Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Imunologia 33ª Aula Teórica Imunodeficiências primárias: imunodeficiências T e combinadas É... apesar das mudanças do programa, cheira-me que a aula em causa seja esta... Sugiro que vão olhando para a ultima página à medida que forem lendo o texto... Vão perceber rapidamente porquê!!! Dr. André Moreira 15/03/07 Introdução Esta aula hoje, pretende fazer um bocadinho a ponte entre o que vos foi transmitido na semana passada e o que vos será transmitido amanha. A aula de amanhã vai ser muito mais interessante – vai estar cá o Prof. Taborda Barata da UBI – que vem apresentar aspectos clínicos das Imunodeficiências das quais nós hoje vamos tratar da parte mais aborrecida, os mecanismos imunológicos subjacentes a essas Imunodeficiências dando especial relevâncias às que designamos por SCID (Imunodeficiências Severas Combinadas). Combinadas porque apesar de afectarem apenas a célula T, como a célula B é necessária para activar a célula B, quando a célula B é afectada, isso tem repercussão na célula B. Retomando um bocadinho aquilo que vos foi apresentado na última aula, nós timos falado da agamaglobulinemia ligada ao X, do síndrome de Hiper IgM, e dissemos também que a ID mais comum é esta deficiência selectiva da IgA – 1:400/500 – e poderia clinicamente não ter importância nenhuma, ou podia apresentar alguns aspectos como maior incidência de doença atópica e de doença alérgica. Vimos também ID de sub-classes de IgG e que clinicamente poderia não haver grande tradução. Foi chamada atenção para esta Hipogamaglobulinemia transitória da infância que ocorria a partir dos 6, 7, 8 meses e que podia ir até aos 2 anos, mas que era caracterizada analiticamente por níveis de Ig abaixo do normal mas presentes. Digamos que se tivermos como valor de referência para a IgG 700-800; estas crianças vão ter 350-400, podem ter um aumento ligeiramente maior da incidência de infecções respiratórias mas é uma situação transitória e auto-limitada, que não é indicação para se fazer terapêutica com Ig de substituição. Agamaglobulinemia ligada ao X Este esquema (ver Fig. 2), ajuda-nos a perceber em que fase do desenvolvimento da célula B é que cada uma destas situações acontece. Numa primeira fase, dentro da medula óssea, em que passava de célula B Progenitora a célula B Percursora, havia um rearranjo dos segmentos de genes que codificavam a porção variável da cadeia pesada – arranjo VDJ – cujo objectivo era sintetizar as cadeias pesadas que eram expressas à superfície da célula com umas cadeias às quais chamamos pseudo-cadeias leves. Quando havia a expressão à superfície desta cadeia pesada com a pseudo-cadeia leve, nós chamamos-lhe um pré-receptor da célula B. Era o aparecimento deste pré-receptor B que marcava o estádio de célula B percursora e também dava o sinal para o núcleo para Fig. 1 1/10 parar o rearranjo das cadeias pesadas e começar a síntese das cadeias leves. (Fig. 1) Lembram-se que para a transdução desse sinal, era importante que uma Tirosina-Quinase, conhecida como Tirosina-Quinase de Bruton (Fig. 4 – D), e é esta que está deficiente na agamagblobulinemia ligada ao X. Temos aqui uma interrupção no desenvolvimento da célula B, o que faz com que fenotipicamente se procurarmos células B no sangue periférico destes indivíduos existam 0, e não existam consecutivamente Ig. A Fig. 2 – Resumo da Ontogenia B. A – Bloqueio na agamaglobulinemia ligada ao X É óbvio que também podemos ter uma interrupção se falharem os processos envolvidos no rearranjo dos próprios segmentos VDJ das cadeias pesadas e cadeias leves. Vimos que este era feito à custa de 2 enzimas, a RAG1 e a RAG2, aquelas enzimas de recombinação. Se estas enzimas falharem, é lógico que nós não vamos ter recombinação e a interrupção faz-se a