6- 1 6 O Formalismo da Mecânica Quântica, Parte III; Medições na Mecânica Quântica. 6.3.1 A matriz representativa de um operador Passemos,agora, ao problema de encontrar a matriz representativa de um operador A. Suponhamos conhecidos a função ψ(x), o operador A e um sistema de eixos ξ1, ξ2, ξ3, ... no espaço de Hilbert sob consideração. O vetor Iψ(x)>, ou simplesmente ψ(x), neste parágrafo não usamos, normalmente, a notação de Dirac, poderá ser descomposto em suas projeções sobre estes eixos, ou seja ∞ ψ( x ) = c nξn , onde cn = <ξnIψ>, e o problema que nos propomos é o de n =1 encontrar a expansão do vetor φ(x) no processo de aplicar o operador A sobre ψ, ou seja, estamos buscando os coeficientes dn na relação ∑ φ(x) = A ψ(x) = ∑n=1,∞ dn ξn (1) Efetivamente, achados estes coeficientes dn, ficará completamente definida a função φ(x) e, em conseqüência, o efeito do operador A ao ser aplicado à função ψ(x). O efeito este, no espaço Hilbert, é o de transformar o vetor ψ no vetor φ. Sabemos que, em geral, um operador A transforma um vetor do espaço Hilbert num outro vetor, distinto em magnitude e direção. (Segundo Dirac, o conjunto {ci} é o representante da função ψ. Se as ξi são autofunções do operador A, então os números ci definem o estado do sistema, representado pela função ψ, na "representação A".) Para resolver o problema posto de encontrar o vetor φ apliquemos A aos membros de ψ = ∑ cmξm: 6- 2 φ = Aψ = A ∑cmξm = ∑ cmAξm := ∑dm ξm (2) com cm = <ξmIψ> , ou (ξm,ψ), e dm = <ξmIφ> ou (ξm,φ). Os dm ficam para ser determinados, veja isso no que segue. Tomamos em conta que A (c f(x)) = c (A f(x)), quaisquer que sejam A e f , contanto que c seja uma constante. Para achar φ(x) precisamos, pois, previamente encontrar o efeito que tem o operador A sobre as funções ξm. Ao aplicar A sobre ξm obteremos uma nova função que poderemos, a sua vez, projetar sobre os eixos. Suponhamos que ao fazer isso obteremos a expansão A ξm = ∑n Anmξn = A1 m ξ1 + A2 m ξ2 + ... (3) Substituindo isso na expansão (2), obteremos φ = ∑m cm (A1 m ξ1 + A2 m ξ2 + ... ) = ∑m cm A1 m ξ1 + ∑m cm A1 m ξ1 + ∑m cm A2 m ξ2 + .... = d1 ξ1 + d2 ξ2 + ... := ∑m dm ξm sendo (4) dn = ∑m,∞ cm Anm (5) Uma vez determinados os coeficientes An m, podemos calcular, por meio de (5), todos os componentes dn do vetor φ. Estes componentes podem ser distribuídos em forma matricial, formando a matriz representativa do operador A ( a forma desta matriz depende da base). ⎡ A11 A12 ⎢A A 22 [ A nm ] = ⎢ 21 ⎢ A 31 A 32 ⎢ . ⎣ . .⎤ A 23 .⎥⎥ = [ A ] (6) A 33 .⎥ ⎥ . .⎦ A3 Usamos colchetes para as matrizes infinitas e parênteses para as finitas. A matriz (6) representa ao operador A, já que determina, sem ambigüidade alguma, o vetor (ou a função) φ que se obtém ao aplicar A sobre uma função ψ dada. O vetor φ, definido por seus componentes dn = ∑m,∞ cm Anm escreve-se em notação matricial como 6- 3 ⎡ d1 ⎤ ⎡ A11 A12 ⎢d ⎥ ⎢ A ⎢ 2 ⎥ = ⎢ 21 A 22 ⎢d3 ⎥ ⎢ A 31 A 32 ⎢ ⎥ ⎢ . ⎣ . ⎦ ⎣ . A13 .⎤ ⎡ c1 ⎤ A 23 .⎥⎥ ⎢⎢c 2 ⎥⎥ ⋅ A 33 .⎥ ⎢c 3 ⎥ ⎥ ⎢ ⎥ . .