CARCINOGÊNESE BUCAL: EFEITOS DA EXPOSIÇÃO CRÔNICA A

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PIBIC-UFU, CNPq & FAPEMIG
Universidade Federal de Uberlândia
Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação
DIRETORIA DE PESQUISA
CARCINOGÊNESE BUCAL: EFEITOS DA EXPOSIÇÃO CRÔNICA A
SOLUÇÕES DE ETANOL SOBRE O EPITÉLIO LINGUAL DE
CAMUNDONGOS
Talita Franco1
Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Odontologia. Av. Pará, 1720, CEP 38400-902, Uberlândia, MG.
[email protected]
Danilo Saleti França2
Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Odontologia.
[email protected]
Bianca Caroline Silva3
Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Odontologia.
[email protected]
Marcus Vinícios Caixeta4
Universidade Presidente Antônio Carlos, Curso de Biomedicina.
[email protected]
Paulo Rogério de Faria5
Universidade Federal de Uberlândia, Instituto de Ciências Biomédicas.
[email protected]
Sérgio Vitorino Cardoso6
Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Odontologia.
[email protected]
Adriano Mota Loyola7
Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Odontologia.
[email protected]
Resumo: O consumo crônico de bebidas alcoólicas é um importante fator relacionado ao câncer
oral, mas seu efeito biológico sobre a mucosa ainda não foi esclarecido. A metalotioneína é uma
proteína com propriedades neutralizadoras sobre compostos genotóxicos, associando-se à pior
prognóstico para pacientes com câncer oral. Camundongos C57BL/6J foram submetidos ao
consumo de etanol (15% ou 40%) durante seis meses. Em seguida, avaliou-se a expressão da
metalotioneína por imunoistoquímica na mucosa lingual dos animais avaliados. Não houve
diferenças estatisticamente significantes em relação à espessura do epitélio lingual quando
comparados os grupos alcoolizados, ou entre eles e um grupo controle. O mesmo ocorreu com a
quantidade de marcação da metalotioneína no epitélio, comparando os grupos expostos ao etanol e
o grupo controle. Os resultados observados sugerem que mecanismos outros que não aqueles
associados à metalotioneína estão envolvidos na carcinogênese oral pelo etanol.
Palavras-chave: Etanol, câncer oral, C57BL/6J, metalotioneína.
1
Aluna de Graduação; bolsista PIBIC (processo D-034/2008).
Aluno de Mestrado.
3
Cirurgiã-dentista, colaboradora.
4
Aluno de Graduação.
5
Professor Adjunto.
6
Professor Adjunto, orientador.
7
Professor Associado.
2
1
1. INTRODUÇÃO
O câncer oral é um sério problema de saúde pública em várias partes do globo e, somado ao
câncer de faringe, representam o sexto tipo mais comum de câncer no mundo (Warnakulasuriya,
2008). Regiões da América Latina e Caribe (Uruguai e Porto Rico), incluindo o Brasil, apresentam
alta incidência de câncer oral. São países que têm em comum o alto consumo de bebidas alcoólicas
e do tabaco, além de uma dieta inadequada (La Vecchia et al, 1997; Wünsch-Filho, 2002; Ho,
2007). No Brasil, excluído o câncer de pele, o câncer da cavidade oral representa a quinta maior
incidência de câncer entre homens e a sétima entre as mulheres (Wünsch-Filho, 2002). O álcool e o
tabaco são reconhecidamente os dois principais fatores de risco para o câncer oral (Gillison, 2007;
Ide, 2008), sendo relacionados com mais de 75% dos cânceres da mucosa oral em homens nos
Estados Unidos, França e Itália (La Vecchia et al, 1997). Dados epidemiológicos são muito claros
ao mostrar a associação do consumo crônico de bebidas alcoólicas com a etiopatogênese de doenças
crônico-degenerativas, especialmente do sistema digestório, cardiovasculares, neurológicas e com o
câncer (Pöschl, 2004; Klatsky, 2009).
Em razão das informações obtidas por diversos estudos epidemiológicos a interação entre o
consumo de etanol e o câncer tem despertado especial interesse (Boffetta e Hashibe, 2006).
