TCC PRONTISSIMO revisado para publicação PDF

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UNIJUI – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO
RIO GRANDE DO SUL – CAMPUS IJUI
DHE – DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
TABATA PAULA DE MENEZES
O TRABALHO DO PSICÓLOGO NO CENTRO DE REFERÊNCIA DA ASSISTÊNCIA
SOCIAL: UM BREVE HISTÓRICO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS SOCIAIS
Ijui
Dezembro 2014
TABATA PAULA DE MENEZES
O TRABALHO DO PSICÓLOGO NO CENTRO DE REFERÊNCIA DA ASSISTÊNCIA
SOCIAL: UM BREVE HISTÓRICO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS SOCIAIS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como
requisito parcial para conclusão do curso de
formação de Psicólogo sob a orientação de Ms.
Flavia Flach.
Ijui
Dezembro 2014
LISTA DE ABREVIATURAS
CAPs - Caixas de Aposentadoria e Pensão
CRAS – Centro de Referencia da Assistência Social
CREPOP - Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas
INPS - Instituto Nacional da Previdência Social
LBA - Legião Brasileira de Assistência
LOAS - Lei Orgânica de Assistência Social
MPAS - Ministério da Previdência e Assistência Social
PAIF – Programa de Atenção Integral à Família
PNAS - Política Nacional de Assistência Social
SUAS - Sistema Único de Assistência Social
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo identificar a função do psicólogo dentro do CRAS.
Criado pelo Sistema Único da Assistência Social, o CRAS tem como finalidade prestar
serviços assistenciais às famílias que estão em situação de vulnerabilidade social e constitui
uma ferramenta do Estado para a promoção de uma política de assistência social na qual está
voltada à formação de sujeitos autônomos. Para a identificação do trabalho do psicólogo, será
apresentada uma trajetória histórica da inserção da assistência social quanto política pública e,
posteriormente, a inserção do psicólogo no campo social, assim como uma revisão conceitual
sobre a psicologia social e psicologia social comunitária. A partir desse estudo, pode-se
perceber que os psicólogos que atuam na área social enfrentam muitos desafios, já que, na
vida acadêmica, não existem subsídios suficientes para dar suporte aos profissionais que
atuam nesta área. Assim, a pesquisa poderá contribuir para uma reflexão, por parte das
pessoas que estão envolvidas nas políticas sociais, sobre as atividades desenvolvidas por estes
profissionais, assim como favorecer o aperfeiçoamento da atuação no campo social.
Palavras-chave: Política da Assistência Social. Centro de Referência da Assistência Social.
Psicologia Social. Psicologia Social Comunitária.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 5
1
A TRAJETÓRIA HISTÓRICA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL................................ 8
1.1
Constituição Federal a partir de 1988 ...................................................................... 14
2
O TRABALHO DO (A) PSICOLOGO (A) NO CENTRO DE REFERÊNCIA
DA ASSISTÊNCIA SOCIAL (CRAS) ...................................................................... 20
2.1
Psicologia Social e a Psicologia Social Comunitária ................................................ 24
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 29
REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO ................................................................................... 32
5
INTRODUÇÃO
Conhecer a trajetória percorrida pela Assistência Social através de sua história nas
últimas décadas, nos dá instrumentais para enfrentarmos os desafios dos processos de
transformações sociais que estão a nossa volta. Os processos gerados a partir da Constituição
Federal de 1988 e que dizem respeito à Assistência Social, se fizeram fundamentais. Suas
ações estão articuladas com a Saúde e a Previdência Social e, a partir disso, se constituiu a Lei
Orgânica da Assistência Social (LOAS), passando a ser reconhecida como política pública,
que tem como dever garantir os direitos e promover a cidadania dos vários modelos de
população, que sofrem em função da desigualdade social, o lugar dos excluídos.
A partir das definições que foram acordadas na IV Conferência Nacional de
Assistência Social (2003) e das diretrizes estabelecidas pela LOAS (1993) aprovou-se a
construção e implementação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Ajustou-se,
assim, com a Política Nacional de Assistência Social (PNAS/2004), um caminho pautado pela
ruptura de uma história atravessada por ações que tinham em sua intenção a lógica dos
favores, dos clientelismos e, principalmente, a manutenção da condição de submissão aos que
a ele recorriam.
As propostas apresentadas pelo SUAS devem ter participação plena dos usuários para
que essas marcas históricas, sejam garantidas e legitimadas por meio dos movimentos
populares e do fortalecimento dos espaços e instâncias de controle social, que deverão fazer
com que as ações propostas estejam sincronizadas com seus territórios, seus sujeitos, suas
prioridades.
A nova estrutura legal que se origina desse processo de consolidação da assistência
como direito do cidadão e dever do Estado também deu início a um processo de
descentralização, entre estados, município e sociedade civil para a responsabilidade de
assumir a elaboração e a gestão da política de assistência social. Essa nova elaboração da
assistência social não se estabelece de uma hora para a outra, sendo preciso superar obstáculos
históricos que marcam a sociedade brasileira nesse campo.
Assim, o desafio enfrentado pelo Psicólogo referenciado pela política da Assistência
Social está voltado ao cotidiano de cada sujeito que tem sua vida marcada pela exclusão
social. Sendo assim, é preciso estar atento às potencialidades e às vulnerabilidades instaladas
nas comunidades, onde as famílias estabelecem seus laços mais significativos.
Este trabalho tem como objetivo delinear e compreender com mais precisão o trabalho
do psicólogo dentro do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS). A atuação do
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psicólogo no CRAS tem foco na prevenção e “promoção de vida”, mas isto, claro, não
significa desconsiderar outros aspectos relacionados às vulnerabilidades.
O interesse por essa temática de estudo decorre da experiência vivenciada no estágio
de Ênfase em Psicologia e Processos Sociais, que foi realizado em um Centro de Referência
da Assistência Social – CRAS, no qual me deparei com a dúvida acerca de qual é o real
trabalho do psicólogo dentro do CRAS, pois é um trabalho que foge do contexto da clínica e
se volta a projetos onde se precisa ter dispositivos para que sejam realizados, sendo públicoalvo as famílias que vivem em situações de vulnerabilidade social. Para que se efetive este
trabalho, tem-se como propósito de nos ocuparmos das situações que demandam atenção,
cuidado e aproximação com essas famílias.
Através da implantação do Sistema Único de Assistência Social – SUAS, que se abre
portas para a psicologia trabalhar dentro de instituições implantadas por esse sistema. O
estudo sobre o trabalho do psicólogo dentro desse espaço é de fundamental importância para a
psicologia, pois este elabora projetos que estejam voltados para a valorização dos aspectos
saudáveis presentes nos sujeitos, nas famílias e nas comunidades.
Essa pesquisa tem um viés teórico, que permite a busca da história da assistência
social e a compreensão a cerca das novas sínteses apresentadas ao longo do tempo nesse
campo de estudo. Permite, também, trabalhar com a complexidade, com a especificidade e
com as diferenciações que os problemas ou objetos sociais apresentam, compreendendo a
realidade a partir de uma análise estrutural.
A pesquisa procurou compreender como se tem dado o trabalho do psicólogo dentro
de uma instituição vinculada à assistência social e como tem se organizado esse trabalho
multidisciplinar.
Em termos de estrutura, o trabalho está subdividido em dois capítulos, divididos em
subtítulos, buscando, em cada um deles, abordar uma temática pertinente ao objetivo do
trabalho, procurando estabelecer a história da assistência social, visando, a partir disso,
abordar o trabalho da psicologia no CRAS.
A compreensão desta temática está relacionada com a historicidade, por isso
reportada, no primeiro capítulo, uma revisão bibliográfica, buscando identificar a
compreensão histórica da assistência social e depois da Constituição Federal de 1988, em
função de ser um marco legal para as políticas sociais no Brasil. Também está presente no
legado da CF/88 a implantação da Lei Orgânica da Assistência Social, que traz, em seus
princípios, a descentralização da política-administrativa e o SUAS, que materializa o
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conteúdo da LOAS, trazendo as formas de gestão implicadas na assistência social e a
institucionalização do CRAS.
