A saúde mental do estudante de medicina: uma

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
Ana Beatriz de Mattos Pessoa, Jairo Vinícius M. de M. C. Pinto, Juliana Murata,
Murillo de Mayo Ginjo, Rafaella Cleto Penteado, Ramon Pontes Silva, Tallita
Tauscheck.
A saúde mental do estudante de medicina: uma análise bibliográfica.
CURITIBA
2011
Ana Beatriz de Mattos Pessoa, Jairo Vinícius M. de M. C. Pinto, Juliana Murata,
Murillo de Mayo Ginjo, Rafaella Cleto Penteado, Ramon Pontes Silva, Tallita
Tauscheck.
A saúde mental do estudante de medicina: uma análise bibliográfica.
Trabalho apresentado sob orientação
do professor João Carlos do Amaral
Lozovey como requisito parcial para
obtenção de nota na disciplina de
Investigação em Saúde Coletiva.
CURITIBA
2011
A saúde mental do estudante de medicina: uma análise bibliográfica.
PINTO, JV1; SILVA, RP1; PENTEADO, RC1; GINJO, MM1; MURATA, J1; PESSOA,
ABRCM1; TAUSCHECK, T1.
Contato do autor principal.
1 – Acadêmico do curso de medicina da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
RESUMO
É bem sabido que no curso de Medicina há um alto grau de estresse devido não
somente às expectativas pessoais, mas também pelas demandas social, física e
psicológica. Para tanto, a saúde mental do estudante de Medicina deveria ser muito mais
discutida tanto em seu cunho teórico quanto prático para dar ao acadêmico um suporte
para lidar com os sentimentos com os quais se depara. O objetivo deste estudo é realizar
uma revisão de literatura a fim de unir informações importantes na discussão da saúde
mental do acadêmico, resgatando pontos chaves (a idealização e o luto, o estresse e o
burnout, a depressão e o suicídio, e a busca por auxílio) para a análise da situação atual.
O estudo é exploratório-descritivo. Além de citar conceitos básicos definidos por
renomes da literatura, usou-se também como fonte as bases de dados virtuais Pubmed e
SciELO com busca por “estudante de Medicina” e demais palavras chaves, sendo
limitado a artigos científicos de livre acesso publicados em inglês ou em português. O
panorama feito releva a necessidade de mais estudos com o intuito de identificar
causalidade entre fatores associados, reformular os currículos vigentes e por fim
oferecer serviços de apoio ao acadêmico.
Palavras-chave: estudantes de medicina, saúde mental, depressão, suicídio, estresse,
burnout, ansiedade, álcool, tabaco, transtornos psiquiátricos, doenças psiquiátricas.
ABSTRACT
It is well known that there is a high degree of stress in the Medicine course not
only due to personal expectations, but also for social, physical and psychological
demand. Accordingly, the mental health of the Medicine student should be more
discussed in both its theoretical and practical aspects, to provide scholars support to deal
with the feelings they face. The objective of this study is to perform a literature review
in order to assemble important information about the discussion of the academic's
mental health, redeeming keywords (idealization and mourning, stress and burnout,
depression and suicide, and the search for assistance) for analysis of the current
situation. The study is exploratory-descriptive. Apart from mentioning basic concepts
defined by renowned authors, virtual data base sources such as Pubmed and SciELO
were used, searching "Medicine student" and other keywords, restricted to scientific
articles of free access, published in English or Portuguese. The picture made highlights
the need for more studies with the purpose of identify causality among associated
factors, restructure the existing curricula and, ultimately, provide academic support
services.
Keywords: medicine student, mental health, depression, suicide, stress, burnout,
anxiety, alcohol, tobacco, psychiatric disorder, psychiatric disease.
INTRODUÇÃO
O estudante de medicina, ao iniciar o curso, anseia por formar-se um bom médico. Seja
motivado conscientemente pela vontade de se tornar o médico ideal, representado pelas
características do deus grego Asclépio (CASSORLA, 1995), seja motivado pelas razões
mais profundas do inconscientemente (ROCCO, 1992) o acadêmico se atira de forma
obstinada aos seus intentos. Entretanto a dedicação integral a um curso de conteúdo
denso e com constantes cobranças pode vir a ser um fator estressor e produtor de doença
na vida dos estudantes (ZONTA et al., 2006), os quais nem sempre buscam auxilio, e ,
do contrário, tentam “mascarar” seu sofrimento com estratégias que degradam ainda
mais a sua saúde.
