DANIEL MANZONI DE ALMEIDA Desenvolvimento e caracterização do modelo de infecção de leishmaniose mucocutânea no camundongo deficientes do receptor 1 do TNF- α e avaliação das lesões cutâneas crônicas nestes animais infectados com L. major após o tratamento com células mononucleares purificadas da medula óssea. Tese apresentada para o Programa de PósGraduação em Ciências Biológicas do Núcleo de Pesquisa em Ciências Biológicas da Universidade Federal de Ouro Preto para obtenção do título de Doutor em Ciências Biológicas (ênfase em Imunobiologia de Protozoários) Ouro Preto (MG), 2012 DANIEL MANZONI DE ALMEIDA Desenvolvimento e caracterização do modelo de infecção de leishmaniose mucocutânea no camundongo deficientes do receptor 1 do TNF- α e avaliação das lesões cutâneas crônicas nestes animais infectados com L. major após o tratamento com células mononucleares purificadas da medula óssea. Profa. Dra. Leda Quercia Vieira (Orientadora) Laboratório de Gnotobiologia e Imunologia – Depto de Bioquímica e Imunologia Universidade Federal de Minas Gerais Profa. Dra. Rosa Maria Esteves Arantes (Co-Orientadora) Laboratório de Neuro-Imuno-Patologia – Depto de Patologia Geral Universidade Federal de Minas Gerais Para minha família: Aos meus pais Iraídes e Marli de Almeida e meu irmão Vinícius pelo apoio, incentivo e amor incondicional. To Matthew DeCarlo, my husband, my partner for all the love, support and friendship AGRADECIMENTOS À minha orientadora Profa Dra Leda Quercia Vieira pela orientação, oportunidades, ensinamentos e amizade que irie levar por toda minha vida. Leda me aceitou em seu laboratório de forma absolutamente receptiva, apoiando e incentivando todas as minhas ideias, meus planos profissionais e pessoais. Sempre presente e de forma generosa contribuiu pela minha formação de um jeito singular. Muito obrigado por ter me proporcionado os quatro anos de maior aprendizado e um dos anos mais importantes da minha vida. Serei eternamente grato pela oportunidade. O profissional que sou hoje tem grande parte dos ensinamentos éticos, generosos e humanos que vejo e aprendi com você; À minha co-orientadora Profa Dra Rosa Maria Esteves Arantes pelos ensinamentos, paciência e exemplo de sabedoria. Rosa sempre demostrou presença na minha formação, abrigou a mim e os estudantes de iniciação científica que estavam no meu projeto por seis meses em seu laboratório. Uma ajuda que só me fez crescer mais. Terei sempre minha admiração pela pessoa e profissional, sensível e humana que Rosa é. Muito obrigado pela orientação que irei levar por toda minha vida; Ao Dr. Phillip Scott pela orientação de parte da minha tese nos EUA, paciência, bom humor e por ter me proporcionado aprender em seu laboratório; À Paula Melo Seixas, minha grande amiga, pela amizade, auxílio nos experimentos, companheirismo nos momentos mais difíceis, por me abrigar em sua casa por várias vezes, pela alegria de aprender em todos os momentos dessa tese; Ao Caio Cotta Natale, meu grande amigo, pela amizade, auxílio nos experimentos, sabedoria, alegria nos momentos não alegres, aprendizado em todos os momentos dessa tese; Ao Sérgio Alexandre Cruz pela paciência e discussões de clínica médica que sempre tivemos. Pelo incentivo e alegria de conviver durante esse projeto; À Luiza da Silva Miranda, pela oportunidade de aprender, auxílio nos experimentos de morfometria; À Júlia Assiat, pela oportunidade de aprender com seu conhecimento, cultura e alegria; À Nádia Maheso, pela oportunidade de aprender com seu conhecimento, cultura, alegria e espírito aventureiro; Ao Danilo Scherrer, meu grande amigo, pela amizade, conselhos, oportunidade de aprender e me orgulhar de suas vitórias; À Dra Claudia Zuleida Gonzales, pela amizade, ensinamentos, ajuda quando comecei a tese no Brasil e nos EUA, momentos de alegrias intensos. Tenho uma admiração imensa por você, mamita! Ao Prof Dr. Luís Carlos Crocco Afonso pela oportunidade de aprender em seu laboratório e sugestões sempre interessantes para o trabalho e crescimento profissional; À Pós-Graduação em Ciências Biológicas, por ter me recebido de “braços abertos” para essa empreitada. Muito obrigado pela oportunidade; À Cida Tropia, da secretaria do NUPEB, e a Universidade Federal de Ouro Preto por ter me recebido de forma tão carinhosa, sempre prestativa na secretária do NUPEB; Ao Mateus Kochem por toda a ajuda necessária na secretaria da pós-graduação; Aos meus amigos do LAGI, Paula Melo Seixas, Caio Cotta Natale, Luciana Brito, Matheus Heitor Carneiro, Louisa Andrade, Liliane Martins dos Santos, Waldionê de Castro, Magda Elane, Leonardo, Lara Ustch, Juan Macedo, Marcelo Silva, Eric Roma, Ana Clara Matoso, Yure, Warley Tavares, Ricardo Reis, Syed Hassan, Fernanda Ferraz, Carolina Oliveira, Antônio Paulino e Antônio Vaz por todos os momentos de discussão, aprendizado, sofrimento e alegria que passei com cada um de vocês. Vou leva-los eternamente no meu coração; Ao meu amigo Matheus Heitor Carneiro pela amizade, generosidade e ajuda técnica em muitos momentos; Aos colegas do Scott Lab Patrícia Petritus, Fernanda Novais, Venkata Yaramili, Cláudia Lombana, Érika Krosby; Ba Nyugume pelo aprendizado e um ano de muita alegria; Aos amigos do Laboratório de NeuroImunoPatologia pela oportunidade de aprender um pouco de patologia e por terem me recebido de forma tão paciente num período difícil de 6 meses; Aos amigos do Laboratório de Imuno Parasitologia do ICBE pelo aprendizado e por terem me recebido de forma tão carinhosa no período que estive em Ouro Preto; Aos amigos do laboratório do Prof. Dr. Renato França, em especial Samyra Nassif, pelo apoio e ajuda técnica em alguns experimentos de migração celular; Ao Prof Dr Ricardo Gonçalves pelos auxílios em citometria; Ao Prof. Dr. Alexandre Reis, Profa Dra Fabiana Simão Machado e Prof Dr André Talvani pela participação e sugestões valorosas na minha banca de qualificação; À Dra Dulciene Maria Magalhães de Queiroz pela oportunidade de aprendizado e colaboração em diversos projetos; Ao CNPq pela bolsa de doutorado no país e para o exterior; À Universidade da Pensilvânia e o NHI por 1 ano de convivência, aprendizado e financiamento de parte do meu projeto de doutorado nos EUA; Aos meus amigos e companheiros do curso de bases celulares de 2008; Aos professores, alunos e monitores das edições do UFMG & Escolas de 2008, 2009 e 2010; À Profa Dra Maria de Fátima Horta (Patiu) e os estudantes da turma de Farmácia do segundo semestre de 2008 pelo aprendizado no estágio de docência; À minha amiga Dra Eliana Bline Marengo pelo incentivo, amizade, leituras, conselhos e presença em todos os momentos de nossa tão valiosa amizade; Ao meu grande amigo Fabrício Freire Melo por toda amizade incondicional, incentivo e companheirismo em todos os momentos. Abriu meus caminhos quando eu achei que nada mais iria dar certo. Muito obrigado. Sem sua participação nessa história eu não teria tido coragem de começar; À minha família, meu pai Iraídes de Almeida, minha mãe Marli Manzoni de Almeida, meu irmão Vinícius Manzoni de Almeida e minha cunhada Gabriela Rosa por todo apoio incondicional. Amo vocês! Ao meu marido e companheiro Matthew DeCarlo pela cumplicidade, amor, paciência e dedicação; A todos aqueles de forma direta ou indireta participaram desse trabalho e para minha formação, meu muito obrigado! “Apesar das ruínas e da morte, onde sempre acabou cada ilusão, a força dos meus sonhos é tão forte, que tudo renasce a exaltação e nunca as minhas mãos ficam vazias” (Sophia de Mello Breyner Andresen) “Todo conhecimento começa num sentimento” (Leonardo da Vinci) RESUMO A leishmaniose é causada por parasitas do gênero Leishmania. A forma mucocutânea da leishmaniose apresenta lesões crônicas com baixo número de parasitas no local da infecção causando uma resposta inflamatória exagerada. Camundongos TNFR1 KO, quando infectados com L. major, conseguem controlar o crescimento do parasita no local da infecção, porém mantém um intenso infiltrado inflamatório quando comparados aos animais selvagens. O objetivo desse estudo foi a caracterização das lesões cutâneas crônicas desenvolvidas nos animais TNFR1 KO infectados por L. major e a análise do efeito da terapia celular nessas lesões. Os camundongos selvagens e TNFR1 KO foram inoculados na pata com L. major e foram acompanhados por 15 semanas de infecção para análise do perfil da imunopatologia desenvolvida. Os resultados mostraram que as lesões crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major apresentaram níveis elevados de citocinas pró-inflamatórias (IFN-γ, TNF-α e IL-17) e das quimiocinas CCL2 e CCL5 quando comparados aos animais selvagens. A persistência dessas lesões em camundongos TNFR1 KO é devida a um infiltrado inflamatório intenso e persistente, rico de células Ly6G+ e TCD8+ no local da infecção. Para testar a terapia celular, os camundongos TNFR1 KO foram tratados na fase crônica (15 semanas após a infecção) com três preparados de células mononucleares purificadas da medula óssea, semanalmente, por via endovenosa e as análises realizadas um e dois meses após o tratamento. O tratamento com células mononucleares derivadas da medula óssea mostrou eficácia no controle das lesões crônicas dos camundongos TNFR1 KO. Após sete dias da transferência, as células transferidas foram localizadas nas lesões diferenciadas em células CD11c+ e MHCII+; Após um e dois meses dos tratamentos, as lesões reduzidas apresentaram aumento da expressão de IL-10 e diminuição da expressão de IL-17; as análises histológicas mostraram porcentagens reduzidas de células polimorfonucleares nas lesões dos animais tratados com as células quando comparados aos animais tratados com veículo. Esses resultados mostraram que as células mononucleares purificadas da medula óssea promovem o controle das lesões crônicas desenvolvidas em camundongos TNFR1 KO infectados. Palavras-chaves: leishmaniose; TNFR1; Leishmania major; terapia celular; leishmaniose muco-cutânea ABSTRACT Leishmaniasis is caused by parasites of the genus Leishmania. The mucocutaneous form is characterized by a low number of parasites at the site of infection and chronic lesions caused by an exacerbated inflammatory response. We showed that TNFR1 KO mice, when infected with L. major, control parasite growth at the site of infection, but maintain an intense inflammatory infiltrate and develop chronic lesions when compared to wildtype mice (WT). The aim of this study was the characterization of inflammatory profile in chronic infection in L. major-infected TNFR1 KO mice and analysis of the effect of cell therapy in these chronic lesions. WT and TNFR1 KO mice were inoculated in the foot-pad with L. major and were followed for 15 weeks of infection for analysis of the immunopathology profile. Our results showed that chronic lesions from L. majorinfected-TNFR1 KO presented high levels of pro-inflammatory cytokines (IFN-, TNFα and IL-17) and chemokines (CCL2 and CCL5) when compared with WT animals. Persistence of these lesions in TNFR1 KO mice is due to intense inflammatory infiltrate with increase percentage of Ly6G+and TCD8+ cells at site of infection compared to WT mice. Treatment with mononuclear cells derived from bone marrow caused lesions repair. TNFR1 KO mice, in the chronic phase of infection, were treated with of purified mononuclear cells from bone marrow and analyses were performed 1 and 2 months after the treatment. After the treatment, donor-cells were located at the site of infection and differentiated in CD11c+ e MHCII+ profile 7 days after the transfer; these lesions showed significantly smaller showing evidence of healing; increased expression of IL10 and decreased expression of IL-17; and decreased number of polymorph nuclear cells was found in the lesions when compared to animals treated with PBS. These results showed that mononuclear cells derived from bone-marrow are effective for the treatment for control of chronic lesion in L.major-infected TNFR1 KO mice. Keywords: leishmaniasis; TNFR1; Leishmania major; cell therapy; muco-cutaneous leishmaniasis LISTA DE GRÁFICOS E FIGURAS Figura 1: Curva de infecção e parasitismo nos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major.......................................................................................................... 