Uso da Taxa de Juros : Quimera ou Desfaçatez ? Há muitos anos temos escutado argumentos dos mais falaciosos acerca da eficácia da aplicação da taxa de juros como instrumento para reduzir os índices inflacionários. Com poucas exceções, tais argumentos têm origem em membros da confraria ou em devotos da chamada “Escola de Chicago”, alunos ou seguidores fervorosos de Milton Friedman. E somente funcionam, e de forma aparente, em casos, em mercados e em circunstâncias muito específicas. Da mesma forma, temos certeza de que alguns dos defensores dessa prática foram induzidos por determinados acontecimentos ou coincidências, pois vários deles se constituem em profissionais de indiscutível seriedade. Caso contrário, andariam pelas ruas cobrindo os próprios rostos, para evitar o reconhecimento por parte dos transeuntes ou para que não víssemos o rubor da vergonha que lhes assaltaria quando da descoberta da verdade. Os defensores dessa prática, que argumentam ser o aumento da taxa um remédio de insofismável eficácia contra o crescimento dos preços internos de qualquer país, esquecem que o Japão, a Alemanha, os Estados Unidos, a China e muitos outros países, mantém ou mantiveram taxas nominais de juros abaixo de 4% por muitos anos e taxas reais por vezes negativas, no mesmo período. E onde está a inflação desses países? Se a manutenção de elevadas taxas de juros, conforme dizem os entendidos, mantém os preços em baixa, por que razão os países acima mencionados não experimentaram um surto hiperinflacionário no período em que as suas taxas reais ficaram tão próximas de zero? O que ninguém discute – e os números demonstram – é que as taxas de juros pagas pelo Governo brasileiro, e enfim por nós todos, são as mais elevadas do mundo há vários anos, sem qualquer justificativa plausível. E os juros cobrados dos consumidores continuam sendo muitíssimo mais elevados, cuja conseqüência direta pode ser facilmente observada nos lucros divulgados pelas entidades do nosso sistema financeiro. 2 E uma das questões que nos incomodam tem base no próprio jornalismo dito “especializado”. É, para nós, integrantes da chamada Economia Produtiva, ou Economia Real, profundamente desgastante e até deprimente, ler nos jornais, ou escutar nas emissoras de televisão, a frase “o Mercado está em queda”, “o Mercado divulga crescimento do Risco Brasil”, ou “o Mercado informa que a Economia está em queda” referindo-se, especificamente, à opinião dos economistas ou técnicos vinculados às instituições bancárias. Ora, o Mercado é constituído, basicamente, de Produtos e Serviços, cuja existência gera demanda, oferta e consumo. Assim sendo, não faz nenhum sentido falar em “Mercado”, quando estamos tratando, exclusivamente, do Mercado Financeiro. No Brasil, é necessário que se dê importância à Economia Produtiva, ou Economia Real, pois é essa Economia que gera riqueza e que gera empregos. A moeda somente terá valor enquanto existirem bens e serviços a adquirir. A moeda é um meio de troca, um facilitador, uma forma de medida e, não, a entidade principal de uma Economia. E é esse Mercado que é atingido de forma negativa quando as taxas de juros se elevam pois, quando isso acontece, os investidores preferem aplicar seus recursos em papéis do que nos investimentos produtivos, os quais, de uma forma geral, apresentam maior risco, a não ser que a sua remuneração seja comparativamente bem mais atrativa. E é a esse fenômeno que é atribuído o termo “Custo de Oportunidade”. E esse “Custo de Oportunidade”, quando se manifesta de forma negativa, faz com que os investimentos na indústria, no comércio e nos serviços, que são os maiores geradores de empregos, sejam reduzidos ou eliminados, com sérios prejuízos para o desenvolvimento da economia do país e para a sobrevivência da população em geral. E é essa a razão que nos faz indagar : o uso da taxa de juros como instrumento de redução inflacionária é uma simples quimera, ou um tipo de desfaçatez destinado a alimentar algum setor da economia brasileira? Paulo de Albuquerque Diretor de Economia e Estatística da ABRACI São Paulo, maio de 2006.