este nível. E agora vocês podem lembrar-se que a RAG1 e RAG2 eram, não só importantes para o rearranjo das cadeias de Ig, mas também, na ontogenia da célula T. Eram as mesmas que estavam envolvidas na síntese de cadeias β e α do TCR. Assim, um defeito nestas enzimas traduz-se, não só em défice na ontogenia B, mas também na ontogenia T, e isto vai ser um dos exemplos que vamos ver hoje, a propósito das combinadas. Temos neste caso um modo de transmissão autossómico recessivo e na agamagblobulinemia de Bruton uma transmissão ligada ao X. Temos a nossa célula B com IgM ou IgD à superfície, sai da medula, vai para um gânglio (Fig. 2), recebe um sinal da célula T, é feita uma apresentação antigénica, começa a proliferar, começa a formar o centro germinativo, e acontecem essencialmente 2 fenómenos: 1. Maturação da afinidade – do que iria ser a Ig para aquele antigénio. À custa de mutações ao acaso nas regiões de complementaridade 2. Especificidade de função à Ig – Comutação Isotípica São estes os 2 fenómenos que ocorrem no centro Fig. 3 germinativo. Ora bem, podemos também ter uma interrupção a este nível. Lembrem-se que era essencial para que fosse definido o isotipo da Ig que a célula B recebesse o sinal da célula T e que esse sinal era feito à custa do ligando do CD40, o CD154. (Fig. 3) Portanto se houver alguma falha no CD40 não vai 2/10 haver comutação isotípica e aquela célula B só vai produzir IgM, não vai conseguir produzir nem IgG, nem IgA, nem IgE. Também é verdade que, o defeito não precisa de ser no CD40L ou no CD40, qualquer defeito que haja na via de transdução de sinal, que vai desde a superfície da célula até ao núcleo, potencia uma falha nesta mudança de isotipo. ID comum variável Outra situação é a ID comum variável, que clinicamente aparece no adulto, caracterizada por um aumento de infecções de bactérias capsuladas, mas tem uma grande diferença. Na fenotipagem de sangue periférico, vocês encontram células B. O que iam encontrar era muito menos quantidade de anticorpos, e de facto há um defeito na passagem da célula B madura em Plasmócito. Existe uma série de defeitos genéticos que podem estar subjacentes. Aquele que é o mais conhecido e o mais documentado é o defeito numa proteína induzida pelo contacto entre a célula B e a célula T. Apesar de sabermos muito pouco do que está por trás, há ali qualquer coisa que falha no sinal de activação para a diferenciação em plasmócito. A propósito da Imunodeficiência Comum Variável, a deficiência está na passagem de célula B madura para Plasmócito produtor de Ig, o que faz com que haja comutação isotípica, haja maturação da afinidade, mas tudo em muito pouca quantidade porque há muito poucos plasmócitos. O resultado é que o paciente não consegue produzir anticorpos suficientes face à exposição a um agente patogénico. Na última aula foi apresentado um caso de uma criança com agamaglobulinemia ligada ao X, mostro-vos uma fotografia de uma amigdalite e pergunto-vos se esta amigdalite pode, ou não, corresponder à amigdalite do caso da semana passada? Não pode! Qual é a justificação? Nós temos aqui as amígdalas com exsudado, as amígdalas são constituídas por células B, portanto, isto claramente não podia ser um caso de agamaglobulinemia ligada ao X por causa disso. Também tínhamos visto nos TAC’s e radiografias, broquiectasias, das quais a principal causa eram bactérias capsuladas. Tanto a IgG como a IgM conseguem fazer a opsonização. A opsonização com a IgG tem alguma vantagem directa, porque os macrófagos têm receptores à superfície que conseguem fazer logo a fagocitose. Mas a IgG activa mais o complemento do que a IgM. A IgM ao activar o complemento faz com que comece a haver na superfície do agente C3b e iC3b com receptor na célula fagocítica, facilitando a fagocitose. Qual é a