ANÁLISE COMPARATIVA DA CORRESPONDÊNCIA ENTRE COMER E RELATAR DE CRIANÇAS E ADULTOS* MAKERLEY FERREIRA**, SÔNIA MARIA MELLO NEVES***, LORISMÁRIO ERNESTO SIMONASSI****, MARISE ANDRADE*****, DORALICE OLIVEIRA PIRES DIAS****** Resumo: investigou-se o efeito do reforçamento das verbalizações relativas ao comportamento de comer e sua correspondência ou não com o comer em quatro crianças obesas e quatro com IMC normal ou abaixo da média e, quatro adultos acima do peso e quatro com IMC normal. Observou-se correspondência entre o comer e o relatar em crianças e adultos obesos e não obesos. Palavras-chave: Obesidade. Comportamento Verbal. Auto-relato. Correspondência. E studos empregando diferentes técnicas de inquérito alimentar indicam a subestimação nos relatos de consumo, tanto em homens quanto em mulheres adultas; a subestimação é encontrada especialmente entre indivíduos obesos e, principalmente, entre mulheres (DRUMMOND,1998). O comportamento verbal, segundo Skinner (1957), é um comportamento operante, sendo este desenvolvido e mantido por reforçamento mediado por outros. Um exemplo é o comportamento verbal de relatar. O relato é um comportamento emitido por um falante que está sob controle de estímulos discriminativos públicos ou privados. O comportamento de comer também é um operante, neste caso um operante não verbal. O comer dentro ou fora dos limites necessários fisiologicamente é um comportamento * Recebido em: 02.09.2014. Aprovado em: 22.09.2014. ** Mestranda em Psicologia no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia (PSSP). E-mail: [email protected]. *** Doutora em Psicologia. Professora Titular do Departamento de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás). E-mail: [email protected]. **** Doutor em Psicologia. Professor no Departamento de Psicologia. Pontifícia Universidade Católica de Goiás. E-mail: [email protected]. ***** Graduada em Psicologia. E-mail: perita.marise@hotmail. ****** Mestre em Psicologia pela PUC Goiás. E-mail: [email protected]. FRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 24, especial, p. 61-72, out. 2014. 61 mantido e/ou modificado pelos antecedentes e pelas consequências (BOUTON, 2011). Através do comportamento de relatar, torna-se possível que o individuo desenvolva habilidade de descrever o que fez (fazer – dizer), que segundo Ribeiro (1989) indica auto-conhecimento e para ele auto-controle é a habilidade de predizer o que se vai fazer. Beckert (2002) propõe o autocontrole e o autoconhecimento como interligados. A correspondência entre comportamento verbal e não verbal consiste na ocorrência de dois tipos de comportamento, ou seja, se há correspondência entre o que a pessoa diz e o que ela faz, dizer – fazer, e o que faz e relata, fazer– dizer (HERRUZO; LUCIANO, 1994). Segundo Ribeiro (1989), uma importante forma de correspondência se dá entre o comportamento da pessoa e seu próprio relato, e existem poucos trabalhos realizados sobre correspondência entre comportamento e relato verbal, principalmente entre crianças (PANIAGUA, 1989). É relevante o estudo de correspondência entre dizer-fazer e fazer-dizer visto que, segundo Herruzo e Luciano (1994), esses termos exercem influências mútuas. Essa influência pode ocorrer na forma de alteração de comportamento, podendo tanto o comportamento verbal acarretar alterações no comportamento não verbal quanto o contrário (BAPTISTUSSI, 2010). Relativo ao comportamento de se alimentar em crianças, Loovas (1964) observou que manipulando-se o comportamento verbal, controlou-se a ingestão dos alimentos das mesmas. Os estudos de Ribeiro (1989) foram replicados por Dias (2008) em crianças com índice de massa corporal (IMC) acima do peso ideal para a idade das mesmas. No lugar de brinquedos foram usados alimentos, para se observar as contingências e os comportamentos relacionados com o comer e identificar o efeito do reforçamento das verbalizações relativas ao comportamento de comer. De forma genérica os resultados do estudo de Dias (2008) mostram que as variáveis manipuladas não provocaram mudanças significativas nos relatos correspondentes dos participantes, sendo que as manipulações das consequências não indicaram efeitos significativos nas interações entre o comportamento