Insper Instituto de Ensino e Pesquisa Programa de Mestrado Profissional em Economia Rafael Pinhate Bandeira REQUERIMENTO DE CAPITAL MAIS ELEVADO: UMA AVALIAÇÃO DE SEU IMPACTO NA ECONOMIA E NO RISCO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS São Paulo 2014 Rafael Pinhate Bandeira Requerimento de capital mais elevado: uma avaliação de seu impacto na economia e no risco das instituições financeiras Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Economia do Instituto de Ensino e Pesquisa, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Economia. Área de concentração: Finanças Orientador: João Manoel Pinho de Mello – Instituto de Ensino e Pesquisa São Paulo 2014 Bandeira, Rafael Pinhate Requerimento de capital mais elevado: uma avaliação de seu impacto na economia e no risco das instituições financeiras / Rafael Pinhate Bandeira; orientador - João Manoel Pinho de Mello. - São Paulo, 2014. 57 f. Dissertação (Mestrado - Programa de Mestrado Profissional em Economia, Área de concentração: Finanças aplicadas) - Insper Instituto de Ensino e Pesquisa. 1.requerimento de capital 2.alavancagem 3.taxa de juros de empréstimos 4.risco 5. medidas macroprudenciais FOLHA DE APROVAÇÃO Rafael Pinhate Bandeira Requerimento de capital mais elevado: uma avaliação de seu impacto na economia e no risco das instituições financeiras Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Economia do Instituto de Ensino e Pesquisa, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Economia. Área de concentração: Finanças. Aprovado em: janeiro/2015 Banca examinadora Prof. Dr. João Manoel Pinho de Mello Assinatura:_______________________ Instituição: Insper Prof. Dr. Ricardo Oliveira Brito Assinatura:_______________________ Instituição: Insper Prof. Dr. Márcio Issao Nakane Instituição: USP Assinatura:_______________________ A meus avós, Cida, Teresa, Dino e Antônio, e a meus pais, Marli e Antônio. AGRADECIMENTOS Agradeço a meu orientador, Prof. Dr. João Manoel Pinho de Mello, pelo grande apoio técnico e incentivo durante o processo de desenvolvimento deste trabalho. À instituição onde atualmente trabalho, por acreditar no meu potencial e por incentivar o meu desenvolvimento acadêmico. A minhas colegas de mestrado, Jordana, Marisa e Thaís, por toda a troca de conhecimentos e pelo ambiente amigável no curso. À Nathália Nicoletti, pela compreensão e suporte durante os dois anos de mestrado. A meus pais, Marli e Antônio, por sempre terem me propiciado a oportunidade de ter uma educação de qualidade e por me incentivarem em todas as minhas decisões. Obrigado por fazerem parte da minha vida e me apoiarem na busca de ser uma pessoa melhor. RESUMO Bandeira, Rafael Pinhate. Requerimento de capital mais elevado: uma avaliação de seu impacto na economia e no risco das instituições financeiras São Paulo, 2014. 57 f. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Ensino e Pesquisa, São Paulo, 2014 Requerimento mínimo de capital é uma ferramenta central da regulação bancária e tem sido objeto recorrente de debates desde a última crise financeira. Por um lado, economistas defendem que o requerimento de capital próprio deveria ser elevado em níveis muito acima dos atuais propostos no Acordo de Basileia III. Em contrapartida, instituições financeiras argumentam que tal medida afetaria a economia, através do encarecimento do custo de crédito ou da redução de sua oferta, que também exerceria pressão sobre seu preço. Este trabalho contribui para o debate de requisito mínimo de capital de duas maneiras. Primeiramente, são investigadas as consequências no custo de crédito do aumento do requerimento de capital no nível do empréstimo, através da análise de medidas macroprudenciais adotadas pelo Banco Central do Brasil entre 2010 e 2011, que aumentaram a exigência capital de algumas operações de concessão de crédito à pessoa física por um período determinado. Como resultado, há evidências estatísticas de que as taxas de juros de crédito das operações afetadas pelas medidas tenham aumentado junto com o maior nível de capital requerido dessas operações. Não se sabe o que ocorreria com a taxa média se o requerimento fosse aumentado uniformemente. Por outro lado, a teoria prediz que, no nível agregado do banco, o aumento da proporção de capital próprio no mix de capital reduziria o custo de dívidas e o custo de equity, deixando o custo de capital médio ponderado inalterado, apesar do aumento da proporção do capital mais caro. Em um segundo momento, para avaliar este argumento, analisou-se a relação entre alavancagem e o risco de detentores de dívidas, mensurado através do yield implícito nos preços dos títulos emitidos por instituições financeiras brasileiras, e a relação entre alavancagem e o risco de acionistas, mensurado através do beta alavancado das ações dos maiores bancos no Brasil. Conclui-se que quanto maior for a participação de capital próprio no mix de capital, ou seja, quanto menor for a alavancagem, menor será o retorno requerido por acionistas e detentores de dívidas e este efeito poderia tender a neutralizar o deslocamento de financiamento via dívidas para financiamento via capital próprio, ou seja, de um instrumento com menor retorno requerido para um outro com maior retorno requerido. Palavras-chaves: requerimento de capital; alavancagem; taxa de juros de empréstimos; medidas macroprudenciais; risco. Código JEL: G21, G28. ABSTRACT Bandeira, Rafael Pinhate. Higher capital requirement: an assessment of its impact on the economy and on the financial institutions’ risk São Paulo, 2014. 57 f. Dissertation (Mastership) - Instituto de Ensino e Pesquisa, São Paulo, 2014 Minimum capital requirement is a central tool of banking regulation and has been the recurring subject of debate since the last financial crisis. On the one hand, economists advocate that the Common Equity Tier I requirement should be raised much above the current levels proposed by the Basel III Accord. However, financial institutions argue that this measure would affect the economy through an increase of cost of credit or a reduction in the credit supply, which would also press its price. This paper contributes to the minimum required capital debate in two ways. First, it investigates the consequences on the cost of credit of a higher capital requirement at the loan level, analyzing macro prudential measures adopted by Central Bank of Brazil between 2010 and 2011, which increased the capital requirement of specific individuals lending operations for a certain period. As a result, we find statistical evidence that the loan interest rates of the affected operations have increased along with the higher level of required capital for these operations. It is not known what would happen to the average interest rate if the requirement was homogeneously increased. By contrast, at the bank aggregate level, the theory predicts that increasing the equity proportion in the capital mix would reduce the cost of debt and cost of equity, leaving the weighted average cost of capital unchanged, despite the higher proportion of more expensive capital. In a second investigation to evaluate this argument, we analyzed the relationship between leverage and the risk of debt holders, measured by the implicit yield in the prices of bonds issued by Brazilian financial institutions, and the relationship between leverage and the shareholders risk, measured by leveraged beta of the biggest banks in Brazil. It follows that the greater the share of equity financing in the capital mix, that is, the lower the leverage, the lower the debtholders and shareholders’ required return and this effect could tend to counteract the shifting from debt finance to equity finance, that is, from an instrument with a lower required rate of return to an instrument with a higher required rate of return. Keywords: capital requirement; leverage; loan interest rate; macro prudential measure; risk. JEL code: G21, G28. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 Evolução das taxas de juros de crédito ...................................................................... 40 Figura 2 Evolução da inadimplência acima de 90 dias ............................................................ 40 Figura 3 Evolução do swap PRÉ-DI ........................................................................................ 41 Figura 3 Evolução do índice de Basileia dos principais bancos brasileiros ............................. 41 LISTA DE TABELAS Tabela 1 Análise da base de dados da relação entre taxa de juros e capital ..................... 40 Tabela 2 Análise da base de dados da relação entre yield e alavancagem......................... 43 Tabela 3 Análise da base de dados da relação entre beta e alavancagem ......................... 44 Tabela 4 Estimação da relação entre exigência de capital adicional e taxas - modelo (2)46 Tabela 5 Estimação da relação entre yield e alavancagem - modelo (3) ............................ 47 Tabela 6 Estimação da relação entre RoA e alavancagem ................................................. 49 Tabela 7 Estimação da relação entre beta e alavancagem - modelo (7) ............................ 50 Tabela 8 Estimação da relação entre RoE e alavancagem ................................................. 51 SUMÁRIO SUMÁRIO EXECUTIVO...................................................................................................... 11 1) INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 14 2) REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ...................................................................................... 20 3) METODOLOGIA........................................................................................................... 26 3.1) EFEITOS DA MEDIDA MACROPRUDENCIAL SOBRE AS TAXAS DE JUROS DE CRÉDITO ........................................................................................................... 26 3.2) EFEITOS DA ALAVANCAGEM SOBRE O YIELD E O BETA ......................... 34 4) DESCRIÇÃO DOS DADOS .......................................................................................... 39 5) RESULTADOS ............................................................................................................... 45 5.1) EFEITOS DA MEDIDA MACROPRUDENCIAL SOBRE AS TAXAS DE JUROS DE CRÉDITO ........................................................................................................... 45 5.2) EFEITOS DA ALAVANCAGEM SOBRE O YIELD E O BETA ......................... 47 6) CONCLUSÃO................................................................................................................. 