´E só fatorar... Será mesmo?

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É só fatorar. . . Será mesmo?
Neste pequeno artigo resolveremos o problema 2 da USAMO (USA Mathematical Olympiad) 2005:
Problema. Prove que o sistema
não tem solução em inteiros x, y, z.
x6 + x3 + x3 y + y = 147157
3
x + x3 y + y 2 + y + z 9 = 157147
Solução. No começo, podemos pensar que este é mais um problema simples na qual “é só fatorar”:
(x3 + 1)(x3 + y) = 147157
x6 + x3 + x3 y + y = 147157
⇐⇒
3
x + x3 y + y 2 + y + z 9 = 157147
(x3 + y)(1 + y) = 157147 − z 9
Aı́ é só fatorar 147157 = 3157 · 7314 e testar todos os 2 · (157 + 1) · (314 + 1) casos, certo?
Infelizmente, acho que na hora da prova não irı́amos ter tempo para fazer isso. Então temos que dar
um jeito de estudar menos casos.
Observe que x3 + 1 é um divisor de 3157 · 7314 . Logo
x3 + 1 = ±3α · 7β
Você poderia pensar no x3 + y, mas isso não seria uma boa, considerando que x3 + y é linear em
y e poderia assumir qualquer valor inteiro por causa disso. Além disso, x3 + 1 tem só uma variável e o
principal. . . fatora!
Assim, o principal no problema é resolver a equação diofantina
x3 + 1 = ±3α · 7β
(∗)
em que x é inteiro (positivo, negativo ou até quem sabe nulo!) e α e β são inteiros não negativos.
Podemos fatorar o primeiro membro de (∗):
x3 + 1 = ±3α · 7β ⇐⇒ (x + 1)(x2 − x + 1) = ±3α · 7β
Quando fatoramos em equações diofantinas, devemos calcular o mdc dos fatores, senão a equação fica
ofendida! Vamos usar tanto esse fato que o chamaremos de
Lema. Seja x inteiro. Então mdc(x + 1; x2 − x + 1) = 1 ou mdc(x + 1; x2 − x + 1) = 3. Além disso, se 3
divide um dos números x + 1 ou x2 − x + 1 então divide ambos, ou seja, 3 divide x + 1 se, e somente se, 3
divide x2 − x + 1.
Demonstração. Seja d = mdc(x+1; x2 −x+1). Vendo x+1 mód d, obtemos x+1 ≡ 0 (mód. d) ⇐⇒ x ≡
−1 (mód. d). Vendo agora x2 − x + 1 mód d, obtemos x2 − x + 1 ≡ 0 (mód. d) ⇐⇒ (−1)2 − (−1) + 1 ≡ 0
(mód. d) ⇐⇒ 3 ≡ 0 (mód. d) ⇐⇒ d|3 ⇐⇒ d = 1 ou d = 3.
Vimos acima que se x + 1 é divisı́vel por 3 então x2 − x + 1 também é. Vejamos agora a recı́proca. Mas
isso é tão fácil quanto resolver equação do segundo grau!
x2 − x + 1 ≡ 0 (mód. 3) ⇐⇒ 4x2 − 4x + 4 ≡ 0 (mód. 3) ⇐⇒ 4x2 − 4x + 1 ≡ 0
2
⇐⇒ (2x − 1) ≡ 0 (mód. 3) ⇐⇒ 2x − 1 ≡ 0 (mód. 3)
⇐⇒ −x − 1 ≡ 0 (mód. 3) ⇐⇒ x + 1 ≡ 0 (mód. 3)
(mód. 3)
Agora, voltemos à equação (∗), ou seja,
(x + 1)(x2 − x + 1) = ±3α · 7β
Logo x + 1 = ±3α1 · 7β1 e x2 − x + 1 = 3α2 · 7β2 (note que x2 − x + 1 =
α1 , β1 , α2 e β2 inteiros não negativos.