A partir dessa trajetória histórica, buscou-se, no capítulo dois, focar especificamente
no trabalho do psicólogo dentro do CRAS e de como a psicologia social é realizada nesta
instituição, sendo este o objetivo desta pesquisa.
Para finalizar o trabalho, faz-se algumas considerações em torno de como pode ser
dado o trabalho da psicologia, voltados a estratégias para conhecer a população com a qual se
irá trabalhar.
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1 A TRAJETÓRIA HISTÓRICA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL
O conhecimento da história acerca das políticas públicas sociais traz, ao profissional
de psicologia, informações relevantes sobre de que maneira se constitui a assistência social e
como ela é vista nos anos anteriores à Constituição Federal de 1988, já que a assistência social
não era reconhecida como tal. Anteriormente, ela se dava fora de instituições voltadas
especificamente à assistência social ou de profissionais com algum tipo de formação. Nos dias
de hoje, as instituições sociais trabalham com profissionais graduados no curso de assistência
social e também psicólogos. Para isso, é importante fazer-se uma retrospectiva histórica sobre
a política da assistência social, para que o profissional obtenha maior conhecimento sobre o
assunto, tendo mais respaldo no que tange ao próprio exercício da profissão, bem como seus
limites, áreas de atuação, etc. As políticas sociais, assim, nasceram com a emergência da
sociedade capitalista, na medida em que se reconhece a questão social e a necessidade de
intervir para o seu enfrentamento.
Nessa esfera, as sociedades pré-capitalistas assumiram algumas responsabilidades
sociais visando manter a ordem social, punindo as pessoas que eram marginalizadas, mas não
possuíam uma visão de conjunto a respeito do bem comum na sociedade. Assim, as
protoformas das políticas sociais se deram a partir da caridade, do assistencialismo e de ações
filantrópicas.
As sociedades pré-capitalistas não privilegiavam as forças de mercado e assumiam
algumas responsabilidades sociais, não com o fim de garantir o bem comum, mas
com o intuito de manter a ordem social e a vagabundagem. Ao lado da caridade
privada e de ações filantrópicas, algumas iniciativas pontuais com características
assistenciais são identificadas como protoformas de políticas sociais. (BEHRING,
2009, P.47).
Através das ações sociais filantrópicas realizadas nas sociedades pré-capitalistas (cuja
ajuda na Idade Média vinha através da igreja, sendo esta uma época marcada pelo fim da
escravidão), fez com que a sociedade se dedicasse ao assistencialismo para que se mantivesse
a ordem social esperada.
Nos séculos XIII e XIV surgiram congregações religiosas que se dedicaram à
assistência social, realizando o assistencialismo domiciliar e hospitalar. A partir do século
XV, os homens tinham o dever de distribuir esmolas e as mulheres de realizar visitas com
viés doutrinários. Nessa época, marcada pelo fim da escravidão, as pessoas estavam livres
para sair e ir para o local em que realizavam seus atos de caridade. (VIEIRA, 1989).
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No Brasil, o nascimento das políticas sociais está relacionado ao ambiente de
afirmação da República e da consolidação do capitalismo, que se realiza a partir do início do
século XX. Isto não quer dizer que não tenha havido, antes desse período, ações do governo e
da sociedade organizada sob manifestações de “problemas sociais”; mas sim, que essas ações
também eram marcadas por um viés caritativo, paternalista e assistencialista. Durante o
processo de colonização marcado pela acumulação de capital nos países centrais do
capitalismo emergente, houve pouca consideração em relação à população e aos problemas
locais. O Brasil foi inserido na dinâmica da economia mundial de forma marginal e
dependente. Esse processo se estendeu durante todo o período colonial, marcado pela
escravidão e exploração dos recursos naturais.
O Brasil, a partir da sua independência, passa a procurar seu espaço nas relações do
capitalismo internacional. Porém, não executa grandes rupturas com a trajetória anteriormente
estabelecida, tanto em termos de estrutura econômica quanto em termos de realidade social e
de trato das manifestações da questão social.
Na verdade, o liberalismo é filtrado pelas elites nativas por meio de uma lente
singular: a equidade configura-se como emancipação das classes dominantes e
realização de um certo status desfrutado por elas, ou seja, sem incorporação das
massas; na visão de soberania, supõe-se que há uma independência vantajosa entre
as nações, numa perspectiva passiva e complacente na relação com o capital
(BEHRING, 2009, p. 73).
“O Estado Brasileiro nasceu sob o signo de forte ambiguidade entre um liberalismo
formal como fundamento e o patrimonialismo como prática no sentido da garantia dos
privilégios das classes dominantes” (BERHING, 2009, p. 75). Assim, o desenvolvimento da
política social acompanha a dinâmica da conformação do Estado Brasileiro emergente.
Deve-se levar em consideração que até o início do século XX, a postura liberal do
Estado brasileiro e o conservadorismo das elites dominantes não permitiram que as
manifestações sociais fossem tratadas para além de simples casos de polícia. A ampliação das
possibilidades de organização dos trabalhadores, emergentes nas primeiras décadas deste
século, é que tencionam as relações e fazem surgir uma nova postura em relação às
manifestações da questão social.
Sendo assim, o Estado brasileiro elegeu as questões relacionadas ao trabalho como
sendo centrais para a formulação de suas políticas sociais, especialmente pela sua necessidade
de implementar um processo acelerado de industrialização que reposicionasse o país no
contexto das nações capitalistas. As áreas que obtiverem maior atenção foram o trabalho e a
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previdência, porém isso ocorreu de forma limitada e precária, sendo que as demais áreas
como saúde, educação e habitação tiveram um tratamento apenas residual. (PEREIRA, 2006).
Foi assim que no ano de 1923 foi aprovada a lei Eloy Chaves que instituiu a obrigatoriedade
de criação de Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs), abrangendo apenas algumas
categorias planejadas de trabalhadores, este foi um ano chave para entender a política social
brasileira no período subsequente (BEHRING, 2009). “O Estado historicamente se apropria
não só da prática assistencial como expressão de benemerência como também cataliza e
direciona os esforços de solidariedade social da sociedade civil”. (SPOSATI, 2003, p. 41).
Vale ressaltar, ainda, que a política trabalhista, quando se tratava de regulamentação
das relações entre capital e trabalho, adotou uma forma de controlar as organizações
operárias, com o intuito de substituir o conflito pela harmonia social.
O assistencialismo social se constituiu, no decorrer dos anos, como um instrumento do
Estado para que se pudesse enfrentar as manifestações de âmbitos sociais. Para isto,
instituíram-se políticas que seriam responsabilizadas para o atendimento aos trabalhadores
identificados como pobres e carentes. Todavia, para entender melhor este contexto, é de
fundamental importância conhecer a trajetória histórica da política de assistência social como
prática.
A assistência é prática antiga na humanidade. Não se limita nem à civilização
judaico-cristã nem às sociedades capitalistas. A solidariedade diante dos pobres, dos
viajantes, dos doentes, dos incapazes, dos mais frágeis, se inscreve sob diversas
formas nas normas morais de diferentes sociedades. Ao longo do tempo grupos
filantrópicos e religiosos foram conformando práticas de ajuda e apoio. (SPOSATI,
2003, p 40).
Assim, pode-se perceber que a prática de ajuda e apoio é antiga, sendo ela instituída
através de solidariedade das pessoas quanto às mais necessitadas. Historicamente, a política
social se caracterizava pela caridade, ajuda, solidariedade, através de entidades religiosas. Ao
longo do tempo, tornou-se responsabilidade pública.
No Brasil, o reconhecimento da assistência social pelo estado aconteceu muito
lentamente, sendo que, é no espaço das relações sociais que se dá a busca de uma nova forma
de cidadania. Foi na revolução de 1930 em que se conduziu a questão social ao centro da
agenda pública. Nesta época, o Estado aumentou sua atuação no serviço social, sendo ela uma
resposta das lutas sociais e trabalhistas.
