Brycon cephalus Günther

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ARS VETERINARIA, 15(3):149-153, 1999.
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CARACTERÍSTICAS HEMATOLÓGICAS DE TELEÓSTEOS
BRASILEIROS. IV. PARÂMETROS
ERITROLEUCOMÉTRICOS, TROMBOMÉTRICOS E
GLICEMIA DO MATRINXÃ (Brycon cephalus Günther, 1869)
(OSTEICHTHYES: CHARACIDAE)
(HEMATOLOGICAL CHARACTERISTICS OF BRAZILIAN TELEOSTS.
IV. PARAMETERS OF MATRINXÃ (Brycon cephalus Günther, 1869)
(OSTEICHTHYES: CHARACIDAE))
M. TAVARES-DIAS1, C. M. D. FRASCÁ-SCORVO1,
E. CAMPOS-FILHO3, F. R. MORAES1,2
RESUMO
Neste trabalho foram estudados os parâmetros sangüíneos do matrinxã (Brycon cephalus), peixe de água doce,
criado em cativeiro, em boas condições de saúde. Foram determinados os valores médios do eritrograma, do leucograma,
de número de trombócitos, das taxas de hemoglobina e hematócrito, do volume corpuscular médio (VCM), da hemoglobina
corpuscular média (HCM), da concentração da hemoglobina corpuscular média (CHCM) e da glicemia. Quanto ao leucograma
a contagem média de leucócitos totais foi 2597,5 ± 1261,8/mL. Entre as células sangüíneas com função de defesa orgânica,
considerando leucócitos e trombócitos, os últimos representaram 70,1% e os leucócitos 29,9% do total (linfócitos 15,4 ±
8,3%, neutrófilos 7,2 ± 7,9 %, monócitos 4,1 ± 1,6% e célula granulocítica especial 3,2 ± 5,4%). Os resultados mostraram
que o valor médio do eritrograma foi de 2,915 ± 0,41 x 106/mL. A taxa média de hemoglobina foi de 10,9 ± 1,2 g/dL; o
valor médio do hematócrito foi de 39,0 ± 8,7%; o valor médio do VCM foi de 134,8 ± 24,3 fL; o valor médio do HCM foi
38,1 ± 4,4 pg; o valor médio do CHCM foi de 28,8 ± 4,5 g/dL e o índice glicêmico médio foi de 60,4 ± 20,2 mg/dL.
PALAVRAS-CHAVE: Brycon cephalus, células sangüíneas de defesa, hemograma, glicemia.
SUMMARY
The blood parameters of matrinxã (Brycon cephalus), a freshwater fish, reared in captivity in good health conditions,
were studied. The average values of red blood cells count, defense blood cells (leukocytes and thrombocytes), hematocrit
and hemoglobin rates, mean corpuscular volume (MCV), mean corpuscular hemoglobin (MCH), mean corpuscular
hemoglobin concentration (MCHC), and plasma glucose concentration were determined. The average total leukocytes was
2597.5 ± 1261.8/mL. Among the total defense cells, thrombocytes represent 70.1% and leukocytes 29.9% (lymphocytes
15.4 ± 8.3%, neutrophils 7.2 ± 7.9 %, monocytes 4.1 ± 1.6% and special granulocitic cells 3.2 ± 5.4% ). The average red
1. Laboratório de Patologia de Organismos Aquáticos - Centro de Aqüicultura - CAUNESP, Rod. Carlos Tonanni, Km 05,
14870-000, Jaboticabal, São Paulo.
2. Departamento de Patologia Veterinária, FCAV-UNESP - Via de Acesso Prof. Dr. Paulo Donato Castellane, km 05, 14870-000,
Jaboticabal, S.P.
3. Hospital Veterinário, FCAV-UNESP - Via de Acesso Prof. Dr. Paulo Donato Castellane, km 05, 14870-000, Jaboticabal, S.P.