1
4
(2x − 1)2 + 3) > 0), sendo
Veja que, do Lema, concluı́mos que α1 = 0 ⇐⇒ α2 = 0 e, além disso, β1 = 0 ou β2 = 0, pois se ambos
os expoentes β1 e β2 forem positivos então 7 seria um dos fatores de mdc(x + 1; x2 − x + 1), absurdo. Além
disso, se α1 > 0 (ou α2 > 0) então α1 = 1 ou α2 = 1 pois, caso contrário, 9 dividiria mdc(x + 1; x2 − x + 1),
absurdo.
Suponha primeiro que α1 e β1 são ambos não nulos. Logo α2 > 0 e β2 = 0.
Se α1 ≥ 2, α2 = 1 e, portanto, x2 − x + 1 = 3 ⇐⇒ x = −1 ou x = 2. x = −1 é o mesmo que x + 1 = 0,
o que não é possı́vel. x = 2 é equivalente a x + 1 = 3, absurdo já que supomos que β1 > 0.
Logo α1 = 1 e, portanto, x + 1 = ±3 · 7β1 e x2 − x + 1 = 3α2 . Mas aı́, sendo a = 7β1 , x = 3a − 1 ⇐⇒
x = 27a3 − 27a2 + 9a − 1 ⇐⇒ x3 + 1 = 9(3a3 − 3a2 + 1). Como 3a3 − 3a2 + 1 não é divisı́vel por 3, a
maior potência de 3 que divide x2 − x + 1 é 32 , ou seja, α2 = 2. Portanto, x2 − x + 1 = 9, o que é impossı́vel
para x inteiro.
3
Desta forma, não é possı́vel que α1 e β1 sejam ambos não nulos. Resta-nos, então, dois casos: α1 = 0 e
β1 = 0.
•
Primeiro caso: α1 = 0 e β1 = 0. Neste caso, x + 1 = ±1 e, portanto, x = 0 ou x = −2. Veja que, para
esses valores de x, x3 + 1 é da forma 3α · 7β .
•
Segundo caso: α1 = 0 e β1 > 0. Aqui temos x + 1 = ±7β1 , α2 = 0 e β2 = 0, ou seja, x2 − x + 1 = 1 ⇐⇒
x = 1 ou x = 0. Nenhum desses valores de x satisfaz x + 1 ser uma potência de 7 maior que 1.
•
Terceiro caso: α1 > 0 e β1 = 0. Temos x + 1 = ±3α1 , α2 > 0 e β2 ≥ 0. Além disso, α1 = 1 ou α2 = 1.
Se α1 = 1, x + 1 = ±3, ou seja, x = 2 ou x = −4. Novamente, para esses valores de x, x3 + 1 é da forma
3 · 7β .
α
Se α2 = 1, x+1 = ±3α1 e x2 −x+1 = 3·7β2 . Logo x = ±3α1 −1 e x2 −x+1 = (±3α1 −1)2 −(±3α1 −1)+1 =
32α1 ∓ 3α1 +1 + 3. Logo x2 − x + 1 = 3 · 7β2 ⇐⇒ 32α1 ∓ 3α1 +1 + 3 = 3 · 7β2 ⇐⇒ 3α1 (3α1 −1 ∓ 1) = 7β2 − 1.
Agora temos que resolver esta outra equação diofantina:
3α1 (3α1 −1 ∓ 1) = 7β2 − 1
(∗∗)
Neste caso utilizamos o
Lema de Hensel. Seja p um primo ı́mpar, a um inteiro e n um inteiro positivo. Sejam α e β inteiros não
negativos, com α > 0.
(i) Se a maior potência de p que divide n é pβ e a maior potência de p que divide a − 1 é pα (atenção, p
deve dividir a − 1! Mas note que p não precisa dividir n), então a maior potência de p que divide an − 1
é pα+β .
(ii) Se n é ı́mpar, a maior potência de p que divide n é pβ e a maior potência de p que divide a + 1 é pα (as
mesmas condições sobre os expoentes α e β do item (i) devem valer), então a maior potência de p que
divide an + 1 é pα+β .
Vejamos como aplicá-lo no problema.