⎦ ⎣ . ⎦ (6) Na Mecânica, parágrafo 2.2.3, Mech_2_2, falamos sobre a representação de matrizes com MUPAD. d2 é , por exemplo, o produto da segunda linha, [A21, A22, A23, ...], com a coluna [ci], ou seja d2 = A21c1 + A22c2 + A23c3 + ... = ∑m cm A2m Para determinar os coeficientes Anm basta observar em A ξm = ∑n Anmξn que Anm não é outra coisa que a projeção do vetor Aξm sobre o vetor ξn. Para obter Anm nos bastará, então, multiplicar escalarmente Aξm e ξn. Teremos, portanto, Anm = (ξn,Aξm) (7) Lembrando que (f,g) = ∫f*(x)g(x) dv, resulta Anm = (ξn,Aξm) = ∫ξ*nAξm dv := <nIAIm> (8) Conhecendo, assim, os coeficientes Anm da matriz representativa do operador A, teremos imediatamente os componentes dn do vetor φ na Eq. 4. O operador adjunto foi definido em 6.2.2. Falemos, agora, da matriz adjunta. Se A+ é o adjunto do operador A, resulta que para quaisquer vetores ψ, φ vale (φ,Aψ) = (A+φ,ψ) (9) Para dois vetores ξm, ξn do sistema {ξi} de eixos temos (ξn,Aξm) = (A+ξn,ξm) = (ξm,A+ξn)* (10) Daí vemos que Anm = (A+mn)* ou A*nm = A+mn ou A+nm = A*mn. Ou seja: Obtêm-se a matriz adjunta trocando linhas e colunas (matriz transposta) e tomando os complexos conjugados dos elementos da matrix transposta. Se A é um operador hermiteano o autoadjunto, resulta Anm = A*mn. 6- 4 Exemplo: A seguinte matriz é hermiteana: i a + ib ⎞ ⎛ 3 ⎟ ⎜ A =⎜ −i 6 i 3 ⎟ , ⎜ a − ib − i 3 9 ⎟⎠ ⎝ − i a − ib ⎞ ⎛ 3 ⎟ ⎜ A =⎜ i 6 −i 3⎟ ⎜ a + ib i 3 9 ⎟⎠ ⎝ T i a + ib ⎞ ⎛ 3 ⎟ ⎜ 6 i 3 ⎟ Sendo A+ = (AT)*, obtemos A = ⎜ − i ⎜ a − ib − i 3 9 ⎟⎠ ⎝ + ou seja A = A+ . Para matrizes reais vale A+ = AT. Se as funções βi empregadas para calcular os elementos da matriz A são as autofunções do operador A, ou seja quando A βi = αiβi, obtém-se <mIAIn> = ∫β*m Aβn dv = αn ∫β*mβndv = αn δmn e a matriz fica reduzida a sua diagonal principal com os elementos iguais aos autovalores, ou seja ⎡α1 ⎢ α2 ⎢ [A] = ⎢ ⎢ 0 ⎢ ⎢⎣ 0 α3 . ⎤ ⎥ ⎥ ⎥ ⎥ ⎥ . ⎥⎦ (11) Dito de outra maneira: o problema de achar os autovalores de um operador equivale a reduzir sua matriz representativa a sua matriz diagonal. (Por isso é importante, ter métodos numéricos que diagonalizam uma matriz.) Note que os elementos da diagonal principal de toda matriz hermiteana devem ser reais, já que se o elemento Ajj fosse a + ib, o elemento A*jj seria a - ib, e estes elementos só podem ser iguais quando b = 0, ou seja, quando são reais. 6- 5 6.3.2 Mudanças de eixos no espaço Hilbert. Vimos que um operador dado A num sistema de eixos dado {ξi} está representado por a matriz [Anm]. É claro, que se mudarmos o sistema e aplicarmos um novo sistema de eixos {ξ'i}, o mesmo operador estará representado por uma matriz distinta [A'nm]. O problema é como encontrar esta nova matriz [A'nm]? Vamos introduzir um novo operador, U, que faz a transformação do conjunto ortonormal {ξi} no conjunto, também ortonormal, {ξ'i}: ξ'n = U ξn, n = 1, 2, 3, ... (12) (Um exemplo de uma mudança de eixos estudamos na Mecânica, parágrafo 3.6.1, descrevendo rotações por meio de uma matriz de rotação.) Sendo o conjunto {ξi} completo, podemos transformar todo vetor ψ = ∑n=1,∞ cnξn em outro vetor ψ' usando U. Ou seja ψ' = Uψ = U ∑n=1,∞ cnξn = ∑n=1,∞ cn Uξn = ∑n=1,∞ cnξ'n (13) O operador U é chamado de operador unitário e pode ser