Desde antes do vestibular, com as pressões de estudo e concorrência, até diplomar-se
médico, com as cobranças inerentes à profissão como a falta de tempo e a
responsabilidade pela vida, diversas são as condições que podem causar sofrimento e
alterações na saúde mental do estudante de medicina. Dentre os eventos estressores
estão a figura do médico idealizado (QUINTANA et al., 2010) , o pouco tempo livre, o
grande volume de estudo, as dificuldades do relacionamento com os pacientes e a
interferência da rotina da carreira médica na vida pessoal (MILLAN et al, 2005). Esses
fatores podem causar conseqüências na saúde mental dos acadêmicos, causando estresse
e conseqüentes condições depressivas e ansiosas (FOGAÇA et al., 2008).
Muito embora algumas escolas de medicina tenham serviços de auxilio à saúde mental
dos acadêmicos (MILLAN et al., 2008) isso acaba não sendo uma constante. Diante dos
estressores do curso, os estudantes buscam diversas formas de suportá-los. Alguns
recorrem aos serviços especializados, seja de profissionais de saúde ou de serviços
ofertados por suas escolas (CUNHA et al., 2009) outros recorrem à religiosidade ou a
outras estratégias saudáveis como fortalecimento de laços afetivos e práticas esportivas
(ZONTA et al., 2006). Infelizmente, uma parcela dos acadêmicos recorre a práticas que,
muito embora aliviem seu estresse momentaneamente, prejudicam sua saúde de forma
geral a longo prazo. Dentre essas estratégias infortunas incluem-se o tabagismo
(MENEZES et al., 1994), a ingestão de álcool e o uso de substâncias psicoativas
(LEMOS et al., 2007).
Frente à situação apresentada, faz-se necessário, portanto, que se estudem as condições
de saúde mental dos estudantes de medicina e que se busquem alternativas para garantir
a qualidade de vida dos futuros médicos.
METODOLOGIA
A presente pesquisa é do tipo exploratório-descritiva. Para a revisão de literatura, foi
realizada uma busca nas bases de dados virtuais Pubmed e Scielo com o descritor
“estudantes de medicina” combinado com outros descritores como “depressão”,
“suicídio”, “estresse”, “burnout”, “ansiedade”, “álcool”, “tabaco”, “transtornos
psiquiátricos”, “doenças psiquiátricas”, limitados a artigos científicos. Esses termos
foram traduzidos para a língua inglesa, para a pesquisa no banco de dados Pubmed. No
banco de dados do Scielo, tivemos o cuidado de selecionar artigos que diziam a respeito
da saúde mental do estudante de medicina brasileiro, uma vez que foram encontrados
artigos sobre estudantes de outros países, como Venezuela e Honduras. Nessa pesquisa,
encontramos um número razoável de artigos científicos a respeito da saúde mental do
estudante em diversas faculdades de medicina no Brasil. Foram identificadas as
produções científicas da área médica a partir de 1980. A opção de trabalhar com
produções da década de 80 deveu-se ao fato de as bases de dados estarem disponíveis a
partir deste período. De todas as referências encontradas, foram selecionadas apenas as
publicadas em periódicos de língua inglesa e portuguesa. Os autores optaram ainda por
utilizar apenas artigos de livre acesso à população, ou seja, que não têm custo
financeiro.
A pesquisa foi complementada e aprofundada com livros e sites da internet
especializados no assunto, com fim do melhor entendimento sobre como a saúde mental
do ser humano pode ser afetada, nas diversas formas. No site
http://www.fm.usp.br/cedem/qv/servicos.php foram encontrados serviços e programas
de suporte ao estudante de universidades. Estão ilustradas, 23 universidades em que
existem serviços e programas direcionados para o suporte ao estudante, incluindo o
estudante de medicina, que é o objeto de nosso estudo.
DISCUSSÃO
Idealização e luto.
Comumente as pressões sobre os futuros médicos iniciam-se antes mesmo destes
adentrarem à faculdade ou universidade. As cobranças começam nos estudos e
preparativos para o vestibular. O estresse da competição, da grande concorrência por
uma vaga em boas instituições, o histórico de reprovações de anos passados, o peso das
cobranças familiares e o medo da não aprovação são alguns dos fatores que antecedem a
vida acadêmica já como um funesto preâmbulo do que virá a posteriori (SOUZA, 2010).
