Istoe Dinheiro, 19 de fevereiro de 2016 A nova Cassandra da economia brasileira Por: Paula Bezerra A Empiricus, umas das maiores casas independentes de análise financeira do País, anda na contramão das previsões do mercado. Seus relatórios, assinados pelo sócio-fundador Felipe Miranda, têm o poder de cair como uma bomba na mesa dos investidores. Na terça-feira 16, a mais recente projeção da equipe da Empiricus fez a espinha de muitos gelar: “O calote – o Brasil está tecnicamente quebrado”. Para corroborar essa tese, no dia seguinte a agência de classificação de risco Standard & Poor’s, que já havia retirado o grau de investimento do Brasil, em setembro, rebaixou novamente a nota soberana, agora com perspectiva negativa. (leia reportagem aqui). Aos 31 anos, Miranda incorpora o mito grego da Cassandra, aquela que tem o dom da profecia, mas vive sob dilema. Se erra, é desmoralizada. E, se acerta as previsões, é chamada de agourenta. “Não sou psicólogo, meu trabalho não é deixar as pessoas bem-humoradas”, diz Miranda. “Meu trabalho é fazer as pessoas ganharem dinheiro.” Miranda é um especialista em mexer com o imaginário dos leitores. De segunda a sextafeira, ele se fecha às 7h40 em sua mesa, no 4º andar de um edifício no Itaim Bibi, zona sul de São Paulo, e fica cerca de duas horas analisando o mercado financeiro e buscando a frase impactante de seu próximo livro ou relatórios sobre a situação econômica brasileira. A força da Empiricus está, justamente, no poder do título, muito mais catastrofista e chamativo que o conteúdo de seus trabalhos. Nesse último relatório, para justificar que o Brasil está quebrado, Miranda e sua equipe mostram que a relação dívida-PIB caminha rapidamente para superar o patamar de 80% – hoje está em 66% – depois de 2018. Mas, com a ressalva: “Mais uma vez, não se trata de uma conta exclusiva da Empiricus”, diz o texto. E, diferentemente da agressividade do título de seu produto, Miranda não acredita veemente em um default. “Antes de dar o calote, como última consequência, o governo tem a prerrogativa de imprimir dinheiro para honrar seus compromissos”, diz ele. “Mas pagar a dívida com inflação é um calote disfarçado.” O segredo da empresa está nessa fama de polemista adquirida nos últimos anos, principalmente após a publicação do relatório O Fim do Brasil, em 2014. Ser considerado agourento rende, também, fortuna. Os seguidores da Empiricus aumentam na mesma proporção que a popularidade de seus relatórios chamativos. Atualmente, são 1,6 milhão de assinantes do conteúdo gratuito e 115 mil pagantes, que desembolsam entre R$ 9,90 a R$ 600 por mês para ter acesso ao material exclusivo. O resultados da empresa é mantido em sigilo. A história recente da economia mostra outros personagens conhecidos como Cassandra. O economista americano Nouriel Roubini, chamado de doutor Catástrofe, deu início a uma série de previsões pessimistas sobre a economia mundial no início dos anos 2000. Quando acertou a previsão de quebra do mercado imobiliário americano, passou a ser o sábio a quem ninguém deu ouvidos. A desmoralização da Cassandra acontece por aqueles que lembram de projeções falhas ou do longo período para a concretização de uma previsão. Quando Miranda falava que a cotação do dólar chegaria a R$ 4, a moeda americana estava sendo negociada a R$ 2,90 e chegou a cair antes de iniciar uma trajetória de alta. Em janeiro, Miranda disse que as ações da Petrobras estavam condenadas a cair, por isso era preciso vender e não comprar papéis da estatal. Em poucos dias, a Petrobras alcançou uma valorização de mais de 20%. A bolsa de valores causou o mesmo efeito, porém contrário, que a S&P sobre seu último relatório. Especialistas ouvidos pela DINHEIRO acreditam que a intenção de Miranda é assustar para gerar mais volatilidade no mercado financeiro e, assim, mais demanda para sua consultoria. “O Brasil não vai dar um calote, não teremos crise de abastecimento e muito menos hiperinflação”, diz José Oreiro, professor do Instituto de Economia da UFRJ e da Associação Keynesiana Brasileira. “Nossas instituições são sólidas o suficiente para que medidas drásticas como essas se concretizem.” As críticas fazem parte da história da Empiricus. No final de 2011, a casa de análise publicou uma carta aberta aos clientes e à imprensa detalhando o que considerava inconsistente no balanço do frigorífico Marfrig. A empresa entrou com uma notificação na Comissão de Valores Mobiliários e, em novembro de 2012, venceu o caso. A Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais avaliou como inadequada a conduta de analistas da Empiricus, que estavam abusando de agressividade nos relatórios. Marcos Eduardo Elias, responsável pelos textos, recebeu a suspensão do credenciamento por um ano. Rodolfo Amstalden e Roberto Altenhofen pagaram multa de R$ 2 mil. “Para se firmar no mercado financeiro é preciso cultivar a chamada teimosia saudável e não ter medo de errar”, afirma Miranda. “Vamos errar, isso é certo, mas temos que errar pequeno para perder menos. Esse é nosso objetivo.”