Seja 3γ a maior potência de 3 que divide β2 . Como a maior potência de 3 que divide 7 − 1 é 3, aplicando
o Lema de Hensel para a = 7, p = 3, n = β2 , α = 1 e β = γ, obtemos que a maior potência de 3 que divide
7β2 − 1 é γ + 1. Mas, de (∗∗), a maior potência de 3 que divide 7β2 − 1 é 3α1 , logo γ + 1 = α1 ⇐⇒ γ = α1 − 1.
Logo 3α1 −1 divide β2 e, portanto, β2 ≥ 3α1 −1 . Sendo w = 3α1 −1 , temos
α1 −1
3α1 (3α1 −1 ∓ 1) = 7β2 − 1 ≥ 73
− 1 =⇒ 3w(w ∓ 1) ≥ 7w − 1
Mas note que a exponencial 7w − 1 cresce bem mais que o polinômio 3w(w − 1). De fato, uma simples
indução mostra que 7w − 1 > 3w(w + 1) ≥ 3w(w ∓ 1) para w ≥ 2: 7w+1 − 1 − 3(w + 1) (w + 1) + 1 =
(7w − 1) − 3w(w + 1) + 6(7w − 1 − w). Por hipótese, 7w − 1 − 3w(w + 1) > 0 e, além disso, 7w − 1 − w >
(7w − 1) − 3w(w + 1) > 0. Logo se a desigualdade 7w − 1 > 3w(w + 1) é válida então a mesma desigualdade
vale para valores maiores de w. Como, em particular, vale para w = 2, acabou.
Logo w = 1 ⇐⇒ 3α1 −1 = 1 ⇐⇒ α1 = 1, que já estudamos.
As aplicações do Lema de Hensel geralmente seguem esse script: primeiro, aplicamos o teorema e depois
chegamos a alguma desigualdade que limita algum dos expoentes, chegando a um número normalmente bem
finito de casos.
Você deve estar se perguntando como é a demonstração do Lema de Hensel. Vamos demonstrá-lo nesse
caso particular (a = 7, p = 3). A prova do Lema em si não é muito diferente do que se segue.
t−2
x
Primeiro, seja β2 = 3γ · t, sendo que 3 não divide t. Utilizaremos a fatoração xt − 1 = (x − 1)(xt−1 +
γ
+ · · · + x + 1) para x = 73 :
γ
γ
γ
γ
γ
7β2 − 1 = (73 )t − 1 = (73 − 1) (73 )t−1 + (73 )t−2 + · · · + 73 + 1
Como já dissemos antes, se não calcularmos o mdc das parcelas, a equação fica ofendida! Assim, seja
γ
D = mdc(x − 1; xt−1 + xt−2 + · · · + x + 1), com x = 73 . Vendo x − 1 mód D temos x ≡ 1 (mód. D). Logo
xt−1 + xt−2 + · · · + x + 1 ≡ 0 (mód. D) ⇐⇒ 1 + 1 + · · · + 1 ≡ 0 (mód. D) ⇐⇒ t ≡ 0 (mód. D), ou
{z
}
|
t uns
seja, D divide t. Note que esse resultado não depende do valor de x (desde que seja inteiro, é claro!), então,
você pode guardar:
Fato. Seja x inteiro e D = mdc(x − 1; xt−1 + xt−2 + · · · + x + 1). Então D divide t.
Na nossa demonstração, o que interessa é que 3 não divide t e, portanto, não divide D. Em outras
γ
palavras, todos os fatores 3 estão em 73 − 1.
γ
Agora vamos provar que 73 − 1 tem γ + 1 fatores 3 por indução em γ: a base γ = 0, 1 é óbvia. Agora,
γ+1
γ
γ
γ
γ
note que 73
− 1 = (73 )3 − 1 = (73 − 1)((73 )2 + 73 + 1). Mas mdc(x − 1; x2 + x + 1) = 3 para todo
γ
γ
γ
x inteiro, em particular para x = 73 . Logo a maior potência de 3 que divide (73 )2 + 73 + 1 é 3 e, pela
γ
hipótese de indução, a maior potência de 3 que divide 73 − 1 é γ + 1. Assim, o passo indutivo está provado
e a indução também.