53 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 55 11 Sumário executivo A crise financeira que teve início em 2007 começou nos Estados Unidos após o colapso da bolha especulativa no mercado imobiliário, alimentada pela enorme expansão de crédito bancário e potencializada pelo uso de novos instrumentos financeiros, notadamente securitizações, tendo se espalhado pelo mundo todo em poucos meses. O evento marcante da crise foi a falência do banco de investimento Lehman Brothers, em 2008, após a recusa do Federal Reserve em socorrer a instituição. Este cenário turbulento gerou um aumento da preferência das instituições financeiras pela liquidez, ou seja, por ativos de fácil liquidação, e levou à contração do crédito bancário para transações comerciais e industriais. A "evaporação do crédito" resultou em uma rápida e profunda queda da produção industrial e do comércio internacional em todo o mundo, tornando-se também uma crise econômica. Uma das possíveis causas dessa crise é a regulação bancária pouco rígida naquele momento. Desde então, reguladores e órgãos internacionais de supervisão bancária e de estabilidade financeira têm trabalhado para introduzir um conjunto de propostas para sua reforma, com o objetivo de promover maior resiliência no setor. Avalia-se que umas das principais razões para a crise ter se tornado tão severa decorreu da alavancagem excessiva do setor bancário de muitos países, ou seja, do alto nível de endividamento dos bancos, acompanhada de uma gradual erosão do nível e da qualidade da base de capital, que nada mais é que o patrimônio que instituições financeiras devem manter para absorver perdas de eventos inesperados. Desta forma, o Acordo de Basileia III introduziu exigências que buscam o aumento da qualidade, da consistência e da transparência da base de capital. Mesmo com os avanços da regulação bancária desde 2008, as discussões sobre os requerimentos mínimos de capital e seus respectivos impactos na economia continuam tendo lugar de destaque na agenda de economistas, reguladores e instituições financeiras. Por um lado, economistas defendem que a exigência mínima de capital próprio deveria ser elevada em 12 níveis muito acima dos atuais propostos no Acordo de Basileia III, pois esta situação reduziria a probabilidade de falência dos bancos, evitando a originação e o contágio de crises financeiras. Em contrapartida, instituições financeiras argumentam que tal medida teria efeitos sobre a economia, dado que um eventual requisito de capital adicional poderia implicar em maior custo aos bancos e que esse seria repassado ao consumidor final através do encarecimento do custo de crédito, ou mesmo estancaria a sua oferta, fato que também exerceria pressão sobre o preço do crédito. Ambas as situações tenderiam a reduzir o nível de investimento e o consumo, tendo efeito adverso na atividade econômica. Este trabalho contribui para o debate sobre o requerimento de capital de duas maneiras. Primeiramente, são investigadas as consequências da elevação da exigência de capital na economia, através da análise um caso específico ocorrido no Brasil. Em dezembro de 2010, o Banco Central do Brasil adotou medidas macroprudenciais, que são medidas de regulação e de supervisão do sistema financeiro e buscam o estabelecimento de um ambiente de estabilidade em seu sentido mais amplo, que transcende os agentes individuais e, portanto, tem um caráter sistêmico. Uma dessas medidas relacionava-se ao aumento do capital requerido para algumas operações de crédito à pessoa física. Aproveitando-se deste cenário regulatório, foi avaliado empiricamente o impacto do aumento da exigência de capital nas taxas de juros das operações de crédito afetadas, concluindo que, no nível do empréstimo, o maior requerimento de capital regulatório aumentou as taxas, impactando, portanto, a economia através do aumento do custo de crédito. Não se sabe o que ocorreria com a taxa média se o requerimento fosse aumentado uniformemente. Por outro lado, no nível agregado do banco, a teoria prediz que a redução no endividamento e o aumento na proporção de capital próprio no financiamento do banco reduziriam tanto o custo de dívidas quanto o custo de capital próprio, por consequência da redução de seu risco de falência. Essas reduções deixariam o custo de capital médio ponderado 13 inalterado, apesar do aumento da proporção do capital mais caro (capital próprio). Em outras palavras, o aumento da exigência de capital próprio não teria efeitos no custo de capital total do banco, não justificando, portanto, o aumento do custo de crédito. Assim, em uma segunda documentação, foram analisadas as relações entre alavancagem e o custo de dívidas e entre alavancagem e o custo de capital próprio. Como resultado, conclui-se que há correlação positiva entre alavancagem e ambos os custos, o que implica que quanto maior for a participação de capital próprio no financiamento da instituição financeira, menor será o retorno requerido por acionistas e detentores de dívidas e este efeito poderia tender a contrabalancear o deslocamento de financiamento via dívidas para financiamento via capital próprio, ou seja, de um instrumento com menor retorno requerido para um outro com maior retorno requerido. 14 1) Introdução O nível de capitalização e de alavancagem das instituições financeiras tem sido objeto recorrente de debates, principalmente após a crise financeira global, cujo ápice ocorreu em 2008. Capital tem como objetivo principal a absorção de perdas em cenários severos, visando à proteção de depositantes e, de forma ampla, dos sistemas financeiro e econômico. Durante a crise de 2008, pode-se afirmar que o capital de fato absorveu perdas, como, por exemplo, no caso do Lehman Brothers, cujos acionistas tiveram seus investimentos zerados com a falência da instituição. Contudo, a insuficiência de capital para absorver as perdas em sua integridade bem como a pouca qualidade do capital disponível culminaram em aportes efetuados por instituições governamentais para evitar um problema ainda maior oriundo do contágio e para preservar a estabilidade do sistema financeiro e econômica. Desta forma, mesmo após alguns anos de discussões, é possível dizer os economistas e os representantes do setor bancário não se entendem. O tema central em questão é a exigência de capital para as instituições financeiras: economistas argumentam que a exigência de capital próprio deveria aumentar de forma significativa, muito acima dos atuais níveis do Acordo de Basileia III, ato esse que geraria maior resiliência das instituições financeiras e, consequentemente, diminuiria a probabilidade de ocorrência de crises e de necessidade de suportes governamentais, representando, portanto, a solução socialmente ótima. Já os representantes de instituições financeiras não concordam e afirmam que tal manifestação seria prejudicial aos empréstimos e à economia em geral, dado que o aumento de capital requerido acarretaria em aumento do custo de empréstimos e/ou em racionamento do crédito disponível na economia. Neste cenário, o presente trabalho tem como principal intuito averiguar, empiricamente, alguns dos argumentos utilizados no debate de maior exigência de capital das instituições financeiras, que pode ter múltiplas implicações. Assim, este documento buscar contribuir para a discussão de duas maneiras. Primeiramente, o maior requisito regulatório de capital poderia 15 se traduzir em um maior custo de financiamento das instituições financeiras, uma vez que haveria a necessidade de operar com níveis mais elevados de capital cujo custo é maior, ou mesmo poderia reduzir a oferta de crédito. Ambas as situações exerceriam pressão para aumento do preço do crédito, afetando o consumidor final e os investimentos e, de forma ampla, a economia. Portanto, este trabalho se propõe a avaliar a relação entre o capital requerido e as taxas de juros de crédito no mercado brasileiro. Em contrapartida, estudiosos afirmam que o aumento do nível de capital próprio de um banco reduz o seu risco e, como consequência, investidores tendem a exigir menos retorno ao investir na instituição. Este pensamento se constrói através da argumentação de que o aumento de capital próprio reduz o custo de capital e o custo de dívida e, mesmo que a proporção de capital próprio seja maior, o custo de capital médio ponderado permanece o mesmo. Desta maneira, a segunda documentação deste estudo diz respeito à relação do nível de alavancagem dos bancos brasileiros, métrica essa mais fidedigna da proporção de financiamento com capital próprio do que índices de capital, com o yield de títulos por eles emitidos, que, indiretamente, mensura o risco dos detentores de dívidas, e também com o risco dos acionistas, quantificado através do beta alavancado das ações dos bancos. Neste contexto, há diversos trabalhos defendem o aumento da exigência de capital próprio. Admati, DeMarzo, Hellwig e Pfleiderer (2013) examinaram a visão hipotética de que capital próprio é “caro”, supostamente levando a conclusão de que um maior requerimento de capital é custoso para a sociedade e afetaria os mercados de crédito negativamente. Deste modo, avaliaram que os argumentos apresentados para apoiar esta visão são falaciosos, irrelevantes para o debate regulatório por confundir custos privados e sociais. Portanto, concluíram que a exigência de níveis de capital significativamente mais elevados do que os requerimentos atualmente propostos implicaria em um grande benefício social e um custo social mínimo, se houver. Kashyap, Stein e Hanson (2010) analisaram o impacto do aumento substancial dos 16 requerimentos de capital de grandes instituições financeiras e concluíram que, mesmo que a magnitude do aumento fosse de 10 pontos percentuais, as taxas de juros de operações de crédito aumentariam em menos de 1 ponto percentual. Em contrapartida, Institute of International Finance (IIF)(2011), associação global de bancos, em sua avaliação do impacto acumulado na atividade econômica resultante do conjunto de reformas no setor financeiro, afirmou que o nível de crescimento da economia global seria afetado com a reforma regulatória. No mais, apresentaram uma teoria alternativa à Admati et al. (2013), ao afirmar que a taxa de retorno esperada pelos acionistas é afetada de forma significativa pela situação atual de capital próprio e por expectativas e receios de que novas exigências regulatórias resultem em emissões adicionais de ações no futuro. Ou seja, a incerteza do cenário regulatório faria com que os investidores demandassem mais retorno, como consequência das possibilidades, por exemplo, de ter seu capital diluído ou de aumentar a concentração de seus investimentos no setor bancário. Basel Committee on Baking Supervision (BCBS)(2010) também analisou o impacto econômico de longo prazo da reforma regulatória de capital, concluindo que o aumento de cada 1 ponto percentual no índice de capital aumentaria o spread de empréstimos em 13 pontos-base. No Brasil, Martins e Schechtman (2013) investigaram as consequências sobre spreads de crédito da adoção de uma medida macroprudencial intrassetorial de capital no Brasil, através da utilização de micro dados. Os resultados mostraram que os bancos brasileiros, depois da medida regulatória, aumentaram os spreads cobrados para empréstimos