verbal e não verbal. Os grupos mantiveram o padrão de comportamento de relatar constante nas diferentes fases do experimento, ou seja, demonstraram correspondência entre o comportamento verbal e o não verbal. Esses resultados conflituam com os de Ribeiro (1989). Como objetivo geral, o presente estudo foi, assim como o de Dias (2008), (a) identificar o efeito da consequenciação das verbalizações relativas ao comportamento de comer, sendo esta a variável manipulada e a observação da possível correspondência ou não com o comportamento não verbal de comer em crianças, e (b) além disso visou comparar os resultados com os de adultos com IMC acima do ideal. Considerando as diferentes manipulações do uso do reforçamento, este estudo buscou identificar: 1) O efeito do reforçamento não contingente a verbalização nem ao comportamento de comer em crianças e adultos com IMC acima ou IMC abaixo ou adequado para a idade. Assim, a VI era o relato afirmativo da ingestão sendo a pergunta realizada individualmente e as VDs, eram a acurácia ou não do comportamento verbal e não verbal e o consumo; 2) O efeito do reforçamento das verbalizações afirmativas relacionadas com o comportamento de comer independentemente da correspondência com o comportamento não verbal de comer, em crianças e adultos com IMC acima ou TMC abaixo ou adequado para idade, sendo esse relato obtido individualmente, em grupo homogêneo e heterogêneo. 62 FRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 24, especial, p. 61-72, out. 2014. 3) O efeito do reforçamento da correspondência entre o comportamento de comer e relatar em crianças e adultos com IMC acima ou IMC abaixo ou adequado para idade, sendo esse comportamento observado individualmente e em grupo homogêneo e heterogêneo. Um outro objetivo foi ajustar à metodologia utilizada por Ribeiro (1989), na qual os participantes foram expostos a seis tipos de estímulos (alimentos) e podiam comer apenas três dos alimentos. Com isso buscou-se observar se as diferenças encontradas entre os trabalhos de Dias (2008) e Ribeiro (1989) se deram devido à alterações metodológicas. Para tornar mais claros os efeitos das variáveis manipuladas foi aumentado, comparativamente ao estudo de Dias (2008) o número de sessões em cada condição experimental. Também foram acrescidas duas novas condições experimentais: Reforço de correspondência individual e Reforço em grupo homogêneo, com o objetivo de que as condições experimentais atendam a todas as condições experimentais propostas de maneira igualitária. MÉTODO Participantes Os participantes foram oito crianças de ambos os sexos, com idades de dez e onze anos, sendo quatro crianças com peso adequado ou abaixo da média para sua idade (percentil entre 0,3 e 25,1) e quatro obesas (percentil entre 96,7 e 98,1). Também participaram adultos de ambos os sexos, com idades variando entre dezoito e cinqüenta anos, sendo quatro com peso adequado para sua idade (Índice de Massa Corpórea – IMC- entre 20, 5 e 25, 6) e quatro com peso acima da média para sua idade (IMC entre 27, 7 à 38, 7). Crianças e adultos com peso normal ou abaixo da média pertenceram ao grupo de não obesos e os participantes com sobrepeso ou obesidade ao grupo de obesos Material As sessões aconteceram nas salas de uma escola estadual. Foi utilizada uma filmadora, uma folha de registro do consumo de alimentos de cada participante e de seu relato verbal em cada fase experimental. Na sala de alimentação, havia cinco mesas de 60x70 centímetros, que foram agrupadas para colocar os alimentos. A filmadora foi alocada filmadora nessa sala e ficava pouco exposta para dificultar a visão pelos participantes. Na sala de relatar, havia seis cadeiras e uma mesa para auxiliar o experimentador no momento de anotar as informações dos relatos dos participantes. Foi colocado à disposição dos participantes seis categorias de alimentos: laticínios (leite, iogurte queijo), doces (bombom, doce de leite e cocada), salgados (pizza, coxinha e pastel), frutas (maçã, laranja e mamão), bebidas (coca-cola, suco de laranja e água) e secos (batinha, Skinny e bolacha). Sendo assim, a cada sessão eram dispostos seis alimentos, cada um de uma categoria para que a criança pudesse comer. Eram colocadas na frente de cada alimento uma ficha com o nome do alimento. Foi utilizado, também, uma balança, fita métrica, tripé, lápis, papel, fichas redondas e coloridas e os alimentos, que eram dispostos em copos e pratos descartáveis. FRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 24, especial, p. 61-72, out. 2014. 