A Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro e sua importância no contexto luso-brasileiro 187 a cabeça, que não deveria ser pequena nem grande, nem alta nem torta... De acordo com o autor, a representação da figura humana deveria resultar numa forma idealizada, como observado nos tratados italianos, que orientavam a arte do bem retratar. No Tratado de Arquitertura & Pintura, Cirilo Volkmar Machado23 no capítulo O grande livro dos pintores ou a arte da pintura abordando a difícil arte do retrato, concordava também que a beleza se achava no antigo. Fazia algumas considerações relevantes sobre cuidados para se obter um bom resultado na obra. Na parte Retratos, livro sétimo, capítulo um dizia: o pintor não deve ter objetos que entristeçam o seu modelo; a luz de frente é mais favorável aumenta o relevo sobre o fundo escuro; o horizonte baixo é mais favorável ao retrato, etc. Quanto às vestes, dizia que não se deveria copiar dos mestres – “O manequim ensina melhor que Rafael”. O pintor de retratos deveria observar o que convém a cada um, segundo a sua cor, idade, tipo; as negras amam o branco e deveriam usar as cores claras, nunca as escuras, por exemplo. Cirilo enfatizava a importância da harmonia e das belas proporções na arte do retrato, desde a Grécia Antiga e da retratística romana, mas elogiava o artista do Renascimento, que foi mais além, dando ênfase à individualidade do modelo. Também Roger de Piles, no Curso de pintura por princípios, 170824, sobre a maneira de pintar retratos, advertia que é possível alcançar um objetivo por diferentes vias; no entanto, recomendava que o artista trabalhasse a obra em três etapas distintas: esboço; pintura, retoque. No esboço o artista deveria experimentar o desenho em diferentes poses, a menos que se tratasse de executar um desenho já pronto. Cuidar, nessa etapa, para que estivesse tudo em seu lugar, o que garantiria uma aproximação maior da realidade do modelo. Na pintura, segunda etapa, antes de empastar as áreas, dar apenas umas pinceladas leves e novamente verificar os efeitos e corrigir o desenho, se necessário. Fica clara, então, a primazia do desenho, base fundamental para a obra, princípio ditado pelos artistas do Renascimento italiano. Ao analisar o método de pintar retratos, em Van Dick, Roger de Piles observa nas suas obras o quanto são importantes as mãos, tanto no desenho quanto no emprego das cores. Do mesmo modo, não negligenciava o tratamento das roupas, sempre executadas com muito esmero: a primeira etapa partia do desenho cuidadoso, realizado pelo artista, em preto e branco sobre o fundo cinza. Depois eram trabalhadas por seus auxiliares, de acordo com as peças deixadas em seu ateliê pelos retratados, sendo revisadas, ao final, pelo artista. De Piles recomendava ainda que o pintor trabalhasse depressa, pois desse modo a obra ganha mais vida e alma, embora entenda que o ritmo impresso ao trabalho é fruto da experiência de cada um. Observava que o convívio regular com boas obras é benéfico ao artista e que os pintores, ao longo da história, traçaram caminhos diferentes, mas os princípios clássicos, freqüentemente, foram os mesmos. Esses princípios referentes à boa maneira de pintar retratos eram comuns na Europa; no entanto, não sabemos até que ponto esses fundamentos eram conhecidos 23 24 MACHADO, 2001. DE PILES, 1708: 48-62.