UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CURSO DE MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO PÚBLICA PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE KATIA MARIA TAVARES DA SILVA DESAFIOS DO CRESCIMENTO INDUSTRIAL PARA A GESTÃO DA EDUCAÇÃO EM GOIANA/PE RECIFE 2015 KATIA MARIA TAVARES DA SILVA DESAFIOS DO CRESCIMENTO INDUSTRIAL PARA A GESTÃO DA EDUCAÇÃO EM GOIANA/PE Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Gestão Pública Para Desenvolvimento do Nordeste, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Gestão Pública. Orientador: Prof. Dr. Denilson Bezerra Marques RECIFE 2015 Dissertação de Mestrado apresentada por Katia Maria Tavares da Silva ao Curso de Mestrado Profissional em Gestão Pública para o Desenvolvimento do Nordeste, da Universidade Fedederal de Pernambuco, sob o título: “Desafios do crescimento industrial para a Gestão da Educação em Goiania/PE” orientada pelo professor Denilson Bezerra Marques e aporvada pela Banca Examinadora formada pelos professores doutores: Prof. Dr. Denilson Bezerra Marques Presidente Profa. Dra. Cátia Wanderley Lubambo Examinadora Interna Prof. Dr. Edson Francisco de Andrade Examinador Externo Recife, 26 de fevereiro de 2015. Profa. Dra. Alexandrina Saldanha Sobreira de Moura Coordenadora Aos meus filhos Dora e Pedro. AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus. Sua presença é o meu sustento. A todos meus agradecimentos: Aos amigos da Biblioteca Setorial de Educação, do Sistema de Bibliotecas da UFPE e Centro de Educação. Obrigada pelo espaço de partilha das experiências vividas no Mestrado. Aos amigos, Adriana, Alessandra, Elisa, Ingrid, Janeide, Nísea e Régis, que ao me ouvirem contribuíram para esta construção. As amigas Andréa, Karine, Lígia e Susana, pelo carinho da amizade. Aos amigos da turma 12, do Mestrado em Gestão Pública, em especial a Andrea, Maria, Patrícia, Sueli, Joyce, Reginaldo, Fernanda, Renata e Marcelo. Obrigada a todos. Ao meu orientador, professor Denilson Marques, pelas contribuições na orientação e no Grupo de estudo, e por sua paciência e humildade em me acompanhar nesta caminhada. Aos professores Cátia Lubambo e Edson Francisco de Andrade, pelas contribuições que promoveram meu aprendizado. A contribuição imensa dos sujeitos da pesquisa. Institucionalmente representados pela Secretaria Municipal de Educação de Goiana, Conselho Municipal de Educação de Goiana, Sindicato dos Professores do Município de Goiana e Câmara Municipal de Vereadores de Goiana. A minha família, que sem o apoio de vocês não teria conseguido. Meus irmãos Kassiano e Kassia. Minha mãe Noêmia, pela dedicação em cuidar dos meus pequenos, durante minhas ausências. Obrigada! Meu esposo Sérgio, o teu amor fortaleceu a minha caminhada. Meus filhos Dora e Pedro. A presença de vocês renova minha vida e esperanças. Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem. Hebreus 11:1 RESUMO O crescimento industrial do município de Goiana/PE e as implicações locais para a gestão da educação, é o tema central na investigação que apresentamos. O objetivo da pesquisa é analisar as mudanças do crescimento industrial para a gestão da educação no município. Considerações sobre o estabelecimento de políticas públicas para educação, que embasaram a pesquisa, apontam a pluralidade de relações, a rede de articulações e as reformas políticas, história, arranjos locais e financiamento de políticas públicas, como temas que permeiam a discussão (AZEVEDO, 2001; BALL, 2001; BURBULES E TORRES, 2004; LINGARD, 2004). Estas questões fortalecem a pesquisa da realidade municipal e suscitam o questionamento sobre como as questões econômicas, culturais e políticas locais se articulam e como a gestão da educação tem construído respostas no cenário de crescimento industrial. Para o levantamento de dados, realizamos observação local, entrevistas com atores da gestão da educação e análise de informações constantes em documentos. Na interpretação dos dados buscamos apropriar as discussões do quadro teórico ao conjunto de informações coletadas nas entrevistas e documentos. Aprofundamos as discussões teóricas a partir das categorias de análise proposta na concepção teórica de Giddens (1991). Constatamos que a elaboração da política educacional no município, promoveu mudanças com a instituição de instrumentos legais e Plano decenal, contudo, a política educacional se efetiva na execução de políticas planejadas pela União e pelo Estado. A ausência de planejamento, questões estruturais como a oferta inadequada de ensino, inexistência de gestão democrática e canais de participação, implicam na construção de respostas às demandas sociais historicamente constituídas e as do contexto mais recente. Dessa forma, consideramos a necessidade da gestão local promover o planejamento em consonância com o fortalecimento de canais de participação social, necessárias ao atendimento de demandas sociais que se apresentam. Palavras-chave: Gestão da educação. Gestão pública. Política educacional. ABSTRACT Goiana‟s, PE, industrial growth and its local implication to education management, is the main theme of the presented investigation. The objective of the research is to analyze the changes of the industrial growth regarding the city‟s education management. Considerations about the enforcement of public policies to education, that support the research, point the plurality of relations, the web of articulations, the political and historical reforms, local arrangements and funding of public policies, as topics that permeate the discussion (AZEVEDO, 2001; BALL, 2001; BURBULES E TORRES, 2004; LINGARD, 2004). These questions strengthen researches of the city‟s reality and promote the questioning about how local economic, cultural and political matters are articulated and how the education management have been developing answers in the industrial growth scenery. To gather data, there were local observations, interviews with the actors of the management of education and analysis of constant information in documents. To interpret data we worked to appropriate the discussions of the theoretical framework to the amount of collected information in interviews and documents. We deepened theoretical discussions from the analysis categories proposed in Giddens‟ (1991) theoretical conception. It was found that the elaboration of educational policies in a city, promoted changes with the institution of legal instruments and ten-year plan, however the tools of local planning are highlighted without relating with education management practice and the educational policies of the city effectively highlight the execution of policies planned by the Union and the State. The lack of planning structural matters, such as the inadequate offer of education, the inexistence of democratic management in the schools and participation nets, infer in the developing of answers to the social demands historically constituted and the ones of the most recent context, from industrial growth. Therefore, we considered the need of the local management to promote the planning in consonance with the strengthening the social participation nets, necessary to the attending of social demands presented. Keywords: Education management. Public management. Educational policy. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Município de Goiana na Região da Mata Norte de Pernambuco ...................... 19 Figura 2 - Mapa rodoviário da Região da Mata Norte de Pernambuco ............................. 20 Figura 3 - Organograma da Secretaria de Educação do Município de Goiana ................. 77 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade, conforme o censo 2000.......................................................................................................... 21 Gráfico 2 - Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade, conforme o censo 2010.......................................................................................................... 21 Gráfico 3 - Fluxo Escolar por Faixa Etária - Goiana - PE - 1991/2000/2010 .................... 24 Gráfico 4 - Escolaridade da população de 25 anos ou mais de Goiana - 1991 .................. 25 Gráfico 5 - Escolaridade da população de 25 anos ou mais de Goiana - 2000 .................. 26 Gráfico 6 - Escolaridade da população de 25 anos ou mais de Goiana - 2010 .................. 26 Gráfico 7 - Frequência escolar para o grupo etário de 18 a 24 anos.................................. 27 Gráfico 8 - Taxa de Atividade e de Desocupação 18 anos ou mais - 2010 ......................... 28 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Relação de entrevistados ..................................................................................... 18 Quadro 2 – Índice de Desenvolvimento Humano Municipal e seus componentes – Goiana/PE ............................................................................................................ 23 Quadro 3 – Empreendimentos industriais em funcionamento na Região da Mata Norte do Estado de Pernambuco .................................................................................. 30 Quadro 4 – Empreendimentos industriais em fase de implantação na Região da Mata Norte do Estado de Pernambuco ....................................................................... 32 Quadro 5 – Documentos Legais da Educação ....................................................................... 107 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 13 1.1 PROBLEMA DE PESQUISA E OBJETIVOS ................................................................. 15 1.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ...................................................................... 16 2 O MUNICÍPIO DE GOIANA ........................................................................................ 19 3 DESCONTINUIDADES E REFLEXIVIDADE: PERSPECTIVA TEÓRICA NA ABORDAGEN SOCIAL DE GIDDENS ....................................................................... 34 3.1 CONTRIBUIÇÃO DA TEORIA SOCIAL DE GIDDENS PARA A PESQUISA EM GESTÃO DA EDUCAÇÃO ............................................................................................. 34 3.2 INSTITUIÇÕES MODERNAS NA TEORIA SOCIAL DE GIDDENS ......................... 39 4 GLOBALIZAÇÃO E EDUCAÇÃO .............................................................................. 43 4.1 REFORMA DA GESTÃO PÚBLICA E GERENCIALISMO ......................................... 52 4.2 DESCENTRALIZAÇÃO E POLÍTICA EDUCACIONAL ............................................. 55 4.2.1 Regime de colaboração ................................................................................................... 61 4.2.2 Políticas de Financiamento ............................................................................................. 63 5 PODER LOCAL ............................................................................................................. 70 6 A GESTÃO DA EDUCAÇÃO NO MUNICÍPIO DE GOIANA ................................. 75 6.1 A POLÍTICA EDUCACIONAL NO MUNICÍPIO DE GOIANA/PE ............................. 75 6.2 PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO ......................................................................... 85 6.3 REGIME DE COLABORAÇÃO E OUTRAS FORMAS DE ARTICULAÇÃO E COOPERAÇÃO ................................................................................................................ 92 6.4 GESTÃO DA CLASSE DOCENTE ................................................................................. 98 6.5 FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO .......................................................................... 103 6.6 INSTRUMENTOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO NO MUNICÍPIO DE GOIANA: LEIS E REGIMENTOS ............................................................................................................ 107 6.7 DESAFIOS DO CRESCIMENTO DOS SETORES PRODUTIVOS PARA A GESTÃO DA EDUCAÇÃO EM GOIANA/PE .............................................................. 109 7 DESCONTINUIDADES E REFLEXIVIDADE: PANORAMA DA GESTÃO EDUCACIONAL NO MUNICÍPIO DE GOIANA/PE ............................................... 117 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 124 REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 127 APÊNDICES................................................................................................................... 133 13 1 INTRODUÇÃO A gestão de políticas educacionais no âmbito municipal é enfatizada no que diz respeito à necessidade de conhecimentos mais específicos sobre a realidade social, participação e efetividade das políticas públicas. A gestão municipal materializa esse entendimento que No caso dos Dowbor considera na discussão sobre a perspectiva do poder local nos países subdesenvolvidos. O autor registra que: países subdesenvolvidos, a questão se reveste de particular importância na medida em que o reforço do poder local permite, ainda que não assegure, criar equilíbrios mais democráticos frente ao poder absurdamente centralizado das elites. (DOWBOR, 2008, p. 5). A discussão desenvolvida por Dowbor relaciona o poder local às mudanças que envolvem participação, descentralização e desburocratização. A evidenciação do papel do poder público municipal, no tratamento apontado pelo autor, toma centralidade com as reformas da educação promovidas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), conforme a qual a participação da gestão municipal é destacada na construção de políticas públicas locais. Neste quadro a pesquisa sobre a gestão municipal nutre o conhecimento sobre o desenvolvimento de tais mudanças promovidas no contexto municipal. O movimento de construção, que é próprio de cada local é permeado pela história, por aspectos econômicos, sociais, culturais que incidem sobre a construção da agenda da gestão no município. Respostas construídas pelo poder público local têm visibilidade pós reforma. A gestão local tem, entre outras questões, a possibilidade de instituição do sistema de ensino e, além disso, responsabilidades diante da descentralização financeira também são atribuídas nesse contexto. Sobre a discussão Colares menciona que: Note-se que, traçadas as possibilidades que a União e os Estados ofereçam, cabe às prefeituras municipais, via secretários de educação, estabelecer os mecanismos de aplicação, procurar parcerias, estabelecer convênios e buscar diferentes formas de suporte para o desenvolvimento das ações previstas. (COLARES, 2005, p. 141). A discussão apresentada enfatiza as novas competências da gestão municipal, diante do contexto da descentralização. As responsabilidades da gestão são fortemente caracterizadas 14 em concordância com a realidade financeira local, o que dá evidências e responsabilidades ao poder público local. Vale salientar outra dimensão sobre a evidência do poder local, que relaciona a descentralização na construção de políticas públicas de educação influenciadas ao esgotamento do projeto desenvolvimentista e pela globalização da economia. Sobre essa dimensão Sarmento menciona que: O incentivo à descentralização faz parte do intento neoliberal de desonerar o governo federal, que centraliza os recursos e repassa responsabilidades tanto a governos estaduais, como a governos municipais e, também, a Organizações Não-Governamentais (ONGs). (SARMENTO, 2005, p. 1373). Se, por um lado, as orientações da política local ganham centralidade, por outro lado há uma questão de fundo mais ampla relacionada às influências de diretrizes políticas no âmbito global. A autora também evidencia contrapontos à discussão sobre a influência da política neoliberal e registra que: “Nas últimas décadas, vários municípios têm realizado propostas inovadoras e buscado alternativas para diminuir as diferenças sociais em seu âmbito e a educação tem se mantido como uma questão prioritária nos discursos políticos” (SARMENTO, 2005, p. 1386). O entendimento é que a divisão de competências que evidencia o poder local abre também possibilidades de maior participação social nas decisões da política local. Dessa forma, a investigação da gestão local desvela questões sobre a realidade de tais orientações em um contexto próprio de cada município. O crescimento industrial no município de Goiana, que é uma característica recente do município, fortalece a investigação nesse contexto de mudanças com o crescimento industrial. Uma nova agenda para a gestão local da educação se estabelece relacionada à transição entre o contexto agropecuário para o industrial. Percebemos que lacunas sobre o conhecimento de tais mudanças registradas nos veículos de comunicação não elucidavam detalhes sobre aspectos organizativos da gestão da educação no município. Isso se tornou significativo para a consolidação do interesse sobre esse tema. A pesquisa apresenta mudanças para a gestão da educação, estabelecidas no contexto de crescimento industrial no município, a partir da concepção de atores da gestão da educação local. O estudo que apresentamos não delimita período de análise, contudo o cenário de crescimento que identificamos está correlacionado a Agenda de Desenvolvimento Regional do estado de Pernambuco, que inicialmente se estabelece com a implantação da Hemobrás em 2010 e a investigação de campo se realizou nos meses de outubro a dezembro de 2014. As 15 mudanças que apontamos incidem sobre a construção de uma nova agenda para as ações da gestão da educação. Esse quadro apresenta um movimento de mudanças iniciais em curso que possibilitam novas investigações. 1.1 PROBLEMA DE PESQUISA E OBJETIVOS A gestão municipal da educação, diante das responsabilidades atribuídas na LDB, como a articulação com o Estado e a União, a gestão democrática com a participação da comunidade, a atuação de outras instituições como os Conselhos Municipais, entre outras questões, evidencia estratégias para a efetivação de uma política educacional voltada para o fortalecimento da gestão local. As discussões sobre as responsabilidades da gestão municipal ganham um novo relevo diante de aspectos da realidade de cada município. Consideramos que o município de Goiana se constitui em um ambiente favorável a esta análise, por apresentar um quadro de mudanças socioeconômicas intensificado pelo crescimento do número de indústrias instaladas no município. Dessa forma, com o problema de pesquisa, buscamos responder ao questionamento: Como o contexto de crescimento industrial produz desafios para a gestão da educação em Goiana? Em Consideração a esse questionamento propomos o objetivo geral de: analisar os desafios do crescimento industrial para a gestão da educação em Goiana/PE. A partir da proposta de investigar os desafios apontados construímos os seguintes objetivos específicos: Caracterizar o município de Goiana e o contexto de construção da política educacional; Conhecer a estrutura de construção da política de educação; Identificar mecanismos de colaboração construídos no âmbito municipal; Apontar as implicações do crescimento industrial para a gestão da educação. Os objetivos que elencamos promovem o conhecimento sobre as responsabilidades atribuídas à gestão municipal por orientações legais, como a LDB, a descentralização e aspectos do próprio contexto da gestão municipal da educação de Goiana norteiam a investigação que realizamos. 16 1.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS A investigação que realizamos tem como foco o estudo da gestão municipal da educação. Em conformidade com os objetivos propostos, consideramos como fontes de informações: a consulta a atores envolvidos na gestão municipal e documentos sobre a política de educação no município. A abordagem qualitativa foi estabelecida como referencial de tratamento, para a compreensão dos dados que coletamos. Quanto aos métodos, a análise de conteúdo foi utilizada por permitir oportunidades para o conhecimento sobre os aspectos da produção documental e suas implicações. Para atender a essa orientação, a identificação inicial dos documentos que tratam das diretrizes da gestão educacional, foi introdutória na análise que desenvolvemos. A observação inicial e o levantamento de informações nutriram a necessidade de conhecimento sobre questões estruturais da política educacional como: o município tem sistema de ensino ou integra o sistema estadual? Quais instituições constituem as instâncias deliberativas da politica educacional? O que se registra nos documentos legais do município? Nessa etapa construímos o corpus1 da pesquisa documental. Nessa fase percebemos correlações entre a instituição de um conjunto de leis municipais e o estabelecimento do sistema de ensino do município. A experiência que citamos se relaciona à concepção de análise de conteúdo registrada por Bardin (2004), que compreende a inferência sobre os aspectos do ambiente de produção da comunicação. Como ressalta a autora: “A intenção da análise de conteúdo é a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção (ou eventualmente, de recepção), inferência esta que recorre a indicadores (quantitativos ou não)” (BARDIN, 2004, p. 34). Concordamos que a evidenciação de aspectos sociais, culturais, entre outros, foi relevante à construção sistemática do conhecimento sobre problema que investigamos. Os fatores determinantes da produção mencionados é o contexto social da produção documental. Tomando como exemplo Goiana, a orientação teórica sobre a análise de conteúdo, fortaleceu a necessidade de conhecer práticas da política de educação local. A partir dessa discussão, consideramos a necessidade de conhecer a concepção da gestão através de atores da política local. Para tanto, a entrevista como fonte de dados complementou informações sobre a gestão municipal, para os procedimentos de análise. O levantamento de informações nessa fase buscou explorar a construção da política local, identificar os 1 Bardin (2004) trata como corpus da pesquisa o conjunto de documentos reunidos para o processo analítico. 17 mecanismos de interação mantidos pelo município e apontar as implicações do crescimento industrial para a gestão da educação. Para os procedimentos de seleção e análise dos documentos, atribuímos categorias de análise que subsidiassem interpretações para atender aos objetivos propostos como: Política de educação, Plano Municipal de Educação, Financiamento da educação, Gestão da Classe docente, são categorias de análise apresentada nessa pesquisa. Na construção do corpus da pesquisa documental, identificamos um conjunto de leis caracterizadas como “Marcos Legais da Secretaria de Educação do município de Goiana” 2. Essa publicação se constituiu no elemento orientador na identificação de documentos legais no momento inicial de levantamento de dados. Os documentos identificados nessa fase são elencados no Quadro 5 na página 107. No que se refere às entrevistas, observamos as orientações dos autores Laville e Dionne (1999), que mencionam a potencialidade desse instrumento em levantar informações do contexto. Os autores mencionam que: A flexibilidade adquirida permite obter dos entrevistados informações muitas vezes mais ricas e fecundas, uma imagem mais próxima da complexidade das situações, fenômenos ou acontecimentos, imagem cuja generalização será todavia delicada e exigirá cuidado e prudência por parte do pesquisador. (LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 190). A esse tipo de tratamento destacado, pelos autores, enfatiza a potencialidade na exploração de conhecimentos produzidos, por exemplo, por atores da gestão. O conhecimento adquirido por esse instrumento na visão dos autores se torna fecundo e possibilita o conhecimento de informações mais próximas. Dessa forma, a escolha desse instrumento se deve à flexibilidade para aprofundar o conhecimento sobre o quadro local, a partir da exploração da experiência de atores da gestão municipal da educação. O tratamento do conteúdo apresentado nas entrevistas é orientado igualmente pela análise de conteúdo. Para isso a construção do roteiro orientador das entrevistas pautou-se nos objetivos propostos na pesquisa. Em relação aos atores da gestão da educação no município que identificamos para entrevista, apresentam a seguinte vinculação institucional: a) Secretaria Municipal de Educação de Goiana. A consulta à Secretaria Municipal de Educação tinha por objetivo identificar dados que apresentassem a visão da instituição, como órgão executivo das políticas de Educação 2 GOIANA (Prefeitura). Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. 18 Básica no município. Esse objetivo não foi atingido através da entrevista. Contudo, o Secretário de Educação do município de Goiana, Horácio dos Reis Filho, respondeu aos questionamentos do roteiro de entrevista, que citamos ao longo da análise de dados. b) Câmara Municipal de Goiana Como órgão legislativo da administração municipal, identificamos objetivo de evidenciar o entendimento dessa instância sobre a construção da política local. c) Conselho Municipal de Educação O Conselho Municipal de Educação de Goiana (CMEG), assessora a Secretaria Municipal de Educação na construção de políticas locais. O Conselho apresenta funções de caráter normativo, deliberativo, consultivo e fiscalizador. Conhecer a concepção dessa instância é fundamentado pelo entendimento de que historicamente tal órgão se estabelece como mediador entre órgãos governamentais e sociedade e por fazer parte da construção da política de educação local. d) Sindicato dos Professores do Município de Goiana O Sindicato como instância que defende interesses dos profissionais do magistério, constituía relevância pelo caráter contestatório a ele atribuído. Dessa forma, a participação desse órgão subsidia a construção da pesquisa. Das instituições citadas, apresentamos abaixo quadro com a organização das entrevistas: instituições, atores e quantidades das entrevistas realizadas: Quadro 1 - Relação de entrevistados Instituição Câmara Municipal de Goiana Conselho Municipal de Educação Sindicato dos Professores do Município de Goiana Atores da política de Educação do município de Goiana Vereador Número de entrevista 01 Conselheiro Municipal de Educação 01 Presidente do Sindicato dos Professores de Goiana 01 Fonte:Kátia Maria Tavares da Silva (2015). A concepção metodológica que apresentamos contemplou os objetivos propostos. A reunião dos atores entrevistados teve o propósito de ampliar o conhecimento sobre a gestão da educação no município diante das mudanças do crescimento industrial. Os dados levantados a partir dessa concepção metodológica forneceu lastro para o conhecimento que apresentamos nesse estudo, diante das mudanças em curso que identificamos no município de Goiana. 19 2 O MUNICÍPIO DE GOIANA O município pernambucano de Goiana faz parte da Região de Desenvolvimento da Mata Norte (RD Norte) do estado. A divisão de regiões administrativas manifesta o objetivo de enfatizar a regionalização associada ao planejamento de atividades para o desenvolvimento local. Os dados do município apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), registram que Goiana tem uma área de 501,881 quilômetros quadrados. A formação do distrito de Goiana data de 1568 (IBGE, 2014). No ano de 2005, ocorre uma divisão territorial que compreende o município com a reunião de três distritos: Goiana, Ponta de Pedras e Tejucupapo. Na figura 1, observamos o município na região da Mata Norte de Pernambuco. E na figura 2, o mapa rodoviário da Região da Mata Norte de Pernambuco. Figura 1- Município de Goiana na Região da Mata Norte de Pernambuco Fonte: CONDEPE/FIDEM. 20 Figura 2 - Mapa rodoviário da Região da Mata Norte de Pernambuco Fonte: Google mapas 2014. O município de Goiana dentro da região é evidenciado como um dos mais populosos. A população, no ano de 2010, era de 75.644 habitantes (IBGE, 2014), sendo 43.531 de população urbana. A taxa de urbanização para o mesmo ano é de 76,71% e a população rural corresponde a 17.619 habitantes. Os dados do IBGE registram que houve uma diminuição do percentual entre os anos de 2000 a 2010, para domicílios particulares permanentes com saneamento inadequado. No ano de 2000, o percentual dessa categoria era de 17,53%; no ano de 2010, esse percentual decresce para 8,69 %. Em relação a informações da demografia do município, os dados do IBGE demonstram: 21 Gráfico 1 - Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade, conforme o censo 2000 Fonte: Pnud, Ipea, Fundação João Pinheiro e Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil Gráfico 2 - Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade, conforme o censo 2010 Fonte: Pnud, Ipea, Fundação João Pinheiro e Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. As pirâmides etárias com dados dos censos 2000 e 2010 apresentam algumas mudanças no perfil demográfico municipal, com estreitamento na base e alargamento no meio da figura. Isso significa um aumento do contingente da população na faixa etária entre 15 e 64 anos. O 22 aumento do percentual desta faixa etária de 63,19% no ano 2000 para 67,27% em 2010 representa um aumento da taxa de envelhecimento. Os dados apresentados sintetizam uma visão geral sobre os aspectos demográficos e de infraestrutura. Contudo, outras análises fornecem uma visão sobre os aspectos dessas categorias no município: Goiana possui grandes contradições em relação aos serviços de infraestrutura urbana. O município, embora cortado por muitos rios e riachos, não possui um bom sistema de captação, armazenamento e distribuição de água para a população. [...] a grande quantidade de ruas não pavimentadas e consequentemente sem sistema de drenagem. Embora o cenário seja negativo existem obras em andamento que visam minimizar os efeitos negativos da ausência e precariedade de rede de coleta e tratamento de esgotos que contaminam o solo, as aguas e a população. (HEMOBRAS; FIOCRUZ, 2013, p. 37). A análise demonstra que os problemas de infraestrutura municipal são considerados como comuns de grande cidade e que transformações socioespaciais, os quais vêm ocorrendo na região, agravam os problemas desse quadro. Sobre os problemas elencados estão: Casas localizadas em áreas de risco (margens de rios e encostas); expansão urbana desordenada, ocasionando um processo de favelização de algumas áreas do município; infraestrutura precária de algumas casas que são construídas com materiais inadequados, como taipa e madeira, em áreas sem nenhuma estrutura. (HEMOBRAS; FIOCRUZ, 2013, p.38). A análise apresentada pela pesquisa esclarece que atrativos como oportunidades de trabalho, vinculados ao crescimento industrial, respondem por parte dessa expansão desordenada. Em relação ao Índice de Desenvolvimento Humano Municipal – (IDHM) para Goiana é de 0,651, em 2010. Esse índice situa o município no grupo de municípios com IDHM médio. O Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento (PNUD) analisa que: Entre 2000 e 2010, a dimensão que mais cresceu em termos absolutos foi Educação (com crescimento de 0,236), seguida por Longevidade e por Renda. Entre 1991 e 2000, a dimensão que mais cresceu em termos absolutos foi Educação (com crescimento de 0,126), seguida por Longevidade e por Renda. (NAÇÕES UNIDAS, 2014). A tabela reproduzida abaixo evidencia os dados que fazem parte da composição do IDH e também apresenta dados sobre o panorama da educação no município. 23 Quadro 2 - Índice de Desenvolvimento Humano Municipal e seus componentes - Goiana – PE IDHM e componentes 1991 2000 2010 IDHM Educação 0,214 0,340 0,576 % de 18 anos ou mais com ensino fundamental completo 19,98 28,75 47,80 % de 5 a 6 anos na escola 41,23 75,33 95,45 % de 11 a 13 anos nos anos finais do fundamental ou com fundamental 26,79 40,32 81,52 % de 15 a 17 anos com ensino fundamental completo 12,96 19,23 45,51 % de 18 a 20 anos com ensino médio completo 7,35 13,30 30,58 IDHM Longevidade 0,632 0,714 0,779 Esperança de vida ao nascer (em anos) 62,90 67,84 71,75 IDHM Renda 0,492 0,550 0,614 Renda per capita 170,58 245,01 364,77 completo Fonte: Pnud, Ipea, Fundação João Pinheiro e Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Sobre o IDHM de Goiana, a análise do PNUD menciona um crescimento do município significativo em relação à média estadual e à média nacional. Sobre essa evolução, a pesquisa por período registra que: Entre 2000 e 2010 O IDHM passou de 0,511 em 2000 para 0,651 em 2010 - uma taxa de crescimento de 27,40%. O hiato de desenvolvimento humano, ou seja, a distância entre o IDHM do município e o limite máximo do índice, que é 1, foi reduzido em 28,63% entre 2000 e 2010. Entre 1991 e 2000 O IDHM passou de 0,405 em 1991 para 0,511 em 2000 - uma taxa de crescimento de 26,17%. O hiato de desenvolvimento humano, ou seja, a distância entre o IDHM do município e o limite máximo do índice, que é 1, foi reduzido em 17,82% entre 1991 e 2000. Entre 1991 e 2010 Goiana teve um incremento no seu IDHM de 60,74% nas últimas duas décadas, acima da média de crescimento nacional (47%) e acima da média de crescimento estadual (52%). O hiato de desenvolvimento humano, ou seja, a distância entre o IDHM do município e o limite máximo do índice, que é 1, foi reduzido em 41,34% entre 1991 e 2010. (PNUD, 2014). A análise evolutiva do IDHM é importante para fomentar o debate sobre o desenvolvimento municipal. Como ressalta o PNUD (2014), o IDH é um índice sintetizador, que pode ser potencializado quando se consideram outros aspectos como: democracia, participação, equidade, sustentabilidade, entre outros. Sobre esses aspectos apontados na análise do IDH, constatamos lacunas que incidem sobre a análise do IDH. Aspectos como a 24 ausência de processo eletivo para os gestores das escolas municipais, ausência de atuação de Conselhos Escolares e problemas de sustentabilidade da política financeira da Secretaria de Educação são identificados nos relatos apresentados nas entrevistas. Esses aspectos levantados na análise de dados evidenciam sinais de uma estrutura que influencia a sustentabilidade de políticas públicas de educação e que tais questões tomam uma dimensão maior no cenário de crescimento industrial. Essa consideração é relacionada ao aumento de demandas por políticas públicas com o crescimento populacional do município, por exemplo. Os dados sobre frequência por faixa etária, que compõem o IDHM, representados no Quadro 2, são visualizados no gráfico 3 e demonstram percentuais para os períodos entre 1991 a 2010. Os percentuais para as faixas etárias entre 5 a 6 anos, e 11 a 13 anos, tiveram uma elevação mais significativa como observamos no gráfico 3. Gráfico 3 - Fluxo Escolar por Faixa Etária - Goiana - PE - 1991/2000/2010 Fonte: Pnud, Ipea, Fundação João Pinheiro e Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Por outro lado a análise da pesquisa participativa da Hemobrás e FioCruz, em relação a matrículas referentes ao ano de 2011, posterior ao intervalo apresentado no gráfico 3, considera que: 25 Em relação à educação infantil, o município apresentou uma baixa cobertura, segundo dados do censo escolar, em 2011 o número total de matriculas foi de 3.023, expressando uma cobertura de 49,6% (crianças na faixa de menor de 1 a 6 anos), destas 2.090 foram matriculadas na rede municipal (34%) e 963 (15,8%) na rede privada. (HEMOBRAS; FIOCRUZ, 2013, p. 99). A análise destaca lacunas na oferta de ensino no município, em relação à faixa etária de 1 a 6 anos. As lacunas nessa faixa etária representam que o município não tem cobertura efetiva de acesso ao ensino para a faixa etária pela qual a gestão municipal é responsável na LDB. A taxa de analfabetismo é outro dado sobre a educação no município que apresentamos nos gráficos 4, 5 e 6. A taxa é representada na categoria Ensino Fundamental Incompleto e Analfabeto. Sobre a categoria, ressalta-se que os percentuais apresentam decréscimo no período que compreende 1991, 2000 e 2010. Gráfico 4 - Escolaridade da população de 25 anos ou mais de Goiana – 1991 Fonte: Pnud, Ipea, Fundação João Pinheiro e Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 26 Gráfico 5 - Escolaridade da população de 25 anos ou mais de Goiana - 2000 Fonte: Pnud, Ipea, Fundação João Pinheiro e Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Gráfico 6 - Escolaridade da população de 25 anos ou mais de Goiana - 2010 Fonte: Pnud, Ipea, Fundação João Pinheiro e Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. O estudo da Hemobrás e FioCruz, apresenta uma análise mais especifica sobre o analfabetismo no município a partir de grupos territoriais. Os dados revelam discrepâncias relacionadas às diferenças entre os núcleos territoriais. Sobre essa discussão, o estudo menciona que “o município ainda apresenta percentual de analfabetismo quase duas vezes superior à média nacional” (HEMOBRAS; FIOCRUZ, 2013, p. 99). O estudo apresenta 27 considerações sobre a discrepância das taxas, relacionando as diferenças às desigualdades entre áreas urbanas e rurais. O gráfico 6 destaca o registro sobre a escolaridade da população de 25 anos ou mais. Na representação dos dados para o ano de 2010, o percentual dessa categoria com o ensino fundamental incompleto e analfabetos é de 22,7 %. Em relação a outras categorias, esse percentual, apesar de ter diminuído, ainda permanece elevado em relação a outros níveis de escolaridade como, por exemplo, o percentual da população com ensino fundamental completo e médio incompleto. Gráfico 7 - Frequência escolar para o grupo etário de 18 a 24 anos Fonte: Pnud, Ipea, Fundação João Pinheiro e Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. No gráfico 7 o percentual de jovens para a faixa etária 18 a 24 anos que não tem vínculo com atividades de ensino é elevado. Dados da pesquisa participativa da Hemobrás e Fiocruz (2013) destacam o aumento da oferta de ensino profissionalizante como necessidade de grupos jovens. Entendemos que esse quadro está relacionado a exigências do mercado de trabalho promovido pela instalação de indústrias no município. Esse contexto possibilita entender modificações do contexto municipal, que podem influenciar este percentual. Em relação aos dados da população economicamente ativa, o gráfico 7 demonstra a organização por categorias. 