Em virtude disso, pode-se questionar o que ocorre com essa população, que,
por um lado, se mostra tão capacitada e, por outro, tão vulnerável ao
adoecimento. Por isso a hipótese é de que as forças que estão envolvidas na
busca do objetivo também estarão presentes no adoecimento. A idealização, a
identificação, juntamente com a determinação, a persistência e a
competitividade serão fatores determinantes no adoecimento. Superar a
identificação do estudante de medicina com o ideal de “ser” médico é o
trabalho a ser realizado. (SOUZA, 2010. Pág. 1).
O estudante de medicina inicia o curso com uma idealização de médico e de
atendimento em saúde. Porém ao se deparar com a fria realidade das ciências básicas e
das excessivas cobranças em torno dos densos conteúdos sofre um penoso desprazer.
Essa perda da abstração leva a um processo de luto pelo objeto idealizado e conseqüente
sofrimento (FREUD, 1917). Não obstante o estudante ainda se depara com as cobranças
que a sociedade impõe sobre os acadêmicos ao também idealizar o médico
(QUINTANA et al., 2010) e, por decorrência, idealizar o estudante de medicina, sempre
dedicado e competente.
Ao começar as aulas no hospital o estudante de medicina se deparara com diversos
conflitos já que inicia o convívio com a dor, o sofrimento e a morte que podem ser
prejudiciais para a sua saúde mental (LEE et al., 2001). Ao se deparar com o fato de
que nem sempre a cura está ao seu alcance e de que nem todas as doenças estão sob o
seu controle, põem-se por terra os sonhos idealistas e onipotentes dos futuros médicos
(GONÇALVES, 1998). O freqüente contato com a perda e com o sofrimento leva o
acadêmico a se confrontar com sua mortalidade e a temer pela sua própria saúde. O
estudante sente-se, então, vulnerável já que o sentimento que havia outrora, de que
poderia impedir a dor e a morte sua e de sua família são colocados em cheque.
(WERNER, 1976).
Estresse e burnout
O ensino médico é pautado por momentos constantes de pressão e por fatores
estressores dentre os quais estão o pouco tempo livre, o grande volume de estudo, as
dificuldades do relacionamento com os pacientes e a interferência da rotina da carreira
médica na vida pessoal (MILLAN et al., 2005). Estudos apontam que os estudantes de
medicina adoecem mais que a população em geral (MILLAN et al., 1998; CAVESTRO
e ROCHA, 2006; REZENDE et al., 2008), o que indica que estariam mais vulneráveis,
portanto, ao estresse e, conseqüente, a doenças mentais (SOUZA, 2010).
O estresse pode ser definido como a soma de respostas físicas e mentais, como a
vigilânica elevada, e sobre as quais se tem pouco controle causadas em resposta a uma
experiência adversa (HIGGINS, 2010). Frente a situações de estresse, uma pessoa pode
responder com alterações afetivas muito variadas, dentre as quais as mais comuns são as
depressivas e ansiosas (FOGAÇA et al., 2008). Os sintomas característicos, que
indicam, incluem a insônia, fadiga, irritabilidade, esquecimento, dificuldade para
concentração e queixas somáticas. Estudos com universitário, e em especial com os do
curso de medicina (COSTA E PEREIRA, 2005) apontam que o estresse ao qual são
submetidos ao longo de sua vida acadêmica podem desencadear distúrbios mentais de
cunho emocional, como estados depressivos, isolamento social, irritabilidade e
distúrbios somáticos como gastrite, diarréia, cefaléia e perda de peso. De acordo com
estudo de FIOROTTI et al. (2010) de de 225 acadêmicos de medicina avaliados havia
uma prevalência de transtornos mentais comuns em 29,6%.
Segundo estudos de AGUIAR et al. (2009), com o objetivo de identificar o perfil
sociodemográfico dos acadêmicos de Medicina e avaliar a prevalência de sintomas de
estresse, metade dos estudantes (49,7%) apresenta sintomas de estresse, sendo que os
sintomas psicológicos são os mais prevalentes. O estudo mostrou também que embora
haja maior prevalência percentual do sexo masculino (54,5%) entre os estudantes de
Medicina, os índices de sintomas de estresse se revelam superiores no sexo feminino
(66,7%% versus 35,8%). Nesse mesmo estudo, foi evidenciado, que a história de vida,
os antecedentes pessoais e familiares, e os aspectos de personalidade têm papel
significativo na gênese de transtornos por estresse.