automotivos, cujo requerimento de capital aumentou com a medida. Por fim, foi também avaliado o impacto do aumento de financiamento via capital próprio no risco de falência dos bancos. Baker e Wurgler (2013) estimaram como a alavancagem afeta o risco e o custo de capital próprio de bancos americanos, bem como seus respectivos impactos no custo de capital total. O resultado deste estudo confirmou que equity 17 risk bancário é acentuadamente crescente com a alavancagem. Miles, Yang e Marcheggiano (2011), na avaliação dos custos e benefícios de longo prazo da maior exigência de capital próprio, regrediram as estimativas de betas de bancos do Reino Unido em função de suas respectivas alavancagens, concluindo também que o impacto da alavancagem no beta é significante e a relação entre ambos é positiva. Para abordar os dois questionamentos centrais deste trabalho, são efetuadas avaliações empíricas entre as variáveis de interesse. A primeira investigação busca analisar a relação entre o capital requerido e as taxas de juros praticadas em operações de concessão de crédito. Para isso, focou-se em estudar um caso específico ocorrido no Brasil, mais precisamente relacionado às medidas macroprudenciais adotadas pelo Banco Central do Brasil (BCB) em dezembro de 2010, que, dentre outras implicações, aumentaram o requerimento de capital de algumas modalidades de crédito à pessoa física, dependendo de seus respectivos prazos de concessão. O caso mencionado é relevante, pois teve impacto em apenas algumas operações de concessão de crédito, permitindo utilizar operações não afetadas como grupo de controle. No mais, é possível avaliar não somente o impacto do aumento do capital requerido como também a sua redução, tendo em vista que o BCB reverteu parcialmente, em novembro de 2011, as medidas macroprudenciais adotadas em 2010. Na segunda contribuição deste trabalho, foram efetuadas duas análises, ambas visando a relacionar o risco de instituições financeiras, tanto do ponto de vista de detentores de dívida quanto dos acionistas, com níveis de alavancagem dos respectivos bancos. Primeiramente, investigou-se se o nível de alavancagem tem alguma relação com o yield implícito nos preços dos títulos privados emitidos pelas instituições financeiras, medida essa reflete o risco de default. Para isso, foram avaliados quinze papéis emitidos por oito instituições financeiras brasileiras distintas. Complementarmente, analisou-se como o beta alavancado, proxy para o risco dos acionistas, de três instituições financeiras listadas na Bolsa de Valores, Mercadorias 18 & Futuros de São Paulo (BM&FBOVESPA) é influenciado pelos níveis de alavancagem das respectivas instituições. Para ambas as análises, foram utilizados dados dos balancetes trimestrais de cada instituição, desde o 2º semestre de 2009 até o 3º semestre de 2014 e dados do mercado de ações e do mercado de títulos privados. A abordagem empírica é relevante porque, do ponto de vista teórico, o custo de capital médio ponderado se mantém inalterado à estrutura de capital, caso não existam distorções que invalidem suas enunciações. Segundo Modigliani e Miller (1958), na ausência de considerações adicionais tais como a existência de vantagens fiscais ou subsídios públicos, o aumento do financiamento via capital próprio simplesmente varia como o risco está alocado entre os investidores do banco, ou seja, entre detentores de dívidas e acionistas. Entretanto, dado que o mercado real de capital contém fricções e ineficiências que confrontam certas premissas de Modigliani-Miller, a validade do argumento de irrelevância da estrutura de capital não é tão clara, convindo, portanto, uma evidência empírica, como fizeram Baker e Wurgler (2013) para o mercado norte-americano e Miles et al. (2011) para os bancos do Reino Unido. Vale destacar que todas as investigações deste trabalho baseiam-se no mercado brasileiro. Este fato é importante, pois instituições financeiras no Brasil operam com níveis de alavancagem relativamente baixos, logo, qualquer efeito da alavancagem sobre o yield implícito dos títulos e sobre o beta alavancado dos bancos é menos esperado e, se documentado aqui, deve ser ainda mais forte em um mercado cujos níveis de alavancagem são maiores. Visando a melhor organizar as discussões deste estudo, o presente documento foi dividido seis seções, além desta introdução. Na seção 2, são discutidos trabalhos relacionados e referências bibliográficas que serviram de motivação e de base para elaboração dos argumentos construídos. A seção 3 é dedicada à apresentação das metodologias aplicadas nas avaliações empíricas, além de fornecer detalhamentos sobre as medidas macroprudenciais e sobre as variáveis que afetam a taxa de juros e o spread de crédito. São descritas sucintamente 19 na seção 4 as características dos dados utilizados nos estudos empíricos, apresentando também suas fontes de extração. Os resultados das avaliações empíricas são debatidos na seção 5. Por fim, na seção 6, são apresentados os comentários conclusivos deste trabalho. 20 2) Revisão bibliográfica Desde a crise de 2008, reguladores e órgãos internacionais de supervisão bancária e de estabilidade financeira, dentre eles o Basel International Settlement (BIS) e o Financial Stability Board (FSB), têm trabalhado para introduzir um conjunto de propostas para reforma da regulamentação bancária, com o objetivo de promover uma maior resiliência no setor. Dentre as novas exigências propostas, o Acordo de Basileia III e os novos requerimentos de capital e de alavancagem exercem papel central. Segundo BCBS (2010), umas das principais razões para a crise financeira e econômica ter se tornado tão severa decorreu da alavancagem excessiva do setor bancário de muitos países, acompanhada de uma gradual erosão do nível e da qualidade da base de capital. A fragilidade do setor bancário foi rapidamente transmitida para o restante do sistema financeiro e para a economia, resultando em uma contração da disponibilidade de crédito e de liquidez. Por fim, o setor público teve que intervir ao injetar liquidez, capital, suportes e garantias, expondo o contribuinte a perdas significativas. Desta forma, o Acordo de Basileia III introduziu, do ponto de vista microprudencial, exigências que buscam o aumento da qualidade, da consistência e da transparência da base de capital. Adicionalmente, foi também recomendado um índice de alavancagem, com o objetivo de restringir a alavancagem no setor bancário e introduzir uma segurança adicional contra o risco de modelo e contra erros nas mensurações de risco, através de uma métrica simples, transparente e não sensível a risco. No mais, medidas macroprudenciais como os colchões de conservação e anticíclico aumentam o requerimento mínimo de capital próprio e total, quando ativados, em relação ao Acordo de Basileia II. Mesmo com os avanços da regulação bancária desde 2008, as discussões sobre a exigência de capital e seus respectivos impactos na economia continuam tendo lugar de destaque na agenda de economistas, reguladores e instituições financeiras. Segundo Admati, DeMarzo, Hellwig e Pfleiderer (2013), o custo social de um aumento significativo de capital próprio para grandes instituições financeiras seria, se tivesse algum, 21 muito baixo e argumentos que sugerem o contrário são baseados em falácias, pois confundem custos privados de bancos (e seus acionistas) e custos sociais do público geral, ou são construídos em modelos inadequados, tanto da perspectiva teórica quanto empírica. O fato de que o aumento de capital próprio reduz o risco de crise financeira nas instituições que podem originar e contagiar o sistema bancário é visto como um claro benefício social. Entretanto, há argumentos de que a elevação do requerimento de capital próprio aumenta o custo de funding dos bancos por conta da maior proporção de capital próprio no mix de capital, cujo retorno exigido é maior. Admati et al. (2013) afirma que, mesmo sendo verdade que o retorno requerido do capital próprio é superior ao retorno requerido de dívidas, não é verdade afirmar que “economizar” capital próprio reduz os custos de capital. “Economizar” capital próprio tem efeito sobre o risco deste capital e, portanto, sobre o seu retorno requerido. Esse efeito deve ser levado em consideração ao avaliar as implicações do aumento do requerimento de capital próprio no custo de capital de bancos. Quando dado banco é financiado proporcionalmente com mais capital próprio, o risco de um dado ativo é traduzido em menos risco ao acionista. Refletindo essa redução do risco, o prêmio de risco no retorno sobre capital próprio (Return on Equity – ROE) esperado será menor. Como o capital próprio adicional geralmente reduzirá o risco de falência do banco, a taxa exigida pelas dívidas deste banco também será menor. Essas reduções de prêmio de risco nas taxas de retorno requeridas contrabalanceiam o efeito direto de deslocamento de financiamento via dívidas para financiamento via capital próprio, ou seja, de um instrumento com menor retorno requerido para um outro com maior retorno requerido. Desta forma, Admati et al. (2013) concluíram que o efeito líquido do aumento de capital próprio não aumenta o custo de funding total do banco. Em contrapartida, Institute of International Finance (IIF)(2011), associação global cujos membros são, dentre outros, os maiores bancos comerciais e de investimento do mundo, em sua avaliação do impacto acumulado na atividade econômica decorrente do conjunto de 22 reformas no setor financeiro, concluiu em sua estimação central que o nível real do Produto Interno Bruto (PIB) no período de 5 anos será cerca de 3,2% menor do que seria caso não houvesse reforma. A maneira precisa na qual a reforma restringirá a expansão atual depende fortemente de dois canais. Primeiramente, há a questão de como investidores vão responder às implicações de uma regulação bancária mais severa. Se investidores de ações estiverem dispostos a fornecer mais capital a um custo mais baixo (refletido através da maior segurança) e investidores de dívida também estiverem preparados para investir em dívidas de prazos mais longos a spreads gerenciáveis, então as implicações negativas no crescimento oriundas da reforma regulatória poderiam ser modestas. Até agora, no entanto, IIF afirma que o mercado de capitais está tendendo a sinalizar o oposto. Apesar da observação do IIF, vale ressaltar que, conforme será apresentado na sequência deste trabalho, foram encontradas evidências no mercado brasileiro de que a redução na alavancagem implica em menor retorno exigido pelo acionista e menor yield requerido pelo detentor de dívida. Contudo, no arcabouço de IIF, a necessidade de se levantar montantes significativos de capital próprio e, em menor escala, de emitir dívidas de longo prazo provavelmente colocará pressão relevante no custo marginal de financiamento bancário. A afirmação anterior leva à segunda questão-chave, de como executivos responderão às mudanças nas