NOME DO ALUNO DE MESTRADO

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Insper Instituto de Ensino e Pesquisa
Programa de Mestrado Profissional em Economia
Rafael Pinhate Bandeira
REQUERIMENTO DE CAPITAL MAIS ELEVADO: UMA
AVALIAÇÃO DE SEU IMPACTO NA ECONOMIA E NO
RISCO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS
São Paulo
2014
Rafael Pinhate Bandeira
Requerimento de capital mais elevado: uma avaliação de seu
impacto na economia e no risco das instituições financeiras
Dissertação de mestrado apresentada ao Programa
de Mestrado Profissional em Economia do Instituto de
Ensino e Pesquisa, como parte dos requisitos para a
obtenção do título de Mestre em Economia.
Área de concentração: Finanças
Orientador: João Manoel Pinho de Mello – Instituto de
Ensino e Pesquisa
São Paulo
2014
Bandeira, Rafael Pinhate
Requerimento de capital mais elevado: uma avaliação
de seu impacto na economia e no risco das instituições financeiras /
Rafael Pinhate Bandeira; orientador - João Manoel Pinho de Mello.
- São Paulo, 2014.
57 f.
Dissertação (Mestrado - Programa de Mestrado
Profissional em Economia, Área de concentração: Finanças
aplicadas) - Insper Instituto de Ensino e Pesquisa.
1.requerimento de capital 2.alavancagem 3.taxa de
juros de empréstimos 4.risco 5. medidas macroprudenciais
FOLHA DE APROVAÇÃO
Rafael Pinhate Bandeira
Requerimento de capital mais elevado: uma avaliação de seu impacto na economia e no risco
das instituições financeiras
Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de
Mestrado Profissional em Economia do Instituto de Ensino
e Pesquisa, como parte dos requisitos para a obtenção do
título de Mestre em Economia.
Área de concentração: Finanças.
Aprovado em: janeiro/2015
Banca examinadora
Prof. Dr. João Manoel Pinho de Mello
Assinatura:_______________________
Instituição: Insper
Prof. Dr. Ricardo Oliveira Brito
Assinatura:_______________________
Instituição: Insper
Prof. Dr. Márcio Issao Nakane
Instituição: USP
Assinatura:_______________________
A meus avós, Cida, Teresa, Dino e
Antônio, e a meus pais, Marli e Antônio.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a meu orientador, Prof. Dr. João Manoel Pinho de Mello, pelo grande apoio
técnico e incentivo durante o processo de desenvolvimento deste trabalho. À instituição onde
atualmente trabalho, por acreditar no meu potencial e por incentivar o meu desenvolvimento
acadêmico. A minhas colegas de mestrado, Jordana, Marisa e Thaís, por toda a troca de
conhecimentos e pelo ambiente amigável no curso. À Nathália Nicoletti, pela compreensão e
suporte durante os dois anos de mestrado. A meus pais, Marli e Antônio, por sempre terem me
propiciado a oportunidade de ter uma educação de qualidade e por me incentivarem em todas
as minhas decisões. Obrigado por fazerem parte da minha vida e me apoiarem na busca de ser
uma pessoa melhor.
RESUMO
Bandeira, Rafael Pinhate. Requerimento de capital mais elevado: uma avaliação de seu
impacto na economia e no risco das instituições financeiras São Paulo, 2014. 57 f.
Dissertação (Mestrado) - Instituto de Ensino e Pesquisa, São Paulo, 2014
Requerimento mínimo de capital é uma ferramenta central da regulação bancária e tem sido
objeto recorrente de debates desde a última crise financeira. Por um lado, economistas
defendem que o requerimento de capital próprio deveria ser elevado em níveis muito acima dos
atuais propostos no Acordo de Basileia III. Em contrapartida, instituições financeiras
argumentam que tal medida afetaria a economia, através do encarecimento do custo de crédito
ou da redução de sua oferta, que também exerceria pressão sobre seu preço. Este trabalho
contribui para o debate de requisito mínimo de capital de duas maneiras. Primeiramente, são
investigadas as consequências no custo de crédito do aumento do requerimento de capital no
nível do empréstimo, através da análise de medidas macroprudenciais adotadas pelo Banco
Central do Brasil entre 2010 e 2011, que aumentaram a exigência capital de algumas operações
de concessão de crédito à pessoa física por um período determinado. Como resultado, há
evidências estatísticas de que as taxas de juros de crédito das operações afetadas pelas medidas
tenham aumentado junto com o maior nível de capital requerido dessas operações. Não se sabe
o que ocorreria com a taxa média se o requerimento fosse aumentado uniformemente. Por outro
lado, a teoria prediz que, no nível agregado do banco, o aumento da proporção de capital próprio
no mix de capital reduziria o custo de dívidas e o custo de equity, deixando o custo de capital
médio ponderado inalterado, apesar do aumento da proporção do capital mais caro. Em um
segundo momento, para avaliar este argumento, analisou-se a relação entre alavancagem e o
risco de detentores de dívidas, mensurado através do yield implícito nos preços dos títulos
emitidos por instituições financeiras brasileiras, e a relação entre alavancagem e o risco de
acionistas, mensurado através do beta alavancado das ações dos maiores bancos no Brasil.
Conclui-se que quanto maior for a participação de capital próprio no mix de capital, ou seja,
quanto menor for a alavancagem, menor será o retorno requerido por acionistas e detentores de
dívidas e este efeito poderia tender a neutralizar o deslocamento de financiamento via dívidas
para financiamento via capital próprio, ou seja, de um instrumento com menor retorno requerido
para um outro com maior retorno requerido.
Palavras-chaves: requerimento de capital; alavancagem; taxa de juros de empréstimos; medidas
macroprudenciais; risco.
Código JEL: G21, G28.
ABSTRACT
Bandeira, Rafael Pinhate. Higher capital requirement: an assessment of its impact on the
economy and on the financial institutions’ risk São Paulo, 2014. 57 f. Dissertation
(Mastership) - Instituto de Ensino e Pesquisa, São Paulo, 2014
Minimum capital requirement is a central tool of banking regulation and has been the recurring
subject of debate since the last financial crisis. On the one hand, economists advocate that the
Common Equity Tier I requirement should be raised much above the current levels proposed
by the Basel III Accord. However, financial institutions argue that this measure would affect
the economy through an increase of cost of credit or a reduction in the credit supply, which
would also press its price. This paper contributes to the minimum required capital debate in two
ways. First, it investigates the consequences on the cost of credit of a higher capital requirement
at the loan level, analyzing macro prudential measures adopted by Central Bank of Brazil
between 2010 and 2011, which increased the capital requirement of specific individuals lending
operations for a certain period. As a result, we find statistical evidence that the loan interest
rates of the affected operations have increased along with the higher level of required capital
for these operations. It is not known what would happen to the average interest rate if the
requirement was homogeneously increased. By contrast, at the bank aggregate level, the theory
predicts that increasing the equity proportion in the capital mix would reduce the cost of debt
and cost of equity, leaving the weighted average cost of capital unchanged, despite the higher
proportion of more expensive capital. In a second investigation to evaluate this argument, we
analyzed the relationship between leverage and the risk of debt holders, measured by the
implicit yield in the prices of bonds issued by Brazilian financial institutions, and the
relationship between leverage and the shareholders risk, measured by leveraged beta of the
biggest banks in Brazil. It follows that the greater the share of equity financing in the capital
mix, that is, the lower the leverage, the lower the debtholders and shareholders’ required return
and this effect could tend to counteract the shifting from debt finance to equity finance, that is,
from an instrument with a lower required rate of return to an instrument with a higher required
rate of return.
Keywords: capital requirement; leverage; loan interest rate; macro prudential measure; risk.
JEL code: G21, G28.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 Evolução das taxas de juros de crédito ...................................................................... 40
Figura 2 Evolução da inadimplência acima de 90 dias ............................................................ 40
Figura 3 Evolução do swap PRÉ-DI ........................................................................................ 41
Figura 3 Evolução do índice de Basileia dos principais bancos brasileiros ............................. 41
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Análise da base de dados da relação entre taxa de juros e capital ..................... 40
Tabela 2 Análise da base de dados da relação entre yield e alavancagem......................... 43
Tabela 3 Análise da base de dados da relação entre beta e alavancagem ......................... 44
Tabela 4 Estimação da relação entre exigência de capital adicional e taxas - modelo (2)46
Tabela 5 Estimação da relação entre yield e alavancagem - modelo (3) ............................ 47
Tabela 6 Estimação da relação entre RoA e alavancagem ................................................. 49
Tabela 7 Estimação da relação entre beta e alavancagem - modelo (7) ............................ 50
Tabela 8 Estimação da relação entre RoE e alavancagem ................................................. 51
SUMÁRIO
SUMÁRIO EXECUTIVO...................................................................................................... 11
1) INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 14
2) REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ...................................................................................... 20
3) METODOLOGIA........................................................................................................... 26
3.1) EFEITOS DA MEDIDA MACROPRUDENCIAL SOBRE AS TAXAS DE
JUROS DE CRÉDITO ........................................................................................................... 26
3.2) EFEITOS DA ALAVANCAGEM SOBRE O YIELD E O BETA ......................... 34
4) DESCRIÇÃO DOS DADOS .......................................................................................... 39
5) RESULTADOS ............................................................................................................... 45
5.1) EFEITOS DA MEDIDA MACROPRUDENCIAL SOBRE AS TAXAS DE
JUROS DE CRÉDITO ........................................................................................................... 45
5.2) EFEITOS DA ALAVANCAGEM SOBRE O YIELD E O BETA ......................... 47
6) CONCLUSÃO................................................................................................................. 53
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 55
11
Sumário executivo
A crise financeira que teve início em 2007 começou nos Estados Unidos após o colapso
da bolha especulativa no mercado imobiliário, alimentada pela enorme expansão de crédito
bancário e potencializada pelo uso de novos instrumentos financeiros, notadamente
securitizações, tendo se espalhado pelo mundo todo em poucos meses. O evento marcante da
crise foi a falência do banco de investimento Lehman Brothers, em 2008, após a recusa do
Federal Reserve em socorrer a instituição. Este cenário turbulento gerou um aumento da
preferência das instituições financeiras pela liquidez, ou seja, por ativos de fácil liquidação, e
levou à contração do crédito bancário para transações comerciais e industriais. A "evaporação
do crédito" resultou em uma rápida e profunda queda da produção industrial e do comércio
internacional em todo o mundo, tornando-se também uma crise econômica.
Uma das possíveis causas dessa crise é a regulação bancária pouco rígida naquele
momento. Desde então, reguladores e órgãos internacionais de supervisão bancária e de
estabilidade financeira têm trabalhado para introduzir um conjunto de propostas para sua
reforma, com o objetivo de promover maior resiliência no setor. Avalia-se que umas das
principais razões para a crise ter se tornado tão severa decorreu da alavancagem excessiva do
setor bancário de muitos países, ou seja, do alto nível de endividamento dos bancos,
acompanhada de uma gradual erosão do nível e da qualidade da base de capital, que nada mais
é que o patrimônio que instituições financeiras devem manter para absorver perdas de eventos
inesperados. Desta forma, o Acordo de Basileia III introduziu exigências que buscam o aumento
da qualidade, da consistência e da transparência da base de capital.