63 Procedimento Este estudo foi iniciado após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob código 0023.0.168.000-08. As sessões foram realizadas em média três vezes por semana, eram conduzidas pelo experimentador que registrava os alimentos consumidos em uma ficha. Consistiam em dois períodos, o de alimentar e o de relatar. No primeiro período, o de alimentar, os participantes eram trazidos pelo experimentador das salas de aula para a sala onde os alimentos eram colocados sobre as oito mesas (colocadas juntas) de fácil acesso para os participantes. A instrução oferecida para as crianças e adultos foi: “Você poderá comer o que quiser e poderá sair quando quiser, ou até eu dizer que o tempo acabou e te chamar”. O período de comer terminava, quando a criança/adulto ingeria o terceiro alimento e o experimentador interrompia o período de comer dizendo: “o seu tempo acabou, por favor pare de comer e você pode sair da sala”, ou quando a criança/adulto saia da sala antes de comer o terceiro alimento. Foi recomendado aos participantes que ficassem privados de alimentos por duas horas, ou seja, ao chegarem à escola, não comessem nada até o momento do experimento. Contudo, não há garantias de que eles seguiram esta regra. Logo que o participante entrava na sala onde estavam dispostos os alimentos e a filmadora, o experimentador ficava atrás de uma estante na mesma sala, onde estava o notebook conectado a câmera e observava o que a criança/adulto comia. Quando o terceiro alimento era ingerido o experimentador encerrava o período de comer. No período de relatar, era solicitado ao participante que fosse para o fim do corredor onde era solicitado que relatasse sozinho ou acompanhado, de acordo com a fase do experimento. O experimentador perguntava aos participantes se comeu cada alimento. A liberação dos reforços era modificada de acordo com as fases experimentais. Fichas foram entregues de acordo com as contingências estabelecidas em cada fase do experimento. Cada ficha tinha valor equivalente a R$: 0,10 e os participantes poderiam trocar o valor que tinha por, no caso dos adultos, dinheiro e no caso de crianças um brinde (brinquedos). Como tinham brindes de diferentes valores eles poderiam optar por acumular fichas e “comprar’ brinquedos superiores, com maior valor. Também foram utilizados reforços sociais (i.e, balanço de cabeça, “muito bem”, “ótimo” “isto mesmo”, “muito bom”, etc.). As fases experimentais são descritas a seguir: Fase 1 – Linha de Base I A Linha de Base I teve como objetivo o registro do comportamento de comer e relatar dos participantes antes da introdução das variáveis do estudo. Foram realizadas seis sessões iniciais, de Linha de Base. Os participantes recebiam a instrução descrita acima, dada na sala de alimentação, e, após o término do período de comer, o participante era conduzido ao fim do corredor, para o período de relatar. Assim que o participante chegava ao fim do corredor, era convidado a sentar e o experimentador perguntava se ele tinha comido os alimentos da lista um por um. O experimentador ouvia os relatos e não comentava nenhuma das respostas dos participantes. O participante recebia as fichas de modo não contingente ao tipo de relato, 64 FRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 24, especial, p. 61-72, out. 2014. e as trocava por brindes ou dinheiro. Ao final de cada sessão, o experimentador agradecia a participação. Fase 2 – Reforço individual do relato de comer Após a Linha de Base I, começaram as fases de Reforço individual do relato de comer. Esta fase foi composta de quatro sessões e a consequenciação com fichas foi contingente ao relato de comer. Os participantes novamente comiam e depois relatavam, porém só recebiam a ficha quando relatassem que comeram, ou seja, independentemente do que tivessem comido no período de alimentar, só era oferecida a ficha se dissessem que comeu o alimento. Os relatos negativos não