condições de financiamento. Argumenta-se que poderia ser através do corte de outros custos, mais notadamente a remuneração de colaboradores, e através da transferência deste custo na forma de taxas de empréstimo mais altas. IIF, no entanto, supõe que há benefícios advindos do processo de reforma regulatória. Contudo, acredita que os estudos oficiais do setor tenderam tanto a minimizar os custos da reforma no crescimento econômico quanto a superestimar os benefícios. No debate sobre o impacto no custo de capital, IIF (2011) diz que a questão mais controversa está relacionada a como a taxa de retorno requerida por acionistas poderia evoluir com o regime regulatório mais severo. Além da hipótese de que não haveria mudança no custo 23 de capital para os bancos, dado que a maior exigência de capital seria compensada pela redução de seu risco, expressada por Admati et al. (2013), uma visão alternativa enfatiza que a taxa de retorno esperada pelos acionistas é afetada de forma significativa pela situação atual de capital próprio e por expectativas e receios de que novas exigências regulatórias resultem em emissões adicionais de ações no futuro. Em outras palavras, quantidades importam. De acordo com essa visão, na medida em que a reforma regulatória conduziria a uma exigência de emissão de ações, o argumento de que quantidades importam neutralizaria os benefícios de redução de risco, consequência de uma base maior de capital próprio, no retorno requerido, ou, possivelmente, colocaria pressão imediata no retorno requerido até que as novas emissões sejam confortavelmente aceitas por investidores. Em contraste, a abordagem de Modigliani-Miller supõe que qualquer emissão adicional pode ser absorvida por investidores sem implicações: colocando de outra forma, os investidores aceitariam uma taxa de retorno menor, mesmo se tornando relativamente mais expostos a um determinado setor. BCBS (2010) analisou o impacto econômico de longo prazo da reforma regulatória de capital através da coleta e da síntese de evidências quantitativas relacionadas à magnitude dos custos e dos benefícios macroeconômicos. Segundo BCBS (2010), os benefícios estão associados à redução da probabilidade de crise bancária. Entretanto, é suposto que o aumento do capital requerido colocaria pressão no custo do crédito bancário. Desta maneira, o custo mais alto de crédito diminuiria investimentos e o consumo, que, por sua vez influenciariam o nível de equilíbrio da economia. Para isso, supõe-se que qualquer aumento no custo de funding é totalmente transferido e também que o custo de capital não é reduzido pela redução de risco dos bancos ao manter mais capital. Como resultado, foi concluído que o aumento de cada 1 ponto percentual no índice de capital aumentaria o spread de empréstimos em 13 pontos-base. Kashyap, Stein e Hanson (2010), fizeram um trabalho similar ao analisar o impacto do aumento substancial do capital requerido de grandes instituições financeiras. Como ponto de partida, 24 supuseram que o aumento no requerimento conduziria os bancos a substituírem o financiamento via dívidas de longo prazo por capital próprio. Usando o conhecido arcabouço de Modigliani e Miller (1958), em que as principais diferenças entre custo de dívidas e de financiamento via capital próprio são devidas a diferenças no tratamento fiscal, estimaram que até mesmo grandes variações nos requerimentos de capital provavelmente conduziriam a pequenos impactos de longo prazo no custo de empréstimos. Por exemplo, mesmo que o índice mínimo de capital subisse em 10 pontos percentuais, a metodologia utilizada sugere que as taxas de juros de empréstimos cresceriam em algo da ordem de apenas 25 a 45 pontos-base. De qualquer forma, alertaram que, apesar de que uma mudança significativa no regime de capital possa não ter impacto material sobre o custo do crédito, há preocupações muito significativas relacionadas à reformulação de como será fornecido o crédito e suas consequências para a estabilidade financeira. No Brasil, Martins e Schechtman (2013) investigaram as consequências sobre spreads de crédito da adoção de uma medida macroprudencial intrassetorial de capital. Devido a preocupações relacionadas a uma rápida e desequilibrada expansão do setor de financiamento de automóveis, o capital regulatório bancário foi elevado para financiamentos com prazos longos e altos loan-to-values. Este estudo utilizou-se de micro dados para avaliar o comportamento dos spreads de concessão de crédito para aquisição de veículos, modalidade essa que foi parcialmente afetada pelas medidas macroprudenciais de 2010. Os resultados mostraram que os bancos brasileiros, depois da medida regulatória, aumentaram os spreads cobrados para empréstimos automotivos cuja exigência de capital aumentou. Quando comparado ao conjunto de financiamentos não alvejados pela medida, o aumento foi de pelo menos 13%. Por outro lado, não foi encontrada evidência robusta de elevação dos spreads para os financiamentos cujas ponderações de risco não foram alteradas. Finalmente, o estudo mostrou que a posterior retirada da medida regulatória de capital foi associada, de modo 25 semelhante, a menores spreads cobrados em empréstimos automotivos cujas ponderações de risco decresceram. Não obstante, quando medida relativamente, essa redução nos spreads foi menor que o aumento original. Baker e Wurgler (2013) estimaram como a alavancagem afeta o risco e o custo de capital próprio de bancos, bem seus respectivos impactos no custo de capital total. O resultado deste estudo confirmou que equity risk bancário é acentuadamente crescente com a alavancagem, com o beta de uma carteira de bancos menos capitalizados sendo 0,93, enquanto o beta de uma carteira composta de bancos mais capitalizados era de 0,50, baseando-se em dados do mercado norte-americano. Entretanto, ao avaliar se o custo do capital próprio era menor nos bancos menos alavancados, ou seja, nos bancos com os menores betas, o resultado foi contrário ao esperado. Bancos com beta alto tiveram retornos menores que bancos com beta baixo. Este efeito foi chamado de anomalia do baixo risco. Vale destacar que a análise de Baker e Wurgler (2013) supõe que o retorno realizado dos bancos reflete exatamente o retorno exigido por acionistas, ou seja, o custo de capital próprio. Miles, Yang e Marcheggiano (2011), na avaliação dos custos e benefícios de longo prazo ao exigir que bancos se financiem com maior proporção de capital próprio, usaram dados de bancos do Reino Unido para avaliar a ligação entre alavancagem e o custo de capital próprio dos bancos. Supondo o Capital Asset Pricing Model (CAPM) como modelo de precificação do retorno requerido dos acionistas, regrediram as estimativas de betas dos bancos em análise em função de suas respectivas alavancagens entre 1997 e 2010, concluindo que o impacto da alavancagem no beta é significante e a correlação entre ambos é positiva. Com base nos resultados da regressão mencionada e supondo que o custo de dívidas se mantém constante, estimaram que se alavancagem do sistema caísse pela metade (de 30 para 15 vezes), o custo de capital médio ponderado aumentaria em apenas 33bps, de 5,33% para 5,66%. 26 3) Metodologia 3.1) Efeitos da medida macroprudencial sobre as taxas de juros de crédito A discussão central do aumento do capital requerido passa pela forma como essa exigência adicional afetaria a economia de maneira geral. Tal manifestação poderia refletir no custo de empréstimos ou em sua oferta, que, por sua vez, tenderia a levar a uma desaceleração da atividade econômica. Para avaliar empiricamente a relação entre capital requerido e taxa de juros de crédito, optou-se por analisar um caso temporário ocorrido no Brasil de aumento do capital exigido para algumas operações de crédito às pessoas físicas, permitindo assim uma análise no nível do empréstimo. Em 3 de dezembro de 2010, o Conselho Monetário Nacional (CMN) e o BCB adotaram um conjunto de medidas de natureza macroprudencial para, segundo eles, aperfeiçoar os instrumentos de regulação existentes, manter a estabilidade do Sistema Financeiro Nacional e permitir a continuidade do desenvolvimento sustentável do mercado de crédito. As iniciativas visavam, ainda, a dar prosseguimento ao processo de retirada gradual dos incentivos introduzidos para minimizar os efeitos da crise financeira internacional de 2008. As medidas adotadas foram as seguintes: 1. Majoração do requerimento de capital para operações de crédito a pessoas físicas com prazos superiores a 24 meses, comportando exceções: • Através da Circular nº 3.515, o Fator de Ponderação de Risco (FPR) passou de 100% para 150% na maioria das operações de crédito a pessoas físicas com prazo superior a 24 meses, o que significa que o requerimento de capital das instituições financeiras aumentou dos até então atuais 11% para 16,5% do valor dessas operações. No caso do crédito consignado, a regra só se aplicava sobre as operações com prazo superior a 36 meses. 27 • O aumento incidiu sobre as operações de financiamento de veículos ou arrendamento mercantil de veículos nas seguintes situações: i. Prazo entre 24 e 36 meses: quando o valor da entrada for inferior a 20% do valor do bem. ii. Prazo entre 36 e 48 meses: quando o valor da entrada for inferior a 30% do valor do bem. iii. Prazo entre 48 e 60 meses: quando o valor da entrada for inferior a 40% do valor do bem. • A majoração do FPR não se aplicava às operações de crédito rural, às operações de crédito habitacional e ao financiamento ou arrendamento mercantil de veículos de carga. 