definido de diferentes maneiras. Aqui vamos usar a seguinte Definição Um operador U é chamado de unitário (ou ortogonal) se satisfaz à relação U U+ = U+U = I (14) A matriz U que representa um operador unitário é uma matriz unitária (ou ortogonal, ou seja as colunas e linhas são vetores ortonormais). Vamos demonstrar que um operador unitário preserva o produto interno e não muda o comprimento de um vetor. A equação ξn = T ξ'n define o operador inverso de U, pois temos ξn = T ξ'n = TU ξn Æ TU = I Æ T = U-1 ou seja ξn = U-1 ξ'n. Vamos demonstrar que o operador U deixa inalterado o produto interno, ou seja (Uφ,Uψ) = (φ,ψ). 6- 6 ψ = ∑m=1,∞ cmξm e φ = ∑n=1,∞ dnξn; Uψ= ∑m=1,∞ cmUξm = ∑m=1,∞ cmξ'm e Uφ= ∑n=1,∞ dnUξn = ∑n=1,∞ dnξ'n (Uφ,Uψ) = (∑n=1,∞ dnξ'n, ∑m=1,∞ cmξ'm)= ∑n,m (dnξ'n, cmξ'm) = ∑n,m d*n cm (ξ'n, ξ'm) = ∑n d*n (∑mcm δnm) = ∑n d*n cn temos também (φ,ψ) = (∑n=1,∞ dnξn, ∑m=1,∞ cmξm) = ∑n,m d*n cm (ξn, ξm)= ∑n d*n cn Por isso, (Uφ,Uψ) = (φ,ψ), e daí segue que U é unitário. Também podemos escrever U-1 = U+ e ξn = U+ ξ'n. {cn} sejam os componentes do vetor ψ no sistema {ξi} e {dn} os do vetor φ. No sistema {ξ'i} esses componentes são {c'n} e {d'n}. Temos, também, que (φ,ψ) = ∑n d*n cn = ∑n (d'n)* cn', já que o produto interno deve ser independente do sistema de eixos. Para achar o efeito que tem a mudança da base sobre a matriz representativa do operador A, consideramos a equação φ = A ψ em ambos os sistemas. (Em ambos os casos trata-se do mesmo operador e dos mesmos vetores φ e ψ, somente as matrizes representativas são diferentes.) Usando a base {ξi} temos ψ = ∑n=1,∞ cnξn e φ = ∑n=1,∞ dnξn; além disso φ = A ψ = ∑m=1,∞ cm Aξm; dn = (ξn,φ) = (ξn, ∑m=1,∞ cm Aξm) = ∑m (ξn, cm Aξm) = ∑m cm (ξn, Aξm) Designando (ξn, Aξm) = <ξnIAIξm> por Anm obtemos, finalmente, dn = ∑m=1,∞ Anm cm, n = 1,2,3,... (15) Usando a base {ξ'i}, obteremos d'n = (ξ'n,φ) = (ξ'n, ∑m=1,∞ c'm Aξ'm) = ∑m (ξ'n, c'm Aξ'm) = ∑m c'm (ξ'n, Aξ'm) e com A'nm := (ξ'n, A ξ'm) resulta d'n = ∑m=1,∞ A'nm c'm, n = 1,2,3,... (16) 6- 7 Também podemos escrever (já que ξ'n = U ξn e ξ'm = Uξm) A'nm := (ξ'n, A ξ'm) = (Uξn, AUξm) = (ξn, U+AUξm)= (U+AU)nm (17) Com as regras para a multiplicação de matrizes obteremos cr m = (AU)r m = ∑s=1,∞Ars Usm; r = linha, m = coluna; C:= AU dn m = (U+C)n m = ∑r=1,∞U+nr Cr m := A'nm. U+nr = elemento da linha n e da coluna r da matriz U+ ou seja, U+nr := (ξn, U+ξr), Ars := (ξr, Aξs); Usm := (ξs, Uξm) com U+ = U-1 Podemos escrever A'nm = (U+AU)nm = ∑r,s=1,∞U+nr Ars Usm , ou também A' = U+A U = U-1AU (18) A relação (18) indica a lei de transformação de matrizes ao mudar os eixos. Esta lei tem caráter geral e, por isso, é aplicável também quando o número de dimensões é finito, pois, na sua dedução, nunca foi preciso pôr uma condição ao respeito do número das dimensões. Mas, observe bem, não para toda matriz unitária U será A' mais simples do que A. Mas, segundo um teorema muito importante de Schur (1909), existe para qualquer matriz A uma transformação unitária U tão que A' = U+A U é da seguinte forma (forma canônica de Schur): ⎡λ1 A '12 ⎢ λ2 ⎢ ⎢ A=⎢ ⎢ ⎢ ⎢ ⎣ A '13 A '23 λ3 ⋅ ⋅ ⋅ ⋅ ⋅ ⋅ ⋅ ⋅ ⋅ A '1n ⎤ A '2n ⎥⎥ A '3n ⎥ ⎥ ⋅ ⎥ ⋅ ⎥ ⎥ λn ⎦ (19) Os elementos A'ii = λi são os autovalores de A. Além disso, pode-se demonstrar que Tr A = Tr A' e det A = det A'. 