Mesmo com os avanços da regulação bancária desde 2008, as discussões sobre os
requerimentos mínimos de capital e seus respectivos impactos na economia continuam tendo
lugar de destaque na agenda de economistas, reguladores e instituições financeiras. Por um
lado, economistas defendem que a exigência mínima de capital próprio deveria ser elevada em
12
níveis muito acima dos atuais propostos no Acordo de Basileia III, pois esta situação reduziria
a probabilidade de falência dos bancos, evitando a originação e o contágio de crises financeiras.
Em contrapartida, instituições financeiras argumentam que tal medida teria efeitos sobre a
economia, dado que um eventual requisito de capital adicional poderia implicar em maior custo
aos bancos e que esse seria repassado ao consumidor final através do encarecimento do custo
de crédito, ou mesmo estancaria a sua oferta, fato que também exerceria pressão sobre o preço
do crédito. Ambas as situações tenderiam a reduzir o nível de investimento e o consumo, tendo
efeito adverso na atividade econômica.
Este trabalho contribui para o debate sobre o requerimento de capital de duas maneiras.
Primeiramente, são investigadas as consequências da elevação da exigência de capital na
economia, através da análise um caso específico ocorrido no Brasil. Em dezembro de 2010, o
Banco Central do Brasil adotou medidas macroprudenciais, que são medidas de regulação e de
supervisão do sistema financeiro e buscam o estabelecimento de um ambiente de estabilidade
em seu sentido mais amplo, que transcende os agentes individuais e, portanto, tem um caráter
sistêmico. Uma dessas medidas relacionava-se ao aumento do capital requerido para algumas
operações de crédito à pessoa física. Aproveitando-se deste cenário regulatório, foi avaliado
empiricamente o impacto do aumento da exigência de capital nas taxas de juros das operações
de crédito afetadas, concluindo que, no nível do empréstimo, o maior requerimento de capital
regulatório aumentou as taxas, impactando, portanto, a economia através do aumento do custo
de crédito. Não se sabe o que ocorreria com a taxa média se o requerimento fosse aumentado
uniformemente.
Por outro lado, no nível agregado do banco, a teoria prediz que a redução no
endividamento e o aumento na proporção de capital próprio no financiamento do banco
reduziriam tanto o custo de dívidas quanto o custo de capital próprio, por consequência da
redução de seu risco de falência. Essas reduções deixariam o custo de capital médio ponderado
13
inalterado, apesar do aumento da proporção do capital mais caro (capital próprio). Em outras
palavras, o aumento da exigência de capital próprio não teria efeitos no custo de capital total
do banco, não justificando, portanto, o aumento do custo de crédito. Assim, em uma segunda
documentação, foram analisadas as relações entre alavancagem e o custo de dívidas e entre
alavancagem e o custo de capital próprio. Como resultado, conclui-se que há correlação positiva
entre alavancagem e ambos os custos, o que implica que quanto maior for a participação de
capital próprio no financiamento da instituição financeira, menor será o retorno requerido por
acionistas e detentores de dívidas e este efeito poderia tender a contrabalancear o deslocamento
de financiamento via dívidas para financiamento via capital próprio, ou seja, de um instrumento
com menor retorno requerido para um outro com maior retorno requerido.
14
1) Introdução
O nível de capitalização e de alavancagem das instituições financeiras tem sido objeto
recorrente de debates, principalmente após a crise financeira global, cujo ápice ocorreu em
2008. Capital tem como objetivo principal a absorção de perdas em cenários severos, visando
à proteção de depositantes e, de forma ampla, dos sistemas financeiro e econômico. Durante a
crise de 2008, pode-se afirmar que o capital de fato absorveu perdas, como, por exemplo, no
caso do Lehman Brothers, cujos acionistas tiveram seus investimentos zerados com a falência
da instituição. Contudo, a insuficiência de capital para absorver as perdas em sua integridade
bem como a pouca qualidade do capital disponível culminaram em aportes efetuados por
instituições governamentais para evitar um problema ainda maior oriundo do contágio e para
preservar a estabilidade do sistema financeiro e econômica. Desta forma, mesmo após alguns
anos de discussões, é possível dizer os economistas e os representantes do setor bancário não
se entendem. O tema central em questão é a exigência de capital para as instituições financeiras:
economistas argumentam que a exigência de capital próprio deveria aumentar de forma
significativa, muito acima dos atuais níveis do Acordo de Basileia III, ato esse que geraria maior
resiliência das instituições financeiras e, consequentemente, diminuiria a probabilidade de
ocorrência de crises e de necessidade de suportes governamentais, representando, portanto, a
solução socialmente ótima. Já os representantes de instituições financeiras não concordam e
afirmam que tal manifestação seria prejudicial aos empréstimos e à economia em geral, dado
que o aumento de capital requerido acarretaria em aumento do custo de empréstimos e/ou em
racionamento do crédito disponível na economia.
Neste cenário, o presente trabalho tem como principal intuito averiguar, empiricamente,
alguns dos argumentos utilizados no debate de maior exigência de capital das instituições
financeiras, que pode ter múltiplas implicações. Assim, este documento buscar contribuir para
a discussão de duas maneiras. Primeiramente, o maior requisito regulatório de capital poderia
15
se traduzir em um maior custo de financiamento das instituições financeiras, uma vez que
haveria a necessidade de operar com níveis mais elevados de capital cujo custo é maior, ou
mesmo poderia reduzir a oferta de crédito. Ambas as situações exerceriam pressão para
aumento do preço do crédito, afetando o consumidor final e os investimentos e, de forma ampla,
a economia. Portanto, este trabalho se propõe a avaliar a relação entre o capital requerido e as
taxas de juros de crédito no mercado brasileiro. Em contrapartida, estudiosos afirmam que o
aumento do nível de capital próprio de um banco reduz o seu risco e, como consequência,
investidores tendem a exigir menos retorno ao investir na instituição. Este pensamento se
constrói através da argumentação de que o aumento de capital próprio reduz o custo de capital
e o custo de dívida e, mesmo que a proporção de capital próprio seja maior, o custo de capital
médio ponderado permanece o mesmo. Desta maneira, a segunda documentação deste estudo
diz respeito à relação do nível de alavancagem dos bancos brasileiros, métrica essa mais
fidedigna da proporção de financiamento com capital próprio do que índices de capital, com o
yield de títulos por eles emitidos, que, indiretamente, mensura o risco dos detentores de dívidas,
e também com o risco dos acionistas, quantificado através do beta alavancado das ações dos
bancos.
Neste contexto, há diversos trabalhos defendem o aumento da exigência de capital
próprio. Admati, DeMarzo, Hellwig e Pfleiderer (2013) examinaram a visão hipotética de que
capital próprio é “caro”, supostamente levando a conclusão de que um maior requerimento de
capital é custoso para a sociedade e afetaria os mercados de crédito negativamente. Deste modo,
avaliaram que os argumentos apresentados para apoiar esta visão são falaciosos, irrelevantes
para o debate regulatório por confundir custos privados e sociais. Portanto, concluíram que a
exigência de níveis de capital significativamente mais elevados do que os requerimentos
atualmente propostos implicaria em um grande benefício social e um custo social mínimo, se
houver. Kashyap, Stein e Hanson (2010) analisaram o impacto do aumento substancial dos
16
requerimentos de capital de grandes instituições financeiras e concluíram que, mesmo que a
magnitude do aumento fosse de 10 pontos percentuais, as taxas de juros de operações de crédito
aumentariam em menos de 1 ponto percentual.
Em contrapartida, Institute of International Finance (IIF)(2011), associação global de
bancos, em sua avaliação do impacto acumulado na atividade econômica resultante do conjunto
de reformas no setor financeiro, afirmou que o nível de crescimento da economia global seria
afetado com a reforma regulatória. No mais, apresentaram uma teoria alternativa à Admati et
al. (2013), ao afirmar que a taxa de retorno esperada pelos acionistas é afetada de forma
significativa pela situação atual de capital próprio e por expectativas e receios de que novas
exigências regulatórias resultem em emissões adicionais de ações no futuro. Ou seja, a incerteza
do cenário regulatório faria com que os investidores demandassem mais retorno, como
consequência das possibilidades, por exemplo, de ter seu capital diluído ou de aumentar a
concentração de seus investimentos no setor bancário. Basel Committee on Baking Supervision
(BCBS)(2010) também analisou o impacto econômico de longo prazo da reforma regulatória
de capital, concluindo que o aumento de cada 1 ponto percentual no índice de capital aumentaria
o spread de empréstimos em 13 pontos-base. No Brasil, Martins e Schechtman (2013)
investigaram as consequências sobre spreads de crédito da adoção de uma medida
macroprudencial intrassetorial de capital no Brasil, através da utilização de micro dados. Os
resultados mostraram que os bancos brasileiros, depois da medida regulatória, aumentaram os
spreads cobrados para empréstimos automotivos, cujo requerimento de capital aumentou com
a medida.
Por fim, foi também avaliado o impacto do aumento de financiamento via capital
próprio no risco de falência dos bancos. Baker e Wurgler (2013) estimaram como a
alavancagem afeta o risco e o custo de capital próprio de bancos americanos, bem como seus
respectivos impactos no custo de capital total. O resultado deste estudo confirmou que equity
17
risk bancário é acentuadamente crescente com a alavancagem. Miles, Yang e Marcheggiano
(2011), na avaliação dos custos e benefícios de longo prazo da maior exigência de capital
próprio, regrediram as estimativas de betas de bancos do Reino Unido em função de suas
respectivas alavancagens, concluindo também que o impacto da alavancagem no beta é
significante e a relação entre ambos é positiva.
Para abordar os dois questionamentos centrais deste trabalho, são efetuadas avaliações
empíricas entre as variáveis de interesse. A primeira investigação busca analisar a relação entre
o capital requerido e as taxas de juros praticadas em operações de concessão de crédito. Para
isso, focou-se em estudar um caso específico ocorrido no Brasil, mais precisamente relacionado
às medidas macroprudenciais adotadas pelo Banco Central do Brasil (BCB) em dezembro de
2010, que, dentre outras implicações, aumentaram o requerimento de capital de algumas
modalidades de crédito à pessoa física, dependendo de seus respectivos prazos de concessão.
O caso mencionado é relevante, pois teve impacto em apenas algumas operações de concessão
de crédito, permitindo utilizar operações não afetadas como grupo de controle. No mais, é
possível avaliar não somente o impacto do aumento do capital requerido como também a sua
redução, tendo em vista que o BCB reverteu parcialmente, em novembro de 2011, as medidas
macroprudenciais adotadas em 2010.