38 Figuras 2: Análises histopatológicas das lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major ................................................................... 39 Figura 3: Análise da expressão de IFN-γ, TNF-α, IL-17 e IL-10 nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major ......................... 41 Figura 4: Análise da expressão de FoxP3 nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major............................................. 42 Figura 5: Análise da expressão de CCL2 e CCL5 nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major ............................................. 44 Figura 6: Análise do infiltrado inflamatório nas lesões crônicas nos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados com L. major .................................................................. 46 Figura 7: Análise do infiltrado inflamatório de células dendríticas nas lesões crônicas nos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados com L. major...................................... 47 Figura 8: Efeito dos tratamentos com células da medula óssea nas lesões crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados com L. major ............................................ 49 Figura 9: Análise da expressão de IFN-γ e TNF-α nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea ......................................................................................................................... 51 Figura 10: Análise da expressão de IL-10 e TGF-β nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea. ........................................................................................................................ 52 Figura 11: Análise da expressão de IL-17 e FoxP3 nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea ......................................................................................................................... 53 Figura 12: Análise da expressão de arginase I e iNOS nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea ......................................................................................................................... 54 Figura 13: Análise da produção de IL-10 e IFN-γ por células órgãos linfoides secundários dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea. ...................................................................................... 56 Figura 14: Análise da carga de parasitas nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados com L. major e após o tratamento com células purificadas da medula óssea ......................................................................................................................... 58 Figura 15: Análise da migração das células purificadas da medula óssea de camundongos TNFR1 KOGFP+ para as lesões cutâneas crônicas de camundongos TNFR1 KO infectados por L. major ................................................................................................... 60 Figuras 16: Análises histopatológicas das lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea ....... 62 Figura 17: Tratamento de camundongos selvagens, infectados com L. major, com células purificadas da medula óssea ....................................................................................... 64 Figura 18: Modelo para análise da diferenciação de células purificadas da medula óssea em células dendríticas in vivo ................................................................................................ 66 Figura 19: Análise da participação do TNFR1 na diferenciação de células purificadas da medula óssea em células dendríticas in situ............................................................................ 67 Figura 20: Análise das células produtoras de citocinas no local de infeção de camundongos TNFR1 KO infectados com L. major e tratados com células purificadas da medula óssea ......................................................................................................................... 69 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Lista de camundongos utilizados no estudo ........................................................... 24 Tabela 2: Características comuns descritas entre as lesões cutâneas de pacientes com leishmaniose mucocutânea e as lesões crônicas desenvolvidas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major .................................................................................................. 79 LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS BSA: Soro albumina bovina C: Graus Celsius CCL#: Ligantes de receptores de quimiocinas CC CCR#: Receptor de quimiocinas CC CD: Cluster of differentiation cDNA: DNA complementar CO2: Gás carbônico CR: Receptor do complemento CXCL#: Ligantes de receptores de quimiocinas CXC DEPC: Dietilpirocarbonato dNTP: Desoxinucleotídeos DMEM: Dulbecco’s Modified Eagle’s Medium DMSO: Dimetilsulfóxido DTT: Ditiotreitol EDTA: Ácido etileno-diamino-tetra-acético ELISA: Ensaio imunoenzimático (Enzyme-Linked ImmunoSorbent Assay) g: Gravidade g: Grama HETAB: Brometo de hexadeciltrimetilamônio H2O2: Peróxido de hidrogênio HPRT: Hipoxantina fosforibosil transferase H2SO4: Ácido sulfúrico IFN: Interferon Ig: Imunoglobulina IL-#: Interleucina iNOS: Óxido nítrico sintase indutível L: Litro m: Metro M: Molar MHC: Complexo de histocompatibilidade principal MMP: Metaloproteinase da matriz extracelular mRNA: Ácido ribonucléico mensageiro NaCl: Cloreto de sódio NaHCO3: Bicarbonato de sódio Na3PO4: Fosfato de sódio NAG: N-acetilglicosaminidase NK: Células exterminadoras naturais NO: Óxido nítrico OD: Densidade óptica OPD: o-fenileno-diamina PBS: Salina tamponada com fosfato 0,1 M, pH 7,3 (Phosphate Buffered Saline) PCR: Reação em cadeia da polimerase (Polimerase Chain Reaction) PGE2: Prostaglandina E2 RT: Transcriptase reversa SBF: Soro bovino fetal SSA: Solução saturada de sulfato de amônia TGF: Fator de crescimento transformante Th#: Células T auxiliares do tipo # TMB: Tetrametilbenzina TNF: Fator de necrose tumoral TNFR: receptor do TNF-α U: Unidades SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 1 OBJETIVOS ................................................................................................................... 19 MATERIAL E MÉTODOS ............................................................................................ 22 RESULTADOS ............................................................................................................... 35 DISCUSSÃO ................................................................................................................... 70 CONCLUSÕES ............................................................................................................... 92 REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 94 ANEXOS ................................................................................................................. 117 INTRODUÇÃO 1 1. INTRODUÇÃO 1.1 A Leishmaniose: formas clínicas e tratamentos farmacológicos Leishmaniose é a denominação dada para doenças provocadas pela infecção por protozoários do gênero Leishmania que, dependendo da espécie, podem produzir vários tipos de manifestações clínicas (locais e sistêmicas), sendo um problema importante de saúde pública mundial, principalmente nos países em desenvolvimento, como por exemplo, o Brasil. São doenças endêmicas das regiões tropicais e subtropicais, abrangendo áreas de florestas úmidas nas Américas aos desertos no oeste da Ásia, estando presente em áreas rurais e urbanas (Herwaldt, 1999). O número de casos em todo mundo é de aproximadamente 12 milhões e há estimativas do surgimento de 400.000 novos casos anuais dessa doença. Segundo a Organização Mundial de Saúde, cerca de 350 milhões de pessoas estão ameaçadas de contrair a doença em 88 países (Organização Mundial de Saúde). Desde 1993, a Organização Mundial de Saúde considera a Leishmaniose como a segunda doença de importância pública causada por protozoários, depois da malária (Desjeux, 2004a; Desjeux, 2004b; Reithinger e cols., 2007). Há duas principais formas das manifestações clínicas da leishmaniose: a tegumentar e a visceral. A forma visceral pode ser causada pela infecção pelas espécies L. donovani e L. infantum no Velho Mundo e L. chagasi no Novo Mundo e é caracterizada por febre, hepatoesplenomegalia, linfodenopatia, hipergamaglobulina, emagrecimento, edema e estado de debilidade progressiva podendo levar a caquexia e ao óbito (Lainson, 1983; Lainson e cols., 1987; Herwaldt, 1999; Silveira e cols., 2004). A forma cutânea pode ser causada pela infecção das espécies de parasitas L. major e L. tropica descrita em casos no Velho Mundo; e L. amazonensis, L. pifanoi, L. panamensis, L. braziliensis, L. guyanensis, L. laisoni e L. mexicana nos casos do Novo Mundo. A leishmaniose tegumentar é uma manifestação multifacetada que pode atingir a pele e em alguns casos as mucosas, podendo assim, ser denominadas clinicamente como forma 2 cutânea e mucocutânea, respectivamente. A leishmaniose cutânea é caracterizada pela formação de úlceras únicas ou múltiplas. O espectro de suas manifestações inclui lesões localizadas e bem delimitadas que são resolvidas, em indivíduos que desenvolvem uma resposta imune protetora mediada por células (Lainson, 1983; Lainson e cols., 1987; Weigle & Saraiva, 1996; Desjeux, 2004a; Silveira e cols., 2004; Silveira e cols., 2005). No Brasil, a leishmaniose mucocutânea é manifestada em cerca de 3% dos pacientes e é principalmente causada pela L. braziliensis, do complexo “braziliensis” (Jones e cols., 1987; Barral-Netto e cols., 1995; Marsden, 1994). A leishmaniose mucocutânea é caracterizada por lesões destrutivas e crônicas que acometem regiões de mucosa nasal e cartilagens das regiões adjacentes, meses ou anos após uma lesão cutânea preliminar causando mutilações e morbidade nos indivíduos afetados (Marsden, 1986; Castes e cols., 1993). Há pouco entendimento dos mecanismos imunopatológicos que envolvem o aparecimento da forma clínica mucocutânea. Os estudos efetuados até o presente momento são concebidos e foram analisados em amostras de lesões e sangue de humanos infectados ou em infecções experimentais de cobaias para mimetizar essa forma de leishmaniose, pois não há modelo murino para esta forma da doença. As hipóteses mais discutidas sobre as possíveis causas do acometimento das mucosas compreendem: 1) a resposta imune exacerbada devido à resistência de alguns parasitas à eliminação (como por exemplo, a resistência dos parasitas ao estresse oxidativo e assim promovendo a metástase do mesmo pelo organismo) (Acestor e cols., 2006); 2) a persistência de antígenos que provocam reações de hipersensibilidade ou fenômenos de auto-imunidade relacionados às reações cruzadas entre parasitas e tecidos do hospedeiro (Alcover e cols., 1984); e 3) os fenômenos inflamatórios exacerbados não seriam regulados negativamente pelo hospedeiro, devido a falhas nesses mecanismos. A hipótese da resposta imune exacerbada é apoiada por estudos realizados com células obtidas do sangue e amostras de lesões de pacientes acometidos da forma mucocutânea. 