6- 8 6.4 Medições na Mecânica Quântica Na mecânica quântica postulamos que a cada grandeza observável à corresponde um operador A. Agora podemos afinar este conceito afirmando que este operador é sempre hermiteano. (Nesta seção designamos as autofunções com φ em vez de ψ.) A todo autovalor an da equação Aφ = aφ corresponde uma autofunção φn e pedimos que o sistema das autofunções φ1, φ2, φ3 ... seja completo e que os autovalores formem uma sucessão ordenada a1 ≤ a2 ≤ a3 ≤ ... Toda partícula ou grupo de partículas está descrita na mecânica quântica por uma função de onda ψ, e o problema de encontrar os valores possíveis da variável à reduz-se a achar os autovalores da equação Aφ = aφ. Agora vamos perguntar-nos quais são as probabilidades de cada um dos resultados possíveis. Para responder esta pergunta, expandiremos a função de onda ψ do sistema sob estudo em uma série das autofunções φn ψ = ∑n=1,∞ cnφn (20) Se o sistema estiver, antes da medição, num autoestado φn de A, então fazendo uma medição da observável à daria o resultado certo an. Em geral, o sistema está num estado ψ, com ||ψ|| = 1, que não é um autoestado. Mas ψ sempre pode ser expandido numa série de autoestados φn onde cn =(φn,ψ). Uma expansão do quarto postulado afirma que a probabilidade de obter para a observável à dum sistema no estado (20) um resultado compreendido no intervalo a´≤ a ≤ a'' é P(a',a'') = ∑n|cn|2 (21) incluindo na soma unicamente tais valores de n para os quais an está compreendido no intervalo a´≤ a ≤ a''. E, em conseqüência, quando no intervalo (a',a'') contém o único autovalor aj, então P(a',a'') = |cj|2 e ψ = φj. Agora, ao fazer a experiência, pode suceder que o estado do sistema se altere e, por isso, se medirmos a observável à no mesmo sistema uma segunda vez, pode ser que vamos obter um resultado diferente de aj. Se somarmos todas as probabilidades possíveis devemos obter P(-∞,+∞) = ∑n=1,∞ |cn|2 = 1 (22) 6- 9 Vamos demonstrar a Eq. 22, mas antes recordaremos como se pode determinar os coeficientes cn. <φiIψ> = (φi,ψ) = ∫ψφ*idv = ∫(∑cnφnφ*i)dv = ∑cn∫φi*φndv =∑cn δin = ci Agora a Eq. 22, usando ψ = ∑cnφn e ψ* = ∑c*nφ*n e ∫ φ*iφjdv = δij , resulta ∫ψ*ψdv = ∑i≠j c*jci ∫ φ*jφidv + ∑k=1,∞ c*kck∫φ*kφkdv = ∑k=1,∞c*kck = ∑k=1,∞|ck|2=1 q.e.d. Agora nos resta generalizar a expressão para o valor esperado (postulado 5, seção 3.1). Vamos substituir ψ = ∑cnφn na relação < à > = ∫ψ*Aψdv. O cálculo é parecido ao anterior (à é a observável que anteriormente, 3.1, foi designado por Q): < à > = ∫ψ*ψdv = = ∑i≠j c*icjaj ∫ φ*iφjdv + ∑k=1,∞ c*kckak∫φ*kφkdv = ∑k=1,∞c*kckak = ∑k=1,∞ak|ck|2 < à > = ∑k=1,∞ak|ck|2 (23) A Eq. 23 nos dá o valor esperado da observável à em função dos coeficientes cn e dos autovalores an. Se conhecemos as autofunções e os autovalores, os coeficientes cn para cada ψ se deduzirão imediatamente por meio da equação ∫ψφidv = ci. Conhecendo estes valores, podemos realizar os cálculos requeridos para determinar < Ã> e P(a',a''). Como indicado, <Ã> é o valor médio que se encontraria se num número elevado de sistemas iguais, todos descritos pela mesma função de onda, efetuarmos um experimento para medir a magnitude da observável Ã. Se a função de onda fosse ψ = φn, então, sendo cn = 1 e ci = 0 para i ≠ n, a equação < à > = ∑k=1,∞ak|ck|2 daria < à > = an (24) como efetivamente deveria de ser. Consideremos o caso da energia total dum sistema. 