Estado de Sergipe Poder Judiciário 4ª Vara Cível CAPUCHO, ARACAJU/Se Termo do Despacho Dados do Processo Número 200410400571 Classe Civil Publica Competência 4ª VARA CíVEL Situação ANDAMENTO Distribuido 02/08/2004 Ofício único Em: Local do Registro 2º Distribuidor Partes do Processo Requerente MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE SERGIPE Requerido BRADESCO SAUDE S/A Requerido SUL AMERICA COMPANHIA DE SEGURO SAUDE DECISÃO O Ministério Público do Estado de Sergipe e a Coordenadoria Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor - PROCON aparelham esta ação civil coletiva, com pedido liminar, em face da Sul América Companhia de Seguro Saúde e Bradesco Saúde S/A. Expressam que as requeridas, no mês de junho próximo passado, enviaram correspondência modelar aos consumidores, com a informação de que a mensalidade do plano de saúde seria aumentada em 85,1% (-) e que este reajuste seria necessário em vista da defasagem acumulada nos últimos anos. Não detalharam a razão do reajuste, embora genericamente afirmem que essa correção se devia à evolução dos custos médico-hospitalares, à idade da carteira e à limitação de aumentos nos últimos anos. E, de acordo com a citada epistola, a suspensão do art. 35-E, da Lei nº 9.656/98, pelo Supremo Tribunal Federal, autorizaria o reajuste nos moldes pretendidos, sem o controle da ANS (Agência Nacional de Saúde Complementar). Asseguram que a mencionada decisão foi interpretada, equivocadamente, pois o Supremo Tribunal Federal não autorizou reajustes exorbitantes, fundado em cláusula abusiva, resultante em alteração unilateral de preço e do conteúdo e qualidade do contrato, em afronta ao art. 51, incisos X e XIII, do CDC. Realçam que a comunicação supra se verificou no mesmo período em que as requeridas ofertavam o denominado Programa de Incentivo à Adaptação dos Contratos (PIAC) que se encontra suspenso pela Justiça Federal, por conter inúmeras situações prejudiciais ao consumidor. Com isto, extraem a conclusão de que, ao tempo em que comunicavam aumento abusivo, as requeridas ofertavam, como alternativa ao consumidor, uma migração para outro contrato, muito mais caro, com a afirmativa de que o PIAC autorizava-lhe a tal. Ressaltam que as operadoras de planos de saúde, a pretexto de cumprirem determinações da ANS, dentro do hoje Suspenso Programa de Incentivo à Adaptação dos Contratos (RN 64 de 22 de dezembro de 2003) e estarem baseadas me decisão do Supremo Tribunal Federal (ADIN 1.931-8), enviam correspondências oferecendo um novo contrato (migração) por preço muito superior, com informação de que, caso não aceite a migração, o antigo contrato sofrerá abusivo aumento de preço. Dizem que assim o fizeram as requeridas. Outros comentários repulsivos a essas condutas das requeridas foram feitos na inicial. Daí os postulantes realçam dispositivos da lei e decisões que repudiam as práticas abusivas nos contratos de plano de saúde e pedem a concessão de liminar (inaudita altera pars), a fim de que a todos os consumidores das requeridas, que tenham firmado contrato anteriormente a 02 de janeiro de 1999, seja dado o direito de permanecer com os direitos inerentes ao contrato, liberando-se de iníquo reajuste (que genericamente foram elevados em percentuais de até 85,1%, fixando-se por ora o percentual de 11,75% referido na Resolução 74/04 e Súmula Normativa 05/03, ambas da Agência Nacional de Saúde, especialmente, porque a efetividade da medida impediria a proliferação de milhares de ações nos mais variados recantos desse país, bem como prejuízo graves aos consumidores. Decido. Trata-se de contrato cativo de longa duração. Os segurados assumiram a obrigação de pagar as mensalidades inicialmente definidas, e as seguradoras (requeridas), o compromisso de prestarem a assistência contratada, em caso de evento futuro e incerto (doença). De forma que todo o período de contratação era alimentado por espectativa e confiança. Ressalte-se que, no abalizado conceito da profª Cláudia Lima Marques, a espécie caracteriza um contrato de consumo típico das pós-modernidade: um fazer de segurança e confiança, um fazer complexo, um fazer em cadeia, um fazer reiterado, um fazer de longa duração, um fazer de crescente essencialidade. É um contrato oneroso e sinalagmático, de um mercado em franca expansão, onde a boa-fé deve ser a tônica das condutas (O Novo Regime das Relações Contratuais. 4ª edição, pág. 420). Os reajustes das mensalidades, em conseqüência, não podem ser unilaterais ou arbitrários; devem ser criteriosos, especificados e motivados, além de instruídos com planilha demonstradora dos custos e benefícios, preferencialmente organizada por órgão estatal, ou, quando impossível, deverão logicamente acompanhar apenas o índice inflacionário. A verdade é que, sem indicação de critérios seguros e transparentes, o reajuste afigura-se arbitrário e fere o princípio do equilíbrio contratual. No caso dos autos, a afronta a estes princípios se manifesta, pois, de uma só vez, e sem esclarecimento substancioso e convincente, as requeridas simplesmente comunicaram que embutiriam nas mensalidades o acréscimo de 85,1% (-). Com esta imposição, afrontaram induvidosamente o artigo 122, do Código Civil, e os artigos 39, incisos X e XI, e 51 IV, X, XIII, do CDC. Em face do exposto, concedo a liminar requerida, a fim de que as suplicadas fiquem impedidas de emitir boletos com reajuste superior aos 11,75% (-) autorizados pela Agência Nacional de Saúde; ficam as requeridas, outrossim, com a obrigação de informar de modo amplo e inconfundível aos consumidores que, até decisão final na presente causa, o reajuste se limita ao percentual supra-indicado. Para caso de descumprimento desta decisão, fixo a multa diária de R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais), a ser revertida ao Fundo de Reparação de Interesses Difusos. Intimem-se para o imediato cumprimento. Citem-se as rés para que respondam, na quinzena legal, sob os efeitos da revelia. Faça-se a publicação antevista no art. 94 da Lei nº 8.078/90. Intimem-se os autores. Aracaju, 04 de agosto de 2004. José Pereira Neto Juiz da 4ª Vara Cível.