SíP PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA REGISTRADO(A) SOB N° ACÓRDÃO *02166579* Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n° 597.850-4/3-00, da Comarca de MARÍLIA, em que é apelante COSTA sendo apelados IRENE APARECIDA DA SILVEIRA DA JÚLIO CÉSAR SILVEIRA DA COSTA (E OUTRO): ACORDAM, em Quinta Tribunal de Justiça seguinte decisão: Câmara do Estado "DERAM de Direito de São Paulo, Privado do proferir a PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O Desembargadores julgamento OSCARLINO teve a MOELLER participação (Presidente), AZEVEDO. São Paulo, 04 de fevereiro de 2009. 6 ^ ^ J- >— SILVERIO RIBEIRO Relator dos OLDEMAR PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível n° 597.850.4/3-00 Comarca: Marília Apelante: Irene Aparecida da Silveira da Costa (conv. AJ) Apelados: Júlio César Silveira da Costa e Outro VOTO 15651 EMENTA: AÇÃO - INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA - Filho usuário de drogas - ProposHura pela genitora - Ausência de interesse para agir na modalidade adequação - Extinção do processo com fulcro no art. 267, inciso VI, do CPC - Afastamento - Admissibilidade da medida que decorre do direito à saúde, à integridade física e mental, constitucionalmente garantidos, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana - Recurso provido, para determinar o processamento da ação. Deferimento da antecipação de tutela para realização de exame psiquiátrico e conseqüente internação do requerido, providenciando a Municipalidade, sob pena de multa diária de R$ 500,00. Trata-se de ação de internação compulsória que IRENE APARECIDA DA SILVEIRA DA COSTA move contra JÚLIO CÉSAR SILVEIRA DA COSTA e PREFEITURA MUNICIPAL DE MARÍLIA, julgada extinta, sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, inciso VI, do Código de Processo Civil. O apelo da autora, com pedido de antecipação de tutela recursal, visando o reconhecimento do interesse de agir consubstanciado na 50 18 025 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO possibilidade de realizar a internação compulsória de seu filho, dependente químico e que vem causando sérios transtornos familiares, cujas despesas, ademais, devem ser pagas pela Municipalidade de Marília. Não vieram contra-razões, em face não ter sido instaurada a relação processual. É o relatório. Postula a autora a internação compulsória de seu filho Júlio César Silveira da Costa, de 24 anos de idade, sob o fundamento de ser é usuário de drogas. Alega que está descontrolado emocionalmente, desaparece durante dias sem dar notícia de seu paradeiro, além de furtar comida de sua residência para custear o vício. Aponta que ele não tem interesse em deixar de fazer uso de substância entorpecente, tomando-se avesso a qualquer tratamento, o que toma imprescindível a sua internação psiquiátrica. Aduz que não tem condições econômicas para custear o tratamento do filho, motivo pelo qual requer que seja custeado pela Municipalidade de Marília. Requer em sede de antecipação de tutela recursal a internação e tratamento psiquiátrico compulsório de Júlio César. Em que pese o entendimento da digna magistrada sentenciante, cabe ressaltar que a internação compulsória de pessoas portadoras de * <• Ap. Cível n° 597.850.4/3-00 - Marília - voto 15651 2 50 18 025 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO transtornos mentais é admitida em nosso ordenamento jurídico, nos termos do art 9o da Lei 10.216, de 6 de abril de 2001, que a conceitua como medida "determinada, de acordo com a legislação vigente, pelo juiz competente, que levará em conta as condições de segurança do estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e funcionários". Também, o Decreto n° 24.559 de 3 de julho de 1934, ainda em vigor, já admitia a internação dos toxicômanos ou intoxicados habituais por ordem judicial ou requisição de autoridade pública ou a pedido do próprio paciente ou solicitação de seu cônjuge, pai, filho