recebiam conseqüências de aprovação nem de ficha. Fase 3 – Reforço de relato de comer em grupo heterogêneo Esta fase do experimento era composta de quatro sessões idênticas à fase anterior, com exceção de que os relatos eram realizados em grupos de participantes. Nessa fase, cada sessão de relato era realizada em dois grupos, cada subgrupo com quatro participantes sendo composto por indivíduos com IMC adequado e com IMC inadequado para sua idade. Cada participante entrava individualmente para comer, e após o período de comer saia da sala e esperava no final do corredor até que os quatro participantes do grupo terminassem o período de comer para então relatarem. Foram colocadas quatro cadeiras no final do corredor, o experimentador sentava de um lado da mesa e as crianças do outro lado da mesa, de modo que todas as crianças formavam um semicírculo do lado aposto da mesa em que o experimentador estava. Então, os participantes eram entrevistados da esquerda para a direita e recebiam as fichas e conseqüências de aprovação verbal. Fase 4 – Reforço de relato de comer em grupo homogêneo Essa fase teve o mesmo delineamento da fase anterior, mas o grupo formado para o momento do relato era homogêneo, ou seja, quatro participantes com IMC adequado ou abaixo do peso formavam um grupo e quatro com IMC acima da média outro grupo. Fase 5 – Reforço de correspondência Individual Nesta fase, o relato era realizado individualmente. As consequências eram oferecidas se o relato fosse contingente ao comer. Cada relato correspondente de comer ou não comer produziria aprovação e uma ficha, ou seja, se o participante tivesse comido a maçã e relatasse que comeu a maçã, receberia uma ficha; ou, se não tivesse comido a maçã e relatasse que não comeu, também receberia uma ficha. Nessas duas situações, o comportamento do participante seria classificado como correspondente, de modo que ganharia o reforço. No entanto, os relatos não correspondentes não eram conseqüenciados com fichas nem aprovação. Se o participante tivesse comido a maçã e relatasse que não comeu, ou não tivesse comido a maçã e relatasse que comeu. FRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 24, especial, p. 61-72, out. 2014. 65 Esta condição era a única em que o experimentador que entrevistava o participante sabia quais alimentos ela havia comido, de acordo com a transcrição das fichas de registro. Exceto pela modificação na contingência de reforço, os demais arranjos experimentais foram os mesmos da fase anterior. Fase 6 – Reforço de correspondência em grupo homogêneo Essa fase teve o mesmo delineamento da fase anterior, mas o grupo formado para o momento do relato era homogêneo. Fase 7 – Reforço de correspondência em grupo heterogêneo Essa fase também teve o mesmo delineamento da fase anterior, mas o grupo formado para o momento do relato era heterogêneo. Fase 8 – Linha de Base II O procedimento realizado nesta fase final era idêntico à linha de base inicial, em que qualquer resposta do participante, correspondente ou não correspondente, não influenciava no número de fichas. O participante recebia as fichas de modo não contingente ao tipo de relato, e as trocava por brindes ou dinheiro. RESULTADOS Análise das correspondências por grupos: Grupo A - Crianças não obesas (PC 1 ao 4) Na Figura 1 podemos observar que o PC 1 apresentou três relatos de não correspondência nas fases de relatar em grupo (Reforço de Comer em grupo heterogêneo e grupo homogêneo) e o PC 2 apresentou uma resposta não correspondente também na fase de relatar em grupo (Reforço de Comer em grupo homogêneo). As demais respostas destes participantes foram de total correspondência. As respostas de não correspondência aparecem de duas formas no participante PC1 que por duas vezes comeu e não relatou que comeu, e por uma vez não comeu e relatou que havia comido. O participante PC 2 não correspondeu apenas uma vez, comendo e relatando que não havia comido. (Figura 1) Nos participantes PC 3 e PC 4, em todas as sessões de todas as fases que ocorreu total correspondência entre comer e relatar, demonstrando assim que não houve efeito das variáveis manipuladas. (Figura 1) 66 FRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 24, especial, p. 61-72, out. 