Na segunda contribuição deste trabalho, foram efetuadas duas análises, ambas visando
a relacionar o risco de instituições financeiras, tanto do ponto de vista de detentores de dívida
quanto dos acionistas, com níveis de alavancagem dos respectivos bancos. Primeiramente,
investigou-se se o nível de alavancagem tem alguma relação com o yield implícito nos preços
dos títulos privados emitidos pelas instituições financeiras, medida essa reflete o risco de
default. Para isso, foram avaliados quinze papéis emitidos por oito instituições financeiras
brasileiras distintas. Complementarmente, analisou-se como o beta alavancado, proxy para o
risco dos acionistas, de três instituições financeiras listadas na Bolsa de Valores, Mercadorias
18
& Futuros de São Paulo (BM&FBOVESPA) é influenciado pelos níveis de alavancagem das
respectivas instituições. Para ambas as análises, foram utilizados dados dos balancetes
trimestrais de cada instituição, desde o 2º semestre de 2009 até o 3º semestre de 2014 e dados
do mercado de ações e do mercado de títulos privados.
A abordagem empírica é relevante porque, do ponto de vista teórico, o custo de capital
médio ponderado se mantém inalterado à estrutura de capital, caso não existam distorções que
invalidem suas enunciações. Segundo Modigliani e Miller (1958), na ausência de considerações
adicionais tais como a existência de vantagens fiscais ou subsídios públicos, o aumento do
financiamento via capital próprio simplesmente varia como o risco está alocado entre os
investidores do banco, ou seja, entre detentores de dívidas e acionistas. Entretanto, dado que o
mercado real de capital contém fricções e ineficiências que confrontam certas premissas de
Modigliani-Miller, a validade do argumento de irrelevância da estrutura de capital não é tão
clara, convindo, portanto, uma evidência empírica, como fizeram Baker e Wurgler (2013) para
o mercado norte-americano e Miles et al. (2011) para os bancos do Reino Unido. Vale destacar
que todas as investigações deste trabalho baseiam-se no mercado brasileiro. Este fato é
importante, pois instituições financeiras no Brasil operam com níveis de alavancagem
relativamente baixos, logo, qualquer efeito da alavancagem sobre o yield implícito dos títulos
e sobre o beta alavancado dos bancos é menos esperado e, se documentado aqui, deve ser ainda
mais forte em um mercado cujos níveis de alavancagem são maiores.
Visando a melhor organizar as discussões deste estudo, o presente documento foi
dividido seis seções, além desta introdução. Na seção 2, são discutidos trabalhos relacionados
e referências bibliográficas que serviram de motivação e de base para elaboração dos
argumentos construídos. A seção 3 é dedicada à apresentação das metodologias aplicadas nas
avaliações empíricas, além de fornecer detalhamentos sobre as medidas macroprudenciais e
sobre as variáveis que afetam a taxa de juros e o spread de crédito. São descritas sucintamente
19
na seção 4 as características dos dados utilizados nos estudos empíricos, apresentando também
suas fontes de extração. Os resultados das avaliações empíricas são debatidos na seção 5. Por
fim, na seção 6, são apresentados os comentários conclusivos deste trabalho.
20
2) Revisão bibliográfica
Desde a crise de 2008, reguladores e órgãos internacionais de supervisão bancária e de
estabilidade financeira, dentre eles o Basel International Settlement (BIS) e o Financial
Stability Board (FSB), têm trabalhado para introduzir um conjunto de propostas para reforma
da regulamentação bancária, com o objetivo de promover uma maior resiliência no setor. Dentre
as novas exigências propostas, o Acordo de Basileia III e os novos requerimentos de capital e
de alavancagem exercem papel central. Segundo BCBS (2010), umas das principais razões para
a crise financeira e econômica ter se tornado tão severa decorreu da alavancagem excessiva do
setor bancário de muitos países, acompanhada de uma gradual erosão do nível e da qualidade
da base de capital. A fragilidade do setor bancário foi rapidamente transmitida para o restante
do sistema financeiro e para a economia, resultando em uma contração da disponibilidade de
crédito e de liquidez. Por fim, o setor público teve que intervir ao injetar liquidez, capital,
suportes e garantias, expondo o contribuinte a perdas significativas. Desta forma, o Acordo de
Basileia III introduziu, do ponto de vista microprudencial, exigências que buscam o aumento
da qualidade, da consistência e da transparência da base de capital. Adicionalmente, foi também
recomendado um índice de alavancagem, com o objetivo de restringir a alavancagem no setor
bancário e introduzir uma segurança adicional contra o risco de modelo e contra erros nas
mensurações de risco, através de uma métrica simples, transparente e não sensível a risco. No
mais, medidas macroprudenciais como os colchões de conservação e anticíclico aumentam o
requerimento mínimo de capital próprio e total, quando ativados, em relação ao Acordo de
Basileia II. Mesmo com os avanços da regulação bancária desde 2008, as discussões sobre a
exigência de capital e seus respectivos impactos na economia continuam tendo lugar de
destaque na agenda de economistas, reguladores e instituições financeiras.
Segundo Admati, DeMarzo, Hellwig e Pfleiderer (2013), o custo social de um aumento
significativo de capital próprio para grandes instituições financeiras seria, se tivesse algum,
21
muito baixo e argumentos que sugerem o contrário são baseados em falácias, pois confundem
custos privados de bancos (e seus acionistas) e custos sociais do público geral, ou são
construídos em modelos inadequados, tanto da perspectiva teórica quanto empírica. O fato de
que o aumento de capital próprio reduz o risco de crise financeira nas instituições que podem
originar e contagiar o sistema bancário é visto como um claro benefício social. Entretanto, há
argumentos de que a elevação do requerimento de capital próprio aumenta o custo de funding
dos bancos por conta da maior proporção de capital próprio no mix de capital, cujo retorno
exigido é maior. Admati et al. (2013) afirma que, mesmo sendo verdade que o retorno requerido
do capital próprio é superior ao retorno requerido de dívidas, não é verdade afirmar que
“economizar” capital próprio reduz os custos de capital. “Economizar” capital próprio tem
efeito sobre o risco deste capital e, portanto, sobre o seu retorno requerido. Esse efeito deve ser
levado em consideração ao avaliar as implicações do aumento do requerimento de capital
próprio no custo de capital de bancos. Quando dado banco é financiado proporcionalmente com
mais capital próprio, o risco de um dado ativo é traduzido em menos risco ao acionista.
Refletindo essa redução do risco, o prêmio de risco no retorno sobre capital próprio (Return on
Equity – ROE) esperado será menor. Como o capital próprio adicional geralmente reduzirá o
risco de falência do banco, a taxa exigida pelas dívidas deste banco também será menor. Essas
reduções de prêmio de risco nas taxas de retorno requeridas contrabalanceiam o efeito direto
de deslocamento de financiamento via dívidas para financiamento via capital próprio, ou seja,
de um instrumento com menor retorno requerido para um outro com maior retorno requerido.
Desta forma, Admati et al. (2013) concluíram que o efeito líquido do aumento de capital próprio
não aumenta o custo de funding total do banco.
Em contrapartida, Institute of International Finance (IIF)(2011), associação global cujos
membros são, dentre outros, os maiores bancos comerciais e de investimento do mundo, em
sua avaliação do impacto acumulado na atividade econômica decorrente do conjunto de
22
reformas no setor financeiro, concluiu em sua estimação central que o nível real do Produto
Interno Bruto (PIB) no período de 5 anos será cerca de 3,2% menor do que seria caso não
houvesse reforma. A maneira precisa na qual a reforma restringirá a expansão atual depende
fortemente de dois canais. Primeiramente, há a questão de como investidores vão responder às
implicações de uma regulação bancária mais severa. Se investidores de ações estiverem
dispostos a fornecer mais capital a um custo mais baixo (refletido através da maior segurança)
e investidores de dívida também estiverem preparados para investir em dívidas de prazos mais
longos a spreads gerenciáveis, então as implicações negativas no crescimento oriundas da
reforma regulatória poderiam ser modestas. Até agora, no entanto, IIF afirma que o mercado de
capitais está tendendo a sinalizar o oposto. Apesar da observação do IIF, vale ressaltar que,
conforme será apresentado na sequência deste trabalho, foram encontradas evidências no
mercado brasileiro de que a redução na alavancagem implica em menor retorno exigido pelo
acionista e menor yield requerido pelo detentor de dívida. Contudo, no arcabouço de IIF, a
necessidade de se levantar montantes significativos de capital próprio e, em menor escala, de
emitir dívidas de longo prazo provavelmente colocará pressão relevante no custo marginal de
financiamento bancário. A afirmação anterior leva à segunda questão-chave, de como
executivos responderão às mudanças nas condições de financiamento. Argumenta-se que
poderia ser através do corte de outros custos, mais notadamente a remuneração de
colaboradores, e através da transferência deste custo na forma de taxas de empréstimo mais
altas. IIF, no entanto, supõe que há benefícios advindos do processo de reforma regulatória.
Contudo, acredita que os estudos oficiais do setor tenderam tanto a minimizar os custos da
reforma no crescimento econômico quanto a superestimar os benefícios.
No debate sobre o impacto no custo de capital, IIF (2011) diz que a questão mais
controversa está relacionada a como a taxa de retorno requerida por acionistas poderia evoluir
com o regime regulatório mais severo. Além da hipótese de que não haveria mudança no custo
23
de capital para os bancos, dado que a maior exigência de capital seria compensada pela redução
de seu risco, expressada por Admati et al. (2013), uma visão alternativa enfatiza que a taxa de
retorno esperada pelos acionistas é afetada de forma significativa pela situação atual de capital
próprio e por expectativas e receios de que novas exigências regulatórias resultem em emissões
adicionais de ações no futuro. Em outras palavras, quantidades importam. De acordo com essa
visão, na medida em que a reforma regulatória conduziria a uma exigência de emissão de ações,
o argumento de que quantidades importam neutralizaria os benefícios de redução de risco,
consequência de uma base maior de capital próprio, no retorno requerido, ou, possivelmente,
colocaria pressão imediata no retorno requerido até que as novas emissões sejam
confortavelmente aceitas por investidores. Em contraste, a abordagem de Modigliani-Miller
supõe que qualquer emissão adicional pode ser absorvida por investidores sem implicações:
colocando de outra forma, os investidores aceitariam uma taxa de retorno menor, mesmo se
tornando relativamente mais expostos a um determinado setor.
BCBS (2010) analisou o impacto econômico de longo prazo da reforma regulatória de
capital através da coleta e da síntese de evidências quantitativas relacionadas à magnitude dos
custos e dos benefícios macroeconômicos. Segundo BCBS (2010), os benefícios estão
associados à redução da probabilidade de crise bancária. Entretanto, é suposto que o aumento
do capital requerido colocaria pressão no custo do crédito bancário. Desta maneira, o custo mais
alto de crédito diminuiria investimentos e o consumo, que, por sua vez influenciariam o nível
de equilíbrio da economia. Para isso, supõe-se que qualquer aumento no custo de funding é
totalmente transferido e também que o custo de capital não é reduzido pela redução de risco
dos bancos ao manter mais capital. Como resultado, foi concluído que o aumento de cada 1
ponto percentual no índice de capital aumentaria o spread de empréstimos em 13 pontos-base.