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ARS VETERINARIA, 15(3):149-153, 1999.
blood cells count value was 2.915 ± 0.41 x 106/mL. The average hemoglobin rate was 10.9 ± 1.2 g/dL; the average
hematocrit value was 39.0 ± 8.7%; the average MCV was 134.8 ± 24.3 fL; the average MCH was 38.1 ± 4.4 pg; the average
MCHC was 28.8 ± 4.5 g/dL and the plasma glucose concentration was 60.4 ± 20.2 mg/dL.
KEY-WORDS: Brycon cephalus, red blood cells, defense blood cells, plasma glucose, blood.
INTRODUÇÃO
Vários peixes nativos brasileiros, ou não,
despertaram o interesse dos piscicultores devido às suas
características de crescimento rápido, boa conversão
alimentar, facilidade de reprodução induzida e até por
características apropriadas à pesca esportiva. Dentre eles,
destaca-se uma espécie da subfamília Bryconinae
proveniente da Bacia Amazônica, o Brycon cephalus.
Contudo, as informações na literatura sobre o gênero
Brycon está concentrada em temas relacionados à
reprodução
induzida
(FONTENELLE
&
NEPOMUCENO, 1982; WOYNAROVICH &
HOVARTH, 1983; ZANIBONI-FILHO, 1985; SOARES,
1989), ao manejo alimentar (BORGHETTI et al.,1991;
MENDONÇA et al.,1993; PEREIRA-FILHO et al.,1995)
e à larvicultura (LOPES et al., 1994). Estudos de
características fisiológicas como o de parâmetros
hematológicos do gênero Brycon foi realizado somente
em pirapitinga-do-sul, Brycon sp (RANZANIPAIVA.,1991a e 1996). Não havendo outro relato na
literatura brasileira, o presente trabalho descreve os
parâmetros hematológicos de matrinxã (Brycon cephalus)
hígidos, criados em cativeiro.
MATERIAL E MÉTODOS
Alevinos de Brycon cephalus pesando em média
13,2 g foram obtidos de piscicultura comercial do
município de Mococa (São Paulo), no final de abril de
1997. Esses foram mantidos no Centro de Aqüicultura da
UNESP (CAUNESP- Jaboticabal, São Paulo, Brasil), onde
foram tratados com ração balanceada contendo 35% de
proteína bruta até agosto de 1997. Após esse período
passaram a receber ração contendo 32% de proteína bruta.
Os peixes foram cultivados em tanque de 200 m2, com
profundidade mínima de 1,0 m e máxima de 1,5 m, paredes
revestidas em alvenaria e fundo de terra.
Para o estudo dos parâmetros hematológicos
(série vermelha, células sangüíneas de defesa e glicose
plasmática), 10 exemplares sexualmente imaturos
estocados à densidade de 1,3 peixes/m2 foram amostrados
em novembro de 1997. Após estocagem de 1 peixe/m2
mais 10 foram amostrados em fevereiro de 1998.
Por punção da veia caudal, com o uso de seringas
contendo EDTA (10%), obteve-se aproximadamente 1,0
ml de sangue de cada animal para contagem total de
eritrócitos e de leucócitos em câmara de Neubauer. A
determinação da hemoglobina foi realizada pelo método
de COLLIER (1944) e o hematócrito pelo método de
GOLDENFARB et al. (1971). A contagem diferencial de
células sangüíneas de defesa (leucócitos e trombócitos)
foi realizada em esfregaços corados pancromaticamente
pelo método de ROSENFELD (1947).
O volume corpuscular médio (VCM), a
hemoglobina corpuscular média (HCM) e a concentração
de hemoglobina corpuscular média (CHCM) foram
determinados segundo o método de WINTROBE (1934).
A dosagem da glicose plasmática foi realizada por método
enzimático (Labtest, Glicose God-Ana).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Durante o período de cultivo dos peixes,
utilizados para as análises, a temperatura variou de 18,0 a
33,5oC. A água apresentou as seguintes características: pH
entre 6,9 e 9,3; alcalinidade entre 10,6 a 32,6,
condutividade entre 51,0 a 70,0 mS e o oxigênio dissolvido
de 0,8 a 9,9 mg/L.