Enfim, chegamos à solução de (∗): x = −2; x = 0; x = 2; x = −4. Assim, x3 + 1 só tem fatores primos
3 e 7 para esses valores de x.
Agora é só testar no sistema original. Da primeira equação encontramos y; subsituı́mos na segunda e
provamos que não existe z.
•
x = −2 ⇐⇒ x3 + 1 = −7.
(x3 + 1)(x3 + y) = 147157 = 3157 · 7314
y = 8 − 3157 · 7313
⇐⇒
(x3 + y)(1 + y) = 157147 − z 9
−3157 · 7313 (9 − 3157 · 7313 ) = 157147 − z 9
Vendo mód 157 (e observando que 157 é primo e, portanto, a156 ≡ 1 (mód. 157) para a não divisı́vel
por 157), obtemos
− 3156 · 3 · 72·156 · 7(9 − 3156 · 3 · 72·156 · 7 ≡ −z 9
⇐⇒ 3 · 7(9 − 3 · 7) ≡ z
⇐⇒ − 252 ≡ z
9
9
9
(mód. 157)
(mód. 157)
⇐⇒ z ≡ 62 (mód. 157)
(mód. 157)
Notando que 156 = 3 · 52, elevando a 52 obtemos no lado esquerdo z 3·156 ≡ 1 (mód. 157). Logo
6252 ≡ 1
(mód. 157)
Vejamos se isso é verdade. Se não for, não há soluções nesse caso.
622 = 62 · 3 · 20 + 62 · 2 ≡ 29 · 20 − 33 ≡ −48 − 33 ≡ −81 (mód. 157)
=⇒ 6252 ≡ (−34 )26
=⇒ 62
Logo 6252 ≡ 1
lá!
52
≡3
104
(mód. 157)
(mód. 157)
(mód. 157) ⇐⇒ 3104 ≡ 1 (mód. 157) ⇐⇒ 3156−104 = 352 ≡ 1 (mód. 157). Vamos
36 = 729 ≡ −56 (mód. 157) =⇒ 312 ≡ 562
(mód. 157)
⇐⇒ 3
12
≡ 56 · 3 · 18 + 56 · 2 ≡ 11 · 18 − 45 ≡ −4 (mód. 157)
=⇒ 3
48
≡ 256 (mód. 157) ⇐⇒ 352 ≡ −58 · 81 (mód. 157)
⇐⇒ 352 ≡ −58 · 3 · 27 ≡ −17 · 27 ≡ −17 · 9 · 3 ≡ −(−4) · 3 ≡ 12 (mód. 157)
Logo 352 ≡ 12 (mód. 157) e, portanto, não há soluções nesse caso.
•
x = 2 ⇐⇒ x3 + 1 = 9.
(x3 + 1)(x3 + y) = 147157 = 3157 · 7314
y = 3155 · 7314 − 8
⇐⇒
(x3 + y)(1 + y) = 157147 − z 9
3155 · 7314 (3155 · 7314 − 7) = 157147 − z 9
Vendo mód 157:
3156−1 · 72·156+2 (3156−1 · 72·156+2 − 7) ≡ −z 9
⇐⇒ 3
−1
2
· 7 (3
−1
2
· 7 − 7) ≡ −z
9
(mód. 157)
⇐⇒ − 52 · 7 · 7(−52 · 7 · 7 − 7) ≡ −z 9
⇐⇒ 364 · 7(−364 · 7 − 7) ≡ z
⇐⇒ 50 · 7(−50 · 7 − 7) ≡ −z
⇐⇒ 350 · 357 ≡ −z
⇐⇒ 36 · 43 ≡ −z
⇐⇒ 22 ≡ z
9
9
9
9
(mód. 157)
(mód. 157)
(mód. 157)
9
(mód. 157)
(mód. 157)
(mód. 157)
(mód. 157)
Elevando a 52,
2252 ≡ 1
Vamos lá!