outra ID que pode mimetizar este defeito? Se houver defeito no C3, a IgM que não tem receptores directos para ser fagocitada e que actua indirectamente pelo complemento vai dar origem a um tipo de situações clínicas em que as bactérias encapsuladas vão ter um papel preponderante. Síndrome Hiper IgM Olhando para o que se passa a propósito do Síndrome de Hiper IgM e das alterações que podemos encontrar na comutação isotípica e maturação da afinidade. Nós temos aqui a nossa célula T com o CD40L e a 1ª alteração descrita no síndrome de Hiper IgM é neste ligando. Qualquer defeito que aconteça, ou aqui, ou no CD40 na célula B, vai induzir, fenotipicamente, o mesmo tipo de alteração. E sabe-se também, que esta célula T não actua somente junto da célula B mas é capaz de induzir a activação de macrófagos, bastante importantes na prevenção de infecções oportunistas. Ou seja, alguém que tenha Síndrome de Hiper IgM por 3/10 defeito ou do CD40L ou do CD40 na célula B e Macrófago, vai apresentar, para além de infecções por bactérias capsuladas, infecções oportunistas. O que é fenotipicamente bastante diferente de alguém que possa ter um Síndrome de Hiper IgM mas que o defeito esteja apenas dentro da célula B e nas vias que conduzem o sinal de activação da superfície até À transcrição no núcleo. Enquanto que nos Síndrome de Hiper IgM tipo I e III, temos, para além de agamaglobulinemia, deficiência dos macrófagos com aumento da incidência de infecções oportunistas, no síndrome em que haja alteração dentro do mecanismos responsável pela alteração da afinidade e comutação isotipica, nós vamos ter agamaglobulinemia mas sem aumento de infecções oportunistas. Vamos agora saltar para dentro da célula B. E vocês vêem ali AICDA. Este AICDA é Activation-Induced Citidine Deaminase – Uma desaminase da citidina induzida pelo contacto da célula B com a célula T. Na porção constante do segmento variável, há duas enzimas que estão envolvidas nestas alterações de DNA. A tal Deaminase da Citidina – Remove a citosina e insere um uracilo - e a Uracilo NGlicosilase também envolvida no processo de comutação isotípica e maturação da afinidade. Os 2 defeitos que temos representados anteriormente podem ser a este nível, e a este nível é mais catastrófico porque faz com que não haja, nem comutação isotípica, nem maturação da afinidade, mas pode também ser a nível da Nglicosilase em que apesar de não haver comutação isotipica pode haver maturação da afinidade em alguma porção, mas de uma forma alterada. Quando falamos dos Síndromes de Hiper IgM, obviamente comum a todos eles é o aumento de IgM, ausência de comutação isotipica, ausência de IgA, IgG e IgE, uma quantidade de células B normal, ao contrário da agamaglobulinemia ligada ao X. 2/3 são causados por mutações no CD40L e o terço restante por mutações no CD40 ou nestas 2 enzimas. Também perceberam já porque é que há um aumento de infecções por agente oportunistas, o que tem a ver com o defeito que existe no sinal dado aos macrófagos. Estas infecções já não acontecem nos defeitos das duas enzimas. Percebe-se também que o GCSF que é produzido pelos macrófagos em resposta à estimulação pelo CD40 esteja diminuído o que faz com que nestes doentes haja uma neutropenia e um aumento da incidência de carcinomas hepáticos, que tem a ver com a ausência do CD40. Resumidamente, quando é feita a apresentação por uma célula dendritica de um antigénio carcinoembrionário a uma célula CD4+, se essa CD4+ não der um 2ª sinal via CD40 à célula dendritica, vai fazer com que esta célula dendritica nunca fique funcionalmente capaz de dar um sinal a uma célula CD8 para exercer a actividade citotóxica, e portanto, este é conceptualmente o mecanismo que tenta explicar porque é que há uma incidência aumentada de carcinomas hepáticos. No Síndrome de