CULTURA E SEXUALIDADE EM LIVROS DIDÁTICOS

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CULTURA E SEXUALIDADE EM LIVROS DIDÁTICOS DE BIOLOGIA
Carolina Rosa Travaglia (Bolsista PIBIC/UFU)
Elenita Pinheiro de Queiroz Silva (Universidade Federal de Uberlândia)
Financiamento: FAPEMIG/CNPq
Introdução
Este texto é parte de um projeto de pesquisa de Iniciação Científica (IC) vinculado a
uma pesquisa mais ampla, intitulada Conhecimento biológico e Culturas: Uma análise
das propostas metodológicas presentes nos livros didáticos de Biologia no PNLD/2012,
em andamento. O plano de trabalho da IC teve como objetivo geral a investigação da
articulação entre conhecimento biológico, cultura e sexualidade nas coleções de livros
didáticos de Biologia aprovados pelo PNLD/2012 e como objetivos específicos a
análise da existência ou não de articulação entre conhecimento biológico, questões
culturais e sexualidade destas coleções e o levantamento das formas de orientação que
os do Manual do Professor propõem para o trabalho com o tema sexualidade. Neste
texto apresentaremos as discussões acerca do modo como os livros abordam o tema
sexualidade e cultura.
O livro didático, para alguns autores, é um material muito importante, exercendo grande
influência na metodologia do ensino, pois pode apresentar ideologias e valores culturais
(FRACALANZA; MEGID-NETO, 2006). Para grande parte dos professores (as), este
material é indispensável para seu trabalho. Silva e Parreira (2013, p. 2) afirmam que o
livro didático “tem a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar,
controlar e assegurar gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes”.
Neste sentido, o tema sexualidade e cultura também se faz presente nos livros didáticos
de Biologia. Se considerarmos que a sexualidade vai além da dimensão biológica,
perpassando e não se fixando somente na discussão sobre a reprodução humana,
podemos dizer que a sexualidade é a marca do homem (ser humano) (NUNES, 2003).
Desse modo, a noção de sexualidade está associada à dimensão da cultura. Ela é
produzida pelo ser humano, considerando todas as suas capacidades. Trabalhar o livro
didático em uma perspectiva onde se irá trabalhar a articulação desses temas no campo
do conhecimento biológico é de suma importância, pois assim está se pensando os
alunos, e mesmo os professores (as) em seus processos culturais e modos de existência.
Metodologia
Do ponto de vista metodológico, trata-se de um estudo de natureza qualitativa e adotouse como procedimento de análise a análise documental. Na realização do trabalho as
seguintes etapas foram desenvolvidas: o levantamento das coleções dos livros didáticos
de Biologia aprovados no PNLD/2012; a leitura e levantamento dos temas sexualidade e
sua articulação com questões culturais. No PNLD/2012 foram aprovadas oito coleções.
Todas as coleções são compostas por três volumes. Na leitura e sistematização das
informações buscamos levantar os locais e tipos de textos em que os temas são
retratados em cada livro. De posse destas informações iniciamos o procedimento de
análise que buscava responder as questões e objetivos formulados.
Resultados
Da análise e levantamento já realizados, percebemos que as coleções dos livros
didáticos aprovados no PNLD/2012 abordam o tema sexualidade, porém vimos que essa
abordagem é quase totalmente vinculada à noção de sexo biológico, e é tratada somente
quando os livros abordam o tópico referente ao sistema reprodutor humano (masculino
e feminino). Em relação à articulação com questões culturais, as obras não a trazem
diretamente ao tema sexualidade, mas isso não quer dizer que não há articulação
explícita entre o tema da sexualidade e de uma cultura mais ampla. Todavia, a
articulação entre o tema sexualidade com questões culturais é bastante centrada na
cultura que pode ser reconhecida como de uma “cultura científica” que a reduz a
dimensão fisiológica e anatômica. De outro lado, podemos afirmar que o padrão de
sexualidade reafirmado por este modelo, presente na quase totalidade das obras, é o da
heterossexualidade. Das coleções analisadas, percebemos que há coleções que se
distinguem na abordagem do tema. Uma das coleções, Biologia Hoje (LINHARES E
GEWANDSZNAJDER, 2010), na Unidade III, capítulo 16, tópico Reprodução Humana
após apresentar os sistemas genitais, masculino e feminino, o ciclo menstrual e período
fértil e gravidez apresenta, em dois boxes distintos, intitulados Biologia & Saúde e
Biologia & Sociedade. No primeiro boxe o texto complementar tem o seguinte título
Mulher: cuidados com o corpo e, no segundo, o texto intitulado Homossexualidade. No
texto referente aos cuidados com o corpo da mulher são apresentados um conjunto de
orientações de natureza biomédica a ser adotado por “[...] mulheres e garotas que já
tenham menstruado[...]. O texto insiste na busca de orientação médica pelas mulheres e
sugere a mesma medida em casos de surgimento de sintomas como dor, ardência
verrugas etc na região genital e, ao final desta orientação deixa explícita que muitas
podem ser as causas dos sintomas, dentre elas “[...] se o parceiro estiver com alguma
infecção que possa ser transmitida por contato sexual.” Não há, neste texto, a indicação
de que uma mulher possa ter como parceiro sexual outra mulher. Na sequência, o texto
complementar sobre Homossexualidade apresenta um conjunto de hipóteses da ciência
que poderiam explicá-la, indica que não se deve “[...] rotular os outros por causa disso”.