Biologicamente, o alcoolismo parece alterar significativamente a nutrição e o sistema imunológico
(Maillot, 2001), enquanto que propriedades genotóxicas mais diretas também têm sido descritas,
tais como a solubilização de membranas lipídicas, favorecendo a penetração de agentes
carcinogênicos, aceleração da proliferação celular, e mutagenicidade provocada pelo acetaldeído
produzido a partir do etanol no fígado, ou até mesmo na superfície da mucosa oral (Ogden, 2005;
Seitz, 2007). Ainda, o etanol gera espécies reativas de oxigênio, incluindo íons superóxido e
hidroxila, além de derivados de peroxidação lipídica, os quais podem se ligar ao DNA na forma de
adutos e, assim, dar origem a pareamento errôneo durante o processo de duplicação genômica,
comportando-se potencialmente como mutagênicos (Visapaa, 2004). Não obstante, são ainda muito
poucos os estudos que abordem isoladamente o efeito biológico do etanol sobre o metabolismo,
diferenciação e atividade proliferativa do epitélio da mucosa bucal. Estudos experimentais, que
permitem melhor controle da exposição a esse fator de risco são ainda mais escassos, com avaliação
insuficiente de possíveis alterações moleculares das células expostas (Al-Damouk, 1993; Born,
1996).
A metalotioneína é uma proteína cuja superexpressão está relacionada à piora no
prognóstico de diversos tipos de câncer, incluindo o carcinoma epidermóide oral (Cardoso et al.,
2002). Apresenta baixo peso molecular e é rica em cisteína (Takano et al, 2004). A metalotioneína
se liga principalmente a metais não essenciais, como o zinco, prata, mercúrio e cádmio, o que
justifica hipóteses sobre a importância dessa proteína na homeostase e na neutralização de metais
pesados. Acredita-se que essa proteína, quando exposta a ambiente celular oxidante, libere os
átomos metálicos aos quais está ligada e forme pontes dissulfetos intramoleculares. Essas pontes
são ávidas captadoras de elétrons, favorecendo, assim, a redução do dano potencial dos radicais
livres, promovendo um efeito citoprotetor (Romero-Isart, 2002; Tapiero, 2003). Considerando que o
consumo de etanol provoca um acúmulo de espécies reativas de oxigênio e que a metalotioneína
parece ser eficiente captadora destes, estudos estão sendo realizados para melhor compreender esse
mecanismo de citoproteção (Takano, 2000; Zhou, 2002;).
O objetivo do presente estudo foi avaliar o efeito da exposição crônica a soluções etanólicas
na mucosa oral, mediante avaliação de possíveis alterações morfológicas associadas à proliferação e
diferenciação celular, bem como possível aumento na produção da metalotioneína, enquanto
molécula citoprotetora.
2. METODOLOGIA
2
O protocolo de estudo aqui relatado foi submetido ao Comitê de Ética no Uso de Animais de
nossa Instituição, e constitui parte de uma linha de pesquisa que tem por objetivo avaliar a
importância da formação de radicais livres e de adutos ao DNA, provocados pelo álcool, na
carcinogênese oral. O experimento foi executado nas instalações da Universidade Federal de
Uberlândia, envolvendo o Laboratório de Experimentação Animal (LEA), onde os animais foram
mantidos durante todo o experimento, e o Laboratório de Patologia Bucal, sede das demais etapas
desta pesquisa.
2.1 Animais e Manutenção
Foram empregados trinta camundongos C57BL/6, descritos como susceptíveis ao consumo
de álcool (Yoneyama et al., 2009) (CEMIB / UNICAMP, Campinas, Brasil). Os animais tinham
entre 8 e 12 semanas de idade no começo do estudo e pesavam 29,5 gramas em média (variando
entre 23,6 e 35,4 gramas). Foram colocados em gaiolas de policarbonato, em grupos de cinco,
separados aleatoriamente, e mantidos em ambiente ventilado, com temperatura controlada (22±1ºC)
e ciclos de claro / escuro de 12 / 12 horas, com acesso livre a água e ração apropriada
(Nuvilab/CR1, Nuvital Nutrients LTDA, Brasil).