No Brasil, a extensão da cidadania às classes subalternizadas expande-se a partir da
Revolução de 1930, que direciona o Estado para o atendimento de direitos sociais dos
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trabalhadores. Deste processo, resulta o que Wanderley Guilherme dos Santos denomina a
extensão regulada da cidadania. Esta extensão, cujas raízes encontram-se não em um código
de valores políticos, mas em um sistema de estratificação ocupacional, é definida por norma
legal. Nesta ótica são entendidos como cidadãos aqueles cujas ocupações são reconhecidas e
definidas legalmente. Embute-se a cidadania na ocupação e os direitos passam a ter como
referência o lugar que o indivíduo ocupa no processo produtivo. Assim, a constituição da
cidadania espelha as desigualdades do processo produtivo e deste modo o reforça. (SPOSATI,
2003, p. 36).
Cabe salientar que até os anos de 1930 o país não entendia a pobreza como uma
expressão de cunho social. E, quando a questão era incumbência do Estado, era reconhecida
como um “caso de polícia” que não poderia ser resolvida de imediato.
Também na década de 30, surgiram os Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs),
cuja cobertura se dava acerca dos riscos ligados à perda da capacidade laboral, como a
velhice, a doença, entre outros aspectos.
No campo da assistência social, a primeira instituição que se surgiu foi a Legião
Brasileira de Assistência (LBA), que tinha sua gênese marcada pela presença de mulheres e
pelo seu patriotismo. A LBA assegurava estritamente para a sua presidência as primeiras
damas da República, investindo, dessa forma, a marca do primeiro-damismo junto à
assistência social, estendendo sua ação às famílias da grande massa não previdenciária,
atendendo, na ocorrência de calamidades, através de ações pontuais, urgentes e fragmentadas.
Após as campanhas de impacto realizadas junto aos chamados para a guerra, a LBA
seria a instituição a se firmar na área social, e sua ação assistencial foi implementada no
sentido de dar apoio político ao governo (MESTRINER, 2001, p. 145).
Para
desenvolver
essas novas questões, a LBA buscou auxílio junto às escolas de serviço social especializadas.
Dessa forma, houve uma aproximação de interesses recíprocos entre a LBA e o serviço social,
pois esta precisava de serviço técnico, de pesquisa e trabalhos na área social enquanto o
serviço social estava se firmando como profissão, precisando legitimar-se.
A LBA representou, na época, uma estratégia de legitimação do governo junto à
população pobre, cuja principal atividade era “assistir as famílias dos pracinhas que foram
para a guerra, e logo depois estender seu trabalho à população pobre, principalmente com
programas na área materno-infantil”. (COUTO, 2006, p. 103).
Adentrando às décadas de 1954 a 1964, percebe-se que o planejamento central do
Brasil passou a ser valorizado. Porém, os aspectos sociais continuaram marginalizados. E,
quando eram idealizados, sempre ficavam a serviço da rentabilidade econômica e do
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crescimento industrial, como aconteceu no governo Juscelino Kubitschek, que incluiu a
educação no seu Plano de Metas (PEREIRA, 2006).
A subordinação dos valores da equidade e da justiça social aos interesses da
maximização econômica impediu que o envolvimento estatal na regulamentação e
na provisão sociais viesse a significar ponderável mudança no padrão da política
social herdado do período anterior (PEREIRA, 2006, p,130)
Sendo assim, as principais medidas de proteção social nesse período foram durante o
governo Vargas, com a inserção do salário mínimo, reestruturação do Ministério da Educação
e Saúde, criação do imposto sindical e uma nova legislação sobre acidentes de trabalho. O
caminho das políticas públicas sociais foi marcado pela lenta ampliação dos direitos e também
pelo golpe de 1964 que determinou uma nova ditadura que durou 20 anos, conduzindo a um
novo momento de modernização conservadora no Brasil, com consequências para a política
social.
Em 1969, a LBA foi transformada em fundação e vinculada ao Ministério do Trabalho
e Previdência Social, tendo sua estrutura ampliada, contando com novos projetos e programas.
A ditadura militar cria, sob o comando de Geisel, em 1º de Maio de 1974, o Ministério da
Previdência e Assistência Social (MPAS). Esse foi o órgão de destaque para a elaboração da
política de ataque a pobreza.
A ditadura militar conduziu, também, para a perda de liberdades democráticas através
da censura, prisão e tortura, em que o bloco militar buscou legitimação por meio da expansão
e modernização das políticas sociais. Um exemplo disso é a centralização da Previdência
Social no Instituto Nacional da Previdência Social (INPS) que retirou os trabalhadores da
gestão, passando a trata-los como questão técnica (BERING, 2009).
Além dessa intensa institucionalização da previdência, da saúde e, com menor
importância, da assistência social, que era basicamente implementada pela rede
conveniada e de serviços prestados pela LBA, a ditadura impulsionou uma política
nacional de habitação, uma estratégia de impulsionar a economia por meio do
incremento da construção civil na construção de moradias populares (BEHRING,
2009, p. 137).
Após ser definido um modelo econômico e político a partir de 1967, a política social
tornou-se um meio importante de acumulação de riquezas, pois os programas sociais tinham
como objetivo atender os interesses da economia de empresa, ou seja, os programas tiveram a
sua execução privatizada (PEREIRA, 2006).
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Essas formas autoritárias constituíram-se como um golpe no processo de expansão
política. Por isso, aconteceram movimentos sociais reivindicando por democracia. Como
resposta aos movimentos, o governo tratou de instituir uma nova política salarial e
reestabelecer habeas corpus para crimes políticos. (PEREIRA, 2006). “Foi nesse contexto que
a política social passou a ser estrategicamente intensificada, não como resposta de consciência
às necessidades sociais, mas como uma via de reaproximação do Estado com a sociedade”.
(PEREIRA, 2006, p 144).
Nesse sentido, os grandes focos da pobreza colocavam-se como o principal alvo dessa
política. O governo, sem poder negá-la, teve como tática incluí-la nos Planos de
Desenvolvimento, ampliando os benefícios da ação do Estado e, ao mesmo tempo, criando
uma nova estratégia social, como resultado de uma primeira articulação do governo e
sociedade.
Nesse mesmo espaço, a ditadura militar trouxe uma maior abertura para a saúde,
previdência e educação privadas, ou seja, para quem podia pagar e também para quem não
podia, tornando-se essa uma herança da ditadura para a política social. Em 1974, começam a
manifestar-se os primeiros sinais de esgotamento da ditadura, em função de impactos de
economia internacional.
Com a expansão do capital e as condições do trabalhador, o Estado apropriou-se da
assistência social sob duas formas: a primeira como uma forma de enfrentar politicamente a
questão social, e a outra forma para dar conta das condições apuradas de miséria da força de
trabalho (SPOSATI, 2003).
A partir da crise mundial do capitalismo, o Estado reposicionou-se frente à sociedade,
inserindo-se na relação entre capital e trabalho. Essa inserção é caracterizada de um lado, por
melhores condições de acumulação; e, por outro lado, passa a assumir responsabilidades pelas
condições de vida da população.
A assistência social começa a se configurar mais como uma esfera programática da
ação governamental para prestação de serviços, do que como mecanismo de política para
melhorar as tensões sociais (SPOSATI, 2003). Ao final da década de 70 e começo de 80, a
relevância dos processos alternativos resultantes da organização popular confrontando o
autoritarismo e os estudos sobre a espoliação do trabalhador que matiza tais análises.
(SPOSATI, 1995, p. 14).
Sendo assim, a relevância da importante organização popular e as lutas sociais
reforçaram a organização da política de assistência social, a fim de garantir direitos na
14
melhoria das condições de vida da classe de trabalho, pois o país era dominado pela
acumulação.