O burnout é, por definição, uma forma de sofrimento psíquico relacionada a alterações
fisiológicas decorrentes do estresse, com maior risco de infecções, alterações
neuroendócrinas
do
eixo
hipotalâmico-hipofisário-adrenal,
hiperlipidemia,
hiperglicemia e aumento do risco cardiovascular. A síndrome se caracteriza por
exaustão emocional (fadiga intensa, falta de forças para enfrentar o dia de trabalho e
sensação de estar sendo exigido além de seus limites emocionais), despersonalização
(distanciamento emocional e indiferença em relação ao trabalho ou aos usuários do
serviço) e diminuição da realização pessoal (falta de perspectivas para o futuro,
frustração e sentimentos de incompetência e fracasso) São freqüentes ,também,
sintomas como insônia, ansiedade, dificuldade de concentração, alterações de apetite,
irritabilidade e desânimo (VIEIRA et al., 2006). Muito embora seja uma morbidade
comumente encontrada em clínicas e diagnosticada por ferramentas como o Maslach
Burnout Inventory (MASLACH et al., 1996), ela não consta nas classificações
psiquiátricas.
DYRBYE et al. (2010), em estudo com acadêmicos de medicina, concluiu que atitudes
como honestidade, agir com integridade, advogar a favor das necessidades dos
pacientes, reduzir barreiras para uma saúde mais equalitária, e aderir a um código de
conduta ético são prejudicadas quando os estudantes se encontram em burnout
(exaustão). Dentre os 2682 estudantes norte-americanos pesquisados, 52,8%
encontravam-se em estado de burnout, e 52,5% foram positivos para um screening de
depressão. No quesito relação médico-paciente, a falta é grave: 49% dos estudantes com
burnout relataram um dado de exame físico como normal no prontuário tendo omitido
sua pesquisa no exame físico, contra apenas 35,8% doa estudantes testados negativos
para burnout. Estados de estresse crônico e elevado diminuem a qualidade do
aprendizado e da realização do estudante frente à sua profissão , piorando o quadro de
saúde mental e, ao enfrentar esses conflitos, prejudicando sua identidade profissional,
deixando marcas na mesma (RAMOS-CERQUEIRA et al., 2002)
Depressão e suicídio
A depressão é uma condição comum, já reconhecida por Hipócrates, e que, apesar de
nosso avanço tecnológico desde a Grécia antiga, ainda sabemos muito pouco sobre a
condição dessa doença (HIGGINS, 2010). O transtorno de humor depressivo, de acordo
com a Classificação Internacional de Doenças, em sua 10ª revisão, abarca sintomas
como concentração, atenção reduzidas, auto-estima e autoconfiança reduzidas; idéias de
culpa e inutilidade; visões desoladas e pessimistas do futuro; idéias ou atos lesivos ou
suicídio; sono perturbado; e manifestações somáticas como anedonia, perda de apetite,
perda de peso e perda da libido dentre outras (CID-10, 1993).
Um estudo de rastreamento epidemiológico de sintomas depressivos em residentes e
estudantes de medicina, realizado por GABRIEL et al. (2005), apresentou importantes
índices de sintomatologia depressiva observados nessa população. Participaram, nesse
estudo, 64 residentes e 97 acadêmicos do primeiro ano do curso de medicina e foram
encontrado os seguintes resultados: 81% dos residentes e 72% dos acadêmicos
apresentavam sintomatologia depressiva. Houve predomínio no sexo feminino: 54% das
residentes e 61% das acadêmicas .
Em pesquisa realizada por SCHWENK et al. (2010), constatou-se que estudantes norteamericanos de primeiro e segundo anos são mais susceptíveis que os estudantes de
terceiro e quarto anos a apresentar depressão moderada a severa. Contudo, os estudantes
de primeiro e segundo ano relataram ideação suicida com menos freqüência que os de
terceiro e quarto anos. Dos alunos com depressão moderada a severa, foi encontrada
uma percentagem maior de mulheres em relação a homens. Essa diferença não foi
encontrada nos casos de ideação suicida.
A freqüência com que estudantes
consideraram largar os estudos foi cerca de 8 vezes maior em estudantes de medicina
com depressão moderada a severa que em estudantes com depressão mínima ou não
depressivos.
