A Recente Crise Econômica do Brasil - CORECON-GO

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A Recente Crise Econômica do Brasil
José Luiz Miranda1
Ao se analisar uma crise qualquer que seja a sua forma de manifestação (econômica,
política, social, entre outras) há uma tendência natural das pessoas em focar mais nas suas
causas imediatas ou de curto prazo e menos nas suas causas subjacentes ou de longo prazo,
isto independentemente se a sua origem se situa no plano interno ou no plano externo. Na
verdade todos esses elementos combinados com maior ou menor participação possuem forte
influência na alimentação daquilo que é denominado de crise que, de forma adjacente, pode a ser
alimentada por fatores de ordem política.
Esse fenômeno desconfortante é resultado de um processo que gradativamente vai
incorporando intervenções que, na nossa cultura, prezam por um resultado imediato e sem
avaliação dos seus reflexos futuros em termos de sustentabilidade e eficiência. Em grande parte
a crise que o nosso país ora vivencia é resultado de intervenções impregnadas de conceitos
ideológicos com forte conteúdo populista, algumas delas criando benefícios ilusórios, porém não
se alinhando com as expectativas de uma sociedade contemporânea que se encontra sujeita ao
seu próprio processo dialético.
Ressalta-se que partir do final da década de 1980, com o advento da internet, do
aprimoramento da tecnologia da informação e a presença marcante dos meios de comunicação, a
sociedade passou a ter uma nova configuração em que seus anseios políticos, econômicos e
culturais não mais se limitam a um espaço territorial. Isto tem sido objeto de abordagem em por
pesquisas relacionadas a variadas áreas do conhecimento.
O conceito de que o governo deve atuar de forma assistencialista para gerar bem estar para
uma sociedade sem resolver questões estruturais tem permeado a história de diversos países,
notadamente os latinos americanos. Sob essa ótica uma parcela significativa da sociedade é vista
como passiva, com pouca iniciativa para buscar melhores condições de vida e de subsistência
tornando-se dependente do governo e fonte garantida de votos para preservação de um poder
vigente. É o velho ditado de se dar o peixe e não se ensinar a pescar caracterizando o “Mito do
Governo Grátis” amplamente debatido por Paulo Rabello de Castro2. Esse mito se fundamenta na
premissa de que o governo deve distribuir vantagens e ganhos para todos criando ilusões de
forma indiscriminada a partir de uma prática de denominada de extrativismo econômico.
Alguns exemplos caracterizam esse tipo de intervenção.
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Economista, Professor Universitário e Ex-Conselheiro do Conselho Regional de Economia.
CASTRO, Paulo Rabello. O Mito do Governo Grátis. Rio de Janeiro: Edições Janeiro, 2014.
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O endividamento público com o objetivo de destinar recursos às agências de fomento para
que estas liberem créditos com taxas de juros subsidiadas para empresas eleitas como de
vanguarda estratégica para o país sem transparecer os critérios de escolha.
A Liberação indiscriminada de crédito tendo como âncora os bancos públicos para estimular
a aquisição de bens como referência de ascensão social e como estratégia para o crescimento
econômico ocasionando, porém, em contrapartida, o endividamento, o comprometimento de
renda e até desajustes familiares.
Por outro lado, não são desenvolvidos mecanismos para induzir a formação de uma
poupança individual como provedora de recursos para custeio de maiores benefícios futuros para
o conjunto da sociedade em termos de garantia da aposentadoria e como fonte de recursos para
investimentos privados.
Nesse bojo, uma ampla reforma no mercado de capitais se torna premente para tornar esse
segmento do mercado financeiro menos especulativo. Isto exige por parte do estado o a
implementação de uma política pública de estímulo a abertura de capital pelas empresas de
modo que as pessoas físicas possam adquirir títulos de longo prazo como instrumentos para
formação de poupança e, simultaneamente, transformar-se em fonte segura de recursos para
investimento por parte das empresas.
Trata-se
de
resgatar
conceitos
anteriormente
previstos
desenvolvidos, com destaque para as leis Lei 4728/1965,
em
6404/1976 e
instrumentos
legais
11638/2007, cujos
conceitos não foram implementados em sua plenitude principalmente por força da predominância
de um longo período inflacionário que induzia a obtenção de resultados imediatistas ou quanto a
exigência de maior transparência por parte das empresas, elementos que não se coadunam com
a filosofia desse mercado.