Os valores médios dos parâmetros hematológicos
da série vermelha e o índice glicêmico de matrinxã (B.
cephalus) estão expressos na Tabela 1. O número médio
de eritrócitos foi maior que o observado por RANZANIPAIVA, (1991a) em pirapitinga-do-sul (Brycon sp), sendo
as taxas médias de hematócrito, de hemoglobina e CHCM
semelhantes. Os valores médios de HCM e VCM do
matrinxã (B. cephalus) foram menores que os descritos
em pirapitinga-do-sul, Brycon sp (RANZANIPAIVA,1991a) e em Colossoma macropomum (TAVARESDIAS et al.,1998a). Os valores médios da glicemia foram
similares aos descritos em Piaractus mesopotamicus de
ambiente natural, porém inferiores aos valores dessa
mesma espécie quando mantida em cativeiro (ZUIM et
al.,1988).
Foram identificados e caracterizados na contagem
diferencial de células sangüíneas com funções de defesa
em matrinxã (B. cephalus) linfócitos, neutrófilos,
monócitos, células granulocíticas especiais (CGE),além
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Tabela 1- Parâmetros hematológicos em B. cephalus. Os
dados correspondem aos valores médios ±
desvio padrão e amplitude de variação (Ax).
PARÂMETROS
VALORES
Ax
433,5 ± 132,9
240,0 - 736,0
25,8 ± 2,6
21,0 - 32,0
2,915 ± 0,41
1,950 - 3,530
Hemoglobina (g/dL)
10,9 ± 1,2
8,9 - 13,4
Hematócrito (%)
39,0 ± 8,7
21,0 - 51,0
VCM (fL)
134,8 ± 24,3
96,1 - 194,7
HCM (pg)
38,1 ± 4,4
32,3 - 51,6
CHCM (g/dL)
28,8 ± 4,5
22,5 - 42,4
Glicose (mg/dL)
60,4 ± 20,2
41,0 - 131,0
Peso (g)
Comprimento padrão (cm)
Eritrócitos totais (106/μL)
Tabela 2 - Distribuição percentual de células sangüíneas
de defesa em B. cephalus. Os dados
correspondem aos valores médios ± desvio
padrão e amplitude de variação (Ax).
PARÂMETROS
VALORES
Ax
2597,5 ± 1261,8
1700,0 - 7600,0
Trombócitos (%)
70,1 ± 8,9
56,0 - 76,0
Linfócitos (%)
15,4 ± 8,3
5,0 - 32,0
Neutrófilos (%)
7,2 ± 7,9
4,0 - 28,0
Monócitos (%)
4,1 ± 1,6
0,0 - 6,0
CGE (%)
3,2 ± 5,4
0,0 -18,0
Leucócitos totais (μL)
dos trombócitos que embora não sejam leucócitos tem
função de defesa em aves e peixes (GRECCHI et al.,1980;
NAKAGHI et al., 1995; MATUSHIMA & MARIANO,
1996). Os trombócitos do B. cephalus são células
predominantemente fusiformes, ocasionalmente
arredondadas, de citoplasma acidófilo sem granulações e
núcleo fusiforme. Essas células aparecem, em geral
isoladas, mas ocasionalmente podem ser observadas
agrupadas (Figura 1A).
Os neutrófilos são predominantemente
arredondados, de citoplasma abundante e possuem
granulações acidófilas, ocupando boa parte do citoplasma.