Hiper IgM por defeito do CD40L ou do CD40, há muita IgM, não existe IgG nem IgA, pode ocorrer maturação da afinidade, mutação mas em níveis muito baixos. (Tipo I e Tipo III) Se tivermos um defeito da desaminase da citidina o que se passa é que não há mutação nem há comutação isotípica. Por defeito do Uracil N-Glicosilase não há comutação isotípica, pode haver uma mutação enviesada. (Tipo II e V) Aqui observam que este síndrome de hiper IgM apresenta um vasto espectro que vai desde uma alteração total, em que não existe maturação da afinidade nem 4/10 comutação isotípica, só vamos ter grandes quantidades de IgM, até alterações em que é possível ter a comutação isotípica mas em pequeninas quantidades. Quanto ao tratamento, já vos foi falado da administração de Ig’s intravenosas e subcutâneas Resumindo: 1. Tipo 1 – Mutação do CD40L – Células T não conseguem induzir a alteração de produção de classes de Ig nas B (Fig. 4 – E) 2. Tipo 2 – Mutação do AICDA – Células B não conseguem recombinar o material genético, ausência de comutação isotipica 3. Tipo 3 – Mutação do CD40 – Células B não conseguem receber o sinal das T para mudar de classes de Ig 4. Tipo 4 – Difícil caracterização 5. Tipo 5 – Mutação da Uracilo N-Glicosilase. Semelhante ao tipo 2, apenas descrita em 3 pessoas (França e Japão). Ausência de comutação isotípica. Terminamos aqui os aspectos imuno-patogénicos que nós tínhamos visto aqui na ultima aula, entramos assim naquilo que vai ser o tópico amanha, da aula do Professor Taborda Barata e em que vamos tentar resumir as alterações imunológicas subjacentes aos quadros clínicos. A Fig. 4 B D E A, B, C Defeitos que podem levar à SCID. D, E, F – Outros defeitos C F SCID Vou começar por vos contar uma estória, que é a desta fotografia do David Vetter. David Vetter nasceu em 1971 e faleceu em 1984. Os pais dele tinham tido uma criança do sexo masculino que tinha morrido ao fim de 3 ou 4 meses. Teve uma irmã, que viveu sem problema rigorosamente nenhum. Os pais, que tinham muita vontade de ter um filho do sexo masculino, pediram aconselhamento. Viviam no Texas, e aquilo que lhes foi dito era que tinham uma 5/10 probabilidade de 50% de vir a ter um rapaz – e na altura não se conhecia a Imunodeficiência Severa Combinada (SCID) – e se tivessem um rapaz ele podia nascer “sem sistema imune”. Os pais mesmo assim decidiram arriscar. Na altura aquilo que foi combinado era que se isso acontecesse iriam fazer um transplante de medula da irmã. O nascimento foi preparado – e vocês já devem ter ouvido falar porque na televisão passaram uma série de filmes e séries sobre o rapaz bolha – e construído um casulo para que quando nascesse ele fosse colocado dentro do casulo, e de facto mal nasceu, só esteve 20 segundos fora deste ambiente, foi logo colocado num casulo completamente estéril. O problema que houve foi o facto do HLA da irmã ser bastante diferente do dele e não haver compatibilidade para transplante de medula. O que foi decidido, foi iniciar um projecto de investigação para tentar encontrar uma solução para o problema. Entretanto os anos foram passando, e o David foi crescendo, crescendo sempre dentro de uma bolha, sem qualquer contacto humano e sempre sem vir ao mundo exterior. Apesar do marketing e de todas as imagens referirem que ele teve um desenvolvimento psicológico normal, houve um conjunto de alterações psicológicas e de comportamento que ele teve e a NASA investiu e desenvolveu um fato, que era igual ao fato dos astronautas, que lhe permitiria caminhar e andar fora da bolha. Inicialmente recusou o fato, mas lá acabou por o aceitar, e foi uma primeira tentativa de lhe dar alguma interacção com o mundo externo. A situação começou a ficar um pouco intolerável quando se percebeu que não era possível ter fundos e desenvolver uma