mais diversas dimensões; todavia, identificamos uma carência de investigações e reflexões mais pontuais relativa à formação e ao trabalho do profissional de ensino com formação de bacharelado que atua no âmbito dos Cursos de Pedagogia, assegurando a formação interdisciplinar característica do profissional dessa área. 2 Importantes indagações circundam esse fenômeno por se tratar do curso de pedagogia, embora as mesmas perguntas podem ser dirigidas à prática desses docentens que atuam nos demais cursos universitários. Como o professor bacharel que atua no curso de Pedagogia constrói sua identidade docente? Que significados, intencionalidades e saberes perpassam o seu trabalho situado no chão-da-sala de aula? Que dimensões do saber são transformadas e reconstruidas nos contextos intersubjetivos dos processos de formação/aprendizagem comandados pela racionalidade comunicativa? Qual é o significado desse fenômeno na perspectiva do paradigma da epistemologia da prática? Que conhecimentos ele considera necessário ter para formar os futuros professores? Que dificuldades ele encontra em sua prática? Como ele supera essas dificuldades? Que abordagem teórica e metodológica possibilita elementos de compreensão da atividade desse docente em situação real de trabalho? Como conceber procedimentos de investigação adequados a essa abordagem? As reflexões a seguir, embora almejam consolidar um referencial de análise da racionalidade pedagógica que dá suporte ao trabalho dos docentes com formação de bacharelado no âmbito de Cursos de Pedagogia, se constituem igualmente em elementos de análise da pedagogia universitária numa concepção apoiada em determinados pressupostos do que é o trabalho pedagógico e dos princípios fundantes que o regem. O ensaio pretende desenvolver uma breve reflexão sobre alguns princípios fundantes da racionalidade subjacente a práxis situada do profissional de educação em contexto universitário, assim como identificar elementos teórico-metodológicos que permitem a análise dessa prática e seus processos de construção. Em síntese, o estudo prossegue numa abordagem de epistemologia da prática. ELEMENTOS FUNDANTES DA FORMAÇÃO E DA PRÁXIS DOCENTE A abordagem da epistemologia da prática enquanto referencial fundante da formação e da práxis docente se consolida através de diversos elementos ou categorias constituintes do ensino e da aprendizagem. O postulado que o conhecimento se torna fator de domínio e intervenção nas relações sociais significa, em outros termos, que “o domínio da teoria não pode ser desligado das práticas sociais” (SACRISTÁN, 1999, P.25). Da mesma forma, o pressuposto que a educação é essencialmente uma prática social que carrega conhecimento e intencionalidade em contexto de relações humanas intersubjetivas e comunicativas (HABERMAS, 1997; BOUFLEUER, 2001. MARTINAZZO, 2005), implica que ela procede num processo reflexivo que em último deve mover para a consciência do ser social e sua transformação em direção à sua auto-determinação e emancipação (ADORNO, 2003). O reconhecimento deste pressuposto permite reconhecer o parâmetro da epistemologia da prática como fator subjacente aos processos educacionais de aprendizagem à vida no mundo e do mundo, tornando-se referência e princípio fundante dos elementos essenciais à formação de educadores que reconhecem a educação como prática social. A compreensão, em investigações anteriores junto a docentes atuando em diversos níveis do sistema educacional, da função dos saberes da experiência social (DUBET, 1994) e profissional nos processos de formação permanente do educador, constituiu importante referencial para a percepção da complexidade, heterogeneidade e diversidades dos saberes docentes na perspectiva de Tardif (2002). Este os classifica em saberes disciplinares/teóricos, saberes curriculares/práticos e saberes pedagógico-práticos integrados com saberes da experiência profissional e social dos quais não se dissociam no chão da sala de aula. A articulação entre esses saberes nos momentos de intervenção educacional numa perspectiva de práxis supõe a reflexividade do processo de tomada de decisão de ação onde a intencionalidade do ato expressa objetivos educacionais. 