Estudantes de medicina com depressão severa apresentaram com maior freqüência
estigmas em relação a depressão, quando comparados com colegas não ou minimamente
depressivos. Entre estes estigmas estão a percepção de que contar sobre a doença a um
chefe poderia ser arriscado, que procurar ajuda significaria que a sua capacidade
cognitiva estava afetada, e que se assumissem a depressão suas opiniões seriam menos
respeitadas. Estes dados poderiam refletir a distorção cognitiva que sabidamente ocorre
em pacientes depressivos, podendo os estudantes de medicina afetados ter uma visão
excessivamente negativa e não condizente com a realidade sobre a maneira como são
vistos por outros estudantes. Os dados poderiam ainda indicar que estes estudantes são,
de fato, vistos como menos capazes (SCHWENK et al., 2010).
O suicídio é, sem dúvida, uma das situações mais dramáticas da psiquiatria e resultante
de alteração tanto no conteúdo do pensamento quanto na conduta do paciente. É, muitas
vezes, a maneira encontrada para o alívio do sofrimento, do sentimento de
desesperança, do desamparo, dos conflitos pessoais ou interpessoais e do estresse.
(VIANA et al., 2008). O suicídio encontrado entre médicos e estudantes de medicina
está relacionado, segundo WEKSTEIN (1979) citado por MELEIRO (1998), à perda de
oniotência, onisciência e virilidade idealizadas durante os estudos e durante a carreira
De acordo com MELEIRO (1998) o suicídio entre mulheres médicas é quatro vezes
maior em comparação aos homens. É relatado que mudanças de comportamento e até
mesmo avisos de idealização suicida ocorrem em cerca de 80% e aproximadamente
50% o fazem abertamente. SIMON (1971), realizando um estudo retrospectivo em 62
escolas médicas norte-americanas e três canadenses, concluiu que o suicídio é a segunda
causa de morte entre os estudantes de medicina, perdendo apenas para os acidentes. Os
dados encontrados com os alunos da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo aproximaram-se aos dos obtidos por Simon (MILLAN, 2008).
Ainda de segundo trabalhos de MILLAN et al. (2008) e também de DE MARCO et al.
(1992), alunos de medicina com melhor performance escolar encontram-se em um
grupo de alto risco de suicídio. Os referidos autores conjeturam que, por serem pessoas
mais exigentes, estariam mais propensas a sofrer as pressões impostas diante de
qualquer falha. O estudante passa a ter culpa pelo que não sabe e com isso se sente
paralisado pelo medo de errar. Esses quadros caracterizam-se por sentimentos de
desvalia e impotência, que, muitas vezes, são responsáveis por idéias de abandono do
curso, depressão e suicídio (MELEIRO, 1998).
Busca por auxílio
Para formar-se dentro das condições dadas atualmente no ensino médico, o estudante de
medicina deve buscar formas para superar ou pelo menos suportar as exigências e
demais estressores presentes em sua vida acadêmica, já que , de acordo com JUNG
(1975) “somente se o médico souber lidar com ele mesmo e com seus próprios
problemas ele será capaz de ensinar o paciente a fazer o mesmo”.
Frente às situações inóspitas do curso, os estudantes buscam diversas formas de suportálos. Uns recorrem aos serviços especializados, tanto de profissionais de saúde ou de
serviços ofertados por suas escolas (CUNHA et al., 2009) outros recorrem à
religiosidade ou a outras estratégias saudáveis como fortalecimento de laços afetivos e
práticas esportivas (ZONTA et al., 2006).
Algumas escolas de medicina possuem serviços de auxílio à saúde mental dos
acadêmicos a exemplo da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(FMUSP), que possui já grande experiência. Nesses serviços, dentre os principais
motivos de consulta predominam,transtornos de humor, principalmente os quadros
depressivos. Os episódios depressivos, seguidos pelos transtornos depressivos
recorrentes, transtornos distímicos e transtornos bipolar são as principais causas
(MILLAN et al., 2008).
A análise dos prontuários do período de 1997-2003 realizada por BELLODI (2007)
mostrou que a cada ano, 11% dos 600 alunos da Faculdade de Medicina da Santa Casa
de São Paulo têm procurado o serviço de apoio psicológico oferecido pelos
profissionais da instituição. A pesquisa mostrou predomínio no atendimento ao sexo
feminino e nos anos iniciais do curso. Dentre as razões pessoais pela procura por
psicoterapia destacam-se dificuldades no relacionamento amoroso e com a família. No
domínio profissional destacam-se a procura por problemas com colegas, principalmente
no sexo feminino, e dificuldade de concentração, no sexo masculino. Quadros
depressivos ligados a frustação do idealismo inicial, diminuição da qualidade de vida e
falta de tempo livre foi marcante entre as mulheres. Entre o sexo masculino as
principais queixas emocionais estão relacionadas a ansiedade gerada pela alta
competitividade e rivalidade, prejudicando a capacidade de priorizar atividades
realmente importantes para formação.