A questão social toma mais visibilidade com o fim da repressão, proporcionando um
campo fértil para o desenvolvimento dos movimentos sociais que, com poder de pressão,
almejavam legitimar suas demandas, proporcionando visibilidade à assistência social ao lado
das demais políticas públicas como estratégia privilegiada de enfrentamento da questão social,
objetivando a diminuição das desigualdades sociais. Para as classes subalternadas, a política
social de assistência social configura-se como um espaço de garantia de direitos,
possibilitando serviços e benefícios que, de outras formas, lhe são negados; um espaço de
lutas, reivindicações, na garantia de direitos. Já a década de 1980 inaugurou um novo patamar
na relação entre Estado e sociedade. Foi marcada pela transição dos governos militares à
constituição da democracia. (COUTO, 2006, p. 140).
Nesta década, os estudos e a própria política permitem uma maior compreensão das
contradições que norteiam a esfera da assistência social, sendo que esta apreensão necessita
de uma análise profunda, levando-se a uma leitura do assistencial como um mecanismo
primordial do significado histórico das diferentes formas de enfrentamento das manifestações
da questão social.
1.1 Constituição Federal a partir de 1988
Pode-se considerar que a Constituição Federal de 1988 foi um marco para o
desenvolvimento das políticas sociais brasileiras, pois foi a partir dela que ficaram
assegurados os direitos sociais e individuais, reconhecendo a assistência social como política,
juntamente com as políticas de saúde e de previdência, formando o que se chama de Tripé da
Seguridade Social – saúde, assistência e previdência. A partir disso, a assistência social
passou a se transformar em um direito ativo, e seus usuários passaram a ser sujeitos
possuidores do direito à proteção devida do Estado. Assim, a assistência social passa a ser
direito de todos, não importando cultura, religião ou classe, ou seja, é uma garantia a todas as
pessoas que dela necessitarem.
Quando falo em direito de cidadania ativo, quero referir-me, sobretudo, à qualidade
peculiar dos direitos sociais de se concretizarem em políticas públicas mediante
efetivo comprometimento do Estado com o bem-estar de indivíduos e grupos
(PEREIRA, 1996, p. 100).
15
A Carta Magna de 1988 ofereceu um espaço de reflexão e mudança, inaugurando um
padrão de proteção social positivo de direito que ultrapassasse as práticas assistenciais, além
do surgimento de novos movimentos sociais objetivando sua efetivação. Esta Constituição ao
mesmo tempo em que encerra uma legislação formal, inicia um processo de consolidação da
proteção social.
Nesta senda, negociada através de um movimento nacional com o Governo Federal,
foi aprovada, em dezembro de 1993, a Lei Orgânica de Assistência Social - LOAS, que
iniciou o processo de construção da gestão pública e participativa da assistência social através
dos Conselhos deliberativos e partidários da União, Estados, Distrito Federal e Municípios,
bem como da realização das conferências nacional, estaduais e municipais de assistência
social.
A LOAS organiza a política social de assistência social em uma estrutura
descentralizada e participativa que direciona funções específicas para cada nível de Governo.
O Governo Federal mantém a prerrogativa de elaborar normas gerais da política da assistência
social, garantir o financiamento e execução dos benefícios de prestação continuada, apoiar
financeiramente os programas, projetos e serviços de enfrentamento à pobreza em âmbito
nacional, assumindo, assim, o papel de articular da unidade nacional.
A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade
Social não contributiva, que prevê os mínimos sociais realizada através de um
conjunto integrado de ações de iniciativa públicas e da sociedade, para garantir o
atendimento às necessidades básicas (LOAS, Art. 1º).
A inserção da Assistência no âmbito da Seguridade Social aponta para seu caráter de
política de proteção social articulada com outras políticas do campo social, voltadas à garantia
de direitos e de condições dignas de vida, para que se garanta um atendimento às necessidades
de cada sujeito, sendo este, então, um direito do cidadão.
Para isso, a participação da sociedade é de suma importância para que seja
desenvolvida uma maior valorização das políticas sociais, em que se permita a visibilidade
das demandas sociais, provocando avanço e melhoria dessas políticas. As organizações da
sociedade civil permeiam as ações estatais, visando à garantia de direitos.
Na política da assistência social, o Estado oferece serviços e coordena a rede
socioassistencial, regula e financia os serviços, também institui outras formas de participação
como as do controle social e das comissões intergestoras. Pode-se, assim, verificar a
prevalência desse modelo de divisão de responsabilidades com o enfrentamento da pobreza e
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exclusões sociais, tanto na prestação de serviços diretos por organizações não
governamentais, denominadas de organizações de assistência social, quanto no trato com a
família, de maneira a reforçar suas funções de proteção.
A proteção social são formas institucionalizadas para proteger parte ou conjunto de
seus membros. Tais sistemas decorrem de certas vicissitudes da vida natural ou
social, tais como a velhice, a doença, o infortuno, a privações (PNAS apud DI
DIOVANNI, 1998, p. 10).
Yazbek (2008) aborda a Política Social enquanto modalidade de intervenção do
Estado no âmbito do atendimento das necessidades sociais básicas dos cidadãos e afirma que
ela responde a interesses diversos.
A Política Social expressa relações, conflitos e contradições que resultam da
desigualdade estrutural do capitalismo. Interesses que não são neutros ou igualitários
e que reproduzem desigual e contraditoriamente relações sociais, na medida em que
o Estado não pode ser autonomizado em relação à sociedade e as políticas sociais
são intervenções condicionadas pelo contexto histórico em que emergem.
(YAZBEK, 2008, p. 82).
A política social, no capitalismo, não é capaz de modificar o quadro de suas
condições. Mas é de fundamental importância considerar-se ela como um avanço das lutas
dos trabalhadores, tendo em vista elevar o padrão de vida da maioria das pessoas. Behring
(2009) afirma que no Brasil a política social assume caráter instável, restrita e segmentada
desde seus primórdios, pois são também resultado das medidas esparsas e frágeis de proteção
social que se desenvolveram no país.
A política de assistência social tem um novo modelo no Brasil, pois, em termos legais,
não existe mais lugar para a caridade, ou para a ação paternalista como ocorreu ao longo da
história da assistência social e, conforme já citado, a LOAS nasceu para mudar esses
paradigmas. A LOAS trata-se de um documento que é produto e expressão de debates e
embates políticos nem sempre tranquilos e consensuais (PEREIRA, 1996). Ela prevê, em suas
principais diretrizes, a responsabilidade do Estado na coordenação e execução da política de
assistência social, possibilitando o acesso aos benefícios e serviços assistenciais, a divulgação
das informações, a participação da sociedade no controle da política, conferindo à assistência
social um caráter de política pública.
17
A assistência social não é um fenômeno dado, mas produzido e reproduzido e, com
tal, sujeito a constantes modificações no tempo e no espaço. Estas modificações
decorrem tanto de mudanças estruturais, ao nível da economia, quanto de mudanças
políticas, no âmbito das relações conflituosas de interesses entre sujeitos
diferenciados. (PEREIRA, 1996, p. 105).
A LOAS integra a prestação de serviços assistenciais, programas de assistência social
e projetos de enfrentamento da pobreza, já que a assistência social deve se preocupar com os
novos modelos de pobreza e de exclusão social que atingem parcelas consideráveis da
população.
A ênfase nos serviços, programas e projetos reflete a preocupação da LOAS de
apontar para a importância da relação orgânica entre política social de assistência
social e as demais socioeconômicas setoriais, tendo em vista não só a eficiência das
ações assistenciais, mas também a extensão destas políticas públicas para a sua
efetiva universalização (PEREIRA, 1996, p. 106).
Na medida em que a assistência social desempenha ativamente a sua função de incluir
os sujeitos que se encontram fora da sociedade por motivo de pobreza, desemprego, entre
outros, no bojo das políticas sociais, ela deixará de ser pontual, isolada e restrita, cumprindo,
assim, seu papel universal essencial. Para isso, foi instituída a Política Nacional de
Assistência Social, para que seja cumprida a função essencial de inclusão social.