2014. Figura 1: Relatos correspondentes e não correspondentes das crianças do Grupo A (não obesas) e do Grupo B (obesas) por sessão Nota: Quadrados brancos indicam o relatar correspondente ou não, quadrados cinza indicam o comer e quadrados negros indicam a não correspondência. Grupo B - Crianças obesas (PC 5 ao 8) Na Figura 1, podemos também observar que os PC 5, 6, 7 apresentaram nove relatos de não correspondência, dentre eles sete aconteceram em grupo: Reforço de Comer em grupo Heterogêneo e Homogêneo e Reforço de Correspondência em Grupo. O PC 8 foi o único participante do grupo que apresentou total correspondência entre comer e relatar em todas as fases. Análise Comparativa do Comportamento de Crianças Obesas e Não Obesas Observa-se que entre os grupos de crianças obesas e não obesas encontramos não correspondência e correspondência entre o comer e relatar nos dois grupos. No grupo de crianças obesas encontramos um número maior de participantes que emitiram respostas não correspondentes. A análise estatística descritiva demonstrou que o Grupo A apresentou maior correspondência na fase 7 de Reforço de Correspondência em Grupo Heterogêneo com média 3,81 de relatos correspondentes e desvio padrão de 1. A fase de menor correspondência foi a Linha de Base I com média 3,04 de relatos correspondentes e desvio padrão de 0,5. No Grupo B observa-se que a fase de maior correspondência foi a Linha de Base II com média 4 e desvio padrão de 0,7 e a de menor correspondência foi a Linha de Base I. O grupo B apresentou na média de correspondência maior que o grupo A. FRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 24, especial, p. 61-72, out. 2014. 67 Nos grupos A e B foram observadas respostas não correspondentes por superestimação, do total de 13 não correspondências 8 foram por superestimação, ou seja, não comer e relatar ter comido determinado alimento. Grupo C - Adultos não obesos (PC 1 ao 4) Pode-se observar na Figura 2 que em todos os participantes não obesos encontramos total correspondência entre comer e relatar, não apresentando assim efeito das variáveis manipuladas nas fases experimentais. Figura 2: Relatos correspondentes e não correspondentes dos adultos obesos e não obesas por sessão Nota: Quadrados brancos indicam o relatar, quadrados cinza indicam o comer e quadrados negros indicam a não correspondência. Grupo D - Adultos obesos (PC 5 ao 8) Na Figura 2, observa-se que o PA 5 apresenta seis não correspondências nas Fases 1, 2, 3, 4, 6 e 7, já o PA 6 apresenta quatro não correspondências somente nas fases de relato de grupo Fase 3, 4, 5 e 6.Pode-se observar que o a não correspondência dos dois participantes ocorrem por comer e não relatar, e não o contrário, não comer e relatar. Os PA 7 e PA 8 apresentam total correspondência entre o comer e relatar. Análise Comparativa do Comportamento de Adultos Obesos e Não Obesos Os resultados mostram, na comparação entre os grupos de adultos, que somente no grupo de adultos obesos encontramos a não correspondência. 68 FRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 24, especial, p. 61-72, out. 2014. O Grupo C teve maior correspondência na Fase 5 (Reforço de correspondência Individual) com média 3,3 e desvio padrão de 0,6. No grupo Da Fase 8 (Linha de Base II) foi a de maior correspondência com média de 3,3 e desvio padrão de 0,5. No grupo C observou-se maior correspondência mais que o grupo D . Análise comparativa de correspondência do comportamento entre crianças e adultos O grupo de crianças apresentou um numero maior de participantes que apresentaram não correspondência (PC 1, 2, 5 e 6) em relação aos adultos (PA 5 e 6). A não correspondência nas crianças aparece tanto no grupo de obesos quanto no de não obesos, mas nos adultos aparece somente no grupo de obesos. Todas as não correspondências dos adultos foram por subestimação do comportamento de comer, isto é, comer e relatar que não comeu determinado alimento. Em contrapartida as não correspondências das crianças foram tanto por superestimação quanto por subestimação, sendo maior o numero de não correspondência por superestimação principalmente no grupo de crianças obesas. Nas fases experimentais, quanto à média de correspondências, tanto as crianças quanto os