O cenário atual de crise obrigou ao governo a ter reduzir a meta do superávit primário para
0,15% do Produto Interno Bruto (PIB), ou seja, o montante que deve ser economizado para pagar
os juros da dívida pública, o que é classificado no âmbito das contas públicas como despesas
financeiras. Apesar do alvoroço criado no mercado financeiro em função da manifestação das
empresas de agências de rating quanto à expectativa quanto ao risco de rebaixamento do grau
de investimento do país, essa iniciativa de redução já era previsível por grande parte dos
analistas dedicados a estudar as contas públicas em função do histórico de comportamento das
contas públicas.
Uma meta elevada para o superávit primário praticamente não era vista como factível no
curto prazo devido o comportamento ascendente da dívida pública que em parte é potencializado
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pelo aumento sistemático da Taxa Selic como instrumento de combate à inflação, mas que gera
maior obrigação financeira junto aos credores, conforme abordamos no artigo “Inflação, Taxa
Selic e Dívida Pública”.
Contudo, apesar desse imbróglio financeiro, o desafio maior em termos de gestão das
contas públicas se volta mais para as despesas classificadas como não financeiras.
As despesas não financeiras do governo que são caracterizadas pelos vultosos recursos
destinados a programas de natureza distributiva, alguns de cunho assistencialista, e que carecem
de sustentação no longo prazo principalmente em cenário de pouco crescimento econômico. Os
programas de natureza distributiva em parte foram desenhados pelas letras da Constituição
Promulgada em 1988, ou seja, antes da queda do Muro de Berlim (1989).
Nela os constituintes buscavam o antigo socialismo pautado no controle direto do capital
pelo Estado e os meios de produção pela burocracia governamental com o objetivo de alcance de
uma sociedade próspera e equilibrada. No entanto, pela ótica econômica, qualquer demanda
social a ser atendida, mesmo que as iniciativas sejam bem intencionadas, geram despesas e para
cobrir essas despesas devem ser geradas receitas e, estas, se originam dos tributos que todos
pagam, inclusive penalizando mais drasticamente aqueles que são beneficiários dos programas
sociais. Em uma linguagem coloquial: “se dá com uma das mãos e se tira com as duas mãos”.
As despesas não financeiras são aquelas que não se correlacionam diretamente com a
dívida pública, mas que indiretamente pode impactá-la. No geral as despesas não financeiras são
subdivididas em 28 áreas, porém a ênfase maior recai sobre os gastos de natureza social que em
grande parte são decorrentes de obrigações contidas em cláusulas da supramencionada
Constituição Federal de 1988 sendo responsáveis por aproximadamente 80% do montante
dispendido. São eles: Assistência Social, Previdência, Trabalho, Saúde e Educação. Segundo a
Fundação Getúlio Vargas no período de 2007 a 2013 os gastos de natureza social tiveram um
crescimento 1,74% do PIB enquanto que os outros gastos classificados como despesas não
financeiras tiveram um aumento de 0,02% do PIB3.
A gestão dessas despesas tende a exigir maior eficácia principalmente em cenários de
instabilidade e em face de demandas sociais cada vez mais crescentes que induzidas em parte
pelo aumento da expectativa de vida da população como consequência de maior preocupação
com a medicina preventiva e a um acelerado processo de urbanização do país. A isso se
acrescenta a redução gradativa do índice de natalidade com reflexos diretos no comportamento
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Revista Conjuntura Econômica/ novembro 2014
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da População Economicamente Ativa (PEA) que vai trazer impacto nas contas da Previdência
Social.
O Regime Geral da Previdência Social embute o mecanismo de que as contribuições da
população em atividade devem custear a aposentadoria daqueles que não se encontram mais em
atividade. Parte do impacto financeiro foi amenizada pela implantação do Fator Previdenciário
voltado para as aposentadorias do setor privado, mas pouco atingindo as aposentadorias do setor
público que continuaram a propiciar o recebimento integral do último salário da ativa por ocasião
da inatividade do funcionário público, porém não contribuindo integralmente para usufruir desse
benefício o que gera certa distorção financeira.
Essa distorção somente tende a ser corrigida com a aplicação dos dispositivos previstos na
Lei 12618/2012, que institui o Regime de Previdência Complementar para os Servidores Públicos
Federais ao estabelecer um teto máximo de aposentadoria custeada com recursos da previdência
e transfere o complemento para montante de contribuições realizadas pelo funcionário durante a
sua vida ativa.