ou parente até 4 o grau, ou outro interessado. Aliás, o Decreto 891, de 1938, editado pelo Governo Vargas, não revogado, prevê, no seu art. 29, que: "os toxicômanos ou os intoxicados habituais, por entorpecentes, por inebriantes em geral ou bebidas alcoólicas, são passíveis de internação obrigatória ou facultativa por tempo determinado ou não". O § 1 o do mencionado artigo dispõe que: "A internação obrigatória se dará, nos casos de toxicomania por entorpecentes ou nos outros casos, quando provada a necessidade de tratamento adequado ao enfermo, ou for conveniente à ordem pública. Essa internação se verificará mediante representação da autoridade policial ou a Ap. Cível tf 597.850.4/3-00 - Marflia - voto 15651 3 50 18 025 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO requerimento do Ministério Público, só se tornando efetiva após decisão judicial". Não se faz necessário o prévio pedido de interdição, que pode ser requerido nos moldes do art. 1767, inciso III, do Código Civil. Ou seja, a internação pode ser requerida como medida protetiva à pessoa dependente de substância entorpecente, visando o seu adequado tratamento médico, a ser imposta para salvaguardar o direito à saúde e a integridade física e mental constitucionalmente garantidos e tendo por fundamento o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1 o , inciso III, da Constituição Federal). Além disso, visa também resguardar a família e a sociedade contra qualquer ato danoso que possa ser praticado pelo dependente. De outra parte, não se faz imprescindível o esgotamento da via administrativa para que o interessado possa se socorrer do Poder Judiciário, haja vista o princípio de livre acesso à Justiça. Nesse sentido, vem se orientando a jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul: "APELAÇÃO CÍVEL. FAMÍLIA. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. TRATAMENTO PARA DROGADIÇAO. DIREITO Á SAÚDE. ART. 196 DA CONSTITUÇÃO FEDERAL. SOLIDARIEDADE DOS ENTES FEDERATIVOS QUANTO AO DEVER DE PRESTAÇÃO DE SAÚDE AOS NECESSITADOS. Ap. Cível n° S97.8S0.4/3-00 - Manila - voto 156S1 4 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO "A Carta Federal é expressa ao assegurar o direito à vida e o direito à saúde como garantias fundamentais, instituídas em norma de caráter imperativo, auto-aplicáveis, de acordo com a responsabilidade solidária dos entes federativos (art. 196 da CF/88). Assim, sendo normas asseguradoras de direitos que se sobrepõem a quaisquer outras, sob pena de colocar-se em risco a saúde e a vida do demandante" (Apelação Cível n° 70025882192, 7a Câmara Cível, rei. Des. Vasco Delia Giustina, julgado em 22.10.2008). "AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA, INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. CABIMENTO. Comprovada a necessidade de internação por dependência química e doença é de ser determinada a medida, a fim de garantir a segurança do paciente e de seus familiares. O direito à saúde de forma gratuita é garantia fundamental e dever do Estado (artigo 196 da Constituição Federal). Agravo não provido" (Agravo de Instrumento n° 70026400119, Oitava Câmara Cível, rei. Des. Alzir Felippe Schmitz, julgado em 30.9.2008). "AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. LEGITIMIDADE ATIVA DA COMPANHEIRA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO. OFENSA A PRINCÍPIOS. O pedido de internação compulsória é procedimento de jurisdição voluntária, que não tem partes, mas sim interessados. E a companheira tem legítimo interesse para postular providências que busquem a garantia da saúde e da integridade física do A- *—. Ap. Cível n° 597.850.4/3-00 - Marília - voto 15651 5 50 18 025 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO companheiro. Os entes estatais são solidariamente responsáveis pelo atendimento do direito fundamental à saúde, não havendo razão para cogitar em ilegitimidade passiva ou em obrigação exclusiva de um deles. Nem mesmo