adultos apresentaram maior média de correspondência na Fase 5 – Reforço de correspondência Individual: Média dos Grupos A (3,5) B (3,8) C (3,3) D (3,1). CONCLUSÃO O presente trabalho abordou a questão da correspondência no autorrelato de crianças e adultos e, de acordo com os resultados apresentados, observou-se que em geral as variáveis manipuladas não provocaram mudanças nos relatos tanto dos participantes adultos, quanto nos das crianças obesas e não obesas. Observou-se no presente estudo correspondência em todos os participantes, tanto no grupo de crianças quanto no grupo de adultos. A correspondência entre dizer e fazer também foi encontrada nos estudos de Ribeiro (1989) e Dias (2008) que demonstram a acurácia do repertorio de auto-tatear sob as variáveis manipuladas nas crianças. No estudo de Ribeiro (1989), as crianças apresentaram altos índices de correspondência na LB1, porém os relatos foram modificando sua função de tato para mando, levando a não correspondência. Isso pode ser observado no presente estudo em que os PC 1, 2, 5 e 7 apresentaram uma média de 9,4 respostas de correspondência e depois apresentaram resposta de não correspondência de não comer e relatar que comeu (superestimação). Pode-se sugerir que a consequência tenha influenciado esse tipo de comportamento visto que das oito respostas de não correspondência por superestimação sete aconteceram nas fases de reforçamento do comer, ou seja, o comportamento deixa de exercer a função de tatear e passa a exercer a função de mando. Nas pesquisas realizadas por Drummond (1998) observou-se que há subestimação nos relatos de consumo de adultos. No presente estudo, podemos observar que os participantes adultos que não corresponderam totalmente (PA 5 e 6) comiam e relatavam que não haviam comido algum dos alimentos, ou seja, subestimavam, corroborando assim os dados obtidos por Drummond (1998). Uma outra variável que possivelmente explica a superestimação do comer no relato em grupo observado no responder das crianças na fase de reforço do comer deve-se a competiFRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 24, especial, p. 61-72, out. 2014. 69 tividade detectada no grupo através de relatos sobre o número de fichas que cada um ganhava nessas condições. Somente uma das respostas de não correspondência do tipo superestimação, nas crianças, não ocorreu nesta fase. Outras contingências envolvendo o comportamento de dizer a verdade ou mentir, como o controle de contingências éticas, regras e aprendizado social, o que pode ter algum significado para a correspondência de mais participantes adultos do que crianças, podem ter influenciado no presente estudo. Observou-se que as últimas as Fases C e D apresentaram maior média de correspondência o que pode ter envolvido efeito cumulativo das variáveis investigadas. Em relação a não correspondência pode-se observar que esta ocorreu principalmente nas fases de relato em grupo tanto em adultos quanto em crianças. Observamos um total de 14 não correspondências no responder das crianças sendo que 12 destas ocorreram nas fases de relato em grupo e no caso dos adultos foram detectadas 10 não correspondências sendo que 8 destas também ocorreram nas fases de relatos em grupo. As respostas não correspondentes tanto nos adultos quanto nas crianças não diferiram quanto ao fato do grupo ser homogêneo ou não. No entanto, quando comparamos o responder dos participantes dos grupos de obesos e não obesos observamos que somente foi detectada não correspondência nos adultos (PA 5 e 6) e nas crianças obesas. No entanto, no caso das crianças obteve-se não correspondência em duas das quatro crianças não obesas também. Ribeiro (1989) argumenta sobre a possibilidade dos relatos sem correspondência durante o relato em grupo serem devido ao contexto do grupo em si (controle social), ou pelo aumento do tempo entre comer e relatar já que na situação de grupo o intervalo é maior por se esperar que todas as crianças do grupo comam para que depois relatem. Mas em seguida descarta essa possibilidade por observar que a fase Reforço da Correspondência em grupo mantinha o contexto do grupo e o intervalo mas não apresentou não correspondências. Os dados deste estudo mostram que houve não