2. Elevação do compulsório sobre depósitos à vista e a prazo: • O adicional de compulsório sobre depósitos à vista e a prazo foi elevado de 8% para 12%. • O compulsório sobre depósitos a prazo aumentou de 15% para 20%. Segundo Prates e Cunha (2012), enquanto a segunda medida afetou as condições gerais de liquidez dos bancos, a primeira iniciativa teve como foco o crédito ao consumo e foi condicionada pela preocupação do BCB com a forte expansão desse crédito, principalmente nas modalidades de empréstimos consignados e financiamento a veículos. Entretanto, em 11 de novembro de 2011, o BCB publicou a Circular nº 3.563 e reverteu parcialmente as medidas adotadas no final de 2010, visto que intervenções de natureza macroprudencial são dinâmicas e devem acomodar as flutuações cíclicas. Essa ação visou a enfrentar o cenário de desaceleração econômica, abrandando as regras que limitaram a concessão de crédito no final de 2010. Como resultado, as seguintes operações que possuíam requerimento de capital de 16,5% após 2010 voltaram ao patamar de 11%: 28 - crédito consignado com prazo entre 36 e 60 meses; - financiamento com prazo contratual entre 24 e 60 meses para aquisição de veículo automotor, garantido por alienação fiduciária do veículo; - arrendamento mercantil financeiro de veículo automotor, com prazo contratual entre 24 e 60 meses; - outras operações de crédito pessoal sem destinação específica com prazo contratual entre 24 e 36 meses; Em contrapartida, nesta mesma data, as exposições relativas a operações de crédito pessoal sem destinação específica, incluindo as operações de crédito consignado, com prazo superior a 60 meses tiveram seus requerimentos de capital aumentados, de 16,5% para 33%. Vale ressaltar que, como o prazo médio de concessão das referidas operações é inferior a 60 meses, pode-se afirmar que a medida de 2011 reduziu o requerimento de capital total, se forem avaliadas as carteiras consolidadas. Com o cenário regulatório apresentado em mente, utilizou-se uma janela de observação de dados mensais entre janeiro de 2009 e dezembro de 2012, que abrange tanto o aumento do requerimento de capital em dezembro de 2010 quanto sua redução em novembro de 2011 para algumas modalidades de crédito à pessoa física. Aspirando avaliar o impacto que esses movimentos regulamentares tiveram nas taxas de juros de crédito das modalidades por eles afetadas, foram coletados dados relativos às seguintes operações bancárias: (i) crédito pessoal total à pessoa física, (ii) aquisição de veículos por pessoa física, (iii) aquisição de outros bens por pessoa física, e (iv) capital de giro total à pessoa jurídica. Enquanto as duas primeiras operações foram, na média, atingidas pelas medidas macroprudenciais, dado que o prazo médio de concessão de ambas as modalidades era próximo de 4 anos na janela avaliada, a terceira não foi afetada, na média, por conta de seu curto prazo médio de concessão, próximo de 1 ano na janela avaliada, assim como a quarta, por se tratar de 29 uma operação à pessoa jurídica. Portanto, as duas últimas operações foram utilizadas como grupo de controle. Para modelar o aumento de capital no tempo, utilizou-se de uma variável dummy, que, para as operações crédito pessoal total e de aquisição de veículos, assumiu o valor 0 entre janeiro de 2009 e novembro de 2010 e entre novembro de 2011 e dezembro de 2012 e o valor 1 no período de aumento do capital requerido, ou seja, entre dezembro de 2010 e outubro de 2011. Já para as operações de aquisição de outros bens e de capital de giro total, essa variável se manteve com o valor 0 em toda a janela de observação. Como método de análise, utilizou-se dados em painel, técnica que constitui de uma combinação de corte transversal com séries de tempo. Assim, o painel em análise tem duas dimensões de variação dos dados, uma relacionada às modalidades de crédito e outra temporal, sendo capaz a sua capacidade de captar a dinâmica do comportamento das unidades. Para avaliar, no nível da operação, se o capital requerido tem algum impacto nas taxas de juros de crédito das modalidades de crédito afetadas, adotou-se o modelo de efeitos fixos, pois é suposto que cada operação em análise tem suas próprias características, que podem ou não influenciar as variáveis explicativas e de interesse. No mais, entende-se que esse modelo é adequado, pois busca-se avaliar variáveis que variam no tempo. Assim, são introduzidas variáveis dummies que representam cada modalidade de crédito e cada mês de análise. Logo, a especificação do modelo é: 𝑠𝑖𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1 ∙ 𝐾𝑖𝑡 + 𝛾𝑖 ∙ 𝐶𝑖 + 𝜃𝑡 ∙ 𝑀𝑡 + ∑𝑛 𝛽𝑛 ∙ 𝑋𝑛,𝑖𝑡 + 𝜀𝑖𝑡 (1) Em que: - 𝑠𝑖𝑡 é a taxa de juros anual de cada modalidade de crédito i em cada mês t; - 𝐾𝑖𝑡 é a variável dummy mencionada anteriormente, que representa o nível de capital de cada modalidade de crédito i em cada mês t; 30 - 𝐶𝑖 são variáveis dummies para cada modalidade de crédito i, que capturam os efeitos fixos de cada tipo de concessão; - 𝑀𝑡 são variáveis dummies para cada mês t, que capturam os efeitos fixos do tempo; - 𝑋𝑛,𝑖𝑡 são as n variáveis de controle, com valores para cada modalidade de crédito i em cada mês t; - 𝜀𝑖𝑡 é o termo de erro de cada operação de crédito i em cada mês t. - 𝑖 representa as operações de crédito pessoal total, de aquisição de veículos por pessoa física, de aquisição de outros bens por pessoa física e de capital de giro total à pessoa jurídica; - 𝑡 representa cada mês entre janeiro de 2009 e dezembro de 2012; - 𝛼0 , 𝛼1 , 𝛾𝑖 , 𝜃𝑡 , 𝛽𝑛 são os parâmetros da regressão. Ressalta-se que as dummies de tempo 𝑀𝑡 funcionam como controle para capturar a influência de ciclos econômicos e de tendências e as dummies de modalidades de crédito 𝐶𝑖 controlam as especificidades de cada operação de concessão. Com o modelo econométrico definido, procurou-se avaliar quais seriam as n variáveis de controle da regressão. Na literatura, encontram-se diversos estudos que tentam identificar os fatores que influenciam a taxa de juros de crédito e o spread. O BCB (2014) faz periodicamente a decomposição contábil do spread com dados dos balanços de uma amostra de instituições bancárias, procurando explicitar a contribuição de fatores contábeis para a sua formação. O BCB decompõe o spread em cinco componentes: i) custos administrativos: refere-se aos custos com os insumos utilizados pela indústria bancária, como capital físico, trabalho, recursos operacionais e depósitos; ii) inadimplência: diz respeito à proporção de não recebimento dos créditos concedidos; 31 iii) custo do compulsório: de acordo com o BCB, corresponde ao custo de oportunidade que os bancos incorrem em deixar parte dos depósitos à vista e a prazo depositados no BCB, com rendimento inferior ao que obteriam caso pudessem emprestar os recursos; iv) tributos e taxas: incluem tributos indiretos, como IOF, PIS, COFINS e ISS, além do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido; v) resíduo: corresponde à diferença entre o spread total e a soma dos quatro componentes anteriores. Pode ser utilizado como indicador da margem auferida pelo banco, embora inclua outros fatores, como erros de mensuração. Segundo Afonso, Köhler e de Freitas (2009), o exercício efetuado pelo BCB é relevante porque permite avaliar, ex-post, a formação do spread. No entanto, por não incorporar a reação dos agentes econômicos a alterações de variáveis, não permite fazer inferências. Adicionalmente, a decomposição não possibilita a quantificação do impacto de outras variáveis sobre o spread. Por exemplo, o spread deve estar fortemente correlacionado com a conjuntura macroeconômica, aumentando em períodos de incerteza. Entretanto, uma decomposição contábil não permite tangibilizar, por exemplo, os efeitos de um aumento na volatilidade do PIB sobre o spread. De acordo com Oreiro, de Paula, da Silva e Ono (2006), operações de concessão de crédito expõem instituições financeiras à incerteza quanto à taxa de retorno dos empréstimos. Esta incerteza decorre do fato de que uma parte dos empréstimos não será devolvida em razão da inadimplência voluntária ou não dos tomadores, fato que é precificado na definição do spread e da taxa de juros de crédito. Ainda, como consequência intrínseca da atividade bancária, instituições financeiras incorrem o risco associado aos descasamentos de indexadores e prazos entre aplicações e captações. Operações de concessão de crédito podem ser prefixadas, ou seja, a taxa de retorno 32 é estabelecida no momento da concessão e não sofre nenhum reajuste até o final do contrato, enquanto suas fontes de captação tendem a ser pós-fixadas, variando de acordo com as oscilações da estrutura de taxa de juros. Complementarmente, o nível de taxa de juros representa o custo de oportunidade da instituição financeira, pois, caso decidisse por não conceder crédito, teria a possibilidade de rentabilizar seu capital de acordo com a taxa de juros praticada pelo mercado sem incorrer riscos. Como neste trabalho estão sendo avaliadas as taxas de juros de crédito e não os spreads, as taxas de juros de mercado devem ser consideradas como um dos fatores que afeta as taxas cobradas em concessões. No mais, é de se esperar que o ambiente regulatório também tenha a sua influência sobre as taxas de juros de crédito. Por exemplo, o custo de oportunidade de retenção das reservas e as exigências de capital advindas das normas de regulação e de supervisão bancária, foco deste estudo, podem ter alguma influência no spread e, consequentemente, nas taxas. Por fim, a concentração bancária também pode ter efeitos se a estrutura de mercado prevalecente nesse setor for essencialmente não-competitiva. Nesse contexto, os bancos teriam poucos incentivos para aumentar a sua eficiência operacional, operando com spreads elevados, quer como forma de gerar receita suficiente para cobrir os seus custos elevados, quer como resultado da capacidade de precificar os seus serviços num patamar bastante superior ao custo marginal de produção dos serviços bancários. Vale ressaltar que, mesmo havendo diversos fatores que afetam os spreads e as taxas de juros de crédito, sejam eles contábeis, macroeconômicos, regulatórios ou de mercado, muitos deles não são específicos de cada operação de crédito, portanto, não servem como variáveis de controle para o modelo proposto neste trabalho. Especificamente em relação à concentração bancária, se ocorresse aumento do poder de mercado nas operações afetadas pela medida macroprudencial simultaneamente ao aumento do capital requerido, os resultados deste trabalho poderiam ser espúrios. Contudo, a estrutura de mercado pouco mudou neste período, 33 fato que rechaça esta possibilidade. Desta maneira, buscou-se extrair fatores característicos de cada modalidade que possam ter relação com sua respectiva taxa praticada, tendo em vista que os impactos de fatores que afetam simultaneamente todas as operações serão capturados pelas variáveis dummies de tempo. Assim, optou-se por utilizar as seguintes variáveis de controle: i) Inadimplência: percentual da carteira com atraso acima de 90 dias. Instituições financeiras, ao definirem as taxas das operações, estão interessadas na inadimplência esperada e não ocorrida. De qualquer forma, entende-se que a inadimplência ocorrida é uma boa proxy para a inadimplência esperada no momento da concessão do crédito. Cada modalidade de crédito tem um comportamento peculiar de inadimplência; ii) Swap PRÉ-DI: taxa de retorno de mercado deste instrumento. Essa variável tenta incorporar os custos de captação e de oportunidade de instituições financeiras no momento de concessão de crédito. Para cada modalidade, utilizou-se a taxa do swap PRÉ-DI de acordo com o prazo médio de concessão da operação, visando a alinhar o custo da operação a sua duração. Vale ressaltar que as taxas de juros de crédito de todas as modalidades consideradas neste trabalho são prefixadas. No mais, a principal variável do modelo refere-se a uma variabilidade no ambiente regulatório, resultado de uma intervenção macroprudencial no capital requerido para algumas operações. Portanto, a especificação completa do modelo é: 𝑠𝑖𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1 ∙ 𝐾𝑖𝑡 + 𝛾𝑖 ∙ 𝐶𝑖 + 𝜃𝑡 ∙ 𝑀𝑡 + 𝛽1 ∙ 𝐼𝑖𝑡 + 𝛽2 ∙ 𝑉𝑖𝑡 + 𝜀𝑖𝑡 (2) Em que: - 𝛼0, 𝛼1 , 𝐾𝑖𝑡 , 𝛾𝑖 , 𝐶𝑖 , 𝜃𝑡 , 𝑀𝑡 , 𝛽1 , 𝛽2 e 𝜀𝑖𝑡 são as mesmas variáveis descritas na equação (1); - 𝐼𝑖𝑡 é a inadimplência de cada modalidade de crédito i em cada mês t; - 𝑉𝑖𝑡 é a taxa de mercado do swap PRÉ-DI de acordo com o prazo médio de concessão de cada modalidade de crédito i em cada mês t. 34 O coeficiente 𝛼1 é o parâmetro de maior interesse neste modelo. Ele mensura o impacto que a elevação do capital requerido teve nas taxas de juros de crédito das modalidades atingidas pelas medidas macroprudenciais, ou seja, aquisição de veículos e crédito pessoal. Se os bancos precificam cada empréstimo com base em seu custo de financiamento marginal e se esse custo foi alterado com a exigência adicional, então é esperado que tais instituições aumentem as taxas das referidas operações de crédito e que isso se reflita em um coeficiente 𝛼1 > 0. 