Poder Judiciário JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Paraná 1ª TURMA RECURSAL – JUÍZO C JUIZADO ESPECIAL (PROCESSO ELETRÔNICO) Nº200970510140226/PR RELATORA : JUÍZA MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA RECORRENTES : UNIÃO FEDERAL, GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ E OLIVIO DAVANSO RECORRIDOS : OS MESMOS VOTO Trata-se de recursos interpostos contra sentença que julgou procedente pedido da parte autora para garantir o fornecimento de três aplicações do medicamento Ranibizumab (Lucentis), na dosagem indicada pelo médico que acompanha o seu tratamento, bem como, considerando o fornecimento suficiente em razão da antecipação de tutela, declarar que não são devidas novas doses do medicamento. O Estado do Paraná recorre alegando que o medicamento não está contemplado no rol dos medicamentos essenciais e que a pretensão do autor deve ser indeferida, uma vez que fere os princípios constitucionais da reserva do possível e do acesso universal às ações e serviços da saúde. A União pede a reforma da sentença, alegando sua ilegitimidade passiva e, consequentemente, a falta de interesse de agir da parte autora. No mérito, refuta sua responsabilidade pelo fornecimento do medicamento. O autor recorre para que se mantenha a concessão do medicamento prescrito, pelo prazo de tempo necessário ao tratamento. É o relatório. No que se refere aos recursos da União e do Estado do Paraná, mantenho a sentença por seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/1995, aplicável subsidiariamente aos Juizados Especiais Federais. Ressalto apenas, no que diz respeito à ilegitimidade suscitada pela União, que é entendimento desta 1ª Turma Recursal que se trata de responsabilidade solidária dos entes federados em fornecer medicamentos necessários ao tratamento de saúde das pessoas que não têm condições para adquiri-los. Nesse sentido, colaciono a seguinte ementa: 200970510140226 [GML©/GML] *200970510140226 200970510140226* 200970510140226 1/4 Poder Judiciário JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Paraná 1ª TURMA RECURSAL – JUÍZO C ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ENTES POLÍTICOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. EXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. 1. A União, Estados-Membros e Municípios têm legitimidade passiva e responsabilidade solidária nas causas que versam sobre fornecimento de medicamentos. 2. Tratando-se de litisconsórcio necessário, não pode a parte litigar somente contra um dos litisconsortes. 3. Sentença anulada para que o feito prossiga contra os três entes federados. (Juizado Especial, Processo Eletrônico Nº 200870590058126/PR, Relatora: Juíza Márcia Vogel Vidal De Oliveira, Sessão de 02/09/2010). Quanto ao recurso do autor, assiste-lhe razão. O autor é portador de hemorragia macular com baixa acuidade visual relacionada à idade (DMRI) e o medicamento referido foi indicado por seu médico oftalmologista para o tratamento da patologia. Tal medicamento tem alto custo (R$ 4.702,42 por aplicação) e ele não dispõe de recursos financeiros para adquiri-lo, já que sua renda provém de benefício previdenciário de valor mínimo. Veja-se, a respeito, o que diz a sentença: O laudo pericial (evento nº 21) deixa claro que o medicamento Ranibizumab (Lucentis) “melhora de forma significativa a acuidade visual e evita a perda progressiva da visão, inibindo a formação de vasos sanguíneos e conseqüentemente de fibroses e cicatrizes intraoculares” e que “atualmente a terapia angiogênica intravítrea é a terapêutica primária para degeneração macular relacionada à idade”. O tratamento adequado para o quadro clínico do autor consiste na utilização do medicamento Ranibizumab (Lucentis), na dosagem recomendada pelo médico que acompanha o tratamento, não sendo possível substituí-lo pelo Avastin ou pelo Macugem, conforme se infere das respostas dadas aos seguintes quesitos do Juízo: “8. Considerando o quadro do(a) paciente examinado(a), o tratamento com esse medicamentos é recomendado ou até mesmo necessário? Resposta: Sim, é recomendado e se trata de primeira linha de tratamento. 9. Em caso positivo, qual é a dose recomendada para o(a) paciente examinado(a)? 