correspondência nas fases de Reforço da Correspondência em grupo (homogêneo e heterogêneo) em adultos e crianças. O número de não correspondências obtidos nesta fase, nas respostas das crianças, foi bem menor (3 não correspondências) do que na fase de reforço do relato de comer em grupo (9 relatos de não correspondência). Já nos adultos não observamos esta diferença. Estes dados sugerem que o responder com correspondência em crianças é mais sensível ao contexto de relatar em grupo, conforme sugerido por Ribeiro (1989) do que o responder de adultos. Apesar de ajustada a metodologia, no presente estudo, dada a instrução após ingerir o terceiro alimento para que os adultos e as crianças parassem de comer, observou-se que todas as crianças obesas e não obesas e todos adultos obesos continuaram a comer após a instrução de parar. Já com participantes adultos não obesos, isso aconteceu somente com os participantes PA2 e PA4. Observou-se, também, que as crianças não obesas comeram 84 alimentos a mais que o permitido, e as crianças obesas comeram 56 alimentos a mais após a instrução de que parassem de comer. Assim sendo, parece que o controle instrucional em situação de ingestão de alimento é superado pela consequência natural da ingestão, isto é, pelos reforçadores naturais (HORCONES, C. L., 1992). Os dados obtidos neste estudo corroboram principalmente os de Ribeiro (1989) onde foi observado altos índices de correspondências, mas foram observadas também não correspondências, na fase de reforço do brincar em crianças em grupo. E, como no estudo de Ribeiro (1989), também pudemos observar nas crianças a alteração da função do comporta70 FRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 24, especial, p. 61-72, out. 2014. mento verbal, onde tatos tornam-se mandos devido às contingências reforçadoras instaladas, o que não foi encontrado no estudo de Dias (2008). O delineamento de limitar a 3 alimentos foi pertinente por permitir a melhor observação, tanto da correspondência quanto da não correspondência; vemos o efeito dessa variável no aparecimento de mais respostas não correspondentes se comparado ao estudo de Dias (2008). Existe na literatura de correspondência uma variedade muito grande de experimentos para estudo de correspondência conforme apontado por Herruzo e Luciano (1994). Neste estudo e em todos citados por Herruzo e Luciano (1994) além das diferenças dos procedimentos, também se encontra variabilidade no fazer-dizer – dizer-fazer, praticamente com todos os procedimentos. Somente Pereira Pinto (2005) zera a variabilidade quando as contingencias programadas foram entre as classes de operantes. O procedimento especificava que reforços só ocorriam se uma classe de respostas, o fazer ou o dizer, fosse contingenciada por outra classe, e aí sim os reforços, em forma de pontos, eram liberados. O procedimento de Pereira Pinto (2005) foi um arranjo simples baseado no Princípio de Premack (GEIGER, 1996; HOLSTEIN; PREMACK, 1965). Em relação ao presente experimento as fases de Reforço de Correspondência foram reforçadas a correspondência do comportamento de comer, independentemente da outra classe (falar). Sugere-se que este estudo seja replicado com dependência funcional entre classes de operantes. Devido aos resultados importantes da fase de grupos recomenda-se melhora no delineamento dessas a fim de observar melhor as contingências envolvidas nos relatos de grupo. Um delineamento preciso para o controle alimentar com o objetivo dos participantes poderem comer exatamente três alimentos, também é sugerido, igualando assim as chances de corresponder com não corresponder. COMPARATIVE ANALYSIS OF CORRESPONDENCE BETWEEN EATING AND A REPORTING OF CHILDREN AND ADULTS Abstract: this study investigate the effects of reinforcement on verbal reports of eating behavior and its correspondence or not to eating of four obese children and four with normal BMI or underweighed and of four overweighed or obese adults and four with normal BMI. Results showed correspondence between eating and verbal reports both in obese and non obese children and adults. Keywords: Obesity. Verbal Behavior. Self-report. Correspondence. Referências BAPTISTUSSI, M. C. 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