3 Esta percepção permite reconhecer que a ação docente, humana e prática, é articulada por uma determinada racionalidade comandada pelo educador, a qual pode ser identificada através de tipos dominantes de ação que a perspectiva habermesiana caracteriza como instrumental, comunicativa ou estratégica (HABERMAS, 1997). Em se tratando dos processos de ensino/aprendizagem, objeto da ação docente, o paradigma da epistemologia da prática se expressa no fenômeno da cognição/ação situada (LAVE, 1988, 1991; GERVAIS & LOIOLA, 2000) resultante da interação transformadora que envolve seres humanos. É nesta perspectiva que compreendemos a ação docente como processo de trabalho intersubjetivo. Constitui-se, assim, a categoria „trabalho do educador‟ que referendemos como uma práxis transformadora de um sujeito (docente/educador) em interação situada com outro sujeito (aluno/aprendiz), onde a produção de saberes e de significados caracteriza e direciona o processo de comunicação, dialogicidade e entendimento na direção de uma emancipação fundada no ser social. Nesta concepção, o trabalho docente se constitui como processo de mediação e de interação educativa a partir de conteúdos de aprendizagem em perspectiva de construção de uma sociabilidade humana onde sujeitos constituem sua identidade própria no seio da uma coletividade. O trabalho do educador, por implicar dimensões epistemológicas, cognitivas, políticas, culturais e sociais, entre outras, e por constituir-se ao mesmo tempo em ato de instrução e de formação envolvendo sujeitos, afeta o projeto de vida do aprendiz e por isso remete à emancipação humana. Educar enquanto processo intencional sistemático implica tanto em instrução, ou seja, em propiciar o acesso ao domínio de conhecimentos teóricos e práticos que a humanidade já produziu, incluindo os simbólicos, bem como em formação que consiste em criar condições para a auto-determinação do sujeito cidadão, social, cultural, política e profissionalmente falando. Essa segunda dimensão mais complexa do ato de educar é indissociável da primeira, e infelizmente muitas vezes desprezada pelos educadores nas suas funções cotidianas. O ato de instruir e de formar postula objetivos intencionais do professor/educador. Envolve, assim, elementos diversos que modelam e dão direção à prática desses profissionais, às suas intervenções interativas com outro(s) sujeito(s) aprendiz(es). Esse núcleo constitui no nosso entender a dimensão pedagógica, sempre presente em toda prática educativa e que se situa e se manifesta na „postura‟ do educador em relação a sua intervenção. Em torno do núcleo central do trabalho docente gravitam diversos elementos definidores da formação necessária à função do educador como sujeito pedagógico. A formação desse sujeito pedagógico passa pelos princípios: do conhecimento/compreensão do seu universo social, do domínio de saberes múltiplos e heterogêneos, da dialética teoria/prática, do disciplinamento para a reflexão e a transformação pedagógica da matéria, da intersubjetividade, do trabalho cooperativo e colaborativo, da competência regulada pela autonomia profissional, da ética de uma profissão que tem sua identidade fundada em saberes próprios. Trata-se, portanto, de um profissional com identidade social e disciplinar definida. Nessa ótica a identidade profissional está relacionada necessariamente à função social e ao estatuto da profissão, bem como à cultura do grupo ao qual o sujeito pertence profissionalmente e ao contexto sócio-político no qual se constitui. (SANTOS, 2001, p.33) Na função docente o educador se situa nos contornos disciplinares dos currículos com que trabalha, numa práxis flexível delimitada pelos princípios e metas de um projeto pedagógico, integrando as dimensões interdisciplinares dos seus enfoques e guiado por intenções pedagógicas. O currículo assim concebido não deve ser entendido como prescrições estáticas, mas na dinâmica de uma práxis institucional que se movimenta, estabelecendo um diálogo entre os agentes sociais, os fatores técnicos e os sujeitos envolvidos, tanto professores como alunos que o concretizam e o moldam. 