2.2 Exposição experimental ao etanol
Após 10 dias de ambientação, 20 animais foram submetidos a períodos seqüenciais de
adaptação à ingestão alcoólica, utilizando-se solução de sacarose (leite condensado a 4,5%),
adicionado de solução aquosa de etanol nas concentrações de 2%, 4%, 6%, 8%, 10%, e então 15%
(V/V) (Reagen-Quimibrás Indústrias Quimicas S.A., Rio de Janeiro, Brasil), durante um período de
cinco dias para cada concentração, mantendo-se a oferta de água e ração ad libitum. Nesse ponto,
10 camundongos foram aleatoriamente escolhidos para proceder em outra semana de adaptação a
solução aquosa de sacarose acrescida de 40% de etanol. Ao atingir a concentração esperada de
etanol (15% ou 40%), a sacarose foi retirada, mantendo-se esta concentração de etanol para
desenvolvimento dos padrões de dependência alcoólica. Então, os dois grupos obtidos,
denominados EtOH15% e EtOH40%, foram submetidos à exposição às soluções alcoólicas por
mais seis meses, sendo continuamente monitorado o consumo médio de solução alcoólica em cada
grupo. A concentração final para os grupos experimentais foi determinada procurando-se mimetizar
a exposição humana a bebidas fermentadas e destiladas. Para obter dados basais, 10 camundongos
foram mantidos somente com água e ração ad libitum durante todo o experimento, alocados no
grupo denominado controle. Ao final do período experimental, os animais foram sedados por
exposição a éter etílico e então sacrificados por deslocamento cervical, seguindo as normas do
Colégio Brasileiro de Experimentação Animal, procurando reduzir ao máximo o sofrimento dos
animais.
2.3 Obtenção e processamento de amostras biológicas
Após a remoção cirúrgica da língua dos animais mediante incisão submentoniana na linha
média do assoalho bucal, tais amostras foram examinadas macroscopicamente para identificação de
possíveis alterações evidentes e fixadas em solução de formol a 10% por um período de 24 horas.
Estas peças foram então seccionadas no sentido perpendicular ao longo eixo da língua, em três
partes com espessura craniocaudal similar, obtendo-se então amostras apicais, médias e posteriores
do órgão. Seguiu-se por processamento histológico de rotina, com emblocamento em parafina
histológica e microtomia para obtenção de secções teciduais com 3µm de espessura, dispensadas
em lâminas previamente tratadas com silano (3-aminopropiltrietoxi-silano), para ensaios
posteriores.
2.4 Avaliação histopatológica
3
Para cada camundongo, uma lâmina foi corada em hematoxilina e eosina. Inicialmente,
foram avaliadas qualitativamente, em busca de possíveis alterações displásicas no tecido epitelial
(Gale et al., 2005 IN Barnes et al., 2005), mediante uso de microscópio Nikon Eclipse E-400, em
objetivas de 10×, 20× e 40× de magnificação. Em seguida, realizou-se morfometria do epitélio para
identificar possíveis alterações hipertróficas e hiperplásicas que pudessem ser associadas ao
consumo de álcool. Para esse intento, foi eleita a porção ventral e lateral, não papilar, da língua,
tendo em vista que estas são regiões não protegidas por ceratina e, teoricamente, mais susceptíveis
ao efeito da substância. Para cada amostra, toda essa extensão foi então fotografada no mesmo
microscópio descrito anteriormente, em objetivas de 40× de magnificação. Com o auxílio de um
software específico (ImageJ), em cada imagem foram traçadas cinco linhas eqüidistantes e
perpendiculares à camada basal do epitélio. Tais linhas partiram do aspecto basal das células basais,
idealmente seguindo o longo eixo dessas células, até o limite externo da camada de queratina. Para
cada amostra, o comprimento médio de tais linhas em todos os campos histológicos fotografados foi
então tomado como medida da espessura epitelial.
2.5 Imunoistoquímica
Para a evidenciação imunoistoquímica do antígeno metalotioneína, empregou-se a técnica de
estreptavidina-biotina-peroxidase com recuperação antigênica em microondas com tampão EDTA
(1mM, pH 8,4), utilizando-se anticorpo monoclonal E9, diluído a 1:800 (Dako, Carpinteria, EUA).
A marcação nas camadas basal e parabasal do próprio epitélio de revestimento, além de eventuais
células mioepiteliais de glândulas salivares menores presentes nas amostras, foi considerada como
controle positivo interno. A omissão dos anticorpos primários foi empregada como controle
negativo.
Para análise quantitativa da marcação da metalotioneína, procedeu-se a rotina similar à
descrita para a avaliação das lâminas coradas em hematoxilina e eosina. Especificamente, além da
espessura total do epitélio, foi também mensurada a espessura do tecido apresentando marcação.
Em ambas as avaliações (espessura total e espessura positiva), as retas originais foram sempre
sobrepostas. Para cada par de retas, a proporção entre a espessura positiva e a espessura total foi
considerada para determinar o índice de marcação. Finalmente, a média de todos os pares avaliados
para cada amostra foi considerada como índice final para cada animal.