28 Gráfico 8 - Taxa de Atividade e de Desocupação 18 anos ou mais – 2010 Fonte: Pnud, Ipea, Fundação João Pinheiro e Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. A população economicamente ativa no ano de 2010 é de 28.978, o que equivale a um percentual de 56%. Enquanto a população economicamente ativa desocupada é de 7.908 habitantes. A população economicamente inativa representa 14.869 habitantes. Outra questão que está relacionada à ocupação da população e à distribuição por setores econômicos, que para o município indica os seguintes percentuais: Em 2010, das pessoas ocupadas na faixa etária de 18 anos ou mais, 12,64% trabalhavam no setor agropecuário, 0,08% na indústria extrativa, 16,37% na indústria de transformação, 7,54% no setor de construção, 0,94% nos setores de utilidade pública, 17,07% no comércio e 39,77% no setor de serviços. (PNUD, 2014). As informações sobre os percentuais de ocupação para o ano de 2010 apresentam uma expressiva ocupação no setor agropecuário, se comparado com os dados sobre a ocupação no setor da indústria para o mesmo ano. O cenário de crescimento industrial, que evidencia os dados para os anos posteriores a 2010, apresenta elevação para o percentual de ocupação no setor industrial, que podem ser evidenciados na pesquisa do CONDEPE/FIDEM3. Inserida nessa discussão, a ocupação de novos postos de trabalho surgidos na indústria, que anuncia um deslocamento do percentual mencionado dá visibilidade a outra 3 Os dados da pesquisa do CONDEPE/FIDEM são citados na página 111. 29 questão: as desvantagens da população local em relação à população que migra para o município para ocupação dos novos postos de trabalho. Sobre a discussão a pesquisa participativa da Hemobrás; FioCruz menciona: Outro problema que teve visibilidade nas discussões durante a oficina foi a desvantagem da população local na ocupação dos novos postos de trabalho, demandada pela mudança da matriz econômica. Desvantagem determinada, dentre outros aspectos, pela baixa oferta de cursos profissionalizantes para a juventude, pela parcela da população adulta apresentar pouca ou nenhuma qualificação, pelo elevado percentual de analfabetismo e pela baixa escolaridade. (HEMOBRÁS; FIOCRUZ, 2013, p. 111). O crescimento industrial do município de Goiana está relacionado ao objetivo de desenvolvimento regional do Estado de Pernambuco. De acordo com o estudo do CONDEPE/FIDEM (2011) o declínio de atividades econômicas ligadas à indústria têxtil, cana-de açúcar, produziu uma perda de importância econômica da Região de Desenvolvimento da Mata Norte do estado de Pernambuco. Dessa forma, a estratégia da Agenda de Desenvolvimento do Estado, com os incentivos para instalação de empreendimentos industriais nessa região, é de promover a retomada de crescimento regional. Sobre o contexto da região o estudo menciona que: De origem canavieira desde os primórdios de sua colonização, o Norte Metropolitano e Goiana, após longo período de estagnação econômica, vem redesenhando o perfil de suas atividades econômicas, com a instalação de importantes plantas industriais, a exemplo do Polo Automotivo, impulsionado pela Fiat Automóveis, pelas indústrias de Vidros Planos e pelo Polo Farmacoquímico, de Hemoderivados e de Biotecnologia (CONDEPE/FIDEM, 2012, p. 21). Os dados sobre o conjunto de indústrias estabelecidas na região mencionada no estudo do CONDEPE/FIDEM foram compilados a partir de informações da Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco (Ad-Diper), prefeituras da região da Mata Norte de Pernambuco, Federação de Indústrias do Estado de Pernambuco (FIEPE) e sites das empresas. Conforme o estudo, o quadro de indústrias se apresenta da seguinte forma: 30 Quadro 3 - Empreendimentos industriais em funcionamento na Região da Mata Norte do Estado de Pernambuco NORTE METROPOLITANO E GOIANA – PRINCIPAIS EMPREENDIMENTOS INDUSTRIAIS INDÚSTRIAS EM FUNCIONAMENTO EMPREENDIMENTO LOCALIZAÇÃO LINHA DE PRODUÇÃO 1 Klabin S/A Goiana Produção de papel ondulado 2 Fábrica Itapessoca Cimento Nassau Goiana Produção de cimento 3 Usina Santa Tereza Goiana Produção de Açúcar, Álcool e Biodiesel 4 Gerdau Aços Longos Igarassu Fabricação de Vergalhões para indústrias 5 Shinerai Motos Igarassu Fabricação de Motos 6 Unilever Brasil NE Igarassu Fabricação de produtos de limpeza 7 T & A Pré-moldados Igarassu Fabricação de pré-moldados de concreto 8 Companhia de papeis e papelão ondulados do NE Igarassu Fabricação de toalhas de papel, guardanapo, papel higiênico e embalagens de papelão 9 Companhia Agro Industrial de Igarassu Igarassu Fabricação de Produtos Químicos (Soda caustica, cloro, hipoclorito de sódio e hidrogênio gasoso) 10 Musashi do Brasil Ltda Igarassu Fabricação de engrenagens de precisão para automóveis 11 Janga S. A. – Indústria e Comercio Igarassu Fabricação de Sacos Plásticos 12 Centauro – Formulários do NE Igarassu Fabricação de formulários 13 Cervejaria Nobel Igarassu Fabricação de cerveja 14 Usina São José Igarassu Fabricação de Açúcar e Álcool 15 Alcoa Aluminio S/A Itapissuma Fabricação de Perfis extrudados e laminados para indústrias e Geradores e construção civil 16 Leon Himer S/A Paulista Fabricação de distribuidora de peças e ferramentas 17 Industrias Reunidas Raimundo da Fonte Paulista Fabricação de produtos de limpeza, higiene pessoal, inseticida. 18 Cimento Poty – Grupo Votorantin Paulista Fabricação de cimento 19 Cintex Industria Têxtil Paulista Fiação e tecelagem 20 Vicunha Têxtil Paulista Fabricação de Malhas 21 A & S Têxtil Ltda. Paulista Fabricação de Malhas 22 Superfios Têxtil Ltda. Paulista Fiação e tecelagem 23 Brazmo Indústria e Comércio Paulista Fabricação de produtos químicos 24 W. M Indústrias Químicas Ltda. Paulista Fabricação de produtos químicos 31 25 RDX Gestão e Higienização Têxtil Paulista Lavanderia industrial 26 Lavatec Paulista Lavanderia industrial e hospitalar 27 Formiline Indústria de Laminados Paulista Fabricação de Laminados de fórmica 28 Indústrias Renda S/A Abreu e Lima Fabricação de embalagens metálicas e plásticas 29 Polífrio do NE Ltda. Abreu e Lima Fabricação de isolamentos, portas de frigorífico e equipamentos para instalação de frigoríficos 30 Reprotêxtil Abreu e Lima Fiação e tecelagem 31 Rall Indústria e Comércio Abreu e Lima Fabricação de Borrachas e artefatos 32 Metalúrgica Champion Abreu e Lima Metalúrgica 33 Polígono Produtos e Ligas Plásticas Abreu e Lima Produção de Ligas Plásticas do Brasil 34 Metalmig Abreu e Lima Usinagem de Peças 35 Weber Saint-Gobain Abreu e Lima Fabricação de Argamassa para a Construção civil 36 Venosan Brasil Ltda. Abreu e Lima Fabricação de meias compressivas medicinais 37 Bombril Abreu e Lima Fonte: Ad-Diper, Prefeituras da Região, FIEPE, Sites das Empresas Fabricação de produtos de limpeza 32 Quadro 4 – Empreendimentos industriais em fase de implantação na Região da Mata Norte do Estado de Pernambuco INDÚSTRIAS PREVISTAS /EM IMPLANTAÇÃO EMPREENDIMENTO 1 Hemobrás (Polo Farmacoquímico) LOCALIZAÇÃO Goiana LINHA DE PRODUÇÃO Processamento anual de 500 mil litros de plasma, matéria-prima dos hemoderivados. A partir de 2014 produzirá para remédios portadores imunodeficiência, fundamentais de hemofilia, câncer, Aids, cirrose e queimaduras graves. 2 Multilab (Polo Farmacoquímico) Goiana Fabricação de genéricos e Similares 3 RIFF – Laboratório farmacêutico (Polo Goiana Fabricação de soros Farmacoquímico) 4 AC Diagnóstico (Polo farmacoquímico) Goiana Kits de Diagnósticos 5 IonQuímica (Polo Farmacoquimico) Goiana Insumos para a Indústria Farmacêutica 6 Lafepe Química (Polo farmacoquimico) Goiana Fabricação de Antirretrovirais 7 Companhia Brasileira de Vidros Planos (CBVP) Goiana Fabricação de 260 mil toneladas, o equivalente a 30 milhões de metros quadrados de vidros planos por ano. Será a primeira fábrica de vidros planos do Nordeste. 8 Companhia Brasileira de Vidros Automotivos Goiana (CBVA) (Polo Automotivo) Fabricação de 25 mil toneladas/ano de vidros automotivos 9 Unimetal Goiana Fabricação de Fios de Poliéster 10 Vita Derm Goiana Fabricação de Produtos de Beleza 11 FIAT – Indústria Automobilística (Polo Goiana Fabricação de automóveis, pista de Automotivo) testes e Centro de Pesquisas. 12 Ambev Itapissuma Fabricação de cervejas e refrigerantes 13 Cervejaria Petrópolis Itapissuma Fabricação de cervejas 14 Dystar Paulista Produção de Insumos para a Indústria Têxtil 15 Neotêxtil Paulista Fabricação de 12 milhões de metros de tecido/ano. A ideia é fabricar confecções, além de tecidos esportivos de performance. 16 FL Pré-moldados de concreto Abreu e Lima Fabricação de artefatos de cimento (pré-moldados) Fonte: Ad-Diper, Prefeituras da Região, FIEPE, Sites das Empresas 33 O quadro de indústrias previstas e em fase de implantação apresentado nos quadros acima evidencia o município de Goiana com maior representação de estabelecimentos industriais em relação a outros municípios da região. O registro dessa fase é referenciado no estudo do CONDEPE/FIDEM em 2012. O estudo cita que: “Essa região tem um parque industrial composto por indústrias de pequeno, médio e grande porte, localizadas nos municípios do Paulista, Abreu e Lima, Igarassu, Itapissuma e Goiana” (CONDEPE/FIDEM, 2012, p. 21). E a implantação de novos empreendimentos é significativa para o contexto socioeconômico da região. O contexto de crescimento industrial aponta para novas relações que influenciam aspectos econômicos, sociais e culturais. As relações desse contexto produzem desafios para a gestão local. Dessa forma, a gestão da educação do município também é permeada por essas mudanças e fica evidenciada a necessidade de estabelecimento de uma nova agenda para o desenvolvimento educacional no município. 34 3 DESCONTINUIDADES E REFLEXIVIDADE: PERSPECTIVA TEÓRICA NA ABORDAGEM SOCIAL DE GIDDENS Nessa seção apresentamos reflexões sobre a teoria social proposta por Giddens, com o intuito de destacar subsídios para a análise na pesquisa social sobre a gestão da educação que realizamos. 3.1 CONTRIBUIÇÃO DA TEORIA SOCIAL GIDDENS PARA A PESQUISA EM GESTÃO DA EDUCAÇÃO A elaboração de políticas e práticas educacionais é permeada pela cultura, política e economia. A construção de políticas educacionais é vinculada ao contexto de construção, onde práticas locais também exercem mudanças na efetivação de políticas públicas. Dessa forma, a materialização de uma política pública reúne a dinâmica de construção e processos de organização e gestão. Sobre a dinâmica do processo educativo e a interação entre as dimensões da organização da gestão educacional, Dourado menciona que: É fundamental não perder de vista que o processo educativo é mediado pelo contexto sociocultural, pelas condições em que se efetiva o ensinoaprendizagem, pelos aspectos organizacionais e, consequentemente, pela dinâmica com que se constrói o projeto político-pedagógico e se materializam os processos de organização e gestão da educação básica. (DOURADO, 2007, p. 922). A construção de políticas educativas implica relações que tocam a maneira como as sociedades se organizam. E, por outro lado, a materialização de uma política pública norteia várias ações, como diretrizes governamentais, a organização política e social, recursos para financiamento e a prática social. Esse entendimento sobre a política educacional apresenta uma concepção de construção que não pode ser tomada de forma isolada e enfatiza que há influências que vão além da sua concepção no processo de materialização da política. A gestão educacional estabelece arranjos institucionais que contribuem para novas interações e essas por sua vez influenciam a materialização das políticas de educação. A construção e o estabelecimento de políticas educacionais apontam para uma rede de relações. Essas relações ocorrem em um quadro contemporâneo permeado por um dinamismo atribuído à concepção de modernidade. Sobre essa concepção de modernidade Giddens afirma o seguinte: “Refere-se a um estilo, costume de vida ou organização social que emergiam na 35 Europa a partir do século XVII e que ulteriormente se tornaram mais ou menos mundiais em sua influência”. (GIDDENS, 1991, p. 11). Para Giddens, a concepção de modernidade inicialmente estava associada a um período de tempo e a uma localização geográfica. Contudo, as fontes de dinamismos da modernidade, tempo e espaço, promoviam o deslocamento das relações sociais do seu contexto geográfico. Isso para o autor produz um período que denomina como consequências da modernidade. Tais consequências estão se tornando cada vez mais radicalizadas e universalizadas que antes. Sobre essa discussão, o autor menciona: O advento da modernidade arranca crescentemente o espaço do tempo fomentando relações entre outros “ausentes”, localmente distantes de qualquer situação dada face a face. Em condições de modernidade, o lugar se torna cada vez mais fantasmagórico: isto é, os locais são completamente penetrados e moldados em termos de influência sociais bem distantes deles. (GIDDENS, 1991, p. 27). Outra questão enfatizada pelo autor é a discussão sobre as transformações institucionais, por entender que há uma relação entre as instituições modernas e o dinamismo contemporâneo. Para autor (1991, p. 65), as dimensões institucionais da modernidade: “capitalismo (acumulação de capital no contexto de trabalho e mercados de produtos competitivos), industrialismo (transformação da natureza: desenvolvimento do “ambiente criado”), poder militar (controle dos meios de violência no contexto da industrialização da guerra), a vigilância (controle da informação e supervisão social)” se articulam. Essas produzem um enfeixamento institucional que envolve e condiciona as fontes de dinamismo da modernidade, bem como facilita as transições históricas. As transições históricas apontadas pelo autor, ao se referir às mudanças institucionais, estão relacionadas às rupturas com a tradição, ocasionadas pelas fontes de dinamismo moderno: o distanciamento do tempo-espaço, desencaixe e reflexividade. Nessa perspectiva teórica, fundamentada na análise de influências mútuas, a proposta de análise volta-se para as práticas sociais. Essas práticas sociais representam o centro da discussão sociológica, atribuído em outras teorias ao indivíduo ou à sociedade. A partir dessa diretriz de análise o autor estabelece um método que evidencia categorias, a exemplo da descontinuidade, que é uma proposta que diverge da análise evolucionista da sociedade. Para o autor: 36 Desconstruir o evolucionismo social significa aceitar que a história não pode ser vista como uma unidade, ou como refletindo certos princípios unificadores de organização e transformação. Mas isto não implica que tudo é caos ou que um número infinito de “historias” puramente idiossincráticas pode ser escrito. Há episódios precisos de transição histórica, por exemplo, cujo caráter pode ser identificado e sobre os quais podem ser feitas generalizações (GIDDENS, 1991, p. 15). A descontinuidade estudada pelo autor está representada por rupturas num processo histórico. Essas rupturas são interpretadas como a quebra de práticas sociais tradicionais, que são reforçadas continuamente, limitando a reflexividade e a reinterpretação das práticas sociais recorrentes. Sobre a concepção de tradição Giddens menciona que: A tradição é um modo de integrar a monitoração da ação com a organização tempo-espaço da comunidade. Ela é uma maneira de lidar com o tempo e o espaço, que insere qualquer atividade ou experiência particular dentro da continuidade do passado, presente e futuro, sendo estes por sua vez estruturados por práticas sociais recorrentes. (GIDDENS, 1991, p. 44). A análise proposta pelo autor apresenta a tradição como uma categoria que está ligada às sociedades pré-modernas. Dessa forma, a discussão sobre a modernidade apresenta essa categoria em contraposição à modernidade, que é associada a rupturas de um processo tradicional. Para exemplificar, o autor menciona que a emergência de um novo sistema social, a sociedade da informação, é uma ruptura da tradição. Como também as mudanças institucionais, a exemplo da transição da manufatura para a sociedade da informação. A partir dessa fundamentação da teoria proposta por Giddens, consideramos como exemplo a redemocratização política brasileira. A redemocratização é entendida como uma ruptura que estabelece novas práticas sociais. As mudanças sociais desse quadro podem ser analisadas a partir de categorias destacadas pelo autor como o dinamismo, o escopo das mudanças e a natureza das instituições modernas. Giddens destaca a necessidade de considerar as mudanças da modernidade, sabendo que: A apropriação do conhecimento não ocorre de maneira homogênea, mas com frequência diferencialmente disponível para aqueles em posição de poder, que são capazes de colocá-lo a serviço de interesses seccionais; Os valores são mutáveis; Nenhuma quantidade de conhecimento acumulado sobre a vida social poderia abranger todas as circunstancias de sua implementação, mesmo que tal conhecimento fosse inteiramente distinto do ambiente ao qual ele é aplicado; O conhecimento é instável e mutável. (GIDDENS, 1991, p. 50). 37 Os pontos apresentados pelo autor (GIDDENS, 1991, p. 12) enfatizam que a modernidade não se apresenta de forma totalizadora e “que se expressa na sensação de que não se pode obter conhecimento sistemático sobre a organização social”. Isso se materializa para o autor em outra sensação “de que muitos de nós temos sido apanhados num universo de eventos que não compreendemos plenamente, e que parecem em grande parte estar fora de nosso controle”. Essa discussão apresentada fortalece a análise “descontinuísta” do desenvolvimento social moderno. Tomando ainda como exemplo a redemocratização política brasileira, a parir da categoria “descontinuidade” proposta por Giddens, mudanças vinculadas à redemocratização podem ser lidas como rupturas vinculadas a esse quadro histórico. As reformas educacionais, concebidas no contexto de mudanças, a promulgação da LDB no ano de 1996, o enfoque para gestão municipal registrado na lei são rupturas significativas de uma política anteriormente centralizadora. O estudo da categoria “ruptura”, proposta por Giddens, considera na análise as características “intencionalidade” e “extencionalidade” indicadas pelo autor. A intencionalidade das mudanças apontadas por Giddens traz conhecimento sobre as características e a análise “extencionalista” esclarece as formas de interconexão social entre acontecimentos no contexto global. Giddens discute outros conceitos no contexto da modernidade responsáveis pelo dinamismo das mudanças. A separação do tempo e do espaço, desencaixe dos sistemas sociais e ordenação e reordenação reflexivas das relações sociais. A categoria separação do tempo e do espaço discorre inicialmente sobre o controle social do tempo, com a criação do relógio mecânico, destacando também a discussão mais contemporânea sobre o “esvaziamento do espaço através do fomento de relações entre pessoas ausentes, localmente distantes de qualquer situação dada ou interação face a face” (GIDDENS, p. 27). Sobre a análise dessa categoria o autor menciona que: A separação entre tempo e espaço não deve ser vista como um desenvolvimento unilinear, no qual não há reversões ou que é todo abrangente. Pelo contrário, como todas as tendências de desenvolvimento, ela tem traços dialéticos provocando caraterísticas opostas (GIDDENS, p. 27). O caráter dialético destacado é evidenciado quando o rompimento entre tempo e espaço fornece base para novas combinações nas atividades sociais. Na análise de um sistema 38 de gestão da educação, por exemplo, entendemos que essa categoria de análise remete à investigação da governabilidade e das influências que incidem sobre a política local num contexto de economia globalizada. Dessa forma, a gestão da educação, não pode ser entendida como resultado de um processo isolado. Outra categoria destacada pelo autor é o desencaixe das relações sociais que está atrelado à separação entre tempo e espaço. O desencaixe significa “deslocamento das relações sociais de contextos locais de interação e sua reestruturação através de extensões indefinidas de tempo-espaço”. (1991, p. 29). O deslocamento significa como as relações sociais são fortemente imbrincadas no contexto de globalização. A ordenação e reordenação reflexiva das relações sociais estão situadas na discussão do papel que tem a reflexividade na modernidade. Sobre isso, Giddens menciona: Consiste no fato que as práticas sociais são constantemente examinadas e reformadas sobre estas próprias práticas, alterando assim constitutivamente seu caráter. [...] Em todas as culturas, as práticas sociais são rotineiramente alteradas a luz de descobertas sucessivas que passam a informá-las. Mas na modernidade a revisão da convenção é radicalizada para se aplicar a todos os aspectos da vida humana, inclusive a intervenção tecnológica no mundo material (GIDDENS, 1991, p. 45). A “reflexividade” leva em consideração os aspectos de mudança, enfatizando a construção do conhecimento e a apreensão social do conhecimento que condicionam a mudança. Nesse processo, a comunicação e os suportes de informação são entre outros instrumentos que permeiam a constituição da reflexividade. Consideramos que a “reflexividade” e o dinamismo que a caracteriza, põe em revisão as formas tradicionalmente sedimentadas. Dessa forma, o papel da educação se torna fundamental para a revisão de práticas que promovem mudanças na organização social. A teoria proposta por Giddens fornece caminhos de análise que embasam a investigação a partir da exploração de relações entre fatos, destacando as influências das categorias espaço e tempo e as rupturas com a tradição condicionada pela reflexividade da modernidade. Para o autor esse processo metodológico, centrado nas práticas sociais, tem um rebatimento sobre o papel das ciências sociais, como geradoras de conhecimento sobre a vida social moderna. Sobre essa discussão, Giddens considera que: A sociologia não desenvolve conhecimento cumulativo da mesma maneira que, pode-se se dizer as ciências naturais. Pelo contrário, a introdução de 39 noções sociológicas ou reinvindicações de conhecimento no mundo social não é um processo que possa ser imediatamente canalizado, nem por aqueles que propõem, nem mesmo por grupos poderosos ou agências governamentais. Ainda assim o impacto prático das teorias sociológicas e da ciência social é enorme, e os conceitos e descobertas sociológicas estão constitutivamente envolvidos no que a modernidade é. (GIDDENS, 1991, p. 24). As descobertas sociológicas alimentam a “reflexividade” e são situadas como constitutivas da modernidade. Os recortes produzidos por investigações no campo da pesquisa social é parte do conhecimento produzido em outras pesquisas e o conhecimento gerado pela investigação contribui para a reflexividade. 3.2 INSTITUIÇÕES MODERNAS NA TEORIA SOCIAL DE GIDDENS As instituições modernas fazem parte de um contexto, que de acordo com Giddens (1991, p.16), não apresenta correspondência em outros períodos. Para Giddens (1991, p. 150), o desenvolvimento das instituições sociais modernas e sua difusão em escala mundial promovem um novo tipo de organização social. A relação entre transformações institucionais e as fontes de dinamismo da modernidade: o distanciamento do tempo-espaço, desencaixe e reflexividade são referências de um quadro globalizado. Na era moderna, o nível de distanciamento tempo-espaço é muito maior do que em qualquer período precedente, e as relações entre formas sociais e eventos locais e distantes se tornam correspondentemente “alongadas”. A globalização se refere essencialmente a este processo de alongamento, na medida em que as modalidades de conexão entre diferentes regiões ou contextos sociais se enredam através da superfície da Terra como um todo (GIDDENS, 1991, p. 69). Giddens enfatiza a relação entre modernidade e globalização. Nesse quadro, as instituições modernas são apresentadas como dimensões da globalização. Assim, o sistema de estados-nação, a economia capitalista mundial, a divisão internacional do trabalho e a ordem militar são dimensões da globalização, que se constituem em instituições modernas que evidenciam aspectos diferenciados no contexto contemporâneo. A interdependência entre os estados, a construção de organizações intergovernamentais, entre outras discussões, aponta para o entendimento de perda de 40 soberania dos estados-nação. Para Giddens “a soberania do estado moderno foi, desde o inicio, dependente das relações entre estados”. O sistema de estado-nação e as relações que se constroem entre os estados são permeados por questões políticas, econômicas, culturais, assim como por processos de desenvolvimentos desiguais como enfatiza o autor. A soberania do estado-nação está vinculada a essas questões e se fortalece a partir de acordos que se estabelecem no cenário de economia globalizada. Para Machado (2004, p. 221), a importância do estado-nação não é diminuída, mas continua efetiva e se fortalece em outra instituição moderna que é o sistema capitalista. Sobre essa discussão, o autor menciona que: O Estado-nação é importante para a reprodução do capitalismo tardio, já que é um grande centro de produção de imagens, um agente de fragmentação da realidade em identidades mediadas pelo mercado. É por meio dele que o capital internacional escapa da regulamentação – pois circula livremente – e é por meio dele que se desenvolve uma indústria cultural que tem como centro a comercialização de imagens essencializadas das identidades espalhadas pelo mundo. (MACHADO, 2004, p. 225). O autor dá luz à discussão sobre a construção de uma cultura que colabora com a valorização do capital e aponta que o estado-nação é um instrumento fundamental nesse processo. A economia capitalista mundial e a rede de conexões entre estados é um dos aspectos destacados na dimensão econômica da globalização. O estudo de Giddens apresenta a expansão capitalista com ênfase no processo de integração econômica desvinculada de um centro político. Sobre a importância do capitalismo para o quadro moderno, Giddens registra que “o capitalismo foi uma influência globalizante fundamental precisamente por ser uma ordem econômica e não política” (1991, p. 74). Por outro lado o autor demonstra que é relevante a análise que encadeia a dimensão econômica e política: As distinções entre centro, semiperiferia e periferia (elas mesmas talvez de valor questionável), baseadas em critérios econômicos, não nos permite elucidar concentrações de poder político ou militar, que não se alinham de maneira exata as diferenciações econômicas.(GIDDENS, 1991, p. 74). Dulci (2009) é enfático ao apontar o encadeamento entre a dimensão econômica e política: A hegemonia do capitalismo financeiro, ao ponto a que chegou, só poderia ser alcançada pela via política, mediante o manejo oportuno de recursos de poder. Pode-se buscar uma demonstração disso pelo estudo das relações 41 entre elites econômicas e políticas nos diversos países do mundo. (DULCI, 2009, p. 115). Imbricamento entre a dimensão econômica e política é um aspecto comum na análise de Giddens e Dulci. Nesse contexto, Giddens considera que os estados capitalistas mantêm em sua organização institucional um insulamento da dimensão econômica em relação à dimensão política, apesar de influências mútuas das duas dimensões. Isso para o autor, “possibilita um amplo escopo para as atividades globais das corporações”. (GIDDENS, 1991, p. 75). Além do poderio econômico, as corporações são capazes de exercer influências em sistemas políticos em localidades onde se instalam. Os aspectos dessa dimensão da globalização e a ênfase como instituição moderna são destacados por Giddens, para enfatizar as formas de organização social produzidas pela modernidade. E mais especificamente consequências da modernidade. Em relação à ordem militar como instituição moderna, Giddens destaca que as conexões no quadro contemporâneo, o avanço da indústria da guerra, o poder militar dos estados, como o dimensionamento de conflitos, em que conflitos locais se transformaram em questões de envolvimento global, são enfatizadas no quadro moderno. Essas questões envolvendo a ordem militar na modernidade direcionam acordos e limitam os estados a forjarem monopólios de estratégias militares dentro de seus territórios. Giddens destaca que a constituição dessa instituição moderna ocorre como resultado do poder destrutivo maciço do armamento moderno. Isso para o autor impulsiona os estados a possuírem uma força militar maior que em outros momentos históricos. No que se refere à divisão global do trabalho, destaca que está estreitamente ligada ao desenvolvimento industrial. Nessa dimensão da globalização é destacada a divisão de atividades, sobretudo as especializações regionais, o que se refere ao “tipo de indústria, capacitações e a produção de matérias-primas” (GIDDENS, 1991, p. 80). Para Giddens, um dos principais impactos do industrialismo nessa dimensão institucional é a difusão mundial das tecnologias e como essa ocorrência afeta diretamente os aspectos da vida cotidiana. A análise das instituições modernas apresentadas por Giddens dá lastro ao encadeamento de acontecimentos e fortalece o entendimento de como as instituições modernas permeiam as formas sociais de organização. Para o autor, o estudo de como a vida social é organizada, deve ser o ponto de partida do estudo social. Os aspectos institucionais e enfeixamento entre essas instituições modernas incidem sobre a organização social e promovem mudanças sobre estruturas organizativas. O estudo desse quadro evidencia a 42 organização social e suas práticas. Para o autor, esse é um ponto de partida para o estudo social. Giddens considera que a modernidade é inerentemente globalizante, e que as características básicas das instituições modernas evidenciam as conexões entre acontecimentos localmente distantes. Giddens destaca que: Assim, quem quer que estude as cidades hoje em dia, em qualquer parte do mundo, está ciente de que o que ocorre numa vizinhança local tende a ser influenciado por fatores – tais como dinheiro mundial e mercados de bens – operando a uma distância indefinida da vizinhança em questão. (GIDDENS, 1991, p. 70). As considerações do autor destacam a importância com o encadeamento de acontecimentos na pesquisa. De acordo com Giddens (1991), as estruturas sociais que se apresentam na modernidade estão associadas a novos conhecimentos sobre o mundo. Esse entendimento dá visibilidade ao tratamento da pesquisa em educação, percebendo as mudanças que se colocam. As relações políticas entre estado e educação, o contexto onde se estabelecem as políticas, a história local, entre outras questões, fazem parte do contexto de construção de políticas e são pressupostos para pesquisa em um quadro globalizado. 43 4 GLOBALIZAÇÃO E EDUCAÇÃO As mudanças institucionais e as transformações promovidas pela globalização, tratadas na discussão proposta por Giddens, incidem na construção das políticas educativas e considerações sobre a concepção ideológica evidenciam que o estabelecimento recebe influencias do contexto econômico, cultural, entre outras questões. Robertson e Dale (2011) para situar a globalização registram que: Estas transformações seguiram-se à desintegração dos arranjos pós Segunda Guerra Mundial nas economias ocidentais desenvolvidas na década de 1970, à emergência de políticas econômicas neoliberais e novos desenvolvimentos tecnológicos na década de 1980 e ao colapso em 1989 do icônico Muro de Berlim, que tinha estruturado alianças e relações Leste-Oeste. (ROBERTSON; DALE, 2011, p. 348). Os dados apresentados pelos autores situam as transformações e indicam a trajetória histórica do processo de globalização. Em relação à concepção de globalização, Dulci menciona: O cerne das mudanças que se observaram nos últimos trinta anos é bem descrito pela ideia de globalização neoliberal. Houve um processo de integração dos povos do mundo propiciado por vertiginosas inovações tecnológicas e organizacionais, que incidem na esfera da cultura e nas formas de sociabilidade. (DULCI, 2009, p. 109). Dulci apresenta nexos entre períodos e acontecimentos que estão relacionados à globalização. O autor relaciona a globalização à concepção neoliberal e inovações da tecnologia e da organização social. Por outro lado, Giddens registra que: “A intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que acontecimentos locais são modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distância e vice-versa” (GIDDENS, 1991, p. 69). As relações sociais são o foco da concepção apresentada por Giddens e a conexão entre os estados. Robertson e Dale, ao se referirem à globalização a define como: Processo histórico envolvendo o desenvolvimento desigual e a transformação parcial e contingente das estruturas, práticas e relações sociais, políticas, econômicas e culturais. Crucial nestes processos que se desdobram é o incremento de atores globalizantes poderosos; a intensificação da acumulação; novas lutas políticas, sociais e de classe e a desnacionalização e a transformação de políticas, capital, subjetividades políticas, espaços urbanos e marcos temporais. (ROBERTSON; DALE, 2011, p. 348). 