Assim sendo, muito embora algumas escolas de medicina tenham serviços de
auxilio à saúde mental dos acadêmicos (MILLAN et al., 2008) isso acaba não sendo
uma constante. E o número decai se considerarmos as que possuem uma estrutura
realmente adequada para acolher aos que as procuram. De acordo com informações
retiradas do site da internet da Universidade de São Paulo (http://www.fm.usp.br),
encontramos uma análise dos serviços e programas de suporte ao estudante. Foram
analisadas 23 universidades e sues programas e serviços oferecidos aos estudantes, e foi
concluído que a assistência psicológica ao aluno de Medicina no Brasil remonta à
década de cinquenta; que vários centros tentaram criar serviços com tal finalidade, mas
poucos conseguiram dar continuidade ao seu trabalho por um período longo, apesar de
haver consenso quanto à importância e necessidade dos serviços; que a escassez de
recursos materiais, a política institucional e a indefinição de um setting adequado
parecem ser as causas mais comuns que levam à extinção de serviços; que não há uma
uniformidade quanto aos objetivos, formas de abordagem e população alvo (a maior
parte atende alunos de diferentes áreas e alguns dedicam-se exclusivamente ao
estudante de Medicina); e finalmente, que a carência de bibliografia especializada em
nosso meio faz com que haja uma grande avidez dos colegas de diferentes instituições
para trocar experiências e informações.
Tendo em vista a situação de que nem sempre uma estrutura adequada existe
para acolher os acadêmicos necessitados, e considerando que estes por diversos
motivos, como até o preconceito pela psiquiatria (LYMAN, 1961) muitas vezes acabam
não buscando auxílio especializado, Infelizmente, uma parcela dos acadêmicos recorre a
práticas que, muito embora aliviem seu estresse momentaneamente, prejudicam sua
saúde de forma geral a longo prazo.
Dentre os psicoativos LEMOS et al. (2007), em estudo apresenta o álcool como droga
mais utilizada pelos estudantes de medicina, seguida pelo lança-perfume, tabaco e
maconha. Observa-se uso esporádico de todas as substâncias pesquisadas, com exceção
do álcool, que apresenta altas taxas de uso regular. Além disso, o estudo revelou que a
idade média para o uso de álcool pela primeira vez foi de 14,8 anos, mostrando que
grande parte dos estudantes teve com esta substancia antes de ingressar na universidade.
Foi observado um uso maior de tabaco, maconha e lança-perfume pelo genero
masculino e no uso de tranqüilizantes pelas mulheres. De acordo com estudos de
GABRIEL et al. (2005) 81% dos residentes e 84% dos estudantes com sintomas
depressivos avaliados e faziam uso regular de bebida alcoólica e ainda, 25% dos
residentes e 26% dos estudantes fumavam regularmente .
Considerações Finais
Os resultados encontrados pelos autores oferecem um panorama importante das
condições de saúde mental de estudantes de medicina, revelando a alta prevalência de
transtornos mentais comuns e identificando fatores associados a esses transtornos.
Estes resultados podem servir de estímulo para futuros estudos destinados a identificar
os efeitos de causalidade entre os fatores associados, e na reformulação não só dos
currículos atualmente em uso em nossas universidades, mas também no processo de
ensino e em métodos de aprendizagem, para garantir que a escola médica não exerça
qualquer efeito prejudicial à saúde mental dos futuros médicos.
Ressaltamos ainda a importância de oferecer serviços de apoio em saúde mental para
esses alunos, a exemplo de algumas insitutição supracitadas, evitando assim o
agravamento dos sintomas, reforçando mecanismos saudáveis, e aumentando a
capacidade de lidar com situação de doença mental. Também esperamos que nossos
resultados possam promover o estabelecimento de programas dedicados aos cuidados de
saúde de outros alunos que não alunos de medicina. A identificação precoce de sinais de
estresse, como sintomas depressivos, sintomas de ansiedade, uso de psicoativos e até
ideação suicida em programas de saúde é crucial para o fornecimento adequado de
apoio e tratamento, promovendo a melhoria da saúde mental dos estudantes, prevenindo
mortes por suicídio e aprimorando habilidades profissionais e sociais.
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