A Luta Contra as Alterações Climáticas e a Conferência

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DEBATER A EUROPA
Periódico do CIEDA e do CIEJD, em parceria com GPE, RCE e o CEIS20.
N.1 Junho/Dezembro 2009 – Semestral
ISSN 1647-6336
Disponível em: http://www.europe-direct-aveiro.aeva.eu/debatereuropa/
A Luta Contra as Alterações Climáticas e a
Conferência Climática de Copenhaga (COP15)
Luiz Sá Pessoa
Representação da Comissão Europeia em Portugal
Minhas Senhoras e Meus Senhores
As alterações climáticas e a energia constituem dois dos mais importantes desafios com que
nos defrontaremos ao longo dos próximos anos.
Em Março de 2007 os líderes da UE acordaram em reduzir até 2020, de forma unilateral, pelo
menos 20% das emissões de CO2 (ou 30% se os outros países industriais concordarem em
metas globais equivalentes) e em fixar um objectivo vinculativo de 20% para a utilização de
energias alternativas.
Em Dezembro de 2007, foram lançadas as negociações para a conclusão de um Acordo PósQuioto, ao nível da ONU, com o objectivo de combater as alterações climáticas. Tal acordo
político deve ser assinado no final da Conferência Climática de Copenhaga (COP15) que se
realiza de 7 a 18 de Dezembro de 2009.
A UE tem tomado parte activa nas negociações Pós- Quioto, sobre as alterações climáticas.
Começaria por enquadrar o objectivo da Conferência da ONU, do próximo mês de Dezembro,
em Copenhaga.
As alterações climáticas não são um problema que diga respeito apenas aos nossos filhos e
gerações posteriores, nem apenas à Europa.
As alterações climáticas já começaram, estão a acelerar, e podem ser observadas em qualquer
parte do mundo. Sabe-se que irão agravar-se, caso não actuemos já e de uma forma
coordenada, para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa.
Os glaciares estão a diminuir, não só na Europa, mas também noutras partes do planeta: nos
Andes, nos Himalaias, na Gronelândia. O nível das águas do mar está a subir e irá continuar a
subir nas próximas décadas. Calcula-se essa subida possa atingir 1 metro, podendo ser ainda
maior caso derreta a camada de gelo da Antárctida ou da Gronelândia.
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Já hoje em dia o mundo observa alterações na agricultura, ocorrendo períodos de seca e de
falta de água. São observadas por todo o lado, provocando cenários de crise. E não é apenas
em África, no Darfur, por exemplo…
Em Portugal, também se tem verificado esta situação… Nos últimos 30 anos a temperatura
aumentou a um ritmo de 0,4 a 0,5 por década, o que resultou num aumento de 1,2 a 1,5ºC
desde os anos 70.
A estação das chuvas tem vindo a diminuir, sobretudo nas regiões do sul do país. Por
exemplo, a precipitação média em Março é actualmente inferior em 27% à que ocorria no
início do século XX, sendo a temperatura atmosférica 0,27º superior.
As previsões para Portugal apontam para uma subida do nível médio do mar entre 25 a 110
cm até 2100. Se assim for 67 % do litoral estará em risco de erosão.
Mas não é só a erosão da zona costeira.
As zonas lagunares de Aveiro, Ria Formosa, Óbidos ou Albufeira e as zonas dos estuários do
Tejo e do Sado tenderão a desaparecer ou a estreitar-se muito. Um estudo da Universidade de
Cantábria indica que a subida do nível médio do mar poderá retirar até 15 m de areia às praias
portuguesas, sendo a faixa entre Aveiro e Lisboa a mais afectada.
Para além disso há outras consequências que já se observam, em virtude das alterações na
temperatura e precipitação, por exemplo:
• Cheias e inundações devido ao degelo e precipitação acentuada em curtos períodos de
tempo,
• Falta de água e aumento de incêndios florestais,
• Um aumento das doenças tropicais e de problemas respiratórios,
• Diminuição das colheitas agrícolas, fome,
• Maior taxa de mortalidade devido às súbitas elevadas temperaturas,
• Conflitos, aumento das migrações.