44 As transformações relacionadas à globalização na visão de Robertson e Dale são contextualizadas ao processo histórico e, portanto, os impactos não são homogêneos para os estados. Os autores destacam que as mudanças são estruturais e incidem sobre as relações sociais e ressaltam a intensificação do sistema capitalista materializada nas corporações empresariais como incremento desse processo. Ball (2001, p. 101) enfatiza a reestruturação do estado e as relações que a envolvem: A essência da tese da globalização repousa na questão do futuro Nacional como uma entidade cultural e política. Esta tese é através de quatro perspectivas fortemente inter-relacionadas que referente respectivamente a transformação econômica, política, social. do Estado articulada têm como cultural e O destaque de Ball (2001) é para as mudanças do estado e os rebatimentos nas questões econômicas, sociais, políticas e culturais, que devem ser entendidas de forma associada. A globalização, de acordo com Burbules e Torres (2004), apresenta diferentes interações que se configuram em discussões diferenciadas. De acordo com os autores, as relações dessa discussão se caracterizam em: 1Surgimento de instituições supranacionais, cujas decisões moldam e limitam as opções políticas para qualquer estado. 2Impacto avassalador dos processos econômicos globais, incluindo processos de produção, consumo, comércio, fluxo de capital e interdependência monetária. 3 Ascensão do neoliberalismo como discurso político hegemônico. 4O surgimento de novas tecnologias culturais, de meios e tecnologias de comunicação globais, todos os quais moldam as relações de afiliação identidade e interação dentro e através dos cenários culturais locais. 5Conjunto de mudanças percebidas, uma construção usada pelos legisladores para inspirar apoio e suprimir a oposição a mudanças, porque “forças maiores”(a competição global, respostas as exigências do FMI e Banco Mundial, obrigações para com alianças regionais, e assim por diante) não deixam “nenhuma escolha” ao Estado, além de agir segundo um conjunto de regras que não criou. (BURBULES; TORRES, 2004, p. 11). As mudanças atribuídas à globalização se associam aos níveis econômicos, culturais e políticos da sociedade. Esse entendimento diverge da polarização de temas ou da hegemonia de um tema. Consideramos que o estudo sobre as mudanças promovidas pelo processo de globalização para a educação deve perceber a pluralidade de interações que exerce influências na construção de políticas, na gestão local e no estabelecimento das políticas. 45 O processo de globalização é apresentado em paralelo à reestruturação econômica pós Guerra Fria. Burbules e Torres (2004), Dulci (2009), Robertson; Dales (2011) mencionam relações do contexto político e econômico do pós-guerra que estão associadas à globalização. Dulci (2009) considera que arranjos institucionais que representavam as políticas de bem estar social como tarefa estratégica dos governos foram explicitadas nas décadas de 1950 e 1960. Dulci (2009, p. 111) menciona que “um relativo consenso em torno dessa orientação começou a refluir, de tal modo que em pouco tempo se tornou corrente a percepção de crise do Estado”, na década de 1970. Para elucidar sobre este quadro, Dulci (2009) concorda com a distinção da crise proposta por Vacca4 (1991). Na perspectiva de Vacca a crise dos anos de 1970 está relacionada à crise fiscal, à crise de legitimidade e à crise de governabilidade. A reestruturação econômica, para Burbules e Torres (2004), constitui-se em uma tendência mundial. Os elementos constitutivos dessa tendência se associavam à formação de mercados e integração das economias, internacionalização do comércio, reestruturação do mercado de trabalho, mudanças no modelo de produção, ascensão de novas forças de produção, aumento dos setores de serviços e diferenças financeiras, tecnológicas e culturais entre países desenvolvidos e os subdesenvolvidos. Esses elementos se fortaleceram diante do esgotamento de políticas que representavam o Estado de bem-estar social e apontavam para a necessidade de reestruturação econômica. Os elementos dessa reestruturação econômica são relacionados à concepção neoliberal, que de acordo com Carcanholo (2000), tem origem com a ineficiência do Estado em controlar a crise, a revitalização do liberalismo e a derrocada do socialismo. Esses fatores promoveram a expansão de políticas neoliberais. Em paralelo aos elementos da reestruturação, Burbules e Torres também registram que: A reestruturação econômica também refletiu uma profunda crise fiscal, e as reduções orçamentárias que afetam o setor público resultaram na redução do Estado bem-estar social e na crescente privatização dos serviços sociais, de saúde, habitação e educação. (BURBULES; TORRES, 2004, p. 14). Os impactos apontados têm correspondência com o neoliberalismo e se referem à transferência para o mercado de atividades do estado. Como resultado das mudanças econômicas, políticas e culturais, as políticas sociais recebem influências de uma perspectiva global, fortalecida pela interdependência entre os estados. Nesse quadro as políticas recebem influências dos fundamentos do neoliberalismo. 4 VACCA, G. Tra Itália e Europa: politiche e cultura dell‟alternativa. Milano: FrancoAngeli, 1991. 46 Os fundamentos da política neoliberal apresentados por Carcanholo (2000) manifestam a concepção de uma economia globalizada unida pela perspectiva do mercado e dissemina a ideia de que o mercado promove um caráter harmônico: Os agentes individuais tomam decisões motivados unicamente pelo interesse próprio e todas as interações econômicas, políticas e/ou sociais entre esses indivíduos só podem ser explicadas em termos desse interesse próprio [...]. Essas interações baseadas no interesse próprio não levam ao caos social, mas á harmonia, já que eles fazem parte de uma ordem natural. O mercado é responsável pela interação entre todos os interesses individuais e, portanto, pela manutenção da ordem natural. (CARCANHOLO, 2000, p. 17). O caráter harmônico está relacionado à condução de arranjos produzidos pelo mercado. A manifestação desse quadro promove a ascensão do neoliberalismo nos anos de 1990 e, de acordo com Carcanholo (2000), fortalece o pensamento de que “o neoliberalismo é a forma de se obter êxito da inserção na internacionalização”. A respeito desse quadro, Carcanholo menciona: Aparentemente intensificou-se a relação entre países tanto no que se refere ao setor produtivo, quanto aos fluxos comerciais e financeiros. Nesse sentido, a desregulamentação dos mercados e a desobstrução do comércio internacional e da entrada de capitais afirmam-se com diretrizes de política que podem garantir a inserção das diferentes nações no novo contexto de globalização. (CARCANHOLO, 2000, p. 16). As pautas da política neoliberal, no quadro de liberação dos mercados, livre comércio, privatização e o estímulo à inserção de capital estrangeiro divergem de políticas protecionistas, de regulação e estatização. Dessa maneira, a orientação estabelecida pela política neoliberal tem rebatimentos nas políticas sociais e fortalece o grau de dependência de estados em desenvolvimento. Os ideais do liberalismo, em que o mercado desempenha o papel fundamental, são disseminados através de uma análise da crise de países latino-americanos no Consenso de Washington. O encontro que ocorreu em 1989 na cidade de Washington, nos Estados Unidos e tinha de acordo com Carcanholo (2000), o objetivo de avaliar as reformas econômicas empreendidas na América Latina e produzir diretrizes para o quadro. As diretrizes representavam: cortes drásticos nos gastos públicos reforma administrativa, privatização, menos intervenções fiscais e abertura de importações. Carcanholo (2000) considera que as 47 diretrizes neoliberais disseminadas no Consenso de Washington promoveram a drástica redução do Estado e a abertura total e irrestrita dos mercados. As diretrizes do Consenso estavam vinculadas à concessão de novos empréstimos e cooperação econômica. Dessa maneira, a implementação dos ideais do neoliberalismo tornava-se um pré-requisito para negociar formas de cooperação entre os estados. Contudo, as diretrizes apresentam orientações que vão além das questões econômicas. Para Azevedo (2001), a persuasão da doutrina neoliberal é algo que incide na discussão das políticas públicas, pois evidencia as influências do estabelecimento das políticas públicas em educação. A autora menciona que o debate sobre a educação nesse sentido assume centralidade: Devido à base que representa para os processos que conduzem ao desenvolvimento científico e tecnológico, num quadro em que a ciência e a tecnologia, elas próprias, transformam-se paulatinamente em forças produtivas. Por outro lado, em virtude das repercussões no setor que a regulação via mercado vem provocando, na medida em que esta forja uma nova ortodoxia nas relações entre a política, o governo e a educação. (AZEVEDO, 2001, p. x). As reformas educacionais empreendidas no contexto da desregulação neoliberal promovem objetivos voltados para as economias nacionais. Azevedo (2001) considera que para o alcance do melhoramento econômico, as políticas estabelecem estratégias que fortalecem laços entre a escolarização, trabalho, produtividade, serviços e mercado. As reformas educacionais, de acordo com a autora, são direcionadas para o objetivo de desempenho escolar nesse quadro: [...] aquisição de competências e habilidades relacionadas ao trabalho, controles mais diretos sobre conteúdos curriculares e sua avaliação, implicando também a adoção de teorias e técnicas gerenciais próprias do campo da administração de empresas. (AZEVEDO, 2001, p. xi). A política educacional está envolvida em estruturas de poder, representada pelas instituições do Estado e representações sociais que atuam na definição. Dessa maneira, as repercussões do contexto econômico passam a direcionar a definição curricular associada à competitividade econômica global. Sobre a construção das políticas educacionais nesse contexto, Robertson e Dale (2011) registram: Dentro disso, os sistemas educacionais das nações modernas enfrentaram importantes mudanças em termos de, primeiramente, mandatos que agora orientam a política da educação; em segundo lugar, os recursos humanos e 48 fiscais para oferta de educação (capacidade); e, em terceiro lugar, a governança do setor. (ROBERTSON; DALE, 2011, p.348). Os setores produtivos são lastro para desenvolvimento econômico e as relações produtivas, no contexto de uma economia capitalista, permeiam as relações sociais. A educação, para Severino (2000, p. 71), “como também outras formas de ação sociocultural, está diretamente relacionada com as condições da economia”. Pensar a educação no contexto econômico, entre outras questões, contribui para a reflexão sobre o papel da educação em um determinado sistema social. As implicações do contexto da economia globalizada sobre a educação são representadas por centros de poder dentro do sistema capitalista. Giddens enfatiza que “corporações multinacionais, podem controlar um imenso poder econômico, e ter capacidade de influenciar sistemas políticos em seus países-base e em outros lugares” (1991, p. 75). Dessa maneira, a força política dessas representações toma uma dimensão relevante no tratamento das políticas educacionais. Burbules e Torres apontam para as formas indiretas dessas ações: A influência empresarial sobre o Estado é exercida de forma indireta por meio de liderança intelectual, incutindo nos legisladores um novo conjunto de valores e impondo limites sobre a variedade de opções do Estado, o que representa uma estratégia mais eficaz para mudar prioridades políticas do que a ameaça explícita de sanções punitivas. (BURBULES; TORRES, 2004, p. 16). A relação entre a educação e a economia, no tocante à participação de representantes dos setores produtivos, também se apresenta em uma influência mais direta. A influência exercida na construção de uma política educacional se apresenta também a partir de uma articulação mais direta desses representantes. Luz (2009) comenta sobre a participação do empresariado, a autora menciona que: O padrão de intervenção emergente tem demonstrado uma configuração diferente. Sem anular os elementos do passado, via de regra essa participação foi ampliada por ações mais diretas dos grupos empresariais nas escolas públicas, por meio de projetos tanto financiados por empresas como intermediados por organizações a elas vinculadas e, ainda, por meio da participação dos empresários em programas de governos. Ou seja, por meio de distintas estratégias e ações o empresariado participa da gestão e da oferta no âmbito das políticas educacionais. (LUZ, 2009, p.90). 49 Para a autora, a participação implica em uma redefinição do papel do Estado na gestão das políticas sociais, construindo e ampliando mecanismos de participação de setores privados na esfera da educação. Essa leitura feita por Luz (2009) se relaciona à implementação da descentralização da política educacional. A descentralização, de acordo com a interpretação de Krawczyk apud Luz (2009), tem em vista a autonomia da escola e a criação de mecanismos de descentralização para o mercado, a partir do emprego da noção de responsabilidade social. Como exemplo de atuação do empresariado na política educacional a autora menciona: A redefinição dos espaços de gestão colegiada nas escolas; a criação de programas educacionais em nível federal, com o fim de firmar parcerias com os grupos privados; uma série de subvenções a programas e projetos criados no interior das organizações; o incentivo a diferentes formas de atuação voluntária; a realização conjunta de fóruns entre empresários e poder público; e a criação de outros mecanismos de interlocução das políticas educacionais etc. (LUZ, 2009, p. 103). As formas de participação identificadas pela autora, representantes do processo de descentralização, são também apontadas como ações que influenciam a legitimidade da política governamental. Por outro lado, Barroso5 apud Luz (2009) registra que: As alterações no modo de regulação social estão concorrendo para a construção de novos ajustamentos na legitimidade do espaço educacional, dando lugar a “estratégias e lógicas de ação de diferentes atores, através da confrontação, negociação e recomposição de objetivos e poderes. (LUZ, 2009, p. 91). A orientação para os sistemas educacionais é a intervenção estatal, que passa a ter desafios diferenciados no contexto da globalização. Burbules e Torres concebem que o estado-nação sobrevive como instituição medial, que não deve ser considerada como impotente, porém limitada para promover equilíbrio entre quatro imperativos: (1) respostas ao capital transnacional; (2) respostas a estruturas políticas globais (por exemplo Organização das Nações Unidas) e outras organizações não-governamentais; ( 3) respostas a pressões e demandas domésticas, de modo a manter a própria legitimidade política; (4) respostas as suas necessidades e seus interesses internos.(BURBULES; TORRES, 2004, p.16). 5 BARROSO, João. Regulação e desregulação nas políticas educativas: tendências emergentes em estudos de educação comparada. Lisboa: ASA, 2003. 50 Os imperativos destacados exercem implicações sobre o estado-nação e as decisões políticas são permeadas por pressões externas e internas. Para os autores o estado-nação não pode ser concebido como um agente soberano, mas vai situar sua força como agente articulador entre tais imperativos. Por outro lado, Burbules e Torres (2004) também enfatizam que as respostas que os estados produzem não são homogêneas e, portanto, não existe uma forma única de influências das condições de globalização. Variáveis como a história, localização geográfica, tipos de governo e formas de representação política, nível escolar e formas de governança exercem efeitos múltiplos sobre a educação. Os autores fortalecem, nesse sentido, o estudo que evidencia uma análise histórica mais matizada a respeito da relação entre estado e educação. Morrow e Torres (2004, p. 41) mencionam que “as histórias dos sistemas educacionais estatais e públicos são elementos fundamentais para explicar a formação de políticas públicas em educação no contexto da globalização”. Lingard (2004) fala em hibridização ao se referir à articulação entre forças locais e globais na construção de políticas em educação: Inter-relações locais, nacionais e globais estão sendo reconstituídas, mas mediadas pela história do local e do nacional e pela política, bem como pela hibridização, uma importante característica cultural resultante dos fluxos multidirecionais da globalização cultural e da tensão entre homogeneização e heterogeneização.(LINGARD, 2004, p. 60). O contexto político, a história local, entre outras questões, produzem arranjos institucionais que realçam especificidades locais no estabelecimento de políticas públicas. O autor evidencia a história local na análise da constituição das políticas educacionais, pois tal procedimento proporciona uma análise com atenção às estruturas em que as dimensões de construção e da prática são reorganizadas, como implicações da globalização. Lingard (2004, p. 61) considera que “as estruturas locais, nacionais e globais emergentes possuem relações mutuamente constitutivas”. A visão apresentada por Lingard reforça a perspectiva local como agente que recebe influência e que produz influência na constituição de políticas educacionais. O conjunto de relações que se estabelecem reúne papéis do Estado, do sistema capitalista, de estruturas de gestão pública e das relações sociais. Ball, (2004, p. 1115) destaca que “o mais importante é o modo como todas essas ações se conciliam quando se trata de criar um senso comum para a política”. O entendimento é que as articulações que se constroem 51 representam interesses, e, portanto, configuram-se de maneiras variadas a partir das negociações que são construídas. As articulações entre fatores na concepção de políticas públicas são evidenciadas em Ball (2004), Burbules e Torres (2004) e Lingard (2004). Os autores consideram que a interação entre fatores faz parte do cenário de construção de políticas públicas e, assim, as interações têm caráter diversificado e respaldam arranjos institucionais específicos. Lingard (2004), em análise sobre o papel de organismos internacionais na construção de políticas públicas enfatiza que uma análise linear do quadro não representa as articulações que permeiam o quadro de construção das políticas locais. A respeito desse cenário, Lingard (2004) afirma: Eles são moldados pela reestruturação do Estado, que foi catalisada por estratégias políticas supranacionais, as quais, por sua vez, estão relacionadas com a disfunção emergente entre o funcionamento do capitalismo transnacional ou global e a forma burocrática de Estado que dominava anteriormente. (LINGARD, 2004, p. 72). A análise de Lingard apresenta nexos entre atores que influenciam a construção das políticas de educação no contexto da globalização econômica. A reestruturação do Estado, para o autor, é requerida no contexto de globalização e se configura em uma “mistura reguladora/desreguladora rumo a finalidades mais limitadas” (2004, p. 72). A reestruturação está ligada a um cenário internacional e a disfunções do sistema econômico. Esse entendimento liga a construção de políticas de educação ao âmbito de uma economia nacionalista, mas também a uma concepção de economia de estados globalizados. A política de educação deve ser compreendida em relação às influências estabelecidas na dimensão local na visão de Ball apud Lingard (2004). O autor direciona a análise para o contexto nacional e realça a discussão da dimensão local na construção de políticas educacionais. A abordagem cíclica das políticas públicas desenvolvida por Ball apresenta as várias influências decorrentes da reorganização das políticas vivenciadas na prática local: 1)Contexto de influência que opera diretamente e indiretamente no centro produtor de políticas do Estado educador e nas escolas; 2)O contexto da produção de textos de políticas dentro deste centro produtor de políticas; 3) As escolas como o contexto de práticas políticas influenciadas pelos outros dois contextos. (BALL, 2004 apud LINGARD, 2004, p. 73). 52 A dinâmica apresentada por Ball demonstra que a construção de política não é um postulado estático. As políticas são recriadas e recebem contribuições do entorno. Ball destaca: A maior parte das políticas são frágeis, produto de acordos, algo que pode ou não funcionar; elas são retrabalhadas, aperfeiçoadas, ensaiadas, crivadas de nuances e moduladas através de complexos processos de influência, produção e disseminação de textos e, em última análise, recriadas nos contextos da prática. (BALL, 2001, p. 102). As observações de Ball demonstram que as políticas devem ser analisadas em função de variedades institucionais, das estruturas, das relações que se estabelecem no campo político, econômico e cultural. O autor ressalta que mais que identificar tais questões, elas necessitam ser questionadas e observadas no contexto de práticas específicas e percebidas como resultado de articulações de contexto global. As considerações de Azevedo (2001), Ball (2001), Burbules e Torres (2004), Giddens (1991) e Lingard (2004), no que se refere à construção de políticas públicas para educação, reforçam a pluralidade de relações, a rede de articulações e as mudanças institucionais. Essas questões fortalecem a pesquisa da realidade local e suscitam o questionamento sobre como as questões econômicas, culturais e políticas locais se articulam e quais respostas a gestão local tem construído. Dessa maneira, evidenciar o conhecimento sobre a realidade local é inerente ao conhecimento sobre a construção das políticas públicas e, nesse quadro, o assunto assume centralidade na discussão sobre o desenvolvimento local. 4.1 REFORMA DA GESTÃO PÚBLICA E GERENCIALISMO A reforma da gestão pública implementada na década de 1990 se insere no contexto de definição do Estado após o período ditatorial. Abrucio (2007, p. 68) menciona que o processo de reforma se correlaciona com a “combinação de dois fenômenos: a crise do regime autoritário e, sobretudo, a derrocada do modelo nacional-desenvolvimentista”. Esse quadro desencadeou um processo de mudanças que impactam aspectos estruturais da gestão pública. As mudanças destacadas por Abrucio (2007) podem ser organizadas em três conjuntos: a democratização do Estado, a descentralização e a reforma do serviço civil, por meio da profissionalização da burocracia. O contexto de reforma e o conjunto de mudanças apontadas são compreendidos dentro de uma agenda política mais ampla, que demonstra um movimento da política global do 53 neoliberalismo nas diretrizes políticas do período que compreende os anos de 1990. Para Dombrowski, essa visão política se apresenta na diretriz da descentralização. Sobre a discussão, o autor menciona que: Ocorre que a ideia descentralizadora ganhou consistência no decorrer de uma agenda neoliberal de reformas do Estado – que apresenta entre seus objetivos não apenas a transferência de encargos da esfera federal para as estadual e municipal, como também a “desresponsabilização” do Estado, em todos os níveis, transferindo parte de suas obrigações para o mercado, ou para a sociedade civil. (DOMBROWSKI, 2008, p. 272). A discussão apresentada por Dombrowski está associada à visão gerencialista da administração pública. O gerencialismo se constitui em um modelo de gestão que permeia a trajetória de reformas estabelecidas no período mencionado. Para Klering;Porsse;Guaddagnin (2010), relações econômicas e sociais incidem sobre o estabelecimento desse modelo: Nesse novo contexto, de desafios impostos pela expansão das funções econômicas e sociais do Estado, do aumento do desenvolvimento tecnológico e da globalização da economia mundial, a proposição de um modelo de administração pública gerencial, emprestando conceitos de administração de empresas do mercado, surge como resposta ao modelo burocrático de administração pública. (KLERING; PORSSE; GUADDAGNIN, 2010, p. 7). Para os autores, o modelo gerencial surge numa perspectiva em correspondência ao contexto de mudanças do Estado brasileiro e orientações quanto a valores de eficiência e qualidade permeiam o desenvolvimento de uma cultura gerencial. A transferência de serviços também é característica desse contexto: “o Estado repassa à iniciativa privada o que esta pode executar sob o controle do Estado” (KLERING; PORSSE; GUADDAGNIN, 2010, p. 8). A presença de empresas privadas configura parcerias entre o público e o privado, que fornecem serviços com subsídios do Estado. Klering; Porsse; Guaddagnin compreendem que esse processo: Descentraliza para o setor público não-estatal a execução de serviços que não envolvem o exercício do poder de Estado, mas que devem ser subsidiados pelo Estado, como é o caso dos serviços de educação, saúde, cultura e pesquisa científica. (KLERING; PORSSE; GUADDAGNIN, 2010, p. 8). 54 O repasse de serviços recebe críticas e desencadeia resistência quanto ao estabelecimento do que os autores chamam de “publicização”6. A crítica à adoção de mecanismos mercadológicos é enfática em algumas análises e o destaque incide sobre a lógica mercadológica que diverge da orientação de serviço público para o cidadão. Sobre a discussão, Andriolo afirma: O que parece ficar muito claro em relação ao paradigma gerencialista é que a adoção de critérios mercadológicos de efetividade para o setor público significa essencialmente a adoção de um critério de racionalidade puramente mercadológica sobre aquilo que, por natureza, é revestido de caráter público. (ANDRIOLO, 2001, p. 7). O entendimento que se coloca é que a atribuição de serviços públicos situados na lógica de mercado produz negação da dimensão política da gestão pública. Uma vez que cidadão e cliente são concepções de contextos diferenciados. Autores como Andriolo (2001) fazem crítica enfatizando que não se trata de abandonar a diretriz de eficiência, mas de buscar conciliar a eficiência dentro de uma construção democrática no serviço público. Em relação ao modelo gerencialista na educação, os sistemas de educação são imbuídos por uma lógica performática, voltadas para o desempenho. Ball (2005, p. 539) destaca que “a cultura de gestão e do desempenho como duas das principais tecnologias da reforma educacional que envolve a utilização calculada de técnicas e artefatos para organizar forças humanas e capacidades em redes de poder, as quais terminam por sonegar o espaço à constituição da identidade profissional dos professores como prática ético-cultural”. Novas relações são ocasionadas pelos novos papeis atribuídos ao modelo gerencialista. Ball afirma que as “as organizações educacionais reformadas estão agora „povoadas‟ de recursos humanos que precisam ser gerenciados; a aprendizagem é reapresentada como o resultado de uma política de custo-benefício; o êxito é um conjunto de metas de „produtividade‟(BALL, 2005, p. 546)”. As inovações incidem sobre os papeis e se estendem à incorporação de novos conhecimentos que se correlacionam com objetivos de uma concepção de mercado de trabalho. Em análise sobre os aspectos do modelo gerencialista no âmbito da educação Ball (2005) ainda aponta questões como a padronização, controles de resultados, estabelecimento de metas, questões estas que são uniformizadas para alcance de desempenhos definidos. No 6 Klering;Porsse;Guaddagnin (2010) utilizam o termo “publicização” para definir o repasse a iniciativa privada de serviços do Estado. 55 entendimento do autor, “cenários diferentes oferecem diferentes possibilidades e limites para o profissionalismo” (BALL, 2005, p. 547). A crítica se coloca ao exercício da docência no contexto do gerencialismo. A incorporação de técnicas e de determinados controles, engessa a possibilidade de respostas específicas. Para o autor esse direcionamento produz a ausência de autenticidade e incide sobre relações sociais e interpessoais: Essas novas formas de regulação institucional e do sistema possuem tanto uma dimensão social quanto interpessoal. Elas se desdobram em complexas relações institucionais, de equipe, de grupo e comunitárias e penetram nas nossas interações rotineiras de forma tal que a interação de seus aspectos colegial e disciplinar torna-se sem dúvida muito obscura. (BALL, 2005, p. 556). Ball aponta para as representações sociais construídas nesse contexto e como estão relacionadas ao discurso dominante da lógica da performance no âmbito educativo. O autor orienta que a pesquisa sobre essa temática da educação no cenário de reformas educacionais deve atentar para a recuperação de memórias excluídas e interromper a auto-evidência de discursos dominantes. As considerações de Ball produzem uma reflexão sobre as influências das reformas situadas no contexto do modelo gerencialista e enfatiza a dimensão das relações sociais que são transversais ao processo de aprendizagem. De maneira oposta, as mudanças trazidas pela adoção do modelo gerencialista atribuem valores e orientações que inibem a construção de respostas específicas e tendem a generalizações. O autor não defende que a incorporação de instrumentos da tecnologia, os quais visem aperfeiçoar a gestão pública seja deixado de lado, mas atenta para o automatismo de posturas diante da orientação que tem por base o alcance de desempenhos. 4.2 DESCENTRALIZAÇÃO E POLÍTICA EDUCACIONAL A Lei de Diretrizes e Bases (lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996) coloca a gestão municipal da educação como ente responsável por organizar o sistema de ensino em colaboração com União e os outros entes federados. As ações colaborativas na interpretação de Gracindo (2003, p.216), têm objetivo de promover a oferta de ensino e no que se refere ao município, receber o apoio necessário para o cumprimento de suas responsabilidades. De acordo com a LDB, a colaboração se refere a: 56 Art. 8º. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino. [...]I – elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; II - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais do sistema federal de ensino e o dos Territórios; III - prestar assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o desenvolvimento de seus sistemas de ensino e o atendimento prioritário à escolaridade obrigatória, exercendo sua função redistributiva e supletiva; IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum; V - coletar, analisar e disseminar informações sobre a educação; VI - assegurar processo nacional de avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino; VII - baixar normas gerais sobre cursos de graduação e pós-graduação; VIII - assegurar processo nacional de avaliação das instituições de educação superior, com a cooperação dos sistemas que tiverem responsabilidade sobre este nível de ensino; IX - autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino. (BRASIL, 1996, p.4, grifo nosso). A participação dentro de um sistema de ensino atribui responsabilidades necessárias à articulação para alcance de objetivos comuns. Essa evidenciação é interpretada por Sarmento (2005), relacionada ao entendimento de que o: Município tem sido apontado como um campo potencializador de experiências democráticas, pela proximidade do governo local com os cidadãos. [...] Neste sentido a criação dos sistemas municipais de ensino significa uma opção do município para assumir sua autonomia e abre possibilidade de maior participação social nas decisões de política local. (SARMENTO, 2005, p. 1373). O papel desempenhado pelos dirigentes municipais é parte do planejamento educacional na configuração da LDB. Esse direcionamento é tido como uma fundamentação da descentralização na gestão pública, numa perspectiva de inclusão da esfera municipal, com o intuito de fortalecimento da gestão participativa. A descentralização política tem relação com o processo de democratização e com a reinvindicação por espaços de participação. Arretche (2002, p. 26) menciona que “No Brasil dos anos de 1980, centralização e autoritarismo eram ambos encarados como filhos da ditadura, ao passo que descentralização, democratização do processo decisório e eficiência na gestão pública andariam automaticamente juntas”. A autora enfatiza que “embora originários 57 do mesmo processo histórico no Brasil – a negação do autoritarismo e da centralização –, federalismo e descentralização não implicam engenharias políticas gêmeas”. Segundo a autora, a análise das relações entre federalismo, descentralização e participação no contexto histórico brasileiro, desvela repercussões na política educacional. Andrade traz uma reflexão de que: O formato em que o Estado brasileiro foi gestado e os diferentes modos como foram coordenadas a sua ação, permeada por ciclos de centralização e descentralização, configura também distintas formas de atendimento da demanda educacional, argumento que justifica a relação intrínseca que se estabelece no atual contexto histórico entre a concepção/lógica de ação do estado e a interpretação/avaliação do campo educacional. (ANDRADE, 2012, p. 83). Na perspectiva de gestão descentralizada, orientada pela LDB, a gestão municipal da educação, tem atribuições consideradas avançadas em relação às disposições legais anteriores a LDB (1996). A esse respeito, Gracindo (2003) registra que: O município precisa, segundo a LDB, adaptar sua legislação educacional e de ensino às disposições da nova legislação, no prazo máximo de um ano. Além disto, há necessidade de o município estabelecer prazos e auxiliar as instituições educacionais na adaptação de seus estatutos e regimentos aos dispositivos da LDB e ás suas próprias normas, vinculando, inclusive, as creches e pré-escolas existentes, ou que venham a ser criadas, ao Sistema Municipal, no prazo de três anos. (GRACINDO, 2003, p. 231). Na leitura de autores como Gracindo (2003), a descentralização proposta na LDB atribui responsabilidades que têm o objetivo de promover a autonomia e dão oportunidade à gestão municipal de estabelecer estratégia na construção de uma política educativa voltada para o atendimento das necessidades locais. É relevante também observar outras reflexões sobre o processo de descentralização administrativa. Na pesquisa realizada por Andrade sobre os Sistemas Municipais de Educação, o autor (ANDRADE, 2012, p. 324), destaca que as relações hierárquicas são valorizadas e que essa visão “corresponde ao procedimento de desconcentração, em que se retira do centro o compromisso com a execução, mas mantem a decisão política sob a regulação do poder central”. O autor sintetiza o entendimento sobre a descentralização considerando que: 58 A descentralização não constitui um fim em si mesmo, mas um mecanismo que é viabilizado através das relações sociais estabelecidas entre sujeitos que incrementam sua ação à luz tanto de suas influencias culturais, quanto de suas convicções politico-ideológicas. (ANDRADE, 2012, p. 17). O marco legal representado pela LDB é viabilizado, como esclarece o autor, através das relações sociais. A evidência da gestão municipal é um avanço no tocante à concepção de gestão descentralizada e divisão do poder decisório. A condição é enfatizada pela autonomia que é conferida à gestão municipal nesse contexto geopolítico. Sobre esse entendimento de autonomia Carneiro menciona que: Ao constituir sistema próprio, cada município passa a gozar de autonomia para organizar, pôr em funcionamento, monitorar e avaliar seus órgãos de educação e sua rede de escolas. Imagina-se que, a partir de agora, cada município brasileiro poderá constituir se Conselho Municipal de Educação como a responsabilidade de legislar no âmbito de sua jurisdição, preservados os limites da legislação federal e estadual. (CARNEIRO, 2009, p. 71). Nessa organização registrada na LDB, há áreas de competências aos entes federados, que apresentam um entendimento de funcionamento cooperativo. Ao município a competência de “organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados” (BRASIL, 1996, p. 5). Sobre a competência do município em relação ao ensino fundamental, está registrado que: Oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino. (BRASIL, 1996, p. 6). A LDB define competências e orienta quanto à atuação em outras áreas. A orientação é entendida como um aspecto dinâmico para a gestão educacional, pois potencializa a construção de uma política cooperativa entre as esferas institucionais e de iniciativas que podem significar inovação para a gestão local. Tomando como exemplo as orientações para a Educação de Jovens e Adultos (EJA), a oferta para esse nível é direcionada aos sistemas de ensino, isto é, os entes podem compartilhar a oferta para a EJA. Sobre esse tema, Gracindo 59 (2003, p. 222) menciona que se configura uma ação concreta na busca por democratização e as responsabilidades do sistema municipal. A LDB orienta que: Art. 37º. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria. § 1º. Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames. § 2º. O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre si. (BRASIL, 1996, p. 15). A concepção de gestão que permeia a lei está voltada para reunião de interesses, entre as instâncias governamentais através da construção de modelo cooperativo e o fortalecimento de sistemas autônomos. O entendimento é de que as diferenças regionais devem ser consideradas no planejamento de uma política nacional que pretende ser cooperativa. Dessa forma, o estudo da política educacional deve elucidar a dinâmica das relações que produzem a construção normativa e a prática social. A partir dessas considerações, compreendemos que o estudo sobre as orientações normativas deve considerar as relações sociais e influências do contexto em que são estabelecidas as leis. Sobre esse aspecto, Dourado registra: Uma perspectiva importante implica não reduzir a análise das políticas e da gestão educacional à mera descrição dos seus processos de concepção e/ou de execução, importando, sobremaneira, apreendê-las no âmbito das relações sociais em que se forjam as condições para sua proposição e materialidade. Tal perspectiva implica detectar os tipos de regulação subjacentes a esse processo. (DOURADO, 2007, p. 992). As considerações de Andrade sobre o regime de colaboração se alinham à orientação de Dourado (2007), uma vez que observam as relações sociais no seu contexto. Andrade (2012) menciona que a relação entre os entes federados está orientada pelo ente mais elevado e que a criação dos sistemas municipais é fruto de muitas disputas políticas. Essa relação ocorre através de imposições e transferências de responsabilidades sem apoio técnico e financeiro. O autor esclarece que: Pode-se afirmar que há, neste contexto de relações, uma situação em que a colaboração com o Município, o Estado e a União é circunscrita à distribuição de matriculas do ensino fundamental, sem que haja iniciativas 60 para elaboração de uma agenda programática de intervenções, acordadas entre tais esferas. (ANDRADE, 2012, p. 20). A investigação de Andrade (2012) sobre os sistemas municipais de educação evidencia limites no estabelecimento de um regime de colaboração e autonomia municipal. Os limites ocorrem, segundo o autor, em função da falta de clareza sobre o regime de colaboração. Questões como os papéis dos entes, as ações pactuadas entre os sistemas, não são tratadas na lei. O decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007, trata da implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação. Nesse plano, a menção ao regime de colaboração é relacionada à articulação entre programas e ações de assistência técnica e financeira, registrada no Plano de Ações Articuladas (PAR). O PAR é um plano apresentado pelo Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) 2007, vinculado ao Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, que é um programa estratégico do PDE. O plano é considerado como instrumento para fortalecimento do regime de colaboração: O Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, um programa estratégico do PDE, instituído pelo Decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007, inaugurou um novo regime de colaboração, conciliando a atuação dos entes federados sem lhes ferir a autonomia, envolvendo primordialmente a decisão política, a ação técnica e atendimento da demanda educacional, visando à melhoria dos indicadores educacionais. Sendo um compromisso fundado em 28 diretrizes e consubstanciado em um plano de metas concretas e efetivas, compartilha competências políticas, técnicas e financeiras para a execução de programas de manutenção e desenvolvimento da educação básica. (BRASIL, 2007, não paginado). O roteiro de organização do plano, inicialmente, fortalece a atuação de equipe técnica local para a gestão educacional. A equipe fica responsável pela elaboração de um diagnóstico do quadro municipal. Esse diagnóstico está estruturado em quatro dimensões: 1) Gestão educacional; 2) Formação de Professores e Profissionais de Apoio Escolar; 3) Práticas Pedagógicas e Avaliação e 4) Infraestrutura Física. As dimensões apresentam subdivisões em áreas, e as áreas apresentam indicadores, que são as metas a serem alcançadas para a qualidade da educação básica. Para Duarte e Junqueira (2013, p. 187), o PAR “contribui para maior protagonismo da União na coordenação dos demais sistemas de ensino, ou, como menciona Barroso7 (2006) apud Duarte Junqueira , “na metarregulação sistêmica”. Por outro 7 BARROSO, J. A regulação das políticas públicas de educação: espaços, dinâmicas e atores. Lisboa: Educa, 2006. 61 lado, Duarte e Junqueira fazem uma crítica à concepção do PAR que é da falta de correlação com o regime de colaboração, as autoras apontam que: A elaboração do PAR pelos municípios e do PDE pelas escolas reforça, além da articulação de ações locais pela lógica do desempenho, o papel de coordenação sistêmica ou de regulação institucional do sistema educacional no País, sem uma regulamentação prévia do regime de colaboração. (DUARTE; JUNQUEIRA, 2013, p. 188). Posteriormente, o regime de colaboração é evidenciado na Emenda Constitucional nº 59 de 11 de dezembro de 2009, que traz acréscimos a artigos da Constituição de 1988. O texto da lei registra que “Na organização de seus sistemas de ensino, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório”. (BRASIL, 2009). Ao se referir a “formas”, novamente o encaminhamento sobre o regime de colaboração permanece sem clareza. A orientação nesse texto abre possibilidades ao estabelecimento de formas particularizadas, que podem fortalecer singularidades de um processo de colaboração. Assim, consideramos que as formas colaborativas devem ser entendidas nos contextos onde se desenvolvem, mas fortalecidas por um lastro legal. Em algumas abordagens como as de Saviani (1999), Carneiro (2009) e Andrade (2012), o regime de colaboração está relacionado aos princípios da gestão democrática, promovido por uma gestão sistêmica da gestão educacional. Dessa forma, compreendemos que a concepção de regime de colaboração está relacionada ao processo de democratização brasileira. 4.2.1 Regime de colaboração A orientação da LBD quanto à organização dos sistemas de ensino em regime de colaboração, pressupõe uma organização que apresente uma configuração sistêmica e na qual haja compartilhamento na atuação dos atores institucionais. No campo da educação, essa discussão é tratada por Saviani (1999, p. 20) que menciona: “Sistema de ensino significa, assim, uma ordenação articulada dos vários elementos necessários à consecução dos objetivos educacionais preconizados para a população à qual se destina”. O objetivo em comum numa visão sistêmica requer uma política educacional que tenha como base a negociação e a colaboração. 62 Para Carneiro (2009, p. 71), a atuação colaborativa tem também o objetivo de “construção de uma base congruente de políticas públicas para educação, afim de que não se promovam esforços concorrentes”. A atuação cooperativa nas orientações da LDB fortalece a divisão de competências, apoio técnico e financeiro. Pesquisas como a de Andrade (2012) apontam que a Constituição de 1988 registra a colaboração, mas não há indicação como deve ocorrer o regime de colaboração entre os entes. Isso evidencia limites ao funcionamento de uma gestão sistêmica. Sobre a concepção de regime de colaboração, Andrade (2012, p. 113) registra que: “Supõe-se a reciprocidade da constituição de normas e finalidades gerais, por meio de competências privativas, concorrentes e comuns entre os entes federados, que serão levadas a efeito pela gestão sistêmica da educação”. A reflexão do autor evidencia a discussão sobre a lógica federalista competitiva e a gestão sistêmica da educação. E como tais questões necessitam de revisões para além da delimitação de responsabilidades por ente federado. A gestão sistêmica e o regime de colaboração são atribuídos a um contexto recíproco, os temas permeiam outra discussão, a das desigualdades regionais e construção de objetivos comuns de um plano nacional. Destacando colaboração, visão sistêmica, para a construção de uma política unificada. Partindo dessa concepção, a reflexão de Andrade sobre a concretização de um regime de colaboração pressupõe: A conjugação entre os municípios, o Distrito Federal, os Estados e a União devem assumir e o que precisa ser respeitado em face dos interesses do conjunto da nação (e não apenas de suas partes isoladamente) exige, por parte do governo federal, o exercício da sistematização das diretrizes gerais que deverão ser respeitadas em todos os níveis administrativos do país, e, por parte de cada ente federado, a consolidação de mecanismos de intervenção em etapas especificas da execução de politicas públicas nos diversos setores de atuação estatal. (ANDRADE, 2012, p. 99). Dessa maneira, o regime de colaboração e a gestão sistêmica devem coexistir, consolidando a correlação de uma gestão que tem objetivo em comum, fundamentada nos princípios da gestão democrática da participação, descentralização e autonomia. Isto é, a gestão democrática requer o engajamento dos indivíduos com os interesses públicos. Assim, além de uma orientação da política educacional, um regime de colaboração se constitui também através de ações cooperativas, numa gestão democrática, com atores institucionais da gestão pública e representantes de grupos sociais. Essa fundamentação fortalece o entendimento de que a política educacional é permeada por interesses e, por isso, não é isolada das questões econômicas, sociais e culturais. A partir dessa fundamentação consideramos que o crescimento industrial no município 63 pernambucano de Goiana, trará contribuições ao estudo da gestão municipal da educação naquele município, sobretudo no que se refere ao regime de colaboração e de possibilidades de cooperação com atores do entorno. 4.2.2 Políticas de Financiamento A concepção de descentralização permeia a construção de políticas públicas e a concepção inicial de distribuição de responsabilidades, atribuições e autonomia, mantém também relação com a interface econômica. Krawczyk (2005, p. 811) registra que o processo de descentralização apresenta “novas formas de financiamento, fornecimento e regulação diferentes das tradicionais, exclusivamente assumidas pelo Estado”. O quadro apresentado pela autora se configura na reestruturação do estado, inseridas no processo de redemocratização política. A reestruturação do estado correlaciona o processo de descentralização, que promove novas funções ao governo central, estaduais e municipais aos recursos para financiamento. Casassus (1990) analisa o processo de reformas estabelecido em ciclos que representam: 1) Reformas orientadas para a expansão dos sistemas educativos de modo que amplie as possibilidades de um maior número de pessoas ingressarem no sistema; 2) processos mais complexos e que são denominados de segunda geração, pois estão relacionados com temas, como os de gestão de sistema e de qualidade. (CASASSUS, 2001, p. 9). As reformas são apresentadas por Casassus relacionadas à superação de desigualdades sociais, que se fortalecem na política de redução de recursos econômicos e a ineficiência de gestão. O rebatimento desse quadro se sedimenta no processo reformista que tem lastro nos impactos do sistema econômico, e influencia diretrizes políticas, sociais e culturais. As diretrizes da política educacional desse contexto são fortemente ancoradas, de acordo com Shiroma; Garcia e Campos (2011, p.226), em princípios e preceitos do Banco Mundial. Para as autoras, os objetivos vinculados à maior qualificação da força de trabalho, são enfatizados para garantia da competitividade industrial. Por outro lado, Araújo (2006, p. 296) propõe a reflexão do papel da gestão local na consolidação de uma agenda para a política de educação que esteja ancorada nesses objetivos: “a hegemonia adquirida por essa agenda só se deu pelo papel ativo exercido pelos atores locais, governos que atuam no sentido de legitimar as mudanças educacionais realizadas”. Se, por um lado, aponta-se que as políticas 64 públicas de educação são permeadas por orientações, como o do Banco Mundial, por outro, os arranjos locais também promovem contextualizações significativas. O quadro apontado é indicativo dos impactos da economia para a política educacional. Para Peroni, “é um período democrático politicamente, mas o financiamento delimita fortemente as relações entre os entes federados.” (PERONI, 2006, p. 342). A afirmação da autora evidencia uma relação entre os entes federados, direcionada por uma centralização da União. Peroni enfatiza que a subordinação dos entes federados se consolida na necessidade de recursos e isso motiva adaptações das políticas locais para aquisição de verbas. A descentralização política aponta para mudanças em relação à autonomia dos entes federados, mas, por outro lado, torna o processo de gestão ainda centralizado nas diretrizes da União. Farenzena (2014) destaca que a federação que emerge da Constituição de 1988 e do quadro político desse período aponta para a não centralização do poder político e o reconhecimento da gestão municipal. Contudo, em meados dos anos de 1990, o estabelecimento de restrições produz limitações à gestão municipal: Desde a segunda metade dos anos 1990 os estados e municípios foram sofrendo restrições na sua autonomia de implementação de políticas. Um dos principais fatores de restrição é o enquadramento dos estados e municípios na estratégia de ajuste fiscal (privatizações, renegociação das dívidas, geração de superávit primário, disciplina fiscal através da Lei de Responsabilidade Fiscal). (FARENZENA, 2014, p. 2). A autora destaca ainda que as limitações à gestão municipal apresentam regras mais rígidas no que se refere ao uso dos recursos com programas sociais e que os subsídios da União não abrangem todos os municípios. Dessa forma, o quadro é caracterizado pela transferência de responsabilidade. Farenzena (2014) destaca que grande parte do financiamento da oferta da educação básica cabe aos governos estaduais e municipais. Essa política de descentralização para Leite pode ser compreendida como: A descentralização, mais correto seria denominar desconcentração, buscava que cada instituição se responsabilizasse pelos serviços prestados, que a população usuária fiscalizasse esses serviços pela participação nos conselhos criados e a criação de um sistema de avaliação externo a ser divulgado publicamente para estabelecer a competitividade e, dessa maneira, a qualidade dos serviços. (LEITE, 2007, p. 221). Para Leite, a discussão da descentralização está atrelada ao tema do financiamento. A autora afirma que: 65 No Brasil, a descentralização aparece enquanto diretriz desejável no sistema público na Constituição de 1988, no esteio do processo social e político que se organizava a favor da retomada do caminho democrático e da Reforma Fiscal aprovada que recolocava a discussão sobre a responsabilidade dos entes federativos, em função da descentralização financeira. (LEITE, 2007, p. 226). A diretriz legal comentada por Leite (2007) é consolidada na Constituição Federal de 1988, no artigo 212, que fixa percentuais destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino: A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os estados, e o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida e proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino. (BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1988). Além da garantia dos percentuais fixados na Constituição, a criação de Fundos para a manutenção da educação é construída para atendimento de objetivos específicos relacionados à gestão financeira da educação. Sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF): Genericamente, um fundo pode ser definido como o produto de receitas específicas que, por lei, vincula-se à realização de determinados objetivos. O FUNDEF é caracterizado como um fundo de natureza contábil, com tratamento idêntico ao Fundo de Participação dos Estados (FPE) e ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM), dada a automaticidade nos repasses de seus recursos aos Estados e Municípios, de acordo com coeficientes de distribuição estabelecidos e publicados previamente. As receitas e despesas, por sua vez, deverão estar previstas no orçamento, e a execução contabilizada de forma específica. (BRASIL, 1996, não paginado). As mudanças promovidas pelo FUNDEF são consideradas por Oliveira e Teixeira (2014) uma inovação, por definir novos mecanismos de distribuição dos recursos já existentes que instituem legalmente e de fato um novo padrão de gestão da educação básica. As autoras mencionam que: Essa inovação ocorre basicamente porque 15% de alguns impostos devidos aos estados e municípios são retidos numa conta única e repassados a esses entes federados proporcionalmente ao número de alunos matriculados no ensino fundamental das suas respectivas redes de ensino, considerando, no mínimo, o valor por aluno/ano definido nacionalmente. (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 2014, p. 4). 66 As considerações sobre FUNDEF, por Verhine e Magalhães (2003)8 apud Oliveira e Teixeira (2014), destacam as mudanças que conferem uma concepção inovadora e, por outro lado, denunciam a insuficiência de recursos: Se por um lado esse Fundo tem sido enaltecido pelas suas qualidades de promover transparência por meio da previsão de controle social e da correção das disparidades regionais pela definição de um dispêndio por aluno correspondente a um padrão mínimo de qualidade, por outro lado tem sofrido críticas que denunciam a insuficiência dos seus recursos, a focalização no ensino fundamental em detrimento da educação básica e a iniquidade na proporção de recursos disponíveis em cada estado da federação. (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 2014). As críticas ao FUNDEF culminam no estabelecimento de um novo fundo, que contemple toda Educação básica. Para as autoras, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) consolida uma proposta de inclusão, por abranger além do ensino fundamental, toda a educação infantil, o ensino médio e as modalidades de ensino para todos os níveis, como: educação de jovens e adultos, educação especial, educação profissional. O FUNDEB foi criado pela Emenda Constitucional nº 53/2006 e regulamentado pela Lei nº 11.494/2007 e pelo Decreto nº 6.253/2007, em substituição ao FUNDEF. É um fundo especial, de natureza contábil e de âmbito estadual (um fundo por estado e Distrito Federal, num total de vinte e sete fundos), formado, na quase totalidade, por recursos provenientes dos impostos e transferências dos estados, Distrito Federal e municípios, vinculados à educação por força do disposto no art. 212 da Constituição Federal. Além desses recursos, ainda compõe o Fundeb, a título de complementação, uma parcela de recursos federais, sempre que, no âmbito de cada Estado, seu valor por aluno não alcançar o mínimo definido nacionalmente. Independentemente da origem, todo o recurso gerado é redistribuído para aplicação exclusiva na educação básica. (BRASIL, 2006, não paginado). A concepção de fundos para a gestão financeira da educação é considerada um avanço para a política educacional, contudo, de acordo com Oliveira e Teixeira (2014), devem promover a qualidade da educação. Sobre essa crítica, Oliveira e Teixeira mencionam que: 8 VERHINE, R. E.; MAGALHÃES, A. L. O impacto do FUNDEF no Brasil: resultado de um estudo comparativo realizado em rede nacional. IN: ENCONTRO INTERNACIONAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO COMPARADA: CONSTRUINDO IDENTIDADE LATINO-AMERICANA, 3., 2003, Porto Alegre. Anais... Porto Alegre: SBEC, 2003. 67 Introduzir a qualidade da educação como um conceito norteador da formulação da política de financiamento exige certa "inversão de raciocínio", pode-se chamar assim. Dever-se-ia partir daquilo que se pretende atingir com a educação, dos objetivos que esta tenha, da função que lhe é atribuída pela sociedade, do perfil de aluno que se deseja formar, das habilidades a serem por eles desenvolvidas. Colocar esse norte à frente da preocupação focalizadora em termos da formulação da política é primeiro saber o que se espera da educação e depois alocar os recursos de maneira a realizar essa expectativa. (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 2014, p. 11). Além das críticas à falta de conexão entre as políticas de financiamento e qualidade da educação, o quantitativo de recursos também é considerado insuficiente. Carneiro e Mesquita consideram que: Os recursos distribuídos estão longe de garantir a equalização de oportunidades educacionais, e tampouco um padrão mínimo de qualidade do ensino, objetivos da assistência financeira da União aos estados e municípios, conforme o artigo 211 da Constituição Federal. Carneiro e Mesquita. (CARNEIRO; MESQUITA, 2006, p. 355). Outra crítica diz respeito à descentralização que estabelece responsabilidades à gestão municipal na concepção de políticas de financiamento. Sobre os encargos direcionados aos municípios, Carneiro e Mesquita mencionam: Os municípios que conseguem auxílio governamental para subsidiar projetos de manutenção da educação infantil, não representam a maioria dos municípios brasileiros, ficando comprovada, desta forma, a transferência desta responsabilidade para os municípios. (CARNEIRO; MESQUITA, 2006, p. 355). Essa concepção é enfatizada por Farenzena ao se referir às atribuições da União: A União tem mantido, ao longo dos anos, atribuições que visam construir uma organização nacional, em especial as tarefas de legislação, normatização e planejamento. Todavia, a gestão e grande parte do financiamento da oferta de educação básica cabem aos governos estaduais e municipais. (FARENZENA, 2014, p. 3). Farenzena considera que essa concepção de descentralização está relacionada à política de descentralização e situada dentro da política neoliberal. Leite (2007) registra que a política neoliberal, empreendida por organismos financeiros internacionais, tomava centralidade na discussão sobre a concepção de descentralização, porém outras discussões também foram tematizadas para elucidar as mudanças estruturais da política nacional, como a 68 governabilidade, por exemplo. Para a autora, vale destacar os efeitos do impacto da globalização na periferia capitalista e o rebatimento nas reformas estruturais. A respeito dos impactos da globalização e as influências para as políticas de financiamento, Leite compreende que: Os estados que perderam capacidade de investimentos, só seriam governáveis se atraíssem investimentos privados, mediante a adoção do conhecido programa de reformas voltada para a desmontagem da institucionalidade em que se fundou a industrialização substitutiva de importações: desregulação, abertura, privatização e descentralização. (LEITE, 2007, p. 228). Para a autora esse quadro coloca desafios à governabilidade. Leite considera a discussão proposta por Fiori (1995)9, na qual destaca que questões como o imobilismo governamental da União e legitimidade político- institucional permeiam a concepção de descentralização. Em relação ao imobilismo da União, a autora registra que o engessamento do governo central promove competição por financiamentos entre os entes federativos, o que distorce o pacto federativo e aprofunda desigualdades, como também promove acirramento da guerra fiscal. Quanto à questão da legitimidade político-institucional, Leite (2006, p. 228) menciona que as experiências observadas em outros estados podem ser experimentas também no Brasil, como “o esvaziamento das militâncias partidárias, a substituição dos partidos políticos pela mídia e um crescente esvaziamento do próprio processo eleitoral”. Leite enfatiza que essas questões estão diretamente relacionadas à estratégia de descentralização e ajudam a entender o contexto de implementação das políticas educacionais. O sistema de financiamento está inserido na concepção política que enfatiza a descentralização e, dessa forma, evidencia as desigualdades regionais. Araújo enfatiza que: O sistema de financiamento da educação pública brasileira, escorado na vinculação de recursos de receitas fiscais dos três níveis de governo, implica na participação dos diferentes entes federados, com diferentes percentuais e com diferentes impostos para a manutenção e desenvolvimento do ensino. (ARAÚJO, 2006, p. 308). O autor aponta outras relações que permeiam o financiamento de políticas educacionais. Araújo (2006) menciona que: 9 FIORI, José Luis. A governabilidade democrática na nova ordem econômica. Novos Estudos Cebrap, n. 43, p. 129-156, 1995. 69 O fato de que os municípios brasileiros tenham alcançado tal proporção de crescimento de suas despesas educacionais não é suficiente para eliminar as desigualdades existentes entre diferentes municípios, diferentes estados e diferentes regiões. (ARAÚJO, 2006, p. 309). Esse quadro evidencia questões que permeiam a política de financiamento no que se refere aos governos municipais e as desigualdades regionais. O autor destaca, na discussão, a evidência da gestão local com financiamento educacional, uma vez que as regiões mais pobres são as que dispõem de menos recursos por aluno. As considerações apresentadas pelos autores elucidam a necessidade de participação mais efetiva da União no que se refere à equalização de políticas de financiamento que diminua as disparidades regionais. 70 5 PODER LOCAL O cenário que destaca a descentralização política na redemocratização brasileira enfatiza o poder local. O poder local se constituía em uma discussão central sobre a construção de formas de relacionamento entre Estado e sociedade, pois tais reformas estavam atreladas ao processo democrático. Vieira (2011) menciona que o conceito relaciona espaços decisórios mais próximos dos cidadãos, como municípios, o distrito e o bairro. Dowbor entende que a evidenciação do poder local se torna central para os países subdesenvolvidos, pois mantém relação com o desenvolvimento social: o poder local está no centro do conjunto de transformações que envolvem a descentralização, a desburocratização e a participação, bem como as chamadas novas "tecnologias urbanas". No caso dos países subdesenvolvidos, a questão se reveste de particular importância na medida em que o reforço do poder local permite, ainda que não assegure criar equilíbrios mais democráticos frente ao poder absurdamente centralizado das elites. (DOWBOR, 2008, p. 4). O poder local, nesse quadro, é a gestão municipal e isso é registrado na Constituição de 1988. Assim, a cooperação e a descentralização da gestão entre as esferas do governo são enfatizadas. Farenzena (2014) destaca que está vinculado à estrutura federativa e não resulta de opções políticas de um governo. A discussão do conceito de poder local se vincula a uma base conceitual que tem relação com a discussão conceitual de governo local. Gohn destaca que são conceitos distintos, mas que se inter-relacionam. A autora enfatiza que no caso brasileiro o conceito reforça as políticas regionais: No Brasil, vários estudos destacaram como ele penetra no interior do governo local e interfere nas políticas públicas locais, incluindo o poder econômico, político e social das famílias, assim como o poder carismático de lideres locais e regionais. (GOHN, 2007, p. 34). O contexto histórico também reforça a sedimentação do uso de um determinado conceito. Dombrowski (2008, p. 271) menciona que “o „local‟ na política brasileira foi tido como lócus dos desmandos autoritários de mandatários das elites locais ou regionais”. A imagem generalizada do poder local, nessa concepção, configura-se com a corrupção e a gestão pública a favor de ditames de elites locais. 71 Dombrowski (2008) relata que essa construção conceitual dissemina nas décadas de 1920 e 1930 críticas às instâncias locais e repercute na valorização do processo de centralização política: É necessário observar que essa construção foi responsável por difundir entre nós uma aversão extremada às instâncias locais de governo. Explica- se: praticamente toda reflexão política e social do Brasil das décadas de 1920 e 1930 fazia – como não podia deixar de ser – uma crítica profunda e rigorosa da descentralização republicana que abandonara o país ao apetite das oligarquias locais e regionais de base rural. (DOMBROWSKI, 2008, p. 271). A noção histórica, para Santin (2008, p.323), vincula poder local “ao coronelismo, patrimonialismo e personalismo no exercício do poder político”. Essa visão reforça uma reação a favor da centralização do poder, que, na visão de Dombrowski, traduzia-se na Revolução de 1930: Na prática a centralização no bojo da Revolução de 1930 significava esvaziar as instâncias locais de poder, transferindo-o para o governo central, ao mesmo tempo em que se procurava “blindar” (para usar um neologismo da moda) o governo central contra as pressões locais ou localistas. (DOMBROWSKI, 2008, p. 271). Esse quadro associa a gestão centralizada à modernidade, relacionada ao planejamento, à construção de uma identidade unificada de nação moderna. O poder local se associa ao atraso, conforme Dombrowski (2008, p.272). Esse autor menciona que “sediados no interior, aparecerão, definitivamente, ligados ao atraso do mundo rural e oligárquico: esse é o mundo dos desmandos autoritários, dos resíduos feudais, do clientelismo e do coronelismo”. Divergente dessa imagem, a gestão centralizada do Estado é enfatizada em favor do desenvolvimento social. A ideologia desenvolvimentista fortalecida nessa fase é apontada por Dombrowski (2008) como uma das mais sólidas e duradouras da história republicana. A política ditatorial traz mudanças à concepção de gestão do Estado centralizada e a mudança reforça a descentralização e a democratização. Esse quadro promove uma reestruturação federativa que incide sobre a definição de papéis dos entes federados, a organização tributária, entre outras questões. A dimensão social na discussão sobre poder local destacada por Gohn toma novo contorno nos anos de 1990 após a política ditatorial: 72 Nos anos 1990, o poder local passa a ser visto, de um lado, como sede político-administrativa do governo municipal, mais especificamente de suas sedes urbanas (as cidades), e de outro pelas novas formas de participação e organização popular, como dinamizador das mudanças sociais. (GOHN, 2007, p. 34). Gohn enfatiza a participação social, expandindo o conceito em características distintas para além da questão apenas territorial. A representação do conceito de poder local e o contorno que toma nos anos de 1990, relaciona-se ao debate político sobre a democratização e, sobretudo, da participação cidadã nas decisões para o desenvolvimento. As discussões de Dombrowski (2008), Dowbor (2008) e Gohn (2007), enfatizam o entendimento de que na construção histórica brasileira a concepção sobre poder local é polarizada a partir de visões distintas associadas ao modelo de gestão pública. A gestão de Estado centralizada caracteriza historicamente o poder local associado a políticas regionais elitistas. Por outro lado, a perspectiva que se atribui ao poder local na visão contemporânea é de espaços de participação social que possam intervir nas decisões públicas. Sobre esse aspecto, Dowbor (2008, p. 6) menciona que “Estes processos participativos que constroem gradualmente uma âncora de bom senso no conjunto dos processos políticos, a partir da base da sociedade, estão no centro do que aqui chamamos de poder local”. A citação do autor evidencia a proximidade do poder local e participação popular. Dowbor reforça a importância da participação relacionada ao poder local como fortalecimento da democracia, mas enfatiza a limitação desse processo quando destaca que “o poder local é um instrumento de gestão poderoso, mas insuficiente” (2008, p.5). Para o autor, formou-se em torno dessa discussão uma visão simplificadora de solução universal. A importância do poder local e da participação não são suficientes para garantir o desenvolvimento social. Porém Dowbor menciona que o poder local e a participação estão “abrindo um espaço político profundamente renovador na nossa concepção de democracia” (2008, p. 8). Nesse contexto, a democracia representativa promove a transição para uma democracia participativa. O poder local relaciona-se à dimensão da participação e também da autonomia. A ideia descentralizadora apresenta objetivos que envolvem atribuições de papeis das esferas públicas e organização tributária: Consequentemente, o processo de descentralização política se fez então acompanhar de um outro arranjo tributário e fiscal, consolidando assim o processo de descentralização fiscal, iniciado já na década de 1970 e, finalmente, normatizado pela CF/88, que regulamenta a oferta de recursos 73 fiscais e as competências tributárias específicas no âmbito estadual e municipal. (FARIA, 2006, p. 69). Por um lado, a evidência da gestão municipal está correlacionada à democratização, mas, por outro, apresenta-se limitada em relação ao que se entende por autonomia. Faria (2006, p. 70) menciona que “muitos municípios brasileiros não possuem ainda condições econômicas mínimas, necessitando, portanto, de ajuda financeira da União e dos Estados, o que reduz consequentemente a sua autonomia política”. Dessa maneira, há impasses na promoção da autonomia, em relação à manutenção de uma lógica centralizadora e de recursos locais limitados. A dimensão do poder local é também caracterizada na educação, denominada como “a municipalização da educação”. No campo da legislação, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação registra que “ao município cabe à organização e a gestão dos anos iniciais de escolarização, sendo de sua responsabilidade, oferecer a educação infantil em creches e préescolas, e, com prioridade o ensino fundamental” (BRASIL, 1996). Vieira(2011) coloca que o estabelecimento do FUNDEF e, posteriormente, o FUNDEB, amplia a oferta de serviços do munícipio, mas, por outro lado, isso não se traduz em uma ampliação da autonomia. Sobre a discussão da política de educação, Andrade (2011, p. 17) observa que há uma divisão de responsabilidades que evidencia a gestão municipal, mas que “centralização do poder decisório no nível federal, forja a divisão técnica e política”. Há, nesse sentido, que se compreender a gestão local inserida historicamente em uma visão política de gestão centralizada pela União e que, para a construção de uma política de descentralização, necessita-se de avanços políticos e técnicos que viabilizem a autonomia local. Nesse quadro, as articulações nacionais e internacionais fazem parte da agenda política local. Sobre a discussão Faria menciona: Porém merece cuidado o excessivo elogio localista isolado, pois não se pode minimizar a necessidade das conexões com os contextos internacional e nacional, sem as quais torna-se impossível realmente “pensar o local” em suas múltiplas relações e representações. Desta forma, o estabelecimento de políticas públicas locais vai exigir meios concretos para sua viabilização, assim como mudanças nas antigas estruturas da gestão política clássica. (FARIA, 2006, p. 72). A evidenciação da política local destaca a construção articulada e enfatiza o processo de autonomia, contudo a construção da autonomia necessita de meios que promovam avanços no que se refere a recursos para a viabilização de políticas públicas locais, apoio técnico para 74 o planejamento e participação social. Nesse sentido, um conjunto de ações é requerido para a construção da política local. Dowbor pensa a responsabilidade do poder local articulada e estratégica: Com o volume de problemas que se apresenta, a administração municipal já não pode mais ser vista, portanto, como um nível de decisão que se limita à construção de praças, recolhimento de lixo e outras atividades de cosmética urbana. Trata-se de um eixo estratégico de transformação da forma como tomamos as decisões que concernem ao nosso desenvolvimento econômico e social, ao potencializarmos o papel articulador do conjunto das iniciativas e agentes econômicos e sociais que agem no território. (DOWBOR, 2008, p. 11). A dimensão estratégica tratada pelo autor associa o poder local a uma visão propositiva de gestão municipal, compreendida nas formas de articulação para além do âmbito municipal, mas respondendo diretamente às necessidades da população local. Nesse contexto, o poder local e o processo de descentralização política que trazem evidenciação à gestão municipal, é uma construção que se estabelece progressivamente e deve manter correspondência com a capacidade de viabilização orçamentária. Isso implica a participação social como instrumento de mudança política e econômica que consolida a gestão descentralizada voltada para o desenvolvimento local. 