solução para o problema e foi proposto aos pais tirar o David do casulo e oferecer-lhe tratamento com antibiótico e Ig endovenosa. Os pais não aceitaram, mas chegou-se a um ponto em 1983 em que se tornou impossível que ele continuasse a viver isolado e fechado. Aquilo que foi feito foi um transplante de medula da irmã. O transplante correu mal, houve também passagem de vírus de Epstein-Barr para o David que, como estava imunodeprimido, acabou por falecer com uma data de neoplasias. Ele acabou por ser retirado do casulo, e de viver assim fora, durante um período de tempo muito curto, cerca de 2 semanas. Aquilo que se passava essencialmente era uma diminuição enorme da quantidade de células T e ausência total de resposta proliferativa à estimulação com mitogéneos específicos para a célula T – a fitohematoglutinina. E de facto, aquilo que o David tinha era aquilo que nós consideramos mais comum nas alterações da SCID que é transmissão ligada ao X e tem a ver com um defeito – lembram-se de nós termos falado da IL-2 e do receptor da IL-2 que representava uma cadeia γ comum (Fig. 4 – A), chamada assim porque era comum ao receptor da IL-2, 4, 7, 9, e 15? – ele tinha um defeito aí. E se alguém não consegue que a IL2 não funcione não há nenhum linfócito que prolifere. Em relação à SCID, apresenta um espectro fenotipico com uma data de alterações possíveis. Caracteristicamente começam muito cedo, apesar de haver Ig da mãe até aos 4, 5, 6 meses, as infecções começam antes, por agente oportunistas, por vírus. As consequências são bastante graves, sépsis e meningite, e portanto se não houver um diagnóstico são crianças que vão falecer antes do 1º ano de vida. Se viverem mais tempo têm atrasos de crescimento, má absorção (por colonização), diarreia crónica, ausência de resposta celular T, ausência de resposta humoral, e se não houver restituição do sistema imune por transplante de medula ou terapia génica é fatal. 6/10 Em relação aos genótipos possíveis, uma forma de classificar as SCIDs é relativamente à presença/ausência de células B, células T e células NK. Na ausência de B, presença de T, a mais comum de todas é aquela ligada ao X, e estamos a falar do caso do David Vetter e que representa 50%. É aquela do gene da cadeia γ comum. A propósito do IL-2, IL-4, etc, havia uma via de transdução em que havia uma Quinase, que era a Janus Quinase (JAK-3) (Fig. 4 – B) responsável pela transdução de sinal entre o receptor e o núcleo. Uma alteração desta via também pode levar à mesma apresentação clínica. São 2 situações fenotipicamente iguais mas com mutações diferentes. Lembram-se de na ontogenia termos falado da importância da IL-7 para a proliferação dos percursores dos linfócitos maduros. Falamos isso quer para as células B quer para as células T e também faz todo o sentido que qualquer defeito ou na IL-7 ou no receptor da IL-7 ou na via de transdução de sinal possa dar uma SCID. E depois se não tivermos as recombinases, naquela fase dos rearranjos genéticos quer das IG quer das cadeias α e β do TCR, não temos nem células B, nem células T. E finalmente este defeito da Adenosina Deaminase, enzima envolvida no catabolismo das purinas e que fazia a remoção das purinas, tóxicas para as células. Em todas as células, excepto linfócitos e NK, existe a 5’-nucleotidase que é capaz de fazer essa remoção. Como nos linfócitos não existe a 5’-nucleotidase, qualquer defeito na ADA, vai fazer com que se acumulem radicais tóxicos e que a célula não sobreviva. Sumarizando: • Defeito na cadeia γ comum - 50% dos casos - SCID ligada ao X • Defeito na JAK-3 – 10% dos casos – semelhante ao defeito na cadeia α do receptor da IL-7 • Defeitos na ADA (ou PNP) – 14% • Defeito nas RAG – Recombinação VDJ É um universo muito grande e há um grande conjunto de alterações que estão