Kashyap, Stein e Hanson (2010), fizeram um trabalho similar ao analisar o impacto do aumento
substancial do capital requerido de grandes instituições financeiras. Como ponto de partida,
24
supuseram que o aumento no requerimento conduziria os bancos a substituírem o financiamento
via dívidas de longo prazo por capital próprio. Usando o conhecido arcabouço de Modigliani e
Miller (1958), em que as principais diferenças entre custo de dívidas e de financiamento via
capital próprio são devidas a diferenças no tratamento fiscal, estimaram que até mesmo grandes
variações nos requerimentos de capital provavelmente conduziriam a pequenos impactos de
longo prazo no custo de empréstimos. Por exemplo, mesmo que o índice mínimo de capital
subisse em 10 pontos percentuais, a metodologia utilizada sugere que as taxas de juros de
empréstimos cresceriam em algo da ordem de apenas 25 a 45 pontos-base. De qualquer forma,
alertaram que, apesar de que uma mudança significativa no regime de capital possa não ter
impacto material sobre o custo do crédito, há preocupações muito significativas relacionadas à
reformulação de como será fornecido o crédito e suas consequências para a estabilidade
financeira.
No Brasil, Martins e Schechtman (2013) investigaram as consequências sobre spreads
de crédito da adoção de uma medida macroprudencial intrassetorial de capital. Devido a
preocupações relacionadas a uma rápida e desequilibrada expansão do setor de financiamento
de automóveis, o capital regulatório bancário foi elevado para financiamentos com prazos
longos e altos loan-to-values. Este estudo utilizou-se de micro dados para avaliar o
comportamento dos spreads de concessão de crédito para aquisição de veículos, modalidade
essa que foi parcialmente afetada pelas medidas macroprudenciais de 2010. Os resultados
mostraram que os bancos brasileiros, depois da medida regulatória, aumentaram os spreads
cobrados para empréstimos automotivos cuja exigência de capital aumentou. Quando
comparado ao conjunto de financiamentos não alvejados pela medida, o aumento foi de pelo
menos 13%. Por outro lado, não foi encontrada evidência robusta de elevação dos spreads para
os financiamentos cujas ponderações de risco não foram alteradas. Finalmente, o estudo
mostrou que a posterior retirada da medida regulatória de capital foi associada, de modo
25
semelhante, a menores spreads cobrados em empréstimos automotivos cujas ponderações de
risco decresceram. Não obstante, quando medida relativamente, essa redução nos spreads foi
menor que o aumento original.
Baker e Wurgler (2013) estimaram como a alavancagem afeta o risco e o custo de capital
próprio de bancos, bem seus respectivos impactos no custo de capital total. O resultado deste
estudo confirmou que equity risk bancário é acentuadamente crescente com a alavancagem,
com o beta de uma carteira de bancos menos capitalizados sendo 0,93, enquanto o beta de uma
carteira composta de bancos mais capitalizados era de 0,50, baseando-se em dados do mercado
norte-americano. Entretanto, ao avaliar se o custo do capital próprio era menor nos bancos
menos alavancados, ou seja, nos bancos com os menores betas, o resultado foi contrário ao
esperado. Bancos com beta alto tiveram retornos menores que bancos com beta baixo. Este
efeito foi chamado de anomalia do baixo risco. Vale destacar que a análise de Baker e Wurgler
(2013) supõe que o retorno realizado dos bancos reflete exatamente o retorno exigido por
acionistas, ou seja, o custo de capital próprio. Miles, Yang e Marcheggiano (2011), na avaliação
dos custos e benefícios de longo prazo ao exigir que bancos se financiem com maior proporção
de capital próprio, usaram dados de bancos do Reino Unido para avaliar a ligação entre
alavancagem e o custo de capital próprio dos bancos. Supondo o Capital Asset Pricing Model
(CAPM) como modelo de precificação do retorno requerido dos acionistas, regrediram as
estimativas de betas dos bancos em análise em função de suas respectivas alavancagens entre
1997 e 2010, concluindo que o impacto da alavancagem no beta é significante e a correlação
entre ambos é positiva. Com base nos resultados da regressão mencionada e supondo que o
custo de dívidas se mantém constante, estimaram que se alavancagem do sistema caísse pela
metade (de 30 para 15 vezes), o custo de capital médio ponderado aumentaria em apenas 33bps,
de 5,33% para 5,66%.
26
3) Metodologia
3.1)
Efeitos da medida macroprudencial sobre as taxas de juros de crédito
A discussão central do aumento do capital requerido passa pela forma como essa
exigência adicional afetaria a economia de maneira geral. Tal manifestação poderia refletir no
custo de empréstimos ou em sua oferta, que, por sua vez, tenderia a levar a uma desaceleração
da atividade econômica. Para avaliar empiricamente a relação entre capital requerido e taxa de
juros de crédito, optou-se por analisar um caso temporário ocorrido no Brasil de aumento do
capital exigido para algumas operações de crédito às pessoas físicas, permitindo assim uma
análise no nível do empréstimo.
Em 3 de dezembro de 2010, o Conselho Monetário Nacional (CMN) e o BCB adotaram
um conjunto de medidas de natureza macroprudencial para, segundo eles, aperfeiçoar os
instrumentos de regulação existentes, manter a estabilidade do Sistema Financeiro Nacional e
permitir a continuidade do desenvolvimento sustentável do mercado de crédito. As iniciativas
visavam, ainda, a dar prosseguimento ao processo de retirada gradual dos incentivos
introduzidos para minimizar os efeitos da crise financeira internacional de 2008. As medidas
adotadas foram as seguintes:
1. Majoração do requerimento de capital para operações de crédito a pessoas físicas com
prazos superiores a 24 meses, comportando exceções:
•
Através da Circular nº 3.515, o Fator de Ponderação de Risco (FPR) passou de
100% para 150% na maioria das operações de crédito a pessoas físicas com
prazo superior a 24 meses, o que significa que o requerimento de capital das
instituições financeiras aumentou dos até então atuais 11% para 16,5% do valor
dessas operações. No caso do crédito consignado, a regra só se aplicava sobre
as operações com prazo superior a 36 meses.
27
•
O aumento incidiu sobre as operações de financiamento de veículos ou
arrendamento mercantil de veículos nas seguintes situações:
i. Prazo entre 24 e 36 meses: quando o valor da entrada for inferior a 20%
do valor do bem.
ii. Prazo entre 36 e 48 meses: quando o valor da entrada for inferior a 30%
do valor do bem.
iii. Prazo entre 48 e 60 meses: quando o valor da entrada for inferior a 40%
do valor do bem.
•
A majoração do FPR não se aplicava às operações de crédito rural, às operações
de crédito habitacional e ao financiamento ou arrendamento mercantil de
veículos de carga.
2. Elevação do compulsório sobre depósitos à vista e a prazo:
•
O adicional de compulsório sobre depósitos à vista e a prazo foi elevado de 8%
para 12%.
•
O compulsório sobre depósitos a prazo aumentou de 15% para 20%.
Segundo Prates e Cunha (2012), enquanto a segunda medida afetou as condições gerais
de liquidez dos bancos, a primeira iniciativa teve como foco o crédito ao consumo e foi
condicionada pela preocupação do BCB com a forte expansão desse crédito, principalmente
nas modalidades de empréstimos consignados e financiamento a veículos.
Entretanto, em 11 de novembro de 2011, o BCB publicou a Circular nº 3.563 e reverteu
parcialmente as medidas adotadas no final de 2010, visto que intervenções de natureza
macroprudencial são dinâmicas e devem acomodar as flutuações cíclicas. Essa ação visou a
enfrentar o cenário de desaceleração econômica, abrandando as regras que limitaram a
concessão de crédito no final de 2010. Como resultado, as seguintes operações que possuíam
requerimento de capital de 16,5% após 2010 voltaram ao patamar de 11%:
28
-
crédito consignado com prazo entre 36 e 60 meses;
-
financiamento com prazo contratual entre 24 e 60 meses para aquisição de veículo
automotor, garantido por alienação fiduciária do veículo;
-
arrendamento mercantil financeiro de veículo automotor, com prazo contratual entre 24
e 60 meses;
-
outras operações de crédito pessoal sem destinação específica com prazo contratual
entre 24 e 36 meses;
Em contrapartida, nesta mesma data, as exposições relativas a operações de crédito
pessoal sem destinação específica, incluindo as operações de crédito consignado, com prazo
superior a 60 meses tiveram seus requerimentos de capital aumentados, de 16,5% para 33%.
Vale ressaltar que, como o prazo médio de concessão das referidas operações é inferior a 60
meses, pode-se afirmar que a medida de 2011 reduziu o requerimento de capital total, se forem
avaliadas as carteiras consolidadas.
Com o cenário regulatório apresentado em mente, utilizou-se uma janela de observação
de dados mensais entre janeiro de 2009 e dezembro de 2012, que abrange tanto o aumento do
requerimento de capital em dezembro de 2010 quanto sua redução em novembro de 2011 para
algumas modalidades de crédito à pessoa física.
Aspirando avaliar o impacto que esses movimentos regulamentares tiveram nas taxas
de juros de crédito das modalidades por eles afetadas, foram coletados dados relativos às
seguintes operações bancárias: (i) crédito pessoal total à pessoa física, (ii) aquisição de veículos
por pessoa física, (iii) aquisição de outros bens por pessoa física, e (iv) capital de giro total à
pessoa jurídica. Enquanto as duas primeiras operações foram, na média, atingidas pelas medidas
macroprudenciais, dado que o prazo médio de concessão de ambas as modalidades era próximo
de 4 anos na janela avaliada, a terceira não foi afetada, na média, por conta de seu curto prazo
médio de concessão, próximo de 1 ano na janela avaliada, assim como a quarta, por se tratar de
29
uma operação à pessoa jurídica. Portanto, as duas últimas operações foram utilizadas como
grupo de controle.
Para modelar o aumento de capital no tempo, utilizou-se de uma variável dummy, que,
para as operações crédito pessoal total e de aquisição de veículos, assumiu o valor 0 entre
janeiro de 2009 e novembro de 2010 e entre novembro de 2011 e dezembro de 2012 e o valor
1 no período de aumento do capital requerido, ou seja, entre dezembro de 2010 e outubro de
2011. Já para as operações de aquisição de outros bens e de capital de giro total, essa variável
se manteve com o valor 0 em toda a janela de observação.
Como método de análise, utilizou-se dados em painel, técnica que constitui de uma
combinação de corte transversal com séries de tempo. Assim, o painel em análise tem duas
dimensões de variação dos dados, uma relacionada às modalidades de crédito e outra temporal,
sendo capaz a sua capacidade de captar a dinâmica do comportamento das unidades.