2.6 Análise Estatística
Para identificar possíveis diferenças na média de espessura epitelial e do índice de marcação
de metalotioneína entre os grupos avaliados, foi realizado teste de Kruskal-Wallis. Buscando
identificar possível correlação entre a espessura epitelial e o índice de marcação de metalotioneína,
foi executado teste de Spearman, considerando-se todas as amostras ou as amostras separadas por
grupos. Probabilidade de hipótese nula verdadeira menor que 5% foi considerada estatisticamente
significativa.
3. RESULTADOS
Durante o experimento, os animais do grupo EtOH40% consumiram, em média, cerca de
60% mais solução alcoólica que os do grupo EtOH15%. Conseqüentemente, houve um consumo
cerca de quatro vezes maior de etanol no primeiro em relação ao segundo grupo. Por outro lado, o
consumo de água foi muito similar, no mesmo período (Tabela 1).
4
Tabela 1 – Consumo de água, solução alcoólica ou etanol, por animal, nos grupos experimentais.
Consumo médio diário (mL)
Grupo
Água
Solução alcoólica
Etanol*
EtOH15% 3,5
2,3
0,4
EtOH40% 3,7
3,7
1,5
* Calculado multiplicando-se a quantidade consumida da solução pela concentração.
Macroscopicamente, nenhuma alteração evidente (integridade, contorno, consistência,
textura ou coloração) foi observada nas línguas dos animais avaliados. Da mesma forma, não foram
encontradas alterações microscópicas compatíveis com displasia epitelial ou qualquer outra lesão
caracterizável morfologicamente para esse tecido. Ainda, o epitélio mostrou estrutura usual, com
boa definição das camadas basal, parabasal, espinhosa, pavimentosa e ceratinizada, em todos os
animais, de todos os grupos. Quantitativamente, observou-se que a espessura epitelial total foi
muito similar entre os grupos avaliados (60,8 ± 6,3µm para grupo controle; 59,1 ± 9,6µm para
grupo EtOH15%; e 56,8 ± 9,8µm para grupo EtOH40%), não sendo identificada diferença
estatisticamente significativa entre os mesmos (p = 0,48, teste de Kruskal-Wallis), como
apresentado na Figura 1.
Figura 1 – Distribuição dos animais avaliados, segundo grupo e espessura epitelial (em µm) da região
dorsoventral da língua (barras centrais = média; suíças = desvio-padrão).
A marcação imunoistoquímica da metalotioneína, de forma geral para os três grupos
avaliados, foi evidenciada por coloração acastanhada, homogênea ou por vezes formando grumos
mais grosseiros. Esta marcação teve intensidade variável e foi localizada basicamente nas camadas
basal e parabasal, nuclear e, ou, citoplasmática, como mostrado na Figura 2.
5
Figura 2 – Segmento de mucosa ventrolateral da língua de camundongo C57BL/6, mostrando marcação
imunoistoquímica de metalotioneína. Observa-se coloração de intensidade moderada a forte, nuclear e citoplasmática,
nas camadas basal e parabasal (estreptavidina-biotina-peroxidase; magnificação original: 1600x).
De forma similar ao observado na análise da espessura epitelial, quantitativamente,
observou-se que o índice de marcação imunoistoquímica da metalotioneína foi muito semelhante
entre os grupos avaliados (0,37 ± 0,08 para grupo controle; 0,36 ± 0,02 para grupo EtOH15%; e
0,38 ± 0,07 para grupo EtOH40%), não sendo identificada diferença estatisticamente significativa
entre os mesmos (p = 0,56, teste de Kruskal-Wallis), como apresentado na Figura 3.
Figura 3 – Distribuição dos animais avaliados, segundo grupo e índice de marcação imunoistoquímica da
metalotioneína na região dorsoventral da língua (barras centrais = média; suíças = desvio-padrão).
Finalmente, não houve qualquer correlação significativa entre a espessura epitelial e o índice
de marcação da metalotioneína, tanto quando avaliados todos os animais em um único conjunto,
quanto quando avaliados por grupos, como mostrado na Figura 4.
6
Figura 4 – Análise de correlação entre a espessura (avaliada em hematoxilina e eosina) e o índice de marcação
imunoistoquímica do antígeno metalotioneína no epitélio lingual ventrolateral: a) de todos os animais avaliados; b) dos
animais do grupo controle; c) dos animais do grupo EtHO15%; d) dos animais do grupo EtOH40%.
