Década sem ajuste gerou o caos Hélio Duque O Brasil está quebrado em função de conflito entre a economia e a política. Seria diferente se um projeto de ajuste fiscal realista, fixando o limite de gastos públicos por dez anos, impedindo seu crescimento acima do PIB (Produto Interno Bruto), tivesse sido aprovado. Os seus formuladores foram os ministros Antonio Palocci, da Fazenda, e Paulo Bernardo, do Planejamento, em 2005, no governo Lula da Silva. Quando chegou à Casa Civil a economista Dilma Rousseff liquidou o projeto fundamental para o equilíbrio das finanças públicas: “é um ajuste rudimentar”. Os dois ministros, ao invés de enfrentar o primarismo e convencer o presidente da República da importância de uma base orçamentária realista, aceitaram a qualificação de rudimentares. Com o afastamento do governo do ministro Palocci, assumiria a Fazenda, Guido Mantega, adepto da gastança, permaneceria nos governos Lula e Dilma. Eleita presidente, em 2010, Dilma Rousseff, implantaria a desastrada “nova matriz econômica”, onde o BNDES foi vítima e por extensão toda a sociedade brasileira. Adotaria verdadeiramente uma “política econômica rudimentar”. O País iria se afundar em dívidas impagáveis, juros na estratosfera, queda de arrecadação, desemprego na escala de vários milhões, renda per capita encolhendo em 10%, dívida pública bruta acima de R$ 4,3 trilhões, levando os Estados federativos a situação pré-falimentar. Tudo isso gerado pelo gasto público irresponsável e aparelhamento do Estado por corporações que usufruíram vantagens de todo tipo: algumas empresariais ganharam o apelido de “campeãs nacionais do desenvolvimento”. Um dos exemplos, mais não único, foi o empresário Eike Batista e suas empresas simbolizadas no X de multiplicação. Hoje todas elas em situação falimentar. As outras, a “Lava Jato” está revelando aos brasileiros. Se em 2005 o ajuste fiscal tivesse sido aprovado, o Brasil não estaria mergulhado no cenário de horror e brutal recessão econômica. A PEC que limita os gastos públicos, agora aprovada na Câmara dos Deputados, poderia ter se transformado em realidade, há onze anos. Em linhas gerais os seus fundamentos básicos já estavam presentes na proposta dos dois ministros do PT. Não obstante, o líder do partido na Câmara, Afonso Florence, ignorando essa realidade, afirmar: “A aprovação da PEC do teto dos gastos representará o desmonte de todas as políticas públicas do Brasil”. É secundado pela senadora Vanessa Grazziotin, ao qualificar de PEC da maldade: “O que está ameaçado são os serviços públicos, direito dos mais pobres, dos trabalhadores e a nossa Constituição Cidadã, quem vota a favor da PEC 241 vota contra o Brasil.” Eles acreditam que o dinheiro público é infinito, desconhecendo que sem o ajuste o resultado será a explosão da inflação, da dívida pública, do desemprego, da falência de empresas e falta de recursos para os investimentos sociais. A PEC limitadora dos gastos públicos não é entendida, por insondável mistério, por setores da Igreja Católica. Dom Roberto Ferrería Paz, bispo de Campos, a considera “devastadora e brutal”. Na verdade, mesmo com ajuste, a dívida pública, de acordo com o economista José Márcio Camargo, só vai se estabilizar em 90% do PIB, em 2023. Sem o ajuste ela acumularia déficits e alcançaria 160% do PIB. Demonstrando que no mundo temporal a realidade é diferente do extratemporal. De acordo com a jornalista Miriam Leitão “o Brasil está com déficit nominal maior do que países como Espanha, Irlanda, Portugal e Grécia”. Objetivamente: naqueles países o déficit tem variação de 3% a 4% do PIB, no Brasil é de 9,6%. O despenhadeiro que jogaram o Brasil exigirá muito tempo para a sua retirada. O ajuste das contas públicas é apenas o começo. As reformas na estrutura estatal, destacadamente na previdência, na legislação trabalhista e na área tributária são imprescindíveis. As renúncias tributárias, através desonerações e isenções, de acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2017, atingiria o montante de R$ 280 bilhões. Absurdamente significa o dobro do déficit primário previsto pelo governo. Sem o enfrentamento dessas reformas, mesmo com a disciplina dos gastos públicos, o desequilíbrio fiscal estrutural estará presente na economia brasileira. Para a retomada lenta do crescimento econômico a partir de 2017, o governo não pode tergiversar no objetivo de implantar reformas básicas, nem sempre compreendidas por amplas áreas da sociedade brasileira. Exigirá coragem, determinação e consciência de saber estar construindo para o futuro, o País que o seu povo merece e tem direito. Helio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.