Para avaliar, no nível da operação, se o capital requerido tem algum impacto nas taxas
de juros de crédito das modalidades de crédito afetadas, adotou-se o modelo de efeitos fixos,
pois é suposto que cada operação em análise tem suas próprias características, que podem ou
não influenciar as variáveis explicativas e de interesse. No mais, entende-se que esse modelo é
adequado, pois busca-se avaliar variáveis que variam no tempo. Assim, são introduzidas
variáveis dummies que representam cada modalidade de crédito e cada mês de análise. Logo, a
especificação do modelo é:
𝑠𝑖𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1 ∙ 𝐾𝑖𝑡 + 𝛾𝑖 ∙ 𝐶𝑖 + 𝜃𝑡 ∙ 𝑀𝑡 + ∑𝑛 𝛽𝑛 ∙ 𝑋𝑛,𝑖𝑡 + 𝜀𝑖𝑡
(1)
Em que:
-
𝑠𝑖𝑡 é a taxa de juros anual de cada modalidade de crédito i em cada mês t;
-
𝐾𝑖𝑡 é a variável dummy mencionada anteriormente, que representa o nível de capital de
cada modalidade de crédito i em cada mês t;
30
-
𝐶𝑖 são variáveis dummies para cada modalidade de crédito i, que capturam os efeitos
fixos de cada tipo de concessão;
-
𝑀𝑡 são variáveis dummies para cada mês t, que capturam os efeitos fixos do tempo;
-
𝑋𝑛,𝑖𝑡 são as n variáveis de controle, com valores para cada modalidade de crédito i em
cada mês t;
-
𝜀𝑖𝑡 é o termo de erro de cada operação de crédito i em cada mês t.
-
𝑖 representa as operações de crédito pessoal total, de aquisição de veículos por pessoa
física, de aquisição de outros bens por pessoa física e de capital de giro total à pessoa
jurídica;
-
𝑡 representa cada mês entre janeiro de 2009 e dezembro de 2012;
-
𝛼0 , 𝛼1 , 𝛾𝑖 , 𝜃𝑡 , 𝛽𝑛 são os parâmetros da regressão.
Ressalta-se que as dummies de tempo 𝑀𝑡 funcionam como controle para capturar a
influência de ciclos econômicos e de tendências e as dummies de modalidades de crédito 𝐶𝑖
controlam as especificidades de cada operação de concessão.
Com o modelo econométrico definido, procurou-se avaliar quais seriam as n variáveis
de controle da regressão. Na literatura, encontram-se diversos estudos que tentam identificar os
fatores que influenciam a taxa de juros de crédito e o spread.
O BCB (2014) faz periodicamente a decomposição contábil do spread com dados dos
balanços de uma amostra de instituições bancárias, procurando explicitar a contribuição de
fatores contábeis para a sua formação. O BCB decompõe o spread em cinco componentes:
i)
custos administrativos: refere-se aos custos com os insumos utilizados pela indústria
bancária, como capital físico, trabalho, recursos operacionais e depósitos;
ii)
inadimplência: diz respeito à proporção de não recebimento dos créditos
concedidos;
31
iii)
custo do compulsório: de acordo com o BCB, corresponde ao custo de oportunidade
que os bancos incorrem em deixar parte dos depósitos à vista e a prazo depositados
no BCB, com rendimento inferior ao que obteriam caso pudessem emprestar os
recursos;
iv)
tributos e taxas: incluem tributos indiretos, como IOF, PIS, COFINS e ISS, além do
Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido;
v)
resíduo: corresponde à diferença entre o spread total e a soma dos quatro
componentes anteriores. Pode ser utilizado como indicador da margem auferida pelo
banco, embora inclua outros fatores, como erros de mensuração.
Segundo Afonso, Köhler e de Freitas (2009), o exercício efetuado pelo BCB é relevante
porque permite avaliar, ex-post, a formação do spread. No entanto, por não incorporar a reação
dos agentes econômicos a alterações de variáveis, não permite fazer inferências.
Adicionalmente, a decomposição não possibilita a quantificação do impacto de outras variáveis
sobre o spread. Por exemplo, o spread deve estar fortemente correlacionado com a conjuntura
macroeconômica, aumentando em períodos de incerteza. Entretanto, uma decomposição
contábil não permite tangibilizar, por exemplo, os efeitos de um aumento na volatilidade do
PIB sobre o spread.
De acordo com Oreiro, de Paula, da Silva e Ono (2006), operações de concessão de
crédito expõem instituições financeiras à incerteza quanto à taxa de retorno dos empréstimos.
Esta incerteza decorre do fato de que uma parte dos empréstimos não será devolvida em razão
da inadimplência voluntária ou não dos tomadores, fato que é precificado na definição do
spread e da taxa de juros de crédito.
Ainda, como consequência intrínseca da atividade bancária, instituições financeiras
incorrem o risco associado aos descasamentos de indexadores e prazos entre aplicações e
captações. Operações de concessão de crédito podem ser prefixadas, ou seja, a taxa de retorno
32
é estabelecida no momento da concessão e não sofre nenhum reajuste até o final do contrato,
enquanto suas fontes de captação tendem a ser pós-fixadas, variando de acordo com as
oscilações da estrutura de taxa de juros. Complementarmente, o nível de taxa de juros
representa o custo de oportunidade da instituição financeira, pois, caso decidisse por não
conceder crédito, teria a possibilidade de rentabilizar seu capital de acordo com a taxa de juros
praticada pelo mercado sem incorrer riscos. Como neste trabalho estão sendo avaliadas as taxas
de juros de crédito e não os spreads, as taxas de juros de mercado devem ser consideradas como
um dos fatores que afeta as taxas cobradas em concessões.
No mais, é de se esperar que o ambiente regulatório também tenha a sua influência sobre
as taxas de juros de crédito. Por exemplo, o custo de oportunidade de retenção das reservas e
as exigências de capital advindas das normas de regulação e de supervisão bancária, foco deste
estudo, podem ter alguma influência no spread e, consequentemente, nas taxas.
Por fim, a concentração bancária também pode ter efeitos se a estrutura de mercado
prevalecente nesse setor for essencialmente não-competitiva. Nesse contexto, os bancos teriam
poucos incentivos para aumentar a sua eficiência operacional, operando com spreads elevados,
quer como forma de gerar receita suficiente para cobrir os seus custos elevados, quer como
resultado da capacidade de precificar os seus serviços num patamar bastante superior ao custo
marginal de produção dos serviços bancários.
Vale ressaltar que, mesmo havendo diversos fatores que afetam os spreads e as taxas de
juros de crédito, sejam eles contábeis, macroeconômicos, regulatórios ou de mercado, muitos
deles não são específicos de cada operação de crédito, portanto, não servem como variáveis de
controle para o modelo proposto neste trabalho. Especificamente em relação à concentração
bancária, se ocorresse aumento do poder de mercado nas operações afetadas pela medida
macroprudencial simultaneamente ao aumento do capital requerido, os resultados deste
trabalho poderiam ser espúrios. Contudo, a estrutura de mercado pouco mudou neste período,
33
fato que rechaça esta possibilidade. Desta maneira, buscou-se extrair fatores característicos de
cada modalidade que possam ter relação com sua respectiva taxa praticada, tendo em vista que
os impactos de fatores que afetam simultaneamente todas as operações serão capturados pelas
variáveis dummies de tempo. Assim, optou-se por utilizar as seguintes variáveis de controle:
i) Inadimplência: percentual da carteira com atraso acima de 90 dias. Instituições
financeiras, ao definirem as taxas das operações, estão interessadas na inadimplência
esperada e não ocorrida. De qualquer forma, entende-se que a inadimplência ocorrida é
uma boa proxy para a inadimplência esperada no momento da concessão do crédito.
Cada modalidade de crédito tem um comportamento peculiar de inadimplência;
ii) Swap PRÉ-DI: taxa de retorno de mercado deste instrumento. Essa variável tenta
incorporar os custos de captação e de oportunidade de instituições financeiras no
momento de concessão de crédito. Para cada modalidade, utilizou-se a taxa do swap
PRÉ-DI de acordo com o prazo médio de concessão da operação, visando a alinhar o
custo da operação a sua duração. Vale ressaltar que as taxas de juros de crédito de todas
as modalidades consideradas neste trabalho são prefixadas.
No mais, a principal variável do modelo refere-se a uma variabilidade no ambiente
regulatório, resultado de uma intervenção macroprudencial no capital requerido para algumas
operações. Portanto, a especificação completa do modelo é:
𝑠𝑖𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1 ∙ 𝐾𝑖𝑡 + 𝛾𝑖 ∙ 𝐶𝑖 + 𝜃𝑡 ∙ 𝑀𝑡 + 𝛽1 ∙ 𝐼𝑖𝑡 + 𝛽2 ∙ 𝑉𝑖𝑡 + 𝜀𝑖𝑡
(2)
Em que:
-
𝛼0, 𝛼1 , 𝐾𝑖𝑡 , 𝛾𝑖 , 𝐶𝑖 , 𝜃𝑡 , 𝑀𝑡 , 𝛽1 , 𝛽2 e 𝜀𝑖𝑡 são as mesmas variáveis descritas na equação (1);
-
𝐼𝑖𝑡 é a inadimplência de cada modalidade de crédito i em cada mês t;
-
𝑉𝑖𝑡 é a taxa de mercado do swap PRÉ-DI de acordo com o prazo médio de concessão de
cada modalidade de crédito i em cada mês t.
34
O coeficiente 𝛼1 é o parâmetro de maior interesse neste modelo. Ele mensura o impacto
que a elevação do capital requerido teve nas taxas de juros de crédito das modalidades atingidas
pelas medidas macroprudenciais, ou seja, aquisição de veículos e crédito pessoal. Se os bancos
precificam cada empréstimo com base em seu custo de financiamento marginal e se esse custo
foi alterado com a exigência adicional, então é esperado que tais instituições aumentem as taxas
das referidas operações de crédito e que isso se reflita em um coeficiente 𝛼1 > 0.
3.2)
Efeitos da alavancagem sobre o yield e o beta
Para a segunda investigação deste trabalho, que visa a avaliar se a proporção de
financiamento via capital próprio tem influência no risco de detentores de dívidas e de
acionistas, dados em painel e modelos de efeitos fixos foram novamente utilizados.
No modelo que relaciona alavancagem com risco dos detentores de dívidas, mensurado
pelo yield implícito no preço de mercado dos títulos emitidos por instituições financeiras
brasileiras, as dimensões do painel são os títulos emitidos e o tempo. Desta maneira, o modelo
é construído conforme equação a seguir:
𝑦𝑖𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1 ∙ 𝐴𝑖𝑡 + 𝛼2 ∙ 𝐿𝐿𝑖𝑡 + 𝛼3 ∙ 𝐴𝑇𝑖𝑡 + 𝛾𝑖 ∙ 𝐷𝑖 + 𝜃𝑡 ∙ 𝑇𝑡 + 𝜀𝑖𝑡
(3)
Em que:
-
𝑦𝑖𝑡 é o yield anual implícito de cada título i em cada trimestre t;
-
𝐴𝑖𝑡 é a alavancagem do banco emissor do título i em cada trimestre t;
-
𝐿𝐿𝑖𝑡 é o lucro líquido do banco emissor do título i em cada trimestre t;
-
𝐴𝑇𝑖𝑡 é o ativo total do banco emissor do título i em cada trimestre t;
-
𝐷𝑖 são variáveis dummies para cada título i, que capturam os efeitos fixos de cada
emissão e de cada banco emissor;
-
𝑇𝑡 são variáveis dummies para trimestre t, que capturam os efeitos fixos do tempo;
-
𝜀𝑖𝑡 é o termo de erro de cada título i em cada trimestre t.
35
-
𝑖 representa os títulos;
-
𝑡 representa cada trimestre entre setembro de 2010 a setembro de 2014,
respectivamente;
-
𝛼0 , 𝛼1 , 𝛼2 , 𝛼3 , 𝛾𝑖 , 𝜃𝑡 são os parâmetros da regressão.