4. DISCUSSÃO
O tabaco e o etanol têm sido apontados como os principais fatores de risco para câncer do
trato aerodigestivo superior, com aparente interação potencializadora entre eles. Várias
investigações têm abordado especificamente a interação biológica desses produtos na etiologia do
câncer da cavidade oral, faringe, laringe e esôfago (Franceschi et al, 1990). No presente trabalho,
foi avaliado se o consumo crônico de etanol, independentemente da associação com o tabaco,
levaria a alterações no epitélio lingual, aumentando ou não a probabilidade de ocorrência de
neoplasia nesta região.
Nos animais, variáveis genéticas e ambientais parecem determinar, interativamente, as
diferenças individuais na auto-administração de álcool. O presente estudo foi concebido respeitando
estes parâmetros (Chorilli, 2007), mantendo os animais em condições de temperatura e ciclo claro /
escuro semelhante às encontradas em meio externo. Além disso, foram utilizados animais que,
segundo a literatura, mostram maior predisposição ao consumo voluntário de etanol, e em maiores
quantidades, quais sejam, camundongos da cepa C57/BL6 (Yoneyama, 2008).
O presente artigo relata um modelo experimental de alcoolização crônica, contraposto à
quase totalidade de estudos avaliando exposição aguda (Bennett, 2006), delineado em função da
necessidade de obtenção de material biológico para investigações histopatológicas e moleculares,
necessárias para melhor compreensão da associação entre alcoolismo e câncer bucal. Nesse sentido,
é importante enfatizar que não eram esperadas alterações macroscópicas evidentes na mucosa
lingual dos animais estudados, tais como a formação de tumores ou de lesões cancerizáveis, o que
de fato não ocorreu; tendo em vista que estudos anteriores não evidenciaram o surgimento de lesões
(Al-Damouk, 1993). Não houveram diferenças significativas quanto às alterações microscópicas
relacionadas com a espessura epitelial média avaliada entre os grupos expostos à soluções de etanol;
o que também foi observado quando comparados os grupos expostos ao etanol em relação ao grupo
controle. Tal resultado sugere que não houve efeito significativo resultante da exposição do epitélio
ao álcool.
A definição da concentração de etanol nas soluções utilizadas neste experimento teve por
base o que ocorre com humanos, considerando-se que a concentração de 15% mimetizaria bebidas
fermentadas com alto teor alcoólico, como por exemplo o vinho, e a de 40% assimilaria bebidas
destiladas, podendo citar o whisky e a vodka. O período de consumo utilizado procurou
corresponder a aproximadamente 20 anos de exposição contínua na espécie humana, ou de um terço
da expectativa de vida dos animais, ainda que tal comparação careça de maior rigor cientifico
(Chorilli, 2007). Entretanto, a maior parte dos estudos sobre efeitos do etanol em animais
experimentais descreve efeitos agudos, e outros que se dedicam a efeitos crônicos apresentam
períodos de exposição variados, dificultando comparações mais precisas entre os resultados
descritos (Izzotti et al, 1998; Spanagel, 2005).
Neste estudo, assim com como encontrado na literatura (Camarini, 2004), houve um maior
consumo da solução de etanol quando a sacarose estava presente, durante a fase de adaptação dos
animais. Além disso, os animais que ficaram expostos à solução contendo uma maior concentração
de etanol (EtOH40%), consumiram uma quantidade significativamente mais elevada do que os
animais expostos a uma menor concentração de etanol (EtOH15%). Em relação ao consumo de
água, não houve diferenças significativas entre os grupos avaliados, mesmo ocorrendo um maior
consumo de solução de etanol no grupo EtOH40%. Quando comparados os consumos de água e da
solução de etanol dentro de um mesmo grupo, isoladamente, foi observada uma preferência pelo
consumo de água ao etanol, no grupo exposto à menor concentração de etanol (EtOH15%) de forma
significativa, o que não ocorreu no grupo exposto às mais altas concentrações de etanol
(EtOH40%), onde as quantidades consumidas de água e de solução de etanol foram equivalentes.