3 Os resultados obtidos de células do sangue dos pacientes que desenvolveram a forma mucocutânea mostraram que há predomínio de uma reposta imune inflamatória do tipo Th1 (altos níveis de IFN-γ e TNF-α) quando comparados aos pacientes com a forma cutânea (Faria e cols., 2005). Outro fato interessante mostra que no soro dos pacientes com forma mucosa há maiores concentrações de TNF-α que no soro dos pacientes com a forma cutânea (Da-Cruz e cols., 1996; Gaze e cols., 2006), sugerindo a participação do TNF-α na cronicidade da doença e destruição tecidual. Análises de células do sangue periférico mostraram que pacientes acometidos pela forma mucocutânea produziam níveis semelhantes de TNF-α e IL-10 aos produzidos por pacientes acometidos pela forma cutânea Quando se compararam lesões de pacientes com leishmaniose mucocutânea com as de pacientes com leishmaniose cutânea, notou-se que nos dois grupos havia expressão similar de IL-10 e TNF-. Entretanto, nas lesões mucosas encontrou-se uma expressão menor de receptores para a citocina reguladora IL-10, sugerindo que o dano tecidual era causado pela falta de resposta a IL-10 (Faria e cols., 2005). Nas lesões dos pacientes com a forma mucocutânea há um predomínio de expressão para citocinas da resposta Th1 (IFN-γ e TNF-α) exacerbada, como descrito para células mononucleares. Há uma maior expressão de IL-17 nas lesões obtidas de pacientes que sofriam da forma mucocutânea que na pele de indivíduos sadios. Quando compararam-se lesões mucocutâneas com as cutâneas, encontraram-se maior número de células T CD4+, T CD8+ e neutrófilos nas lesões mucocutâneas (Amato e cols., 2003; Antonelli e cols., 2004; Silveira e cols., 2004; Amato e cols., 2008; Bacellar e cols., 2009; Boaventura e cols., 2010). Esse conjunto de dados obtidos de pacientes mostra que as lesões crônicas dos pacientes com a forma mucocutânea apresentam uma inflamação exacerbada não controlada. Dessa forma, pode-se sugerir a utilização de novas estratégias para o tratamento desta forma clínica da doença, como inibidores da resposta imune celular ou anti-inflamatórios em associação. 4 O tratamento da leishmaniose é feito à base de diversos fármacos descobertos ao longo do século XX. Entretanto, ainda há uma carência de um tratamento mais específico e eficaz que possa acarretar menos efeitos colaterais nos indivíduos. Os medicamentos disponíveis atualmente no mercado são: Glucantine ® (antimoniato de metilglucamina), Lomidina® (pentamidina), Gabbrox® (sulfato de paramomicina), Anfotericina B ou AmBisomeTM (sua forma capsulada) o Impavido ® (miltefosina) (Croft & Olliaro, 2011). No Brasil, o medicamento utilizado como primeira escolha na terapêutica da leishmaniose é o antimoniato de metilglucamina (Frezard e cols., 2009). Esse fármaco é eficaz no tratamento da leishmaniose cutânea, mucocutânea e visceral (Michel & Vacheron, 1964; Koerber e cols., 1978; Aram & El-on, 1986; Ait-Oudhia e cols., 2011a; Ait-Oudhia e cols., 2011b; Pourmahammadi e cols., 2011). O efeito na leishmaniose provocado pelo medicamento é a rápida regressão das manifestações clínicas e hematológicas da doença. Entretanto, devido às baixas dosagens e tratamentos descontínuos, podem ocorrer falhas na terapia e como consequência o aumento das formas resistente dos parasitas. Há relatos que em determinados casos, além de matar o parasita, o medicamento acaba por levar o paciente ao óbito (Frezard e cols., 2009; Sundar & Chakrarty, 2010). Além dos antimoniais, outras drogas têm sido empregadas no tratamento das diversas formas da leishmaniose nos países endêmicos da doença, entre as quais se destacam a pentamidina, anfotericina B, paramomicina e o miltefosina. A pentamidina é particularmente útil em casos que não respondem ao antimonial ou para pacientes com calazar, a leishmaniose visceral, que sejam hipersensíveis ao antimônio. A alta toxicidade dessa droga também é fator limitante para o uso. Hipoglicemia, hipotensão, alterações cardiológicas, nefrotoxidade e até mesmo morte repentina já foram descritas após o uso do medicamento. A anfotericina B é um antibiótico antifúngico derivado de uma cepa de Streptomyces nodosus, sendo indicada para o tratamento da leishmaniose mucocutânea, embora não seja considerado fármaco de primeira escolha no tratamento. Outro fármaco utilizado com eficiência é a paramomicina (também chamada de aminosidine). É um antibiótico aminoglicosídeo que é ativo contra espécies de leishmanias in vitro e in vivo. Estudo clínico para se testar a eficácia da paramomicina injetável contra a leishmaniose visceral foram realizados na 5 Índia, onde o tratamento antimonial padrão não é muito efetivo e as taxas de mortalidade por leishmaniose são altas. Os resultados mostraram eficácia similar à anfotericina B. Atualmente, todos os medicamentos disponíveis para o tratamento da leishmaniose são injetáveis. Foi verificado que a miltefosina, uma droga anti-câncer alquilfosfolipídica, é ativa contra Leishmania spp in vitro e in vivo e pode vir a ser o primeiro tratamento oral para a leishmaniose visceral (Croft & Olliaro, 2011). Resultados de estudos de fase II, na Índia, indicam que quando a miltefosina é administrada por via oral é bem tolerada. Em todas as doses testadas, a droga produziu excelentes resultados de cura parasitológica (contra L. donovani). Estudos clínicos foram planejados e conduzidos contra leishmaniose visceral na Índia e formas cutâneas na Índia e no Brasil (Soto e cols., 2007; Dorlo e cols., 2008; Chrusciak-Talhari e cols., 2011; Madke e cols., 2011) mostrando eficácia. 1.2 Modelos em camundongos: susceptibilidade e resistência à infecção por L. major Os modelos murinos têm sido de extrema utilidade para testar hipóteses sobre a leishmaniose em humanos. A grande maioria do conhecimento sobre a imunidade à leishmaniose cutânea vem dos estudos realizados em camundongos isogênicos e nocautes de moléculas de importância na resposta imune, infectados com L. major. Nas linhagens isogênicas, é estabelecido que camundongos BALB/c são susceptíveis à infecção com L. major, desenvolvendo lesões cutâneas progressivas, crescimento descontrolado do parasita com consequente visceralização e morte do animal. Algumas outras linhagens de camundongos isogênicos, como por exemplo, C3H/HeJ e C57BL/6, são ditas resistentes à infecção por L. major, uma vez que são capazes de controlar a lesão causada após a infecção. Estes camundongos apresentam uma pequena lesão que é geralmente limitada ao local da infecção e que se cura espontaneamente. Entretanto, apesar da aparente cura da doença, o parasita permanece no hospedeiro e novas lesões podem aparecer se o camundongo for imuno-suprimido (Sacks & Noben-Trauth, 2002). O fenômeno de resistência e susceptibilidade à infecção por L. major no modelo murino 6 pode ser dependente de inúmeros fatores como, por exemplo, a dose de parasitas inoculados no animal (alta ou baixa dose de parasitas), fatores genéticos do camundongo e a resposta imune desenvolvida e predominante frente aos parasitas e espécies dos parasitas. Sobre a resposta imune mediando a resistência e a susceptibilidade à infecção por L. major, em meados da década de 80 do século XX foi estabelecido o paradigma da dicotomia da resposta imune mediada por células T CD4+ em células T helper 1 (Th1) e células T helper 2 (Th2) (Coffman e cols., 1991). Basicamente, o paradigma da polarização de células T CD4+ em perfis Th1 ou Th2 é identificado pela produção de um perfil de citocinas característicos durante a infecção. Sendo assim, os camundongos C57BL/6 infectados com L. major desenvolvem uma resposta predominantemente Th1 com a produção de IL-12, IFN-γ, TNF-α, produção de IgG2a e ativação de macrófagos com eliminação dos parasitas possibilitando assim uma lesão auto-limitante. Por outro lado, camundongos BALB/c tendem a desenvolver uma reposta do tipo Th2, caracterizada pela produção de IL-4, IL-5, IL-13 e produção de IgG1 (Sacks & NobenTrauth, 2002). Entretanto, atualmente, outros estudos mostram que a indução do fenômeno de resistência e susceptibilidade à infecção por L. major envolvem outros fatores como a cepa de L. major utilizada na infecção, ativação de populações de células T regulatórias, produção de IL-10 e uso da via da arginase em detrimento da óxido nítrico sintase (iNOS) no metabolismo da arginina e participação de IL-17 na resistência à infecção (Belkaid e cols., 2001; Lopez e cols., 2009). Os macrófagos desempenham um papel importante no curso da infecção causada por Leishmania. Eles servem como células hospedeiras para o parasita e como células apresentadoras de antígeno, que modulam a resposta imune celular específica (Halliwell e cols., 1992). Além disso, esta célula possui vários mecanismos microbicidas incluindo as espécies reativas do oxigênio (O2-, H2O2, OH), o pH ácido nos lisossomas, as enzimas lisossômicas (fosfatase ácida, -glicuronidase, catepsina D) (Cohn, 1978; Karnovsky & Lazdins, 1978) e óxido nítrico (NO) (Nathan e cols., 1984; Belosevic e cols., 1988). Mais recentemente, outro mecanismo de resistência a parasitas 7 intracelulares, dependente de IFN-, mediado por guanosina tri-fosfatases foi descrito (Macmicking e cols., 2003). A ativação de macrófagos por citocinas e agentes próinflamatórios exacerba esses mecanismos microbicidas e promove a eliminação de parasitas intracelulares. Embora o óxido nítrico seja o fator leishmanicida mais aceito (Belosevic e cols., 1988; Green e cols., 1990a; Cunha e cols., 1993) reativos de oxigênio também parecem ser importantes na resistência sistêmica a Leishmania (Linares e cols., 2001; Blos e cols., 2003). As células dendríticas também desempenham um papel importante no curso da infecção causada por L. major. Elas servem como células apresentadoras de antígeno que,assim como os macrófagos podem modular a resposta imune. A infecção por Leishmania é iniciada pela entrada de parasitas na pele. Estudos realizados em camundongos infectados por L. major mostraram que vários subtipos de células dendríticas estão envolvidos na infecção (Soong, 2008). Células dendríticas plasmocitóides, subtipos de células dendríticas residente da pele, participam da resposta imune inicial à infecção por L. major. Essas células não respondem à infecção depois da fagocitose ou endocitose dos parasitas, porém podem ser ativadas pelo reconhecimento do DNA genômico dos parasitas e podem produzir IFN-α/β e IL-12 de maneira dependente de TLR-9 (Schleicher e cols., 2009; Bajénoff e cols., 2006; Soong, 2008). Entretanto, a resposta imune celular na infecção experimental por L. major pode ser orquestrada por outros tipos de células dendríticas. Acredita-se que parasitas e antígenos dos parasitas são transportados a partir do local de infecção para os linfonodos drenantes por células dendríticas CD11c+ e CD8α+. Estas células migram para o local de infecção ao invés provenientes da medula óssea (Leon e cols., 2007). Estas células da medula óssea foram responsáveis pela indução de resposta Th1, com produção de IFN-γ, em linfonodos drenantes nos animais C57BL/6 (Leon e cols., 2007). Coletivamente, estes estudos in vivo sugerem a dinâmica da rede de células dendríticas durante a infecção e a importância de células dendríticas derivadas de monócitos (CD86 high, CD40high, CCR7+ e IL-12+) para ativação de células natural killer (NK) e na geração de respostas Th1 de proteção a infecção por L. major (Soong, 2008). 