Não é só na Europa ou em Portugal que estas ocorrências se fazem sentir. O mesmo se tem
verificado por exemplo na Austrália, na Índia, na China ou na Califórnia.
As consequências na economia não têm precedentes.
Para evitar os mais desastrosos impactos das alterações climáticas, temos que manter a
temperatura global inferior a 2º C acima da temperatura da era pré- industrial. Ou seja,
dispomos actualmente apenas de uma margem extremamente limitada de 1,2ºC e quanto mais
tempo esperarmos maiores serão os riscos e mais elevados serão os custos.
Por isso é tão urgente actuar.
Se falharmos na estabilização, para depois cortarmos as emissões de gases com efeito de
estufa, haverá, segundo os cientistas, alterações climáticas catastróficas e irreversíveis ainda
no período de vida da população actual.
As projecções do 4º relatório de avaliação da ONU apontam nessa direcção e o pior dos
cenários estudados pode vir a tornar-se o cenário mais provável.
Têm vindo a público algumas vozes a respeito do custo das medidas ambientais e propondo
um adiamento dessas medidas até que a crise económica e financeira esteja controlada.
No meu entender, pode contestar-se esse raciocínio com base em dois tipos de argumentos:
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•
•
O Custo da inacção é significativamente superior ao esforço financeiro necessário para
a adopção das medidas de combate às alterações climáticas. Como dizia há 3 anos o
Relatório Stern: "se investirmos 1% agora pouparemos 20% do PIB a longo prazo"!
Relatórios posteriores da McKinsey e da Agência Internacional da Energia confirmam
o montante que é necessário investir agora. Mas Lord Stern já alertou para o facto de
ter subestimado as consequências e os custos da inacção.
O combate às alterações climáticas é oportuno, porque pode constituir uma alavanca
para a recuperação económica e estabelecer as bases de uma nova economia
hipocarbónica, através do desenvolvimento das chamadas indústrias verdes com a
criação de postos de trabalho. Devido aos seus compromissos unilaterais a Europa
obteve uma vantagem competitiva e tem estado na vanguarda da tecnologia das
energias renováveis. O crescimento dos mercados mundiais das energias verdes pode
impulsionar um sector industrial em rápido crescimento e criar emprego. Muitas
centenas de milhares de empregos já foram criados na indústria das eólicas, das
células solares fotovoltaicas, nas infra-estruturas, nos automóveis não poluentes, mas
também nas novas tecnologias que visam a eficiência energética. Segundo um estudo
da Roland Berger só a Alemanha poderá ter em 2020, entre 400.000 a 500.000
empregos nas indústrias ligadas às energias renováveis.
E é um facto que não haverá apenas novos empregos nas indústrias verdes ou limpas, mas
também em I&D.
Com esse objectivo a Comissão Europeia lançou o Plano SET– Plano Estratégico Europeu
para as Tecnologias Energéticas – para o desenvolvimento de tecnologias de baixa
intensidade de carbono.
A CE pretende que o Plano SET, o pilar tecnológico da política da UE em matéria de energia
e clima, seja um trampolim para uma economia hipocarbónica, o que só será possível
reunindo recursos públicos e privados de uma forma coerente. Numa proposta intitulada
«Investir no desenvolvimento de tecnologias hipocarbónicas», a Comissão estima que nos
próximos dez anos será necessário um investimento adicional de 50 mil milhões de euros na
investigação de tecnologias energéticas, quase triplicando o investimento anual na União
Europeia – de 3 para 8 mil milhões de euros –.
O investimento necessário para o desenvolvimento de tecnologias limpas e renováveis será
possível recorrendo a uma ampla gama de instrumentos financeiros. A Comissão e o Banco
Europeu de Investimento já aumentaram significativamente o investimento para este fim, mas
é necessário mobilizar mais verbas provenientes dos sectores público e privado.