As dummies de tempo 𝑇𝑡 funcionam como controle para capturar a influência de ciclos
econômicos e de tendências e as dummies de títulos 𝐷𝑖 controlam as especificidades de cada
emissão e de cada banco emissor, por exemplo, se a emissão foi feita por um banco público ou
privado ou se a emissão foi feita no Brasil ou no exterior.
O coeficiente 𝛼1 é o principal parâmetro em análise deste modelo. Ele reflete o efeito
da alavancagem no risco dos detentores de dívida, que é mensurado através do retorno requerido
por eles. Quanto menor for a proporção de financiamento através de capital próprio de uma
instituição financeira, menor é a capacidade de absorção de perdas de seu Patrimônio Líquido
e, logicamente, maior é a probabilidade de que esta instituição não cumpra com os
compromissos estabelecidos nos títulos por ela emitidos. Desta maneira, é esperado que
detentores de dívida exijam retorno que seja positivamente correlacionado à alavancagem do
banco, que deve gerar um coeficiente 𝛼1 > 0.
Ao contrário do risco dos detentores de dívida, não existe uma medida observável que
mensure o risco dos acionistas. Assim, pode-se estimar o risco de investidores de diversas
formas, sendo a volatilidade da ação um exemplo. Para este estudo, optou-se por utilizar o beta
alavancado de cada ação ao supor que esta métrica representa a medida de risco que acionistas
utilizam para definir seu retorno exigido, supondo que o fazem através do CAPM, desenvolvido
por Sharpe (1964) e Lintner (1965). Conforme apresentado por Miles et al. (2011), no CAPM,
o risco de acionistas é refletido pelo beta das ações da empresa (𝛽𝑎çã𝑜 ), que depende da
correlação entre as taxas de retorno da ação e do mercado como um todo, além das volatilidades
dos retornos da própria ação e do mercado. O CAPM também permite decompor o risco dos
36
ativos (𝛽𝑎𝑡𝑖𝑣𝑜𝑠 ) nos riscos incorridos por acionistas (𝛽𝑎çã𝑜 ) e por detentores de dívidas
(𝛽𝑑í𝑣𝑖𝑑𝑎𝑠 ), conforme equação a seguir:
𝐸
𝐷
𝛽𝑎𝑡𝑖𝑣𝑜𝑠 = 𝛽𝑎çã𝑜 ∙ (𝐸+𝐷) + 𝛽𝑑í𝑣𝑖𝑑𝑎𝑠 ∙ (𝐸+𝐷) (4)
𝐸
-
(𝐸+𝐷) é a proporção de capital próprio na base de capital;
-
(𝐸+𝐷) é a proporção de dívidas na base de capital.
𝐷
Supondo que não há risco sistemático nas dívidas, ou seja, que 𝛽𝑑í𝑣𝑖𝑑𝑎𝑠 = 0:
𝛽𝑎çã𝑜 = (
-
(
𝐷+𝐸
𝐸
𝐷+𝐸
𝐸
) ∙ 𝛽𝑎𝑡𝑖𝑣𝑜𝑠
(5)
) é a razão entre o total de ativos e o capital próprio, ou seja, a alavancagem.
A equação (5) declara que, se não houver risco sistemático nas dívidas dos bancos, o
prêmio de risco das ações deveria aumentar linearmente com a alavancagem. Em outras
palavras, quando um banco reduz pela metade sua alavancagem e mantém o grau de risco de
seus ativos inalterados, o mesmo nível de risco estará distribuído por colchão de capital próprio
que é duas vezes maior, o que implica que potenciais perdas dos ativos serão compartilhadas
por uma base maior de acionistas. Desta maneira, uma análise empírica da relação entre o beta
(𝛽𝑎çã𝑜 ) e a alavancagem é informativa e permite inferir sobre a ligação entre o CAPM e o
teorema de Modigliani-Miller.
No entanto, vale lembrar que os betas podem ser influenciados pelo modo como o
processo de estimação é realizado. Para tanto, é fundamental escolher corretamente o índice de
mercado, o intervalo de tempo e a frequência dos dados a serem utilizados. Desta maneira,
como índice de mercado, optou-se pelo Ibovespa, mais importante indicador de desempenho
médio das ações negociadas no Brasil. Devido às fortes variações de indicadores de mercado e
macroeconômicos no Brasil, como, por exemplo, a taxa de câmbio, calculou-se o beta em cada
período através de uma janela móvel de dois anos com frequência de retornos semanais. Optouse por semanal, em vez de diário, para evitar a possível adição de ruídos, que reduziriam a
37
qualidade estatística da regressão. Ainda, com o intuito de corrigir um possível viés gerado pela
falta de sincronia entre os preços de fechamento de cada ação e o índice de mercado, que são
cotados de forma discreta e continua respectivamente, foi utilizado o estimador de variáveis
desenvolvido por Scholes e Williams (1977) e proposto por Sanvicente e Minardi (1999),
definido como:
𝑏𝑒𝑡𝑎 =
∑1𝑘=−1 𝑏𝑒𝑡𝑎𝑘
1−2∙𝜌
(6)
Em que os três betas no numerador são estimados por mínimos quadrados ordinários, a
saber:
-
𝑘 = −1, beta é estimado através da regressão linear simples entre os retornos da ação e
os retornos do Ibovespa defasados de uma semana;
-
𝑘 = 0, beta é estimado através da regressão linear simples entre os retornos da ação e
os retornos do Ibovespa;
-
𝑘 = 1, beta é estimado através da regressão linear simples entre os retornos da ação e
os retornos do Ibovespa adiantados em uma semana;
-
𝜌 é o coeficiente de correlação entre os retornos do Ibovespa e os retornos do Ibovespa
defasados em uma semana.
Através da metodologia apresentada, obtém-se uma série semanal de betas para cada
instituição financeira. Como a unidade temporal da equação (6) é trimestral, extraiu-se a média
dos betas em cada trimestre para utilizá-lo como variável dependente do modelo.
Com a métrica de mensuração do risco dos acionistas escolhida, foram definidas as
instituições financeiras e o tempo como as dimensões do painel. Assim, o modelo em
investigação é apresentado a seguir:
𝑏𝑖𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1 ∙ 𝐴𝑖𝑡 + 𝛼2 ∙ 𝐿𝐿𝑖𝑡 + 𝛼3 ∙ 𝐴𝑇𝑖𝑡 + 𝛾𝑖 ∙ 𝐼𝑖 + 𝜃𝑡 ∙ 𝑇𝑡 + 𝜀𝑖𝑡
Em que:
-
𝑏𝑖𝑡 é o beta alavancado do banco i em cada trimestre t;
(7)
38
-
𝐴𝑖𝑡 é a alavancagem do banco i em cada trimestre t;
-
𝐿𝐿𝑖𝑡 é o lucro líquido do banco i em cada trimestre t;
-
𝐴𝑇𝑖𝑡 é o ativo total do banco i em cada trimestre t;
-
𝐼𝑖 são variáveis dummies para cada banco i, que capturam os efeitos fixos de cada
instituição financeira;
-
𝑇𝑡 são variáveis dummies para trimestre t, que capturam os efeitos fixos do tempo;
-
𝜀𝑖𝑡 é o termo de erro do banco i em cada trimestre t;
-
𝑖 representa cada banco, sendo eles o Banco do Brasil, o Bradesco e o Itaú Unibanco;
-
𝑡 representa cada trimestre entre junho de 2009 a setembro de 2014, respectivamente;
-
𝛼0 , 𝛼1 , 𝛼2 , 𝛼3 , 𝛾𝑖 , 𝜃𝑡 são os parâmetros da regressão.
Novamente, as dummies de tempo 𝑇𝑡 funcionam como controle para capturar a
influência de ciclos econômicos e de tendências e as dummies de bancos 𝐼𝑖 controlam as
especificidades de cada instituição financeira, por exemplo, se são bancos públicos ou privados.
O coeficiente 𝛼1 é o outra vez o parâmetro de interesse, pois relaciona o risco dos
acionistas com a estrutura de capital das instituições financeiras. Acionistas são os primeiros a
arcar com as perdas na ocorrência de situações adversas. Contudo, se a base de capital próprio
da instituição for suficientemente grande, perdas seriam diluídas entre os diversos investidores,
resultando, nesta situação, em um menor nível de risco para cada acionista individualmente.
Portanto, espera-se que o risco seja diretamente proporcional à alavancagem, implicando em
um coeficiente 𝛼1 > 0.
Vale ressaltar que, para os modelos (3) e (7), foram utilizadas variáveis de controle dos
bancos, sendo o ativo total uma representação do tamanho e da relevância de cada instituição e
o lucro líquido uma variável que visa a refletir a capacidade de geração de resultados das
instituições financeiras que, de forma implícita, tem relação com as probabilidades de
cumprimento de suas obrigações financeiras e de distribuição de dividendos.
39
4) Descrição dos dados
Com o intuito de efetuar as avaliações empíricas propostas neste trabalho, foram
coletados dados públicos do Sistema Financeiro Nacional e dos mercados acionário e de títulos
privados. O BCB, através do Sistema Gerenciador de Séries Temporais, disponibiliza na
internet séries temporais de indicadores da atividade econômica, da economia regional e
internacional, de expectativas de mercado, de crédito, dos mercados financeiros e de capitais,
monetários, entre outros. Especificamente sobre as operações de crédito, são disponibilizadas
séries históricas mensais dos saldos, das concessões, das taxas de juros, dos spreads, dos prazos,
da inadimplência e de provisões, todas segregadas por modalidade de crédito. Assim,
aproveitou-se dessas séries para montar a base de dados utilizada para avaliação, no nível do
empréstimo, da relação entre o capital requerido e as taxas de juros de operações de concessão
de crédito. Foram extraídos dados mensais das taxas de juros de crédito, do prazo de concessão
e da taxa de inadimplência acima de 90 dias para as operações de crédito pessoal total à pessoa
física, de aquisição de veículos por pessoa física, de aquisição de outros bens por pessoa física
e de capital de giro total à pessoa jurídica. O histórico das séries abrange desde de janeiro de
2009, dois anos anteriores às medidas macroprudenciais, até dezembro de 2012, um ano após a
reversão das medidas. No mais, para concluir a análise, foi também necessária a extração das
taxas de mercado de swaps PRÉ-DI para diferentes prazos de vencimento, que foram utilizadas
como uma das variáveis de controle da regressão. Esses dados de mercado foram obtidos na
Bloomberg. A tabela a seguir apresenta uma análise estatística da base e os gráficos
subsequentes permitem avaliar a evolução dessas variáveis na janela de análise:
40
Tabela 1 Análise da base de dados da relação entre taxa de juros e capital
Taxa de juros (%)
Inadimplência (%)
Swap DI-PRÉ (%)
45,51
5,14
11,39
(4,31)
(0,62)
(1,33)
25,87
4,52
11,39
(3,38)
(1,05)
(1,33)
55,32
12,58
10,19
(5,10)
(1,94)
(1,66)
27,84
3,45
11,04
(4,56)
(0,56)
(1,50)
Crédito Pessoal
Aquisição de veículos
Aquisição de outros bens
Capital de Giro
Nota: A tabela apresenta a média de cada variável. Entre parênteses, estão os desvios padrão.