7
Muitas evidências sugerem atuação da metalotioneína no desenvolvimento do câncer, bem
como no desenvolvimento de resistência ao tratamento oncológico e, consequentemente, no
prognóstico da doença (Theocharis, 2003). A expressão da metalotioneína nos tecidos tumorais tem
sido, sobretudo, correlacionado com células tumorais com capacidade proliferativa ou com indução
da apoptose, e foi considerada como um ciclo celular dependente, sendo usada como um marcador
de proliferação celular em certos tipos de tumores. Alguns estudos têm examinado a expressão da
metalotioneína em certos tipos de câncer em relação aos parâmetros clínico-patológicos, capacidade
de proliferação do tumor, apoptose, resistência à drogas e à radiação e sobrevivência do paciente
(Theocharis, 2004).
No epitélio normal de revestimento da mucosa oral, a metalotioneína está localizada apenas
na divisão das células entre as camadas basal e parabasal. Nos ninhos de carcinomas bem
diferenciados, metalotioneína foi observada perifericamente às células tumorais localizadas, mas
não no centro dos ninhos, onde um aumento da taxa de apoptose foi encontrado. Áreas menos
diferenciadas apresentando metalotioneína positivamente, mas com pouca apoptose, sugeriram que
a metalotioneína pode inibir as células a entrar em apoptose, tanto no epitélio normal próximo da
base, quanto em regiões menos diferenciadas de carcinoma de células escamosas da língua
(Theocharis, 2004). No presente estudo, a evidenciação imunoistoquímica da metalotioneína foi
realizada para análise da quantidade de marcação por esta proteína no epitélio, a fim de estabelecer
uma relação quantitativa da expressão da metalotioneína nos grupos expostos ao etanol em relação
ao controle, e entre estes e o surgimento de neoplasias na língua de camundongos. Ao contrário do
ocorrido em semelhantes trabalhos com animais (Lambert, 2004) e em pesquisas em humanos
(Szelachowska, 2009), a marcação da expressão da metalotioneína encontrada neste experimento,
entre os grupos expostos às soluções de etanol, não revelou diferenças significativas, ou seja, a
quantidade de marcação encontrada no grupo EtOH15% foi muito próxima da quantidade
encontrada no grupo EtOH40%. O mesmo aconteceu quando comparados estes grupos expostos ao
etanol com o grupo controle, não havendo também diferenças quantitativas significantes entre todos
os grupos estudados. Dessa forma, o presente estudo não evidenciou relações entre o consumo
crônico de soluções de etanol em diferentes concentrações com a carcinogênese de língua.
5. AGRADECIMENTOS
Este trabalho recebeu apoio financeiro do CNPq (processo D-034/2008).
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ORAL CARCINOGENESIS: EFFECTS OF CHRONIC EXPOSURE TO
ETHANOL SOLUTIONS OVER MICE LINGUAL EPITHELUM
Talita Franco8
Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Odontologia. Av. Pará, 1720, CEP 38400-902, Uberlândia, MG.
[email protected]
Danilo Saleti França9
Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Odontologia.
[email protected]
Bianca Caroline Silva10
Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Odontologia.
[email protected]
Marcus Vinícios Caixeta11
Universidade Presidente Antônio Carlos, Curso de Biomedicina.
[email protected]
Paulo Rogério de Faria12
Universidade Federal de Uberlândia, Instituto de Ciências Biomédicas.
[email protected]
Sérgio Vitorino Cardoso13
Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Odontologia.
[email protected]
Adriano Mota Loyola14
Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Odontologia. Av. Pará, 1720, CEP 38400-902, Uberlândia, MG.
[email protected]
Abstract: Alcoholic beverages chronic consumption is an important factor associated with oral
cancer, but its effect on the biological mucosa is still unclear. Metallothionein is a protein with
neutralizing properties of genotoxic substances and is associated with a worse prognosis for
patients with oral cancer. C57BL/6J mice were submitted to ethanol consumption (15% or 40%) for
six months. Next, we evaluated the metallothionein immunohistochemistry expression in lingual
mucosa of the animals. There was no statistically significant differences in the thickness of the
lingual epithelium when compared groups under alcoholization, or between them and a control
group. The same occurred with the marking of the amount of metallothionein in the epithelium,
comparing the groups exposed to ethanol and the control group. The observed results sugests that
other mecanisms are related to oral carcinogenesis due to etanol.
Key-words: Ethanol, oral cancer, C57BL/6J, metallothionein.
8
Aluna de Graduação.
Aluno de Mestrado.
10
Cirurgiã-dentista, colaboradora.
11
Aluno de Graduação.
12
Professor Adjunto.
13
Professor Adjunto, orientador.
14
Professor Associado.
9
10
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