Conforme sublinhou o Comissário Potočnik, há poucos dias, no lançamento do Plano SET –
Plano Estratégico Europeu para as Tecnologias Energéticas –: «É urgente reforçar o
investimento na investigação de tecnologias limpas para que a Europa possa realizar com
menores custos o processo de Copenhaga. Aumentar hoje os investimentos inteligentes na
investigação é criar uma oportunidade para desenvolver novas formas de crescimento, tornar
mais ecológica a economia europeia e assegurar a competitividade da UE quando se sair da
crise».
Gostaria em seguida de lhes dar um breve resumo sobre o estado actual das negociações para
um Acordo em Copenhaga. Há elementos positivos, que nos dão esperança de se chagar a um
acordo, mas também existem ainda dificuldades a superar.
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1. A posição da UE:
A UE tem estado muito activa nas negociações Pós-Quioto, para que possa ser encontrado um
acordo amplo e ambicioso com o objectivo de evitar que o aumento da temperatura global
atinja os 2ºC acima da temperatura da época pré-industrial, ou seja, que atinja os níveis
catastróficos antecipados pela comunidade científica.
O desafio que propomos é o de dar início a uma nova revolução industrial com base em baixo
consumo de energia e em menores emissões de carbono.
A liderança da UE nesta matéria pode ver-se em primeiro lugar pelo compromisso unilateral
já adoptado, de reduzir, sem quaisquer condições, os seus níveis de emissões em pelo menos
20% até 2020, e aceitando comprometer-se com níveis superiores se outros países
industrializados aceitarem reduções comparáveis para se chegar a um acordo global.
A UE também já lançou um pacote de medidas sobre eficiência energética e energias
alternativas que tem vindo a pôr em prática.
Há um mês, em Setembro de 2009 a Comissão Europeia propôs aos países industrializados
um esforço financeiro conjunto para ajudar os países em desenvolvimento a diminuir as suas
emissões e a adaptarem-se ás alterações climáticas.
Prevê-se que estes países em desenvolvimento necessitem de cerca de 100.000 milhões de
euros para reduzir as suas emissões de gases com efeitos de estufa e para se adaptarem aos
impactos provocados pelo aumento de temperatura.
A Comissão Europeia propõe que, caso haja um acordo ambicioso em Copenhaga, venha a
contribuir com 2 a 15 mil milhões euros por ano até 2020 para integrar o financiamento
público internacional necessário para complementar o financiamento nacional e os fundos
provenientes do mercado internacional de carbono.
Quais são os pontos que a UE considera serem importantes no acordo?
O acordo deve incluir:
• Reduções vinculativas das emissões em todos os países industrializados, baseadas em
esforços semelhantes por parte de cada um;
• Uma acção adequada por parte dos países em desenvolvimento para limitar as
emissões;
• Uma agenda para diferentes acções para adaptação às alterações climáticas;
• Esforços concretos para reduzir a desflorestação e para promover a gestão sustentável
da floresta nas regiões tropicais;
• Estabelecimento de regras sobre o valor das emissões resultantes do uso dos solos,
alteração do uso dos solos e da florestação;
• Criação de um mercado internacional de CO2 alargado, que possa gerar apoios
financeiros e redução de emissões a custos acessíveis para os países em
desenvolvimento;
• Disponibilizar fundos públicos internacionais aos países em desenvolvimento para
complementar os fluxos financeiros do mercado de carbono e do investimento interno;
• Um conjunto de instrumentos de cooperação tecnológica e de financiamento para
acelerar o desenvolvimento de uma economia global hipocarbónica.
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Uma questão que tem estado a bloquear as negociações é a do financiamento de que os países
em desenvolvimento necessitam para poderem lutar contra as alterações climáticas.
Com esse propósito a CE propôs um modelo de financiamento que calcula os montantes
necessários, define fontes de financiamento a sua organização e propõe uma contribuição
equitativa da UE.