6- 10 A forma geral da função de onda será uma soma de um número de diferentes funções de onda ψn(x,t): ψ(x,t) = ∑n=1,∞ cn ψn(x,t) = ∑n=1,∞ cn exp(-iEnt/ħ)ψn(x) (25) O valor esperado da energia calculamos como <E> = ∫-∞,∞ ψ*(x,t)iħ∂ψ(x,t)/∂t dx, onde iħ∂/∂t é o operador da energia. (Os operadores E = iħ∂/∂t e o hamiltoniano H = - ħ2/2m ∆ + U produzem resultados iguais quando aplicados a (25), ou seja eles são operadores equivalentes.) Substituindo (25) na expressão para <E> dá <E> = ∫ ∑m=1,∞ cm* exp(iEmt/ħ)ψm*(x)iħ∑n=1,∞cn(-iEn/ħ)exp(-iEnt/ħ)ψn(x) = ∑n∑m Encm*cn exp[i(Em-En)t/ħ] ∫-∞,∞ ψm*(x) ψn(x) dx A integral é zero para m≠n e a soma sobre m contribui somente com o termo m = n, então temos <E> = ∑n En cn*cn exp[i(En - En)t/ħ] = ∑n=1,∞ En |cn|2 (26) Quando a partícula se encontra num autoestado, por exemplo ψk(x,t), então ck = 1 e cn = 0 para n ≠ k. Neste caso, a Eq. 26 proporciona <E> = Ek. Se ψ(x,t) não for separável, ou seja se não se poderia escrever uma equação como a 25, então os coeficientes cn serão funções do tempo: ψ(x,t) = ∑i ci(t) ψi(x) (27) e os coeficientes ci(t) vão satisfazer a relação cj (t) = cj(t0) exp [ - i Ej (t-t0)/ħ] (28) Esta equação diz algo importante sobre medições da energia: os resultados não dependem do tempo. Pois a probabilidade para medir um autovalor Ej é P(Ej) = |cj(t)|2 = | cj(t0) exp [ - i Ej (t-t0)/ħ]|2 = |cj(t0)|2 = |cj(0)|2 se tomarmos t0 = 0. O tempo da medição desaparece devido à forma especial do fator de tempo (fator exponencial e complexo). 6- 11 6.5 Evolução do valor esperado com o tempo Seja Q um operador hermiteano que pode também depender explicitamente do tempo. Queremos saber a velocidade da mudança do valor esperado da observável Q(t), representada por Q(t). d<Q(t)>/dt = ∫-∞,∞ ∂/∂t [ψ*(x,t) Q(t) ψ(x,t)] dx (29) Isso podemos escrever como d<Q(t)>/dt = ∫-∞,∞ [∂ψ*/∂t Qψ + ψ*(∂Q/∂t ψ) + ψ*Q ∂ψ/∂t]dx (30) O segundo termo no integrando seria zero, se o operador não dependesse explicitamente do tempo. Geralmente, os operadores efetivamente não dependem do tempo, mas no caso de sistemas expostos a campos externos, Q sim pode explicitamente depender do tempo. Para substituir ∂ψ/∂t e ∂ψ*/∂t, utilizamos e equação de Schrödinger dependente do tempo e sua complexa conjugada, ou seja iħ∂ψ/∂t = Hψ e -iħ∂ψ*/∂t = Hψ* (31) O operador H é real. Da Eq. (30) obteremos, escrevendo o segundo termo como um valor esperado no lado esquerdo d<Q(t)>/dt - <∂Q(t)/∂t> = i/ħ ∫{[Hψ(x,t)]* Qψ(x,t) - ψ*(x,t)QHψ(x,t)}dx (32) =i/ ħ [<HψIQψ> - <ψIQHψ>] (33) Utilizando a propriedade hermiteana de H, podemos combinar os operadores d<Q(t)>/dt - <∂Q(t)/∂t> = i/ ħ [ <ψIHQψ> - <ψIQHψ>] = i/ ħ <ψIHQ - QHIψ> (34) Na direita reconhecemos o comutador [H,Q] e