a ser descritas. Mesmo assim existe 1/5 de casos descritos de SCID em que não se sabe a alteração que está na base. A deficiência da ADA, como disse à bocado, está envolvida na deaminação da adenosina, está implicada na remoção de produtos tóxicos para as células. A 1ª causa genética das SCID a ser descoberta foi em 1982, o gene foi clonado em 1983, a terapia génica foi em 1990 e o tratamento eficaz numa SCID sem ser o transplante de medula também em 1990. A propósito, só um caso da descrição dos defeitos de RAG-1 e de RAG-2 (Fig. 4 – C) que afectam tanto a ontogenia B como a T e que atingem 1 em 50.000 individuos. A única opção terapêutica de momento é o transplante de medula. Síndrome de Ommen. É sempre muito difícil, nós conseguirmos arranjar uma classificação estrita e portanto vocês vão encontrar na literatura uma série de classificações a propósito das ID T e combinadas, porque é muito difícil nós falarmos só em defeitos das células T porque elas afectam sempre as células B. À bocado estivemos a falar do Síndrome de Hiper IgM, apesar de colocarmos aquilo dentro das células B, aquilo pode ser um defeito apenas da célula T. 7/10 Síndrome de DiGeorge Em relação ao Síndrome de DiGeorge, lembram-se de onde vem o Timo? De que arcos branquiais? Vem do 3º e 4º. E juntamente com o Timo, lembram-se o que também vinha dos 3º e 4º arcos branquiais? As paratiroides. Aquilo que distingue esta ID das outras é que é diagnosticada nas primeiras 24 horas de vida, porque uma das formas de apresentação é uma hipocalcemia refractária ao tratamento. É uma criança que nasce com uma hipocalcemia grave, a administração de cálcio não resolve, e depois é feito um Raio-X pulmonar e vê-se que não aparece sombra tímica nenhuma. Parece o Raio-X de um adulto, com a involução do Timo. É uma ID relativamente fácil de diagnosticar. É também chamada de Síndrome CATCH-22, para sublinhar as alterações: • Cardiac defects - alterações cardíacas - presença de ducto arterial, alteração do ducto arterio-venoso • Abnormal facies - há caracteristicamente um facias, apresenta um aumento da distância entre os olhos, um hiper-telorismo, orelhas de linha de implantação baixa, boca com forma de peixe e presença de epicanto • Timic hipoplasia - ausência de células T • Cleft palate - Fenda palatina • Hipocalcemia O defeito é uma microdelecção no cromossoma 22. Neste momento é quase ofender a vossa inteligência estar-vos a dizer porque é que não haver timo aumenta a susceptibilidade a infecções por agentes intracelulares. Os mecanismos são óbvios, desde a perda de citotoxicidade celular, à perda de respostas humorais dependentes de células TH. O diagnóstico é fácil se fizermos o Raio-X. Há aquela suspeita de hipocalcemia e o Raio-X pulmonar, caracteristicamente não apresenta timo. O ecocardiograma permite-nos ver as alterações cardíacas, e podemos fazer uma fenotipagem de linfócitos para confirmar aquilo que já tínhamos uma suspeita. O tratamento. Transplante de medula, transplante de timo total e factores de crescimento tímico. Candidíase muco-cutânea crónica A Candidíase muco-cutânea crónica, da qual não vos conseguimos transmitir a alteração genética subjacente, tem uma apresentação clínica tanto em crianças como adultos. Apresentam infecções por Candida e ausência de resposta celular à estimulação por Candida. Existe de facto uma ID específica para a C. albicans o que dá onicomicoses, eczemas e candidiases das mucosas e da pele, mas não está descrito um defeito específico que nos permita dar um diagnóstico pré-natal e descrever a patogenia da doença. Síndrome do linfócito nu Há outras situações, como a deficiência do MHC (Fig. 4 – F), que não tem a ver com defeitos nos genes que codificam o MHC, mas sim com os genes que regulam a transcrição do MHC. Podemos ter ausência de expressão de MHC classe I ou de MHC classe II, com as características que facilmente se imaginam, sendo também situações fatais. O tratamento de 1ª linha e único eficaz é o transplante de medula óssea. Quanto mais precocemente for feito, maior é a probabilidade de sucesso. 