8 As citocinas IL-12 e IFN-γ são críticas para o desenvolvimento da resistência à infecção por L. major (Heinzel e cols., 1993; Sypek e cols., 1993; Afonso e cols., 1994; Heinzel e cols., 1994). Essas citocinas são importantes na diferenciação de células T CD4+ em células Th1, efetoras contra parasitas intracelulares na ativação de macrófagos. A citocina mais importante para a polarização de células T CD4+ em Th1 é a IL-12 (Hsied e cols., 1993; Heinzel, 1994; Heinzel e cols., 1995a; Heinzel e cols., 1995b; Mattner e cols., 1996). Estudos mostraram que camundongos BALB/c quando tratados com IL-12 exógena durante a primeira semana de infecção com L. major apresentaram o desenvolvimento de uma resposta mediada por células CD4 + do tipo Th1 associada ao controle das lesões (Heinzel e cols.,1993; Sypek e cols., 1993). Outros dados mostram que a neutralização da IL-12 em camundongos resistentes à L. major ou a utilização de animais nocautes para IL-12 geraram um fenótipo de suscetibilidade com desenvolvimento de lesões progressivas (Heinzel e cols., 1993a; Mattner e cols., 1996). A IL-12 promove a produção de IFN-γ por células T CD4+ (Wakil e cols., 1998), T CD8+ (Scharton-Kersten e cols., 1995; Satoskar e cols., 1999) e NK (Scharton-Kersten e cols., 1995). Sua participação na eliminação do parasita e recrutamento celular foi demonstrada em vários estudos. A administração de anticorpos anti-IFN- em linhagens resistentes nos dois primeiros dias de infecção fez com que estes camundongos fossem incapazes de controlar a lesão e levou ao desenvolvimento de uma resposta Th2 (Belosevic e cols., 1989; Scott, 1991; Mattner e cols., 1996; Launois e cols., 2002). Resultados semelhantes foram obtidos quando camundongos de fundo genético resistente, mas deficientes de IFN- ou receptor para IFN- foram incapazes de controlar o crescimento do parasita (Wang e cols., 1994; Swihart e cols., 1995; Wakil e cols., 1998). Estes dados sugerem uma função do IFN- na inibição do desenvolvimento de uma resposta Th2. A ativação de macrófagos para eliminação do parasita por IFN- é o principal mecanismo efetor anti-Leishmania. Esta citocina aumenta a síntese da enzima iNOS, levando à produção, a partir de L-arginina, de óxido nítrico, que por sua vez pode gerar radicais reativos de nitrogênio ainda mais tóxicos para o parasita (Green e cols., 1990; Assrey e cols., 1994; Sacks & Noben-Trauth, 2002). A ativação de macrófagos por IFN- pode ser regulada por outras citocinas produzidas pelas células 9 Th2 ou células T regulatórias (Treg) tais como IL-4 (Liew e cols., 1989), IL-10 (Mosmann, 1994; Belkaid e cols., 2001) e TGF-β (Bogdan & Rollinghoff, 1999). Outra citocina importante descrita na infecção experimental por L. major é a IL17. A IL-17 promove a migração de células polimorfonucleares, como os neutrófilos, com função de eliminação de parasitas extracelulares (Gaffen, 2011). Os neutrófilos são células importantes na fase inicial da infecção por L. major. Estas células fagocitam os parasitas e os eliminam (Peters e cols., 2008). Entretanto, alguns autores acreditam que a permanência de L. major no interior de neutrófilos e, como consequência, a fagocitose desses neutrófilos apoptóticos por macrófagos seja uma forma de entrada “silenciosa” de parasitas na célula hospedeira (Laufs e cols., 2002; Laskay e cols., 2003; Ribeiro e cols., 2004). De outra forma, foi mostrado que camundongos BALB/c nocautes para IL-17 apresentam menor número de neutrófilos nas lesões, correlacionando com menores lesões nesses animais (Lopez e cols., 2009). A susceptibilidade à infecção por L. major, por outro lado, é mediada por IL-4, produzida por células T CD4+ ou células B, que são incapazes de induzir uma ativação efetiva em macrófagos para a eliminação dos parasitas intracelular (Sacks & NobenTrauth, 2002; Ronet e cols., 2010; Nakaya e cols., 2011). Um mecanismo sugerido responsável pelo perfil de suscetibilidade seria a inibição da produção de IL-12 pela IL4. Alguns trabalhos mostram que a IL-4 produzida logo após a infecção por L. major inibe a expressão do receptor de IL-12 pelas células T CD4+ (Launois e cols., 1995; Mattner e cols., 1996). Desta forma, estas células não respondem à IL-12 e portanto não se diferenciam no sub-tipo Th1. Além disso, a IL-4 é a principal citocina que promove a diferenciação de células T CD4+ no sub-tipo Th2 (Chatelain e cols., 1992; Launois e cols., 1997). A IL-10 medeia à ativação alternativa de macrófagos e consequente sobrevivência e replicação do parasita intracelular (Scharton-Kersten e Scott, 1995; Vouldoukis e cols., 1997; Belkaid e cols., 2001; Viana Da e cols., 2002; Noben-Trauth e cols., 2003) mostrando que a participação da IL-10 na infecção cutânea por L. major é importante para a regulação da inflamação cutânea. Entretanto, a presença de IL-10 10 permite a manutenção do parasita no tecido. Podemos dizer que, uma vez estabelecida à infecção, o sistema imune do hospedeiro inicia processos regulatórios que diminuem a lesão tecidual, mas, ao mesmo tempo, permitem a permanência do parasita no hospedeiro. Para estudos da leishmaniose de mucosas não há modelo murino experimental. Barral e colaboradores (1983), fazendo cruzamentos entre camundongos C57BL/6 e BALB/c, fizeram a primeira tentativa de desenvolver um modelo de leishmaniose mucocutânea murino. Nesse estudo foram observados a visceralização de parasitas, o aparecimento e o desenvolvimento de lesões em regiões nasais dos camundongos após 25 semanas de infecção por L. major. Entretanto, os parasitas no local da lesão não foram eliminados e outras determinações para caracterizar esse modelo não foram realizadas. Desde então não houve outros relatados na literatura que avaliassem o desenvolvimento de lesões em mucosas de camundongos infectados por espécies de Leishmania. Entretanto, as várias linhagens de camundongos experimentais são capazes de desenvolver lesões crônicas, delimitadas e que apresentam algumas características moleculares similares às encontradas em humanos que apresentam as lesões em mucosas. Por exemplo, camundongos C57BL/6 infectados com L. amazonensis não controlam a lesão, como na infecção por L. major, e desenvolvem lesões crônicas que permanecem até 20 semanas de infecção, pelo menos, mostrando um primeiro modelo de lesão crônica pela infecção por esse parasita. Porém, neste modelo o parasitismo não é contido (Afonso & Scott, 1993). De outra forma, camundongos C57BL/6 e BALB/c infectados com cepas de L. braziliensis não apresentam lesões progressivas e descontroladas, ao contrário, apresentam a capacidade de eliminar e curar os parasitas nas lesões, lesões autolimitadas e resposta pro-inflamatória como os animais resistentes a infecção por L. major (De Souza-Neto e cols., 2004; De Moura e cols., 2005). Por outro lado, as lesões causadas pela infecção com L. major em camundongos C57BL/6 nocautes para o gene do receptor 1 do TNF-α que foi deletado por recombinação homóloga (TNFRp55-/- ou TNFR1 KO) guardam algumas semelhanças com aquelas de pacientes com este tipo de forma clínica da doença. Vieira e colaboradores (1996) descreveram, pela primeira vez, que camundongos TNFR1 KO infectados com L. major 11 desenvolvem uma lesão não cicatrizante, não progressiva e que também não é autolimitante, como encontrada em camundongos C57BL/6. Interessantemente, esses animais, após a 11ª semana de infecção, controlam o parasitismo de forma semelhante aos camundongos selvagens. Entretanto, as lesões permanecem pelo menos até 20 semanas de infecção. Nashleanas & Scott (2000) mostraram que macrófagos derivados desses camundongos são incapazes de produzir NO e controlar o parasitismo após o estímulo com IFN-γ in vitro. Entretanto, in vivo, esses animais conseguem produzir uma resposta Th1, expressar iNOS no sítio da infecção e controlar a replicação de L. major, sugerindo que células T podem ativar os macrófagos desses animais. Estes macrófagos produzem NO por uma via independente de TNF-α, como por exemplo, por meio da ativação do receptor CD40 pelo seu ligante (Nashleanas & Scott, 2000). Nesses animais infectados, mesmo após a eliminação dos parasitas, o infiltrado inflamatório permanece até pelo menos 25 semanas. Os resultados do nosso laboratório mostram que essas lesões são caracterizadas por um infiltrado rico em células mononucleares e neutrófilos que permanecem no local da infecção, ao contrário do que ocorre nos camundongos selvagens que além de controlar o parasitismo, controlam o infiltrado inflamatório (Vieira e cols., 1996). Além disto, as células do baço e linfonodos dos camundongos TNFR1 KO apresentam alta produção de IFN- e TNF no local da infecção. Outras características da infecção por L. major em camundongos TNFR1 KO foram determinadas. Há maior produção de quimiocinas CCL5 e CCL2 nas lesões destes camundongos que em camundongos selvagens tardiamente na infecção, o que sugere um afluxo de células constante e manutenção das mesmas no local da lesão (Oliveira e cols., 2012). O TNF-α é uma citocina que exerce várias atividades biológicas, como por exemplo, a apoptose celular mediada pelo receptor 1 em vários tipos celulares (Zhao e cols., 2000). Na infecção por L. major a eliminação de linfócitos da lesão inflamatória é um componente crítico na resolução da doença uma vez que o patógeno foi eliminado da lesão (Kanaly e cols., 1999). Nosso grupo mostrou deficiência na apoptose em camundongos TNFR1 KO quando comparados aos camundongos selvagens, em fase 12 tardia da infecção quando o controle do parasitismo foi obtido, sugerindo que também há um defeito na resolução do infiltrado inflamatório por este mecanismo mantendo a lesão persistente na ausência do parasita no local da lesão (Oliveira e cols., 2012). O fato de termos em mãos um modelo experimental que mimetiza parcialmente algumas características moleculares, as lesões de pacientes acometidos de leishmaniose mucosa permite-nos propor maneiras de interferir no curso destas lesões. 