temos, então, o resultado d<Q(t)>/dt = <∂Q(t)/∂t> + ħ-1 <i[H,Q]> (35) 6- 12 Quando, como na maioria dos casos, Q não é função explícita do tempo, temos <∂Q(t)/∂t> = 0 e se [H,Q] for zero, também d<Q(t)>/dt = 0 e podemos formular o seguinte Teorema: O valor esperado de um operador que comuta com o hamiltoniano é uma constante do movimento (ou seja, não se modifica quando o estado do sistema evoluir). Já que todo operador comuta consigo mesmo, temos em particular que [H,H] = 0, ou seja que a observável E é conservada. É claro, que a energia não será conservada quando o potencial depender do tempo: U = U(x,t). Em tal caso, o hamiltoniano também seria dependendo do tempo, o que acabamos de excluir. Deveríamos, então, escrever d<E>/dt = <∂U/∂t>. Na mecânica clássica existe uma equação muito parecida à equação (35): dQ(t)/dt = ∂Q/∂t + {Q,H}, (36) onde todas as grandezas são funções e não operadores. Q[xi(t),pi(t); i = 1,2,3,...N = Q(t) é uma observável clássica (ou uma variável dinâmica) para um sistema unidimensional de N partículas cujo hamiltoniano é H. {Q,H} , o colchete ou parêntese de Poisson, é definido por {Q,H} = ∑i=1,N (∂Q/∂xi ∂H/∂pi - ∂Q/∂pi ∂H/∂xi) (37) 6- 13 6.5.1 A conservação da paridade A demonstração da não conservação da paridade foi gratificado com o prêmio Nobel no ano 1957. Até 1956, pensava-se que paridade fosse um princípio fundamental da Natureza: todos os fenômenos naturais obedeceriam a leis invariantes mediante a reflexão no espelho (transformação esquerdo - direito). Em 1956, os físicos sino-americanos Chen Ning Yang e Tsung Dão Lee, sugeriram que as leis do decaimento β violariam a paridade, e suas previsões foram prontamente confirmadas em experiências realizadas por Chien-Shing Wu, também sino-americana, e colaboradores. (Chen Ning Yang e Tsung Dão Lee receberam o prêmio Nobel de 1957 pelos seus trabalhos sobre as leis de paridade em partículas elementares.) Agora resta saber, o que é o operador de paridade Π ? (Veja também 4.5.4) Considere uma função ψ(x). Define-se o operador de paridade Π pela seguinte relação: Πψ(x) = ψ(-x) (38) Logo, o operador de paridade transforma cada coordenada cartesiana em seu negativo. O operador Π é linear, pois Π[ψ1(x) + ψ2(x)] = ψ1(-x) + ψ2(-x) = Πψ1(x) + Πψ2(x) e Π [cψ(x)] = cψ(-x) = c Πψ(x) Além disso, podemos mostrar que Π é um operador hermiteano, pois da definição do produto interno segue (Πψ,φ) = ∫-∞,∞ ψ*(-x) φ(x) dx = ∫-∞,∞ ψ*(x')φ(-x')dx', onde foi usada a substituição x' = -x. Visto que o valor da integral não depende do nome da variável da integração, temos (Πψ,φ) = ∫-∞,∞ ψ*(x)φ(-x)dx = (ψ,Πφ) o que significa que Π é hermiteano. O operador Π2 equivale a multiplicar por um, isto é, o operador Π2 corresponde ao operador unidade, ou seja Π2 = I. Isso podemos ver do seguinte cálculo 6- 14 Π2ψ(x) = Π ψ(-x) = ψ(x), já que Π(Πψ) = Π(ψ(-x)) = ψ(x) = ψ Da hermitecidade de Π segue que os autovalores de Π são reais. Efetivamente, a equação dos autovalores Πψ = λψ pode ser multiplicada por Π dando Π2ψ = λΠψ = λ2ψ Porém, como operar com Π2 equivale a multiplicar por 1, então λ2 = 1, e daí λ = ± 1. Essa equação nos