Fontes: BCB e Bloomberg. Elaboração do autor.
Figura 1 Evolução das taxas de juros de crédito
75,0%
65,0%
55,0%
45,0%
35,0%
25,0%
15,0%
Crédito pessoal
Aquisição de veículos
Aquisição de outros bens
Capital de giro
Fonte: BCB. Elaboração do autor.
Figura 2 Evolução da inadimplência acima de 90 dias
18,0%
16,0%
14,0%
12,0%
10,0%
8,0%
6,0%
4,0%
2,0%
0,0%
Crédito pessoal
Fonte: BCB. Elaboração do autor.
Aquisição de veículos
Aquisição de outros bens
Capital de giro
41
Figura 3 Evolução do swap PRÉ-DI
14,0%
13,0%
12,0%
11,0%
10,0%
9,0%
8,0%
7,0%
6,0%
Crédito pessoal/Aquisição de veículos
Aquisição de outros bens
Capital de giro
Fonte: Bloomberg. Elaboração do autor.
Adicionalmente, julgou-se conveniente analisar como o índice de Basileia das principais
instituições financeiras do Brasil evoluiu durante esse período. O gráfico a seguir apresenta os
índices em cada trimestre de algumas instituições:
Figura 4 Evolução do índice de Basileia dos principais bancos brasileiros
19,00%
18,00%
17,00%
16,00%
15,00%
14,00%
13,00%
12,00%
11,00%
2T2009 3T2009 4T2009 1T2010 2T2010 3T2010 4T2010 1T2011 2T2011 3T2011 4T2011 1T2012 2T2012 3T2012 4T2012
Banco do Brasil
Bradesco
Caixa Econômica Federal
Citibank
HSBC
Itaú Unibanco
Safra
Votorantim
Fonte: BCB. Elaboração do autor.
Exceção ao Itaú Unibanco, todas as instituições financeiras apresentaram redução em
seus respectivos índices de Basileia no momento da adoção da medida macroprudencial,
ocorrida no final de 2010. Já a reversão da medida no último trimestre de 2011 teve efeito
positivo no índice da maioria dos bancos.
Ainda, o BCB, através de sua página na internet, divulga estatísticas sobre a supervisão
do Sistema Financeiro Nacional. Dentre as informações, são disponibilizados, trimestralmente
42
desde 1995, os balancetes de cada instituição financeira regulada, contendo as composições de
ativos e passivos, o resultado da intermediação financeira, o resultado líquido no período e os
índices de imobilização e de Basileia. Com esses dados, foi possível extrair parte das variáveis
de interesse do segundo objetivo deste trabalho, que está relacionado à avaliação da relação
entre o risco das instituições financeiras e a alavancagem. A alavancagem, ao invés de ser
calculada pela divisão entre o Ativo Total e o Capital de Nível I, foi aproximada pela divisão
do Ativo Total pelo Patrimônio Líquido. Tal aproximação se justifica por conta da inexistência
de instrumentos híbridos no Brasil até 2014, que poderiam compor o Capital de Nível I.
Em sequência, pensou-se sobre quais informações poderiam refletir o risco das
instituições financeiras do ponto de vista de detentores de dívidas e de acionistas. Para o
primeiro público, procurou-se identificar títulos privados emitidos por instituições financeiras
atuando no Brasil que tinham informações históricas de mercado. Assim, foram selecionados
quinze títulos de oito bancos distintos, sendo eles: Banco do Brasil, Bradesco, Daycoval, Itaú
Unibanco, Pan, Safra, Santander e Votorantim. Como representação do risco dos detentores de
dívidas, extraiu-se da Bloomberg o yield anual implícito nos preços de mercado de cada título
selecionado, de setembro de 2010 até setembro de 2014 com frequência trimestral. A tabela a
seguir apresenta uma análise estatística da base:
43
Tabela 2 Análise da base de dados da relação entre yield e alavancagem
Yield (%)
Lucro Líquido
Ativo total
(R$ milhões)
(R$ milhões)
Alavancagem
7,15
16,62
4,59
1043
(0,96)
(1,07)
(1,91)
(182)
4,31
11,22
4,37
710
(0,58)
(0,77)
(1,57)
(91)
4,25
6,02
0,11
13
(1,35)
(0,55)
(0,05)
(2)
4,09
11,37
5,31
894
(0,41)
(0,41)
(1,93)
(126)
6,92
10,99
-0,10
17
(0,61)
(13,51)
(0,14)
(5)
10,78
15,42
0,46
105
(1,30)
(1,72)
(0,19)
(24)
4,25
7,00
1,10
448
(0,97)
(0,99)
(0,43)
(46)
5,91
14,20
-0,15
114
(0,52)
(1,21)
(0,50)
(9)
Banco do Brasil
Bradesco
Daycoval
Itaú Unibanco
Pan
Safra
Santander
Votorantim
Nota: A tabela apresenta a média de cada variável. Entre parênteses, estão os desvios padrão.
Fonte: Elaboração do autor.
Por fim, para mensurar o risco dos acionistas, preços semanais do mercado de ações
BM&FBOVESPA foram utilizados, extraídos da Bloomberg. Contudo, limitou-se a análise
apenas as instituições financeiras listadas em bolsa brasileira e com liquidez suficiente, ou seja,
Banco do Brasil, Bradesco, Itaú Unibanco e Santander. Como a mensuração do beta exige uma
série longa de retornos, optou-se por não incluir o Santander na amostra, uma vez que a primeira
negociação de suas ações na BM&FBOVESPA ocorreu em 2009. Assim, para mensurar o risco
dos acionistas, utilizou-se o beta alavancado de cada papel, cuja metodologia de cálculo foi
44
detalhada na seção 3, de junho de 2009 até setembro de 2014 com frequência trimestral. A
tabela a seguir apresenta uma análise estatística da base:
Tabela 3 Análise da base de dados da relação entre beta e alavancagem
beta
Lucro Líquido
Ativo total
(R$ milhões)
(R$ milhões)
Alavancagem
1,22
17,12
4,44
949
(0,11)
(1,37)
(2,10)
(213)
0,92
11,17
4,13
646
(0,14)
(0,69)
(1,54)
(133)
1,02
11,42
5,10
823
(0,08)
(0,40)
(1,88)
(164)
Banco do Brasil
Bradesco
Itaú Unibanco
Nota: A tabela apresenta a média de cada variável. Entre parênteses, estão os desvios padrão.
Fonte: Elaboração do autor.
45
5) Resultados
5.1)
Efeitos da medida macroprudencial sobre as taxas de juros de crédito
Para buscar evidências do possível impacto da elevação do requerimento de capital na
economia de forma abrangente, o ponto central da discussão passa pela reação dos bancos nesta
situação. Desta maneira, procurou-se investigar a existência de um possível choque negativo
para o consumidor final, gerado pela medida macroprudencial que elevou o capital requerido
para algumas operações de crédito a pessoas físicas. O choque ao consumidor é mensurado pelo
aumento do custo de crédito. Se evidenciada a ocorrência do aumento como reflexo do aumento
do capital requerido, pode-se argumentar que esta situação poderia motivar a redução do
consumo, tendo efeito adverso na atividade econômica como um todo.
Como o método dos mínimos quadrados supõe que os resíduos são independentes, o
que pode não ser realista, dado que uma observação de uma variável de uma modalidade de
crédito pode ter alguma correlação com sua observação no período anterior ou mesmo as
observações em um mesmo período podem sofrer influência de um efeito externo que afete-as
simultaneamente, optou-se por agrupar os dados (clusters) para indicar que as observações
podem estar correlacionadas dentro de um mesmo mês (I) ou dentro de uma mesma modalidade
de crédito (II).
Assim, regrediu-se a equação (3) discutida na seção 3, cujos resultados são apresentados
na Tabela 4:
46
Tabela 4 Estimação da relação entre exigência de capital adicional e taxas - modelo (2)
Variável dependente: taxa (%)
(I)
(II)
6.464609 ***
6.464609 *
(0.8718941)
(2.201732)
1.074798 **
1.074798 **
(0.4275475)
(0.2204491)
1.395569 *
1.395569 *
(0.7684272)
(0.4905664)
Agrupamento
Meses
Modalidades de crédito
Observações
192
192
Modalidade de crédito
4
4
Meses
48
48
0.9431
0.9431
Capital adicional
Inadimplência (%)
Swap PRÉ-DI (%)
R2 ajustado
Nota: *, ** e *** indicam os coeficientes estatisticamente significantes a 10%, 5% e 1%, respectivamente. Entre
parênteses, estão os desvios padrão robustos.
Fonte: Elaboração do autor.
O resultado do modelo indica que as taxas de juros de crédito das modalidades afetadas
pela medida macroprudencial aumentaram em 6,46 pontos-percentuais durante o período em
que capital requerido era maior, ou seja, de dezembro de 2010 a outubro de 2011, com níveis
de confiança superiores a 99%, ao agrupar os meses, e a 90%, ao agrupar as modalidades de
crédito. Portanto, no nível do empréstimo, há evidências estatísticas de que o aumento do capital
requerido impactou a atividade econômica, através do aumento do custo de crédito.
No mais, os sinais dos controles utilizados são consistentes com a expectativa inicial: é
possível concluir que o nível de inadimplência de cada modalidade de crédito tem correlação
positiva com suas respectivas taxas, com nível de confiança superior a 95%. Por fim, os
coeficientes da variável swap PRÉ-DI, cuja intenção é a representação dos custos de captação
e de oportunidade das operações, confirmam que as taxas de juros de crédito são crescentes
com os referidos custos, com nível de confiança superior a 90%.
47
5.2)
Efeitos da alavancagem sobre o yield e o beta
A elevação do requerimento de capital próprio, por reduzir a probabilidade de falência
das instituições financeiras, poderia não ter impacto no custo de capital médio ponderado no
nível do banco, se investidores de ações e de dívidas levarem em consideração o menor nível
de risco incorrido no estabelecimento da taxa de retorno exigida pelos respectivos papéis
detidos. O modelo (3) da seção 3 busca analisar a relação entre o retorno exigido por detentores
de dívidas e a alavancagem das instituições financeiras em questão. Novamente, por supor que
as observações podem não ser independentes, efetuou-se duas simulações, uma ao agrupar os
trimestres e outra ao agrupar os títulos. A Tabela 5 apresenta os resultados estimados:
Tabela 5 Estimação da relação entre yield e alavancagem - modelo (3)
Variável dependente: yield (%)
(I)
(II)
0.0256571 **
0.0256571 *
(0.0089308)
(0.0146967)
-1.34e-09
-1.34e-09
(5.03e-08)
(4.68e-08)
3.54e-09 ***
3.54e-09
(8.88e-10)
(2.53e-09)
Agrupamento
Trimestres
Títulos
Observações
255
255
Títulos
15
15
Trimestres
17
17
R2 ajustado
0.8550
0.8550
Alavancagem
Lucro líquido (R$)
Ativo total (R$)
Nota: *, ** e *** indicam os coeficientes estatisticamente significantes a 10%, 5% e 1%, respectivamente.