75 6 A GESTÃO DA EDUCAÇÃO NO MUNICÍPIO DE GOIANA A partir desta seção, apresentamos a análise de dados coletados através de entrevistas e documentos. O tratamento foi orientado pela análise de conteúdo, com atribuição de categorias de análise, procurando-se conhecer a gestão da educação no município de Goiana, as instâncias que participam da gestão da educação, o Plano Municipal de Educação (PME), documentos que instruem a educação, o financiamento da educação, gestão docente e formas de cooperação da política educacional. Na apresentação da gestão da educação, evidenciamos orientações legais e o diálogo com as informações explicitadas por atores da gestão local. Dessa forma, percebemos correlações e divergências entre a base legal, PME e práticas sociais expostas nos relatos das entrevistas. Os impasses entre o que é documentado e práticas locais da gestão da educação são percebidos de uma forma mais intensa no cenário de crescimento industrial. Essa situação evidencia o panorama de oportunidades locais que desafia a gestão local para um planejamento estratégico diante das mudanças que se colocam. Por outro lado explicita os desafios do quadro da educação, demonstra a necessidade de planejamento, reformulação de instrumentos legais e efetivação de espaços de participação social. 6.1 A POLÍTICA EDUCACIONAL NO MUNICÍPIO DE GOIANA/PE A política educacional no município de Goiana é estabelecida tendo o lastro de documentos legais como a Lei Municipal nº 1998, de 13 de outubro 2006, que “dispõe sobre a criação e organização do sistema de ensino de Goiana-PE, e dá outras providências” (GOIANA, 2006). A instituição do “Sistema Municipal de Ensino Municipal” acompanha a diretriz da Lei de Diretrizes de Bases da Educação sobre a opção de construção de sistema de ensino próprio. A Lei Municipal citada acima, registra que os órgãos do Sistema Municipal de Ensino compreendem a Secretaria Municipal de Educação, como órgão executivo das políticas de educação básica. A Secretaria é assessorada, na execução da política de educação no município, pelo Conselho Municipal de Educação de Goiana (CMEG), que exerce a função normativa, das escolas da rede municipal de educação básica e das unidades escolares da educação infantil privada. 76 Como instância do Sistema Municipal de Educação, a Secretaria, que foi criada anteriormente, pela Lei Municipal nº 1.985, de 30 de abril de 1986, tem objetivos voltados para elaboração, planejamento, coordenação, execução, supervisão e avaliação de políticas públicas de educação do munícipio. A participação da Secretaria abrange de acordo com a lei citada, uma atuação que excede o caráter de órgão executivo. Dessa forma, a participação da Secretaria na construção do Plano Municipal de Educação, atende às finalidades, estabelecidas pela Lei citada acima, para organização e administração do Sistema Municipal de Educação. No Regimento Interno do município, o organograma da estrutura organizacional da Secretaria, apresenta as instâncias, competências e respectivas relações hierárquicas. A seguir, na figura 3, reproduzimos a imagem do organograma da Secretaria registrada no regimento: 77 Figura 3 - Organograma da Secretaria de Educação do Município de Goiana Fonte: Regimento Interno da Secretaria de Educação do Município de Goiana/PE 78 A estrutura organizativa da Secretaria demonstra uma visão seccionada, com distribuição de competências, que pode ser entendida como uma orientação descentralizadora. Contudo, a representação aponta para uma orientação que tende mais à verticalização. O planejamento é disposto na seção denominada de Assessoria de Planejamento e Avaliação, seção que tem a competência de construir o planejamento e a qual compete a “formulação de finalidades; objetivos e diretrizes das políticas educacionais” (GOIANA, 2008, p.12). Contudo, a articulação e a integração entre diversas coordenadorias mencionadas, não é explicitada. A presença de outras instâncias é registrada em documento produzido pelo Secretário de Educação do Município: Conselhos de Controle Social, no âmbito da Alimentação Escolar (CAE), do Transporte Escolar e do Fundo Municipal de Controle e Acompanhamento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB); um Fórum Municipal de Educação e 42 (quarenta e duas) Escolas nas Etapas e Modalidades de sua competência. (REIS FILHO, 2014, não paginado). As instâncias apresentadas não estão evidenciadas no organograma apresentado na figura 3, porém tramita na Câmara Municipal de Goiana projeto de Lei que apresenta modificações à atual estrutura organizativa. No depoimento abaixo a entrevistada evidencia a tramitação e a necessidade de coerência com o contexto de mudanças locais: A Câmara recebeu um projeto de lei, onde deve tá alterando, pois há muito tempo que existe esta estrutura e deixa ainda muito a desejar diante do crescimento, tanto da cidade, quanto dos programas e projetos que ultimamente tem sido feito convênios [...] Precisa e muito de pessoal pra se ter condição de trabalhar. (Vereador da Câmara Municipal de Goiana 2013-). Na concepção apresentada, a visão de reconstrução da estrutura organizativa da Secretaria, passa pelo entendimento de atualização voltada para a realidade do crescimento de setores produtivos, como também da necessidade de aumento do quadro de pessoal para desenvolvimento de atividades relacionadas à gestão. A construção do sistema é ressaltada como fortalecimento da perspectiva local. Verificamos isso na ênfase à presença do Conselho Municipal de Educação junto à Secretaria na organização da gestão da educação. Sobre esse aspecto o depoente destaca: 79 Nós temos em Goiana um Conselho. E este Conselho participa da elaboração da política educacional. E sempre que possível, a gente tá sendo chamado. A gente tem uma interação na construção dessa política. Não chegamos ao desejável [...], mas a gente tem participação nessa política. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-) A instituição do CMEG, como órgão que assessora a Secretaria na política educativa, segue um objetivo de integração com o estabelecimento do Sistema de ensino local. O Conselho foi criado pela Lei Municipal de nº 1.138 de 1969. Contudo, recebem modificações das leis municipais, nº 1.785 de 1996, Lei nº 1997 de 2006 e da Lei 2021 de 2007. As modificações que sucedem a criação do CMEG, nos anos de 1996, 2006 e 2007, dispõem sobre a competência e funcionamento de caráter normativo, deliberativo, consultivo e fiscalizador do órgão. A integração entre o Conselho e a instituição do sistema de ensino no município, representa a composição de uma política local, enfatizada pela necessidade de construção de diretrizes legais do município. Esse caráter normativo do Conselho é registado pela entrevistada: [...] o conselho tem feito resoluções para que a educação reforce seus objetivos e busque uma educação de qualidade. Nós temos a resolução da EJA, a resolução dos anos iniciais, do nono ano, que foi inserido no município, através de resolução do Conselho e temos também uma resolução para a educação infantil [...]. Tem a resolução da educação infantil onde se faz adequações necessárias para que as crianças tenham seu espaço adequado, na mesinha onde senta, no refeitório. Então a gente tem preparado resoluções pra que o munícipio seja auxiliado por essas resoluções, para que tenha seus compromissos cumpridos. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). A instituição do conselho reforça a atuação desse órgão no assessoramento e no alcance de objetivos educativos voltados para a qualidade da educação na visão apresentada acima. A opção de construção do sistema próprio reforça o significado da política educativa local, em relação à participação e à autoridade para legislar do governo municipal. Essa compreensão permeia o entendimento sobre a atuação do Conselho e como isso recai em responsabilidades da gestão local. A discussão sobre a autonomia local para legislar e atender assim a necessidades mais específicas da dinâmica do município é registrada no depoimento abaixo: [...] a constituição de 88, elevou aos municípios a digamos a autoridade de criar seu sistema. Goiana é sistema desde 2004. Então nós optamos por organizar o nosso sistema. Aqueles municípios que não criaram seus sistemas, ou não organizaram seus sistemas, ainda absorvem as diretrizes do 80 Estado. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). Outro aspecto da política educativa é a presença de Conselhos de Controle social, que, no depoimento da Conselheira, auxiliariam na organização administrativa e têm rebatimentos na captação de recursos para financiamento de políticas públicas locais: Além do Conselho municipal que é um dos órgãos principais dentro do município, por ser um sistema, ele é normativo, ele deliberativo, fiscalizador, mas também tem o Conselho do FUNDEB, o Conselho do CAE da Merenda, temos o Fórum municipal, que é integrado com várias pessoas da sociedade civil também. Temos o PAC, que é uma parceria do Governo Federal com o município, temos uma comissão do PAR, onde nós nos reunimos para fazer uma avaliação das propostas para saber se foram atendidas, se não foram atendidas, nós temos dado retorno para o Governo Federal, e temos sido atendidos com creches, com escolas, com reformas, com mobiliários, chegaram os aparelhos de ar-condicionado para serem instalados nas escolas. E eu estou muito feliz! As quadras, as obras estão finalizando e tem outras que já estão iniciando. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). O caráter normativo é enfatizado nos depoimentos, em correlação com a instituição do sistema de ensino próprio. Por outro lado, o caráter sistêmico de funcionamento, atribuído a um sistema de ensino, demonstra necessidade de consolidação, conforme é registrado no trecho da entrevista abaixo: Eu não posso dizer ainda que é sistema, por que sistema significa uma articulação. Uma articulação em prol de alguma coisa. Em prol de uma finalidade. E a gente não nota que exista essa articulação. Existe uma diretriz que os municípios ou seguem, ou não seguem. Aqueles que seguem têm os melhores resultados, ganham os investimentos, os recursos. E aqueles que não seguem ficam à margem e não há nada, entendeu? Então um sistema que é uma coisa concatenada, organizada, definido quais são os papeis. Este é o grande debate nacional: o Regime de colaboração, discussão do que é sistema, e qual é a responsabilidade dos entes: municípios, Estados e União, nessa questão da execução do sistema, tornar o sistema vivo, dinâmico. E que cumpra os objetivos para o qual foi criado. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). A subordinação entre as esferas governamentais tem sido compreendida na fala anterior vínculada à condição de recebimento de recursos. O depoimento enfatiza que há lacunas entre o que é veiculado ou compreendido em relação à constituição de um sistema e o que ocorre em gestões locais. Essa compreensão aponta para a ocorrência de incorporação de sistemas de controles padronizados que vêm junto com recursos, condicionados pelas 81 políticas de financiamento. Como tal, as formas estabelecidas dessa natureza reforçam a subordinação e a existência de uma orientação central que permeia a gestão local produzindo também limites à autonomia. A fundamentação teórica aponta para o entendimento de que a gestão e as políticas públicas de educação devem ser compreendidas para além das concepções e processos, como afirma Dourado (2007). Além disso devem ser incluídas as regulações subjacentes, que implicam na materialização dessa política. Dessa maneira, o entendimento de Sarmento (2005) de que a descentralização no nível municipal é alvo de divergências entre políticos e educadores, enfatiza dimensões da concepção e da prática de estabelecimento de uma política. Como observamos, quando o depoente registra que a interação entre a Secretaria e instâncias como Conselho Municipal de Educação ainda não chegou ao desejado para a construção da Política de Educação Municipal, evidencia as divergências entre atores dessa política. A participação embora seja enfatizada, não atende ainda a uma perspectiva de construção descentralizada, em que os papeis de Conselho e Secretaria possam exercer funções conjuntas para a política local. Podemos observar no relato abaixo que é algo requerido, mas que não se consolidou na prática local: [...] A gente já discutiu sobre isto, tem até alguns documentos. Muitas vezes as políticas são implantadas no improviso, não existe um planejamento, um espaço para discussão e o pior, não existe uma análise, uma avaliação, se aquilo que foi implantado deu certo, precisa melhorar em que? Então não existe esse retorno daquilo que foi implantado. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). O relato demonstra que a construção política não tem alcançado uma perspectiva de participação desejada, a qual apresente planejamento participativo, espaços de discussão e uma política de avaliação. O entendimento é que a gestão local ainda não consolidou espaços de participação política e esse quadro esclarece uma diretriz política centralizada, que por sua vez, desfavorece espaços de fortalecimento de sujeitos políticos. Nos relatos que coletamos, a participação normativa do Conselho é ressaltada. O que demonstra uma dinâmica de ações voltadas para a formulação de instrumentos legais da gestão municipal. Por outro lado, a dimensão de mediação entre sociedade civil e gestão governamental, não recebe o mesmo destaque nos relatos. Outra questão apontada no relato acima é a construção política de um planejamento solidificado que represente conhecimento da realidade local e tenha objetivo de promover 82 avanços de qualidade e que não tenha um caráter transitório relacionado à imprevisibilidade. Esse aspecto é fortalecido por um processo de avaliação de políticas, que de acordo com o relato exposto inexiste. Outra dimensão da construção da política educativa no município é a transparência e o uso racionalizado dos recursos. No trecho da entrevista que reproduzimos abaixo é explicitado que a participação na construção da política educacional no município não favorece a proposição de instâncias como, por exemplo, o Conselho, no uso de recursos para as politicas públicas. E, por outro lado, a própria transparência desses recursos fica a desejar: E o outro lado é a questão do investimento, do dinheiro, do capital que é investido. Isso fica ainda muito a desejar, por que a gente não tem conhecimento pleno do capital, o que a gente poderia fazer mais barato, se realmente aquele foi um investimento necessário para desenvolver aquela política. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). O depoimento citado faz menção à constituição de um espaço participativo, de fortalecimento do poder decisório para as instâncias como o Conselho Municipal de Educação. Apesar de reconhecer que há uma interação na construção da política de educação local o depoente declara que faltam elementos que favoreçam uma gestão descentralizada. Quando questionado sobre o que seria desejável à construção de políticas de educação local, o depoente responde: Então quando eu falo do desejável, ele tá nessa balança aí, entre o planejamento, deixar o improviso mais de lado e a questão da plenitude na deliberação dos investimentos para que a gente soubesse, para que a gente discutisse esses investimentos. Então para a gente chegar ao desejável a gente precisa tomar conta dessas duas ações. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). Os dois aspectos indicados na citação acima, a decisão sobre os investimentos e a consolidação de um planejamento local, implicam na construção de uma política que tem o objetivo de ser participativa. O improviso ao qual se refere o entrevistado aponta para a ausência de planejamento que caracteriza a descontinuidade de políticas. A gestão municipal registra que instituiu a realização de conferências municipais, com o objetivo de promover espaços de participação social. De acordo com o Secretário de Educação do município: 83 No ano passado a Gestão instituiu, por Decreto Municipal, o Fórum Municipal de Educação, responsável pela organização das Conferências Municipais de Educação e pela Coordenação do Processo de Reformulação do Plano Municipal de Educação (PME). (REIS FILHO, 2014, não paginado). O entendimento sobre a constituição de Fóruns de discussão é registrado pelo Secretário em entrevista à União Nacional dos Dirigentes Municipais (UNDIME): O Fórum amplia a participação e traz entidades e grupos que não estão contempladas na composição do CME e em outros órgãos de controle essenciais na área educacional, como o conselho do Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação] e o Conselho de Alimentação Escolar (REIS FILHO, 2014, não paginado). A participação apontada pelo Secretário é uma oportunidade para a inclusão de grupos locais que influenciam a construção do plano municipal e o estabelecimento de propostas voltadas para a realidade local. A visão de participação contida nos Fóruns Municipais de Educação é de articulação entre as instâncias executivas, legislativa e sociedade: É importante o Fórum se instituir como órgão sistêmico e articulador das políticas educacionais definidas no município. O Plano Municipal de Educação é um instrumento desta articulação e o Fórum deve fazer a interlocução entre o poder executivo, o poder legislativo e a sociedade por meio das metas e diretrizes definidas no Plano. (REIS FILHO, 2014, não paginado). Os Fóruns, na visão registrada por Reis Filho (2014), promovem uma construção participativa, agregando espaço de participação e planejamento. O entendimento não é sobreposição da dimensão do planejamento em relação a espaços de participação, mas de construção conjunta. Contudo, o que observamos é que o próprio processo de planejamento não evidencia uma agenda de participação. A fala de outro entrevistado menciona a experiência dos Fóruns de discussão e registra a dinâmica vivida, mas reforça que existe uma necessidade de se fomentar as organizações dos Fóruns Municipais de Educação: Nós temos atas, nós fazemos debates sobre os temas discutidos. Há a participação do segmento de pais de estudantes, de gestores, de professores, dos Conselhos. Nas reuniões temos uma pauta e aquela pauta ela pode até se estender, mas a gente busca o consenso e se esse Fórum for fomentado mais 84 vezes a gente consegue atingir objetivo de participação. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). A experiência de realização dos Fóruns Municipais de Educação, na visão da entrevistada, é positiva quanto à abertura de participação política. No relato verificamos que a Conselheira entende que esse é um movimento de “empoderamento” de representações participantes, pois promove a construção de uma política educativa de forma conjunta. O interesse em estabelecer esses espaços faz parte do entendimento da atual gestão, como podemos perceber no trecho abaixo: Existe uma clara intenção do Secretário em ativar o fórum, mas o fórum é uma experiência aqui no nosso município que não deu bons frutos. A comunidade para atuar em fórum é difícil. Mas existe uma boa vontade da Secretaria em relação aos fóruns. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). A dimensão de participação social na visão do entrevistado não constitui uma experiência efetivada no município. Além disso, uma agenda de realização de Fóruns ainda não foi estabelecida. O sistema de ensino compreende “uma ordenação articulada dos vários elementos necessários à consecução dos objetivos educacionais preconizados para a população à qual se destina”, como afirma Saviani (1999, p. 120). Dessa maneira, a constituição de espaços de participação é uma atividade da ação sistematizada. Saviani reforça o debate entre a ação sistêmica e objetivos educacionais, apontando que o resultado da ação sistematizada é o planejamento. O plano de educação é, nesse quadro, a materialização dos esforços empreendidos no planejamento da política educacional. Nesse aspecto, de acordo com a concepção teorica explicitada acima, a constituição de espaços de participação, a colaboração entre os entes, a racionalidade do uso dos recursos são, entre outros, frutos de uma ação sistematizada. Assim, verificamos que o município empreendeu a construção da legislação educacional, de acordo com a orientação legal constante na Lei de Diretrizes e Bases, mas a legitimação de espaços de participação, que compreendam uma visão de gestão descentralizada não é evidenciada. O planejamento da política educacional vislumbrada na construção do Plano de Educação Municipal, são sinais da formalização do planejamento da política de educação local. Contudo, o cenário de mudanças ocasionada pelo crescimento industrial promove novas 85 questões para a política de educação que não estavam evidenciadas na construção do Plano. Como exemplo, o aumento do número de matrículas apontado pelos entrevistados, é um impasse entre o planejamento estabelecido e o quadro municipal atual. Dessa forma, a política de educação tem desafios potencializados pelo cenário de crescimento industrial e o Plano Municipal de Educação também demonstra necessidade de atualização relacionado ao cenário de crescimento. 6.2 PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO A instituição do sistema de ensino na LDB correlaciona o planejamento e construção do plano municipal. Saviani menciona que a opção do sistema a ser adotado: “deverá ser prevista no plano educacional do município ao mesmo tempo em que determinará a forma como será detalhado o referido plano educacional” (1999, p. 125). Nesse sentido, a construção do plano municipal materializa as diretrizes do planejamento e retrata a política local. A constituição do plano de educação vai além de uma opção administrativa local, representa uma política que atende a objetivos que repercutem no desenvolvimento social. Saviani (1999) faz um relato sobre a concepção de plano em diferentes momentos históricos no Brasil. O autor discorre desde a concepção desenvolvimentista, atribuída aos anos de 1940, até a concepção estratégica dos anos de 1990, voltada para a estratégia de adequação ao financiamento de organismos internacionais. Para Saviani: Uma proposta alternativa de “Plano de Educação” manterá, por certo, a ideia de plano como um instrumento de política educacional. Tratar- se-á, no entanto, de uma política que, visando atender efetivamente às necessidades educacionais da população como um todo, buscará introduzir a racionalidade social, isto é, o uso adequado dos recursos de modo a realizar o valor social da educação. (SAVIANI, 1999, p. 134). O autor defende que o plano de educação é um instrumento político, que perpassa a questão de mandatos políticos, embora tenha um período de vigência. Reúne, entre outras questões, a concepção de uso racionalizado e transparência dos recursos públicos e responsabilidade fiscal. O plano concebido dessa maneira atende ao que o autor chama de “racionalidade social” e influencia também a execução da própria política. O município de Goiana tem um plano municipal de educação, para o decênio de 20082017. O Plano foi instituído pela Lei Municipal nº 2.090 de 29 de dezembro de 2008. A definição do Plano Municipal de Goiana menciona que: 86 É um conjunto de estratégias estabelecidas pela Secretaria de Educação, a vista de um diagnóstico das necessidades educacionais, para superar problemas e atingir objetivos, por meios e metas e recursos cientificamente definidos. As intenções e ações se entrelaçam em um programa com previsão detalhadamente quantificada e qualificada no espaço e no tempo, com avaliação e reprogramação periódicas. (GOIANA, 2008, p. 1). A definição de Plano concebida parte de um diagnóstico de necessidades educacionais e é situado como instrumento estratégico para alcance das metas e objetivos. Os objetivos elencados no Plano são: Elevação global do nível de escolaridade da população municipal; Melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis; redução das desigualdades sociais e de aprendizagem no acesso e no sucesso escolar; democratização da gestão de ensino público, pela participação dos profissionais da educação, na elaboração da proposta pedagógica e pela participação da Comunidade Escolar nos Conselhos Escolares. (GOIANA, 2008, p. 1). A visão que o Plano transmite, a partir dos objetivos elencados, é que a política de educação, que é construída no âmbito local, está pautada, entre outras questões, na mudança de aspectos quantitativos, como o nível de escolaridade da população municipal e qualitativos como o fomento da gestão democrática. Sobre o âmbito de construção do Plano, o trecho da entrevista registra que: O plano Municipal que está em vigência ele foi concebido dentro de um caráter muito democrático. Várias instituições, o professorado, os estudantes, todos os segmentos se envolveram no Plano e se a gente for fazer uma avaliação, do que a gente andou, do que a gente conseguiu com este plano, na maioria das vezes a avaliação é positiva. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). O espaço de participação registrado no trecho acima se refere à instituição de dois Fóruns Municipais, com objetivo de reunir vários segmentos para construção documental. De acordo com os dados do Plano Municipal, o grupo foi composto por professores, equipe técnica e comunidade escolar. A metodologia instituída foi a organização de debates com grupos temáticos, coordenados por Conselheiros do Conselho Municipal de Educação. Os grupos tinham como atividade discutir problemas educacionais e estabelecer alternativas e estratégias de enfrentamento. A organização para a construção do Plano registra a participação da sociedade na construção. A experiência produzida pelos dois eventos é ressaltada no discurso abaixo apresentado pela Conselheira: 87 O fórum criado ele é um dos fatores que a gente vê como primordial por que reúne pessoas de todas as instâncias, do Conselho do FUNDEB, de Merenda, do Conselho municipal de Educação, do governo, para se reunir e debater a qualidade da educação [...] Então esse Fórum funcionou, esse Conselho funcionou, a comunidade teve participação: o pai, do aluno, estudante, representantes dos professores, de gestores, representante do Governo, de igreja, representantes da Justiça. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). Os Fóruns, nesse contexto, são percebidos como eventos pontuais do período de construção do Plano, sendo entendidos dentro do objetivo de organização da produção do texto do Plano. Embora a experiência tenha sido referenciada como relevante ao processo democrático, a construção desse espaço não foi consolidada posteriormente. A estrutura do Plano Municipal de Educação de Goiana apresenta seção sobre o atendimento do nível da Educação Básica e modalidades de ensino. A organização dessa seção registra o diagnóstico, prioridades, diretrizes, objetivos e metas, para a Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio e também para as modalidades, Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional, Educação à Distância, Educação Especial e Educação do Campo. Um cronograma de ações por período é apresentado, com prazos para ocorrência das ações. O conteúdo do Plano também reúne uma seção sobre a Formação e Valorização do Magistério da Educação Básica. A valorização do magistério registrada no Plano implica objetivos da formação profissional, formação continuada, jornada de trabalho, salários e compromisso social e político. Outra seção que compõe o Plano é a de Gestão democrática. A concepção de gestão democrática declara o compromisso de “garantir às escolas municipais, em todos os níveis a gestão democrática com eleição para diretores e vice-diretor” (GOIANA, 2008, p.111). A gestão democrática nesse contexto é referida à: A efetivação do controle social, definindo competências especificas e a adoção de novas capacidades humanas, políticas e técnicas, tanto nos níveis centrais como nos descentralizados, tendo como objetivo o desenvolvimento de uma gestão responsável. (GOIANA, 2008, p. 112). O compromisso de garantir a participação da comunidade nas eleições para diretores das escolas não foi efetivado e o descumprimento dessa ação inviabiliza a institucionalização de práticas democráticas locais. O depoimento abaixo evidencia essa contradição: 88 A gestão democrática, se reveste na forma de escolha dos diretores e da equipe gestora de cada escola. Aí já faz parte do princípio de uma democracia. E hoje aqui no nosso município, a questão é de indicação, cargos comissionados. Então é estranho você defender democracia numa situação em que a própria gestão é indicada. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). A ausência de eleições para as direções das escolas é evidenciada nos relatos e a divergência desse quadro é ressaltada, em relação à perspectiva de gestão democrática registrada no Plano. O entendimento é que o processo de gestão democrática mobiliza o envolvimento entre comunidade e gestor. Em outra fala, destacamos a menção ao envolvimento que o gestor deve ter com a comunidade. Na visão da Conselheira, o conhecimento sobre a realidade de cada escola e as competências que são requeridas ao gestor, envolvem relações com a comunidade escolar, para além da demanda da organização burocrática de planos de financiamentos. O depoimento que registramos abaixo aponta essa questão: [...] Tanto Sindicatos, como Conselhos, vem se articulando com os gestores, que não é desta gestão, mas de outras que a gente vem tentando, para que aconteça a gestão democrática de fato e de direito. Hoje os gestores são indicados pelo governo. E a gente tem grandes preocupações. Enquanto Conselheira eu vejo que os gestores, deveriam ter um conhecimento maior, por que hoje nós não temos apenas um gestor na escola para mandar ou colocar faltas. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). A gestão democrática, no que se refere à eleição da gestão das escolas, registrada pela Conselheira, é requerida em outras gestões e a efetivação não tem sido estabelecida. A participação da comunidade nas eleições para os gestores é prevista no artigo 188, no inciso 6º da Lei Orgânica do Município. A ausência do processo eletivo para diretor e ativação dos Conselhos escolares é também destacado no depoimento abaixo: Existe um esforço de ativação ou de tentar que os Conselhos Escolares funcionem. Existe uma ideia, um apoio da Secretaria Municipal para que isto seja implantado. Mas isso é estranho por que gestão por gestão, isso é apoiado, isto é falado, da importância, mas os gestores das escolas não fazem. A Secretaria solicita que funcione, solicita que os Conselhos sejam implantados, mas na prática é tudo no papel. Nas boas intenções. Eu acho que aí tem uma coisa errada que a Secretaria ainda não atentou para isto. Se a gestão for realmente democrática, parte do principio de que a gestão de cada escola deveria ser escolhida pela comunidade e não apenas o Conselho seja motivador, mas que o próprio gestor dê o esforço pessoal para que isto 89 seja realizado. Talvez seja um principio que eles próprios não acreditam. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). O estabelecimento do processo eletivo para os cargos de direção das escolas, nesse sentido, é uma ação que permeia a gestão democrática, tem aparato legal e apoio de órgãos como Conselho Municipal e Sindicato dos Professores. Mas, a efetivação não foi estabelecida. A ausência do processo eletivo apontado nos relatos acima recai sobre a falha na constituição de práticas democráticas no contexto das escolas e reforça o descrédito da gestão. Dessa forma, a organização de processo eletivo é requerida, como também o fortalecimento de Conselhos escolares, para que práticas cotidianas possam fortalecer a construção da gestão democrática e de relações mais horizontais. Essa situação no relato apresentado abaixo incide sobre relações coletivas, mas também sobre outras relações individuais: [...] imagine uma escola, onde tem seu gestor nomeado, que é cargo comissionado. E esse gestor era o pior professor da escola, um professor que não rendia. Então isso acontece muito, entendeu? Por causa de apadrinhamento político uma pessoa é designada para aquela escola, e veja que sentimento isso cria para os colegas da rede, os professores. É um sentimento de que por uma questão política você pode ter o maior cargo da escola e você não precisa render nada, você não precisa ser um bom professor para isto. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). No relato acima a construção de uma prática de gestão democrática incide sobre a rotina de relações construídas no âmbito da escola. Entendemos que a ausência de um sistema eletivo, interfere nas relações e nos valores que são construídos no ambiente escolar. Marques menciona que “a institucionalização de práticas democráticas na gestão escolar forma sujeitos democráticos. Supomos que estes sujeitos não serão democráticos apenas nas escolas, mais em todos os espaços sociais aos quais pertençam.” (MARQUES, 2011, p. 233). A autora ressalta a escola, como espaço de formação de valores para a transformação social. O impasse entre o compromisso registrado no Plano a respeito de eleições para os cargos de diretor e vice-diretor compromisso este registrado na Lei Orgânica do município e a prática de escolha de diretores e vice-diretores através de indicação da gestão municipal se fortalece na ausência de práticas cotidianas que consolidam a gestão democrática. O Plano ainda trata na última seção de seu conteúdo, do financiamento da educação. Nessa seção, ressalta-se o compromisso de implantação de políticas educacionais com objetivo de atingir a qualidade na educação realizada no município. Destacam-se, no diagnóstico, orientações da LDB sobre os recursos públicos destinados à educação, as 90 orientações da lei para os municípios e a definição de custos, identificação dos recursos e estratégias para aplicação diante das receitas municipais. A seção ainda registra a organização metodológica para a projeção de dados com composição de valores para os anos do decênio 2008-2017 que compreendem a execução do Plano. Os objetivos e metas da seção de financiamento registram o estabelecimento de fundos específicos para níveis de ensino como a Educação Infantil, mobilização da comunidade para exercer fiscalização de aplicação dos recursos. Além disso, registra o objetivo de assegurar a autonomia das escolas quanto à gerencia de recursos, a criação de incentivos fiscais para adoção de programas de assistência estudantil, entre outras questões tratadas na seção. Na elaboração do plano ressalta-se o estabelecimento dos espaços de debates para construção do documento, por outro lado, nos relatos coletados evidenciam-se críticas quanto à representação da realidade financeira exposta e ausências quanto à transparência dos recursos. Quanto às divergências apontadas em relação aos recursos, a discussão evidenciada pelos entrevistados recai sobre a viabilidade de metas e objetivos definidos no Plano. Sobre a discussão, o relato do atual Secretário de educação declara que: A elaboração do Plano Municipal de Educação (PME) se deu fora de qualquer contexto de crescimento econômico, embora ele apresente metas que vão além da capacidade arrecadatória do Município, numa relação de dependência do apoio técnico e financeiro do Estado e da União. (REIS FILHO, 2014, não paginado). O Plano, nesse sentido, não é entendido como um referencial de ações que visem à concretude e à descentralidade: Sobre a elaboração, eu faço a mesma crítica que é feita no cenário nacional. O nosso plano de fato é carregado de boas intenções, só que é um documento de gaveta. De gaveta, por que não adianta só ter boas intenções, por que de onde vai vir o recurso para ser implantado determinada política. É por isto que o nosso plano agora ele vai ser reformulado, reformulado justamente para se adequar ao Plano Nacional. E ao se adequar ao Plano Nacional vai ter estabelecido metas bem claras, de onde vêm os recursos, quais são as necessidades que teremos nesses próximos anos. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). Nesse sentido, o Plano não atinge o cumprimento de metas e objetivos nele registrados e, por conseguinte, não se torna referencial para ações da gestão da educação. Entretanto, a implementação do Plano, que é uma orientação do Plano Nacional de Educação (PNE), não 91 foi conduzida para provimento dos ajustes necessários à realidade. O trecho da entrevista abaixo aponta o entendimento da Conselheira sobre o assunto: Houveram acréscimos de várias modificações, o nosso Plano tem que acompanhar as modificações do governo federal, nós temos que seguir, e só em 2008 nós construímos um plano decenal, se ele não está contemplando as novas demandas como: não será mais obrigação do município fazer concurso para médico, para psicopedagogo, será parceria da Secretaria de Saúde com a Secretaria de Educação. Então aí é um ponto que já tem uma divergência do nosso Plano. Outro ponto é com a questão da acessibilidade, por que a gente tem que pensar acessibilidade não apenas na escola mas fora da escola. Então a gente tem um Plano que contempla essas situações mas precisam ser ampliadas. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). O trecho da entrevista se refere às divergências contidas no Plano em relação às demandas atuais. As divergências ocorrem, nesse entendimento, pelas orientações de políticas do governo federal e o entendimento local sobre certos temas como, por exemplo, a acessibilidade. Para além das divergências, o próprio cumprimento das metas e objetivos estabelecidos no atual Plano, não é incorporado pela gestão atual. O trecho abaixo evidencia essa afirmação: O grande problema é transformar aquelas ações, que acho que isto não é exclusividade aqui de Goiana, é transformar aquelas ações, aquelas ideias que estão lá no Plano em realidade, em execução para que se torne realidade. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). O relato evidencia a desconexão entre o que é documentado em um plano de educação e a materialização do planejamento. Sobre as dificuldades de planejar e materializar o que é planejado a discussão no Plano Nacional relaciona a dificuldade “a complexidade do modelo federativo brasileiro, as lacunas de regulamentação das normas de cooperação e a visão patrimonialista que ainda existe em muitos setores da gestão pública” (BRASIL, 2014, p. 5). O entendimento é que deve haver um esforço contínuo para que as desigualdades estabelecidas historicamente sejam eliminadas. Dessa forma, a construção de um Plano perpassa o período de mandatos políticos e o desafio, nesse caso, é consolidá-lo como política de estado. Consideramos que o Plano que resulta da construção do planejamento municipal de educação para o decênio de 2008-2017 é instrumento político que não é incorporado como uma política de Estado e por isso, permeado por descontinuidades. 92 Nas entrevistas é enfatizado impasses entre o que está registrado no Plano Municipal de Educação e a prática política da gestão da educação. Este quadro é indicativo, de acordo com os relatos, que falta atualização do documento e, portanto, tornou-se desconexo para as ações da política de educação. O contexto de mudanças também favorece a necessidade de atualização e formalização de ações da política local direcionadas a demandas estabelecidas e do contexto mais recente do município. 6.3 REGIME DE COLABORAÇÃO E OUTRAS FORMAS DE ARTICULAÇÃO E COOPERAÇÃO A construção de ações pactuadas e o fortalecimento de ações cooperativas que visem à construção sistêmica da política de educação refletem o entendimento sobre o Regime de Colaboração. Nesse quadro, a definição de responsabilidades fortalece a descentralização que é um princípio da gestão sistêmica e o apoio técnico e financeiro ressalta também a cooperação. O entendimento é de partilha de responsabilidades, atividades e recursos. O regime de colaboração é referendado para a construção de uma política da nação, na qual a articulação entre União e os entes federados respaldem ações que promovam a política educacional. O entendimento registrado no PNE sobre o regime de colaboração destaca que é “forma republicana, democrática e não competitiva de organização da gestão, que deve ser estabelecida entre os sistemas de ensino, para assegurar a universalização do ensino obrigatório” (BRASIL, 2014, p.17). Dessa forma, o objetivo de universalização do ensino, pressupõe a articulação, ou seja, o apoio necessário ao cumprimento de responsabilidades locais como, por exemplo, a participação dos municípios nesse processo. A dinamização do regime de colaboração para além do registro Constitucional encontra entraves fortalecidos na falta de apoio técnico e financeiro, nas diferenças regionais e na própria dinâmica de gestão local. Essa crítica encontra resposta na menção que o plano faz a respeito das estratégias para dinamização do regime de colaboração, na qual lemos que “a maioria das estratégias apresentadas no PNE tem como ancoragem o acionamento de mecanismos que pressupõem a dinamização do regime de colaboração” (BRASIL, 2014, p. 17). O entendimento é de que a articulação entre os entes fortaleça o apoio para a concretização dos objetivos da gestão da educação. Anteriormente a socióloga Silke Weber fez críticas a modelos burocráticos estabelecidos na construção do plano. Weber questiona a relação entre o modelo de gestão do plano e o alcance de objetivos da qualidade na educação. Sobre essa discussão Weber menciona que: 93 O que cabe perguntar é se tais instrumentos irão subsidiar (ou não) a regulação, atividade de Estado que visa ao ordenamento e desenvolvimento do conjunto das unidades escolares da educação básica, com o fito de oferecer os seus diversos tipos e modalidades de ensino em padrões de qualidade que se coadunem com as exigências inerentes à formação e ao exercício da cidadania requeridas pela sociedade brasileira atual. (WEBER, 2008, p. 315). Weber afirma que as regras devem ser estabelecidas e observadas para se tornarem referências nas instituições escolares. A autora evidencia o distanciamento entre a concepção de regras e as práticas locais. No tocante à política educativa, o alcance de objetivos pode ser ofuscado pelos arranjos locais. A crítica da autora permanece atual diante dos relatos sobre o que é estabelecido em gestões locais. O PNE reconhece lacunas em relação à regulamentação do regime de colaboração e evidencia que promover a construção do regime de colaboração, está correlacionado à atuação da União, representada pelo Ministério, e também dos entes federativos. Sobre a discussão, o PNE registra que: O Ministério da Educação exerce, nesse contexto, sua função de coordenação federativa, tendo como desafio estimular que as formas de colaboração entre os sistemas de ensino sejam cada vez mais orgânicas, mesmo sem que as normas de cooperação ainda estejam regulamentadas. (BRASIL, 2014, p. 8). O reconhecimento do papel dos entes federativos na consolidação do regime de colaboração é explicitado no PNE. O entendimento é que as lacunas podem ser superadas por uma atuação mais participativa da gestão local. Por outro lado, é relevante entender que limites financeiros se tornam impeditivos da construção de iniciativas locais. O destaque do regime de colaboração converge para a orientação de que “as estratégias delineadas no novo PNE só serão efetivas se o pacto federativo se consolidar com a delimitação, no regime de colaboração, da assunção das responsabilidades específicas dos entes federativos” (BRASIL, 2014, p. 49). Nesse contexto, a concepção do PNE é de promover a articulação e a construção de uma política educativa unificada. As discussões sobre o regime de colaboração no âmbito do município e as articulações entre setores reafirmam o entendimento de que a cooperação é necessária ao cumprimento das responsabilidades locais. Sobre a discussão, verificamos no trecho da entrevista abaixo: 94 Tem que existir uma articulação, até por que esta engrenagem não funciona. Porque se o Conselho, ele normatiza. Se o Conselho debate sobre as políticas públicas educacionais que são executadas pela Secretaria de Educação, então tem que haver essa interação. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). A interação entre setores permeia a construção normativa como é evidenciado na fala do entrevistado. A discussão evocada nessa fala é que a articulação é necessária ao cumprimento das ações, esse entendimento é fortalecido pelo mesmo entrevistado no trecho abaixo: [...] A lei define, qual o sistema educacional, e qual é o papel, que os estados, os munícipios e a União tem nesse regime de colaboração, que está estabelecido lá na Constituição e na Lei de Diretrizes e Bases. [...] outras pessoas dizem, que estes papeis está bem claro e definidos nos planos e nas leis de sistema. Mas aí não se chega a um norte, a um denominador comum. Então este é um debate, o que é regime de colaboração? Quais os papeis? O que cada ente desempenha no seu sistema? Como esse sistema pode ser mais dinâmico para atingimento do seu papel e metas. Então esse é o grande debate hoje tanto em nível nacional, quanto estadual, e também a gente pode dizer que tem esse debate no nosso município. Afinal de contas, a gente não vai ter condições de cumprir as metas do Plano Nacional de Educação se a gente não tiver aí, uma boa articulação entre o Estado, União e municípios. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). A articulação é relacionada no depoimento ao cumprimento das metas do PNE. Essa discussão reafirma a atenção ao alcance de metas do Plano que, entre outras questões, são significativas à política de financiamento e viabilizam políticas locais. Nesse trecho da entrevista, são identificadas práticas locais de colaboração no estabelecimento de políticas públicas: [...] o que eu posso dizer, é que existe colaboração do transporte. Do transporte municipal, afinal de contas a rede do município é grande e tá bem definido que o estado só oferta ensino médio e todo ensino fundamental é com a prefeitura, mas todo ensino médio é responsabilidade do estado, então existe esse transporte dos estudantes, então há essa colaboração bem visível no transporte. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana, 2013-). A colaboração apontada do transporte escolar é situada em relação à articulação entre estado e município. Também é referendado na Lei Orgânica do Município (LOM) o apoio do município ao transporte para atividades de ensino. Nos artigos 150 e 185 da LOM, lê-se que o município: XV – Promoverá, gratuitamente, na forma da lei, o transporte de estudantes residentes no Município, para frequentarem, na Capital do Estado de 95 Pernambuco ou nas localidades com o mesmo itinerário, cursos inexistentes no Município; VII – Atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde. (GOIANA, 2010, p. 55). O deslocamento de alunos para atividades de ensino é inserido na LOM em apoio ao desenvolvimento educacional, tratado como inciativa do município. Sobre as ações colaborativas o Secretário de Educação do município menciona que: Além da relação colaborativa com a União, a Secretaria de Educação e Inovação mantém parcerias com o Estado, na perspectiva da requalificação de Espaços Educacionais e implementação de Programas envolvendo o Transporte Escolar, a Distorção Idade Série e a Educação de Jovens e Adultos (REIS FILHO, 2014, não paginado). Outras articulações são identificadas no trecho da entrevista, mas o programa de apoio ao deslocamento de alunos para atividades de ensino aparece com ênfase nos depoimentos. Outras formas de colaboração são identificadas nesse trecho da entrevista: Existem parcerias com relação ao transporte escolar dos alunos do estado também para outras escolas. Parceria de programas, como o “Se Liga”. E do Governo Federal nós temos a parceria do “Programa Mais Educação”, do “Escola Aberta”, do mobiliário, das construções, dos transportes, tudo é contrapartida, que é feita entre os entes federados. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). As articulações apontadas pela depoente são identificadas como parcerias importantes para o melhoramento da estrutura física, como também de desenvolvimento de programas voltados para a formação educacional. As articulações apontadas no depoimento são compreendidas como proposta para o desenvolvimento educacional local, pois criam oportunidade de financiamento das atividades. Em outra visão, entretanto, as ações que são apontadas ainda não celebram uma proposta integradora do regime de colaboração. No trecho abaixo, o depoente trata das parcerias e articulações: Uma obra ou outra é apoiada pelo Estado [...]. Há ações, uma política integrada não. Ações entre estado e município, uma política integradora, uma intencionalidade, no geral não existe. Existe muito diagnóstico, existe muito entendimento da realidade, mas a gente não notou ainda, não percebeu, uma política integradora dos órgãos, dos setores. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). 96 As ações incidem sobre o desenvolvimento estrutural das escolas, mas as articulações, como são tratadas pelo depoente, não representam uma política integradora, que envolva subsídios para uma perspectiva colaborativa inserida numa visão de gestão sistêmica. Como observamos acima, algumas lacunas demonstram a ausência de normas de cooperação que não foram regulamentadas, para consolidação do regime de colaboração. Esse quadro incide na articulação entre instâncias governamentais, e não promove a continuidade. Como relata o depoente “são ações” e dessa forma não se constituem em uma política de Estado. Nos relatos, outras formas cooperativas, que não constituem o regime de colaboração entre União e os entes, são apontadas. Porém tais iniciativas constituem formas cooperativas de interação entre o poder público local e atores do entorno. Tais iniciativas incidem no contexto da educação no município e são correlacionadas ao crescimento industrial. Sobre esse aspecto a entrevistada registra que: A Hemobrás ela disponibiliza um projeto. E o papel do município é construir um projeto e ela vai e financia. Então existe contrapartida. Por exemplo: tem um projeto agora, tentando ser aprovado, O financiamento é da empresa e a Secretaria de Educação tem que fazer um projeto. Então há contrapartidas deles investindo na nossa educação. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). A oferta de projetos de educação inseridos numa perspectiva social do empresariado local é identificada no trecho da entrevista. A presença de instituições de outras instâncias do governo federal e estadual também se estabelece no município. O trecho da entrevista evidencia a questão: Uma Escola Técnica foi implantada acerca de um ano. A gente vai ter uma escola do SENAI. A partir do ano que já começa a ser construída. A gente sente que tá sendo oferecido vários cursos de formação. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). Nesse trecho, a oferta de outras instituições de formação provoca uma dinâmica na oferta de formação, que se relaciona a um momento mais recente do município. Esse quadro é reconhecido no trecho da entrevista que apresentamos abaixo: O SESI tem investido bem mais em educação em Goiana, do que há alguns anos atrás. Antes era só a Educação Infantil e ultimamente, já tem até o ensino médio. A Câmara aprovou um projeto de lei doando um terreno ao SENAI e já está lá pra ser construído. O SESC Ler também tá chegando, ele já estava previsto. O SESC ler, vai além do ensino regular eles tem escola de 97 formação. Eles trazem cursos de formação profissional. (Vereador da Câmara Municipal de Goiana 2013-). A fala evidencia que a presença de instituições formativas, como o SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), SESC (Serviço Social do Comércio) e SESI(Serviço Social da Indústria) incide sobre a oferta educacional no munícipio. E o estabelecimento dessas instituições é compreendido como cooperativo no atendimento de demandas atribuídas ao contexto de crescimento industrial. Contudo, a Secretaria de Educação do município não tem participação na efetivação dessa cooperação como afirma o Secretário de Educação do munícipio: A Cooperação com outros Órgãos (SENAI, SENAC, etc.) na perspectiva da qualificação profissional é efetivada, no Município, pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia. (REIS FILHO, 2014, não paginado). Apesar de o estabelecimento dessas instituições incidir sobre a oferta da educação, a Secretaria não participa da efetivação dessas relações. A articulação é compreendida na perspectiva de construção de uma política integradora entre as instituições públicas, privadas e de economia mista para a oferta de ensino no município. Em relação à cooperação que se apresenta a partir da inciativa do empresariado, representantes das indústrias que se instalaram no cenário recente, como por exemplo, FIAT e a Hemobrás, a cooperação se apresenta em iniciativas para melhoramento da estrutura física de algumas escolas, como se percebe no trecho da entrevista: Um grupo de diretores de empresas já tem dado olhar para esse lado social. Em iniciativas, já recuperaram creches, além da estrutura física, todos os equipamentos, de montagem das salinhas, tem a parte de cozinha, já deixaram estruturado. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). A cooperação em relação à estrutura física também é apontada pelo Secretário de Educação do Município: A Secretaria de Educação e Inovação visa criar parcerias com os Setores Produtivos na perspectiva de apoio estrutural das Escolas Públicas Municipais, em particular, das creches construídas com o apoio do Governo federal. (REIS FILHO, 2014, não paginado). 98 As formas cooperativas com empresas são situadas em uma perspectiva de futuro das ações da Secretaria. Por outro lado, percebemos que a participação do empresariado das indústrias e de outras instituições de economia mista ocorre e incide sobre a oferta de formação e sobre os recursos nesse cenário recente vinculado ao crescimento industrial. As articulações são também destacadas como ocorrências do cenário de crescimento industrial como é registrado no trecho da entrevista: [...] Então ações existem. E muitas motivadas por causa destes investimentos. Mas isso já repercutiu na rede em si. Eu posso te dizer que ainda não. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-) Observamos que várias questões são consideradas no contexto de articulações, sejam no estabelecimento do regime de colaboração entre as instâncias governamentais, seja nas formas de cooperação de setores industriais. As articulações apontadas nos relatos são repercussões do cenário de crescimento industrial e influenciam a construção da política de educação local. Porém, mesmo reconhecendo as influências na visão do entrevistado, o cenário de mudanças ainda não promove mudanças na Rede de Educação. Consideramos que o planejamento local é impactado nesse contexto de crescimento, contudo a construção de um planejamento que envolva esses representantes não se apresenta como ação organizada da política de educação do município, diante dos desafios que se colocam nesse cenário de crescimento e de articulações com atores governamentais e Não-governamentais. Neste quadro as ações que se apresentam, de atores do entorno como, por exemplo, as ações realizadas por empresários que direcionam investimentos, sinalizam a presença de novos atores no cenário de gestão da política local. Esse quadro apresenta de acordo com relatos que coletamos possibilidades de parcerias entre atores institucionais e atores vinculados a indústrias e instituições formadoras de economia mista como o SENAI, SENAC, SESC. 6.4 GESTÃO DA CLASSE DOCENTE As mudanças do cenário de crescimento industrial permeiam também a atuação docente. Ball considerando as mudanças ocorridas pela concepção gerencialistas para as políticas educacionais, menciona que: “cenários diferentes oferecem diferentes possibilidades e limites para o profissionalismo” (BALL, 2005, p. 547). O entendimento é que as novas 99 orientações são introduzidas e que tais condições “remodelam as relações de poder e afetam como e onde são feitas as opções de políticas sociais” (BALL, 2005, p. 547). Podemos interpretar que o cenário de mudanças econômicas do município repercute nos papeis da classe docente e impulsionam a construção de novas perspectivas profissionais. A construção de perspectivas profissionais no cenário de crescimento industrial insere nova demanda à atuação profissional. Apontamentos como capacitação, rendimento profissional, abertura de concursos para contratação profissional e reformulação do Plano de Cargos e Carreiras (PCC) são alguns dos dados tratados sobre o tema nos relatos coletados nas entrevistas. Sobre esse quadro o trecho da entrevista registra que: [...] Temos elaborado proposições com as demandas principais. Hoje tem demanda que a gente não vai esperar o Plano Municipal, por que hoje a gente tem estagiários na rede, alguns contratos que são pouquíssimos, precisamos de um concurso, para que essas vagas sejam ocupadas por profissionais. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). A realização de concursos e ocupação de cargos, atualmente exercidos por estagiários, é apontada como uma necessidade de adequação no cenário de crescimento industrial. O depoimento apresentado esclarece certa urgência de tratamento desse assunto, visto que a medida deve anteceder a reformulação do Plano Municipal. O PME do município de Goiana, no que se refere ao tratamento da classe docente, tem inicio com a construção de um diagnóstico. O levantamento desse tema no diagnóstico aponta para a insuficiência da política local em relação à classe docente. Sobre a discussão, o PME registra: a) Formação insuficiente do corpo docente; b) Desvalorização do curso normal médio; c) Currículo que dicotomiza teoria e pratica; d)Falta de incentivos à formação continuada; e)Falta de motivação dos professores; f)Múltipla jornada de trabalho; g)Salários dos profissionais de educação nivelados por baixo; h)Baixos níveis de aproveitamento na aprendizagem, combinando os elevados índices de repetência com a evasão escolar; i) Número excessivo de alunos por sala de aula; j) Falta de materiais didáticos de apoio ao trabalho pedagógico; k)ausência dos pais no cotidiano da escola; l)Falta de acompanhamento psicopedagógico e psicológico; m)Articulação ineficiente entre a Secretaria, Escola, Conselho Tutelar e comunidade. (GOIANA, 2008, p. 100). O elenco de dados do diagnóstico repercute nas ações construídas no plano, com o objetivo de mudança no ponto em que a política local é provocada a atender, como se registra, 100 a valorização do professor. As ações previstas na construção do Plano registram que a valorização implica os requisitos de formação do profissional, programa de educação continuada, organização de jornada de trabalho, adequação salarial e compromisso social e político do magistério. É pertinente considerar, como pontuamos ao longo da discussão, que o Plano Municipal de Educação, não se constitui como uma política de Estado. Portanto, lacunas nas ações de valorização do magistério são evidenciadas e intensificadas diante do contexto de crescimento industrial: Hoje nós temos uma grande preocupação com o Plano de Carreiras. Nós temos um Plano de Carreiras que está prestes a ser reformulado também, além do Plano decenal, é o PCC do Magistério, ele precisa ser reformulado. Então ao mesmo tempo que seja o setor econômico que vai fomentar mais imposto, mais tudo, a gente sonhou em ter um Plano de Carreiras mais adequado as nossas necessidades. O custo de vida da cidade aumentou. Então se o reajuste nosso anual que é dado pelo Governo Federal foi um problema este ano para repassar, eu tenho uma preocupação hoje, se amanhã se em janeiro a gente vai ter um aumento de 13, 65 %, então minha preocupação é essa: que não seja cumprido. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). A atenção nesse contexto de mudanças está em torno do Plano de Cargos e Carreira e Remuneração do Grupo Ocupacional de Apoio Administrativo do Magistério (PCCRR) ou, como é falado nas entrevistas, o Plano de Cargos e Carreiras (PCC), instituído pela Lei Municipal 2.065, de 12 de maio de 2008. A sanção da Lei 2. 095, de 09 de março de 2009, adequa a remuneração dos profissionais do Magistério Público da Educação Básica do município de Goiana ao piso salarial nacional. Ainda em 2009, o Plano recebe alteração, instituída pela Lei Municipal 2.123 de 30 de dezembro de 2009, que está em vigência. O respaldo legal existe, mas impasses influenciam o que é estabelecido legalmente. Essa situação é alertada na fala da depoente, quando exemplifica que no acordo de reajuste houve problemas no repasse. Também é pertinente observar outros impasses como o fato de que, ao mesmo tempo em que o descumprimento do que legalmente já foi estabelecido vem à tona, o PCC vigente não atende às expectativas da classe e é apontada a necessidade de atualizações que acompanhem o contexto de mudanças locais. No trecho da entrevista em que apresentamos o cenário de mudanças e a repercussão no aumento do custo de vida do munícipio, são apontadas questões significativas que influenciam a necessidade de reformulação do PCC. As exigências profissionais do cenário de 101 crescimento industrial também são evidenciadas como justificativa para a reformulação da valorização profissional no PCC. A reformulação do PCC do município é requisitada no que diz respeito à qualidade da educação e à valorização profissional, como verificamos nos depoimentos: Os planos de cargos e carreiras, eles não incentivam o professor para dar esse salto de qualidade no seu trabalho. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). [...] Acham que o nosso Plano é muito ousado, e o impacto para a educação não estão relacionados, a cobrança que vem, com as formações. A cobrança para estarmos preparados. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). As observações da entrevistada apontam para uma política de valorização do profissional por parte da gestão local. Além disso, em outro trecho a entrevistada deixa evidente que esse cenário de crescimento industrial requer uma postura profissional mais participativa: Com relação ao preparo do professor, ele hoje não se prepara se ele não quiser. Eu estou inscrita em três cursos. Para melhorar o nosso atendimento, adequar a escola à demanda que está aí, tá batendo na nossa porta, não. Ela já chegou, então tem a preocupação que as pessoas tenham capacitações, tenham outros cursos. Hoje temos conhecimento que na nossa cidade temos doutores, mestres, e isso era uma coisa rara. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). Observamos que o contexto de crescimento industrial rebate em uma nova concepção de planejamento, que se articula com a reformulação de instrumentos legais a abertura de espaços de participação da comunidade, com objetivo de interlocução entre segmentos da sociedade, participação profissional e consolidação de uma política local contínua. Outra dimensão da gestão da classe docente, evidenciada no relato que transcrevemos, é o acompanhamento das atividades profissionais. O trabalho do professor, nessa visão, deve ter um acompanhamento que explicite orientações de rendimento, que observe condições norteadoras para que o trabalho alcance o objetivo de aprendizagem. Esse aspecto é evidenciado em correlação com a qualidade de educação. O entrevistado menciona: Não há esse sistema de acompanhamento da gestão sobre o trabalho do professor, é uma pena. E esse sistema de gestão de acompanhamento ele devia ter uma regra clara no Plano de Cargos e Carreiras. A gente ali devia estabelecer os parâmetros, do que o professor precisa fazer e qual o 102 rendimento que ele precisa ter, para que o seu desempenho seja aproveitado, no sistema de ensino e aprendizagem e isso a gente não tem. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). Percebemos que o relato do entrevistado citado acima materializa questões das práticas sociais da gestão local da classe docente, bem como a ausência de objetivos norteadores para a prática docente que realcem a ligação entre prática e planejamento. Por um lado a discussão apontada no relato citado evidencia fragilidades da gestão da classe docente, por outro aponta para uma reflexão apropriada na discussão sobre a gestão da classe docente. Tal reflexão se refere às críticas aos modelos de gestão que permeiam o trabalho docente, que tolhem o exercício da atividade do professor, em afirmação de uma política que enfatiza a padronização de processos e controle de rendimentos, como considera de maneira pertinente Ball (2005, p. 546): As organizações educacionais reformadas estão agora “povoadas” de recursos humanos que precisam ser gerenciados; a aprendizagem é reapresentada como o resultado de uma política de custo-benefício; o êxito é um conjunto de „metas de produtividade.‟ Os docentes são atores sociais que compõem esse cenário de crescimento. E o desafio para a política local é o de construção de uma política educativa que esteja correlacionada com a realidade do município, a fim de alcançar o que defende o PNE em relação à construção de uma política educacional que busque a qualidade: Um quadro de profissionais da educação motivados e comprometidos com os estudantes de uma escola é indispensável para o sucesso de uma política educacional que busque a qualidade referenciada na Constituição Brasileira. Planos de carreira, salários atrativos, condições de trabalho adequadas, processos de formação inicial e continuada e formas criteriosas de seleção são requisitos para a definição de uma equipe de profissionais com o perfil necessário à melhoria da qualidade da educação básica pública. (BRASIL, 2014, p. 12). As orientações registradas no PNE no que diz respeito aos sistemas de ensino relacionam a melhoria da qualidade da educação a requisitos de valorização. Dessa forma, o ambiente proposto para a construção de uma política educacional envolve a valorização dos profissionais da educação integrada à oferta e à qualidade da educação. As diretrizes da política de educação para a classe docente evidenciada no Plano Municipal de Educação não está correlacionada a visão de valorização profissional apresentada, por exemplo, pelo Conselho Municipal de Educação e Sindicato dos 103 Profissionais de Educação em Goiana. De acordo com os relatos há impasses em relação a contratação, realização de concursos, cumprimento de acordos salariais, entre outras questões são apontadas. Este quadro da política educacional no cenário de crescimento econômico apresenta novas dimensões para a valorização profissional; Plano de Cargos e Carreiras para o Magistério e a política de formação continuada, estão na pauta das reivindicações e mudanças são apontadas como necessárias em função das exigências do cenário de crescimento industrial. Os desafios desse cenário, nos relatos apresentados, evidencia a discussão da valorização profissional, da qualidade da educação em correlação as mudanças socioeconômicas do município, por outro lado as questões da política de gestão da educação para a classe docente, também registradas nos relatos, demonstram impasses entre as práticas da gestão local e as expectativas da classe em relação a valorização profissional. 6.5 FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO A política de financiamento da educação, a partir do respaldo legal disposto no artigo 212 da Constituição Federal de 1988, fixa percentual à União e aos entes, destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino. A construção legal está atrelada à concepção da descentralização e à divisão de responsabilidade, no contexto da democratização política. O financiamento da educação, nesse quadro político, evidencia a autonomia dos entes federados e repercute sobre a descentralização financeira, ou seja, a responsabilidade que cada instância de gestão tem com recursos financeiros, necessários às políticas públicas locais. Em consideração a esse entendimento de autonomia, evidencia-se a discussão sobre o sentido de descentralização e gestão sistêmica que restringe apoio técnico e financeiro. A crítica se fortalece tomando como referência o contexto de desigualdades regionais, em que as instâncias locais lidam com a insuficiência de recursos. Outros mecanismos de distribuição de recursos são instituídos na política de financiamento da educação, como FUNDEF em 1996 e FUNDEB em 2006. A presença desses fundos em momentos diferentes consolida a previsão de recursos destinados a políticas de educação, embora sejam apontadas exiguidades de tais recursos. A autonomia concebida, permeada pela insuficiência de recursos para alguns municípios, influencia o planejamento político da gestão da educação municipal. Percebemos que uma das dimensões que fortalece a dependência é a ausência de gestão sistêmica, inexistência de regulamentação de mecanismos de cooperação e a exiguidade de recursos de alguns municípios. 