4 Concebendo o ensino como processo político complexo, seu „saber ensinar‟ deve ser a expressão de uma autonomia e auto-determinação situada nos limites da ética profissional, a qual estabelece os elementos normativos de sua competência, definida por Campani (2008) como “um conjunto de natureza cognitiva, afetiva, prática e técnica formada por saberes e esquemas de ação, posicionamentos assumidos, habilidades, hábitos e atitudes necessário ao exercício das funções docente inter-relacionando-se com o desenvolvimento da capacidade de gestão dos processos educativos.” Entre os elementos do trabalho docente se integra a gestão escolar, esta fundada nas intencionalidades do Projeto Pedagógica do Curso e da Instituição. Neste sentido reza o Parecer CNE/CP 5/2005 de 12/2005 que associa à gestão o que podemos considerar como a essência dos processos pedagógicos em todas as dimensões e espaços de intervenção, na escola ou em outros espaços não-escolares. Define o Parecer que o campo de atuação pedagógica abrange a “Gestão educacional que integre as diversas atuações e funções do trabalho pedagógico e de processos educativos escolares e não-escolares”. Em sentido mais restrito a gestão pedagógica da matéria se situa no processo de transformação pedagógica da mesma quando o docente em situações reais de interações subjetivas com os alunos articula adequada e criativamente seu reservatório de saberes para dar sentidos aos conteúdos de ensino. Essa práxis faz do educador um sujeito hermenêutico porque vivencia o desafio de produzir sentidos. Mediador de saberes, sua prática é reflexiva e transformadora. Da mesma forma, ao transformar conteúdos do ensino, visando adequá-los aos alunos a quem se destinam, ao contexto onde ocorre, às limitações espaço-temporais e às normas institucionais e curriculares, entre outros, o docente se apresenta como sujeito epistêmico. A docência como „gestão e transformação pedagógica/ética da matéria‟ procede através de uma racionalidade complexa, interativa, dialógica, do entendimento, que não exclui a racionalidade normativa, instrumental de determinados campos da ciência e da tecnologia, mas que a integra num processo voltado para a emancipação humana e profissional dos sujeitos em formação. Portanto, a racionalidade que dá consistência ao campo pedagógico requer a intersubjetividade de um movimento de coletividade onde a comunicação busca a construção do entendimento intersubjetivo, da dialogicidade, da argumentação, da busca de consenso, da convergência de sentidos e significados, enfim, da sociabilidade. Fundamenta-se, assim, uma compreensão ampliada dos processos de emancipação humana. Uma racionalidade que enquanto prática reflexiva dá sentido e direção à prática humana nas suas mais diversas expressões, tanto identificando o espaço objetivo ocupado pelo conhecimento ‟científico‟, como reconhecendo o sujeito na individualidade de sua consciência crítica. ELEMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DE PROCEDIMENTOS DE ABORDAGEM A perspectiva de estudo em pauta requer o desenvolvimento de referenciais teóricometodológicos e de procedimentos que dão conta da complexidade de análise do trabalho docente em situação. Os fenômenos educacionais dessa natureza investigados em pesquisas anteriores apontam para a necessidade de abordagens que permitem contemplar olhares interdisciplinares e multirreferenciais que admitem as dimensões multiculturais às quais deve ser atento o educador. O saber situado, referência de nossas análises, foi mais adequadamente identificado e compreendido através de análises de cunho etnográfico e etnometodológico que a abordagem da ergonomia do trabalho docente redesenha na busca de privilegiar os motivos e os significados da ação situada. O estudo dos 5 fenômenos educacionais na perspectiva de formação e de práxis do educador pressupõe conceber este como um sujeito epistêmico e hermenêutico, mediador de relações de saberes com os educandos. Ao mesmo tempo, a compreensão da estreita articulação entre o processo de formação do docente e os saberes da sua experiência profissional e social impele para a adoção de abordagem de investigação que incentiva a reflexividade dos diversos sujeitos envolvidos, fator que elementos da pesquisa colaborativa proporcionam. O referencial teórico-metodológico proposta permite o estudo do cotidiano e da cultura escolar de educadores e educandos vistos sob a ótica da práxis de sujeitos