(mód. 157)
222 = 484 ≡ 13 (mód. 157) =⇒ 224 ≡ 169 ≡ 12 (mód. 157)
=⇒ 228 ≡ 144 ≡ −13 (mód. 157) ⇐⇒ 228 ≡ −222
6
⇐⇒ 22 ≡ −1
⇐⇒ 22
52
(mód. 157) =⇒ 22
48
(mód. 157)
≡ 1 (mód. 157)
4
≡ 22 ≡ 12 (mód. 157)
De novo, não temos soluções nesse caso.
•
x = −4 ⇐⇒ x3 + 1 = −63.
(x3 + 1)(x3 + y) = 147157 = 3157 · 7314
y = 8 − 3155 · 7313
⇐⇒
(x3 + y)(1 + y) = 157147 − z 9
−3155 · 7313 (9 − 3155 · 7313 ) = 157147 − z 9
Vendo mód 157:
− 3156−1 · 72·156+1 (9 − 3156−1 · 72·156+1 ) ≡ −z 9
⇐⇒ − 3
· 7(9 − 3
−1
−1
· 7) ≡ −z
⇐⇒ 52 · 7(9 + 52 · 7) ≡ −z
⇐⇒ 364(9 + 364) ≡ −z
⇐⇒ 50 · 59 ≡ −z
⇐⇒ 33 ≡ z
9
9
9
9
9
(mód. 157)
(mód. 157)
(mód. 157)
(mód. 157)
(mód. 157)
(mód. 157)
Elevando a 52,
3352 ≡ 1
(mód. 157)
Vamos ver se isso é verdade mesmo: primeiro note que 3352 = 352 · 1152 e que já sabemos que 352 ≡ 12
(mód. 157). Assim, basta calcular 1152 mód 157.
112 ≡ −36 (mód. 157) =⇒ 114 ≡ 362 = 36 · 4 · 9 ≡ (−13) · 9 ≡ 40 (mód. 157)
=⇒ 118 ≡ 1600 ≡ 30 (mód. 157) =⇒ 1116 ≡ 900 ≡ −42 (mód. 157)
=⇒ 1132 ≡ 422 = 42 · 40 + 42 · 2 ≡ 1680 + 84 ≡ 110 − 73 ≡ 37 (mód. 157)
=⇒ 1148 = 1132 · 1116 ≡ 37 · (−42) ≡ −37 · 40 − 37 · 2 ≡ 90 − 74 ≡ 16 (mód. 157)
=⇒ 1152 = 1148 · 114 ≡ 16 · 40 = 640 ≡ 12 (mód. 157)
Novamente, não há soluções.
•
x = 0 ⇐⇒ x3 + 1 = 1. Nesse caso, obtemos y = 147157 − 1 e y(y + 1) = 157147 − z 9 ⇐⇒ (147157 −
1)147157 = 157147 − z 9 =⇒ (147 − 1)147 ≡ −z 9 (mód. 157) ⇐⇒ z 9 ≡ 47 (mód. 157) =⇒ 4752 ≡ 1
(mód. 157).
Vamos fazer mais uma vez as contas! Algo que pode ajudar é que 4752 ≡ (−110)52 ≡ 1152 · 1052
(mód. 157) e que sabemos que 1152 ≡ 12 (mód. 157). Falta, então, calcular 1052 mód 157.
103 ≡ −58 (mód. 157) ⇐⇒ 104 ≡ −580 ≡ 48 (mód. 157) ⇐⇒ 105 ≡ 480 ≡ 9 ≡ 32
(mód. 157)
Já calculamos algumas potências de 3 mód 157! Entre elas, 312 ≡ −4 (mód. 157):
1030 ≡ 312 ≡ −4 (mód. 157) =⇒ 1045 = 1030 · (105 )3 ≡ −4 · 36 ≡ −4 · (−56) ≡ 67 (mód. 157)
=⇒ 1050 = 1045 · 105 ≡ 67 · 9 = 603 ≡ −25 (mód. 157)
=⇒ 1052 ≡ −250 · 10 ≡ 64 · 10 ≡ 12 (mód. 157)
De novo, nenhuma solução.