diz que os autovalores do operador Π2 são +1 e -1. Se λ = +1 então diz-se que ψ é uma função par. Quando λ = -1 diz-se que ψ é uma função ímpar. Para a autofunção ψ(x) = senx encontramos Πψ(x) = sen(-x)= - senx = -1·ψ(x), o que nos diz que λ = -1 e que ψ é uma função ímpar. Para ψ = cosx teremos Πψ(x) = +1·ψ(x), logo, ψ = cosx é uma função par. Da forma similar veremos que ψ = e-x não é uma autofunção do operador Π, uma vez que ψ = e-x não possui uma paridade definida, pois vemos que Πψ = ex e isso significa que Πψ ≠ ± 1·ψ Finalmente vamos demonstrar que no caso de um sistema com potencial simétrico, por exemplo no caso V(-x) = V(x), o hamiltoniano do sistema e o operador de paridade comutam, isso é ΠH = HΠ ou seja [Π,H] = 0. Pois temos H = p2/2m + V(x) com V(x) = V(-x) Hψ(x) = - ħ2/2m d2ψ(x)/dx2 + V(x)ψ(x) e ΠHψ(x) = - ħ2/2m Πd2ψ(x)/dx2 + ΠV(x)ψ(x) = - ħ2/2m d2ψ(-x)/dx2 + V(-x)ψ(-x) = - ħ2/2m d2ψ(-x)/dx2 + V(x)ψ(-x) = HΠψ(x) Sendo esta equação válida para qualquer função, temos HΠ -ΠH = [H,Π] = 0. q.e.d. Isso tem como conseqüência que d<Π>/dt =0, como vimos no parágrafo anterior ("se [H,Q] for zero, também d<Q(t)>/dt = 0"). 6.15 6.5.2 O Teorema de Ehrenfest A mecânica clássica como limite da mecânica quântica. Paul Ehrenfest, 18.1.1880 - 25.9.1933, veja a biografia na página http://www-groups.dcs.stand.ac.uk/~history/Mathematicians/Ehrenfest.html A mecânica quântica substitui o sistema mecânico sob estudo por uma função de onda ψ. As propriedades de ψ se deduzem das do sistema mecânico real. Quando se trata de uma partícula, esta função de onda será, em geral, um pacote de ondas. Se a partícula é descrita por uma função de onda ψ, que pode ou não ser um pacote de ondas, os valores médios das coordenadas e do momento linear satisfazem às equações m d<x>/dt = <px> = m<vx> m d<y>/dt = <py> = m<vy> m d<z>/dt = <pz> = m<vz> que podemos escrever como d<r>/dt = <v> (40) o que é análoga à equação dr/dt = v. O conteúdo da equação (40) constitui o teorema de Ehrenfest, Z. Phys. 45,455 (1927), que agora vamos a demonstrar. (O processo do cálculo é longo, mas não tem dificuldade nenhuma. O representaremos detalhadamente por ser seguramente instrutivo.) Começaremos calculando a derivada com respeito ao tempo de <x>. d<x>/dt = d/dt ∫V ψ*xψ dV = ∫∂ψ*/∂t xψdV + ∫ψ* x∂ψ/∂t dV Substituímos ∂ψ/∂t e ∂ψ*/∂t utilizando a equação de Schrödinger dependente do tempo e sua complexa conjugada, confira a Eq. 31. 6.16 d<x>/dt = ∫ xψ [iħ/2m ∆ψ - iU/ħ ψ]dV + ∫ xψ[-iħ/2m ∆ψ* + iU/ħ ψ*]dV = iħ/2m ∫ (xψ* ∆ψ - xψ ∆ψ*)dV (41) Logo demonstraremos que o segundo termo do integrando pode ser transformado, confira Eqs. 46-53. Essa transformação nos proporcionará d<x>/dt = = iħ/2m ∫ ψ* [x ∆ψ - ∆(xψ)]dV (42) É fácil mostrar que ∆(xψ) = x∆ψ + 2 ∂ψ/∂x, o que dá d<x>/dt = - iħ/2m ∫ψ*(2∂ψ/∂x)dV = -iħ/m ∫ ψ* ∂ψ/∂x dV (43) Tomando em conta que <px> = -iħ∫ψ* ∂ψ/∂x dV, resulta, finalmente, d<x>/dt = m-1 <px>, (44) ou seja, a primeira componente da Eq. (40). q.e.d. Devemos dar-nos conta de que este resultado foi somente possível, porque <px> foi adequadamente definido. É evidente que um cálculo idêntico dará as equações