transformadores. Postulando que o conhecimento é inseparável do contexto e da ação social, manifestando-se nas falas e ações destes atores sociais, ou seja, na interação do diálogo fonte de expressão da intencionalidade e dos motivos da ação (THERRIEN & DAMASCENO, 2000). Na expressão de Coulon (1995, p.30) “a etnometodologia é a pesquisa empírica dos métodos que os indivíduos utilizam para dar sentido e ao mesmo tempo realizar as suas ações de todos os dias: comunicar-se, tomar decisões, raciocinar”, sendo assim uma „prática social reflexiva‟. Os trabalhos já realizados nesta concepção nos aproximaram da perspectiva da ergonomia do trabalho docente (LOIOLA & THERRIEN, 2001; DURAND, 2000) de modo a privilegiar a „atividade‟ como expressão de conhecimentos situados, espaço de cognição/aprendizagem que contextualiza a relação dialética teoria-prática. Assim compreendemos nossa proposta de articulação do paradigma da epistemologia da prática com o paradigma metodológico da ergonomia do trabalho docente. Aplicada aos estudos do campo da educação, a ergonomia propicia “a investigação da dinâmica que considera o sujeito, a atividade e o contexto como um todo. De modo mais específico, trata-se de um ponto de vista centrado no desenvolvimento dos conhecimentos em contexto” (LOIOLA & THERRIEN, 2001, p.150). Trata-se de uma análise que, segundo os mesmos autores, contempla “variáveis dinâmicas de natureza física, social, institucional e política”. Nosso enfoque da formação e do trabalho docente concebe o domínio do ‟saberensinar‟ como resultante de aprendizagem situada, contextualizada, e fundada na atividade interativa de um trabalho de humano com humano onde a autonomia da ação deve se equilibrar entre pólos de normatividade e de improvisação. A complexidade dos contextos intersubjetivos no chão da sala de aula envolve sujeitos individuais e coletivos regulados pela ética profissional de modo que a intervenção docente se torna geradora de saberes e conhecimentos que afetam tanto o pólo docente como o discente. Cabe aos processos de investigação identificar que mecanismos e que racionalidade regem esses processos. A ergonomia enquanto análise do trabalho educativo concebido nos moldes da epistemologia da prática é percebida como mecanismo teórico e metodológico com potencialidade de desvelar elementos substantivos para a compreensão e concepção da formação docente. CONSIDERAÇÕES FINAIS Tendo em vista estabelecer parâmetros centrais para o estudo do trabalho docente do professor universitário com formação básica de bacharel, e focando questões relativas à prática situada desse profissional no âmbito da pedagogia, o ensaio foi desenvolvido sob o pressuposto da epistemologia da prática tendo a racionalidade pedagógica, a práxis, o saber da experiência, a transformação pedagógica da matéria, a gestão escolar, a dialogicidade, a competência, a ergonomia docente como fatores, entre outros, de apreensão da identidade do sujeito observado. As categorias de análise identificadas e suas respectivas compreensões são partes de um núcleo de referências desenvolvido no decorrer de práticas de investigação do Grupo de Pesquisa Saber e Prática Social do Educador. Os debates e estudos sobre a formação para a docência universitária hão de valorizar e ressignificar o saber prático do professor constantemente reconstruído em situações de trabalho 6 intersubjectivo de dialogicidade, reconhecendo na sua práxis a dialeticidade da relação teoria e prática. A complexidade do saber ensinar, ou seja, da competência para o ensino universitário, requer a formação de um docente cuja identidade revela um sujeito epistêmico e hermenêutico, produtor de saberes e de sentidos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL/CNE Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia. Parecer CNE/CP Nº: 5/2005 ADORNO, T W. Educação e emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003. BOUFLEUER, J. Pedro. Pedagogia da ação comunicativa : uma leitura de Habermas. Ijuí : Ed. Unijuí, 1997. CAMPANI, Adriana. Mudanças e impactos na docência do ensino superior. Projeto de pesquisa. Sobral : UVA. 2008. COULON, Alain. Etnometodologia. Petrópolis: Vozes, 1995. DUBET, François. 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