200970510140226 [GML©/GML] *200970510140226 200970510140226* 200970510140226 2/4 Poder Judiciário JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Paraná 1ª TURMA RECURSAL – JUÍZO C Resposta: A dose recomendada é a mesma solicitada pelo seu medico de 0,5mg. 11. Existem medicamentos alternativos aos indicados no item ‘6’ e com a mesma eficácia? Resposta: No caso do autor não, primeiro o mesmo deve ser tratado com a medicação indicada e caso a mesma não apresente resultado satisfatório poderá utilizar outros medicamentos ou cirurgia” (sublinhei). Cumpre destacar, ainda, que o medicamento Ranibizumab não é experimental e está registrado na ANVISA desde 2006. Assim, não se cuida da hipótese de fornecimento de medicamento sem comprovação científica de sua eficácia, mas sim de garantir que o autor tenha acesso ao tratamento adequado (considerado de primeira linha pelo perito) para o combate da degeneração macular relacionada à idade, doença que poderá causar perda visual rápida do olho esquerdo. Com se vê, a sentença reconheceu, com base no laudo pericial, a importância do fornecimento do medicamento pleiteado, e que não existem outros fármacos que apresentem resultado satisfatório como o fornecido. No caso, portanto, limitar o fornecimento do medicamento ao total considerado suficiente em razão da antecipação da tutela concedida, entendo que esvazia o conteúdo das garantias previstas na Constituição Federal. Nesse sentido, destaco a seguinte ementa: ADMINISTRATIVO - MOLÉSTIA GRAVE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTO - DIREITO À VIDA E À SAÚDE DEVER DO ESTADO - MATÉRIA FÁTICA DEPENDENTE DE PROVA. 1. Esta Corte tem reconhecido aos portadores de moléstias graves, sem disponibilidade financeira para custear o seu tratamento, o direito de receber gratuitamente do Estado os medicamentos de comprovada necessidade. Precedentes. 2. O direito à percepção de tais medicamentos decorre de garantias previstas na Constituição Federal, que vela pelo direito à vida (art. 5º, caput) e à saúde (art. 6º), competindo à União, Estados, Distrito Federal e Municípios o seu cuidado (art. 23, II), bem como a organização da seguridade social, garantindo a "universalidade da cobertura e do atendimento" (art. 194, parágrafo único, I). 3. A Carta Magna também dispõe que "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que 200970510140226 [GML©/GML] *200970510140226 200970510140226* 200970510140226 3/4 Poder Judiciário JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Paraná 1ª TURMA RECURSAL – JUÍZO C visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" (art. 196), sendo que o "atendimento integral" é uma diretriz constitucional das ações e serviços públicos de saúde (art. 198). (...) (RMS 28.338/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/06/2009, DJe 17/06/2009). Feitas essas considerações, portanto, dou parcial provimento ao recurso do autor para condenar os réus a lhe garantirem o fornecimento do medicamento prescrito e a continuidade do tratamento que vem desenvolvendo, mediante as aplicações do medicamento Ranibizumab (Lucentis), na dosagem indicada pelo médico que acompanha o seu tratamento e enquanto perdurar a necessidade da medicação. Justifica-se o provimento parcial do autor, todavia, uma vez que, considerando a competência dos Juizados Especiais Federais ser limitada ao valor máximo de 60 (sessenta salários mínimos), o valor do tratamento indicado também não poderá ser superior a esse valor, sob pena de usurpação de competência. Dessa forma, a condenação dos réus fica limitada ao valor máximo de tratamento, o qual, consigne-se, não pode ultrapassar o valor de alçada dos Juizados Especiais Federais, até porque, no caso, houve renúncia expressa ao excedente (evento 1, TERMREN5). Condeno os recorrentes vencidos (UNIÃO E ESTADO DO PARANÁ) ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, os quais deverão ser rateados pelos réus. Ante o exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO AOS RECURSOS DOS RÉUS E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO AUTOR. Márcia Vogel Vidal de Oliveira Juíza Federal Relatora 200970510140226 [GML©/GML] *200970510140226 200970510140226* 200970510140226 4/4