Assim, o sistema dado não tem soluções inteiras.
O problema também admite uma solução mais curta. Vamos apresentá-las e depois fazemos alguns
comentários sobre as duas soluções.
Solução alternativa. No sistema
x6 + x3 + x3 y + y = 147157
3
x + x3 y + y 2 + y + z 9 = 157147
o que aparece mais são números ao cubo. Então pode ser interessante ver algum módulo primo com poucos
resı́duos cúbicos.
O fato é que os primos com “poucos” resı́duos cúbicos são os da forma 3k + 1. Depois vamos ver por
quê.
Ver mód 7 não dá certo (tente e veja por si mesmo!). Mas ver mód 13 funciona bem. A tabela a seguir
mostra os resı́duos cúbicos mód 13:
x mód 13 0 ±1 ±2
x3 mód 13 0 ±1 ±8
±3 ±4 ±5 ±6
±1 ∓1 ±8 ±8
Como no problema o x só aparece ao cubo, podemos encontrar y mód 13 na primeira equação e substituir
na segunda. Temos 147 ≡ 4 (mód. 13) =⇒ 1476 ≡ 212 ≡ 1 (mód. 13) =⇒ 147156 ≡ 1 (mód. 13) ⇐⇒
147157 ≡ 4 (mód. 13) e 157 ≡ 1 (mód. 13) =⇒ 157147 ≡ 1 (mód. 13). Assim, vendo mód 13 o sistema
fica
(x3 + 1)(x3 + y) ≡ 4 (mód. 13)
(x3 + 1)(x3 + y) ≡ 4 (mód. 13)
⇐⇒
(x3 + y)(1 + y) ≡ 1 − z 9 (mód. 13)
z 9 ≡ 1 − (x3 + y)(1 + y) (mód. 13)
Já vemos, por exemplo, que x3 6≡ −1 (mód. 13). Vamos testar os outros quatro casos (x3 ≡ 0, 1, 5, 8
(mód. 13)):
x3 mód 13 (x3 + y) ≡ 4(x3 + 1)−1 (mód. 13) z 9 ≡ 1 − (x3 + y)(1 + y) (mód. 13)
0
0 + y ≡ 4 · 1−1 ≡ 4
z 9 ≡ 1 − 4 · (1 + 4) ≡ 11
−1
1
1+y ≡4·2 ≡2
z 9 ≡ 1 − 2 · (1 + 1) ≡ 10
−1
5
5+y ≡4·6 ≡5
z 9 ≡ 1 − 5 · (1 + 0) ≡ 9
−1
9
8
8 + y ≡ 4 · 9 ≡ −1
z ≡ 1 − (−1) · (1 + 4) ≡ 6
Nenhum dos números 6, 9, 10, 11 é resı́duo cúbico de 13 e portanto z 9 = (z 3 )3 ≡ 6, 9, 10, 11 (mód. 13)
não tem solução. Logo o sistema não tem solução.
Agora, vamos explicar por que os primos com “poucos” resı́duos são os da forma 3k + 1.
Lema. Seja p um primo maior que 3. Então
•
Se p ≡ −1 (mód. 3) então todo resı́duo é resı́duo cúbico, ou seja, p admite p resı́duos cúbicos.
•
Se p ≡ 1
(mód. 3) então p admite
p−1
3
+ 1 resı́duos cúbicos.
A demonstração desse lema é baseado no seguinte fato:
Fato. Seja p primo ı́mpar e a inteiro não divisı́vel por p. A congruência x3 ≡ a3
•
1 solução se p ≡ −1 (mód. 3);
•
3 soluções se p ≡ 1
(mód. p) tem
(mód. 3).
Vamos provar esse fato: primeiro, temos
x3 ≡ a3
(mód. p) ⇐⇒ x3 − a3 ≡ 0
(mód. p)
2
⇐⇒ (x − a)(x + ax + a2 ) ≡ 0 (mód. p)
⇐⇒ x ≡ a
Já temos uma solução, x ≡ a
x2 + ax + a2 ≡ 0
(mód. p) ou x2 + ax + a2 ≡ 0
(mód. p)
(mód. p). Estudemos a congruência quadrática.