se o remédio, substância ou tratamento postulado não se encontre na respectiva lista, ou se encontre na lista de outro ente, ou tenha custo elevado. Em razão da qualidade fundamental do direito à saúde, a condenação dos entes estatais ao custeio de internação para tratamento de dependência química não representa ofensa aos princípios da separação dos poderes, do devido processo legal, da legalidade ou da reserva do possível, e não caracteriza ofensa a eventuais restrições orçamentárias" (Agravo de Instrumento n° 70026628610, 8a Câmara Cível, rei. Des. Rui Portanova, julgado em 26.9.2008). "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. TRATAMENTO PARA DROGADIÇÃO. DIREITO À SAÚDE ASSEGURADO CONSTITUCIONALMENTE. 1) Cabe ao necessitado optar pelo ente que deverá fornecer-lhe o tratamento médico de que necessita, descabendo a alegação de que a presente demanda não enseja a utilização da via judicial. A Administração Pública não pode eximir-se de obrigação que lhe é constitucionalmente outorgada para afastar do Poder Judiciário a análise dos fatos que envolvem eventual violação de direito. 2) A via judicial é adequada para postular-se tratamento contra drogadição, quando o Poder Público não disponibiliza recursos para tal. Ademais, o acesso à Justiça é Ap. Cível n° 597.850.4/3-00 - Marília - voto 15651 £ 50 18 025 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO direito constitucionalmente assegurado a todos os cidadãos (CF, art. 5o, inc. XXXV). 3) É dever do Estado assegurar a efetivação dos direitos referentes à saúde, devendo ser fornecido o tratamento médico ou o medicamento ao jovem necessitado (ECA, art. 4 o caput). Recurso provido" (Apelação cível n° 70024989147, 8a Câmara Cível, rei. Des. José Ataídes Siqueira Trindade, julgado em 3.9.2008). Este Tribunal, inclusive, já se posicionou favorável à internação compulsória de filho adotivo, que é alcoólatra e freqüentemente agredia o casal de idosos, medida ademais proposta pelo Ministério Público Estadual (Apelação Cível n° 457.686-4/2, São Carlos, 6a Câmara de Direito Privado, rei. Des. Waldemar Nogueira Filho, julgada em 4.10.2007). O julgado, ademais, ressalta a lição de Antônio Rulli Neto, no sentido de proteção ao idoso, em que pode o juiz, diante do caso concreto, adotar a medida que entender necessária à proteção da pessoa idosa, como determinado no Estatuto, que privilegiou todas as medidas que possam garantir a vida digna do idoso, independentemente do procedimento ou tipo de ação (Proteção Legal do Idoso no Brasil, Fiúza Editores, 2003, p. 320) Na hipótese, vale notar que a autora juntou documento emitido pelo serviço de saúde da Prefeitura Municipal de Marília dando conta de que o filho é "usuário de drogas: maconha, crack, cocaína e necessita de apoio multiprofissionar (fl. 18). r __ —— Ap. Cível n° 597.850.4/3-00 - Marília - voto 15651 7 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Também, o relatório médico de fl. 28 faz menção de que o usuáriopaciente não comparece aos retornos marcados, tendo dificultado o seu tratamento ambulatorial, que vem sendo feito por meio do SUS, motivo pelo qual há indicação médica para internação. Assim, tendo em conta os elementos existentes nos autos, que indicam a presença dos requisitos do art. 273 do Código de Processo Civil, defere-se o pedido de antecipação de tutela para determinar a imediata realização de exame psiquiátrico no réu Júlio César e a conseqüente internação, a ser providenciada pela Municipalidade, se houver parecer médico nesse sentido, sob pena de multa diária de R$ 500,00. Conseqüentemente, dá-se provimento ao recurso para, anulada a sentença extintiva do feito, determinar o processamento da ação nos seus ulteriores termos, citando-se o requerido e a Municipalidade, deferida a antecipação de tutela recursal. Em face do exposto, ao reclamo é dado provimento. SILVÉRIO RIBEIRO Relator Ap. Cível n" 597.850.4/3-00 - Marília - voto 15651 50 18 025