Orientando o Cirurgião-Dentista Carlos Eduardo de Meo Garrote Ortodontista, Espec. em DTM e Dor Orofacial. Membro do Programa de DTM e DOF do Centro de Pesquisas Odontológicas São Leopoldo Mandic Marcelo Lucchesi Teixeira Prof. Dr. da Faculdade de Odontologia São Leopoldo Mandic, Área de Prótese, DTM e Dor Orofacial Juliana Cama Ramacciato Prof. Dr. da Faculdade de Odontologia São Leopoldo Mandic, Área de Farmacologia, Anestesiologia e Terapêutica Rogério Heládio Lopes Motta Prof. Dr. da Faculdade de Odontologia São Leopoldo Mandic, Área de Farmacologia, Anestesiologia e Terapêutica Orientando o Cirurgião-Dentista Antidepressivos em Odontologia: indicações e cuidados 1. Atualmente, quais são os medicamentos utilizados no controle e tratamento das Desordens Temporomandibulares (DTM)? O uso de medicamentos para controle e tratamento das DTM tem se destacado nos últimos anos, demonstrando resultados clínicos significativos2, 12, 3. Dentre os medicamentos utilizados, diferentes classes farmacológicas têm sido empregadas no tratamento das DTM, tais como analgésicos (opiáceos e não opiáceos) e antiinflamatórios (esteroidais e não esteroidais). Outras classes medicamentosas também têm sido avaliadas, como por exemplo, os benzodiazepínicos (Diazepam-Vallium®), que possuem indicações mais específicas dentro das DTM (casos de mialgia crônica) 11,13, assim como os anticonvulsivantes, que são medicamentos utilizados para tratar desordens convulsivas, onde trabalhos mais recentes mostram seu significativo papel no controle das dores crônicas1,3. Nos casos de pontos gatilhos musculares (“trigger points”), os anestésicos locais sem vasoconstritores são utilizados para diagnóstico e controle da dor localizada dentro do músculo 7. Alguns estudos clínicos também têm demonstrado o importante papel dos relaxantes musculares e antidepressivos em doses baixas no controle das DTM 12, 10, 5, 3. Classe farmacológica 2. Dentre os medicamentos utilizados nas DTM, qual é o papel dos antidepressivos? Estas drogas têm provado benefícios em uma ampla gama de condições dolorosas, incluindo cefaléias primárias (cefaléia tipo tensão), desordens musculoesqueléticas crônicas (dor miofascial, fibromialgia) e algumas desordens de dor neuropática (odontalgias atípicas, neuralgia pós herpética, neuralgia traumática do trigêmeo)4. Os antidepressivos são agrupados em 3 categorias principais: antidepressivos tricíclicos (ADT); inibidores da monoaminoxidase (IMAO) e inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS)3. Dos 3 grupos, os ADT são os mais comumente prescritos para casos de dor crônica, ou seja, os mais indicados dentro da odontologia. Os ADT quando usados no manejo de um paciente de dor crônica, podem diminuir a dor assim como o apertamento dental noturno, e fornecer algum efeito de relaxamento muscular. Quanto maior a atividade nos receptores serotoninérgicos de um ADT (Tryptanol®, Amitryl®), maior é a sua indicação para melhorar a qualidade de sono e apertamento dental noturno. A ciclobenzaprina (Miosan®), um relaxante musculoesquelético, tem uma estrutura tricíclica similar a da amitriptilina e pode ser substituída por ela em baixas doses, principalmente quando o paciente não apresenta alteração de humor9. Os principais ADT utilizados nas DTM e suas doses utilizadas estão descritas na tabela 1. Apresentação comercial Analgesia (modulação da dor) Sedação Relaxamento muscular Efeitos autonômicos Arritmia cardíaca Possíveis Efeitos no bruxismo e no sono * Ciclobenzaprina (relaxante muscular) Miosan® Mirtax® Cizax® Musculare® ++++ ++++ ++++ +++ ++ ++++ Amitriptilina (ADT) Tryptanol® Amytril® Neoamtriptilina® ++++ +++ ++ +++ +++ +++ Nortriptilina (ADT) Pamelor® ++ ++ + + + + Imipramina (ADT) Tofranil® +++ +++ ++ +++ ++ ++ Prozac®, Zoloft®, Ciatalopran®, Daforin®, Aropax® + _ _ _ _ _ ** Inibidores Seletivos da recaptação da serotonina ++++ intenso; +++ moderado; ++ leve; + muito leve; *ausência de evidencia; – apenas relato de paciente (questionário); ** parece aumentar a atividade do bruxismo do sono TABELa 1 Comparação entre RM (relaxante muscular) / ADT (antidepressivo tricíclico) / ISRS (inibidores seletivos de recaptação de serotonina): Uso racional de fármacos no controle e tratamento da DTM 294 REV ASSOC PAUL CIR DENT 2010;64(4):294-5 3. Quais os cuidados que o Cirurgião-Dentista deve ter ao prescrever um antidepressivo? Em geral, quando se deseja prescrever um ADT para DTM e dor neuropática é aconselhável iniciar com uma dose baixa durante a noite, e essa dose poderá ser aumentada, até que o efeito desejado seja atingido. Deve-se considerar interações medicamentosas, bem como seus efeitos colaterais (xerostomia, por exemplo). Esses medicamentos são geralmente utilizados em dose única, aproximadamente de uma a duas horas antes de dormir. Entretanto, se os sintomas são controlados pela manhã e retornam