A Política Nacional de Assistência Social – PNAS, aprovada na IV Conferência
Nacional de Assistência Social em 2003, foi criada com o objetivo de organizar o processo de
descentralização da Assistência Social entre União, Estado e Municípios, e de promover a
defesa e atenção dos interesses e necessidades sociais. Baseia-se em ações de prevenção,
proteção, promoção e inserção social, ações essas voltadas para as famílias. Assim, a PNAS
objetiva garantir os mínimos sociais, fortalecendo os princípios amplos, democráticos e de
direitos.
Esses instrumentos normativos estabelecem as condições de gestão, de financiamento,
de controle social, de competências dos níveis de governo com a gestão da política, comissões
de pactuação, negociação e de avaliação. Criam, por exemplo, conselhos deliberativos e
controladores da Política de Assistência Social, Fundos Especiais para a alocação de recursos
financeiros específicos da Assistência Social e órgãos gestores da Política de Assistência
Social, em todos os níveis de governo, além de Comissões Intergestoras Bipartites e
Tripartites (PNAS, 2004).
Assim, em 2004 a PNAS definiu as bases para o novo modelo de gestão da política
pública de Assistência Social através da instituição do Sistema Único de Assistência Social –
18
SUAS, que tem como modelo uma gestão descentralizada e participativa, com foco no
atendimento às famílias, seus membros e indivíduos. O SUAS materializa o conteúdo da
LOAS, consagra os direitos de cidadania e inclusão social, bem como a efetividade da
assistência social política. A implantação do SUAS caracteriza-se por uma revolução na
assistência social brasileira, planejado e executado pelos governos em âmbito Federal,
Estadual, Municipal e do Distrito Federal em parceria com a sociedade civil.
A Política Nacional de Assistência Social que institui o SUAS define dois patamares
de proteção social: a básica e a especial, para que seja garantida a segurança de sobrevivência
e de acolhida e convívio ou vivência familiar dos sujeitos. Essa nova organização explicita a
universalização da proteção social aos cidadãos, e a organização, responsabilidade e
funcionamento de seus serviços e benefícios nas três esferas de governo.
A proteção social encontra-se dividida em dois patamares de proteção social. Isso se
faz conforme a população que será atendida, sendo que em um dos patamares está a Proteção
Social Básica, que tem por objetivos prevenir situações de risco social e o fortalecimento de
vínculos familiares. Destina-se à população que se encontra em situação de vulnerabilidade.
Ela é de responsabilidade dos Centros de Referências de Assistência Social – CRAS, que são
unidades públicas estatais, destinadas ao atendimento socioassistencial de famílias em
situação de vulnerabilidade social.
O
CRAS
é
o
principal
equipamento
de
desenvolvimento
dos
serviços
socioassistenciais da Proteção Social Básica. Investe no espaço de efetivação dos direitos
socioassistenciais, realizando a política de assistência social. É por meio do CRAS que a
proteção social se concretiza, reconhecendo as dificuldades, bem como estimulando as
potencialidades locais, modificando a qualidade de vida das famílias no vínculo social.
Caracteriza-se como a principal porta de entrada do SUAS, ou seja, é uma unidade que
possibilita o acesso de um grande número de famílias à rede de proteção social de Assistência
Social.
Os CRAS contam com uma equipe mínima que se constitui por dois profissionais de
nível médio e dois profissionais de nível superior, sendo um assistente social e o outro que
seja preferencialmente um psicólogo, contando também com um coordenador com nível
superior. Vale ressaltar, contudo, que a formação da equipe dessas instituições depende do
número de famílias referenciadas, do tamanho e do porte do município.
Para que se possa entender melhor o conceito do CRAS e de qual é o papel do
psicólogo, será abordado, no próximo capítulo, com maior profundidade, o que caracteriza a
19
instituição desses Centros na sociedade e como se dá o trabalho do psicólogo, que foge um
pouco de um trabalho clínico, adentrando na esfera social.
20
2 O TRABALHO DO (A) PSICOLOGO (A) NO CENTRO DE REFERÊNCIA DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL (CRAS)
Segundo pesquisa desenvolvida em Sergipe, na qual foram pesquisados 32 psicólogos
de 28 cidades, apontam que são poucos os profissionais que atuam dentro de instituições
vinculadas a serviços de assistência social e tem algum tipo de formação ou curso de
especialização que sejam específicos na área de políticas publicas sociais. Com isso, entendese, também, que os cursos de Psicologia, na sua maioria, ainda têm grades curriculares que
priorizam, fundamentalmente, a formação acadêmica clínica visando atender apenas o sujeito
individualizado em espaço reservado ao setting terapêutico, com pouca ou nenhuma inclusão
de temáticas que permitam a discussão de políticas públicas da assistência social ou práticas
que preparem os alunos para atuarem com problemas sociais e comunitários (CRUZ, 2009).
No decorrer deste capitulo vamos articular algumas responsabilidades do psicólogo
dentro do Centro de Referência de Assistência Social – CRAS, e de que forma este
profissional realiza seu trabalho, apesar do pouco conhecimento acadêmico neste campo que
ainda é muito recente para a psicologia.
Nessa esfera, foi com a criação do SUAS em 2003 que se abriu espaços de trabalho
para o psicólogo dentro da proteção social básica e também que se determinou que quem
participa da proteção básica são famílias cujos membros estão em situação de vulnerabilidade
social. Para a realização de atividades socioassistenciais previstas na proteção básica, o SUAS
instituiu os CRAS’s como um local de referência, sendo ele um equipamento estatal.
O CRAS presta serviços de acolhimento, grupos de convivência, acompanhamentos
em serviços socioeducativos, visitas domiciliares, encaminhamentos para a rede de proteção
social e orientação sobre os direitos familiares e sociais. Promove o acesso de documentação
pessoal, atendimentos individuais, previne situações de riscos de pessoas que vivem em
situações de vulnerabilidade social, cadastramento socioeconômico, elaboração de relatórios e
prontuários. É por meio do CRAS que a proteção social básica se concretiza, reconhecendo-se
as dificuldades sociais e a importância da existência de políticas sociais, bem como o estímulo
às potencialidades locais, modificando a qualidade de vida das famílias no vínculo social.
As pessoas que se encontram em situações de vulnerabilidades sociais, na grande
maioria, apresentam sinais de condições precárias de moradia e saneamento, desnutrição, não
possuem emprego e seus vínculos sociais são escassos. Esses fatores compõem o risco social.
A pessoa que está nessa situação torna-se um excluído. Indivíduos são impossibilitados de
partilhar dos bens e recursos oferecidos pela sociedade, sendo, consequentemente,
21
abandonados e expulsos dos espaços sociais. As pessoas que procuram a assistência social
geralmente têm sua vida marcada por essa trajetória de exclusão, de rompimento dos vínculos
familiares, comunitários e sociais.
Sendo assim, o CRAS, além de porta de entrada para o sistema, é responsável pela
aplicabilidade das atividades do PAIF, que se configura como importante estratégia do SUAS
para a implementação da política de assistência social.
Logo, a equipe do CRAS é responsável pelo desenvolvimento do Programa de
Atenção Integral às Famílias (PAIF) que prestar informação e orientação à
população de sua área de abrangência, bem como articular a rede de proteção social
local no que se refere aos direitos de cidadania, mantendo ativo um serviço de
vigilância da exclusão social na produção, sistematização e divulgação de
indicadores da área referenciada pelo o CRAS, em conexão com outros territórios.
(CRUZ, 2009, p.14).
O modelo de família nuclear é composto hierarquicamente pelo marido ou pai, o qual
exerce autoridade e poder sobre a esposa e os filhos, desempenhando, assim, o papel de
provedor. Dentro dessa família, são atribuídas atividades masculinas e femininas. O SUAS,
por sua vez, refere-se aos diversos modelos existentes de organização familiar que, com o
passar dos tempos, foram sendo construídas, em especial, aquelas famílias que são
constituídas pela mulher como “chefe da família” e seus filhos e filhas, sendo eles biológicos
ou não, resultantes de uma ou mais uniões, de um companheiro/a, permanente ou ocasional;
ou, ainda, por outras pessoas que gravitem em torno desse núcleo. Sendo assim, o CRAS atua
prioritariamente junto às famílias em estado de vulnerabilidade social e, nesta proteção, o
trabalho deve considerar novas referencias para a compreensão dos diferentes moldes
familiares, superando o reconhecimento de um modelo único baseado na família nuclear.