3.2) Efeitos da alavancagem sobre o yield e o beta Para a segunda investigação deste trabalho, que visa a avaliar se a proporção de financiamento via capital próprio tem influência no risco de detentores de dívidas e de acionistas, dados em painel e modelos de efeitos fixos foram novamente utilizados. No modelo que relaciona alavancagem com risco dos detentores de dívidas, mensurado pelo yield implícito no preço de mercado dos títulos emitidos por instituições financeiras brasileiras, as dimensões do painel são os títulos emitidos e o tempo. Desta maneira, o modelo é construído conforme equação a seguir: 𝑦𝑖𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1 ∙ 𝐴𝑖𝑡 + 𝛼2 ∙ 𝐿𝐿𝑖𝑡 + 𝛼3 ∙ 𝐴𝑇𝑖𝑡 + 𝛾𝑖 ∙ 𝐷𝑖 + 𝜃𝑡 ∙ 𝑇𝑡 + 𝜀𝑖𝑡 (3) Em que: - 𝑦𝑖𝑡 é o yield anual implícito de cada título i em cada trimestre t; - 𝐴𝑖𝑡 é a alavancagem do banco emissor do título i em cada trimestre t; - 𝐿𝐿𝑖𝑡 é o lucro líquido do banco emissor do título i em cada trimestre t; - 𝐴𝑇𝑖𝑡 é o ativo total do banco emissor do título i em cada trimestre t; - 𝐷𝑖 são variáveis dummies para cada título i, que capturam os efeitos fixos de cada emissão e de cada banco emissor; - 𝑇𝑡 são variáveis dummies para trimestre t, que capturam os efeitos fixos do tempo; - 𝜀𝑖𝑡 é o termo de erro de cada título i em cada trimestre t. 35 - 𝑖 representa os títulos; - 𝑡 representa cada trimestre entre setembro de 2010 a setembro de 2014, respectivamente; - 𝛼0 , 𝛼1 , 𝛼2 , 𝛼3 , 𝛾𝑖 , 𝜃𝑡 são os parâmetros da regressão. As dummies de tempo 𝑇𝑡 funcionam como controle para capturar a influência de ciclos econômicos e de tendências e as dummies de títulos 𝐷𝑖 controlam as especificidades de cada emissão e de cada banco emissor, por exemplo, se a emissão foi feita por um banco público ou privado ou se a emissão foi feita no Brasil ou no exterior. O coeficiente 𝛼1 é o principal parâmetro em análise deste modelo. Ele reflete o efeito da alavancagem no risco dos detentores de dívida, que é mensurado através do retorno requerido por eles. Quanto menor for a proporção de financiamento através de capital próprio de uma instituição financeira, menor é a capacidade de absorção de perdas de seu Patrimônio Líquido e, logicamente, maior é a probabilidade de que esta instituição não cumpra com os compromissos estabelecidos nos títulos por ela emitidos. Desta maneira, é esperado que detentores de dívida exijam retorno que seja positivamente correlacionado à alavancagem do banco, que deve gerar um coeficiente 𝛼1 > 0. Ao contrário do risco dos detentores de dívida, não existe uma medida observável que mensure o risco dos acionistas. Assim, pode-se estimar o risco de investidores de diversas formas, sendo a volatilidade da ação um exemplo. Para este estudo, optou-se por utilizar o beta alavancado de cada ação ao supor que esta métrica representa a medida de risco que acionistas utilizam para definir seu retorno exigido, supondo que o fazem através do CAPM, desenvolvido por Sharpe (1964) e Lintner (1965). Conforme apresentado por Miles et al. (2011), no CAPM, o risco de acionistas é refletido pelo beta das ações da empresa (𝛽𝑎çã𝑜 ), que depende da correlação entre as taxas de retorno da ação e do mercado como um todo, além das volatilidades dos retornos da própria ação e do mercado. O CAPM também permite decompor o risco dos 36 ativos (𝛽𝑎𝑡𝑖𝑣𝑜𝑠 ) nos riscos incorridos por acionistas (𝛽𝑎çã𝑜 ) e por detentores de dívidas (𝛽𝑑í𝑣𝑖𝑑𝑎𝑠 ), conforme equação a seguir: 𝐸 𝐷 𝛽𝑎𝑡𝑖𝑣𝑜𝑠 = 𝛽𝑎çã𝑜 ∙ (𝐸+𝐷) + 𝛽𝑑í𝑣𝑖𝑑𝑎𝑠 ∙ (𝐸+𝐷) (4) 𝐸 - (𝐸+𝐷) é a proporção de capital próprio na base de capital; - (𝐸+𝐷) é a proporção de dívidas na base de capital. 𝐷 Supondo que não há risco sistemático nas dívidas, ou seja, que 𝛽𝑑í𝑣𝑖𝑑𝑎𝑠 = 0: 𝛽𝑎çã𝑜 = ( - ( 𝐷+𝐸 𝐸 𝐷+𝐸 𝐸 ) ∙ 𝛽𝑎𝑡𝑖𝑣𝑜𝑠 (5) ) é a razão entre o total de ativos e o capital próprio, ou seja, a alavancagem. A equação (5) declara que, se não houver risco sistemático nas dívidas dos bancos, o prêmio de risco das ações deveria aumentar linearmente com a alavancagem. Em outras palavras, quando um banco reduz pela metade sua alavancagem e mantém o grau de risco de seus ativos inalterados, o mesmo nível de risco estará distribuído por colchão de capital próprio que é duas vezes maior, o que implica que potenciais perdas dos ativos serão compartilhadas por uma base maior de acionistas. Desta maneira, uma análise empírica da relação entre o beta (𝛽𝑎çã𝑜 ) e a alavancagem é informativa e permite inferir sobre a ligação entre o CAPM e o teorema de Modigliani-Miller. No entanto, vale lembrar que os betas podem ser influenciados pelo modo como o processo de estimação é realizado. Para tanto, é fundamental escolher corretamente o índice de mercado, o intervalo de tempo e a frequência dos dados a serem utilizados. Desta maneira, como índice de mercado, optou-se pelo Ibovespa, mais importante indicador de desempenho médio das ações negociadas no Brasil. Devido às fortes variações de indicadores de mercado e macroeconômicos no Brasil, como, por exemplo, a taxa de câmbio, calculou-se o beta em cada período através de uma janela móvel de dois anos com frequência de retornos semanais. Optouse por semanal, em vez de diário, para evitar a possível adição de ruídos, que reduziriam a 37 qualidade estatística da regressão. Ainda, com o intuito de corrigir um possível viés gerado pela falta de sincronia entre os preços de fechamento de cada ação e o índice de mercado, que são cotados de forma discreta e continua respectivamente, foi utilizado o estimador de variáveis desenvolvido por Scholes e Williams (1977) e proposto por Sanvicente e Minardi (1999), definido como: 𝑏𝑒𝑡𝑎 = ∑1𝑘=−1 𝑏𝑒𝑡𝑎𝑘 1−2∙𝜌 (6) Em que os três betas no numerador são estimados por mínimos quadrados ordinários, a saber: - 𝑘 = −1, beta é estimado através da regressão linear simples entre os retornos da ação e os retornos do Ibovespa defasados de uma semana; - 𝑘 = 0, beta é estimado através da regressão linear simples entre os retornos da ação e os retornos do Ibovespa; - 𝑘 = 1, beta é estimado através da regressão linear simples entre os retornos da ação e os retornos do Ibovespa adiantados em uma semana; - 𝜌 é o coeficiente de correlação entre os retornos do Ibovespa e os retornos do Ibovespa defasados em uma semana. Através da metodologia apresentada, obtém-se uma série semanal de betas para cada instituição financeira. Como a unidade temporal da equação (6) é trimestral, extraiu-se a média dos betas em cada trimestre para utilizá-lo como variável dependente do modelo. Com a métrica de mensuração do risco dos acionistas escolhida, foram definidas as instituições financeiras e o tempo como as dimensões do painel. Assim, o modelo em investigação é apresentado a seguir: 𝑏𝑖𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1 ∙ 𝐴𝑖𝑡 + 𝛼2 ∙ 𝐿𝐿𝑖𝑡 + 𝛼3 ∙ 𝐴𝑇𝑖𝑡 + 𝛾𝑖 ∙ 𝐼𝑖 + 𝜃𝑡 ∙ 𝑇𝑡 + 𝜀𝑖𝑡 Em que: - 𝑏𝑖𝑡 é o beta alavancado do banco i em cada trimestre t; (7) 38 - 𝐴𝑖𝑡 é a alavancagem do banco i em cada trimestre t; - 𝐿𝐿𝑖𝑡 é o lucro líquido do banco i em cada trimestre t; - 𝐴𝑇𝑖𝑡 é o ativo total do banco i em cada trimestre t; - 𝐼𝑖 são variáveis dummies para cada banco i, que capturam os efeitos fixos de cada instituição financeira; - 𝑇𝑡 são variáveis dummies para trimestre t, que capturam os efeitos fixos do tempo; - 𝜀𝑖𝑡 é o termo de erro do banco i em cada trimestre t; - 𝑖 representa cada banco, sendo eles o Banco do Brasil, o Bradesco e o Itaú Unibanco; - 𝑡 representa cada trimestre entre junho de 2009 a setembro de 2014, respectivamente; - 𝛼0 , 𝛼1 , 𝛼2 , 𝛼3 , 𝛾𝑖 , 𝜃𝑡 são os parâmetros da regressão. Novamente, as dummies de tempo 𝑇𝑡 funcionam como controle para capturar a influência de ciclos econômicos e de tendências e as dummies de bancos 𝐼𝑖 controlam as especificidades de cada instituição financeira, por exemplo, se são bancos públicos ou privados. O coeficiente 𝛼1 é o outra vez o parâmetro de interesse, pois relaciona o risco dos acionistas com a estrutura de capital das instituições financeiras. Acionistas são os primeiros a arcar com as perdas na ocorrência de situações adversas. Contudo, se a base de capital próprio da instituição for suficientemente grande, perdas seriam diluídas entre os diversos investidores, resultando, nesta situação, em um menor nível de risco para cada acionista individualmente. Portanto, espera-se que o risco seja diretamente proporcional à alavancagem, implicando em um coeficiente 𝛼1 > 0. Vale ressaltar que, para os modelos (3) e (7), foram utilizadas variáveis de controle dos bancos, sendo o ativo total uma representação do tamanho e da relevância de cada instituição e o lucro líquido uma variável que visa a refletir a capacidade de geração de resultados das instituições financeiras que, de forma implícita, tem relação com as probabilidades de cumprimento de suas obrigações financeiras e de distribuição de dividendos. 