durante o final do dia, o horário da dose pode ser alterado em função de um maior conforto para o paciente3. Muitos pacientes estão atualmente administrando ISRS como a fluoxetina (Prozac®), sertralina (Zoloft®) ou paroxetina (Aropax®) para combater a depressão e outros quadros. Essas drogas tendem a ser mais estimulantes e menos sedativas que os ADT e são geralmente tomadas pela manhã e não antes de dormir para evitar eventos adversos na qualidade do sono. Por essa razão, elas não são recomendadas para controlar o apertamento dentário noturno. Além disso, os ISRS podem não exibir os mesmos efeitos analgésicos como os ADT e parecem não ser tão efetivos para controle da dor crônica como são para a dor neuropática. Quando a dosagem necessária para alívio da dor alcançar o nível de efeito antidepressivo, ou se o paciente apresentar-se severamente deprimido é aconselhável a indicação para acompanhamento de um médico psiquiatra9. Outro cuidado que o CD deverá considerar a respeito do uso dos antidepressivos refere-se à ocorrência de bruxismo do sono8. Isto geralmente acontece nos pacientes que utilizam ISRS com dosagens para o controle de humor (quadro depressivo), quando prescritos por psiquiatras, o que torna necessária uma avaliação clínica criteriosa nos pacientes que utilizam estes medicamentos nestas condições. A figura 1 mostra o desgas- te do esmalte dental de um paciente com bruxismo do sono em decorrência do uso crônico de ISRS. Os ISRS tornaram-se o grupo mais prescrito mundialmente para depressão14 devido seu melhor perfil terapêutico, menores efeitos colaterais que os ADT e ausência de restrições alimentares (alimentos que contém tiramina, como por exemplo, queijos e vinhos dentre outros), necessária com a terapia de IMAO. São os ADT e os ISRS que tem mostrado o melhor benefício em pacientes com dor crônica6. Para prescrever antidepressivos, o CD deverá fornecer ao paciente a Receita de Controle Especial, antigamente chamada receita carbonada, com os cuidados mencionados na portaria 344/98 da ANVISA. O Cirurgião-Dentista pode e deve utilizar a farmacoterapia como coadjuvante, e não como única ferramenta no controle e tratamento das DTM. Entretanto, o cirurgiãodentista deverá conhecer e considerar o risco de efeitos colaterais, interações medicamentosas, seus possíveis efeitos adversos bem como os seus benefícios da associação destes medicamentos, ou seja, é primordial que o CD considere a etiologia multifatorial das DTM para a utilização destes medicamentos nos casos devidamente selecionados. FIGURA 1 Caso de bruxismo do sono em paciente de 43 anos do gênero masculino, com uso crônico de ISRS REFERÊNCIAS 1. Dionne RA. Pharmacologic approaches. In: Laskin DM, Greene CS, Hylander WL, editors. TMDs: an evidence-based approach to diagnosis and treatment. Hanover Park (IL): Quintessence Publishing Co, Inc.; 2006. p. 347–57. 2. Herman CR, Schiffman EL, Look JO, et al. The effectiveness of adding pharmacologic treatment with clonazepam or cyclobenzaprine to patient education and self-care for the treatment of jaw pain upon awakening: a randomized clinical trial. J Orofac Pain 2002;16(1):64–70. 3. Hersh E, Ramesh B, Andres P et al. Pharmacologic Management of Temporomandibular Disorders. Oral Maxillofacial Surg Clin N Am 20 (2008) 197–210. 4. Kantor TG. Pharmacology and mechanisms of some pain relieving drugs. Headache Quart 1993; 4 (1): 57-62. 5. Kimos P, Biggs C, Mah J, et al. Analgesic action of gabapentin on chronic pain in the masticatory muscles: a randomized controlled trial. Pain 2007; 127(1–2):151–60. 6. Mico JA, Ardid D, Berrocoso E, et al. Antidepressants and pain. Trends Pharmacol Sci 2006;27(7): 348–54. 7. Okesson JP. Tratamento das desordens temporomandibulares e oclusão. São Paulo: Artes médicas; 2000. 8. Osman Sabuncuoglu, MD;1 Ozalp Ekıncı, MD;2* Meral Berkem, MD3. Spec Care Dentist 29(5): 215-217, 2009 9. Pertes R. Tratamento clínico das disfunções temporomandibulares e da dor orofacial. Quintessence editora ltda, 2005. 10. Rizzatti-Barbosa CM, Martinelli DA, Ambrosano GM, et al. Therapeutic response of benzodiazepine, orphenadrine citrate and occlusal splint association in TMD pain. Cranio 2003;21(2):116–20. 11. Singer EJ, Dionne RA. A controlled evaluation of diazepam and ibuprofen for chronic orofacial pain. J Orofac Pain 1997;11:139–47. 12. Svensson P, Wang K, Lars N. Effect of muscle relaxants on experimental jaw-muscle pain and jaw-stretch reflexes: a double-blind and placebocontrolled trial. European Journal of Pain 7 (2003) 449-456. 13. Taylor DJ, Mallory LJ, Lichstein KL, et al. Comorbidity of chronic insomnia with medical problems. Sleep 2007;30(2):213–8. 14. The top 300 prescriptions for 2005 by number ofUS prescriptions dispensed. Available at: http://www.rxlist.com/top300.htm. Accessed April 04, 2007. Rev assoc paul cir dent 2009;632010;64(4):294-5 295