1.3 Terapias celulares: uma proposta de tratamento para lesões crônicas em tecidos As terapias celulares são um conjunto de metodologias e abordagens tecnológicas fundamentadas no conhecimento de várias ciências que visam à utilização de células para o tratamento de inúmeras doenças. A transfusão de componentes do sangue de um indivíduo saudável para outro acometido de alguma doença é a terapia celular mais antiga descrita (De La Morena & Gatti, 2010; Schimidt, 2012). O transplante de células-hematopoiéticas (transplante de medula óssea) é atualmente a única forma de tratamento com células indiferenciadas ou células imaturas (célulastronco) cuja aplicação faz parte do arsenal médico disponível. Atualmente, o principal foco da terapia celular é a medicina regenerativa, que objetiva a substituição de células e tecidos lesados, senescentes ou perdidos por estruturas novas restaurando assim sua capacidade orgânica (Charbord, 2010; Arnous e cols., 2012; Cassino e cols., 2012; Cerqueira e cols., 2012). Os mecanismos pelos quais as células indiferenciadas transplantadas atuam ainda não são totalmente esclarecidos. Um conjunto de resultados sugere que além dos efeitos diretos na substituição de células nos tecidos lesados, as células transplantadas podem exercer efeitos indiretos nos tecidos, como estimulação do sistema imunológico e secreção de fatores que induzem migração, crescimento, proliferação de outros tipos celulares nos tecidos induzindo reparo tecidual (Muller e cols., 2008). Dentro desse contexto, as células imaturas ou indiferenciadas da linhagem hematopoiética se apresentam como uma fonte de tecidos para transplantes e terapias celulares. As células-tronco podem ser definidas como células com grande capacidade 13 de proliferação, auto-renovação e capacidade de responder a estímulos externos, além de dar origem a diferentes linhagens celulares mais especializadas (Kondo e cols., 2003). Em adultos, uma fonte de células imaturas hematopoiéticas é a medula óssea que, desde a década de 1950, são utilizadas no tratamento de diferentes doenças que afetam o sistema hematopoiético. Na medula óssea encontram-se as células indiferenciadas hematopoiéticas que podem dar origem a todos os diferentes tipos de células do sangue (De La Morena & Gatti, 2010). A medula óssea é um tecido encontrado na cavidade medular dos ossos longos e nos interstícios dos ossos esponjosos, sendo um tecido altamente vascularizado. Este tecido tem uma estrutura anatômica característica, formando microambientes compostos de células do estroma, matriz extracelular, fatores de crescimento, que permite a sobrevivência, multiplicação e diferenciação de células progenitoras de células do sangue, as conhecidas como células-tronco da medula óssea (Kondo e cols., 2003). As células-tronco presentes na medula óssea de organismos adultos originam as células sanguíneas, além de células que formam e mantém o estroma medular. As células-tronco hematopoiéticas apresentam extensivo potencial de auto-renovação e proliferação associado à capacidade de se diferenciar em progenitoras e manter todos os elementos sanguíneos (eritrócitos, neutrófilos, eosinófilos, basófilos, mastócitos, monócitos, macrófagos, linfócitos T, B e NK e células dendríticas). Essas características são mostradas pela capacidade de reconstituir a hematopoiese completa, após transplante, em recipiente cuja medula óssea foi destruída completamente. (Kirchhof e cols., 2002; Kondo e cols., 2003). Um dos tipos celulares imaturos mais predominantes na série mononuclear encontrada na medula óssea são os monócitos. Os monócitos são originados na medula óssea e infiltram nos tecidos periféricos pela corrente sanguínea. Tanto na situação de homeostase quanto na inflamação, os monócitos circulantes deixam a corrente sanguínea e migram para os tecidos periféricos condicionados por fatores de crescimento tecidual local, citocinas pro-inflamatórias e produtos microbianos (Auffray e cols., 2009; Shi & Pamer, 2011). Em camundongos, as populações dos monócitos podem ser dividas de 14 acordo com a expressão de receptores Ly6C. Monócitos classificado como Ly6C high e CD115 positivos (CD115 é o receptor de GM-CSF) são células que infiltram nos tecidos periféricos rapidamente em situações de dano tecidual agudo, como descrito na infecção por Toxoplasma gondii (Dunay e cols., 2008; Dunay e cols., 2010a; Dunay & Sibley, 2010b). Entretanto, monócitos Ly6Clo e CD115+ é um subtipo de monócitos que migram tardiamente para os tecidos periféricos lesionados e estão envolvidos com processos de reparo tecidual (Dunay e cols., 2008; Cuervo e cols., 2011; Davison & King, 2011; Donnely e cols., 2011; Pereira e cols., 2011). Essas células podem diferenciar-se em populações de células dendríticas ou macrófagos (Leon e cols., 2007; Davison & King, 2011). Dessa forma, o recrutamento de monócitos é essencial para o controle efetivo da remoção de vírus, bactérias e protozoários (Serbina & Pamer, 2006; Hokeness e cols., 2005; Robben e cols., 2005; Dunay e cols., 2008; Serbina e cols., 2008) e pode contribuir para a patogênese de doenças inflamatórias e degenerativas bem como em processos regenerativos de doenças crônicas como descrito em modelos de doenças cardíacas ou doenças auto-imunes (King e cols., 2009; Salama e cols., 2011; Shi & Pamer, 2011; Wrigley e cols., 2011 Ellrichman e cols., 2012) Um dos estudos pioneiros que versa sobre o potencial terapêutico com células mononucleares indiferenciadas ou células imaturas da linhagem hematopoiética da medula óssea foi realizado por pesquisadores italianos no modelo experimental de lesão muscular induzida quimicamente. Esse trabalho mostrou que células-tronco hematopoiéticas injetadas em músculos esqueléticos lesados quimicamente diferenciamse em células desse tecido, os miócitos. Outro protocolo testado foi a inoculação destas células pela via endovenosa. Este protocolo mostrou que estas células são capazes de migrar para a lesão e diferenciaram-se em células do tecido lesado (Ferrari e cols., 1998). A partir de então, o potencial das células-tronco da medula óssea foi testado em diversos modelos e em testes clínicos em humanos que sofreram lesões agudas e crônicas com sucesso na migração e reparo tecidual, como por exemplo, em modelos de cardiopatias, doenças auto-imunes (diabetes, artrite), lesão muscular e lesões no sistema 15 nervoso (Ferrari e cols., 1998; Peron e cols., 2011; Zhang e cols., 2011; Arnous e cols., 2012; Wu e cols., 2012). Há poucos estudos sobre o tratamento com células da medula óssea no curso de infecções, mecanismos de reparo tecidual após alguma terapia celular, em especial, nas parasitoses que acometem milhões de pessoas em países em desenvolvimento. Soares e colaboradores (2004) mostraram que camundongos infectados com Trypanosoma cruzi, tratados com células mononucleares purificadas da medula óssea, por via endovenosa, mostraram melhoras nas lesões. Essas células tiveram a capacidade de migrar para o coração lesionado e induzir reparo tecidual. O reparo tecidual foi caracterizado pela diminuição de infiltrado inflamatório de forma dose dependente pela apoptose dessas células inflamatórias no tecido cardíaco. Entretanto, esse tratamento não foi capaz de interferir no número de parasitas determinados na infecção após o tratamento. Apesar desse fato, esses resultados foram encorajadores para a realização de testes clínicos em humanos com falência cardíaca ocasionada pela infecção por T. cruzi. O procedimento em um paciente humano foi realizado aspirando células da medula óssea do próprio individuo. Posteriormente, essas células foram purificadas e as células mononucleares foram marcadas com um reagente fluorescente e logo em seguida foram inoculadas diretamente no ventrículo esquerdo do coração do paciente. Esse procedimento mostrouse seguro e houve sucesso no reparo da lesão cardíaca nesse indivíduo (Villas-Boas e cols., 2006). Ainda em humanos, a terapia celular mostrou-se interessante quando se implantaram células-tronco hematopoiéticas de um doador homozigoto recessivo para o receptor da quimiocina CCL5 (CCR5-/-) em um paciente HIV+ crônico que havia desenvolvido um tipo de leucemia. Nesse indivíduo o transplante desse tipo particular de células-tronco, além da recuperação do tecido medular sadio, houve eliminação da infecção pelo vírus e recuperação da população de células TCD4 + por um tempo prolongado (Hutter e cols., 2009). Também foram realizados transplantes de células da medula óssea em camundongos infectados com Schistosoma mansoni. Os granulomas formados em torno dos ovos do parasita aprisionados no fígado e intestinos de camundongos causam a 16 patologia e fibrose crônica nestes órgãos. O tratamento de camundongos infectados com S. mansoni na fase crônica com células-tronco purificadas da medula óssea mostrou potencial na redução de granulomas e áreas de fibrose no fígado. Nesse mesmo estudo, foi mostrado que, tanto após a transferência de células pela via endovenosa ou após o inoculo local essas células migraram, instalaram-se e fusionaram-se com as células do fígado no local da lesão hepática por tempos iguais ou superiores 2 a 4 semanas após o tratamento, ressaltando a capacidade terapêutica e participativa dessas células no reparo tecidual do local da injúria. Entretanto, esse tratamento não foi capaz de induzir eliminação os vermes adultos (Oliveira e cols., 2008). Recentemente, no modelo de infecção por Pseudomonas aeroginsa (que causa lesão com fibrose crônica nos pulmões) em camundongos, avaliaram-se a migração e a substituição das células lesadas dos pulmões por células totais da medula óssea. Esses autores mostraram que após o tratamento as células não migraram para o local de infecção. Entretanto, células-tronco hematopoiéticas purificadas foram localizadas no local de fibrose do pulmão após o tratamento local. Esses dados mostram que as célulastronco derivadas da medula óssea podem substituir as células do tecido lesado (Rejman e cols., 2009). Há poucos estudos mostrando a participação de células imaturas da linhagem hematopoiética nas lesões cutâneas causadas pela infecção por parasitas do gênero Leishmania. Estudos mostraram que células com o perfil Ly6C+ e Ly6G- (monócitos imaturos circulantes) infiltraram do sangue periférico para as lesões causadas pelo parasita, participando de mecanismos de indução da resposta imune para morte do parasita, controle das lesões e diferenciação em macrófagos e células dendríticas (Leon e cols., 2007; Gonçalves e cols., 2011). Outros estudos mostraram que células dendríticas diferenciadas in vitro a partir de culturas de células indiferenciadas obtidas da medula óssea autóloga e transferidas para camundongos infectados com L. major induziram o controle das lesões por mecanismos de estimulação do sistema imune (Carrion e cols., 2007; Remer e cols., 2007; Remer e cols., 2010). Dessa forma, esses resultados sugerem que células imaturas obtidas da medula óssea podem ser importantes no controle das 17 lesões cutâneas crônicas de camundongos infectados por L. major. O camundongo TNFR1 KO infectado por L. major é um bom modelo para esses estudos, visto que as lesões não são resolvidas. Em outros modelos descritos na literatura para estudo de lesões crônicodegenerativas, as terapias celulares foram promissoras no reparo dos tecidos lesados. Não há estudos disponíveis versando sobre as possíveis intervenções terapêuticas experimentais, recuperação das lesões após o tratamento em períodos prolongados de infecção por Leishmania. O tratamento com células de medula óssea pode ser promissor para tratamento das lesões nos casos humanos de leishmaniose que apresentam quadros de difícil cicatrização cutânea ou em outras doenças de pele com patogênese similar. 