Caso Clínico Dificuldades de interpretação dos testes hormonais em uma paciente com macroadenoma pituitário e insuficiência renal crônica Francisco Bandeira, MD, Phd, FACE Coordenador Apresentação: Paula de Aragão Prazeres Discussão: Leyna Leite UED-HAM Fevereiro/2011 Macroadenoma Hipofisário Anamnese •ID: M.L.S, feminina, 65 anos, parda, natural e procedente de RecifePE •Q.P.D: Investigação de macroadenoma hipofisário diagnosticado em 2010 •HDA : 2009 - Desorientação, agitação e comportamento compulsivoagressivo RMN - formação expansiva em sela túrcica Endocrinologia para avaliação diagnóstica ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Anamnese •IS -geral: anorexia, astenia -pele: NDN -olhos: déficit visual -ORL-NDN -TGI: disfagia discreta para sólidos -AR: tosse pouco produtiva há 15 dias, nega dispnéia -ACV: dor precordial intermitente -AGU: NDN -Mamas: sem galactorréia -ME: fraqueza muscular em MMII, dificuldade para deambular e subir escadas -Nega equimoses e estrias violáceas ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Anamnese • AP: - HAS + (desde os 25 anos) - DM2 + (há 15 anos) - DLP + - Coronariopata( IAM e CRM 2007) / FA - IRC - HTA + aos 45 anos - G8 P5 A3- Menopausa aos 42anos - Nega história de osteoporose e fraturas Nega tabagismo/etilismo/hepatite ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Anamnese • Drogas em uso: 1) Hidralazina 100mg 6/6hs 7) Sinvastatina 40mg/dia 2) Atenolol 50mg 8) Insulina NPH 30/22U 3) Atensina 0,100mg 8/8hs 9) Insulina Regular 12/6/8U 4) Anlodipina 10mg 10) Rivotril 0,5mg/dia 5) Aldactone 25mg 11) Sertralina 50mg/dia 6) 12) Heparina NF 0,25ml 8/8hs Isordil 10mg 3x/d ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Exame Físico • peso= 68,5Kg altura: 1,41cm IMC=34,45 CA=103cm EGB, hipocorada(+1/+4), afebril, eupnéica, hidratada, acianótica, aictérica, consciente e orientada ACV: RCI bulhas hipofonéticas FC: 60bpm PA: 130X80mmHg AR: MV+ em HTE s/RA ABD: globoso, depressível , presença de estrias <1cm não violáceas, indolor, RHA+ Tireóide: não palpável e ausência de linfonodomegalias Gibosidade + Discreta Pletora Facial Paquimetria= 02mm ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Exames complementares • Pré-internamento: -Laboratorial: Cortisol(17/08/10) 8hs= 24Ug/dl (basal) (VR= 5 a 25Ug/dl) 16hs=19Ug/dl (VR= 5 a 13Ug/dl) IGF-1(14/08/10)= 371 ng/ml (VR- 61 a 65 anos= 75 a 212) GH basal= 0.94ng/ml ACTH(25/06/10)= 147 pg/ml (VR=5 a 46pg/ml) ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Exames complementares • Pré-internamento: Prolactina(06/12/10)= 7.0 ng/ml (VR=4.79 - 23.3) TSH(06/12/10)= 0.99uUI/ml (VR= 0.27 - 4.2) T4l(06/12/10)= 1,2ng/100ml (VR=0.6 - 1.54ng/100ml) HbA1C(06/12/10)= 7.3% (VR=4.0 a 6.5%) ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Exames complementares • Pré-internamento: Campimetria ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Exames complementares • Coronariografia(17/11/10): 1. DA ocluída no 1/3 médio 2. Cx com lesão moderada no 1/3 médio 3. Ramo DP com lesão severa no 1/3 proximal 4. MIE-DA pérvia, sem lesões • Ecocardiograma (nov/2010): FE: 70% Aumento de AE MVE+ ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Exames complementares • RNM(25/04/10): Formação expansiva de 2,4 x 2,2x 2,0 cm em sela túrcica, que se estende para a cisterna supra-selar e ocasiona efeitos compressivos sobre o quiasma óptico, pricipalmente sobre o nervo óptico á esquerda. Lateralmente, não foram observados planos de clivagem com os seios cavernosos. Contudo, as artérias carótidas apresentam calibre preservado. A lesão apresenta degeneração cística e hemorrágica. ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Exames complementares • Internamento: 24/01/11 Gli= 196 HbA1C=8.5% Ur= 138.3 Cr= 2.6 Hb= 11.9 Leuco= 14.150 Ca= 8.6 K= 4.0 CT=196 LDL= 85 TG= 376 HDL=36 FA= 72 GGT= 62 -Proteinúria de 24hs= 2,69g/dia ClCr=15ml/min MDRD: 21 ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Exames complementares • Internamento: (21/01/11) TSH= 1.57ulU/ml T4L=1.57ng/dl (VR= 0.4 - 4.0) (VR= 0.90- 1.80) (28/01/11) Cortisol salivar(0h)= 5.11nmol/L (VR= 2.7 nmol/L) Cortisol sérico (0h)= 16.2ug/dl (VR= 2,5 – 12,5ug/dl) (26/01/11) Estradiol= 30.1pg/ml LH=0.111mlU/ml FSH=0.678mIU/mL ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Exames complementares • Internamento -Holter(08/02/11) 1. Ritmo Sinusal com condução AV 1: 1 e frequencia que variou entre 43 e 78bpm com média de 53bpm 2. Foram observadas 9214 extra-sístoles supraventriculares, isoladas, bigeminadas, acopladas 3. Extra-sístoles ventriculares monomórficas, isoladas, raras 4. Ausência de pausas significativas ou BAV 5. Não houve relato de sintomas ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Exames complementares • Internamento: RNM(28/01/11) Lesão expansiva sólida de contornos lobulados e localização intra e supra-selar apresentando realce heterogêneo pelo meio de contraste IV. Esta lesão exerce efeito compressivo sobre o quiasma óptico que se encontra deslocado súpero-anteriormente. Também apresenta íntima relação com assoalho do terceiro ventrículo e aa. cerebrais posteriores predominando à esquerda sem evidência de repercussão significativa sobre esses vasos. Lesão tem íntima relação com lobo frontal basal e artéria cerebral anterior; ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Hipóteses Diagnósticas 1)Macroadenoma hipofisário com compressão de quiasma óptico - Produtor ACTH?GH? - Não Funcionante? 2)Hipogonadismo Hipogonadotrófico sec à P1 3)HAS 4)DM2 5)DLP mista 6)Síndrome Metabólica 7)IRC em tratamento conservador 8)DAC 9)FA intermitente ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário DISCUSSÃO ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Discussão Estamos diante de um caso de uma mulher, portadora de várias comorbidades, com uma massa selar a esclarecer. Dentres as diversas causas, tais como lesões vasculares, tumorais, císticas, infecciosas e inflamatórias, destaca-se o adenoma hipofisário, como a mais comum. A definição etiológica é importante, pois a partir dela é que será definido o tratamento. Entretanto, em alguns casos, o diagnóstico pode ser difícil, só podendo ser realizado através do estudo da peça, com análise anatomopatológica e imunohistoquímica. Neste caso, a massa selar é um macroadenoma hipofisário, por ser uma lesão maior que 1 cm (2,4 x 2,2 x 2cm). É preciso determinar se ela apresenta hipersecreção hormonal (adenoma funcionante) ou não (adenoma não-funcionante). O quadro clínico mostra manifestações secundárias ao efeito de massa – déficit visual e hipogonadismo, porém sem estigmas clássicos de qualquer excesso hormonal. A campimetria e a RNM comprovam o efeito invasivo tumoral, com o comprometimento do quiasma. ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Discussão Dentre os tumores funcionante, podem ser levantadas as hipóteses de prolactinoma, somatropinoma e Doença de Cushing. O prolactinoma é considerado o tumor hipofisário mais comum. A paciente apresenta condições potencialmente responsáveis pelo aumento dos níveis de prolactina, como o uso de atenolol e a insuficiência renal, que deveriam ser excluídas na suspeita de tumor produtor deste hormônio. Na avaliação laboaratorial, duas dosagens em momentos distintos, mostraram níveis de prolactina normais, afastando assim o prolactinoma como causa da doença. ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Discussão No contexto da Acromegalia, apesar de não ter alterações clássicas do excesso de GH, a paciente apresenta um quadro clínico compatível, com manifestações resultantes da compressão e das complicações (HAS, arritimia, DM e dislipidemia). No rastreio bioquímico, estão elevados os níveis de GH basal e de IFG-I. Não foi realizada doseagem de GH pós-OGTT devido aos riscos relativos à sobrecarga de glicose em uma portadora de Diabetes. Contudo, é importante ter cautela na interpretação diagnóstica, uma vez que o DM descompensado e a insuficiência renal podem levar ao falso positivo. A cirurgia é o tratamento de escolha, e neste caso tem indicação absoluta, devido ao déficit visual. Todavia, a paciente teve risco cirúrgico elevado e também não deseja ser submetida à cirurgia. Assim, o tratamento medicamentoso é a opção, sendo o análogo da somatostatina (octreotide) a primeira escolha. Há restrição ao uso dos agonistas dopaminérgicos derivados do ergot (cabergolina e bromocriptina), pois a paciente apresenta estenoses importantes do leito coronário, e estes medicamentos podem levar a espasmos coronarianos. A quinagolida, não derivada do ergot, não está disponível no Brasil. O inconveniente do antagonista do receptor de GH (pegvisomant) é não levar à redução do adenoma, com o risco até de aumento do mesmo. ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Discussão A Doença de Cushing na sua maioria é causada por um microadenoma. Dentre os aspectos clínicos, a paciente é obesa e com gibosidade e pletora facial, além de diabetes, dislipidemia e sintomas provavelmente psiquiátricos. Os exames trazidos pela paciente revelevam um cortisol basal normal e um cortisol no final da tarde e ACTH elevados. Durante internamento, o hipercortisolismo foi confirmado com as dosagens do cortisol sérico e salivar tarde da noite. Entretanto, da mesma forma, essas dosagens hormonais podem sofrer interferência do DM descompensado e da insuficiência renal. Na impossibilidade de realização de um procedimento cirúrgico, resta oferecer a paciente um tratamento clínico, mas sabendo que os análogos da somatostatina são pouco eficazes e que os agonistas dopaminérgicos ainda não têm papel totalmente definido na Doença de Cushing. ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Discussão O adenoma não-funcionante é a principal causa de macroadenoma hipofisário e suas manifestações são relacionadas à compressão tumoral sobre estruturas vizinhas. Neste caso, a causa poderia ser um adenoma não funcionante, apenas se os excessos hormonais demonstrados laboratorialmente forem secundários ao DM descompensando e à insuficiência renal. A abordagem terepêutica tem a cirurgia como sua principal escolha. Em segunda linha, dispõe-se de tratamento clínico, uma vez que já foram demonstrados receptores dopaminérgicos e somatostatínicos nestes tipos de tumores, etretanto a taxa de sucesso é limitada. Neste caso, a avaliação clínica e laboratorial realizada não permite a conclusão diagnóstica. Isto só seria possível com a análise imunohistoquímica do tumor, para definir se as hipersecreções encontradas são reais ou apenas secundárias às comorbidades apresentadas pela paciente. Independente da causa, a cirurgia tem indicação absoluta devido à compressão do quiasma. A limitação do risco cirúrgico e o não desejo da paciente pela cirurgia deixam o tratamento clínico como única opção, com agonista dopaminérgico ou análogo da somatostatina, desde que se tenha muita atenção ao risco de precipitação de angina pectoris. É fundamental o escalrecimento do caso para a paciente, salientando a possibilidade de uma resposta clínica frusta e do risco de maiores perdas no campo visual e também de apoplexia hipofisária. ________________________________________________________________________________________________________________________ Macroadenoma Hipofisário Referências 1) Klibanski A, et al. The endocrine tumor summit 2008: appraising therapeutic approaches for acromegaly and carcinoid syndrome.Pituitary, 2009; 13(3):266-86. 2) Giustina A, et al. A Consensus on Criteria for Cure of Acromegaly. J Clin Endocrinol Metab, 2010; 95: 3141–48. 3) Gueorguiev M, Grossman A. Acromegalia. In: Bandeira F, Graf H, Griz L, Faria M, Lazaretti-Castro M, editors. Endocrinologia Básica e Diabetes. 2nd Ed. Rio de Janeiro: Medbook Editora, 2009. 4) Newell-Price J, Trainer PJ. Síndrome de Cushing. In: Bandeira F, Graf H, Griz L, Faria M, Lazaretti-Castro M, editors. Endocrinologia Básica e Diabetes. 2nd Ed. Rio de Janeiro: Medbook Editora, 2009. 5) Quidute ARP, Montenegro RM. Adenomas hipofisários clinicamente não funcionante. In: Bandeira F, Graf H, Griz L, Faria M, Lazaretti-Castro M, editors. Endocrinologia Básica e Diabetes. 2nd Ed. Rio de Janeiro: Medbook Editora, 2009. 6) Faria M, Nascimento GC, Montenegro RM. Hipopituitarismo. In: Bandeira F, Graf H, Griz L, Faria M, Lazaretti-Castro M, editors. Endocrinologia Básica e Diabetes. 2nd Ed. Rio de Janeiro: Medbook Editora, 2009. 7) Vilar L, Freitas MC, Campos R, Naves LA. Distúrbios da secreção de prolactina. In: Bandeira F, Graf H, Griz L, Faria M, Lazaretti-Castro M, editors. ________________________________________________________________________________________________________________________ Endocrinologia Básica e Diabetes. 2nd Ed. Rio de Janeiro: Medbook Editora, 2009.