21 Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. ISSN 1982 6613 HUME E O CETICISMO 1 HUME AND THE SKEPTICISM VALADARES, Alexandre Arbex2 RESUMO O presente artigo propõe uma leitura da filosofa de Hume, especialmente de sua teoria do conhecimento (ou da sua impossibilidade), à luz de sua relação com o ceticismo. Assinalando o caráter controverso dessa filiação, o texto expõe inicialmente os pontos principais da crítica de Hume ao ceticismo antigo, e os seus argumentos em favor da um ceticismo dito moderno, que, sem converter-se em método, como em Descartes, demarcaria, revelando os limites da natureza humana, o campo mesmo da experiência e da investigação científica. Em seguida, tem lugar, uma apresentação dos conceitos de impressões e ideias, com base nos quais Hume propõe como crítica à noção de causalidade ou ao princípio de razão, a sua teoria da associação de ideias. Por fim, é analisado o papel do hábito e da crença na produção do conhecimento. Palavras-chave: Hume; Ceticismo; Causalidade. ABSTRACT This article proposes an interpretation of Hume's philosophy, especially his theory of knowledge (or its absence) in the light of its relationship with skepticism. Noting the contentious nature of this affiliation, the text presents initially the main points of criticism of Hume's skepticism old, and his arguments in favor of a modern skepticism said that, without becoming a Method, as in Descartes, demarcate, revealing the limits of human nature, the same field of experience and scientific research. Then, you must place a presentation of the concepts of views and ideas on which Hume suggests, as criticism of the notion of causality or the principle of reason, his theory of association of ideas. Finally, we analyze the role of habit and belief in knowledge production. Keywords: Hume; Skepticism; Causality. 1 As obras de H ume citadas no texto serão referidas nas notas de rodapé por suas respectivas abreviações: TNH (Tratado da Natureza Humana) e IEH (Investigação acerca do entendimento humano). 2 Mestre em Ciência Política (IUPERJ), doutorando em Filosofia (IFCS-UFRJ). Membro do grupo de pesquisa Spinoza & Nietzsche SpiN.E-mail: [email protected]. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 22 Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. ISSN 1982 6613 1. Embora seja recorrente nos estudos de história da filosofia associar Hume à linhagem do ceticismo, e se possam recolher na sua obra numerosas citações que corroborem essa filiação, há decerto algo de paradoxal em vincular a uma doutrina que sustenta a impossibilidade do conhecimento e prega a prática renitente da dúvida uma obra como o Tratado da natureza humana (TNH), definida, em seu subtítulo, como “tentativa de introduzir o método experimental de raciocínio nos assuntos morais”. Essa advertência sucinta que inaugura a obra fundamental da filosofia de Hume parece, antes, anunciar a intenção de estender o senhorio da razão científica aos domínios da sentimentalidade. Além disso, a expressão “método experimental” denota a grande influência exercida sobre Hume pela física newtoniana, que, segundo suas palavras, haveria de “passar vitoriosa à posteridade”.3 A física de Newton apartava-se da tradição racionalista, e propunha, em lugar das relações de causalidade fundadas no princípio de razão, conforme o qual todas as coisas decorrem de uma causa suficiente pela qual devem ser explicadas, um método pautado pela observação de fatos, por uma comparação sistemática dos seus efeitos, a partir da qual se pudessem deduzir as leis de operação dos fenômenos e os padrões constantes da experiência. A rigor, Newton não oferece uma explicação das causas da gravidade: ele descreve, por meio de princípios matemáticos, as suas leis de funcionamento; reside nessa diferença o sentido da célebre frase de Newton, hypotheses non fingo (“não finjo hipóteses”), com a qual ele buscara assinalar que a filosofia experimental se circunscrevia apenas ao que era dado deduzir dos fenômenos, e tudo mais que excedesse essa condição poderia ser considerado hipotético. O projeto de Hume é construir uma psicologia científica ou uma física do espírito, à maneira da física newtoniana e inspirada em seu método (LAPORTE, 1933). Ora, a adoção do método experimental implica a rejeição da metafísica, na medida em que esta supõe a possibilidade de estabelecer princípios primeiros ou verdades a priori capazes de dar conta de todas as questões. O empirismo procede por casos, por exemplos, e se, confrontado com a infinita heterogeneidade do real e com a oscilação dos juízos humanos, tende por um lado a desdobrar-se em ceticismo, por outro lado, porém, não implica de modo algum o negativismo cético segundo o qual todo conhecimento humano é vão porque todas as certezas são derrogáveis por qualquer simples exceção captada na experiência: para Hume, trata-se antes de afirmar que os limites do conhecimento humano são traçados pela própria constituição da natureza dos homens e coincidem com o campo da experiência ou das percepções sensíveis, para além do qual existem apenas hipóteses. O empirismo constitui, pois, uma crítica ao a priori (DELEUZE, 1974), e, desse ponto de vista, recomenda, inicialmente, uma postura cética à razão: é erro comum entre os filósofos, afirma Hume,4 supor que um princípio fundamental fixado graças à aplicação do intelecto, conquanto seja de fato capaz de explicar um grande número de coisas, possa dar conta da imensa variedade da natureza. Para submeter todos os fenômenos às leis de seu raciocínio, os filósofos se vêem por vezes obrigados a sustentar as mais absurdas opiniões, e, ao fazê-lo, não 3 HUME. “A origem e o progresso das artes e das ciências”. Ensaios morais, políticos e literários. São Paulo: Nova Cultural, 1989. 4 HUME. “O cético”. Ensaios morais, políticos e literários. São Paulo: Nova Cultural, 1989. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 23 Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. ISSN 1982 6613 encontram outra justificativa que a disposição particular de seu espírito ou suas propensões naturais de gosto. E, por certo, o mais confiável entre os princípios da filosofia é precisamente o lema cético segundo o qual nada é em si mesmo bom ou ruim belo ou disforme, visto que todos os juízos derivam apenas da constituição peculiar dos sentimentos humanos. Essa denúncia das variações de nossos julgamentos e da contradição das opiniões consiste, para Hume, em uma forma “popular” (IEH, XII) de ceticismo, que, além de preconizar uma atitude insustentável ante as questões de fato com que nos deparamos na vida diária, não tem qualquer conteúdo filosófico. Trata-se de um ceticismo espontâneo ou de primeiro nível, que se diferencia dos ditos ceticismos pré-filosóficos, como o pirrônico e o cartesiano, este a aconselhar a dúvida universal como forma de proteção contra o erro e como etapa inicial necessária da inquirição metódica pela verdade, aquele a usar a razão contra a própria razão, explorando suas contradições a fim de tornar patente a falibilidade de todos os juízos. A argumentação que fundeia essas modalidades de ceticismo é descrita por Hume5 como um processo de acumulação de incertezas que se vão formando a partir de sucessivas