39 4) Descrição dos dados Com o intuito de efetuar as avaliações empíricas propostas neste trabalho, foram coletados dados públicos do Sistema Financeiro Nacional e dos mercados acionário e de títulos privados. O BCB, através do Sistema Gerenciador de Séries Temporais, disponibiliza na internet séries temporais de indicadores da atividade econômica, da economia regional e internacional, de expectativas de mercado, de crédito, dos mercados financeiros e de capitais, monetários, entre outros. Especificamente sobre as operações de crédito, são disponibilizadas séries históricas mensais dos saldos, das concessões, das taxas de juros, dos spreads, dos prazos, da inadimplência e de provisões, todas segregadas por modalidade de crédito. Assim, aproveitou-se dessas séries para montar a base de dados utilizada para avaliação, no nível do empréstimo, da relação entre o capital requerido e as taxas de juros de operações de concessão de crédito. Foram extraídos dados mensais das taxas de juros de crédito, do prazo de concessão e da taxa de inadimplência acima de 90 dias para as operações de crédito pessoal total à pessoa física, de aquisição de veículos por pessoa física, de aquisição de outros bens por pessoa física e de capital de giro total à pessoa jurídica. O histórico das séries abrange desde de janeiro de 2009, dois anos anteriores às medidas macroprudenciais, até dezembro de 2012, um ano após a reversão das medidas. No mais, para concluir a análise, foi também necessária a extração das taxas de mercado de swaps PRÉ-DI para diferentes prazos de vencimento, que foram utilizadas como uma das variáveis de controle da regressão. Esses dados de mercado foram obtidos na Bloomberg. A tabela a seguir apresenta uma análise estatística da base e os gráficos subsequentes permitem avaliar a evolução dessas variáveis na janela de análise: 40 Tabela 1 Análise da base de dados da relação entre taxa de juros e capital Taxa de juros (%) Inadimplência (%) Swap DI-PRÉ (%) 45,51 5,14 11,39 (4,31) (0,62) (1,33) 25,87 4,52 11,39 (3,38) (1,05) (1,33) 55,32 12,58 10,19 (5,10) (1,94) (1,66) 27,84 3,45 11,04 (4,56) (0,56) (1,50) Crédito Pessoal Aquisição de veículos Aquisição de outros bens Capital de Giro Nota: A tabela apresenta a média de cada variável. Entre parênteses, estão os desvios padrão. Fontes: BCB e Bloomberg. Elaboração do autor. Figura 1 Evolução das taxas de juros de crédito 75,0% 65,0% 55,0% 45,0% 35,0% 25,0% 15,0% Crédito pessoal Aquisição de veículos Aquisição de outros bens Capital de giro Fonte: BCB. Elaboração do autor. Figura 2 Evolução da inadimplência acima de 90 dias 18,0% 16,0% 14,0% 12,0% 10,0% 8,0% 6,0% 4,0% 2,0% 0,0% Crédito pessoal Fonte: BCB. Elaboração do autor. Aquisição de veículos Aquisição de outros bens Capital de giro 41 Figura 3 Evolução do swap PRÉ-DI 14,0% 13,0% 12,0% 11,0% 10,0% 9,0% 8,0% 7,0% 6,0% Crédito pessoal/Aquisição de veículos Aquisição de outros bens Capital de giro Fonte: Bloomberg. Elaboração do autor. Adicionalmente, julgou-se conveniente analisar como o índice de Basileia das principais instituições financeiras do Brasil evoluiu durante esse período. O gráfico a seguir apresenta os índices em cada trimestre de algumas instituições: Figura 4 Evolução do índice de Basileia dos principais bancos brasileiros 19,00% 18,00% 17,00% 16,00% 15,00% 14,00% 13,00% 12,00% 11,00% 2T2009 3T2009 4T2009 1T2010 2T2010 3T2010 4T2010 1T2011 2T2011 3T2011 4T2011 1T2012 2T2012 3T2012 4T2012 Banco do Brasil Bradesco Caixa Econômica Federal Citibank HSBC Itaú Unibanco Safra Votorantim Fonte: BCB. Elaboração do autor. Exceção ao Itaú Unibanco, todas as instituições financeiras apresentaram redução em seus respectivos índices de Basileia no momento da adoção da medida macroprudencial, ocorrida no final de 2010. Já a reversão da medida no último trimestre de 2011 teve efeito positivo no índice da maioria dos bancos. Ainda, o BCB, através de sua página na internet, divulga estatísticas sobre a supervisão do Sistema Financeiro Nacional. Dentre as informações, são disponibilizados, trimestralmente 42 desde 1995, os balancetes de cada instituição financeira regulada, contendo as composições de ativos e passivos, o resultado da intermediação financeira, o resultado líquido no período e os índices de imobilização e de Basileia. Com esses dados, foi possível extrair parte das variáveis de interesse do segundo objetivo deste trabalho, que está relacionado à avaliação da relação entre o risco das instituições financeiras e a alavancagem. A alavancagem, ao invés de ser calculada pela divisão entre o Ativo Total e o Capital de Nível I, foi aproximada pela divisão do Ativo Total pelo Patrimônio Líquido. Tal aproximação se justifica por conta da inexistência de instrumentos híbridos no Brasil até 2014, que poderiam compor o Capital de Nível I. Em sequência, pensou-se sobre quais informações poderiam refletir o risco das instituições financeiras do ponto de vista de detentores de dívidas e de acionistas. Para o primeiro público, procurou-se identificar títulos privados emitidos por instituições financeiras atuando no Brasil que tinham informações históricas de mercado. Assim, foram selecionados quinze títulos de oito bancos distintos, sendo eles: Banco do Brasil, Bradesco, Daycoval, Itaú Unibanco, Pan, Safra, Santander e Votorantim. Como representação do risco dos detentores de dívidas, extraiu-se da Bloomberg o yield anual implícito nos preços de mercado de cada título selecionado, de setembro de 2010 até setembro de 2014 com frequência trimestral. A tabela a seguir apresenta uma análise estatística da base: 43 Tabela 2 Análise da base de dados da relação entre yield e alavancagem Yield (%) Lucro Líquido Ativo total (R$ milhões) (R$ milhões) Alavancagem 7,15 16,62 4,59 1043 (0,96) (1,07) (1,91) (182) 4,31 11,22 4,37 710 (0,58) (0,77) (1,57) (91) 4,25 6,02 0,11 13 (1,35) (0,55) (0,05) (2) 4,09 11,37 5,31 894 (0,41) (0,41) (1,93) (126) 6,92 10,99 -0,10 17 (0,61) (13,51) (0,14) (5) 10,78 15,42 0,46 105 (1,30) (1,72) (0,19) (24) 4,25 7,00 1,10 448 (0,97) (0,99) (0,43) (46) 5,91 14,20 -0,15 114 (0,52) (1,21) (0,50) (9) Banco do Brasil Bradesco Daycoval Itaú Unibanco Pan Safra Santander Votorantim Nota: A tabela apresenta a média de cada variável. Entre parênteses, estão os desvios padrão. Fonte: Elaboração do autor. Por fim, para mensurar o risco dos acionistas, preços semanais do mercado de ações BM&FBOVESPA foram utilizados, extraídos da Bloomberg. Contudo, limitou-se a análise apenas as instituições financeiras listadas em bolsa brasileira e com liquidez suficiente, ou seja, Banco do Brasil, Bradesco, Itaú Unibanco e Santander. Como a mensuração do beta exige uma série longa de retornos, optou-se por não incluir o Santander na amostra, uma vez que a primeira negociação de suas ações na BM&FBOVESPA ocorreu em 2009. Assim, para mensurar o risco dos acionistas, utilizou-se o beta alavancado de cada papel, cuja metodologia de cálculo foi 44 detalhada na seção 3, de junho de 2009 até setembro de 2014 com frequência trimestral. A tabela a seguir apresenta uma análise estatística da base: Tabela 3 Análise da base de dados da relação entre beta e alavancagem beta Lucro Líquido Ativo total (R$ milhões) (R$ milhões) Alavancagem 1,22 17,12 4,44 949 (0,11) (1,37) (2,10) (213) 0,92 11,17 4,13 646 (0,14) (0,69) (1,54) (133) 1,02 11,42 5,10 823 (0,08) (0,40) (1,88) (164) Banco do Brasil Bradesco Itaú Unibanco Nota: A tabela apresenta a média de cada variável. Entre parênteses, estão os desvios padrão. Fonte: Elaboração do autor. 45 5) Resultados 5.1) Efeitos da medida macroprudencial sobre as taxas de juros de crédito Para buscar evidências do possível impacto da elevação do requerimento de capital na economia de forma abrangente, o ponto central da discussão passa pela reação dos bancos nesta situação. Desta maneira, procurou-se investigar a existência de um possível choque negativo para o consumidor final, gerado pela medida macroprudencial que elevou o capital requerido para algumas operações de crédito a pessoas físicas. O choque ao consumidor é mensurado pelo aumento do custo de crédito. Se evidenciada a ocorrência do aumento como reflexo do aumento do capital requerido, pode-se argumentar que esta situação poderia motivar a redução do consumo, tendo efeito adverso na atividade econômica como um todo. Como o método dos mínimos quadrados supõe que os resíduos são independentes, o que pode não ser realista, dado que uma observação de uma variável de uma modalidade de crédito pode ter alguma correlação com sua observação no período anterior ou mesmo as observações em um mesmo período podem sofrer influência de um efeito externo que afete-as simultaneamente, optou-se por agrupar os dados (clusters) para indicar que as observações podem estar correlacionadas dentro de um mesmo mês (I) ou dentro de uma mesma modalidade de crédito (II). Assim, regrediu-se a equação (3) discutida na seção 3, cujos resultados são apresentados na Tabela 4: 46 Tabela 4 Estimação da relação entre exigência de capital adicional e taxas - modelo (2) Variável dependente: taxa (%) (I) (II) 6.464609 *** 6.464609 * (0.8718941) (2.201732) 1.074798 ** 1.074798 ** (0.4275475) (0.2204491) 1.395569 * 1.395569 * (0.7684272) (0.4905664) Agrupamento Meses Modalidades de crédito Observações 192 192 Modalidade de crédito 4 4 Meses 48 48 0.9431 0.9431 Capital adicional Inadimplência (%) Swap PRÉ-DI (%) R2 ajustado Nota: *, ** e *** indicam os coeficientes estatisticamente significantes a 10%, 5% e 1%, respectivamente. Entre parênteses, estão os desvios padrão robustos. Fonte: Elaboração do autor. O resultado do modelo indica que as taxas de juros de crédito das modalidades afetadas pela medida macroprudencial aumentaram em 6,46 pontos-percentuais durante o período em que capital requerido era maior, ou seja, de dezembro de 2010 a outubro de 2011, com níveis de confiança superiores a 99%, ao agrupar os meses, e a 90%, ao agrupar as modalidades de crédito. Portanto, no nível do empréstimo, há evidências estatísticas de que o aumento do capital requerido impactou a atividade econômica, através do aumento do custo de crédito. No mais, os sinais dos controles utilizados são consistentes com a expectativa inicial: é possível concluir que o nível de inadimplência de cada modalidade de crédito tem correlação positiva com suas respectivas taxas, com nível de confiança superior a 95%. Por fim, os coeficientes da variável swap PRÉ-DI, cuja intenção é a representação dos custos de captação e de oportunidade das operações, confirmam que as taxas de juros de crédito são crescentes com os referidos custos, com nível de confiança superior a 90%. 47 5.2) Efeitos da alavancagem sobre o yield e o beta A elevação do requerimento de capital próprio, por reduzir a probabilidade de falência das instituições financeiras, poderia não ter impacto no custo de capital médio ponderado no nível do banco, se investidores de ações e de dívidas levarem em consideração o menor nível de risco incorrido no estabelecimento da taxa de retorno exigida pelos respectivos papéis detidos. O modelo (3) da seção 3 busca analisar a relação entre o retorno exigido por detentores de dívidas e a alavancagem das instituições financeiras em questão. Novamente, por supor que as observações podem não ser independentes, efetuou-se duas simulações, uma ao agrupar os trimestres e outra ao agrupar os títulos. A Tabela 5 apresenta os resultados estimados: Tabela 5 Estimação da relação entre yield e alavancagem - modelo (3) Variável dependente: yield (%) (I) (II) 0.0256571 ** 0.0256571 * (0.0089308) (0.0146967) -1.34e-09 -1.34e-09 (5.03e-08) (4.68e-08) 3.54e-09 *** 3.54e-09 (8.88e-10) (2.53e-09) Agrupamento Trimestres Títulos Observações 255 255 Títulos 15 15 Trimestres 17 17 R2 ajustado 0.8550 0.8550 Alavancagem Lucro líquido (R$) Ativo total (R$) Nota: *, ** e *** indicam os coeficientes estatisticamente significantes a 10%, 5% e 1%, respectivamente. Entre parênteses, estão os desvios padrão robustos. Fonte: Elaboração do autor. Como se nota na Tabela 5, o retorno requerido pelos detentores de dívidas, representado pelo yield implícito no preço dos títulos emitidos, tem correlação positiva com a alavancagem 48 das instituições financeiras emissoras, com níveis de confiança superiores a 95%, ao agrupar os trimestres, e a 90%, ao agrupar os títulos. Esse resultado permite concluir que o aumento de capital próprio reduziria o retorno requerido por detentores de dívidas, pois essa ação seria traduzida