RELATÓRIO DO GRUPO DE TRABALHO DE FEBRE REUMÁTICA – SOPERJ – 2010-12 Maio de 2011 O Grupo de Trabalho de Febre Reumática da SOPERJ reúne pediatras gerais e especialistas (reumatologistas, cardiologistas e um neurologista), além de uma psicóloga, tem como objetivo em comum trabalhar para contribuir com o controle e/ou erradicação da febre reumática, doença totalmente prevenível, através de ações de educação, capacitação e assistência, com foco primordial no diagnóstico, tratamento e profilaxia corretos da doença. A febre reumática é uma complicação inflamatória de uma faringoamigdalite bacteriana causada pelo Estreptococo beta-hemolítico do Grupo A de Lancefield, doença bacteriana mais comum na infância, ocorrendo em 1 a 2 episódios por ano na idade escolar, e freqüente motivo de consulta da criança em unidades básicas de saúde e/ou unidades de emergência. A febre reumática é uma doença crônica, que ocorre em surtos, com possibilidade de piora das lesões cardíacas a cada novo surto, sendo a profilaxia da recidiva fundamental para a boa evolução do paciente. Além disso, por ser esta profilaxia realizada com injeções regulares de penicilina benzatina, o que torna esse tratamento doloroso, o incentivo permanente e o alerta sobre as graves consequencias da interrupção do tratamento são essenciais. Nos últimos seis meses, foi observado nas reuniões do Grupo de Trabalho o relato repetido de que têm ocorrido alguns graves problemas, que dificultam o adequado atendimento aos pacientes com Febre Reumática no Estado do Rio de Janeiro. Ocorre hoje, segundo o relato da maioria dos membros do GT de Febre Reumática, uma dificuldade de acesso dos pacientes portadores ou com suspeita de febre reumática, aos serviços de referência para o acompanhamento e tratamento desta doença. As dificuldades neste acesso são especialmente evidentes nos hospitais onde a marcação de consultas de primeira vez e de seguimento estão sendo realizadas pelas Centrais de Regulação, a qual não leva em consideração a gravidade de cada caso específico, ficando os pacientes mais graves no mesmo patamar de prioridade que o paciente que é encaminhado sem indicação adequada. Traduzindo em fatos, foi relatado pelos colegas que trabalham no Hospital Municipal Jesus e no Hospital Universitário Antônio Pedro, que o paciente que necessita de atendimento de primeira vez por febre reumática confirmada ou suspeita, pode levar até 2 meses ou mais para conseguir uma consulta com o especialista da Reumatologia, Cardiologia ou Neurologia. Assim, o agendamento dos pacientes com febre reumática ou suspeita da doença, deveriam ter alguma prioridade no atendimento das especialidades de Cardiologia, Reumatologia e Neurologia. Também é fundamental, que o médico especialista possa controlar o agendamento do retorno destes pacientes, não só para que as formas graves da doença sejam acompanhadas de perto, como também para que se consiga controlar as faltas e abandono de tratamento destas pessoas (sistema de busca ativa). Este fato não nos traria tanta preocupação, se os colegas que atendem a esses pacientes nas unidades básicas de saúde e unidades de emergência do Município e Estado do RJ demonstrassem estar preparados para a realização do diagnóstico e orientação terapêutica adequados. Infelizmente, isso não tem sido observado e, muitos destes pacientes, já apresentam doença mais avançada com lesão cardíaca de uma ou mais válvulas, quando finalmente conseguem chegar a um hospital de referência. Além disso, muitos profissionais da rede básica de saúde relatam a dificuldade de realização e a demora na obtenção dos resultados de exames diagnósticos, mesmo os mais simples, como hemograma e a VHS. Outro ponto fundamental de entrave no atendimento ao paciente com febre reumática são as dificuldades na aplicação da penicilina benzatina. Pela sua fácil posologia (uma injeção a cada 21dias), pelo baixo custo do tratamento (R$ 2,00 a ampola) e pela ausência de resistência do Estreptococo beta-hemolítico do grupo A de Lancefield à penicilina, a profilaxia secundária da febre reumática com penicilina benzatina é a forma mais adequada de tratamento desta doença. Porém, devido ao mito infundado da alergia e às dificuldades técnicas de aplicação alegadas, a administração da penicilina benzatina tem sido dificultada ou recusada por um número significativo de profissionais de unidades básicas de saúde, o que gera um enorme problema para os pacientes, que muitas vezes têm que se deslocar para um dos Centros de Referência, em que são acompanhados, para aplicarem a penicilina benzatina, implicando em maior consumo de tempo e dinheiro. Um exemplo prático, foi o relato de um paciente que, ao procurar o Posto de Saúde Lincoln Freire em Santa Cruz para aplicação da penicilina benzatina, foi encaminhado para fazer a medicação na Clínica da Família da região, sendo que, para chegar lá, o paciente que vai a pé ao posto de saúde, teve que pegar 2 ônibus. Outros pontos de dificuldade estão na obtenção de vagas para a internação e tratamento de adolescentes, que compõem uma grande parte dos pacientes sob risco de febre reumática, o desabastecimento de penicilina benzatina em algumas unidades de saúde, e a dificuldade de se obter exames básicos como VHS nas unidades de emergência do Estado, Município e até dos hospitais federais, como por exemplo, o Hospital Federal de Bonsucesso. Na última semana, tivemos ainda uma série de relatos por parte dos pacientes, da dificuldade de aplicação da penicilina benzatina nas unidades básicas de saúde do município do Rio de Janeiro, devido à nova regulamentação da ANVISA – RDC 44/2010, que orienta a prescrição de antibióticos. As unidades de saúde não estão mais aceitando administrar a penicilina benzatina com a receita médica inclusa no Cartão de Profilaxia do Paciente Reumático. Este cartão é utilizado há cerca de 20 anos pelos Centros de Referência no Rio de Janeiro, e tem servido como uma receita (o médico assina e carimba a prescrição) para a aplicação regular da penicilina a cada 21 dias, e como forma de controle das doses aplicadas, o que é fundamental para o acompanhamento destes pacientes. Acreditamos que a solução para estes problemas dependa em parte do reconhecimento da doença, bem como do atendimento prioritário na fase aguda. Para isto, é necessária uma reestruturação do sistema de saúde vigente, permitindo ao médico especialista ter controle sobre a sua agenda de atendimento regular, fazendo com que os pacientes consigam chegar ao especialista e tenham tratamento específico em tempo adequado. Também reconhecemos a necessidade de treinamento e capacitação das equipes de profissionais médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e outros colaboradores da equipe multidisciplinar de saúde para que aprendam e apreendam sobre a necessidade do diagnóstico adequado e rápido e do tratamento efetivo das faringoamigdalites bacterianas e dos surtos agudos da doença. Da mesma forma, é esperada alguma estratégia para acelerar o agendamento e os resultados dos exames laboratoriais e para garantir a aplicação regular da penicilina benzatina. Solicitamos à Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro que oriente seus profissionais de saúde para que aceitem o Cartão de Profilaxia da Febre Reumática como uma receita válida e não neguem o atendimento e administração da penicilina benzatina a esses pacientes. Grupo de Trabalho de Febre Reumática – SOPERJ – Gestão 2010-2012 Maio de 2011