8/10 Síndrome de Wiskott-Aldrich (WAS) e Ataxia-telangiectasia Aquilo que os distingue dos outros, nomeadamente no WAS, é que, provavelmente há vários defeitos. Há, sem sombra de dúvida um defeito numa proteína responsável pelo citoesqueleto – CD43. Isso explica porque é que existe trombocitopenia e uma incidência aumentada de hemorragias e coagulopatia. Não explica porque é que existe eczema. Mas há também um defeito do CD23. Lembram-se de termos falado nele na aula de Hipersensibilidades a propósito dos receptores para a IgE, do receptor de alta afinidade e do receptor de baixa afinidade e falamos do CD23 como sendo um mecanismo de feed-back para a síntese de IgE. Isto pode ser o mecanismo que explica porque é que estes doentes têm IgE aumentadas. A Ataxia telangiectasia, clinicamente, é o que o nome diz. Há uma ataxia porque há uma destruição da estrutura do cerebelo – perturbação da marcha – numa criança já com 9-10 anos. Apresenta aranhas vasculares e o defeito é à custa de uma Quinase de Serina que detecta estragos no DNA e é responsável por interromper o ciclo celular e dar um sinal à célula para entrar em apoptose. Se isso não acontecer há continuação e há então proliferação de células defeituosas. Terapia génica Os últimos 2 slides para vos falar da terapia genica. Isto é um resumozinho de uma publicação no New England1 por um grupo francês a propósito de 5 rapazes que quiseram prosseguir terapia genica. Fez-se a remoção de Stem-Cells, a introdução do gene que estava deficiente neles, que é o gene da cadeia γ do receptor IL-2. Essa inserção no genoma é feita por um retrovirus e depois é feita a reinclusão dessa stem-cell nos rapazes. Dos 5 rapazes, 4 anos após estavam todos bem excepto 2. Vida normal, células T e B normais, respostas às vacinas normais, tinham parado as Ig endovenosas. Em 2 deles desenvolveu-se um clone anormal de células T porque o vector tinha inserido no local errado, em 2 leucemia linfoblástica aguda que foi tratada. 5 casos e em 2004 mais 4 casos, exactamente com o mesmo tipo de tratamento. É... acho que acabou... Queriam mais? Porra! Que raio de aula mais intricada... É verdade... quando uma pessoa não percebe nada de Imuno e se mete a desgravar uma aula das do meio do ano, isto não resulta muito bem... Mas pronto... Até me parece que fiquei a perceber isto... O professor divagou um bocado na estrutura da aula... Ora falava de SCID ora voltava ao Hiper IgM ora se lembrava e falava da agamaglobulinemia do XPTO... portanto eu tentei agrupar ao máximo possível as doenças para facilitar a leitura... Espero que tenha resultado... E vocês nem imaginam o projecto que é escrever agamaglobulinemia... Ora repitam... agamaglobulinemia, agamaglobulinemia, agamaglobulinemia, agamaglobulinemia... bonito, hein?! Pois... Fico-me por aqui!!! Marcelo Sousa, da grande, mítica e poderosa turma 3! O tipo que escreve tudo a Trebuchet MS! “I Explode Out And The Peace Is No More Bathed In New Light” 1 N Engl J Med. 2002 Apr 18;346(16):1185-93 Sustained correction of X-linked severe combined immunodeficiency by ex vivo gene therapy. 9/10 Anexo: (é... isto já é aula com anexo, já é tudo... diz que esta gente é um espectáculo) Defeitos congénitos que prejudicam o funcionamento do sistema imune e que resultam em diversas ID. • Laranja – deficiências fagocíticas. • Verdes – deficiências humorais. • Vermelhos – deficiências mediadas por células. • Roxo – ID combinadas. Kuby Immunology 5th Edition – É verdade... É daqui que vem esta e as outras imagens… 10/10