18 OBJETIVOS 19 2. OBJETIVOS 2.1. Objetivo geral: Desenvolver e caracterizar o modelo de infecção de leishmaniose mucocutânea no camundongo TNFR1 KO e avaliar as lesões cutâneas crônicas nestes animais infectados com L. major, após o tratamento com células mononucleares purificadas da medula óssea. 2.2 Objetivos específicos: 2.2.1 Desenvolvimento do modelo murino para leishmaniose mucocutânea: - avaliar o curso das lesões e carga parasitária nas lesões dos camundongos selvagens (C57BL/6) e TNFR1 KO infectados com L. major; - avaliar as lesões histológicas das lesões dos camundongos selvagens (C57BL/6) e TNFR1 KO infectados com L. major; - avaliar o infiltrado inflamatório em camundongos selvagens e TNFR1 KO infectados com L. major; - avaliar a expressão das citocinas IFN-γ, TNF-α, IL-10 e IL-17 e de FoxP3 nas lesões cutâneas de camundongos selvagens e TNFR1 KO infectados com L. major. 20 2.2.2 Analisar o potencial da terapia celular com células mononucleares purificadas da medula óssea nas lesões de camundongos TNFR1 KO infectados com L. major: - analisar o curso e controle das lesões cutâneas em camundongos TNFR1 KO infectados com L. major e tratados com células mononucleares purificadas da medula óssea; - analisar o efeito do tratamento com células mononucleares purificadas da medula óssea na expressão das citocinas IFN-γ, TNF-α, IL-10, TGF-β e IL-17 e de FoxP3 nas lesões e produção de IFN-γ e IL-10 por células de linfonodos drenantes e baço dos camundongos tratados; - analisar a produção de citocinas em células CD11b+ e CD11b- nas lesões de TNFR1 KO infectados com L. major e tratados com células mononucleares purificadas da medula óssea; - analisar a diferenciação, in situ, das células mononucleares purificadas da medula óssea nos camundongos receptores e infectados com L. major. 21 MATERIAL E MÉTODOS MÉTODOS 22 3. MATERIAL E MÉTODOS 3.1 Animais 3.1.1 Camundongos Camundongos C57BL/6 foram obtidos do Centro de Bioterismo da Universidade Federal de Minas Gerais (CEBIO); camundongos C57BL/6 EGFP+ (positivos para Green Fluorescent Protein (gene da actina) (linhagem C57BL/6-Tg [CAG-EGFP] 10sb/J) foram fornecidos, gentilmente, pelo Dr. Mauro Martins Teixeira e Dra. Danielle Glória de Souza, do Laboratório de Imunofarmacologia. Os camundongos TNFR1 KO (linhagem B6.129-Tnfrsf1atm1Mak/J , do Jackson Laboratories, (Bar Harbor, Maine, EUA) foram fornecidos pelos Drs. Phillip Scott (University of Pennsylvania, Filadélfia, Pensilvânia, EUA) e Klaus Pfeffer (Universität Düsseldorf, Düsseldorf, Renânia do Norte-Vestfália, Alemanha) e mantidos no Laboratório de Gnotobiologia e Imunologia já por vários anos. Os animais C57BL/6 TNFR1 KO GFP+ foram obtidos por Daniel Manzoni-de-Almeida e Dra Leda Quercia Vieira por cruzamento entre animais TNFR1 KO x C57BL/6 GFP+ (no Laboratório de Imunologia e Gnotobiologia. O fenótipo dos camundongos TNFR1 KO GFP+ foi confirmado por PCR pela ausência do receptor 1 do TNF-α e presença do gene GFP. Para determinar o fenótipo GFP+, amostras do sangue periférico dos animais TNFR1 KO foram coletadas e analisadas por microscopia de fluorescência. Os animais foram mantidos no biotério experimental do Laboratório de Gnotobiologia e Imunologia do Depto de Bioquímica e Imunologia do ICB-UFMG em estante ventilada, recebendo ração, cama e água estéreis. Camundongos C57BL/6 CD45.1 e CD45.2 (linhagens C57BL/6 Thy-1.1/1.2) foram obtidos do departamento de Pathobiology da Universidade da Pensilvânia ou das colônias comercias da Jackson Laboratory Bar Harbor, Maine, EUA) e mantidos no biotério de criação e experimentação do Laboratório do Dr. Phillip Scott, no departamento de Pathobiology da Universidade da Pensilvânia. A Tabela 1 representa a lista das linhagens de camundongos utilizados nesse estudo. Todos os procedimentos foram executados de acordo com os protocolos institucionais e internacionais que regulam a 23 experimentação em animais. O projeto foi aprovado pela Comissão de Ética em Experimentação Animal da Universidade Federal de Minas Gerais (CETEA), protocolo 55/2009. Tabela 1: Lista de camundongos utilizados no estudo camundongos C57BL/6 TNFR1 KO C57BL/6 TNFR 1 KO GFP+ C57BL/6 C57BL/6 CD45.1 C57BL/6 CD45.2 C57BL/6 GFP+ 3.2 Parasitas e antígeno Leishmania major (MHOM/IL/1980/Friedlin) foi mantida em meio de Grace conforme descrito (Afonso e Scott, 1993). Para infecção foram utilizadas formas promastigotas metacíclicas purificadas por centrifugação em gradiente de Ficoll (Spath e Beverley, 2001). Para obtenção do antígeno particulado, os parasitas foram obtidos de culturas de fase estacionária. Após lavagem dos parasitas com PBS, os parasitas foram congelados e descongelados por sete vezes. O extrato resultante da lise dos parasitas foi ajustado a uma concentração de proteína de 1mg/mL. 3.3 Infecções subcutâneas e intradérmicas dos camundongos com L. major Para as análises das populações de células dendríticas, análise da diferenciação das células transferidas em células CD11c+ e análises da produção de IFN-γ e TNF-α nas 24 células das lesões, camundongos selvagens (C57BL/6) e TNFR1 KO foram infectados pela via intradérmica da orelha com 10 µL de PBS na orelha contendo 1x10 6 de parasitas na forma promastigota metacíclica de L. major. Para os demais experimentos, os camundongos selvagens e TNFR1 KO foram inoculados pela via subcutânea com 30 µL de PBS contendo 1x106 parasitas na forma promastigota metacíclica de L. major na pata direita. A análise do desenvolvimento e das lesões foi acompanhada e medida com auxílio paquímetro digital (Starrett ® 727, Itu, SP, Brasil) e os resultados expressos com a diferença de espessura entre a pata ou orelhas não infectadas dos camundongos controle C57BL/6 e TNFR1 KO. 3.4. Análise do infiltrado inflamatório, por citometria de fluxo, das lesões cutâneas dos camundongos selvagens e TNFR1 KO infectados com L. major. Após duas, seis e quinze semanas de infecção, as lesões foram coletadas, maceradas manualmente em PBS e incubadas por 1 hora e 30 minutos a 37 C com meio RPMI 1640 sem soro fetal bovino contendo colagenase (1 mg/mL) (Sigma, Aldriech, MO, EUA). Posteriormente, os tecidos foram lavados com meio RPMI 1640 com soro fetal bovino e triturados manualmente. Após esse processo as células obtidas foram centrifugadas com PBS a 600 x g por 10 minutos a 4 C. A concentração de células foi ajustada (0,5x106) por contagem por exclusão de azul de tripan e marcadas com anticorpos anti-Ly6C PercepCy5 (clone HK.14) (1:250), anti-Ly6G Pacific Blue (clone 1A.8) (1:200), anti-CD11b PE (clone M1/70) (1:200), anti-CD11c PeCy7 (clone N418) (1:200), anti-MHCII (I-A/I-E) Pacific Blue (clone M5/114.15.2) (1:200), anti-CD4 FITC (clone RM4-5) (1:200), anti-CD8 FITC (clone DK25) (1:200), anti-CD3 PE (eBio G4.18 [G4.18]) (1:200), anti-F4/80 Percep (clone BM8) (1:200) (eBioscience, San Diego, CA, EUA). As células foram incubadas por 15 minutos a 4 C e posteriormente lavadas com PBS e fixadas em tampão contendo 2% de paraformaldeído. As amostras de células foram analisadas (100.000 células por amostra) em citometria de fluxo (BD FacsCANTO II, Franklin Lakes, NJ, EUA) e os resultados obtidos analisados pelo software FlowJo v7.6.5 Versão, Tree Star, Inc., Ashland, OR, EUA) 25 3.5 Obtenções de células totais e das células mononucleares purificadas da medula óssea 3.5.1 Obtenção das células totais da medula óssea Para obtenção das células da medula óssea, camundongos selvagens C57BL/6, TNFR1 KOGFP+ e TNFR1 KO foram eutanasiados e os fêmures e tíbias retirados. As extremidades dos ossos foram cortadas e a medula óssea retirada com meio RPMI sem soro fetal bovino (Sigma Chemical Co) acrescido de penicilina (10.000 U) e estreptomicina (100 µg/mL) (GIBCO BRL, Grand Island, NY, EUA) utilizando-se uma seringa com agulha BD30G para obter células totais de medula num tubo de 50 mL. O meio contendo as células foi centrifugado a 600 x g por 10 minutos a 4 C. O sobrenadante foi desprezado e as células foram novamente suspendidas em 1,0 mL em meio e o número de células viáveis foi determinado pelo método de exclusão por azul de tripan em câmara de Neubauer. 3.5.2 Purificação das células mononucleares da medula óssea As células totais da medula óssea foram obtidas como descrito no item 3.5.1. Nesse estudo nós utilizamos duas técnicas de purificação de células mononucleares da medula óssea: por separação por gradiente utilizando reagente Ficoll, para os tratamentos, e utilizando anticorpos específicos e colunas magnéticas, para análise da diferenciação das células doadoras in situ. Para a metodologia do gradiente de Ficoll, a fração de células mononucleares foi obtida segundo descrito por Soares e colaboradores (2004) e Oliveira e colaboradores (2008). Resumidamente, após a coleta das células totais da medula óssea foi realizada a separação das células mononucleares em gradiente de FICOLL-HYPAQUE - densidade de 1,077 (Sigma Chem Co). Para esse procedimento a mistura Ficoll-Hypaque é colocada no fundo do tubo (50 mL) e as células da medula coletadas são vagarosamente colocadas sobre a fase de Ficoll (na proporção 1:1). Após a centrifugação de 40 minutos a 600 x g a separação ocorre da seguinte maneira: na fase superior ficam as células mononucleares, em seguida o Ficoll e então os eritrócitos e granulócitos, que ficam sob a forma de um sedimento celular no 26 fundo do tubo. A camada de células mononucleares foi removida assepticamente e transferida para um tubo estéril 15 mL. As células foram lavadas por duas vezes com meio DMEM, devido à toxicidade do Ficoll. Após esta etapa, a viabilidade das células foi determinada por exclusão de azul de tripan, contadas em câmara de Neubauer e a concentração ajustada. Na metodologia utilizando anticorpos específicos e colunas magnéticas (MACS® MicroBeads LS columms; Miltenyi Biotecnology, Cambridge, MA, EUA) como descrevemos em John e colaboradores (2011), as células totais da medula óssea de camundongos não infectados foram obtidas de tíbias e fêmures. As hemácias foram lisadas com solução de lise (NaCl 10 nM, MgCl2 5 mM, Tris-HCl 10 nM, pH 7,0) por 1 minuto a 25 C e as células restantes foram incubadas, por 15 min a 4 C, com anticorpo biotinilado anti-Ly6G (clone 1A.8) (Miltenyi Biotecnology, Cambridge, MA, EUA) e selecionadas para o marcador Ly6G por colunas magnéticas. Após lavagens, as células obtidas foram incubadas, por 15 minutos a 4 C em ausência de luz, com anticorpo antiCD11b PE ou APC (clone M1/70) (eBioscience) e positivamente selecionadas para o marcador CD11b . Após finalizar essa etapa, a viabilidade das células foi determina por exclusão de azul de tripan, contadas em câmara de Neubauer e a concentração ajustada. A presença de marcadores das células nas amostras de células totais ou purificadas da medula óssea foi avaliada pela expressão dos marcadores para CD11b, CD11c, Ly6C, Ly6G, CD115 e CD117 (c-kit). As células obtidas foram transferidas para placas de 96 poços na concentração de 5x106 células por poço e incubadas durante 30 minutos a 4 C com solução de bloqueio PBS/BSA 5%. Posteriormente, as células foram lavadas com PBS e incubadas com anticorpo anti-CD11b (clone M1/70) (1:200) PE, anti-CD11c PEcy7 (clone N418) (1:200), anti-Ly6C PercpCy5 (clone HK1.4) (1:200), anti-Ly6G Pacific Blue (clone 1A.8) (1:200), anti-CD115 APC (clone AFS98) (1:200) (eBioscience) e anti-CD117 (anti-c-kit) PercpCy5 (clone 2B8) (1:200) (BD Pharmingen, San Diego, CA, EUA) diluído em PBS/BSA 1% durante 15 minutos. Após a incubação, as células foram lavadas e fixadas com 200 µL de tampão paraformaldeído 2%. Foram analisadas 50.000 células por amostra em citometria de fluxo (BD 27 FacsCANTO II, Franklin Lakes, NJ, EUA) e os resultados obtidos analisados pelo software FlowJo. 