Entre parênteses, estão os desvios padrão robustos.
Fonte: Elaboração do autor.
Como se nota na Tabela 5, o retorno requerido pelos detentores de dívidas, representado
pelo yield implícito no preço dos títulos emitidos, tem correlação positiva com a alavancagem
48
das instituições financeiras emissoras, com níveis de confiança superiores a 95%, ao agrupar
os trimestres, e a 90%, ao agrupar os títulos. Esse resultado permite concluir que o aumento de
capital próprio reduziria o retorno requerido por detentores de dívidas, pois essa ação seria
traduzida em maior robustez patrimonial da instituição e, consequentemente, menor
probabilidade de inadimplência. Na base de dados que serviu de insumo para a regressão, a
alavancagem média dos bancos da amostra era cerca de 11 vezes na janela avaliada. Baseandose nos resultados do modelo, conclui-se que se a alavancagem dos bancos caísse pela metade
(ou seja, para 5,5 vezes, na média), o yield das dívidas cairia em 0,14 ponto-percentual. Apesar
de significante, entende-se que o impacto da alavancagem é pequeno no yield dos títulos, dado
que a média de yields na base é de 5,3%.
Os controles utilizados não apresentaram resultados significantes, exceção ao ativo
total, quando agrupado por trimestre, que apresenta inesperadamente correlação positiva com
o yield. Imaginava-se que o resultado seria contrário ao evidenciado, dado que instituições
maiores costumam ter maior confiança das partes interessadas, o que tenderia a resultar em uma
correlação negativa entre yield e ativo total.
Com o mesmo espectro de bancos e o mesmo período utilizados na avaliação empírica
recém relatada (modelo 3), julgou-se informativa a investigação da relação entre o retorno sobre
os ativos (Return on Assets – RoA) realizado e o nível de alavancagem dos bancos, através de
um modelo de efeitos fixos. Os resultados destas estimações são apresentados na tabela a seguir:
49
Tabela 6 Estimação da relação entre RoA e alavancagem
Variável dependente: RoA (%)
(I)
(II)
-0.0503667 ***
-0.0503667 ***
(0.0061334)
(0.0021825)
Agrupamento
Trimestres
Bancos
Observações
176
176
Bancos
8
8
Trimestres
17
17
R2 ajustado
0.7298
0.7298
Alavancagem
Nota: *, ** e *** indicam os coeficientes estatisticamente significantes a 10%, 5% e 1%, respectivamente.
Entre parênteses, estão os desvios padrão robustos.
Fonte: Elaboração do autor.
Com nível de confiança superior a 99%, a correlação entre RoA e alavancagem é
negativa, ou seja, o aumento da alavancagem tenderia a reduzir o retorno sobre os ativos, tudo
mais constante. Supondo a não variabilidade dos ativos, a explicação para a relação inversa
entre RoA e alavancagem está na influência que a alavancagem teria no custo de financiamento
da instituição financeira, e, por consequência, no numerador do índice RoA. Níveis mais
elevados de alavancagem trariam duas consequências: (i) aumento da base de capital de
terceiros e (ii) aumento do custo de captação, como reflexo de seu maior risco, conforme
resultados do modelo (3). Esses efeitos não seriam neutralizados pela diminuição da base de
capital próprio na mensuração do RoA, dado que o custo de capital próprio é um custo
econômico e não financeiro, ao contrário do custo de capital de terceiros. Portanto, este
resultado empírico corrobora a evidência de que níveis mais baixos de alavancagem refletiriam
na redução do retorno exigido por detentores de dívidas, que, por sua vez, gerariam um RoA
mais elevado, tudo mais constante.
Já o modelo (7) da seção 3 avalia a relação entre a medida de risco utilizada por
acionistas na definição de seu retorno exigido, supondo que o fazem via CAPM, e a
50
alavancagem dos bancos. Outra vez, por supor que as observações podem não ser
independentes, efetuou-se duas simulações, uma ao agrupar os trimestres e outra ao agrupar os
bancos. A Tabela 4 apresenta os resultados estimados:
Tabela 7 Estimação da relação entre beta e alavancagem - modelo (7)
Variável dependente: beta
(I)
(II)
0.0757252 ***
0.0757252 ***
(0.0211963)
(0.0049336)
-2.04e-08
-2.04e-08
(1.69e-08)
(1.68e-08)
-1.03e-09 ***
-1.03e-09
(3.57e-10)
(7.05e-10)
Agrupamento
Trimestres
Bancos
Observações
66
66
Bancos
3
3
Trimestres
22
22
R2 ajustado
0.6826
0.6826
Alavancagem
Lucro líquido (R$)
Ativo total (R$)
Nota: *, ** e *** indicam os coeficientes estatisticamente significantes a 10%, 5% e 1%, respectivamente. Entre
parênteses, estão os desvios padrão robustos.
Fonte: Elaboração do autor.
O resultado obtido do modelo evidencia que a alavancagem possui correlação positiva
com o beta alavancado, com nível de confiança superior a 99% nas duas simulações. Esta
evidência permite concluir que instituições financeiras com maior alavancagem possuem maior
risco, consequentemente acionistas requerem maior retorno de suas ações, alinhando-se à teoria
apresentada na equação (5). Se analisados os dados insumos da regressão, observa-se que a
alavancagem média dos bancos da amostra era cerca de 13 vezes na janela avaliada. Baseandose nos resultados do modelo, ao supor uma situação de redução da alavancagem pela metade, o
beta dos bancos diminuiria em magnitude próxima de 0,5. Além de significante, este resultado
é expressivo, dado que a média de betas na base é de 1,05. Considerando o CAPM como modelo
51
de estabelecimento da taxa de retorno requerida e um prêmio de risco de mercado de 5% a.a.,
o retorno exigido por acionistas neste cenário seria 2,5 pontos-percentuais menor. Ao comparar
o impacto da redução da alavancagem nos retornos requeridos por detentores de dívidas e por
acionistas, nota-se que o efeito é muito mais forte para o segundo público.
Novamente, não há evidências estatísticas de que os controles utilizados tenham alguma
relação com beta das ações, exceção ao ativo total no agrupamento por trimestres, que apresenta
correlação negativa com o beta, com nível de confiança superior a 99%. Esse resultado vai de
encontro com o modelo de três fatores de Fama e French (1992), cuja análise sugere que
empresas menores tendem a ter uma exigência de retorno adicional pelos investidores, se
comparadas a empresas maiores.
Por fim, para a mesma janela de tempo e os mesmos bancos considerados no modelo
(7), procurou-se apurar a relação entre o retorno sobre o capital próprio (RoE) realizado e os
níveis de alavancagem dos bancos, através de um modelo de efeitos fixos. Os resultados destas
estimações são apresentados na tabela a seguir:
Tabela 8 Estimação da relação entre RoE e alavancagem
Variável dependente: RoE (%)
(I)
(II)
0.4041946
0.4041946 **
(0.3873829)
(0.0614664)
Trimestres
Bancos
Quantidade de observações
66
66
Bancos
3
3
Trimestres
22
22
R2 ajustado
0.8293
0.8293
Alavancagem
Agrupamento
Nota: *, ** e *** indicam os coeficientes estatisticamente significantes a 10%, 5% e 1%, respectivamente.
Entre parênteses, estão os desvios padrão robustos.
Fonte: Elaboração do autor.
52
Diferentemente da correlação negativa entre RoA e alavancagem, foi identificado um
indício de correlação positiva entre RoE e alavancagem, com nível de confiança superior a 95%
ao agrupar os bancos. Essa evidência indica que, mesmo que a alavancagem tenha influência
indesejada no custo marginal de captação dos bancos e, por consequência, no numerador do
índice RoE, a influência do denominador é dominante. Se suposto que o RoE realizado reflete
exatamente o retorno exigido por acionistas, a correlação positiva entre RoE e alavancagem é
mais uma documentação de que a redução da alavancagem diminuiria o retorno exigido eles.
No agrupamento de trimestres, o resultado não foi estatisticamente significante.
Com base nos resultados apresentados nesta subseção, há evidências estatísticas para
afirmar que, no nível do banco, o aumento do requerimento de capital próprio tenderia a
diminuir tanto o custo de dívidas quanto o custo de capital próprio das instituições financeiras.
Esta constatação leva a imaginar que o custo de financiamento total dos bancos pode não
aumentar com o aumento da proporção de capital próprio no mix de capital, podendo essa
investigação ser a motivação de um trabalho posterior. Destaca-se, ainda, que as instituições
financeiras no Brasil operam com níveis de alavancagem relativamente baixos, assim, a
documentação dos efeitos da alavancagem sobre o yield implícito dos títulos e sobre o beta
alavancado dos bancos era menos esperado, logo, deve ser ainda mais forte em um mercado
cujos níveis de alavancagem são maiores.
53
6) Conclusão
Este trabalho investiga, empiricamente, alguns dos argumentos utilizados no debate de
maior exigência de capital das instituições financeiras. Para avaliar se um requisito regulatório
de capital mais elevado afetaria a economia de modo geral, foram analisadas as medidas
macroprudenciais ocorridas no Brasil entre 2010 e 2011, que, dentre outras consequências,
aumentaram o capital requerido de algumas operações de crédito à pessoa física por um período
definido, de dezembro de 2010 a outubro de 2011. Com este cenário, pôde-se concluir
estatisticamente que, no nível do empréstimo, a maior exigência de capital regulatório
aumentou as taxas de juros de crédito das modalidades de crédito afetadas em 6,46 pontospercentuais, impactando, portanto, a economia através do aumento do custo de crédito,
evidência também encontrada por Martins e Schechtman (2013) no estudo específico sobre os
empréstimos para aquisição de veículos. Não se sabe o que ocorreria com a taxa média se o
requerimento fosse aumentado uniformemente.
Por outro lado, no nível agregado do banco, se houvesse uma maior exigência de capital
próprio, a teoria sugere que o custo de capital próprio e o custo de dívida diminuiriam como
reflexo da redução do risco incorrido por acionistas e detentores de dívidas, respectivamente.
Desta maneira, analisou-se também a relação do nível de alavancagem dos bancos brasileiros
com o yield de títulos privados por eles emitidos, que mensura o risco dos detentores de dívidas,
e também com o risco dos acionistas, quantificado através do beta alavancado das ações dos
bancos, supondo que acionistas estabelecem seu retorno exigido pelo CAPM. Como resultado,
foram obtidas evidências estatísticas de que há correlação positiva tanto entre o yield das
dívidas e a alavancagem quanto entre o beta alavancado das ações e a alavancagem,
similarmente ao concluído por Baker e Wurgler (2013) e por Miles et al. (2011) para os
mercados norte-americano e britânico, respectivamente. Ou seja, conclui-se que quanto maior
for a participação de capital próprio no financiamento da instituição financeira, menor será o
54
retorno requerido por acionistas e detentores de dívidas. No entanto, não foi investigado se
essas reduções de custo neutralizariam o deslocamento de financiamento via dívidas para
financiamento via capital próprio, ou seja, de um instrumento com menor retorno requerido
para um outro com maior retorno requerido.
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