em maior robustez patrimonial da instituição e, consequentemente, menor probabilidade de inadimplência. Na base de dados que serviu de insumo para a regressão, a alavancagem média dos bancos da amostra era cerca de 11 vezes na janela avaliada. Baseandose nos resultados do modelo, conclui-se que se a alavancagem dos bancos caísse pela metade (ou seja, para 5,5 vezes, na média), o yield das dívidas cairia em 0,14 ponto-percentual. Apesar de significante, entende-se que o impacto da alavancagem é pequeno no yield dos títulos, dado que a média de yields na base é de 5,3%. Os controles utilizados não apresentaram resultados significantes, exceção ao ativo total, quando agrupado por trimestre, que apresenta inesperadamente correlação positiva com o yield. Imaginava-se que o resultado seria contrário ao evidenciado, dado que instituições maiores costumam ter maior confiança das partes interessadas, o que tenderia a resultar em uma correlação negativa entre yield e ativo total. Com o mesmo espectro de bancos e o mesmo período utilizados na avaliação empírica recém relatada (modelo 3), julgou-se informativa a investigação da relação entre o retorno sobre os ativos (Return on Assets – RoA) realizado e o nível de alavancagem dos bancos, através de um modelo de efeitos fixos. Os resultados destas estimações são apresentados na tabela a seguir: 49 Tabela 6 Estimação da relação entre RoA e alavancagem Variável dependente: RoA (%) (I) (II) -0.0503667 *** -0.0503667 *** (0.0061334) (0.0021825) Agrupamento Trimestres Bancos Observações 176 176 Bancos 8 8 Trimestres 17 17 R2 ajustado 0.7298 0.7298 Alavancagem Nota: *, ** e *** indicam os coeficientes estatisticamente significantes a 10%, 5% e 1%, respectivamente. Entre parênteses, estão os desvios padrão robustos. Fonte: Elaboração do autor. Com nível de confiança superior a 99%, a correlação entre RoA e alavancagem é negativa, ou seja, o aumento da alavancagem tenderia a reduzir o retorno sobre os ativos, tudo mais constante. Supondo a não variabilidade dos ativos, a explicação para a relação inversa entre RoA e alavancagem está na influência que a alavancagem teria no custo de financiamento da instituição financeira, e, por consequência, no numerador do índice RoA. Níveis mais elevados de alavancagem trariam duas consequências: (i) aumento da base de capital de terceiros e (ii) aumento do custo de captação, como reflexo de seu maior risco, conforme resultados do modelo (3). Esses efeitos não seriam neutralizados pela diminuição da base de capital próprio na mensuração do RoA, dado que o custo de capital próprio é um custo econômico e não financeiro, ao contrário do custo de capital de terceiros. Portanto, este resultado empírico corrobora a evidência de que níveis mais baixos de alavancagem refletiriam na redução do retorno exigido por detentores de dívidas, que, por sua vez, gerariam um RoA mais elevado, tudo mais constante. Já o modelo (7) da seção 3 avalia a relação entre a medida de risco utilizada por acionistas na definição de seu retorno exigido, supondo que o fazem via CAPM, e a 50 alavancagem dos bancos. Outra vez, por supor que as observações podem não ser independentes, efetuou-se duas simulações, uma ao agrupar os trimestres e outra ao agrupar os bancos. A Tabela 4 apresenta os resultados estimados: Tabela 7 Estimação da relação entre beta e alavancagem - modelo (7) Variável dependente: beta (I) (II) 0.0757252 *** 0.0757252 *** (0.0211963) (0.0049336) -2.04e-08 -2.04e-08 (1.69e-08) (1.68e-08) -1.03e-09 *** -1.03e-09 (3.57e-10) (7.05e-10) Agrupamento Trimestres Bancos Observações 66 66 Bancos 3 3 Trimestres 22 22 R2 ajustado 0.6826 0.6826 Alavancagem Lucro líquido (R$) Ativo total (R$) Nota: *, ** e *** indicam os coeficientes estatisticamente significantes a 10%, 5% e 1%, respectivamente. Entre parênteses, estão os desvios padrão robustos. Fonte: Elaboração do autor. O resultado obtido do modelo evidencia que a alavancagem possui correlação positiva com o beta alavancado, com nível de confiança superior a 99% nas duas simulações. Esta evidência permite concluir que instituições financeiras com maior alavancagem possuem maior risco, consequentemente acionistas requerem maior retorno de suas ações, alinhando-se à teoria apresentada na equação (5). Se analisados os dados insumos da regressão, observa-se que a alavancagem média dos bancos da amostra era cerca de 13 vezes na janela avaliada. Baseandose nos resultados do modelo, ao supor uma situação de redução da alavancagem pela metade, o beta dos bancos diminuiria em magnitude próxima de 0,5. Além de significante, este resultado é expressivo, dado que a média de betas na base é de 1,05. Considerando o CAPM como modelo 51 de estabelecimento da taxa de retorno requerida e um prêmio de risco de mercado de 5% a.a., o retorno exigido por acionistas neste cenário seria 2,5 pontos-percentuais menor. Ao comparar o impacto da redução da alavancagem nos retornos requeridos por detentores de dívidas e por acionistas, nota-se que o efeito é muito mais forte para o segundo público. Novamente, não há evidências estatísticas de que os controles utilizados tenham alguma relação com beta das ações, exceção ao ativo total no agrupamento por trimestres, que apresenta correlação negativa com o beta, com nível de confiança superior a 99%. Esse resultado vai de encontro com o modelo de três fatores de Fama e French (1992), cuja análise sugere que empresas menores tendem a ter uma exigência de retorno adicional pelos investidores, se comparadas a empresas maiores. Por fim, para a mesma janela de tempo e os mesmos bancos considerados no modelo (7), procurou-se apurar a relação entre o retorno sobre o capital próprio (RoE) realizado e os níveis de alavancagem dos bancos, através de um modelo de efeitos fixos. Os resultados destas estimações são apresentados na tabela a seguir: Tabela 8 Estimação da relação entre RoE e alavancagem Variável dependente: RoE (%) (I) (II) 0.4041946 0.4041946 ** (0.3873829) (0.0614664) Trimestres Bancos Quantidade de observações 66 66 Bancos 3 3 Trimestres 22 22 R2 ajustado 0.8293 0.8293 Alavancagem Agrupamento Nota: *, ** e *** indicam os coeficientes estatisticamente significantes a 10%, 5% e 1%, respectivamente. Entre parênteses, estão os desvios padrão robustos. Fonte: Elaboração do autor. 52 Diferentemente da correlação negativa entre RoA e alavancagem, foi identificado um indício de correlação positiva entre RoE e alavancagem, com nível de confiança superior a 95% ao agrupar os bancos. Essa evidência indica que, mesmo que a alavancagem tenha influência indesejada no custo marginal de captação dos bancos e, por consequência, no numerador do índice RoE, a influência do denominador é dominante. Se suposto que o RoE realizado reflete exatamente o retorno exigido por acionistas, a correlação positiva entre RoE e alavancagem é mais uma documentação de que a redução da alavancagem diminuiria o retorno exigido eles. No agrupamento de trimestres, o resultado não foi estatisticamente significante. Com base nos resultados apresentados nesta subseção, há evidências estatísticas para afirmar que, no nível do banco, o aumento do requerimento de capital próprio tenderia a diminuir tanto o custo de dívidas quanto o custo de capital próprio das instituições financeiras. Esta constatação leva a imaginar que o custo de financiamento total dos bancos pode não aumentar com o aumento da proporção de capital próprio no mix de capital, podendo essa investigação ser a motivação de um trabalho posterior. Destaca-se, ainda, que as instituições financeiras no Brasil operam com níveis de alavancagem relativamente baixos, assim, a documentação dos efeitos da alavancagem sobre o yield implícito dos títulos e sobre o beta alavancado dos bancos era menos esperado, logo, deve ser ainda mais forte em um mercado cujos níveis de alavancagem são maiores. 53 6) Conclusão Este trabalho investiga, empiricamente, alguns dos argumentos utilizados no debate de maior exigência de capital das instituições financeiras. Para avaliar se um requisito regulatório de capital mais elevado afetaria a economia de modo geral, foram analisadas as medidas macroprudenciais ocorridas no Brasil entre 2010 e 2011, que, dentre outras consequências, aumentaram o capital requerido de algumas operações de crédito à pessoa física por um período definido, de dezembro de 2010 a outubro de 2011. Com este cenário, pôde-se concluir estatisticamente que, no nível do empréstimo, a maior exigência de capital regulatório aumentou as taxas de juros de crédito das modalidades de crédito afetadas em 6,46 pontospercentuais, impactando, portanto, a economia através do aumento do custo de crédito, evidência também encontrada por Martins e Schechtman (2013) no estudo específico sobre os empréstimos para aquisição de veículos. Não se sabe o que ocorreria com a taxa média se o requerimento fosse aumentado uniformemente. Por outro lado, no nível agregado do banco, se houvesse uma maior exigência de capital próprio, a teoria sugere que o custo de capital próprio e o custo de dívida diminuiriam como reflexo da redução do risco incorrido por acionistas e detentores de dívidas, respectivamente. Desta maneira, analisou-se também a relação do nível de alavancagem dos bancos brasileiros com o yield de títulos privados por eles emitidos, que mensura o risco dos detentores de dívidas, e também com o risco dos acionistas, quantificado através do beta alavancado das ações dos bancos, supondo que acionistas estabelecem seu retorno exigido pelo CAPM. Como resultado, foram obtidas evidências estatísticas de que há correlação positiva tanto entre o yield das dívidas e a alavancagem quanto entre o beta alavancado das ações e a alavancagem, similarmente ao concluído por Baker e Wurgler (2013) e por Miles et al. (2011) para os mercados norte-americano e britânico, respectivamente. Ou seja, conclui-se que quanto maior for a participação de capital próprio no financiamento da instituição financeira, menor será o 54 retorno requerido por acionistas e detentores de dívidas. No entanto, não foi investigado se essas reduções de custo neutralizariam o deslocamento de financiamento via dívidas para financiamento via capital próprio, ou seja, de um instrumento com menor retorno requerido para um outro com maior retorno requerido. 55 Referências Admati, Anat R., Peter M. DeMarzo, Martin F. Hellwig e Paul Pfleiderer (2013), “Fallacies, irrelevant facts and myths in the discussion of capital regulation: Why bank equity is not expensive”, Working Paper No. 161, Stanford University. Afonso, José R., Marcos A. Köhler e Paulo S. de Freitas (2009), “Evolução e determinantes do spread bancário no Brasil”, Textos para discussão 61, Centro de Estudos da Consultoria do Senado Federal. Baker, Malcolm P. e Jeffrey Wurgler (2013), “Do Strict Capital Requirements Raise the Cost of Capital? Banking Regulation and the Low Risk Anomaly”, NBER Working paper. 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