1 NÚCLEO DE ECOENDOSCOPIA – COMENTÁRIOS DO ARTIGO “Contrast Harmonic-Endoscopic Ultrasound Is Useful to Identify Neoplastic Features of Pancreatic Cysts” Pietro Fusaroli, Marta Serrani, Roberto De Giorgio, Maria Cristina D’Ercole, Liza Ceroni, Andrea Lisotti, Giancarlo Caletti Pancreas 2016; 45 (2): 265-268 Resumo do Artigo Fusaroli e colaboradores investigaram, através de análise retrospectiva, o uso da ecoendoscopia com contraste com ondas harmônicas (CH-EUS), no diagnóstico diferencial de lesões císticas pancreáticas e sua detecção para malignidade, em 76 pacientes submetidos à ecoendoscopia com contraste com ondas harmônicas e injeção de microbolhas durante o exame, no período entre 2008 a 2011. A análise foi realizada através leitura retrospectiva das imagens gravadas em vídeos, retiradas do banco de dados do serviço. Foi utilizado o ecoendoscópio setorial com ondas harmônicas e injeção de microbolhas no momento do exame. Na avaliação, foram estudados os comportamentos dos padrões ecográficos dinâmicos, submetidos à infusão de microbolhas (CH-EUS) e classificados como imagens com : Hiper-realce Hipo-realce Homogeneidade Não homogeneidade Os focos ecográficos do estudo dinâmico foram: Parede do cisto Septos Componentes sólidos intracísticos Washout (rápido / lento) do contraste Os padrões ouro comparativos foram baseados em : Quadro clinico associado à punção aspirativa de agulha fina (citologia ou análise do líquido) Peças cirúrgicas Seguimento clínico mensal, com ecoendoscopia semestral, em período de 1 ano Resultados relevantes: Parede cística Pseudocisto Seroso Mucinoso (cistoadenoma /IPMN) Neuroendócrino (76 lesões) (36) (27) (10) (3) Hiper-realce Hipo-realce 10 % 90 % 86 % 14 % 89 % 11 % 100 % 0% Os padrões comparativos sobre a homogeneidade e o tempo de washout não demonstraram diferenças nos grupos. 2 Pacientes com componente sólido com hiper-realce foram diagnosticados como malignos (2 IPMN maligno e 2 neuroendócrino) em comparação a componente sólido sem realce (10 cistos benignos com “plugs” mucosos e 8 com pseudocistos com debris). Os autores concluíram que : A ecoendoscopia com contraste com ondas harmônicas (CH-EUS) permite diferenciação entre pseudocistos de outros cistos pancreáticos; Não conseguiu diferenciar entre cisto mucinoso e seroso; Vegetações malignas no interior de lesões císticas pancreáticas são claramente demonstradas como componentes sólidos com hiper-realce A ecoendoscopia com contraste com ondas harmônicas (CH-EUS): o Direciona a PAAF ecoguiada à potenciais áreas neoplásicas; o Evita punções de debris ou “plugs” mucosos no interior da lesões císticas. Comentários sobre artigo Publicações sobre novas tecnologias e seus impactos na prática clínica diagnóstica frequentemente geram duas incertezas: Curva de aprendizado: A acurácia ou a nova metodologia que supostamente melhoraria a sua técnica ou eficiência, sempre se submete a uma curva de aprendizado que geralmente não é descrita em publicações. Certamente, há um número mínimo de casos para entender a técnica, resolver dificuldades operacionais durante o exame e sentir suas limitações. A partir de um número mínimo, a nova metodologia pode demonstrar sua real utilização. Descrições que esclareçam sobre um número mínimo de casos, que definam como experiência suficiente para se obter uma acurácia estável são raras nas publicações; Casos consecutivos: No início de uma nova técnica, é comum que os casos realizados sejam inconscientemente “selecionados”, uma vez que nem toda a equipe tem o domínio da técnica e/ou só uma pessoa seja apta para o procedimento técnico. Assim, frequentemente, os casos menos complicados, pacientes com condições clínicas mais favorecidos ou os casos que tendem a ser adequados para a técnica, sejam escolhidos para o estudo. Com isto, o resultado pode ser muito restrito a um grupo “seleto” de pacientes e não corresponder a realidade da população geral. Casos consecutivos minimizam o “viés de seleção” e representam uma amostra real. Nesta publicação, é interessante a tendência da ecoendoscopia com contraste com ondas harmônicas (CH-EUS) permitir diferenciar entre pseudocisto e outras lesões pancreáticas (cistoadenoma seroso, mucinoso, IPMN e neuroendócrino), mas na prática clínica diária, não há muita dúvida sobre o diagnóstico de pseudocisto, se associarmos a história clínica, epidemiologia e análise do líquido intracístico. Os tumores neuroendócrinos com degeneração cística apresentam boa acurácia diagnóstica baseada na análise citológica/anatomopatológica. A maior dúvida persiste ainda no diagnóstico diferencial entre lesões mucinosas e serosas, justamente pela ampla faixa da dosagem de CEA (entre 5 a 192 ng/dL) que não permite direcionar a um diagnóstico. Os modelos escolhidos para padrões ouro da publicação possuem sensibilidade baixa. O modelo mais fiel é a cirurgia pois permite a análise real de toda a lesão ressecada. Utilizar a história clínica associada à análise do líquido intracístico apresenta uma sensibilidade baixa devido à ampla margem indeterminada pela dosagem de CEA. E o seguimento clínico associado à ecoendoscopia por período de 1 ano não é suficiente para diagnóstico de lesão 3 maligna pois para uma IPMN se demonstrar como câncer invasivo, serão necessários vários anos de evolução da doença. A análise da velocidade de “washout” do contraste deve exigir um treino muito longo. O fluxo da circulação tecidual pode variar não apenas pela constituição tecidual, mas também em função do débito cardíaco, hipertensão portal, circulação colateral, hipotensão pelo sedativo, etc. Uma padronização mais detalhada da técnica é necessária para se reproduzir os achados do estudo. Devido à pequena amostra individual de cada tipo de lesão pancreática (3 neuroendócrinos e 10 mucinosos), a diferenciação quanto à etiologia serosa ou mucinosa pode não ter sido suficiente para detecção. Uma amostra mais ampla e representativa precisa ser realizada. Assim como em outros estudos que utilizaram a EUS-CH, reforça-se a idéia de utilizá-la como mais um parâmetro ecográfico para otimizar a punção ecoguiada, e assim, possibilitar maior acurácia diagnóstica. Atualmente, estudos que englobam a “análise de marcadores moleculares em painel”, ou seja, um conjunto de alterações genéticas analisadas sumultaneamente, têm apresentado resultados promissores para o diagnóstico de câncer invasivo intracísticos, o que pode tornar dispensável a citologia e análise bioquímica. Nota: Artigo comentado sobre ecoendoscopia com contraste com ondas harmônicas, disponível em novembro 2015, apresenta um descritivo sobre a técnica. Sérgio Eiji Matuguma e Fauze Maluf-Filho Sérgio Eiji Matuguma: Médico Assistente do Serviço de Endoscopia Gastrointestinal do Hospital das Clínicas e Membro do Núcleo de Ecoendoscopia da SOBED. Fauze Maluf Filho: Livre docente do Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Coordenador do Serviço de Endoscopia do Instituto de Câncer de São Paulo - ICESP - FMUSP, Coordenador do Núcleo de Ecoendoscopia da SOBED, Editor associado da Gastrointestinal Endoscopy.