3.6 Tratamentos dos camundongos infectados com L. major com células totais ou purificadas da medula óssea Nos experimentos de tratamento dos animais selvagens com células da medula óssea, grupos de camundongos C57BL/6 foram infectados por via intradérmica e simultaneamente tratados com três doses semanais de células mononucleares purificadas da medula óssea (1x106/50 µL/camundongo), pela via endovenosa. O curso das lesões foi seguido pela medida semanal das lesões com auxílio de paquímetro digital (Starrett ® 727, Itu, SP, Brasil). A orelha contralateral foi utilizada como controle negativo da infecção. Para avaliar o efeito do tratamento com células mononucleares da medula óssea nas lesões cutâneas crônicas de camundongos TNFR1 KO, grupos de camundongos TNFR1 KO foram infectados na pata direita com 1x106 formas metacíclica de L. major. Após quinze semanas de infecção, quando observamos lesões persistentes e a carga parasitária baixa (Oliveira e cols., 2012), as células totais ou mononucleares purificadas da medula óssea de camundongos selvagens e de camundongos TNFR1 KO foram administradas como nos protocolos de transferência de células obtidas da medula óssea descritos nos modelos experimentais por Menges e colaboradores (2002), Soares e colaboradores (2004) e Oliveira e colaboradores (2008). Para nossos experimentos, grupos de camundongos TNFR1 KO infectados na décima quinta semana por L. major e receberem três injeções de células totais ou mononucleares purificadas da medula óssea provenientes de camundongos selvagens ou TNFR1 KO (10 7/50 µL/camundongo), semanalmente administradas pela via endovenosa. As lesões foram acompanhadas e medidas semanalmente até a vigésima quinta semana de infecção. Após quatro e oito semanas do último tratamento (vigésima primeira e vigésima quinta semana de infecção) grupos de camundongos tratados e não tratados com as células foram sacrificados para análises das lesões da expressão de citocinas, análise da carga parasitária e do infiltrado 28 inflamatório. O curso das lesões foi seguido pela medida semanal das lesões com auxílio de paquímetro digital (Starrett ® 727, Itu, SP, Brasil). A pata contralateral foi utilizada como controle negativo da infecção. 3.7. Análise da carga parasitária Camundongos selvagens e TNFR1 KO após seis, quinze semanas da infecção ou com um e dois meses após o tratamento com células mononucleares purificadas da medula óssea foram eutanasiados e as lesões coletadas. O número de parasitas nas lesões dos camundongos infectados foi determinado pela da técnica de diluição limitante a partir de uma suspensão de células obtidas das lesões. Resumidamente, os homogenatos das patas foram obtidos após maceração manual das lesões. O material foi centrifugado a 250 x g, e os sobrenadantes recuperados foram submetidos a uma posterior centrifugação de 1.000 x g. O sedimento obtido foi suspenso em 400 µL de meio de Grace completo e duzentos microlitros dessa suspensão foram colocados em duplicata em placas de cultura de 96 poços. Posteriormente foram serialmente diluídas 1:10 ou 1:4 e incubadas a 25 C durante 15 dias para seguir o crescimento das promastigotas. O número de parasitas foi expresso em forma de logaritmo negativo da última diluição em que foi constatada a presença dos parasitas. 3.8. Análise da migração das células da medula óssea no local de lesão após o tratamento 3.8.1 Análise dos tecidos por citometria de fluxo Para análise da migração das células transferidas para as lesões cutâneas dos camundongos TNFR1 KO na décima quinta semana de infecção, receberam uma dose de células mononucleares TNFR1 KOGFP+ (1x107/50 µL/camundongo) purificadas da medula óssea, pela via endovenosa e as lesões avaliadas após 24 horas e sete dias após as transferências. Após 24 horas ou sete dias da transferência das células TNFR1 KOGFP+ mononucleares, os camundongos foram eutanasiados e o local de lesão, linfonodos e baço foram coletados. As amostras dos tecidos foram maceradas 29 manualmente em PBS e incubadas por 1 hora e 30 minutos a 37 C com meio RPMI sem soro fetal bovino contendo colagenase (1 mg/mL). Posteriormente, os tecidos foram lavados com meio RPMI com soro fetal bovino e triturados manualmente. Após esse processo as células obtidas foram centrifugadas com PBS a 600 x g por 10 minutos a 4 C. A concentração de células foi ajustada (0,5x106) por contagem por exclusão de azul de tripan e as amostras analisadas (100.000 células por amostra) em citometria de fluxo e os resultados obtidos analisados pelo software FlowJo. 3.9 Análises histopatológicas Amostras das lesões de camundongos selvagens e TNFR1 KO, nos tempos de seis, quinze semanas de infecção ou lesões dos camundongos TNFR1 KO infectados ou após um e dois meses de tratados com células mononucleares purificadas da medula óssea foram coletadas, fixadas em formol 4% tamponado com PBS pH 7,2, desidratadas em concentrações crescentes de álcool, diafanizadas em xilol, embebidas e incluídas em parafina. Foram obtidos cortes de 3 a 5 µm de espessura. Foi realizada a coloração de Hematoxilina e Eosina e as lesões foram analisadas em microscópio de luz. O número de células inflamatórias totais e de polimorfonucleares foi determinado utilizando aproximadamente 10 campos microscópicos, medindo 250 µm, representativos das lesões e foram automaticamente analisados em KS 300 (Carl Zeiss, Oberkochen, Alemanha) determinando o número de células totais do infiltrado ou a porcentagem de polimorfonucleares das lesões com quinze semanas após infecção entre os animais selvagens e TNFR1 KO ou entre as lesões dos animais TNFR1 KO infectados e tratados com células purificadas da medula óssea após um mês da terapia. 3.10. Determinação das citocinas 3.10.1 Por ELISA Os esplenócitos dos camundongos TNFR1 KO infectados e tratados com as células purificadas da medula óssea foram coletados, processados, colocados em cultura e estimulados por 72 horas com antígeno particulado de L. major (50 µg/mL). A 30 determinação das concentrações de IFN-γ e IL-10 nos linfonodos drenantes e baço foram ensaiados pelo método de ELISA de captura. As placas de ELISA (Nalgene NUNC, Rochester, NY, EUA) foram cobertas com os anticorpos de captura desenvolvidos em cabra anti-IL-10 ou anti-IFN-γ diluídos em tampão de revestimento (8,4 g/L de NaHCO3 e 5,8 g/L de NaCl em água destilada; pH 9,6) em um volume total de 100 µL/poço nas concentrações definidas pelo manual do fabricante. As placas foram incubadas a 4 C por 18 horas, e após tal período as placas foram lavadas quatro vezes com tampão de lavagem (PBS contendo 0,05% de Tween 20) e bloqueadas com albumina bovina 1% (BSA) em PBS por 1 hora em temperatura ambiente em um volume de 200 µL/poço. Após o bloqueio, as placas foram lavadas e as amostras e os padrões foram diluídos em solução diluente (BSA 0,1% e Tween 20 0,1% em PBS, pH 7,4) e adicionados às placas em um volume total de 100 µL/poço. As placas foram incubadas durante a noite a 4 C e no dia seguinte as mesmas passaram por um novo ciclo de lavagem, após o qual anticorpos de detecção biotinilados produzidos em cabra foram adicionados na concentração definida pelo manual do fabricante em solução diluente num volume de 100 µL/poço e incubados à temperatura ambiente por 2 horas. Após esse período de incubação e novo ciclo de lavagem, estreptavidina conjugada com peroxidase foi adicionada à placa na proporção 1:4 em solução diluente num volume de 100 µL/poço e incubada à temperatura ambiente por 30 minutos. A placa foi lavada novamente e adicionou-se a solução do substrato o-fenileno-diamina (OPD, Sigma Chemical Co.) a 0,4 mg/mL e H2O2 a 0,005% em tampão citrato-fosfato (0,15 M, pH 5,0) acompanhando-se a formação da cor. A reação foi interrompida após 15 a 20 minutos de incubação com 50 µL/poço de H2SO4 1 M. A leitura das placas foi feita a 492 nm em leitor de microplacas (Multiskan EX, Labsystems, Finlândia). 3.10.2 Por PCR em tempo real As lesões dos camundongos selvagens e TNFR1 KO infectados, nos tempos de seis e quinze semanas de infecção com L. major ou um e dois meses do tratamento com células da medula óssea foram coletadas, triturados em tubos de prolipropileno em solução de Trizol. Após a adição de 0,2 mL de clorofórmio, a mistura foi 31 homogeneizada em vortex e colocadas por 15 minutos no gelo. Em seguida, foi centrifugada por 15 minutos a 13.000 x g a 4 C, a fase aquosa foi transferida para um tubo de microcentrífuga e misturada 1:1 com isoproponol. Nova homogeneização da mistura foi realizada e deixada repousar por 15-30 minutos a -20 C. Novamente a mistura foi centrifugada nas mesmas condições anteriores e o sobrenadante foi desprezado. Um mililitro de etanol 95% foi adicionado ao microtubo, à mistura foi agitada no vortex e novamente centrifugada. Os sobrenandantes foram desprezados, o sedimento foi deixado para secar por 5 minutos e foi suspenso em água deionizada e autoclavada contendo 1mM de EDTA. As amostras de RNA foram mantidas a -70 C até o uso. O RNA foi transcrito (0,5 µg por ensaio, quantificado por espectrofotometria) usando-se transcriptase reversa AMV (GIBCO BRL, Grand Island, NY, EUA) em 25 µL de mistura de reação contendo dNTP 250 mM, Tris-HCl 50 mM, pH8,3, KCl 75 mM, MgCl2 3 mM, di-tiotreinol 10 mM, 10 unidades de RNAsin e oligo DT15 (Promega Corp, Madison, WL, EUA). As misturas foram incubadas por 5 minutos a 95 C, 5 minutos no gelo e 5 minutos a 25 C, nesse passo 100 unidades de transcriptase reversa foram adicionadas e a mistura incubada por 60 minutos a 37 C. A temperatura foi elevada por 95 C por 5 minutos e os tubos foram transferidos para o gelo por 5 minutos. O produto de cDNA foi diluído em 0,2 mL de água destilada estéril e 5 µL foram usados para cada amplificação por reação de polimerase em cadeia. A amplificação da expressão de mRNA específica foi realizada através de PCR em tempo real (RT-PCR) usando iniciadores com seqüências especificas para IL-10, IFN-γ, TNF-α, TGF-β, IL-17 e arginase I, iNOS e FoxP3 e as reações foram desenvolvidas sob um sistema de detecção de seqüência ABI PRISM®7900HT (Applied Biosystems, Foster City, CA, EUA) usando 20% da reação de cDNA em volume total de 15uL de mistura de PCR. Todas as reações foram desenvolvidas em duplicatas usando SYBR Green PCR Master Mix (Applied Biosystems, Foster City, CA, EUA) de acordo com as especificações do fabricante. A quantificação relativa do produto foi determinada pelo método de limiar de ciclos para determinar o incremento em vezes do produto. O programa de PCR para amplificação de cDNA foi desenvolvido sob as seguintes 32 condições: 2 min a 50 C , ativação da AmpliTaq a 95 C durante 10 min, desnaturação a 95 C por 15 segundos. Para o anelamento e extensão final, as amostras foram submetidas a 60 C por 1 min durante 45 ciclos. Para a geração da curva de dissociação, as amostras foram aquecidas a 95 C por 15 segundos, em seguida a 60 C por 5 segundos. Finalmente, as amostras foram esfriadas por 1 min a 4 C. O gene de interesse foi normalizado em relação à expressão da enzima expressa constitutivamente hipoxantina fosforibosil transferase (HPRT), baseado no calculo do CT. A mudança na expressão foi representada como relativa aos animais não infectados. 