revisões críticas dos juízos racionais. Cada juízo relativo à natureza de um objeto deve ser corrigido por outro juízo, relativo à natureza do entendimento; desse modo, à incerteza original, acerca do objeto, se soma uma nova incerteza, acerca da capacidade de julgar; após essas incertezas se terem ajustado uma à outra mediante a retificação do juízo inicial, uma nova incerteza é introduzida no raciocínio com relação a essa estimativa, envolvendo, pois, uma nova crítica à fidelidade da razão. Cada nova reflexão sobre a falibilidade do juízo subtrai uma parcela de certeza das opiniões inicialmente consideradas acerca de um objeto. Esse movimento desdobra-se em uma regressão indefinida, que em algum momento fará perecer por completo a crença no juízo inicial. Os homens tendem a esposar esse tipo de ceticismo quando se confrontam com sua incapacidade de formular uma simples definição suficientemente clara e insuscetível à contestação racional. Quanto à dúvida metódica de Descartes, cujo objetivo é atingir uma verdade sobre a qual se possa construir uma ciência verdadeira, Hume pondera que é impossível conferir a qualquer princípio fundamental, tido por evidente em si mesmo, uma prerrogativa ou precedência sobre outros princípios indubitáveis, e, ademais, ainda que se chegasse a estabelecer tal certeza original, seria absurdo supor que, contando apenas com uma razão cuja imperfeição foi atestada pelo próprio método, se poderia avançar um passo além. A dúvida universal envolve não apenas os objetos ou opiniões, mas a capacidade mesma da razão de emitir juízos perfeitamente confiáveis. De todo modo, esse tipo de ceticismo total, segundo o qual nossos raciocínios são destituídos de qualquer medida de verdade ou de falsidade, é uma extravagância inofensiva, sem nenhuma implicação ou efeito prático. Hume designa essa doutrina cética como uma “seita imaginária”, fundada sobre “raciocínios absurdos”, assim chamados não porque estão em contradição com a lógica ou com a razão, mas porque não são naturais. Os argumentos do ceticismo pirrônico não podem ser sincera e resolutamente assumidos por quem quer que seja, e o método cartesiano preceitua uma estratégia de todo em todo irrealizável. 6 Ora, o estado de incerteza ou irresolução que caracteriza a dúvida não pode nascer de uma decisão consciente de rejeitar como falsa toda opinião que se apresente ao entendimento e 5 6 HUME, TNH, I, parte IV, seções I e II. HUME, IEH, seção XII, parte 1. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 24 Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. ISSN 1982 6613 toda percepção que afete os sentidos, nem tampouco pode resultar, como efeito natural, de uma suspensão voluntária do juízo, como defendem os pirrônicos. Um homem não duvida porque decide duvidar: a dúvida é uma perturbação indesejável com que um homem se depara imprevisivelmente e cuja intercorrência não depende de sua vontade. Além disso, para Hume, ao contrário do que a regra cartesiana orienta, a dúvida não é provisória; ela é um elemento presente a toda dedução ou descoberta filosófica. Por outro lado, se os princípios céticos parecem persuasivos e desconcertantes nos debates acadêmicos, eles se dissipam “como fumaça”7 quando confrontados com os princípios da natureza humana, que governam as ações e os sentimentos dos homens. É certo que as objeções dos céticos tencionam apenas denunciar a condição paradoxal dos homens, que agem segundo ideias ou crenças de cujos fundamentos eles próprios se mostram inseguros quando instados a refletir mais profundamente sobre eles. Hume observa que os argumentos céticos, ainda que sejam irrefutáveis do ponto de vista da razão, não produzem nenhuma convicção prática nem são dignos de crença: é a natureza mesma que os destrói a tempo, e os impede de exercer influência considerável sobre a mente dos homens.8 Os homens são, por natureza, tão determinados a julgar como a respirar ou sentir. A crítica metódica dos céticos confunde a ação da mente, impondo-lhe um esforço excessivo que a desvia de suas operações naturais, e constrange o fluxo espontâneo das percepções – impressões e ideias. É a partir da associação destas, na mente, que se formam as crenças, a base, segundo Hume, de todo conhecimento humano. O ceticismo obriga a uma disciplina que substitui as condições naturais em que se dá a 7 8 HUME, IEH, seção XII, parte 2. HUME, TNH, I, parte II, seção IV. associação das percepções na imaginação por um regime artificial de raciocínio, que, forçando a negação das relações sob as quais as impressões e ideias se compõem umas com as outras na mente, procura extinguir a crença e a evidência. O ceticismo é como o racionalismo, uma doutrina dogmática. Mas, além das objeções céticas contra a razão, Hume examina também as posições do ceticismo quanto aos sentidos. Os argumentos mais comuns acerca das imperfeições dos sentidos, ilustrados por um sem-número de exemplos, como a imagem do remo que parece quebrado dentro d’água ou a simples diversidade de aspectos que toma um mesmo objeto segundo a perspectiva de que é visto, são referidos apenas superficialmente por Hume, que, a esse respeito, se limita a assentir que as percepções sensíveis não são inteiramente fiéis às coisas que representam.9 Tal constatação, porém, não implica que devamos descartá-las sem maiores ponderações: uma vez retificadas pela razão e pela experiência, as percepções sensíveis podem, dentro de certos limites, constituírem critérios adequados para os nossos juízos, ou, mais exatamente, demarcar o campo mesmo em que é dado aos nossos juízos aspirar a algum grau de verdade. Essa argumentação envolve um tema cético clássico: a questão da realidade do mundo exterior. Os homens, afirma Hume, tendem a admitir como pressuposto autoevidente, a existência de um universo exterior independente das suas percepções. Eles imaginam que os objetos são exteriores à mente que os percebe, e que eles seguem existindo, tal como são percebidos, mesmo quando não estão mais presentes aos sentidos. Para identificar as causas que induzem os homens a conferir aos corpos externos uma existência contínua e independente da mente e da 9 HUME, IEH, seção XII, parte 1. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 25 Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. ISSN 1982 6613 percepção, Hume formula a pergunta fundamental do método de investigação que propõe: a partir de que impressão essa ideia é derivada? A relação entre impressões e ideias ocupa a primeira parte do TNH. Hume não estabelece entre elas uma distinção real ou de natureza: ambas são modos de percepção, e se diferenciam apenas quanto à intensidade, e não em qualidade. As impressões são percepções dotadas de maior grau de vividez e força, isto é, são atuais (LAPORTE, ANO), e sempre precedem as ideias na ordem de aparição à mente. As ideias são as percepções menos vívidas ou não-atuais, isto é, virtuais; dito de outro modo, as ideias são as imagens das impressões distanciadas no espaço e no tempo. Impressões e ideias designam, pois, uma mesma percepção, considerada em dois momentos: as impressões constituem dados atuais presentes à mente e aos sentidos, e as ideias são as representações mentais das impressões, as marcas deixadas por estas últimas no fluxo de percepções que constitui a mente humana. As ideias são, para Hume, imagens fracas das impressões, elementos secundários na ordem das percepções, e somente são reinvestidas de algum grau de força e vividez – isto é, são atualizadas – na medida em que se relacionam a uma impressão presente. É por essa razão que Hume recusa a existência de ideias inatas: são as impressões que aportam conteúdo original à mente. A continuidade entre impressões e ideias explica a unidade entre o mundo do ser, das existências, e o mundo das aparências, isto é, o mundo tal como o percebemos. Essa unidade, no entanto, não supõe uma igualdade de natureza entre as percepções e as existências das coisas que são objeto dessas percepções. Hume aponta que não há impressão nem ideia que não seja concebida ou imaginada como existente. A ideia de existência é rigorosamente idêntica à ideia da própria percepção, isto é, à ideia daquilo que se supõe existir; noutros termos, a ideia de percepção é a única medida da ideia de existência. Aparência e existência são uma só e mesma coisa porque uma coisa é dita existente tal como é percebida, e é percebida tal como se apresenta à mente e aos sentidos. Isto significa que as percepções constituem o limite de toda experiência de mundo, e o conhecimento que os homens creem ter a respeito das coisas existentes, às quais não têm acesso senão por via das percepções, é duplamente alucinatório, porque envolve tanto a crença em uma realidade objetiva, a crença no real, quanto a crença em uma identidade pessoal, que se apresenta como instância ordenadora desse exterior povoado. Essas duas crenças – a crença no mundo e a crença no “eu” – são, para Hume, as ficções fundamentais que tornam possíveis todas as demais crenças e definem, com elas, o universo do conhecimento humano (DELEUZE, op. cit., p. 65), isto é, o próprio ceticismo, não como método, mas como o horizonte, por assim dizer, onde todo conhecimento possível é o conhecimento fundado na crença. 2. A ideia da identidade pessoal é, segundo Hume, tida correntemente por tão clara e evidente que os filósofos se eximem de demonstrá-la, alegando mesmo que não poderíamos ter certeza de nada mais, caso duvidássemos dela.10 Mas de que impressão deriva essa ideia? Hume afirma que o “eu” ou a pessoalidade não é uma impressão,mas apenas aquilo a que nossas impressões e ideias supostamente se referem; se existe algo como uma impressão do “eu”, esta deveria permanecer invariável ao longo da nossa vida, de modo que dessa impressão se pudesse derivar a ideia de um “eu” que é sempre idêntico a si mesmo. No entanto, responde Hume, não existe qualquer impressão constante e invariável que seja 10 HUME, TNH, I, parte IV, seção IV. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 26 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 capaz de sustentar essa ideia de identidade; além disso, quando procuramos examinar o que se passa em nós mesmos, encontramos sempre uma percepção particular, atual, de dor ou prazer, de calor ou frio, de amor ou ódio, mas jamais algo como o “eu” íntimo, essencial, esvaziado de toda percepção. Para Hume, os homens não são senão um feixe de percepções sucessivas, em perpétuo fluxo e movimento, que adquire uma composição diversa em cada atualidade. As operações mentais que nos determinam a atribuir uma identidade a essas percepções sucessivas são no que diz respeito ao “eu”, as mesmas que nos fazem imaginar um mundo exterior independente e contínuo. A noção de existência contínua dos objetos, quando estes deixam de estar presentes à mente e aos sentidos, não pode, evidentemente, ser derivada dos sentidos.11 As impressões sensíveis, conforme assinala Hume, não oferecem a imagem de alguma coisa distinta – independente e externa – em relação à percepção mesma, isto é, a percepção não envolve a ideia de uma dupla existência, ou de uma existência para além da aparência. Mas as imagens gravadas em nós pelos sentidos fazem-nos supor que a impressão de um objeto é a própria existência desse objeto, e, desse modo, induzem-nos a crer que tal objeto existe fora de nós e independentemente de nós. Essa crença é reforçada pelo vínculo de pertencimento que presumimos existir entre nossa identidade pessoal e nosso corpo, identificando este último como o continente de nossa pessoalidade e como superfície de contato entre ela e o exterior. Assim, imaginamos como exteriores a nós as impressões que parecem ser exteriores ao corpo. Hume desfecha três argumentos contra essa crença: em primeiro lugar, os homens somente percebem seu corpo por meio das impressões que afetam os 11 Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. sentidos, e estas, na medida em que são percepções singulares e intermitentes, dãolhes sempre uma impressão parcial de seu corpo e não podem ser referidas a uma unidade corporal senão por imaginação; em segundo lugar, a certas impressões, como sons, sabores e aromas, não é possível atribuir uma existência exterior ao corpo, ainda que a imaginação as associe a objetos externos; por fim, sem o concurso do raciocínio e da experiência, a própria visão não poderia oferecer-nos sequer as noções de espaço ou distância, uma vez que elas envolvem algo além da percepção singular do objeto, e, nesta última, nada há que nos autorize a deduzi-las. Os sentidos não representam senão uma percepção dos objetos, e tal percepção, visto que não é jamais independente de nós mesmos, não pode prefigurar-nos a existência de coisas exteriores e distintas. Em síntese, afirma Hume, a independência de nossas percepções em relação a nós não é jamais objeto dos sentidos. Ao confundir um objeto com sua percepção descontínua e dependente da mente, o homem tende a atribuir àquele uma existência contínua e independente. Mas de que deriva a ideia da existência contínua dos objetos, ou, em termos gerais, a crença em uma realidade exterior independente de nossas percepções e de nossa existência? Hume constata que os objetos a que é atribuída pela imaginação tal existência são aqueles que parecem possuir uma constância particular, e que, mesmo que sofram certas modificações, guardam certa coerência com o contexto de relações em que ocorrem e cuja regularidade contrasta com as transformações de que temos consciência em nós mesmos. Somos, então, determinados a associar aos objetos uma constância maior que a observada em nossas percepções: se uma coisa se nos apresenta aos sentidos em dado momento e, depois de um lapso de ausência, preenchido por outra sucessão de percepções, ela torna HUME, TNH, I, parte IV, seção II. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 27 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 a ser-nos presente, mantendo nessa segunda aparição tal semelhança com a primeira que sua impressão atual parece reiterar o conteúdo da ideia derivada da impressão anterior, a mente então transita de uma à outra sem dar-se conta dessa passagem, como se contemplasse sempre um mesmo objeto contínuo. Ela conecta as aparições passadas e presentes do objeto, ligando, por uma relação de semelhança, essas duas percepções perecíveis e singulares, e objetivando essa semelhança em uma existência contínua. A descontinuidade entre as percepções é eliminada, na imaginação, pela suposição de uma existência real que as unifica em uma identidade por semelhança. A memória das impressões descontínuas, evocada por uma impressão presente, confere força e vividez a essa suposição, e ela se converte em crença que, de acordo com Hume, induznos a ver o mundo como algo real e duradouro, cuja existência se preserva tal como a percebemos e independentemente dessa percepção. O princípio de identidade, que sustenta a ideia de existência contínua, envolve, pois, a ideia de tempo ou duração. Mas o tempo implica a ideia de sucessão de impressões e, portanto, a ideia de variação. Hume oferece o exemplo da frase musical tocada em uma flauta: uma sequência de cinco notas desperta a impressão e a ideia do tempo, embora não convenha dizer que o tempo seja uma sexta impressão além das notas tocadas ou que sua ideia nasça de uma reflexão sobre essa sucessão de impressões sonoras. A mente limita-se a considerar a maneira ou modo pelo qual esses sons se lhe apresentam, sem considerar, nesse caso, as suas particularidades. Dá-se o mesmo com a ideia de espaço: ela deriva da percepção da disposição dos objetos sensíveis, isto é, dos pontos que afetam os sentidos, e omite as particularidades desses objetos. As ideias de duração e de espaço apenas assinalam a maneira ou o modo pelo qual as coisas se Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. fazem presentes à mente. Isto significa que a percepção de impressões envolve sempre a percepção das relações de espaço e tempo; é este o sentido da noção humiana de “impressão composta”. A ideia de tempo – derivada da percepção de uma dada sucessão de impressões – e a ideia de espaço – derivada da percepção de uma dada disposição dos objetos segundo as impressões sob as quais se apresentam – não são representáveis em estado puro. Ora, a ideia de tempo supõe uma sucessão de impressões, e, no entanto, quando atribuímos a um objeto uma existência contínua, presumindo que ele é constante no tempo, empregamos a ideia de tempo como um critério de invariação e de permanência. O objeto dito “idêntico a si mesmo” – como, por exemplo, esta folha de papel, que afirmamos ser sempre a mesma folha a cada vez que tornamos a percebê-la –, é, graças a uma ficção da imaginação, concebido como imutável em meio às modificações percebidas em outros objetos coexistentes – como, por exemplo, a sombra que incide sobre a leitura. A constância de dadas percepções, associadas na mente à variação de outras, faz-nos conferir uma identidade as primeiras, mesmo que longos intervalos medeiem entre suas aparições: se abandonamos nosso quarto por alguns dias, e, após uma viagem, expostos a uma sucessão de percepções que nos fazem presente à mente a ideia da variedade ou mudança, retornamos a ele sem perceber qualquer modificação no contexto de suas relações com outros objetos (coerência) ou na sua forma (constância), tendemos a imaginar que esse mesmo quarto seguiu existindo, tal como o deixamos, por todo esse tempo; essas percepções – a ideia derivada da impressão no momento da partida e a impressão atual do retorno – são tomadas como a existência mesma do objeto, e, unidas em uma mesma identidade – pela qual reconhecemos o objeto de uma percepção singular como “nosso quarto” –, determinam-nos a julgar Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 28 Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. ISSN 1982 6613 que essa existência é contínua e independente de nós. A partir de uma relação de semelhança, a imaginação supõe existir uma identidade contínua em lugar da simples sucessão de impressões intermitentes e singulares. A identidade pessoal 12 atribuída à mente humana é uma ficção semelhante à que explica o hábito pelo qual os homens conferem uma identidade a outros objetos. Hume argumenta que, por mais complexa que se suponha ser a mente humana, ela não é capaz de fundir a pluralidade das percepções que a compõem em uma identidade pessoal. As percepções – impressões e ideias – são distinguíveis e separáveis entre si. Elas se subdividem em duas classes: são ditas simples, se não podem ser fracionadas na mente, e complexas, se é possível reduzi-las a partes mais simples. O exemplo pelo qual Hume distingue essas classes de percepções é o mesmo de Berkeley: a percepção complexa de uma maçã pode ser decomposta nas percepções mais simples de sua cor, seu aroma e sabor. Esses dados elementares da natureza são, não pontos físicos, mas pontos sensíveis, e não podem ser experimentados isoladamente na forma de uma impressão simples. Isto significa que, na percepção original, as impressões de sensação são apreendidas sempre sob forma complexa. Mas, na imaginação, as percepções podem dividir-se em impressões mais simples e estas, na medida em que são separáveis e distinguíveis, podem associarse em outras percepções complexas. As ideias derivadas das impressões de sensação podem constituir novo objeto de percepção à mente, e gerar impressões internas, chamadas de impressões de reflexão, que vão, na teoria de Hume, formar as paixões. A mente, portanto, é uma composição de percepções simples, invariantes e indivisíveis, que se associam entre si segundo relações determinadas; é este o 12 sentido da expressão “atomismo espiritual” com a qual Deleuze (1977) designa a concepção humiana da subjetividade. Essa concepção revela o caráter fictício da ideia de uma identidade pessoal da mente humana, que unificaria nela todas as percepções singulares. Hume argüi que essa ideia de identidade não deriva da percepção de um vínculo real entre essas percepções diversas, mas se apresenta apenas como uma qualidade que acompanha a associação de ideias na imaginação, ou, antes, como atributo que conferimos à mente ao considerar a maneira pela qual se unem nela as ideias derivadas das percepções. São as associações de ideias e impressões na imaginação que nos persuadem a crer, ante a descontinuidade das percepções, na continuidade do real. 3. O ceticismo de Hume não se resume à negação obstinada de qualquer certeza ou verdade, nem tampouco a uma rejeição indiferente dos dados dos sentidos. O limite desse ceticismo é o seu empirismo: ele afirma que as únicas existências sobre as quais estamos certos são as percepções, e que apenas a experiência – e a memória que a reproduz na mente – é capaz de corrigir os raciocínios relativos a questões de fato. Hume está claro, não tenciona provar que o mundo e o “eu” não existem, mas apenas sustenta a impossibilidade de se estabelecer qualquer noção segura a esse respeito a partir das percepções. Estas, consideradas em si mesmas, tais como se nos apresentam, nada oferecem que nos permita asseverar quer a existência contínua de um “eu” ou de uma identidade pessoal, quer a existência externa e independente de um mundo. Não se trata, portanto, de perguntar se existem ou não os corpos, mas, antes, de pensar as causas que nos induzem a crer na existência dos corpos e de circunscrever as indagações filosóficas ao teatro interior da imaginação. O subjetivismo de Hume reside nessa demarcação: nunca HUME, TNH, I, parte 4, seção V. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 29 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 ultrapassamos o campo definido pelas nossas próprias percepções, e o sujeito, sem aceder jamais a qualquer forma de existência exterior, não pode ter, por objeto de seu raciocínio, senão os próprios elementos constitutivos de sua mentalidade: as impressões e ideias. A crença no real e no “eu” advém, portanto, não dos sentidos, mas do processo espontâneo de operação da mente, descrito por Hume como mecanismo de associação de ideias. A teoria humiana da associação de ideias é, ao mesmo tempo, uma crítica ao racionalismo e à sua noção fundamental: a noção de relação (LAPORTE, 1933). Um dos princípios fundamentais do racionalismo – ou um dos seus problemas decisivos – concerne à natureza das relações que se supõem existir entre ideias ou entre objetos e com base nas quais a razão opera. Essas relações são, na tradição racionalista, consideradas interiores aos seus termos, isto é, elas estão inscritas na natureza dos termos que ligam e podem ser deduzidas a partir deles. Trata-se de compreender o que, na natureza de um dado objeto, explica a relação que o une a outro objeto, ou, ainda, de descobrir um terceiro termo, mais complexo que estes dois, ao qual essa relação seja interior. Por exemplo: X é causa Y, e a razão pela qual X causa Y decorre da natureza mesma de X ou da natureza de Z, que engloba X e Y ou da qual X e Y são partes. A questão do racionalismo é explicar por que, na experiência, as relações parecem exteriores aos seus termos, ou, ainda, supondo que tais relações de fato existem, mostrar que elas não podem ser concebidas independentemente das naturezas de seus respectivos termos. O empirismo, como anota Deleuze (1974, p. 60), afirma desde sempre a exterioridade das relações, mas a subordina ao problema da origem do conhecimento, que situa no sensível e nas operações do entendimento a fonte de produção das ideias. Hume, entretanto, Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. abdica de elaborar uma teoria sobre a conexão entre mundo sensível e mundo inteligível e sobre a noção corrente de que as ideias são representações dos objetos exteriores, para propor, em lugar dela, uma teoria da exterioridade das relações cujo fundamento é precisamente a identidade entre impressões e ideias. As ideias não contêm nada além do que é dado nas impressões, e não se diferenciam destas senão por seu grau de força e vividez, ou por sua atualidade. Ambas são percepções, o que significa dizer que não há distinção real entre ideias e impressões, mas apenas uma diferenciação de tipos: de um lado ideias e impressões de termos ou objetos, e, de outro, ideias e impressões de relações. O mundo de Hume é o “mundo onde a conjunção ‘e’ destrona a interioridade do verbo ‘é’”, e onde a forma do juízo de atribuição, que subordina a explicação das relações ao conhecimento da essência interior das coisas que as estabelecem, é substituída por uma “lógica autônoma das relações” (DELEUZE, id., ib.), exterior às coisas. Por isso, o objeto fundamental de toda investigação concernente à natureza humana é, precisamente, o modo através do qual as ideias se associam umas às outras na mente sempre sob determinadas relações, independentemente das variações sucessivas do conteúdo das percepções relacionadas. Para Hume, as ideias se associam na mente segundo três princípios: semelhança, contigüidade e causalidade. É a operação desses três princípios – ou a qualidade das relações que se fazem através deles– que define uma natureza humana. Quer isto dizer que a natureza humana não se identifica por uma percepção ou ideia; noutras palavras, ela não é constituída por uma identidade contínua, por um “eu” idêntico a si mesmo, nem tampouco por uma constelação fixa de verdades essenciais. Uma natureza humana não é mais que um modo ou Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 30 Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. ISSN 1982 6613 maneira de associar percepções. A influência do método experimental newtoniano torna a intervir aqui: o projeto filosófico de Hume não tem por objetivo explicar as causas ou origens das ideias, mas apenas descrever o funcionamento dos princípios de associação através dos quais a mente opera. As questões do entendimento, segundo Hume, podem ser resumidas em duas classes: as questões de ideias ou conceituais, e as questões de fato.13 Pertencem ao domínio das primeiras as questões matemáticas ou, em geral, as questões passíveis de demonstração pela atividade do raciocínio, que não se referem a coisas existentes na natureza nem são objeto de impressões sensíveis. As relações matemáticas não são exteriores aos seus termos: elas se prendem ao conteúdo deles e se produzem a partir da consideração das ideias ou conceitos que os definem. É pelo conceito de triângulo, diz Hume,14 que nos é dado descobrir a igualdade existente entre seus três ângulos e a soma de dois ângulos retos. Essa relação segue sendo invariável e insuscetível a contradições enquanto o conceito de triângulo, a partir do qual raciocinamos, continua a ser o mesmo. Com as questões de fato, fundadas nas percepções e enunciadas sob a forma de relações de semelhança, contigüidade e causalidade, sucede algo diverso: as proposições, nesse domínio, sempre admitem uma contradição igualmente concebível. O exemplo de Hume é célebre: “O sol não nascerá amanhã” é uma assertiva tão inteligível quanto a que afirma que “O sol nascerá amanhã”. Está claro que Hume não tenciona desempenhar o papel do cético pirrônico, pronto a sombrear com uma nuvem de dúvidas qualquer ínfima centelha de certeza: não se trata de sustentar que o sol não aparecerá no dia seguinte, mas de assinalar que, nas questões de fato, as certezas não podem ser demonstradas a priori, sem o amparo da experiência. Considerada em si mesma, a proposição contrafactual – “O sol não nascerá amanhã” – é lógica, dispõe de um sujeito e de um predicado, e o entendimento, que a reconhece como tal, não é capaz de, usando apenas os recursos do raciocínio, demonstrar sua falsidade. A despeito disso, inclinamo-nos a afirmar, como uma certeza que prescinde de demonstrações, que o sol nascerá amanhã. O problema filosófico fundamental de Hume descortina-se nesse impasse: como se pode considerar verdadeira uma evidência que não está ao alcance da experiência imediata, ou, noutros termos, qual o fundamento das certezas factuais? Os juízos que dizem respeito a questões de fato decorrem, segundo Hume, dos princípios de associação de ideias, através dos quais somos determinados a supor que a sucessão de percepções descontínuas e intermitentes presentes à mente se subordinam a certa ordem de relações que lhes confeririam uma continuidade coerente com o real. As relações de semelhança e de contiguidade estão implicadas nas relações de causalidade,15 e esta é relação evocada em todos os nossos juízos de fato e o modelo sob o qual a experiência é representada na imaginação. A semelhança, em particular, é a base de duas premissas fundamentais das inferências derivadas da experiência: supomos, em primeiro lugar, que o futuro será sempre semelhante ao passado, e, em segundo lugar, que podemos esperar efeitos semelhantes de objetos ou qualidades sensíveis semelhantes,16 ainda que nos seja impossível ter uma impressão distinta da conexão entre essas qualidades e os efeitos que delas esperamos. Nossos sentidos, afirma Hume, dão-nos uma imagem da cor, do peso e da consistência do pão, embora nada nos digam sobre as 13 15 14 HUME, IEH, seção IV, parte 2. HUME, TNH, I, parte 1, seção VII. 16 HUME, TNH, I, parte 1, seção IV. IEH, seção IV, parte 2. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 31 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 qualidades que o fazem adequado à nossa alimentação; não obstante, se nos deparamos com um corpo de cor, peso e consistência semelhantes ao pão que uma vez nos saciou a fome, não duvidaremos que esse outro corpo deverá alimentar-nos como o primeiro. Essa inferência, no entanto, não se desprende da percepção de uma conexão causal entre tais qualidades sensíveis e os efeitos de que as julgamos capazes; ela deriva apenas de uma associação por semelhança. É a memória que produz a relação de semelhança entre as percepções e faz transitar imperceptivelmente de uma à outra, mesmo que os objetos – isto é, suas respectivas percepções singulares – estejam separadas no tempo e no espaço. Por outro lado, embora as percepções sejam descontínuas, elas se oferecem aos sentidos sempre em certa sucessão e em certa disposição; por isso, a imaginação, ao considerar seus objetos, concebe-os sempre segundo relações de tempo e espaço, apreendendo-os em sua contiguidade. A impressão da proximidade dos objetos na experiência desdobra-se na proximidade de suas respectivas ideias na mente; assim, o critério de semelhança, como elemento da ideia de causalidade, é complementado pela noção de contigüidade, pela qual somos levados a reconhecer, como “causa” de um a coisa, a coisa que mais próxima dela. A ideia de causalidade envolve, por conseguinte, as ideias de semelhança e contiguidade: de uma parte, habituamo-nos a inferir que, no futuro, objetos dotados de qualidades sensíveis semelhantes às de outros objetos percebidos no passado produzirão efeitos semelhantes aos destes últimos; de outra parte, presumimos que objetos contíguos no tempo ou no espaço guardam entre si uma relação de causa. Associamos ideias na mente de acordo com o princípio da semelhança ou da contiguidade sem, no entanto, ter qualquer impressão distinta da suposta conexão Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. entre qualidade semelhante e efeito semelhante, ou entre uma dada percepção e a percepção que a sucede no tempo ou a percepção que coincide com ela no espaço. Ora, é, todavia precisamente por não haver a impressão distinta dessa conexão que é possível, por exemplo, conjecturar, com base na razão, que um objeto semelhante a outro produza efeitos diferentes deste: a regra da semelhança, como a da contiguidade, não é uma lei a priori do entendimento. Se assim fosse, isto é, se essa regra pudesse ser deduzida apenas pela razão (como o são as propriedades do triângulo), então bastaria um único caso de relação de semelhança (como é suficiente, para conhecer as propriedades do triângulo, considerar qualquer triângulo), para que os seus efeitos se nos tornassem imediatamente conhecidos. Mas as inferências que somos capazes de formular acerca da regra de semelhança são estabelecidas, diz Hume, a partir de certo número de casos ou experiências; em algum momento se opera a passagem da quantidade, relativa aos casos experimentados, para a qualidade, ou seja, para a definição da regra. Essa passagem não se realiza, pois, por uma operação do entendimento, e Hume a explicará na sua crítica à noção racionalista de causalidade. A relação de causa e efeito faz passar de uma impressão atual à ideia de uma coisa que não é dada aos sentidos. Ela liga a existência de um fato não presente à existência de um fato presente: a causalidade ultrapassa o que é dado na experiência, permite-nos emitir juízo sobre algo de que não tivemos a experiência ou algo cuja experiência direta nos é impossível. Vemos o sol nascer hoje, como o vimos nascer ontem, e nos sentimos autorizados a dizer que ele nascerá amanhã. Uma experiência é sempre uma contingência particular: o nascer do sol hoje não nos oferece senão uma percepção singular e distinta, uma imagem do presente; se, diante dela, afirmamos que o Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 32 Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. ISSN 1982 6613 sol nascerá amanhã, essa certeza não se funda sobre nenhuma outra razão que a crença de que o futuro se assemelhará ao passado ou que a sucessão das percepções obedece a uma ordem regular e previsível. Mas, nas afirmações “O sol nascerá amanhã” e “Todos os corpos caem com aceleração constante”, as palavras “amanhã” e “todos” exprimem noções insuscetíveis de fornecer qualquer impressão na experiência. O que nos faz imaginar, então, ante uma simples sucessão de percepções, uma ordem de relações necessárias, que nos permite inferir regras gerais a partir de uma experiência que se nos oferece sempre de maneira descontínua e particular? A inferência é uma certeza empírica, sensorial, e não racional, e, ao mesmo tempo, não tem correlato na experiência imediata. Inferir significa ir além do que é dado ou dável na experiência (DELEUZE, 1974, p. 62), e considerar existente ou dotado de realidade algo que é não presente aos sentidos. Hume propõe duas teses para desatar esse paradoxo. Primeiramente, porque tendemos em virtude dos mecanismos de associação de ideias, a transitar de uma ideia a outra, isto é, a inferir uma a partir de outra, imaginamos que entre elas existe uma conexão necessária. O conhecimento dessa conexão, porém, não é obtido por qualquer raciocínio a priori: ele é dado a partir de certo acúmulo na memória de casos semelhantes. Em contrapartida, tal conexão não constitui jamais o objeto de uma percepção distinta: percebemos apenas que um fato se segue a outro fato ou que dois fatos se conjugam em uma percepção, mas não temos qualquer impressão sensível da relação que supomos existir entre eles, visto que os efeitos nunca se mostram nas suas supostas causas, ou, antes, não podem ser deduzidos a partir da simples percepção dessas causas. A percepção de um efeito é distinta e isolável da percepção da sua causa. Hume17 ilustra esse princípio pelo seguinte exemplo. Ao vermos uma bola de bilhar em movimento chocar-se com outra em repouso, concebemos que esta se deslocará, em virtude desse choque, com mesma velocidade e direção da primeira, a qual, tendo comunicado a outra seu movimento inicial, ficará em repouso. Mas o movimento da segunda bola de bilhar é um evento distinto do movimento da primeira, e nesta não há qualquer indício do que sucederá àquela. Isto significa que, se cogitarmos a priori a possibilidade do choque, então, não se pode, pelo raciocínio apenas, deduzir esse desfecho: para a razão, a hipótese de que as duas bolas permaneçam em repouso é tão inteligível, como proposição, quanto a hipótese de que a primeira comunique seu movimento à segunda. A suposição de que existe uma conexão necessária entre um evento e outro é, do ponto de vista da razão, inteiramente arbitrária: a única coisa que é possível, pela experiência, afirmar com respeito a dois eventos ou objetos que se apresentam em sucessão ou contiguidade, e cuja percepção evoca, na mente, outros casos semelhantes, é que eles estão em conjunção constante. Mas poderíamos se estivéssemos acabados de chegar ao mundo e fôssemos dotados de excelentes poderes racionais, inferir, com base em um caso particular, essa regra? A ideia da relação de causa e efeito, que une um evento a outro na imaginação por um elo hipotético, faz parecer que nenhum outro resultado decorrente do choque das bolas de bilhar, exceto o observado, seria possível. É a ideia dessa conexão necessária que nos leva a imaginar que tais efeitos, a que nos habituamos com o tempo e que são seguidamente reiterados pelo curso da natureza, podem ser deduzidos apenas mediante o raciocínio, sem o auxílio da experiência. Aqui intervém a segunda tese 17 HUME, IEH, seção IV, parte 1. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 33 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 de Hume: mesmo depois de termos a experiência das relações causais ou das relações de semelhança, nossas inferências, que se antecipam à experiência, não estão fundadas sobre raciocínios nem qualquer outro processo de entendimento, e as regras gerais que lhes dão forma não são mais que conjeturas derivadas das expectativas consolidadas pela recorrência, isto é, são apenas crenças. Hume afirma que a ideia dessa alegada conexão necessária, que caracteriza a relação de causalidade, não tem qualquer amparo na experiência: ela é puramente presuntiva, e é apenas por percebermos, na experiência, que dois objetos se encontram em conjunção constante que somos determinados a esperar um devido à aparição de outro. Noutros termos, tudo que as nossas impressões nos informam é que a percepção singular de um objeto Y sucede ou coincide, habitualmente, com a percepção singular de um objeto X, e essa conjunção constante se repete com tal recorrência na experiência que, dada a aparição do objeto X aos sentidos e, portanto, a evocação da ideia correspondente a essa impressão na mente, esta é levada a transitar imediatamente à ideia do objeto Y, prevendo a sua aparição na experiência – e, assim, dispondo-nos a esperá-la. Essa transição de ideias não é, pois, definida a priori, por simples dedução do raciocínio, como se a aparição do objeto Y estivesse inscrita, como efeito necessário, na aparição do objeto X; se assim fosse, essa relação poderia ser inferida a partir de um único caso da experiência, como vimos no exemplo da bola de bilhar. A inferência, como a crença que a acompanha, não pode estabelecer-se, entretanto, sem um acúmulo de casos semelhantes na experiência, condensados, na imaginação (que não pode recordá-los um a um) sob a forma de um hábito. De uma parte, a fusão de casos Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. semelhantes na imaginação constitui o hábito, o costume pelo qual tendemos a esperar efeitos semelhantes de percepções semelhantes, e, de outra parte, a observação de cada um desses casos em particular, na experiência, suscita a ideia de que existe uma conexão necessária entre esses efeitos e essas percepções, e é a ideia dessa conexão necessária que está na base da inferência ou da crença. Para Hume, portanto, o hábito é o princípio de unificação, na imaginação, de uma pluralidade de casos singulares, associados sob uma mesma regra de semelhança, e a crença é o princípio de distinção, em cada caso particular, da relação ou conexão que se supõe unir, na experiência, os objetos percebidos em sucessão regular ou em conjunção constante. Desse modo, é por estarmos habituados a ver o sol aparecer todos os dias – e por nossa imaginação fundir todas essas percepções semelhantes em uma única ideia – que podemos crer, ou inferir, que o sol nascerá amanhã – uma vez que projetamos, sobre esse caso particular ainda não dado, a mesma conexão necessária que supomos distinguir os demais casos semelhantes de conjunção constante, na experiência, como casos de uma mesma relação de causalidade. A noção retrospectiva de causalidade, que parte da percepção do efeito para o conhecimento das causas, sofre uma notável inversão em Hume. Pelo princípio de razão, um fato cuja existência é presente está em conexão com outro, que explica, como sua causa, essa existência; esse procedimento conduz a uma regressão infinita, que nos leva a imaginar causas ausentes e cada vez mais remotas. Hume, no entanto, parte precisamente de uma conjectura abstrata – a ideia de uma impressão não presente aos sentidos – para encontrar sua explicação última em algum dado atual da experiência. Desse ponto de vista, o que nos induz a supor como verdadeiro ou necessário que Luis XIV morreu em 1715 não é o conhecimento da Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 34 Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. ISSN 1982 6613 causa de sua morte, mas a impressão presente do relato dela na obra de um historiador; não se trata, evidentemente, de negar que a morte do Rei Sol teve causas determinadas, mas de assinalar que nossa certeza a respeito não deriva do conhecimento dessas causas e da conexão necessária entre elas e seu efeito, mas da crença que nos é inspirada pela impressão presente do relato de um autor, em cujo testemunho nos habituamos a confiar, porque a sua forma se assemelha à de outros que se revelaram igualmente dignos de crédito. A tradicional distinção entre verdadeiro e falso que marca as teorias do conhecimento é substituída pela diferença entre crível e não-crível: o conhecimento é antes uma questão de credibilidade que de verdade. Hume contorna o argumento cético contra a falibilidade da razão e a variabilidade das opiniões ao afirmar que o conhecimento não tem fundamentos racionais e ao atribuir à reiteração sucessiva da crença e do hábito – e não às leis do raciocínio – a estabilidade dos juízos. O conhecimento é uma probabilidade a que a experiência vai agregando graus de certeza a partir da percepção de casos de conjunção constante e de padrões de semelhança. Esse conhecimento, no que respeita às questões de fato, é um efeito espontâneo do mecanismo de associação de ideias. Mesmo o aprendizado – a educação e a cultura – procede por meios nãointelectuais, por simulacros de crença, como aponta Deleuze (1974, p. 63), que se servem das propriedades da linguagem para ultrapassar a experiência – para condensá-la – a fim de substituir a percepção direta de casos semelhantes por uma simples repetição verbal, cuja impressão simula o seu efeito. Se for lícito ainda entrever na filosofia de Hume uma teoria do conhecimento, cumpre, entretanto notar que, nela, em lugar das tradicionais categorias da determinação, da necessidade e da verdade, encontramos apenas coincidência, probabilidade e verossimilhança. 