Sob o ponto de vista econômico e em termos de gestão não é prudente aumentar e criar
benefícios (direitos) sem ter em contrapartida uma fonte de receita saudável, bem gerida e
estruturada para fazer frente às expectativas criadas. A não observância desse preceito traz
como consequência o fato de que em algum momento a conta deve ser paga e quando dívida se
apresenta os transtornos naturalmente se manifestam através da inflação, dos déficits
orçamentários que devem ser cobertos pelo aumento de impostos. São remédios amargos e
desconfortantes para sociedade.
Avançando ou pouco mais. No advento de uma crise econômica e a busca de soluções para
neutralizá-la é comum no Brasil haver uma polarização de conceitos no âmbito do pensamento
econômico. Uma corrente defendendo fielmente a aplicação de instrumentos associados ao
desenvolvimentismo capitaneado pelo keynesianismo e as suas derivações em que o estado
deve ser o ator principal no processo e os demais agentes assumindo os papéis de coadjuvantes
ou figurantes.
Outra corrente, denominada de neoliberalismo também fielmente a aplicação de
instrumentos no qual o mercado assume o papel de ator principal e o estado assumindo o papel
de coadjuvante. No entanto, essas duas correntes na defesa dos seus conceitos tendem a ignorar
algo essencial na sociedade contemporânea que é a importância do ambiente institucional para a
economia sendo objeto de tratamento pela Nova Economia Institucional.
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A Nova Economia Institucional, a partir de uma abordagem multidisciplinar que combina
várias áreas do conhecimento associada a variadas correntes do pensamento econômico uma
vez que todas são dotadas de instrumentos aplicáveis em qualquer situação de crise, porém
observados os níveis de dosagem. Há um realce no papel das instituições para o funcionamento
e comportamento da economia. Essa linha tem importância no momento em que, no Brasil, se
questiona o tamanho do Estado, seu peso, o seu custeio e sua interferência nas decisões dos
indivíduos e das organizações. No momento em que os indivíduos e organizações se sentem
inseguros em tomar as suas decisões isto necessariamente trará reflexos econômicos em termos
de produtividade, de eficiência, de competitividade afetando de forma significativa os resultados.
A necessidade de se realizar ajustes nas contas públicas se torna prioritária para que a
Economia Brasileira possa superar qualitativamente a crise modo a reassumir o grau de
importância que tem no cenário internacional. Para tanto deverão ser adotadas iniciativas que
tendem combinar aspectos econômicos, políticos e jurídicos envolvendo a reavaliação do modelo
atualmente vigente buscando manter elementos de sucesso e eliminando pontos de entrave que
não trouxeram grandes melhorias devido a pouca sustentabilidade.
Isto necessariamente introduzirá um instrumento ainda pouco utilizado em nossa sociedade,
mas que tem sido aplicado em outros países em situações de crise que é a figura do pacto
institucional. Esse pacto é como se fosse uma nova constituinte envolvendo os poderes
constituídos (executivo, legislativo, judiciário, ministério público), os estados e os municípios, uma
vez que ainda vivenciamos no Brasil situações que são oriundas do período colonial. É notória a
defesa que determinados segmentos de poder fazem acerca da manutenção de direitos
custeados com recursos públicos enquanto que, por outro lado, se verifica o fechamento de
milhares de postos de trabalho, serviços públicos precários, endividamento das pessoas, etc.
Para finalizar ressaltamos que as medidas para neutralização da crise presente no país para
amenizar os efeitos danosos da inflação, do desemprego e melhoria do caixa do governo para
fazer frente aos seus compromissos não devem ter conotação de curto prazo ou imediatista e,
ainda, não deve se limitar ao plano econômico. Os caminhos passam necessariamente por uma
reforma estrutural e modo a reduzir o tamanho do estado, o volume das suas despesas, o seu
excesso de intervenção que reflete nas decisões dos indivíduos e organizações.
A Economia Brasileira não conseguirá restabelecer em sua plenitude se medidas concretas
e estruturais não forem tomadas. Nesse processo a influência do cenário externo tem um peso
menor uma vez que a maioria dos países está reduzindo as suas compras (queda da demanda)
por força de ajustes econômicos o que provoca a redução dos preços internacionais das
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commodities afetando, por conseguinte, o balanço de pagamentos do país em função de menor
geração de receita em moeda forte.
Para tanto é necessário que o governo busque obter um apoio político e de governabilidade
uma vez que as instituições de Estado estão em pleno funcionamento. As medidas de momento
que estão sendo adotadas são apenas remédios para sanar uma gripe e não para se tratar de
pneumonia ou até tuberculose que se expandiu por todo o organismo econômico.
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