Federação Nacional dos Professores www.fenprof.pt Onde estão as 4500 escolas que o Governo quer fechar até 2010? O Ministério da Educação (ME) tem como meta o encerramento, até 2010, de 4500 escolas do 1.º ciclo com alunos "insuficientes", falta de condições e insucesso escolar. Ora, não chegam aos três mil os estabelecimentos com menos de 20 alunos. Quais são os restantes? Os jardins-de-infância. Mas terão de ser todos os menos frequentados se se quiser atingir a meta anunciada. Uma meta que nem os próprios municípios entendem. Previsões redondas O número sempre foi anunciado redondo e o ME entende mantê-lo redondo até ao dia em que um portão de escola seja fechado para todo o sempre e possa sem probabilidade de erro entrar para as estatísticas. O problema está no facto de o número redondo não corresponder, nem de longe, à definição anunciada, quando o secretário de Estado da Educação, Valter Lemos, pela primeira vez a lançou para a praça pública, em Setembro do ano passado. Não há 4500 escolas do 1º ciclo do Ensino Básico em Portugal albergando menos de 20 alunos e, portanto, candidatas ao encerramento até 2010. Estas são, segundo as estatísticas de 2005/2006 do próprio ME, 2880. Para chegar perto das imensas 4500, há que juntar-lhe 1289 jardins de infância, e ainda assim, a soma fica-se pelas 4169. A ajuda desinteressada de outros níveis de ensino (incluindo profissional) atira o número final para 4269 estabelecimentos frequentados por menos de 20 crianças e jovens portugueses no ano lectivo que agora finda. Confrontado com a incongruência dos números, fonte do ME insistiu no carácter redondo dos algarismos e incluiu efectivamente os jardins-de-infância na soma do abate. "Os jardins-de-infância entram neste cômputo porque a cobertura do pré-escolar é uma prioridade estratégica que, para se concretizar, tem de estar na primeira linha". Ou seja, não pode ser deixado de fora da reordenação da rede. Mas sempre com a garantia de que a decisão compete aos municípios e nunca ao Ministério. A redução do parque escolar do 1.º ciclo deverá ser ditada pelas cartas educativas que todos os municípios portugueses têm vindo a preparar "há vários anos", adianta a mesma fonte. E o "forte impulso dado pelas actuais prioridades do ME" terá ajudado a que esses documentos possam estar "prontos em breve". "É o conjunto dessas cartas educativas que dirá a todas as entidades interessadas, incluindo o ME, quantas escolas do 1º ciclo serão consideradas apropriadas, sempre escolas com mais de 20 alunos. E a nossa estimativa global é de que serão necessárias cerca de 2500. Como há mais de sete mil, incluindo jardins de infância, resultará que a fechar serão 4000 a 4500", calcula a fonte ministerial. Cartas sem estimativa "Há 174 cartas educativas concluídas ou em fase de conclusão, portanto, não pode ser a partir delas que se tira esse número", garantiu contudo ao JN o vice-presidente da Associação Nacional de Municípios (ANMP), António José Ganhão. "O número não é consequência delas, mas deveria ser, porque, enquanto instrumento de planeamento para o futuro, são elas que devem objectivar o reordenamento escolar". Assegura o também autarca de Benavente que os 4500 estabelecimentos a encerrar foram inventariados pelo ME sem qualquer indicação da ANMP e não correspondem às escolas com menos de 20 alunos e insucesso escolar. Nem juntando-lhes os jardins-de-infância pouco frequentados. "Serão poucos os casos, porque, para funcionarem, os jardins-de-infância têm que ter um mínimo de 15 alunos. Onde não os houver, o ME não coloca educador". As previsões do ME, adianta António José Ganhão, "terão mais que ver com programação de rede escolar e colocação de professores". Segundo o "Recenseamento Escolar Anual 2005/2006" do Gabinete de Informação e Avaliação do Sistema Educativo do ME, existem em Portugal 3118 jardins-de-infância, 6088 escolas básicas do 1.