O CRAS trabalha com a prioridade da inclusão social de famílias que vivem em
situação de instabilidade, econômica e social. Para que haja inclusão, primeiramente, a
sociedade exclui. É o que se verifica nas palavras de Sawaia (2001):
“A sociedade exclui para incluir e esta transmutação é condição da ordem social
desigual, o que implica o caráter ilusório da inclusão. Todos estamos inseridos de
algum modo, nem sempre decente e digno, no circuito reprodutivo das atividades
econômicas, sendo a grande maioria da humanidade inserida através da insuficiência
e das privações que se desdobram para fora do econômico.” (SAWAIA 2001, p.8).
Assim, pode-se perceber que a inclusão não é apenas econômica, mas também no
terreno de qualquer insuficiência, transformando-se aquele espaço de vulnerabilidade em um
22
espaço sociável para se ter um convívio familiar melhor, pois o principal trabalho do CRAS é
com as famílias em situação vulneráveis (SAWAIA, 2001).
O CRAS desenvolve suas atividades com uma equipe que tem como técnicos
obrigatórios dois profissionais com formação superior, sendo que um deles tem que ser
assistente social e o outro, preferencialmente, um psicólogo. São responsáveis pelo
desenvolvimento, planejamento e execução das políticas da assistência social. As propostas de
intervenção devem ser de caráter psicossocial exigindo, dessa maneira, da equipe de trabalho,
predisposição para trabalhar e desenvolver projetos dentro de uma perspectiva
interdisciplinar. (XIMENES, 2009).
Para que o psicólogo possa realizar seu trabalho nessa perspectiva psicossocial, ele
precisa buscar dentro de outros contextos metodológicos que estejam focados ao método
social, saindo, assim, da esfera da psicologia clínica.
Temos, aqui, a necessidade de mudanças nos referenciais teórico-metodológicos, na
fundamentação dos programas, projetos, serviços e benefícios que devem se dar em
nova ótica, investindo-se no potencial humano. Esse investimento pode produzir
superação e desenvolvimento, mas, para tanto, também são fundamentais mudanças
na forma de compreendermos a pobreza e a maneira de atuarmos sobre ela, gerando,
por meio dos vínculos estabelecidos no atendimento, e de um conjunto de ações
potencializadores, o rompimento do ciclo de pobreza, a independência dos
benefícios oferecidos e a promoção da autonomia, na perspectiva da cidadania,
tendo o indivíduo como integrante e participante ativo dessa construção (CREPOP,
2008, p.29).
O guia que serve de referência para o psicólogo é denominado de “Referências e
Técnicas para a atuação do psicólogo no CRAS/SUAS”, publicado em 2007 e reimpresso em
2008. O documento busca produzir informação qualificada para ampliar a compreensão dos
psicólogos em torno do trabalho no campo, assim como fornecer instrumental teórico-técnico
que subsidie o planejamento, a execução e o monitoramento de suas ações na proteção social
básica. (CFP, 2008).
Este documento reitera a Psicologia como uma prática que deve se comprometer com
a transformação social e “toma como foco as necessidades, potencialidades, objetivos e
experiências dos oprimidos” (CFP, 2008, p.22). Embora o documento faça menção principal
ao discurso da transformação social e da emancipação, ao ser analisado, percebe-se que o
papel da psicologia continua vinculado ao individuo e a sua subjetividade. Tem-se, como
exemplo disso, no eixo de apresentação do guia, em que se aponta o sujeito (em interação
com o contexto social) como alvo do trabalho. Além desse papel, o documento propõe que os
psicólogos atuem sobre a subjetividade dos indivíduos, em que possam favorecer sua
23
autonomia, pontuando que a pessoa deve ocupar um lugar de poder “de construtor de seu
próprio direito e da satisfação de suas necessidades” (CFP 2008, p.23).
Botarelli (2008) acredita que a autenticidade da atuação do psicólogo está no seu
trabalho com a singularidade e a subjetividade, mas esses aspectos devem ser tratados de
forma coletiva e não devem ser tratados de forma isolada do coletivo. Busca-se “garantir a
transposição de potência de ação da vida íntima também para o campo de proteção social
diversificado e amplo que o serviço público pode oferecer, inserindo competência política e
humanização na ação coletiva dos usuários” (BOTARELLI 2008, p.21). Para desenvolver um
trabalho voltado para a psicologia social, o psicólogo precisa conhecer a realidade da
comunidade na qual irá trabalhar, já que é a partir das necessidades dessa comunidade que se
realizará um projeto psicossocial.
É notório que a atuação do psicólogo dentro dos CRAS ainda está muito voltada à
psicoterapia e pouco se sabe sobre as ações comunitárias. A psicoterapia é desenvolvida em
grupos e muitas vezes ainda individual. Sabe-se que, no caso de haver demanda para
acompanhamento psicoterapêutico, o CRAS não é lugar para tal, devendo-se referenciar a
demanda para outras instituições que compõem a rede assistencial, sendo elas dentro ou fora
da política de assistência social.
O trabalho na proteção social básica exige dos psicólogos não apenas uma
adequação do trabalho; exige um conhecimento de aspectos que estão fora do
escopo do que a Psicologia delimitou em seus campos de saber. A atuação com
pessoas em situação de pobreza exige não a adequação de um conhecimento teóricotécnico, mas, sim, a criação de novos conhecimentos e uma mudança na postura que
marca historicamente a atuação dos psicólogos. A noção de “sujeito psicológico”
não cabe nos desafios do CRAS, nem tampouco a crença de que a Psicologia só
intervém no sofrimento psíquico ou no ajustamento. Pensar numa atuação que
conjugue um posicionamento político mais crítico por parte dos psicólogos, com
novos referenciais teóricos e técnicos que podem ou não partir dos já consolidados,
mas que necessariamente, precisariam ultrapassá-los, é o grande desafio para a
profissão no campo das políticas sociais em geral (YAMAMOTO, 2010, p. 21).
Sendo assim, os psicólogos, de maneira geral, ainda têm pouco esclarecimento sobre a
forma de atuação no campo social, até mesmo confundindo-o com a área clínica. Pode-se
pensar que isso acontece por ainda existir pouco ou nenhum interesse dos profissionais pela
área, e poucos cursos com ênfase em psicologia social e políticas públicas. A falta de
conhecimento dos psicólogos faz com que em muitos CRAS se desvie o foco de trabalho que
deve ser desenvolvido dentro deste espaço.
24
2.1 Psicologia Social e a Psicologia Social Comunitária
Sobre esse tópico, é necessário, inicialmente, ressaltar, que o desenvolvimento de
ações no tecido comunitário é uma premissa muito evidente na atual política de assistência
social. Isso porque se afirma que a “proteção social exige a capacidade de maior aproximação
possível do cotidiano da vida das pessoas, pois é nele que riscos de vulnerabilidades se
constituem” (Brasil, 2005a, p. 15). Onde se integra a essa busca de atuar “com famílias e
indivíduos em seu contexto comunitário” (Brasil, 2005a, p. 35), a proposta desenvolvida pela
PNAS põe em destaque a necessidade de que a perspectiva sob tal dinâmica territorial esteja
“...pautada na dimensão ética de incluir os ‘invisíveis’, os transformados em casos
individuais, enquanto, de fato, são parte de uma situação social coletiva”(Brasil 2005a, p. 15).
No decorrer deste trabalho, viu-se que, desde a década de 60, no Brasil, foram
desenvolvidos alguns trabalhados em comunidades com situações de vulnerabilidade, com o
intuito de despertar consciência crítica no sujeito e possibilitar melhores condições de vida na
população. Caracterizou um modelo de atuação baseado no espaço teórico e prático da
psicologia social. Assim, foram realizados trabalhos com a educação popular, como a
alfabetização de adultos, instrumento para a conscientização, método que, aos poucos, foi
sendo denominado de psicologia comunitária ou psicologia na comunidade.