O núcleo tem forma de bastonete, em geral excêntrico,
sendo a cromatina nuclear compacta e sem nucléolo visível
(Figura 1B). As células granulocíticas especiais (CGE) são
grandes, muito semelhantes aos neutrófilos, com
citoplasma que se cora fracamente por corante ácido ou
básico. O núcleo é pequeno, excêntrico, contém cromatina
densa e não se observa a presença de nucléolo (Figura
1B). Os linfócitos são células predominantemente
arredondadas e de tamanho variado, tem citoplasma
fortemente basofílico e sem granulações visíveis. O núcleo
possui forma arredondada, cromatina densa, sendo elevada
a sua relação com o citoplasma (Figura 1C). Os monócitos
são células predominantemente grandes, de forma
arredondada e citoplasma basofílico. O núcleo é
freqüentemente excêntrico, geralmente alongado,
ocasionalmente esférico (Figura 1D). RANZANI-PAIVA
(1996) também descreve características similares para as
células sangüíneas de defesa orgânica de pirapitinga-dosul (Brycon sp). Entretanto, esse autor descreve as
características dos trombócitos, sem incluí-los na
contagem diferencial.
Quanto ao percentual de distribuição das células
sangüíneas de defesa orgânica de matrinxã (B. cephalus)
(Tabela 2), observou-se que os trombócitos correspondem
a cerca de 70,1% das células do esfregaço, enquanto
neutrófilos, linfócitos, monócitos e células granulocíticas
especiais somam 29,9%. Trombócitos foram as células
sangüíneas de defesa mais freqüentes no esfregaço de B.
cephalus, seguido por linfócitos, neutrófilos, monócitos e
células granulocíticas especiais. Similarmente, outros
estudos tem documentado a predominância de trombócitos
no híbrido tambacu (TAVARES-DIAS et al.,1998b) e em
Oreochromis niloticus (TAVARES-DIAS & FAUSTINO,
1998). Já em outros estudos onde os trombócitos não foram
incluídos na contagem diferencial, os linfócitos foram as
células mais freqüentes em relação aos demais leucócitos
no sangue periférico de Piaractus mesopotamicus
(MARTINS et al.,1995), espécie também pertencente à
família Characidae. Tal predominância de linfócitos
também têm sido descrita em espécies da família
Pimelodidae (KAVAMOTO et al., 1983); Loricariidae
(KAVAMOTO et al.,1985; SATAKE et al.,1989);
Prochilodontidae (RANZANI-PAIVA & GODINHO,
1986) e Mugilidae (RANZANI-PAIVA, 1995). Em
contrapartida, RANZANI-PAIVA (1996) descreveu
predominância de neutrófilos no esfregaço do também
characídeo pirapitinga-do-sul (Brycon sp).
Em teleósteos, linfocitose (GILL & PANT, 1985;
SANTOS & HALL, 1990), trombocitopenia e neutropenia
(GILL & PANT, 1985) ocorrem após exposição a metais
pesados. Os neutrófilos demonstram grande sensibilidade
às modificações do meio ambiente (MAHAJAN &
DHEER, 1979). DIXON & DICK (1985) relataram que
em Salmo gairdneri ocorreu acentuada linfopenia após
exposição crônica ao cobre. Porém quando todas as células
retornaram aos valores controles significativa neutrofilia
foi observada.
Na contagem diferencial de células sangüíneas
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Figura 1 - Células sangüíneas com função de defesa
orgânica em B. cephalus. (A) Trombócito; (B)
Neutrófilo e Célula granulocítica especial
(CGE); (C) Linfócito; (D) Monócito. Aumento
2230 x. Coloração: ROSENFELD.
de defesa, deste trabalho, as amplitudes de variação de
linfócitos, neutrófilos, monócitos e células granulocíticas
especiais foram menores que aquelas descritas por
RANZANI-PAIVA (1996) em Brycon sp. Isso demonstra
a existência de pequenas variações na composição
sangüínea entre peixes de diferentes espécies. Todavia,
diversos fatores podem contribuir para a variação
quantitativa dos elementos sangüíneos em peixes. Entre
eles incluem-se o sexo, o comprimento, o peso, o estado
nutricional, a ocorrência de doenças, o ciclo sazonal e a
idade (LARSSON et al., 1976; RANZANI-PAIVA,
1991b), assim como o ambiente no qual o animal é mantido
(HICKEY, 1982; TAVARES- DIAS et al., 1998a).
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