104 Outra dimensão do financiamento de políticas públicas é a gestão pública de recursos e o controle social. A participação popular e a construção de espaços que promovam o acompanhamento da gestão, o quadro econômico local, o planejamento político da gestão municipal, instrumentos legais, são dimensões, entre outras, que permeiam o financiamento de políticas públicas. Dessa forma, o financiamento de políticas públicas deve ser considerado além dos recursos que efetivamente são destinados. Esse processo envolve, sobretudo, gestão pública, controle social dos recursos, entre outras questões. Considerar o financiamento de políticas públicas de maneira integrada envolve o entendimento de que a construção de política pública congrega uma amplitude de temas, que embasam os objetivos de um programa. Sobre esse aspecto, o documento “Diagnóstico para Gestão de Políticas e Programas Sociais em Âmbito Municipal”, publicação do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, registra que: Para desenvolver programas no campo da Educação Básica, por exemplo, é preciso conhecer não apenas as condições de acesso à escola, a infraestrutura escolar, o desempenho dos alunos, mas também aspectos relacionados às condições de vida dos estudantes como as condições de moradias, nível de pobreza e rendimento familiar, acesso a serviços de saúde, escolaridade dos pais, fatores esses que certamente podem afetar ou potencializar as ações programáticas específicas. (BRASIL, 2008, p. 1). O entendimento é que a elaboração de um diagnóstico, a partir da integração de temas, fortalece o caráter propositivo na construção de políticas públicas. A sistematização de dados é compreendida como fonte que retrata aspectos da realidade e fornece subsídios para o planejamento público. Em relação ao financiamento da educação no município de Goiana, o PME aborda fontes de recursos, objetivos, metas e ações. Contudo, o documento não relaciona a os recursos, dados de diagnóstico e objetivo das ações. Esse quadro demonstra desarticulação entre planejamento e execução políticas. A desarticulação é apontada no relato do Secretário de Educação Municipal ao se referir à construção do PME, ou seja, a construção do Plano ocorre fora do contexto de crescimento de setores produtivos. A desarticulação tem, nesse quadro, o reforço das lacunas da gestão da educação local. Sobre os recursos para o financiamento das políticas publicas de educação Reis Filho menciona: O investimento em Educação passa, basicamente, pela vinculação existente, que expressa à aplicação de, no mínimo, 25% dos recursos provenientes de impostos arrecadados pelo Município e das transferências de impostos realizadas pelo estado e pela União. (REIS FILHO, 2014, não paginado). 105 Em relação ao quadro de crescimento industrial no município e a relação com os recursos disponíveis para a educação nesse contexto, a análise feita pelo secretário registra que: A fixação de Setores Produtivos em uma determinada região, principalmente no Norte e Nordeste do País, é acompanhada de benefícios fiscais por um período razoável e a contra partida que as Empresas se submetem, quase sempre não responde às necessidades e às demandas sociais provenientes do aumento populacional que exige, de imediato, prestação de serviços públicos na área de Educação, Saúde, Moradia, Segurança e Infraestrutura Urbana. (REIS FILHO, 2014, não paginado). A análise enfatiza os impasses entre o estabelecimento das empresas e as mudanças no quadro de arrecadação. Reis Filho reconhece a otimização do quadro econômico, mas, por outro lado, destaca que necessidades de investimento social repercutem rapidamente para a gestão municipal. Sobre esse aspecto Reis Filho menciona: Observa-se, portanto, uma grande distância entre o que o Município arrecada e a necessidade de gastos e investimentos, diante da nova malha social que, nessa situação, se estabelece na Cidade. E este novo contexto econômico e social repercute nos indicadores educacionais que retratam o acesso à Educação, levando o Município a ter que aumentar a oferta e consequentemente ampliar o seu quadro de pessoal para responder à demanda, sem contar com recursos novos para isto. É, portanto, um grande desafio que leva o Gestor a arrochos fiscais sucessivos na perspectiva de dias melhores a médio e longo prazo. (REIS FILHO, 2014, não paginado). No relato a ênfase é dada às respostas que o município precisa construir diante, por exemplo, do crescimento populacional. Carece de um novo quadro de recursos, em função de tais respostas. Por outro lado, questões estruturais repercutem de maneira mais incidente sobre a gestão dos recursos. A ausência de autonomia financeira da Secretaria de Educação no Município é apontada em outra análise, em que se evidencia que a Secretaria de Educação, tem os recursos administrados pela Secretaria de Administração e Finanças: Assim, a questão de fundo que parece envolver a precariedade da infraestrutura e a não autonomia da Secretaria Municipal de Educação na gestão financeira dos recursos. Sendo este, possivelmente, um aspecto que tem dificultado a execução das ações, com perda de agilidade nas definições e implementação das ações necessárias. (HEMOBRAS; FIOCRUZ, 2013, p. 103). 106 O estudo explicita impasses na gestão da educação, que envolvem questões estruturais. O contexto de ausência de autonomia citado, favorece a desarticulação, a descontinuidade de políticas e reforça mecanismos de centralização e de gestão burocrática. O quadro de financiamento também é alterado pela presença de novos atores que produzem, nesse cenário de crescimento industrial, formas de articulação que incidem sobre a gestão da educação. Reis Filho menciona que: A Secretaria de Educação e Inovação visa criar parcerias com os Setores Produtivos na perspectiva de apoio estrutural das Escolas Públicas Municipais, em particular, das Creches construídas com o apoio do Governo federal. (REIS FILHO, 2014, não paginado). O apoio apontado no relato é citado na entrevista da página 97, em que a parceria para atender a questões de estrutura física é registrada pela depoente. No cenário atual Reis Filho (2014) também aponta a presença de convênios com Organizações não Governamentais, para a oferta de Educação Infantil. O financiamento de políticas públicas de educação local é fortemente influenciado pela ausência de orientação do Plano Municipal de Educação e esse desajuste se intensifica no cenário de crescimento de setores produtivos. A necessidade de recursos para atender às demandas relacionadas ao crescimento populacional, por exemplo, aponta para a necessidade de instrumentos de gestão que antes não estavam evidenciados. Sobre essa discussão, Reis Filho registra: É importante que em sendo redefinido o PME, em 2015, ele seja referência para a definição e/ou atualização dos importantes instrumentos de Gestão Municipal (PPA, LDO e LOA)10. Com isso, estaremos oferecendo as condições para que as metas sejam atingidas. (REIS FILHO, 2014, não paginado). Os comentários de Reis Filho esclarecem que a aquisição de recursos em curto prazo é necessária e que a resposta da gestão local para a demanda social por serviços de saúde, educação, segurança, entre outros, não dispõe de instrumentos no momento atual para atendimento efetivo, seja no que se refere ao Plano Municipal de Educação, seja em relação a diretrizes orçamentárias que consolidem o cumprimento de metas. 10 Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA). 107 6.6 INSTRUMENTOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO NO MUNICÍPIO DE GOIANA: LEIS E REGIMENTOS A política de educação do município de Goiana apresenta instrumentos legais que têm o objetivo de subsidiar quanto à construção de diretrizes para a gestão educacional. Os instrumentos norteadores da política educacional são representados por leis e regimentos que tratam da realidade local e convergem para a uma correlação às disposições da LDB. Os documentos relacionados: Quadro 5 - Documentos Legais da Educação Documento 1) Lei 1.998 de 13 de outubro de 2006 2) Regimento Interno da Secretaria de Educação de 30 de abril de 2008 3) Lei 1.997 de 13 de dezembro de 2006 4) Regimento interno do Conselho Municipal de Educação 5) Lei 2.035 de 20 de agosto de 2007 6) Lei 2.065 de 12 de maio de 2008 7) Lei 2.095 de 09 de março de 2009 Definição do Documento Dispõe sobre a criação e organização do sistema de ensino do município de Goiana. Instrumento formal e normativo que contempla atribuições e orientações sobre ações técnicas, administrativas, financeiras e pedagógicas da Secretaria de Educação Municipal. Dispõe sobre o funcionamento do Conselho Municipal de Educação de Goiana-PE e dá outras providências. Orienta sobre a competência e funcionamento do CMEG. Dispõe sobre a criação da Comissão permanente de acompanhamento e controle social do FUNDEB. Institui o Plano de cargos e carreiras e remuneração do grupo ocupacional de apoio administrativo ao magistério. Adequa a remuneração dos profissionais do magistério público da Educação Básica do município de Goiana, ao piso salarial nacional. 8) Lei 2.123 de 30 de Dispõe sobre o plano de cargos, carreiras e vencimentos do dezembro de 2009 magistério público municipal de Goiana, e dá outras providencias. 9) Lei 2.090 de 29 de dezembro de 2008 Institui o Plano Municipal de Educação e dá outras providências. 10) Lei Orgânica do município de Goiana (revisada e Institui as disposições gerais da gestão municipal de Goiana. atualizada até a emenda nº 012 de 2010) Fonte: Katia Maria Tavares da Silva (2015) a partir de GOIANA (Prefeitura). Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. O rol de leis e regimentos demonstra uma atuação normativa do município e construção de uma base legal local. Esse quadro representa que a gestão municipal tem 108 estabelecido mecanismos legais diante da configuração do poder local, associado à autonomia, descentralização. Como exemplo, podemos citar a instituição do sistema de ensino que atende às orientações da LDB. A Secretaria de Educação e o Conselho Municipal de Educação atuam na construção normativa, assessoram a elaboração de resoluções, entre outras orientações normativas. Na LOM, os temas que permeiam a organização da educação no município e fundamentam as leis, que registramos como os documentos legais da educação, são tratados inicialmente no Art. 6º, ao se referir à manutenção de programas educacionais. A cooperação técnica e financeira entre União, estados e munícipios é registrada inicialmente ao tratar da educação, o que endossa a atenção à cooperação que é registrada na Constituição. O tratamento da educação e a efetivação da garantia desse direito são mencionados no quarto capítulo da LOM. No que se refere ao sistema de ensino, não há menção sobre a organização. O sistema é referido no art. 186, para registrar que o sistema assegurará aos alunos necessitados condições de eficácia escolar. Em relação ao Plano Municipal de Educação, a ausência de menção ao sistema de ensino, reforça a ausência de tratamento do PME. O CMEG é mencionado, em relação à regulação da LOM da composição e funcionamento do órgão. A Secretaria, como órgão executor das políticas educativas, e CMEG, como órgão que a assessora, não são mencionados. Essas ausências evidenciam a organização da política educativa do município e sinalizam desarticulação entre a base legal e práticas de órgãos, como a Secretaria e o CMEG. Por outro lado, percebemos correlações entre o tratamento de alguns temas na LOM e o que é registrado no texto de outras leis e também do PME. A gestão democrática e o processo eletivo para escolha de diretores e vice-diretores são registrados no Plano Municipal, tendo na LOM o lastro legal. Contudo, espaços de discussão para a gestão democrática, seja de Conselhos Escolares, seja de Fóruns municipais temáticos não são tratados na LOM. As responsabilidades referendadas na LDB sobre a oferta de ensino atribuída aos municípios são enfatizadas na LOM. Dessa maneira, as responsabilidades são endossadas, no que se refere à oferta de ensino obrigatório do município e às responsabilidades que incidem sobre as irregularidades na oferta do ensino sob sua competência. A lei também faz menções a questões administrativas, referendadas na Constituição, como recenseamento e atenção à frequência dos alunos. Outra questão tratada é a inclusão de temas locais da história do munícipio, o que resguarda uma atenção à história local. A LOM apresenta o tema da gestão docente ao postular que o município manterá o professorado municipal à altura de suas funções em nível econômico, social e moral. As ações 109 de que trata a discussão no art. 192 se referem à instituição do plano de carreira e do piso salarial profissional, bem como à ajuda de custo aos professores que se deslocam em distritos do município para o desenvolvimento de atividades de ensino. Em relação ao financiamento da educação e ao percentual registrado para os municípios pela Constituição Federal, é igualmente endossado, como outros temas que analisamos no art. 194 da LOM, que “o município, aplicará, anualmente, nunca menos, de 25% (vinte e cinco por cento) da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferência, na manutenção e desenvolvimento do ensino”. As disposições endossadas pela LOM correlacionam à política local às diretrizes da política nacional. Observamos que o tratamento fragmentado e ausência de questões da organização da política educacional produzem uma interpretação imprecisa da construção da política de educação local, correlacionada à orientação legal da LOM. Consideramos que as imprecisões são extensivas às desarticulações observadas, entre a prática política de órgãos de classe, como o Sindicato de Professores, e a gestão da educação. Sobre as desarticulações entre a base legal e práticas sociais, a reflexão de Severino (2003) pondera questões relevantes. O autor, em considerações acerca do sistema legislativo de um estado, situa a importância de um sistema legislativo na sociedade e faz relato sobre o surgimento do direito como instrumento da justiça. As reflexões do autor explicitam que os instrumentos legais representam a democracia e a justiça e ressalta que um instrumento legal, representa a construção histórica social. Como exemplo, Severino menciona que “a educação nacional é, na verdade, um processo social amplo e profundo, que atinge as próprias entranhas da vida da sociedade” (SEVERINO, 2003, p. 57). O autor explica que a experiência histórica do estado brasileiro, apresenta um sistema legal arbitrário. Concordamos que os instrumentos legais são fruto de relações e, assim, suscetíveis a dissensões, porém também podem significar rupturas de antigos modelos e, portanto, considerados avanços na história política. 6.7 DESAFIOS DO CRESCIMENTO INDUSTRIAL PARA A GESTÃO DA EDUCAÇÃO EM GOIANA/PE As mudanças no quadro econômico do estado de Pernambuco se associam à estratégia geográfica de interiorização de indústrias e outros empreendimentos estruturadores que têm como objetivo promover desenvolvimento regional. A concretização dessa política de desenvolvimento regional pode ser exemplificada com a instalação de empresas em áreas consideradas estratégicas. 110 O fomento do setor produtivo é citado no Mapa de Estratégia 2012-2015 do governo do estado. As diretrizes da política de desenvolvimento regional estabelecem a construção da Agenda de Desenvolvimento do Norte Metropolitano e Goiana, que apresenta os objetivos de: Propor, articular e integrar ações estruturadoras e transformadoras que promovam a melhoria da região e valorizem as potencialidades existentes, através de um conjunto de proposições e diretrizes estratégicas, com foco no desenvolvimento sustentável, destacando a valorização do ambiente natural e construído, o desenvolvimento institucional e os processos participativos. (CONDEPE/FIDEM, 2013, p. 2). A estratégia voltada para o norte metropolitano e Goiana, de acordo com a Agenda, é justificada pelo declínio das principais atividades econômicas, como a atividade canavieira, a indústria têxtil, o turismo, o comércio e a pesca. O declínio ocasionou perda de importância econômica dessas atividades tradicionais. Dessa forma, o entendimento é que a implantação de setores produtivos estratégicos retome o desenvolvimento da região. A concepção de desenvolvimento regional enfatizada na Agenda destaca a sustentabilidade das ações. Nesse aspecto, a compreensão é a de reunir a valorização do ambiente, desenvolvimento institucional e os processos participativos, como se registra nos objetivos. Essa concepção de desenvolvimento registra objetivos voltados para impactos sociais derivados das mudanças econômicas. Nesse contexto de crescimento industrial, o diálogo sobre os desafios para a gestão da educação que propomos no estudo é relacionado às mudanças percebidas por atores que fazem parte da gestão da educação no município de Goiana. A dimensão social das mudanças fundamenta a estruturação e reestruturação de políticas públicas e isso se justifica no entendimento de que as mudanças não se limitam aos aspectos financeiros das intervenções. Há nesse quadro, aspectos sociais significativos que permeiam as mudanças. Os impactos sociais podem ser observados por dimensões quantitativas e qualitativas. O desenvolvimento socioeconômico tratado na Agenda está direcionado a “ações que promovam a melhoria da qualidade de vida da população, mediante a qualificação social e profissional para propiciar oportunidades de emprego e renda à população” (CONDEPE/FIDEM, 2013, p. 20). A interpretação que se coloca é que as ações alcancem a melhoria de indicadores sociais nas áreas de educação, saúde, habitação e segurança e que tais mudanças possam representar a redução da pobreza e da desigualdade social. O fomento à educação é apresentado na Agenda em relação à implantação e melhoria de estrutura de escolas e projetos de qualificação. A abrangência do fomento se estende à 111 educação com jornada integral, cursos profissionalizantes, educação de jovens e adultos e de qualificação de mão-de-obra. É destacado o atendimento do SESC Ler (Serviço Social do Comércio), em Goiana voltado para a “Educação de Jovens e Adultos, Educação Infantil, Ensino Fundamental, além da Educação Esportiva, Cultural e de Lazer”. A presença de unidades de ensino das diversas áreas e instituições representa a perspectiva de expansão do ensino para a região norte metropolitano do estado de Pernambuco e Goiana. Como observamos, os investimentos são voltados para a melhoria de indicadores sociais e esses são representativos dos impactos sociais para a região e podem ser observados de uma forma quantitativa. Por outro lado, a nossa proposta de pesquisa social busca evidenciar desafios para a gestão da educação, percebidos de forma qualitativa por atores da organização da educação municipal, na cidade de Goiana. Além das informações coletadas, citamos na seção 2, indicadores populacionais, de renda e os dados da educação. Citamos também outras leituras sobre desafios na região para interpretar as questões apontadas nos dados que coletamos nas entrevistas. O CONDEPE/FIDEM (2011), em estudo sobre os impactos econômicos com o empreendimento do polo farmacoquímico de Pernambuco, evidencia mudanças em relação à distribuição de percentuais por setores da economia em Goiana. O estudo faz projeções com base nos investimentos realizados, com dados coletados em contas públicas. De acordo com o estudo, a representação por setores: Para os novos postos de trabalho, a distribuição setorial será composta por 20,9% pela agropecuária, 51,7% pela indústria, com destaque para os produtos farmacêuticos, e 27,4% pelos serviços, sobretudo os outros serviços, com 11,0% do total. (CONDEPE/FIDEM, 2011, p. 16). A citação demonstra que o município apresentará um novo perfil, voltado para as atividades da indústria. Dessa forma, compreendemos que esse é um demonstrativo de que mudanças sociais significativas são construídas, no contexto do desenvolvimento econômico. Os investimentos econômicos ocasionam mudanças e, consequentemente produzem oportunidades sociais diferenciadas que apontam para a gestão pública e para a sociedade, questões sociais peculiares. Dessa forma, o enfoque do poder local, da descentralização, da gestão sistêmica, ganha centralidade na busca do enfrentamento de questões locais. Nesse contexto, os atores da política local e o entendimento evidenciado por eles trazem elementos que revelam, na construção da política municipal, contraposições entre a base legal e práticas sociais. Consideramos que o entendimento dos desafios na visão dos 112 atores revela dados relacionados ao crescimento industrial, sobretudo revela a visão de quem é habitante e está inserido no cenário de mudanças. Entre os desafios que identificamos nos relatos coletados, a instalação de instituições de ensino no município é colocada em associação à necessidade de qualificação de trabalhadores para atender às exigências do mercado de trabalho. Nesse quadro, a interiorização de empreendimentos industriais, que ocasiona a mudança de perfil das atividades econômicas, também estabelece uma nova geografia para instituições de ensino, como o estabelecimento de Escolas Técnicas, cursos de aperfeiçoamento profissional e ensino superior voltados para as áreas do polo industrial. O Conselho Estadual de Educação de Pernambuco registra a presença de três instituições privadas de ensino técnico no município: O Centro de Ensino Técnico de Goiana (CENTEG), Escola de Enfermagem Santa Bárbara, Escola Técnica Pernambucana e o Centro de Educação Técnica de Goiana (CETEC). O quadro de instituições que oferecem cursos técnicos ainda apresenta outras instituições públicas e de economia mista e organizações civis, como: Escola Técnica Estadual, Centro Vocacional Tecnológico e SESC. A atuação do SENAI compreende a ministração de aulas em espaços cedidos pela Prefeitura do município. A respeito do estabelecimento de instituições e a expansão de espaços de formação no município, o relato destaca: [...] Hoje o SENAC, ele tá atendendo a demandas e formando técnicos, no meio ambiente, técnico em segurança do trabalho, técnicos em mecânica [...]. Mas até agora a vinda de uma unidade da Universidade não está sendo evidenciada aqui no município. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). O relato evidencia que o estabelecimento de instituições, que mudam o cenário de oferta de ensino, não é articulado com a Secretaria Municipal de Educação. Além dos dados sobre o estabelecimento de instituições de ensino, que confirmam essa correlação entre o movimento de instituições de ensino técnico e mercado de trabalho nesse contexto de crescimento, outras discussões têm sido evidenciadas a respeito do movimento de instituições na região. A nova geografia de instituições de formação técnica e superior para os setores produtivos pressupõe a construção na região de um núcleo de formação específica. O movimento institucional, nesse cenário de crescimento, é compreendido no valor da expansão de espaços de formação, mas também nos efeitos que permeiam a gestão local. 113 Dentre as novas disposições para a gestão local, as articulações entre gestão local, empresas e instituições de ensino, pressupõem novas atribuições à gestão municipal. A presença de instituições que estabelecem mudanças na oferta de formação tem relação com a demanda por formação e isso é registrado como um elemento de mudança trazido pelo cenário de crescimento industrial. Assim, uma economia alicerçada na atividade canavieira, pesca e indústria têxtil passa por mudança de perfil econômico a partir do declínio dessas atividades. O cenário de crescimento industrial promove uma busca por formação que manifesta mudanças em relação ao quadro de economia canavieira. Na citação a entrevistada ressalta o conhecimento de ex-alunos de escolas públicas que conseguiram ingressar em instituições de ensino superior: Hoje Goiana tem uma porcentagem altíssima de alunos na Universidade Federal da Paraíba, na Universidade Federal de Pernambuco, e alunos que são estudantes de escola públicas [...]. Eu vejo também os alunos se preparando para o futuro que Goiana vai ofertar. Tem muita gente fazendo Engenharia, fazendo Bioquímica, fazendo Farmácia [...]. Antes a gente era uma área canavieira, então tem um impacto também. Muita gente na Paraíba, nas Universidades Federais, na UNP. Em Recife, a Universo, é a Federal, é a Rural, é a UPE, tem gente em todo canto se preparando para o futuro que Goiana tá ofertando. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). Nesse trecho, a entrevistada sinaliza um movimento de mudança no nível de formação que é relacionado a oportunidades com o estabelecimento de indústrias no município. A busca por formação educacional demonstra que esse movimento se expande também para o entorno da cidade. Mudanças como a inserção da língua inglesa na grade curricular do quarto e quinto anos são indicadas como impactos desse cenário industrial, como podemos perceber, nessa parte da entrevista: [...] Já introduzimos no município a língua inglesa nos quintos anos, nos quartos anos, tem essa preocupação que a comunidade escolar conheça outra língua, pois nós estamos com uma Goiana cosmopolita, você chega num local, você encontra espanhol, você chega ao outro encontra um inglês, um holandês. A inserção deste conteúdo é impacto que vem acontecendo por conta dessa necessidade, dessa demanda que vem acontecendo no município, do crescimento avassalador. Então já se começou a adicionar disciplinas de língua estrangeiras, por que antes só era do sexto ao nono ano, então já há essa preocupação. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-). 114 No relato, a entrevistada dá ênfase à atualização curricular, com a inserção de língua inglesa. Por outro lado, o município manifesta a necessidade também de outras abordagens, significativas ao contexto da região como aponta a pesquisa da Hemobrás e FioCruz: A educação não inseriu a temática da agricultura familiar no currículo escolar, mesmo nas escolas rurais; apesar da riqueza do artesanato goianense, as escolas não incorporaram em suas atividades, por exemplo, oficinas de artesanato com debates e exposições com os grandes mestres. (HEMOBRAS; FIOCRUZ, 2013, p 103). As lacunas curriculares apontadas no estudo são ressaltadas para destacar a desvinculação do currículo em contemplar as necessidades, valores e interesses dos estudantes residentes no campo ou na cidade. O estudo considera que esse quadro “dificulta que o aprendizado se transforme em um instrumento para o desenvolvimento tanto do meio rural quanto no fortalecimento da identidade cultural do município como um todo” (HEMOBRÁS; FIOCRUZ, 2013, p. 104). A crítica à ausência de tratamento de questões que fazem parte de valores culturais locais atinge o fortalecimento da identidade cultural. Dessa forma, entendemos que esse quadro atinge também a representatividade social e a diversidade que compõem a cultura local. Nos relatos dos entrevistados, há correlações entre o aumento da população no munícipio e o aumento de números de matrículas. Em relação ao aumento da demanda de matrículas nas escolas municipais, ressaltam-se condições inadequadas para o atendimento do crescimento da demanda. Sobre esse aspecto o entrevistado comenta: Se em uma situação anterior aos investimentos, a gente já tinha dificuldades de várias escolas ou praticamente 90% delas, nossa rede já necessitava de muito investimento. Imagina com o número de matrículas que vão chegar, vão vir por causa desses investimentos, vários trabalhadores. Então eu tenho certeza que as necessidades desses investimentos vão dobrar, ou triplicar. Então minha preocupação é esta: já precisa numa situação anterior, imagina com essa nova realidade. Então quem conhece a rede, nota que a gente tem uma necessidade muito grande de melhorar a estrutura escolar. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). O relato explicita a falta de estrutura física adequada para o desenvolvimento de atividades escolares. A situação é intensificada com o aumento da demanda por matrículas, pois evidencia a incapacidade de absorção de um número maior de alunos e, por outro lado, sinaliza que tais condições refletem também na qualidade do ensino no município. 115 Nessa perspectiva, o aumento da população e da demanda por educação no município é visto como aspecto de fortalecimento social para cobranças em relação à construção de estruturas mais adequadas nas escolas. O entrevistado destaca: O impacto que a gente já tá observando é do aumento da procura por matrículas [...] E existe um impacto, que a gente tá aguardando caso Está chegando muitas pessoas de fora e quando vê a qualidade, a estrutura da rede municipal fica totalmente desesperado [...] Então a gente espera dois impactos: um aumento no número de matrículas, isto já está se verificando. E o outro impacto é que esse pessoal possa fortalecer a mobilização para que haja mais recursos para melhora da estrutura escolar. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). As condições de organização social para mudanças que se refiram à qualidade da educação das escolas, diante das colocações apontadas no relato, são possibilitadas com a presença de novos habitantes no município. A crítica ao atual quadro é situada nos interesses dos novos habitantes. O quadro descrito é demonstrativo do enfraquecimento das organizações sociais e de espaços de participação no município e tem rebatimentos nas condições da organização da escola. Outra questão apontada como mudança do quadro de crescimento industrial é a relação entre o aumento do custo de vida na cidade e a valorização salarial dos profissionais da educação. Esse assunto é tratado em destaque junto à necessidade de reestruturação do PCC dos professores. Nos relatos coletados o diálogo que se constrói sobre o assunto, enfatiza a necessidade de atualização salarial que seja condizente com as mudanças econômicas do município. Outras discussões sobre a classe docente são tratadas nesse contexto: Ampliação do quadro docente, com convocação imediata dos professores aprovados em concurso; treinamento para as pessoas aprovadas; suporte multiprofissional aos profissionais da educação para ampliar a capacidade de lidar com as diferenças de classe, gênero, raça e etnia, dentre outras; criação de espaços (seminários, palestras, etc.) que permitam discussões entre e com os professores. (HEMOBRÁS; FIOCRUZ, 2013, p. 106). A citação evidencia questões que passam pela valorização profissional, mas também apontam para a necessidade de capacitação, efetivação de contratos e suporte por parte da gestão educacional para o desenvolvimento de atividades. As questões apontadas tornam evidente a necessidade de efetivação de planejamento e a construção de espaços de participação. 116 As questões apontadas, a partir dos relatos coletados nas entrevistas, contribuem para o aprofundamento sobre as mudanças do cenário de crescimento industrial para a gestão da educação. Manifestações sobre a ineficiência de estruturas de gestão da educação e ausência de planejamento da política de educação se tornam mais visíveis neste cenário. Se por um lado oportunidades de mudanças são destacadas para as diversas áreas, por outro, dificuldades da educação se tornam mais visíveis. A contraposição entre oportunidades desse contexto e impasses de estabelecimento de uma política de educação solidificada manifesta preocupação, como enfatiza o relato do entrevistado: Eu vejo com preocupação. Por que se a gente for ver outros exemplos de cidades que receberam investimentos. A população daqueles municípios cresceram muito. Então Goiana já precisava de um investimento grande em educação para transformar sua realidade [...] Então o nosso sentimento é de preocupação e esperança, por que a gente sabe qual é o caminho, mas vamos vê o que acontece. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-). O relato enfatiza desarticulações na gestão da educação. Na visão do entrevistado a estrutura é limitada para o atendimento do quadro local. O descrédito apontado no relato aparece relacionado à perpetuação de políticas desvinculadas de um projeto de educação consolidado no município, no qual diretrizes políticas destacam o crescimento centrado na dimensão econômica, em detrimento do fortalecimento de políticas públicas para a diminuição desigualdades sociais. O entrevistado enfatiza que a importância da educação tem sido destacada em discursos políticos, porém na prática não tem sido priorizada. Entendemos que a gestão da educação não pode ser vista por um único viés. As diretrizes políticas e tendências históricas, que demonstram perpetuação de políticas fragmentadas no sentido de representar um projeto de inversão de problemas estruturais do município, devem ser compreendidas em várias dimensões. Temos, nesse processo, a ausência de um projeto político de educação solidificado, gestão centralizada, dependência financeira, a ausência de canais de participação e inexistência de espaços para o acompanhamento social. Consideramos que a conjuntura de crescimento industrial tem sido um elemento provocador para uma perspectiva de recondução das diretrizes da política de educação local. As demandas e propostas da classe docente, a demanda social por formação para inserção no mercado de trabalho e articulações com atores como empresas delineiam a necessidade de um novo panorama para a gestão da educação local. 