O texto termina por apresentar a homossexualidade atrelada a confusão de sentimentos
e indica que “[...] se alguém estiver em crise por causa de desejos sexuais, vale a pena
procurar um psicólogo”. O parágrafo seguinte, o texto alia à noção de
homossexualidade a ideia de orientação sexual. A sequência do capítulo deste livro são
apresentados os métodos contraceptivos, numa visão e cultura marcadamente
biomédica. Os livros destinados ao/a professor/a de Biologia (Manual do professor)
traz, mesmo que de forma diferente, em todas as obras como devem ser trabalhados os
conteúdos expostos no livro dos alunos. Quanto à abordagem do tema sexualidade na
sala de aula, de maneira geral, os Manuais apresentam orientações há algumas
diferenças entre as obras. Uma obra para outra, diferenças estas que orientam em
algumas obras de forma totalmente básica e em outras de forma mais abrangente e
completa, trazendo situações que possibilitem trabalhar os temas e mostrar o quanto são
importantes até mesmo para o convívio social dos alunos. Tal situação pode ser
comprovada pela orientação dada pelo Manual do Professor da obra que indicamos no
exemplo acima. O Manual não apresenta nenhuma orientação ou sugestão de leitura
para no boxe Biologia & Sociedade “Homossexualidade”. Para o boxe Biologia &
Saúde “Mulher: cuidados com o corpo” o manual afirma que o “professor deve estar
preparado para ouvir muitas perguntas dos estudantes sobre sexualidade [... ]” e alerta:
Muitas das questões colocadas pelos alunos não podem ou devem ser
respondidas de maneira definitiva pelo professor, mas podem (e
devem) ser discutidas sob sua orientação; em algumas situações, será
necessário argumentar com os estudantes, para combater preconceitos
e estereótipos. (LINHARES; GEWANDSZNAJDER, 2010, p. 41)
Este tipo de orientação genérica que deixa a cargo do professor a responsabilidade em
aprofundar o tema e buscar as respostas supostamente adequadas está presente na
maioria das coleções. Não há indicações consistentes de referências ou propostas
metodológicas para os trabalhos com a temática pelo/a professor/a em sala de aula.
Considerações Finais
Concluímos que as obras didáticas analisadas contemplam os temas sexualidade e
cultura, mas estes temas estão presentes em boxes, ou textos complementares não
fazendo parte, na maioria das coleções do texto principal dos livros didáticos que
analisamos. A articulação com a cultura mais ampla e temas que são reconhecidos como
do cotidiano dos/as estudantes de ensino médio estão nestes textos secundários. Todos
os livros apresentam questões, assuntos, temas vinculados a sexualidade e cultura, mas
o enfoque central é o da biomedicina. A temática homossexualidade, em regra geral, é
abordada na referência aos homens, e, quando há menção a homossexualidade feminina
ela não é expressa de maneira mais profunda ou explícita. A cultura juvenil é muito
pouco retratada nas coleções didáticas. Apesar de pouco aprofundamento e não inserção
no texto principal estas obras apresentam tais articulações, embora entendamos que
ainda há o que aprofundar e melhorar, especialmente, na orientação para o
trabalho em sala de aula. Uma abordagem mais aprofundada pode apresentar
melhor suporte aos professores (as), de maneira que possa criar sentido na vida dos/as
alunos/as.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Ministério da Educação. Guia de Livros didáticos: PNLD 2012:
Biologia. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2011.
FRACALANZA, H.; MGID NETO, J. O livro didático de Ciências no Brasil.
Campinas: Komedi, 2006.
LINHARES, S.; GEWANDSZNAJDER, F. Biologia hoje. Vol. 1. São Paulo: Ática,
2010.
NUNES, C. A. Desvendando a sexualidade. Campinas: Papirus, 2003.
SILVA, F.; MAGALHÃES, J; RIBEIRO,P. R. C.; QUADRADO, R. P.
Sexualidade e escola: compartilhando saberes e experiências. 2 ed. Rio Grande:
FURG, 2008.
SILVA, E. P. Q. A invenção do corpo e seus abalos: diálogos com o ensino de
Biologia. 2010. 201f. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Federal de
Uberlândia. Uberlândia, 2010.
SILVA, E. P. Q. PARREIRA, F. L. D. Dizeres sobre sexualidade e cultura: o que
dizem os livros didáticos de Biologia? Anais do 5º Seminário Brasileiro de
Estudos Culturais e Educação e 2º Seminário Internacional de Estudos
Culturais e Educação, realizado na Universidade Luterana do Brasil, Campus
Canoas/RS, de 20 a 22 de maio de 2013.
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