faltantes d<y>/dt = m-1 <py> e d<z>/dt = m-1 <pz> (45) Antes de fazer um comentário sobre o teorema de Ehrenfest, vamos derivar a expressão usada para reduzir o segundo termo do integrando da Eq. (41) Observamos que este termo pode integrar-se por partes. Para fazer isso, comprovaremos primeiro a seguinte identidade: div[xψ grad ψ*] = (xψ) ∆ψ* + grad ψ* · grad (xψ) (46) com as seguintes definições õ ψ = grad ψ = ∂ψ/∂x i + ∂ψ/∂y j + ∂ψ/∂z k ; (õ = Nabla (hebr.)) ∆ ψ = õ2 ψ = div grad ψ = õ·õ ψ = ∂2ψ/∂x2 + ∂2ψ/∂y2 + ∂2ψ/∂z2 observe que õ · õ = õ2 = ∆ (= operador de Laplace) div f = õ· f = ∂fx/∂x + ∂fy/∂y + ∂fz/∂z; 6.17 Exemplo: div (f F) = ∂(f Fx)/∂x + ∂(f Fy)/∂y + ∂(f Fz)/∂z Mas, ∂(f Fx)/∂x = f ∂Fx/∂x + Fx ∂f/∂x etc. Finalmente resulta div (f F) = f (∂Fx/∂x + ∂Fy/∂y + ∂Fz/∂z) + Fx ∂f/∂x + Fy ∂f/∂y + Fz ∂f/∂z ou div (f F) = f (div F) + F · grad f := f (õ· F) + F·õf (47) tomando f := xψ e F = grad ψ* = õψ*, resulta div (xψ õψ*) = xψ (div grad ψ*) + grad ψ*· grad (xψ) = (xψ) (õ·õψ*) + õψ*·õ(xψ) , ou seja div (xψ õψ*) = (xψ) (∆ψ*) + õψ*·õ(xψ) ) (48) Com este resultado volvamos à integral (41) d<x>/dt = iħ/2m ∫V (xψ* ∆ψ - xψ ∆ψ*)dV onde substituímos xψ∆ψ* por (div(xψ õψ*) - õψ* · õ(xψ)) ∫V (xy)∆ψ*dV = ∫V [div(xψ õψ*) - õψ* · õ(xψ)] dV (49) Usando, agora, o teorema de Gauss para transformar uma integral sobre um volume numa integral sobre a superfície do volume: ∫V div A = ∫S A·ds (50) Obteremos ∫V (xy)∆ψ*dV = ∫s (xψ õψ*)· ds - ∫V õψ* · õ(xψ) dV ψ deve sempre anular-se ao longo da superfície S, já que ψ deve tender a zero para grandes distâncias do origem. Assim, a primeira integral se anula e resulta ∫V (xψ)∆ψ*dV = - ∫V õψ* · õ(xψ) dV (51) Repetimos, agora, o processo que acabamos de fazer com o último integrando. Vale a seguinte identidade 6.18 div[ψ*õ(xψ)] = ψ* õ2(xψ) + õψ*· õ(xψ) (52) Podemos introduzir em (51) a expressão õψ*·õ(xψ) que tiramos da Eq. (52) ∫V (xψ)∆ψ*dV = -∫V {div[ψ*õ(xψ)] - ψ* õ2(xψ)}dV e, volvendo a aplicar o teorema de Gauss, tenderemos ∫V (xψ)∆ψ*dV = -∫S [ψ*õ(xψ)]·ds + ∫V ψ* õ2(xψ)}dV Pelas mesmas razões que antes, a integral sobre a superfície se anula e fica ∫V (xψ)∆ψ*dV = ∫V ψ* õ2(xψ)}dV (53) Podemos, finalmente, voltar à integral (41) que queríamos calcular. O teorema de Ehrenfest que acabamos de demonstrar é só um caso especial do lei de correspondência de Bohr, que agora poderíamos pronunciar assim: A cada lei da mecânica clássica corresponde uma lei análoga na mecânica quântica, lei que se obterá substituindo as variáveis clássicas pelos valores médios das variáveis quânticas correspondentes. Assim, por exemplo, quando na mecânica clássica existe um potencial, temos para a força F = m dv/dt = dp/dt = - grad U. A lei análoga na mecânica quântica será d<p>/dt = - grad <U>. Vemos, assim, que a mecânica clássica pode ser considerada como limite da mecânica quântica. De outra maneira pode-se demonstrar isso, observando que para comprimentos de onda "muito pequenos" a equação de Schrödinger se transforma na equação clássica de Hamilton-Jacobi, que é uma equação diferencial parcial de primeira ordem nas n + 1 variáveis independentes q1,q2,q3, ...,qn,t.