Segundo Góis (1994, p. 43), a Psicologia Comunitária é uma área da Psicologia social
que estuda a atividade do psiquismo relativo ao modo de vida do lugar onde vive, ou seja, da
comunidade, o qual visa o desenvolvimento da consciência dos moradores como sujeitos
históricos e comunitários, através de um esforço interdisciplinar que percorre a organização e
o desenvolvimento dos grupos e da comunidade.
Segundo Quintal de Freitas (1998, p. 1), “a visão de homem e a de mundo, assumidas
e vividas pelos profissionais, é que se constitui em aspecto crucial na criação ou determinação
das possibilidades sobre o como estudar, pesquisar e/ou intervir”. A partir da psicologia
comunitária, a compreensão das recorrências e singularidades dos mais variados ajustes
microssociais, traz à tona o pressuposto de que o ser humano não somente reage às
determinações sociais, mas também se constitui em um ator social que participa da criação da
vida cotidiana (MONTERO apud XIMENES 2009).
O trabalho dos psicólogos está em torno dos processos de intervenção acerca dos
modos de vida comunitários, tendo em vista o seu caráter mediador na construção de práticas,
saberes e atores sociais. Os seguintes processos, dessa dimensão, se fazem interligados
complexamente entre si e em intensas, contínuas, diferentes conexões com outros contextos
25
socioculturais. Nesse cenário, a psicologia social comunitária utiliza-se do conteúdo teórico
da psicologia social, privilegiando o trabalho com os grupos, colaborando para a formação da
consciência crítica e para a construção de uma identidade social e individual orientadas por
preceitos eticamente humanos (FREITAS, 1987).
O distanciamento do psicólogo dos espaços tradicionais para as contingências que
existem nos espaços de convivência comunitária não se justifica, então, pela extensão do
serviço psicológico, nos seus moldes tradicionais, a parcelas socioeconomicamente não
favoráveis da população; explica-se, sim, pelo argumento segundo o qual as comunidades
possuem uma série de redes interativas que percorrem – junto com outros transmissores – a
composta construção de pessoas e grupos que ali vivem, podendo, assim, servir de base para
que a prática psicológica seja constituída de modo oposto a rumos psicologizantes.
Dessa forma, pode-se entender que a presença do psicólogo nas ações de Proteção
Social Básica pode contribuir para abranger as possibilidades dessas ações, na medida em que
permite “uma compreensão mais subjetiva da realidade local, isto é, ver que as localidades
são realidades profundamente humanas e simbólicas, sendo, por isso, um erro pensá-las
somente em termos sociológicos e econômicos” (Góis, 2005, p. 73).
Diante deste ponto de vista, de acordo com Sawaia (2004), no local polissêmico das
discussões em torno da pobreza, dos direitos sociais e da cidadania, tem-se também que pôr
em destaque as singularidades e as referências espaços-temporais das pessoas que vivenciam
as expressões complexas da desigualdade social, sendo este o patamar para o
desenvolvimento do trabalho da psicologia, bem como para desvendar a emergência da
afetividade e do sofrimento ético-político como importantes categorias analíticas na
compreensão da dialética exclusão-inclusão social que, ao mesmo tempo, resplende,
singulariza-se e se constitui nas dinâmicas das comunidades.
Faz-se importante pontuar que o desenvolvimento de ações no espaço comunitário não
necessariamente aponta aumento de vínculos sociais, tampouco lineamentos transformadores
daquela dinâmica intersubjetiva, mesmo porque tais ações podem se agregar a diferentes
gradações conceituais e políticos.
Enfim, o tipo de atuação comunitário baseia-se na construção compartilhada de
conhecimentos em forma de diálogo e colaborativa, na qual se salienta a problematização de
saberes e de relações de poder projetados, e, por vezes, naturalizados no dia-a-dia. Nessa
perspectiva, a produção de problemas assume importância concludente, na medida em que as
problematizações determinadas diante de acontecimentos já naturalizados produzem
26
deslocamentos por vezes em desordem, que abrem possibilidades de sentido, ações e modos
de vida antes impensáveis. (Diehl, Maraschin, & Tittoni, 2004, p. 410).
Dados os pontos da psicologia comunitária, a atuação comunitária pode dar corpo ao
desejo de expandir vínculos familiares e comunitários sob o ponto de vista da cidadania. Isso
porque vários profissionais das áreas sociais que constituem a dinâmica comunitária são
considerados co-criadores das ações que são desenvolvidas pelo psicólogo e pela equipe
multiprofissional com a qual este venha a trabalhar. Assim, tais profissionais participam
ativamente da sua execução e do seu planejamento.
No que diz respeito às diretrizes metodológicas das ações de Proteção Social Básica,
seus profissionais são orientados a “construir, em conjunto com as famílias, planos de ação
que concretizam projetos de vida, a partir de necessidades sociais existentes e expectativas e
desejos para o futuro...” (Brasil, 2005b, p. 17). Isso demanda a necessidade de “articular o
conhecimento da realidade das famílias com o planejamento do trabalho” (Brasil, 2005b, p.
16).
A psicologia comunitária, a análise, a vivência e a co-construção de atividades
comunitárias, mediante um método dialógico-vivencial (Góis, 2005) podem simbolizar
elementos relevantes em função de, ao menos, dois lados: em primeiro lugar, porque podem
auxiliar a efetivação das próprias diretrizes já apresentadas e, em segundo lugar, porque
ampliam o campo de clareza relativo à atuação do psicólogo nas ações dignamente grupais da
Proteção Social Básica.
Assim sendo, a atividade comunitária, conceito sistematizado por Góis (1994, 2005) a
partir da teoria da atividade (Leontiev, 1978), assume lugar de destaque na prática da
Psicologia e proporciona o desenvolvimento dos seus participantes e a potencialização da
relação destes com o lugar onde vivem. Tal como conceitua Góis (2005, p. 89), a atividade
comunitária realiza-se “por meio da cooperação e do diálogo em uma comunidade, sendo
orientada por ela mesma e pelo significado (sentido coletivo) e sentido (significado pessoal)
que a própria atividade e a vida comunitária têm para os moradores da comunidade”.
As atividades que são desenvolvidas, nesse sentido, são articuladas através do
cotidiano das próprias comunidades, onde criam momentos de socialização entre os
moradores, formam grupos, constituem redes de apoio entre os moradores e realizam trocas
de experiências, no qual o ponto principal é o dia a dia de cada sujeito na sua subjetividade.
27
(...) provocar impactos na dimensão da subjetividade política dos usuários, tendo
como diretriz central a construção do protagonismo e da autonomia, na garantia dos
direitos com superação das condições de vulnerabilidade social e potencialidades de
riscos (BRASIL, 2006, p. 13).
Segundo Santos (2013 p. 703) “as concepções atuais da subjetividade redimensionam
a importância dos aspectos sociais e coletivos para a construção dos sujeitos, aspectos esses
que são construídos a partir da realidade social e expressos através dos significados, emoções,
ideias, discursos e etc”, sendo que, a desigualdade social gera reflexões na constituição da
subjetividade tanto individual quanto social. Para que se organize a subjetividade, ela precisa
ser representada através de histórias individuais associadas a elementos das histórias
coletivas; desta forma é que a subjetividade fica configurada.
A desigualdade social produz fortes reflexões sobre a constituição da subjetividade
tanto social quanto individual. A subjetividade, como visto anteriormente, pode ser
configurada como unidades representativas das sínteses das histórias de cada indivíduo,
associadas aos elementos das histórias coletivas. Dessa forma, a subjetividade representa o
sujeito através da sua própria expressão, sendo ela manifestada na subjetividade individual,
em que podem ocorrer mudanças que dependem do contexto da subjetividade social
(SANTOS, 2013).