117 7 DESCONTINUIDADES E REFLEXIVIDADE: PANORAMA DA GESTÃO EDUCACIONAL NO MUNICÍPIO DE GOIANA/PE O cenário de mudanças no município de Goiana, representado pelo crescimento industrial, manifesta modificações na história do município, caracterizada pela produção da monocultura canavieira. Contudo, o histórico da atividade agrícola ainda é representativo da identidade local, como ressalta o estudo da Hemobrás; Fiocruz (2013, p. 33) “esse contexto de grande relevância adquirida pela cultura da cana ainda reflete bastante na estrutura fundiária e atividades socioprodutivas no município”. As constatações do estudo citado fortalecem a reflexão sobre a identidade cultural do município construído pela monocultura e as modificações da industrialização recente. Considerar o cenário de mudanças implica buscar a compreensão de valores distintos. Se, por um lado, a estrutura fundiária do município torna presente a história econômica da monocultura local, por outro, mudanças significativas se estabelecem com a instalação de empresas e outros empreendimentos imobiliários. O panorama municipal desse cenário de crescimento apresenta “continuidades” e “descontinuidades”, que se relacionam à história local. O quadro de contradições é visível nos aspectos de infraestrutura urbana, expansão urbana desordenada, sistema de coleta desestruturado, entre outras questões. Por outro lado, o município tem a implantação de empreendimentos industriais de alta tecnologia. As “descontinuidades”, interpretadas a partir da teoria social proposta por Anthony Giddens, trazem elucidações sobre o processo de desenvolvimento desigual e evidenciam características da modernidade e, mais especificamente, consequências da própria modernidade como menciona o sociólogo. “continuidades” e “descontinuidades” são compreendidas como integrantes do processo de desenvolvimento histórico e estão associadas à modernidade. Tal associação revela que os modos de vida produzidos na modernidade divergem dos modos de vida tradicionais e tendem dessa forma a revisões que alteram o caráter das práticas sociais promovendo novos saberes e modos de vida. Em Goiana a modernidade, nos termos em que trata a teoria, é compreendida nas diferenças impostas pelas mudanças do crescimento industrial. A expansão urbana, crescimento desordenado, problemas de mobilidade, são exemplos de mudanças que se impõe ao contexto tradicionalmente apresentado pelo município. Outro exemplo, apropriado a essa discussão, é o aumento da taxa de homicídios analisado pela pesquisa da Hemobrás; Fiocruz: 118 Um dos principais motivos para esse fato está no tráfico e no consumo de drogas no município, diagnosticados pela população como um dos maiores problemas a ser enfrentado. Esse problema é ratificado pelo movimento de interiorização do tráfico e consumo de entorpecentes, que atinge cidades pequenas e médias, especialmente aquelas que passam por um período de crescimento econômico, como o caso de Goiana. (HEMOBRÁS; FIOCRUZ, 2013, p. 33). Os modos de vida tradicionais são revisados à luz de novas práticas estabelecidas pelo crescimento industrial. O conjunto de inadequações, a falta de planejamento, estrutura inadequada e ausência de gestão democrática nas escolas, a que se referem às falas dos entrevistados, sinaliza a evidencia de que há um processo de “descontinuidades” na agenda de desenvolvimento econômico e social do município. Esse quadro revela que tais mudanças estão relacionadas, no cenário recente do município, à passagem de um contexto fortemente ligado à tradição agropecuária para um contexto industrial. Essa reflexão teórica subsidia a interpretação do cenário de crescimento industrial em Goiana. Convivências multidimensional de entre práticas mudanças e sociais revelam diferenciadas dessa maneira anunciam o caráter “continuidades” e “descontinuidades” constitutivas da modernidade. O caráter multidimensional da análise defendida por Giddens significa que não devemos conceber caracterizações exclusivas para elucidar questões da modernidade. Compreende-se que por um lado, questões econômicas exercem influência em determinado contexto, mas, por outro influências tecnológicas e outras que possam ser atribuídas no mesmo âmbito, podem também explicar tais mudanças. Nesse sentido, para o autor, cada um dos elementos presentes nas tradições representa algum papel. As circunstancias diferenciadas, no tratamento teórico mencionado, são sinalizadoras de que mudanças não fornecem impactos totalizadores e isso se refere ao caráter multidimensional das mudanças. O autor destaca nessa discussão, as conexões entre diferentes regiões ou contextos sociais que se enredam na superfície da terra. Dessa maneira, pensar sobre a perspectiva local, a partir dessa reflexão teórica consiste em entender a influência da perspectiva global. Pensar sob essa perspectiva global, expressa-se por exemplo, em compreender as implicações do contexto da economia globalizada para a elaboração de políticas educacionais locais. Para exemplificar Giddens menciona que corporações multinacionais, controlam imenso poder econômico e isso condiciona influências aos sistemas políticos. A reflexão 119 apresentada pelo autor desvela o caráter global embutido na concepção de políticas públicas e presença de atores não governamentais que influenciam a construção política. A exposição do Secretário de Educação do município de Goiana revela o entendimento sobre a construção de uma política de cooperação com as empresas para o apoio ao melhoramento da estrutura física das escolas. Entendemos que essa é a indicação de construção de uma nova agenda, que envolve a intermediação de novos atores na política educacional. Nos relatos, que apresentamos sobre o município no cenário de crescimento industrial, destacam-se divergências do planejamento da política de educação, estrutura física de escolas inadequada, impasses entre as orientações legais e práticas da gestão, dependência financeira e ausência de espaços de participação social. Noutra dimensão, o cenário de crescimento industrial traz visibilidade a oportunidades de construção de uma nova agenda que impacta a gestão da educação local. Além disso, a capacitação técnica tem forte demanda como podemos perceber na análise da Hemobrás; Fiocruz, sobre as desvantagens da população local em preencher os novos postos de trabalho: Desvantagem determinada, dentre outros aspectos, pela baixa oferta de cursos profissionalizantes para a juventude, pela parcela da população adulta apresentar pouca ou nenhuma qualificação, pelo elevado percentual de analfabetismo e pela baixa escolaridade, aspectos por sua vez evidenciados nas reflexões do setor educação. (HEMOBRÁS; FIOCRUZ, 2013, p. 111). As questões cuja visibilidade foi fortalecida pelo cenário de crescimento industrial evidenciam o papel de instituições modernas tratadas por Giddens. O autor ressalta o papel do Estado, como instituição, e as relações que se constroem entre os estados, permeadas por questões políticas, econômicas, culturais, assim como por processos de desenvolvimentos históricos desiguais como enfatiza o autor. As reflexões da teoria social de Giddens, na qual se evidencia o papel das instituições modernas como o estado-nação nesse contexto de mudanças, aponta para o entendimento que as ações do Estado-nação são permeadas por relações de um contexto mais amplo. Nesse sentido, políticas de financiamento e diretrizes globais embutidas, formação tecnicista, em que a qualificação está voltada para a produção, o tratamento da sustentabilidade relacionado a reformas macroeconômicas e estruturais, confluem para o fortalecimento de uma economia de mercado no mundo. O entendimento é o da existência de uma configuração do estado-nação, e do estabelecimento de diretrizes globais disseminadas pela conexão entre estados. A questão de 120 fundo dessa discussão é entender que contextos políticos globais estabelecem influências na política local. Perceber a política local como resultado de orientações globais ressalta também a política local, no sentido das respostas que são construídas, por exemplo, pela gestão municipal. Percebemos que a gestão da educação tem buscado a construção de uma agenda para o cenário de crescimento que ressalta a cooperação com atores não governamentais para construção de políticas públicas. Esse é um indicativo de que a perspectiva de uma agenda de responsabilidade social está em curso e permeia a construção da política de educação no município. Nesse contexto, tomando como exemplo a construção do sistema de ensino municipal, que evidencia a autonomia em relação à política educacional local. A construção do Plano Municipal de Educação é outro aspecto que fortalece as diretrizes da política local para a educação. Contudo, as responsabilidades, as demandas em torno da educação demonstram lacunas da gestão em responder a problemas da pauta da educação municipal, e com isso, consolidar diretrizes políticas locais. As lacunas, como a relação entre o planejamento e as ações da política de educação, o estabelecimento da gestão democráticas nas escolas, entre outras questões, são como um sinal de que o poder público local também passa por processos de “descontinuidades” e de reformulações de suas práticas. Exemplo é a busca por novas formas de cooperação que citamos. A respeito da dimensão política, Giddens enfatiza as influências do relacionamento econômico entre instituições. O autor menciona que “a autonomia do estado é condicionada, embora não determinada num sentido forte, pela sua dependência de acumulação de capital, sobre qual o seu controle está longe de ser completo” (GIDDENS, 1991, p. 61). Giddens destaca a importância da dimensão econômica, mas também destaca que a autonomia do Estado não deve ser percebida como determinação econômica. Nesse ponto o autor evidencia a dimensão política e tal interpretação subsidia as reflexões sobre governo local e como as diretrizes políticas podem contribuir para um desenvolvimento local inovador. Sobre a discussão Sarmento menciona: [...] a valorização dos governos locais, entendendo-se as experiências analisadas como inovações que vêm se contrapondo ao padrão neoliberal, apontando para mudanças qualitativas nas relações e práticas do governo local. (SARMENTO, 2005, p. 1373). 121 A reflexão de Sarmento converge para a discussão tratada por Giddens. Sarmento (2005) destaca que, afora as críticas neoliberais ao papel dos governos, esses são essenciais na construção de políticas de educação. O contexto de crescimento industrial de Goiana desvela essas considerações no campo prático, à medida que a gestão é chamada a responder demandas locais. Dessa forma, entendemos que a gestão municipal, que age ora estabelecendo um Plano Municipal de Educação, ora regulamentando uma base legal orientadora da política de educação e, posteriormente, desarticulando práticas e instrumentos constituídos de gestão, apresenta “descontinuidades” que fragmentam o projeto político local para a educação. O papel da gestão local, dessa maneira, não é entendido a partir de uma visão simplificadora em que o planejamento trará ordenação, como ressalta Dowbor. A própria realidade do município demonstra que constituir um Plano não é uma ação acabada. Porém entendemos que a ação planejada promove possibilidades de estabelecer diretrizes mais condizentes com as necessidades locais. Assim, o papel da dimensão política incide sobremaneira na consolidação do desenvolvimento local. Percebemos esse entendimento em críticas registradas nas entrevistas sobre a ausência de planejamento e as improvisações da política local. Outra questão também tratada por Giddens que se refere à dimensão política é o papel dos movimentos sociais. Para o autor, o papel desempenhado pelos movimentos sociais na modernidade está situado no fortalecimento de canais de participação para o enfrentamento de problemas. Nas entrevistas, percebemos que há requerimento para o fortalecimento de canais de participação como exemplo, a gestão democrática nas escolas e, contudo tais condições ainda não foram estabelecidas. A mobilização social é evidenciada pela ação contestatória, que se materializa em ações políticas. No contexto de Goiana não objetivamos elencar os movimentos sociais. Contudo, evidenciamos ações contestatórias, que podem ser identificadas como uma mobilização social e exercem influências na construção da política local como, por exemplo, o Sindicato de Professores do município. As críticas à concepção do Plano municipal, à ausência do processo eletivo para as direções das escolas e à falta de transparência em relação aos recursos para a gestão de políticas públicas convergem para esse entendimento da ação contestatória que representa a mobilização social. Assim, a participação política interfere no planejamento e isso se manifesta na capacidade de influenciar o poder decisório em uma sociedade democrática, estabelecendo correlação entre o que é planejado e as necessidades sociais. 122 No que se refere à participação social, evidenciamos nos relatos que canais de participação para a definição e gestão de ações políticas no contexto municipal são requeridos. Contudo, ainda não são evidenciadas. Por outro lado, a presença do Conselho Municipal de Educação, como órgão que assessora a Secretaria na elaboração da política educacional e concebido historicamente na condição de instância mediadora entre governos e sociedade, confere a estrutura organizacional da política de educação local um canal para que a participação seja constituída. A fraca visibilidade de canais de participação agrava a aplicação racionalizada de recursos. O entendimento é de que a ausência de participação enfraquece a representação das necessidades da comunidade. A reflexão de Dowbor evidencia essa discussão, ao mencionar que: Assim, a dramática centralização do poder político e econômico que caracteriza a nossa forma de organização como sociedade, leva em última instância, a um divórcio profundo entre as nossas necessidades e o conteúdo do desenvolvimento econômico e social. (DOWBOR, 2008, p. 5). Dowbor, ressalta a participação como elemento de apropriação na construção de políticas púbicas. Para o autor, isso é entendido como uma espécie de recuperação do controle do cidadão, sobre as formas de desenvolvimento estabelecidas pelas ações políticas. A discussão proposta por Giddens sobre a “reflexividade” corrobora com a discussão da participação, à medida que a reflexividade promove mudanças nas práticas sociais. O acesso a informações, o avanço tecnológico, que promove interações e possibilitam que as práticas sociais sejam examinadas e reformadas, produz alterações divergentes das práticas tradicionalmente constituídas. As considerações apresentadas por Giddens elucidam sobre o papel da educação, como processo que estabelece a “reflexividade”. E a “reflexividade” compreendida nesta perspectiva teórica se correlaciona ao ativismo dos indivíduos que através da reflexividade são constituídos como agentes de mudanças, isto é, uma sociedade civil que fortalece a democracia. Em consideração a essa orientação teórica, constatamos alguns dados que subsidiam o entendimento dessa categoria de análise proposta por Giddens. O município de Goiana é caracterizado por um contexto de ausência de articulação entre o planejamento político e as práticas da gestão, média de analfabetismo superior à média nacional11, precária infraestrutura 11 Dado analisado pela pesquisa da Hemobrás; Fiocruz (2013, p. 99). 123 das escolas, falta de autonomia financeira da Secretaria de Educação, ausência de processo eletivo para os gestores das escolas e um modelo de gestão centralizado e pouco participativo, entre outros dados da educação em Goiana. Esses dados são indicativos de que o município apresenta lacunas que não promovem a “reflexividade” e que esse quadro é uma referência de “descontinuidades” dos projetos de gestão. 124 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS O crescimento industrial em Goiana promove visibilidade regional para o município e evidencia potencialidades locais, aspectos da organização administrativa e também demandas sociais. Dessa forma, com a investigação evidenciamos o processo de desenvolvimento empreendido a partir das mudanças nesse contexto. Constatamos que a política local empreendeu a construção de instrumentos legais, formando um arcabouço de orientações que manifestam o objetivo de respaldar ações da Secretaria Municipal da Educação, como instância responsável pela gestão de políticas educacionais no município. Contudo, percebemos divergências entre o que é registrado legalmente e práticas políticas da gestão local da educação. Consideramos que a construção deste arcabouço que compreende a instituição de leis municipais, ganha vigor com a instituição legal do Sistema de Ensino Municipal, no ano de 2006. Os temas tratados no conjunto de leis apresentam orientações sobre o funcionamento do Conselho Municipal de Educação de Goiana, a criação da Comissão permanente de acompanhamento e controle social do FUNDEB, o Plano de Cargos e Carreiras e Remuneração do Grupo Ocupacional de Apoio Administrativo ao Magistério, a remuneração dos profissionais do magistério público da Educação básica do município de Goiana e o Plano Municipal de Educação. Os temas tratados convergem para o quadro em que o município estabelece seu sistema de ensino. A instituição do Sistema de Ensino em Goiana explicita orientações das reformas educacionais constante na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a saber, que o município pode “optar por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor com ele um sistema único de educação básica” (BRASIL, 1996). Essa orientação promove o gerenciamento de políticas no âmbito municipal e a definição de orientações legais como podemos identificar no município. Dessa maneira, a diretriz da legislação educacional fortalece a descentralização. Essa orientação ressalta a centralidade da questão para a gestão municipal. Em outros termos a construção de estratégias locais para empreender a execução de políticas públicas, tendo como guia a realidade do município. Goiana, diante do cenário de crescimento industrial, aprofunda demandas sociais para a administração municipal, em relação à construção de estratégias locais de intervenção para enfrentamento dos problemas sociais que se avolumam. 125 As estratégias se expressam em instrumentos do planejamento, como os Planos Municipais de Educação. De acordo com a análise concebida evidenciamos que o Plano Municipal de Educação de Goiana, embora expresse a formalização do planejamento, é um instrumento de contradições, pois não se constitui como referência para as ações da gestão. De maneira sintética a expressão registrada na entrevista ressalta as lacunas do planejamento: “muitas vezes as políticas são implantadas no improviso”12. A ausência de planejamento se fortalece neste quadro por uma gestão centralizada. Buscamos também evidenciar lacunas da participação social, que tem no quadro de gestão centralizada e desarticulação entre planejamento e práticas políticas, a desarticulação entre as demandas sociais e as políticas executadas pela Secretaria de Educação, como também a inexistência de acompanhamento. Por um lado, a gestão local promoveu mudanças orientadas pela legislação educacional, contudo a atuação da Secretaria Municipal de Educação se efetiva na execução de políticas gestadas no âmbito da União e do Estado. Dessa forma, o município não tem atuado efetivamente de maneira descentralizada, tratando aspectos locais, estabelecendo mudanças para o enfrentamento dos problemas econômicos e sociais que se apresentam no cenário de crescimento industrial. Constatamos também que problemas como precária estrutura de escolas municipais, oferta de ensino insuficiente, inexistência de planejamento, ausência de gestão democrática, incompatibilidade do PCC dos profissionais da educação com cenário recente são questões estruturais que demonstram uma organização incipiente em relação ao contexto atual. Se, por um lado, a inadequação da oferta de ensino ganha visibilidade, por outro, novas demandas como a inserção da língua inglesa nos 4º e 5º anos, vinculadas a mudanças socioeconômicas revelam questões as quais, a gestão da educação local precisa enfrentar. Neste sentido, questões estruturais são agravadas nesse cenário de crescimento industrial e expressam a incompatibilidade entre as questões que se apresentam e a gestão local da educação. Assim, a gestão local é provocada a construir respostas às demandas sociais historicamente constituídas e às do contexto mais recente. O cenário de mudanças também é alterado em função de novos atores que produzem mudanças para a gestão da educação, como indústrias, instituições de ensino superior, instituições de formação técnica, entre outras. O cenário engendra um processo de 12 Citação contida no trecho da entrevista que registramos na página 82. 126 responsabilidade social, por parte de empresas, como a Hemobrás13, que é entendido como estratégico para a viabilização de novas parcerias para o desenvolvimento de ações voltadas para o desenvolvimento da educação local. Contudo a inserção desses novos atores não se constitui em uma cooperação que esteja sistematizada. As mudanças para a gestão da educação no contexto de crescimento industrial da região enfatizam que a dimensão econômica não pode ser desvinculada da dimensão da educação. Considerar essa vinculação remete ao papel da educação nesse cenário de desenvolvimento e se relaciona à sustentabilidade desse cenário. Dessa maneira, a concretização da sustentabilidade nesse processo requer que os atores da gestão da educação local possam promover os instrumentos do planejamento em consonância com o fortalecimento da participação social. Assim a gestão planejada e transparência poderiam fornecer subsídios para equilibrar o processo de decisão e o atendimento das necessidades educacionais do município. 13 A Hemobrás (Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia) promoveu a construção da pesquisa, publicada em 2013: “Análise participativa da realidade socioambiental de Goiana/PE”. O objetivo do estudo era promover reflexões sobre o cenário de crescimento econômico do município e da necessidade de sustentabilidade. 127 REFERÊNCIAS ABRUCIO, F. Luiz. Trajetória recente da gestão pública brasileira: um balanço crítico e a renovação da agenda de reformas. Revista de Administração Pública, v.41, n.spe, p. 67-86, 2007. ANDRADE, E. F. de. Sistemas municipais de educação: impactos na gestão educacional no âmbito do poder local. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2012. ANDRIOLO, L. J. Uma análise dos sistemas de gestão pública de acordo com o conceito atribuído ao destinatário das ações públicas. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 25., 2001, Campinas, SP. Anais... Campinas, SP: ANPAD, 2001. p. 19-29. ARAÚJO, E. Descentralização e financiamento da educação no Brasil e no Chile dos anos 1980 e 1990. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v. 22, n.2, p. 293-314, jul./dez. 2006. ARRETCHE, M. Relações federativas nas políticas sociais. Educação & Sociedade, Campinas, v. 23, n. 80, p. 25-48, set. 2002. AZEVEDO, J. M. L. de. Educação como política pública. 2. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2001. BALL, S. J. Diretrizes políticas globais e relações políticas locais em educação. Currículo sem Fronteiras, v.1, n.2, p. 99-116, Jul./Dez. 2001. ______. Performatividade, privatização e o pós-estado do bem-estar. Educação & Sociedade, Campinas, v. 25, n. 89, p. 1105-1126, Set./Dez. 2004. BALL, S. J. Profissionalismo, gerencialismo e performatividade. Cadernos de Pesquisa, v.35, n.126, p. 539-564, set./dez. 2005. BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2004. BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 10 jul. 2014. BRASIL. Decreto 6.094, de 24 de abril de 2007. Dispõe sobre a implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6094.htm>. Acesso em: 10 jul. 2014. BRASIL. Emenda Constitucional nº 59, de 11 de novembro de 2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc59.htm>. Acesso em: 10 jul. 2014. 128 BRASIL. Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação. FUNDEF. 1996. Disponível em:< http://www.fnde.gov.br/financiamento/fundeb/fundeb-apresentacao>. Acesso: 20 set. 2014. BRASIL. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf>. Acesso em: 26 maio 2014. BRASIL. Ministério da Educação. Planejando a próxima década conhecendo as 20 metas do Plano Nacional de Educação. Brasília, 2014. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome. Diagnóstico para a gestão municipal. Brasília, 2008. Disponível em: < http://www.ufrgs.br/cegov/files/mds/MDS_2008_CadernoInforma%C3%A7%C3%B5esDiag nosticoparaGest%C3%A3oMuncipal.pdf >. Acesso em 13 de set. 2014. BURBULES, N. C.; TORRES, C. A. Globalização e educação: uma introdução. In: BURBULES, N. C.; TORRES, C. A. (Org.). Globalização e educação: perspectivas críticas. Porto Alegre: Artmed, 2004. CARCANHOLO, M. D. Neoliberalismo e o Consenso de Washington: a verdadeira concepção de desenvolvimento do governo FHC. In: MALAGUTI, M. L.; CARCANHOLO, R. A.; CARCANHOLO, M. D. Neoliberalismo: a tragédia do nosso tempo. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2000. CARNEIRO, M. A. LDB fácil: leitura critico-compreensiva artigo a artigo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009. CARNEIRO, M. E. F.; MESQUITA, M. C. D. O financiamento da educação infantil no Brasil de 2003 a 2006. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v.22, n.2, p. 345-357, jul./dez. 2006. CASASSUS, J. A reforma educacional na América Latina no contexto de globalização. Cadernos de Pesquisa, n.114, p. 7-28, nov. 2001. COLARES, M. L. I. S. As políticas educacionais da Secretaria Municipal de Santarém (1989-2002). 2005. 169 f. Tese. (Doutorado em Educação)- Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, 2005. DOMBROWSKI, O. Poder local, hegemonia e disputa: os conselhos municipais em pequenos municípios do interior. Revista de Sociologia e Política, v. 16, n.30, p. 269-281, 2008. DOURADO, L. F. Políticas e gestão da educação básica no Brasil: limites e perspectivas. Educação & Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100, p. 921-946, out. 2007. DOWBOR, L. O que é poder local? 2008. Disponível em: < http://dowbor.org/tag/poderlocal/> . Acesso em: 20 out. 2014. 129 DUARTE, M. R. T.; JUNQUEIRA, D. S. A propagação de novos modos de regulação no sistema educacional brasileiro: o Plano de Ações Articuladas e as relações entre as escolas e a União. Pro-posições, v. 24, n. 2, v.71 , p. 165-193, maio/ago. 2013. DULCI, O. S. Economia e política na crise global. Estudos Avançados, v.23, n.65, p. 105119, 2009. EMPRESA BRASILEIRA DE HEMODERIVADOS E BIOTECNOLOGIA; FIOCRUZ. Análise participativa da realidade socioambiental da Goiana- PE. Recife: Hemobrás, 2013. FARENZENA, N. Federalismo e descentralização. Disponível em: <http://www.pead.faced.ufrgs.br/sites/publico/eixo5/organizacao_gestao/modulo2/federalism o.pdf>. Acesso em: 15 set. 2014. FARIA, L. A questão local: um debate para a educação. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v.22, n.1, p. 69-84, jan./jun. 2006. GIDDENS, A. As consequências da modernidade. São Paulo: Editora UNESP, 1991. GOHN, M. da G. Teorias a respeito do governo local, poder local, esfera pública e governança local. In: ______. Conselhos gestores e participação sociopolítica. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2007. GOIANA (Prefeitura). Lei nº 1.998 de 13 de outubro de 2006. Dispõe sobre a criação e organização do sistema de ensino do município de Goiana. In: ______. Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. ______. Lei 1.997 de 13 de dezembro de 2006. Dispõe sobre o funcionamento do Conselho Municipal de Educação de Goiana-PE e dá outras providências. In: ______. Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. ______. Lei 2.035 de 20 de agosto de 2007. Dispõe sobre a criação da Comissão permanente de acompanhamento e controle social do FUNDEB. Goiana, PE, 2010. In: ______. Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. ______. Lei 2.065 de 12 de maio de 2008. Institui o Plano de cargos e carreira e remuneração do grupo ocupacional de apoio administrativo ao magistério. In: ______. Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. ______. Lei 2.095 de 09 de março de 2009. Adequa a remuneração dos profissionais do magistério público da Educação básica do município de Goiana, ao piso salarial nacional. In: ______. Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. 130 ______. Lei 2.090 de 29 de dezembro de 2008. Institui o Plano Municipal de Educação e dá outras providências. In: ______. Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. ______. Lei 2.123 de 30 de dezembro de 2009. Dispõe sobre o plano de cargos, carreiras e vencimentos do magistério público municipal de Goiana, e dá outras providencias. In: ______. Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. ______. Lei Orgânica do município de Goiana. revisada e atualizada até a emenda nº 012 de 2010. Institui as disposições gerais da gestão municipal de Goiana. Goiana, PE, 2010. GOIANA (Prefeitura). Secretaria de Educação. Regimento Interno da Secretaria de Educação de 30 de abril de 2008 .In: ______. Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. GOIANA (Prefeitura). Regimento interno do Conselho Municipal de Educação. In: ______. Marcos Legais. Goiana, PE: Secretaria de Educação e Inovação, 2010. GRACINDO, R. V. Os sistemas municipais de ensino e a nova LDB: limites e possiblidades. In: BRZEZINSKI, I. (Org.). LDB interpretada: diversos olhares se entrecruzam. São Paulo: Cortez, 2003. IBGE. Cidades: Goiana. Disponível em: < http://cidades.ibge.gov.br/painel/painel.php?codmun=260620>. Acesso em: 10 jul. 2014. LAVILLE, C.; DIONNE, J. A construção do saber: manual de metodologia da pesquisa em ciências humanas. Porto Alegre: Artmed, 1999. LEITE, R. C. LDB: planos, financiamento e descentralização educacional. In: RESCIA, A. P. O.; SOUZA, C. B. G. de; GENTILINI, J. A.; RIBEIRO, R. (Org.). Dez anos de LDB: contribuições para a discussão das políticas públicas em educação no Brasil. Araraquara, SP: Junqueira&Marin, 2007. LINGARD, B. É ou não é: globalização vernacular, politica e reestruturação educacional. In: BURBULES, N. C.; TORRES, C. A. (Org.). Globalização e educação: perspectivas críticas. Porto Alegre: Artmed, 2004 LUZ, L. X. Ação empresarial e educação pública no Brasil. Educação: teoria e prática, v. 19, n.32, p.89-110, jan./jun. 2009. KLERING, L. R.; PORSSE, M. C. S.; GUADAGNIN, L. A. Novos caminhos da administração pública brasileira. Análise, v. 21, n. 1, p. 4-17, jan./jun., 2013. 131 KRAWCZYK, N. R. Políticas de regulação e mercantilização da educação: socialização para uma nova cidadania? Educação & Sociedade, v. 26, n. 92, p. 799-819, 2005. MARQUES, L. R. Os conselhos escolares e a construção de uma cultura democrática nas escolas. In: GOMES, A. M. (Org.). Políticas públicas e gestão da educação. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2011. MORROW, R. A.; TORRES, C. A. Estado, globalização e políticas educacionais. In: BURBULES, N. C.; TORRES, C. A. (Org.). Globalização e educação: perspectivas críticas. Porto Alegre: Artmed, 2004. OLIVEIRA, R. de F.; TEIXEIRA, B. de B. Do FUNDEF ao FUNDEB: a qualidade ainda fora de pauta. Disponível em:< http://www.ufsj.edu.br/portalrepositorio/File/Vertentes/Rosimar%20e%20Beatriz.pdf>. Acesso em: 20 nov. 2014. PERNAMBUCO. Agência Estadual de Planejamento e Pesquisa de Pernambuco (CONDEPE/FIDEM). Norte metropolitano e Goiana. 2012/2013. Disponível em: < http://www.condepefidem.pe.gov.br/web/condepe-fidem/norte-metropolitano-e-goiana >. Acesso em: 14 jun. 2014. PERNAMBUCO. Agência Estadual de Planejamento e Pesquisa de Pernambuco (CONDEPE/FIDEM). Estudos dos impactos dos investimentos na economia pernambucana: unidades da BR FOODS, HEMOBRÁS, Estaleiro Atlântico Sul, Petroquímica Suape e Refinaria Abreu e Lima: visão a partir da Matriz Insumo-Produto de Pernambuco – 2005. Recife, 2011. Disponível em: < http://www.condepefidem.pe.gov.br/c/document_library/get_file;jsessionid=70D133128C35B 1F347BF4F1074532E3D.jvm4i1?uuid=bd676e1a-8bdd-496f-8eb0b32019d6b4d7&groupId=19941>. Acesso em: 13 set. 2014. PERONI, V. M. V. Financiamento da escola à luz do novo papel do Estado: o caso do Rio Grande do Sul. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v. 22, n. 2, p. 331-344, jul./dez. 2006. MACHADO, I. J. de R. Estado-nação, identidade-para-o-mercado e representações de nação. Revista de Antropologia, v. 47, n. 1, p. 207-234, 2004. NAÇÕES UNIDAS. PNUD. Atlas do desenvolvimento humano no Brasil 2013. Disponível em: < http://atlasbrasil.org.br/2013/perfil_print/goiana_pe>. Acesso em: 27 jun. 2014. NAÇÕES UNIDAS. PNUD. O que é IDH. Disponível em: < http://www.pnud.org.br/IDH/IDH.aspx?indiceAccordion=0&li=li_IDH>. Acesso em: 27 jun. 2014. REIS FILHO, H. dos. Os impactos do crescimento econômico na gestão educacional do município de Goiana. Goiana, PE, 2014. Texto produzido pelo autor sem publicação comercial. 132 ROBERTSON, S.; DALE, R. Pesquisar a educação em era globalizante. Educação & Realidade, v. 36, n. 2, p. 347-363, maio/ago. 2011. SANTIN, J. R. A noção história do poder local no brasil e o princípio da participação. 2008. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/brasilia/09_145.pdf>. Acesso em: 16 set. 2014. SARMENTO, D. C. Criação dos sistemas municipais de ensino. Educação & Sociedade, Campinas, v. 26, n. 93, p. 1363-1390, set./dez. 2005. SAVIANI, l. Sistemas de ensino e planos de educação: o âmbito dos municípios. Educação & Sociedade, ano 20, n. 69, p. 119-136, dez. 1999. SEVERINO, A. J. Educação, trabalho e cidadania A educação brasileira e o desafio da formação humana no atual cenário histórico. São Paulo em Perspectiva, v.14, n. 2, 2000. SEVERINO, A. J. Os embates da cidadania: ensaio de uma abordagem filosófica da nova lei de diretrizes e bases da educação nacional. In: BRZEZINSKI, I. (org.). LDB interpretada: diversos olhares se entrecruzam. São Paulo: Cortez, 2003. SHIROMA, E. O.; GARCIA, R. M. C., CAMPOS, R. F. Conversão das “almas” pela liturgia da palavra: uma análise do discurso do Movimento Todos pela Educação. In: HALL, Stphen e MAINARDES, Jefferson (Org.). Políticas educacionais: questões e dilemas. São Paulo: Cortez, 2011. VERHINE, R. E.; MAGALHÃES, A. L. F. Quanto custa a educação básica de qualidade? Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v.22, n.2, p. 229-252, jul./dez. 2006. VIEIRA, S. F. Poder local e educação no Brasil: dimensões e tensões. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v.27, n.1, p. 123-133, jan./abr. 2011. WEBER, S. Relações entre esferas governamentais na educação e PDE: o que muda? Cadernos de Pesquisa, v. 38, n. 134, p. 305-318, maio/ago. 2008. 133 APÊNDICES 134 APÊNDICE A: Roteiro para entrevista ENTREVISTA Pesquisa para a Dissertação: Os impactos do crescimento industrial na gestão educacional no município de Goiana Aluna: Dados do entrevistado Nome: Cargo/Função 1 Conhecer a estrutura de construção da política de educação a) Como ocorre a elaboração da política educativa do município? b) A gestão educacional de Goiana integra o Sistema Estadual ou compõe com o Estado um sistema único de educação básica? Quais considerações podem ser feitas a partir da opção assumida pelo município Conselho Municipal de Educação c) Quais instâncias compreendem a estrutura de gestão da educação do município de Goiana? d) Que articulações há entre as instâncias apontadas? e) Quais impactos do crescimento econômico local podem ser observados na oferta educacional em creches, pré-escolas e ensino fundamental? f) Quais propostas de integração entre a sociedade e escola, têm sido estabelecidas pela gestão municipal? g) De que maneira o crescimento dos setores produtivos em Goiana impacta a gestão da classe docente? Quais ações tem sido estabelecidas? i) Em que contexto surge o Plano Municipal de Educação? História da construção (a construção do plano foi instigada pelos impactos econômicos?) O plano pode ser considerado uma política pública ou uma política de governo? k) Como é feito este monitoramento das metas registradas no plano? j) Há um sistema de monitoramento da Secretaria Municipal de Educação que capte estes impactos econômicos? Se houver, como isto é considerado para a política de educação do município? 2 Identificar mecanismos de colaboração construídos no âmbito municipal a) Quais formas de cooperação e colaboração são identificadas entre as instâncias municipal, estadual e federal? FUNDEB b) A dinâmica de colaboração é alterada pelo crescimento de setores produtivos? a. Como se dá esta alteração? b. Como a Secretaria de Educação se estrutura para dar conta destas alterações? 135 c. Em relação ao estabelecimento de outras instituições (IFPE, SENAI, UFPE, etc, e também outras instituições privadas), como tem sido estabelecida esta parceria? c) Que outras formas cooperativas e colaborativas são vislumbradas pela Secretaria? O que falta para que possam ser concretizadas? d) Além das instâncias governamentais a Secretaria considera outros atores para a construção de parcerias? Quais e como ocorre? e) A Secretaria dispõe de agenda para realização de Fóruns Municipais de Educação? Como ocorre? f) As discussões realizadas nos Fóruns são organizadas pela Secretaria para a gestão da educação? Como funciona? 3 Apontar as implicações do crescimento industrial para a gestão da educação a) Quais considerações podem ser feitas sobre os impactos do crescimento dos setores produtivos para a gestão da educação? b) Quais demandas podem ser apontadas para a Gestão da educação neste contexto de crescimento econômico? Como a Secretaria tem se posicionado em função desta ocorrência? c) Como ocorre a gestão dos recursos para a Educação? A dinâmica de arrecadação é alterada em função do crescimento de setores produtivos? Quais possibilidades econômicas direcionadas a Gestão da Educação podem ser identificadas por este contexto? 136 APÊNDICE B: Carta de Apresentação da Entrevista UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CURSO DE MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO PÚBLICA PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE Apresentação da Pesquisa Entrevistado: _________________________________________________________Solicito a sua colaboração em conceder entrevista para a pesquisa de campo a ser realizada como exigência da pesquisa em desenvolvimento no curso de Mestrado Profissional Em Gestão Pública Para Desenvolvimento do Nordeste, da Universidade Federal de Pernambuco. A pesquisa tem como título: Os impactos do crescimento industrial na gestão educacional no município de Goiana, orientada pelo Professor Doutor Denilson Marques. O objetivo geral da pesquisa é: Analisar os Desafios do crescimento industrial para a gestão da educação no município de Goiana/PE. O tema é de grande relevância para o debate acadêmico e por isto reforço a importância de sua colaboração. As informações sobre a gestão municipal da educação expressados na entrevista ajudarão na construção do meu conhecimento sobre o quadro da gestão municipal. Comprometemo-nos que na análise dos dados os entrevistados não serão identificados por seus nomes. Agradeço sua colaboração para esta pesquisa e construção do conhecimento produzido para a gestão da educação. Katia Maria Tavares da Silva Mestranda em Gestão Pública pela UFPE