(mód. p) ⇐⇒ 4x2 + 4ax + 4a2 ≡ 0 (mód. p) ⇐⇒ (2x + a)2 ≡ −3a2
(mód. p)
Essa congruência tem solução se, e somente se, −3a2 é resı́duo quadrático de p, o que ocorre se, e
somente se, −3 é resı́duo quadrático de p. Para verificar quando isso acontece, utilizamos (sem demonstrar)
a lei da reciprocidade quadrática:
Lei da reciprocidade quadrática. Defina o sı́mbolo de Legendre por
(0
se p divide a
a
= 1
se p não divide a e a é resı́duo quadrático de p
p
−1 caso contrário
Então, sendo p e q primos,
p−1 q−1
p
q
·
= (−1) 2 · 2
q
p
Queremos saber −3
p . Fazendo q = 3, obtemos
p−1 −3−1
p
−3
−3
p
· 2
2
= 1 ⇐⇒
·
= (−1)
=
−3
p
p
3
Mas os resı́duos quadráticos de 3 são 0 e 1. Logo se p é maior que 3
−3
1 se p ≡ 1 (mód. 3)
=
−1 se p ≡ −1 (mód. 3)
p
Deste modo, o fato está demonstrado. Poderı́amos ter demonstrado uma (mas só essa!) mais facilmente:
se p ≡ −1 (mód. 3), p−2
3 é inteiro e
x3 ≡ a3
(mód. p) =⇒ (x3 )
p−2
3
p−2
⇐⇒ x
⇐⇒ x
−1
≡ (a3 )
≡a
≡a
⇐⇒ x ≡ a
p−2
−1
p−2
3
(mód. p)
(mód. p)
(mód. p)
(mód. p)
O resto da demonstração do lema é combinatória: para cada k = 0, 1, 2, . . . , p − 1 seja Ak o número de
soluções de x3 ≡ k (mód. p). Sabemos que se p ≡ 1 (mód. 3) então
(
1 se k = 0
|Ak | = 3 se k é resı́duo cúbico de p
0 caso contrário
e se p ≡ −1 (mód. 3) então
n
1 se k = 0 ou k é resı́duo cúbico de p
|Ak | =
0 caso contrário
Observe que os conjuntos Ak ’s são disjuntos e que todo x é raiz de alguma congruência do tipo x3 ≡ k
(mód. p) (é só tomar k = x3 !), logo S = |A0 | + |A1 | + · · · + |Ap−1 | = p. Temos A0 = {0}, então 0 é resı́duo
cúbico.
Seja n a quantidade de resı́duos cúbicos de p. Se p ≡ 1 (mód. 3), temos S = 1 + 3n ⇐⇒ n =
se p ≡ −1 (mód. 3), temos S = 1 + n ⇐⇒ n = p − 1 e a demonstração do fato está completa.
p−1
3
e
Comentários sobre as duas soluções. Há algumas considerações sobre o problema:
(i) O expoente 9 em z 9 não é necessário. Poderia ser z 3 no lugar de z 9 .
(ii) Podemos trocar 157147 por qualquer múltiplo de 157.
Comparando as soluções, sem dúvida a segunda solução é mais curta e envolve menos contas. Mas
a primeira solução tem mais a dizer: além de provar (ii), o que a segunda solução não faz, nela também
conseguimos um fato bastante interessante sobre números da forma x3 + 1: eles consistem só em fatores
primos 3 e 7 para poucos valores de x (quatro, para ser exato). Na verdade isso é razoavelmente esperado,
dado que o mdc dos fatores x + 1 e x2 − x + 1 é pequeno: é de se esperar que os fatores primos de x + 1 e
x2 − x + 1 sejam bem diferentes.
Isso pode levar a outras perguntas interessantes: seja Xk a quantidade de números inteiros x tais que
x3 + 1 tem exatamente k fatores primos distintos. Xk é finito ou infinito? E se trocarmos x3 + 1 por xn − 1,
n inteiro positivo maior que 3?
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