Segundo Azevedo (2009, p. 69), “o desenvolvimento do indivíduo na sociedade e a
maneira pela qual a subjetividade é construída a partir da interação simbólica, representam as
principais temáticas da psicologia social e comunitária. Numa perspectiva de integrar essas
concepções teóricas enfatizando a importância das práticas sociais, foi construída e
desenvolvida a psicologia social comunitária. Dessa forma, estabeleceu-se uma identidade
profissional para o psicólogo que atuava nas comunidades e em outras instituições com o
enfoque social”.
Quando se fala das diretrizes metodológicas das ações de Proteção Social Básica, seus
profissionais são orientados a “construir, em conjunto com as famílias, planos de ação que
concretizam projetos de vida, a partir das necessidades sociais existentes e expectativas e
desejos para o futuro...” (Brasil, 2005b, p. 17).
28
...embora tendo como premissa fundamental a negação de que a ação profissional
(de qualquer categoria) possa vir a ser o eixo de transformações estruturais, as
possibilidades de ação do profissional de Psicologia rumo a práticas diferenciadas
também devem ser colocadas no contexto do papel do intelectual numa sociedade
contraditória. Nessa direção, o desafio posto para a categoria é ampliar os limites da
dimensão política de sua ação profissional, tanto pelo alinhamento com os setores
progressistas da sociedade civil, fundamental na correlação de forças da qual
resultam eventuais avanços no campo das políticas sociais, quanto pelo
desenvolvimento, no campo acadêmico, de outras possibilidades teóricotécnicas,
inspiradas em outras vertentes teórico-metodológicas que as hegemônicas da
Psicologia (YAMAMOTO, p. 35, 2007).
A importância de conhecer as atividades comunitárias já desenvolvidas no local onde
se realiza a prática do psicólogo se dá através da análise da atividade e, vivenciando-a, é
possível conhecer não só o processo social e econômico de um lugar, como também (e para o
psicólogo é o principal) o que pensam os moradores, o que sentem e o que fazem no seu
cotidiano em relação a si. “Realizar trabalhos com grupos de famílias ou seus representantes,
fortalecendo a socialização e a definição de projetos coletivos” (Brasil, 2005b, p. 18).
Assim, no decorrer das ações da Proteção Social Básica, o profissional de Psicologia
pode utilizar algumas estratégias com o intuito de conhecer a vida e a dinâmica das famílias e
o seu contexto, estabelecendo, assim, vínculos essenciais com essas pessoas. Tais estratégias
envolvem, por exemplo, a realização de entrevistas individuais e/ou coletivas, visitas
domiciliares, participação em atividades da comunidade, registros de acontecimentos e/ou
episódios significativos em diários de campo, conhecimento sobre a história do lugar através
de conversas informais com moradores, realizando, também, o levantamento de documentos e
de outras produções locais e acompanhamento de grupos, entre outras atividades que podem
vir a serem desenvolvidas.
29
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No presente Trabalho de Conclusão de Curso fez-se uma abordagem sobre o trabalho
do psicólogo frente ao Centro de Referência da Assistência Social – CRAS. Inicialmente,
desenvolveu-se uma revisão bibliográfica sobre a trajetória da política de assistência social
para compreender sua evolução enquanto política pública. Através deste trabalho, observou-se
a importância da Constituição Federal de 1988 e da promulgação da LOAS, que trouxeram
consigo a descentralização político-administrativo, visando a garantia de direitos. A partir da
LOAS se propôs o SUAS que apresentou os modelos de gestão, critérios básicos de
organização do processo, do sistema e da política efetiva.
Com o passar dos tempos, a política de Assistência Social tem se constituído como um
instrumento do Estado para enfrentar as manifestações da questão social. Para isto, o estado
instituiu políticas que visam atender aos trabalhadores identificados como pobres e carentes
que, em algumas vezes, foi baseado na perspectiva da cidadania e outras na mera dimensão da
admissão e do apaziguamento dos conflitos.
A Constituição Federal de 1988 é um marco fundamental no processo para a
redefinição da assistência social na sociedade brasileira, na qual reconhece a assistência como
política social que, com o tripé da Seguridade Social, que se constitui da saúde, assistência e
previdência, é, portanto, o sistema que compõe a seguridade social brasileira. A partir disso, a
assistência social passou a ser direito ativo e os usuários desta passaram a ser sujeitos
detentores do direito à proteção devida pelo Estado.
Quando nasce a Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS, os preceitos gerais que
foram estabelecidos pela Constituição Federal de 1988 se tornam materializados em uma
legislação específica para a área. A LOAS traz novos conceitos de política social para a
assistência social, sendo que esta passa a ser direito de cidadania, a qual visa a garantia do
atendimento às necessidades básicas da população. Prevê, ainda, em seus princípios e
diretrizes, a responsabilidade de Estado diante das ações e organiza a política social de
assistência social através da descentralização nas três esferas de governo, dando, assim,
autonomia, por exemplo, aos municípios, para a elaboração e execução de suas políticas e
para a destinação de seus recursos.
A partir do processo de implantação da LOAS é que se leva à criação do Sistema
Único da Assistência Social – SUAS. É nesse instante que a psicologia adentra no espaço das
políticas públicas sociais. A atual política da assistência social é, sem dúvida, uma conquista
muito grande no que se refere à seguridade social. A criação de um Sistema Único da
30
Assistência Social, com serviços não contributivos que passou a atender pessoas em situação
de vulnerabilidade social foi algo que permitiu levar cidadania e dignidade à população mais
carente do país.
Com abertura desta possibilidade do trabalho da psicologia dentro da política de
assistência social, se abriu espaço para muitos psicólogos que possam protagonizar ações que
transformam os serviços da assistência social. Porém, com isso, os psicólogos enfrentam
grandes desafios na atuação do campo da psicologia social. No tocante, especialmente, à
inserção da Psicologia no campo da assistência social, segundo estudos como o de Barros
(2007), por exemplo, há contestações que merecem destaque. Por um lado, a inserção da
Psicologia em espaços como os CRAS tem significado um aumento das oportunidades de
trabalho para psicólogos e uma via para que seus serviços estejam mais facilmente ao alcance
de populações economicamente desfavorecidas. Por outro lado, tal inserção, em muitos casos,
pouco tem servido para que o próprio “fazer psicológico” seja problematizado e para que, em
consequência, novas formas de intervenções sejam inventadas, isso porque, assim como
acontece em outros setores das políticas públicas, a intervenção psicológica tem se
evidenciado pela tentativa de reproduzir um modelo clínico convencional, a partir de
diferentes abordagens.
A presente pesquisa evidenciou que nesse processo de inserção do psicólogo na área
da assistência social há muitos desafios a serem enfrentados. Assim, destaca-se que será
preciso qualificação e capacitação profissional. As atividades devem favorecer entrosamento
entre psicólogo e assistente social. Demanda redefinir o foco das atividades realizadas pelo
psicólogo, de modo que predominem por ás práticas coletivas como enfoque na família e em
atividades comunitárias, reduzindo as práticas individuais. A forma de registro das atividades
nos serviços de CRAS precisa ser aprimorada e atualizada constantemente.
A partir da realização desse estudo, conclui-se que a partir da inserção da psicologia
nas políticas públicas, especialmente no CRAS, surge uma série de questionamentos sobre o
campo de atuação do psicólogo e a especificação do seu papel. Precisam-se ter práticas ativas
que demandam conhecer a população com a qual se está trabalhando, para, a partir disso, se
produzir um trabalho eficiente da psicologia social.
O trabalho que se realiza no CRAS é, sem dúvida, ainda, bastante desconhecido por
muitos e pouco abordado, pois sua implantação é recente e traz desafios constantes para a
Psicologia. O trabalho em grupos é teoria e prática pautadas em valores, como a ética da
solidariedade, resgate dos direitos humanos fundamentais e busca da melhoria da qualidade de
vida que também são determinadas pelo CRAS.
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Portanto, fica-se o desafio para os profissionais de psicologia buscar a cada dia mais
conhecer a prática do trabalho da psicologia dentro das políticas públicas, já que se denota
extremamente importante tanto para o campo profissional do psicólogo, quanto para toda a
sociedade.
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