4. Todas as inferências têm por base uma crença que procede unicamente de um objeto presente à memória ou aos sentidos e de sua conjunção constante, habitual, com outro objeto.18 É o hábito, afirma Hume, e não a razão, que nos induz a fazer da experiência a norma de nossos juízos; e, mesmo nos assuntos que nos parecem mais familiares, nos quais a transição das ideias é tão imperceptível a ponto de nos persuadir que nossas inferências decorrem da simples aplicação do raciocínio, é precisamente então que a força do hábito se apresenta em mais alto grau. Nossa ignorância com respeito à influência do hábito nos faz crer na existência de conexões necessárias onde percebemos apenas casos de conjunção constante. Nascidas da crença, as inferências não são atos racionais, e não dependem mesmo do emprego da razão. Hume observa que as operações mentais essenciais do mecanismo de associação de ideias são demasiado importantes para serem confiadas às deduções lentas e titubeantes da razão. É graças ao hábito e à crença que podemos dar governo à vida, conciliar os meios com nossas expectativas, e decidir sobre questões de fato sem que seja necessário que todos os seus elementos constem da experiência atual. As crenças são determinações da natureza humana, e não podem deixar de manifestar-se sob dadas condições. Noutros termos, nenhum raciocínio pode impedir ou suspender, em nós, o “instinto natural” ou a “tendência mecânica” da crença. 19 Não é difícil prever as dificuldades que essa concepção de crença acarreta à tarefa humanista de diferenciar os homens dos animais, e Hume explorará o ponto, com alguma ironia, ao 18 19 HUME, IEH, seção X. HUME, IEH, seção V, parte 2. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 35 Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. ISSN 1982 6613 discutir a “razão dos animais”20 segundo os mesmos argumentos com que abordara o processo de formação da crença nos homens, sugerindo, por fim, que as diferenças entre o entendimento humano e o entendimento dos animais são da mesma ordem que as diferenças entre o entendimento de um homem e o de outro homem... A crença, assim como o hábito, não é produto de uma operação racional nem se forma em nós por uma espécie de adesão voluntária a seus princípios. Ela é sentida, e não pensada: é um dado da natureza humana tão inevitável quanto a fome ou o sono. A imaginação só atribui força de causalidade a um caso de conjunção constante se este, além das ideias de semelhança e contiguidade, lhe inspira o sentimento de crença. Ora, a razão permitenos, por exemplo, considerar, como uma proposição inteligível, que o sol não nascerá amanhã ou que uma bola de bilhar parada seguirá em repouso mesmo após o choque de outra em movimento: podemos refletir sobre tais asserções, pensá-las como questões, mas não podemos crer nelas nem viver como se as considerássemos verdadeiras, ou, de outro modo, como se realmente duvidássemos de que o sol haveria de nascer no dia seguinte ou que o movimento de um corpo se comunica a outro. O que distingue a crença em relação às concepções formuladas pelo raciocínio, isto é, o que explica por que tendemos a agir sempre segundo a crença, ainda que seja possível opor-lhe pelo raciocínio uma asserção contrária, é o sentimento ou a paixão que se prende à crença: é a paixão que nos faz atribuir valor aos objetos e emitir juízos a respeito deles. Os princípios de associação de ideias – semelhança, contigüidade e causalidade – somente tomam direção e sentido definidos com respeito às paixões; são elas, em suma, que qualificam a associação de ideias e conferem a vividez própria que distingue a crença. É pela paixão, por exemplo, que reconhecemos como semelhantes entre si certas percepções, quando elas excitam em nós a mesma disposição passional. É justamente por isso que a obstinação dos céticos pirrônicos não se sustenta além da esfera artificial do debate acadêmico: na vida diária, a natureza e as paixões calam todas as suas objeções e os desobrigam do compromisso doutrinário de negar com discurso as crenças implícitas em sua prática. O sentimento – a paixão – convalida, por assim dizer, as crenças, e as diferencia tanto da reflexão hipotética, objeto do raciocínio, quanto das ficções engendradas pela imaginação. Conforme adverte Hume,21 podemos compor um ser fantástico, unindo a cabeça de um homem ao corpo de um cavalo, mas não podemos crer que tal criatura exista. A crença não depende da vontade nem pode ser manipulada a esmo; ela se faz acompanhar sempre de uma determinada maneira de sentir que confere realidade ao seu objeto, cuja imagem é mais estável que a fabricada pelo exercício livre da imaginação. Por isso, diz Hume, a ideia de uma pessoa conhecida, presente à mente quando a impressão de sua voz é presente aos nossos sentidos, é mais viva e imediata que a ideia de um castelo encantado. Os homens, e os céticos entre eles, tendem a agir e julgar segundo suas crenças, e estas se lhes tornam sensíveis pela força das paixões que as acompanham. O traço característico dessa natureza humana dominada pelas paixões, segundo Hume, não é, a rigor, o egoísmo, mas a parcialidade. Hume partirá dessa constatação para edificar uma teoria política bastante original, cuja questão de fundo atinará com a necessidade de conciliar essas parcialidades em um mesmo conjunto social. Esse modo de pensar contradiz a 20 21 HUME, TNH, I, parte III, seção XVI; IEH, seção IX. HUME, IEH, seção V, parte 2. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36. 36 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 ideia de que homem é um animal social por natureza, mas a resposta de Hume ao problema da convivência pacífica não passará tampouco pela ideia de um contrato social a que os homens se submeteriam em virtude de um comando da razão. Nem a natureza nem a razão explicam a sociedade: esta nasce, com efeito, de um artifício que convenciona os critérios parciais de justiça a um princípio comum de justiça. Instituída por uma convenção, cujo fundamento é apenas a utilidade da paz, a sociedade organiza-se como uma segunda natureza, que sobrepõe, aos juízos parciais dos homens, uma moral artificial que os identifica ou na qual os homens encontram o espaço mesmo de realização de seus juízos parciais e de suas paixões. O que preserva a validade desse princípio de justiça – e assegura, portanto, a obediência dos homens à ordem que ele institui – não é o seu conteúdo moral em si mesmo, mas a crença de que a sociedade fundada em tal princípio é objeto de interesse e utilidade para todos os homens. O dever dos governantes é manter viva na imaginação dos homens essa crença. A teoria política de Hume, como toda posição política derivada do ceticismo, não deixa de ser conservadora: na falta de outras certezas, o melhor regime é aquele com o qual estamos habituados. Vol. 5, (2010) - Edição Especial Novas Perspectivas Intelectuais e suas Interfaces Existenciais. HUME, D. Tratado da natureza humana. Tradução de Débora Danowski. São Paulo: Unesp: Imprensa Oficial, 2001. LAPORTE, J. Le scepticisme de Hume. Revue philosophique de la France et de l’Etranger, vol. 115, n. 1 e 2. Paris, jan.-jun 1933. VITA-MORE, Natasha. Posthuman in Water. Marca D’água. Disponível em: <http://www.fairpoint.net/~jpierce/images/p osthuman_in_water.jpg> Acesso em: 13 ago 2010. REFERÊNCIAS DELEUZE, G. Empirismo y subjetividad: la fi losofi a de David Hume. Barcelona: Gedisa, 1977. DELEUZE, G. Hume. CHATÊLET, F. História da filosofia, vol. 4. O iluminismo.Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974. HUME. Ensaios morais, políticos e literários. São Paulo: Nova Cultural, 1989. HUME. Investigação acerca do entendimento humano. São Paulo: Nova Cultural, 1989. Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, edição especial, vol. 5, 2010, p. 21-36.