º ciclo, 1261 juntando infantário e primária e ainda 88 escolas básicas integradas, 36 das quais com jardim de infância. O que perfaz efectivamente 7437 escolas com 1º ciclo, o número apontado pelo Ministério. Mas deixa de fora os mais de três mil jardins-de-infância isolados. Ora, destes, há 1289 com menos de 20 crianças, dos quais 878 sem os 15 exigíveis pela lei. Portanto, se apenas encerrarem até 2010 as escolas de 1º ciclo com menos de 20 alunos e com ou sem infantário, estamos a falar de um universo de 2880 estabelecimentos (31 com infantário) e não 4500. À espera da Europa As contas continuam inextricáveis, mas são pouco valorizadas pelo Executivo. "Mas não vá criar -se a ideia de que vamos começar a encerrar agora com a mesma prioridade os jardins-de-infância", faz questão de alertar o mesmo interlocutor, insistindo que esse reordenamento só se completará com ajudas europeias no âmbito do futuro Quadro de Referência Estratégica Nacional 2007-2013. E a "alocação de recursos para recuperação ou construção de estabelecimentos que funcionarão como centros escolares não podia deixar de fora os jardins-de- infância". As cartas educativas têm de facto em conta o pré-escolar, "tal como têm os 1.º, 2.º e 3.º ciclos e até o Secundário, que depende do ME mas cuja organização pode ser negociada", diz o vice-presidente da ANMP. Mas não está escrito que os centros escolares que agregarão alunos de escolas encerradas integrem sempre os jardins de infância. "Poderão", ou não. Primárias a abater este ano ainda sem cálculo definitivo Atraso das cartas atribuído a incumprimento do Ministério Redondo continua também o número das cerca de 1500 escolas que já não devem passar deste Verão. O Ministério garante que só terá um dado definitivo de primárias a encerrar em Setembro, isto é, quando o próximo ano lectivo arrancar e elas já estiverem fechadas. O trabalho está entregue aos municípios, que já receberam "quase todo o financiamento previsto" para o processo de reordenamento deste ano, os 2,4 milhões de euros destinados a obras de melhoramento de escolas e equipamento, assegura fonte ministerial. E outras receberam já "parte das verbas das refeições adiantadas", cujo total era de 13 milhões de euros. "Podem as obras atrasar-se e pode até a transferência de alunos para as escolas acolhedoras ser feita posteriormente, no final do primeiro trimestre, por exemplo", justifica a fonte do ME para explicar a falta de um dado certo. Informação que a Associação de Municípios confirma, apontando a garantia da ministra em como colocaria professores nas escolas dadas como a encerrar caso "as condições de transferência não estejam reunidas em Agosto". Diz António José Ganhão que a solução decorre, de resto, do protocolado com a associação de autarcas no âmbito deste reordenamento. Os encerramentos só ocorrem "quando haja acordo do município e este seja ressarcido pelos custos". Para os 1500 deste ano e para os que se avistam no horizonte de 2010. "É a única coisa que está negociada com a ANMP", garante. A responsabilidade pelo atraso das cartas educativas de cada concelho é, em parte, atirada para o Ministério da Educação. Apenas 174 estão prontas ou em vias de o estar, ou seja pouco mais de metade. "Este processo já poderia estar concluído se o Ministério cumprisse o acordado e comparticipasse em 50% a sua elaboração", alerta o vicepresidente da ANMP e autarca de Benavente, cuja carta educativa custou 20 mil euros. "Mas foi feita em economia de escala, um mesmo grupo subcontratado elaborou os documentos para 11 municípios agregados em associação, o que até facilita o diálogo com o ME". Mas outras, feitas isoladamente, deverão ter ficado bem mais caras. E há, garante António José Ganhão, municípios que dizem que não concluem o processo enquanto o Ministério não cumprir com a sua parte. "Portanto, não há prazos para encerrar o processo". O desejável seria estarem todas as cartas concluídas em Julho, para o Ministério poder melhor negociar verbas do último quadro comunitário de apoio em que o país vai entrar. Sem os documentos, resta à ministra, diz a ANMP, "fazer uma simulação a partir do que já tem". JN, 18/06/2006