Para além dos financiamentos privados, o Fundo do Carbono poderá contribuir com 38.000
milhões de euros por ano; a UE pode contribuir com 10 a 30% do financiamento público
internacional que os países industrializados poderão disponibilizar e que, no seu conjunto,
podem representar entre 22.000 e 50.000 milhões de euros por ano.
Mas, como disse atrás também existem ainda dificuldades a vencer para se chegar a um
acordo.
Na semana passada, o Presidente Barroso disse no Parlamento Europeu que está consciente
das dificuldades para a Conferência de Copenhaga e que há actualmente 3 potenciais
obstáculos, não apenas financeiros, para se chegar a um acordo, a saber:
• A falta de ambição de alguns países desenvolvidos fora da UE para reduzirem
as suas emissões;
• A relutância por parte de importantes países com grandes economias
emergentes em avançarem com propostas convincentes sobre acções
mitigadoras;
• A ausência de uma proposta financeira sólida por parte de países
desenvolvidos.
Há no entanto sinais positivos que têm vindo a público. Falta traduzir esses sinais num texto
simples em que todos se revejam.
O Japão, um dos países que apresenta maior eficiência energética, anunciou em meados de
Setembro, uma meta ambiciosa de redução das suas emissões de GEE em 25% até 2020, em
comparação com o ano de referência de 1990.
Uma semana depois, o Presidente Chinês Hu Jintao declarou em Nova Iorque que a China
tem novas propostas para alterar a actual situação.
Nessa semana, também em Nova Iorque, a Índia alterou a sua posição, aceitando adoptar
medidas a nível nacional, mas também quer dialogar sobre a matéria com a comunidade
internacional.
A Indonésia, um dos países com maiores emissões de CO2, estuda actualmente a fixação de
metas muito ambiciosas.
Os EUA têm sido apresentados como um dos que levanta maiores obstáculos ao
estabelecimento de metas ambiciosas para o curto e médio prazo.
Mas é um facto que o Presidente Obama tem repetido que pretende alcançar a liderança na
luta contra as alterações climáticas. E tais declarações criam expectativas na comunidade
internacional.
São conhecidas as reticências que o Senado Americano tem levantado nesta matéria. Mas, há
a esperança de que após a reforma do sistema de saúde e a melhoria da crise económica, os
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EUA prestem atenção às questões da luta contra as alterações climáticas a tempo da
Conferencia de Copenhaga. Até porque os participantes na reunião do G8 do verão passado
reafirmaram o propósito de conseguir que o aumento médio de temperatura fique abaixo do
limiar dos 2ºC.
O ministro do Meio Ambiente do Brasil afirmou ontem que o Brasil vai avançar com uma
proposta muito ambiciosa de reduzir as suas emissões em 40% até 2020. Embora tal redução
anunciada não tenha como referencial as emissões de 1990, há que registar uma atitude
positiva para as negociações.
Pois as negociações preparatórias prosseguem através de várias rondas.
A última ronda política de negociações terminou em 9 de Outubro em Banguecoque. A
próxima ronda terá lugar em Barcelona, a partir de 2 de Novembro.
Em relação à redução de emissões de CO2, as metas que os diferentes países industrializados
já colocaram sobre a mesa de negociações, apenas conduzirá a uma redução global em 2020,
entre 9 e 15-16% acima dos níveis de 1990. As grandes economias emergentes ainda não
avançaram com metas ou acções concretas para controlarem as suas emissões.
Para que seja obtido em Copenhaga um acordo político, vinculativo e ambicioso, tem que
haver acordo de 192 países, pois temos uma tarefa conjunta e não apenas uma tarefa para a
Europa.
Copenhaga pode ser a última oportunidade para que haja um acordo para que as emissões
globais invertam o ciclo de subida, e assim evitar que a temperatura não suba mais que 2º
acima da temperatura de referência.
Já passaram 12 anos desde Quioto.
Não se pode esperar mais uma década para tomar decisões sobre as acções para reduzir as
crescentes emissões de CO2. Pode ser demasiado tarde.
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