3.10.3 Por citometria de fluxo Para avaliar o perfil da produção de citocinas das células inflamatórias nas lesões dos camundongos TNFR1 KO infectados com L. major, após duas semanas de infecção, os camundongos receberam o tratamento com células mononucleares purificadas da medula óssea (10x106/camundongo) ou PBS. Após sete dias da transferência, as lesões foram coletadas, as células isoladas e estimuladas ex vivo com estímulo policlonal (antiCD3 [10 µg/mL] e anti-CD28 [10 µg/mL] por 12 horas), para análise de produção de citocinas anti- e pró-inflamatórias em populações de células CD11b positivas e negativas do recipiente para produção de TNF-α e IFN-γ. Resumidamente, as células obtidas das lesões foram coletadas, a concentração ajustada e estimuladas, com estímulos policlonais, com anti-CD3 (10 µg/mL), anti-CD28 (10 µg/mL) por 12 horas. Posteriormente as células foram incubadas com brefeldina A e ionomicina (10 µg/mL) (Sigma, Chemical Co) durante 4 horas a 37 graus. Posteriormente, as células foram lavadas com PBS e incubadas com anticorpo anti-CD11b (clone M1/70) (1:200) PE, anti-IFN-γ PEcy7 (clone XMG 1.2) (1:200), anti-TNF-α PE (MP6-XT22) (1:200), antiCD4 Pacific Blue (clone RM4-5) (1:200), anti-CD8 PercepCy5.5 (clone DK25) (1:200) (eBioscience) diluído em PBS/BSA 1% durante 15 minutos. Após a incubação, as células foram lavadas e fixadas com 200 µL de tampão paraformoldeído 2%. Foram analisadas 100.000 células por amostra em citometria de fluxo e os resultados obtidos analisados pelo software FlowJo. 33 3.11. Análise da migração e diferenciação das células mononucleares purificadas da medula óssea nas lesões in vivo Para análise do comportamento das células transferidas nas lesões dos animais infectados por L. major, camundongos C57BL/6 com marcador CD45.2 foram infectados pela via intradérmica (na orelha) com L. major (1x106). Após duas semanas de infecção, o concentrado de células CD11b+ de camundongos com marcador CD45.1 obtido da medula por purificação com anticorpos foi transferido para camundongos CD45.2 pela via endovenosa (10x106/50 µL/camundongo). Em 24 horas e sete dias após a transferência, os animais foram sacrificados e o baço, o linfonodo drenante e a lesão foram coletados para análise dos marcadores Ly6C, CD11b+, CD11c, MHCII, Ly6G, CD45.1, CD45.2 nas células transferidas por citometria de fluxo. As células obtidas foram e incubadas durante 30 minutos a 4 C com solução de bloqueio PBS/BSA 5%. Posteriormente, as células foram lavadas com PBS e incubadas com anticorpo antiCD11b (clone M1/70) (1:200) PE, anti-CD11c PEcy7 (clone N418) (1:200), anti-Ly6C PercpCy5 (clone HK1.4) (1:200), anti-Ly6G (clone 1A.8) Pacific Blue (1:200), antiMHCII APC (clone M5/114.15.2) (1:200), anti-CD45.1 (clone A20) Pacific Blue (1:200) e anti-CD45.2 FITC (clone 104) (1:200) (eBioscience) diluído em PBS/BSA 1% durante 15 minutos. Após a incubação, as células foram lavadas e fixadas com 200 µL de tampão paraformoldeído 2%. Foram analisadas 50.000 células por amostra em citometria de fluxo e os resultados obtidos analisados pelo software FlowJo. 3.13. Análises Estatísticas Os resultados obtidos foram analisados estatisticamente pelo teste t de Student, sendo consideradas significativas as diferenças com p<0,05*. 34 RESULTADOS 35 4. RESULTADOS 4.1. Desenvolvimento do modelo para lesões crônicas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major 4.1.1 Caracterização do desenvolvimento crônico das lesões cutâneas Primeiramente, os camundongos selvagens e TNFR1 KO foram infectados com L. major pela via intradérmica (orelha), como descrito no modelo experimental para infecção por parasitas do gênero Leishmania (Côrtes e cols., 2010). Os resultados mostraram que os animais TNFR1 KO infectados na orelha com L. major perdem o tecido da orelha (cartilagem) após 4-6 semanas de infecção devido à reação inflamatória intensa desenvolvida. Esse resultado nos impediu de infectar os camundongos TNFR1 KO com L. major na orelha para acompanhar a progressão das lesões em fases mais avançadas de infecção (dados não mostrados). Dessa forma, nesse estudo, camundongos C57BL/6 e TNFR1 KO foram inoculados com L. major pela via subcutânea nas patas e as lesões foram acompanhados e medidos por 20 semanas para caracterizar as lesões cutâneas crônicas desenvolvidas pelos camundongos TNFR1 KO. Os camundongos TNFR1 KO, a partir da oitava semana de infecção, desenvolveram lesões maiores quando comparados aos animais selvagens C57BL/6 (Figura 1A e 1B) (p<0.05). Além disso, foi observado um controle do parasitismo no local de infecção, como os camundongos selvagens, na décima quinta semana de infecção (Figura 1C). As análises histopatológicas das lesões cutâneas crônicas dos animais TNFR1 KO infectados mostraram lesões com infiltrado inflamatório difuso e intenso nas lesões desses animais, após seis semanas de infecção, permanecendo essas características até a décima quinta semana de infecção, quando comparados aos camundongos selvagens (Figura 2A, B, C e D). Na décima quinta semana de infecção, há redução significativa do infiltrado inflamatório nos camundongos selvagens, entretanto, nas lesões dos camundongos TNFR1 KO há intenso infiltrado inflamatório (Figura 2E), edema 36 eosinofílico, evidente presença de infiltrado misto com grande representação de polimorfonucleares e debris celulares. 37 A C 2.5 C57BL/6 C57BL/6 Lesão (mm) 2.0 TNFR1 KO 1.5 1.0 0.5 0.0 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 semanas após infecção Carga parasitária (-log título) B D * 10 TNFR1 KO * 8 n.s. 6 4 2 0 6 semanas 15 semanas Figura 1: Crescimento da área da lesão pela infecção e parasitismo nos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major. (A) os camundongos foram infectados com 1x106 formas estacionárias de L. major na pata. As lesões foram semanalmente medidas com paquímetro e a média dos valores das patas de camundongos não infectados foi subtraída de cada pata infectada para estimativa da lesão. Após 6 e 15 semanas de infecção, os camundongos foram eutanasiados e as lesões foram removidas para determinação da carga parasitária por meio da técnica de diluição limitante. A carga dos parasitas foi determinada individualmente e as médias das diluições máximas de cada grupo foram expressas pelo logaritmo negativo do título (última diluição positiva) (B). (C e D) aspecto macroscópico das lesões de camundongos C57BL/6 e TNFR1 KO após 15 semanas de infecção. Cada ponto é representativo de cinco animais por grupo. * representa p<0,05 pelo t de Student. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 38 A B C D 2m 2m 20m Células inflamatórias (area nuclear/lesão m2) E x104 25 20 C57BL/6 TNFR1 KO 15 10 5 0 Figuras 2: Análises histopatológicas das lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major. Os camundongos foram infectados, de forma subcutânea na pata, com L. major (1x106). Após 6 (A-B) e 15 (C-D) semanas de infecção as lesões foram removidas para análise histológica. (E) Quantificação do infiltrado inflamatório (celularidade) por morfometria na décima quinta semana de infecção. Cada ponto é representativo de três camundongos por grupo. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 39 4.1.2. Análise do perfil de citocinas e FoxP3 nas lesões crônicas desenvolvidas nos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major Os animais TNFR1 KO infectados apresentaram maior expressão e concentração de IFN-γ e TNF-α nas lesões cutâneas crônicas quando comparadas às lesões dos selvagens. Entretanto, não foram encontradas diferenças na expressão e concentração de IL-4 entre os animais selvagens e TNFR1 KO (Oliveira e cols., 2012). Dessa forma, com o objetivo de caracterizar os fatores envolvidos na persistência das lesões cutâneas desenvolvidas nos camundongos TNFR1 KO infectados, mesmo na presença de baixo parasitismo, analisamos a expressão de citocinas IFN-γ, TNF-α, IL-10 e IL-17, assim como a expressão de FoxP3, nas lesões. Houve maior expressão de IFN-γ e TNF-α nas lesões cutâneas crônicas nos animais TNFR1 KO infectados (p<0.05) (Figura 3A e 3B). Houve maior expressão de IL-17 nas lesões dos camundongos TNFR1 KO que os animais selvagens (p<0.05) (Figura 3C), após quinze semanas de infecção. Para IL-10 e FoxP3 não houve diferença entre os camundongos selvagens e TNFR1 KO após quinze semanas de infecção. Entretanto, para esses dois fatores, podemos observar menor expressão em ambos os grupos de camundongos comparados na décima quinta semana de infecção que na sexta semana de infecção (Figura 3D e Figura 4). 40 TNF- A 1000 IFN- B * C56BL/6 * 1000 TNFR1 KO 800 800 Aumento da expressão de mRNA (aumento em vezes/HPRT) * 600 600 400 400 200 200 0 NI 6 15 * 0 NI C 6 15 D 30 15 IL-10 20 10 10 5 0 NI 6 15 semanas após infecção IL-17 * 0 NI 6 15 semanas após infecção Figura 3: Expressão de IFN-γ, TNF-α, IL-10 e IL-17 nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major. Os camundongos foram infectados com 1x106 L. major na pata e após 6 e 15 semanas de infecção os animais foram eutanasiados e as patas coletadas para a análise da expressão de mRNA para TNF-α (A), IFN-γ (B), IL-10 (C) e IL-17 (D) por PCR em tempo real. Barras representam a média ± desvio padrão de quatro camundongos por grupo. * representa p<0,05 pelo teste t de Student. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 41 Aumento da expressão de mRNA (aumento em vezes/HPRT) 200 FoxP3 * C56BL/6 TNFR1 KO 150 100 50 0 NI 6 15 semanas após infecção Figura 4: Expressão de FoxP3 nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major. Os camundongos foram infectados com 1x106 L. major na pata e após 6 e 15 semanas de infecção os camundongos foram eutanasiados e as patas coletadas para a análise da expressão de mRNA para de FoxP3 por PCR em tempo real. Barras representam a média ± desvio padrão de quatro animais por grupo. * representa p<0,05 pelo t de Student. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 42 4.1.3 Avaliação da expressão das quimiocinas CCL2 e CCL5 nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados com L. major As lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados apresentam maior expressão de IFN-γ, TNF-α e IL-17 quando comparados aos animais selvagens, houve maior expressão de CCL2 (Figura 5A) e CCL5 (Figura 5B) nas lesões dos camundongos TNFR1 KO após quinze semanas de infectados com L. major (p<0.05). 43 A C56BL/6 CCL2 15000 TNFR1 KO * Aumento da expressão de mRNA (aumento em vezes/HPRT) 10000 * 5000 0 NI 6 15 B 30 CCL5 20 * 10 0 NI 6 15 semanas após infecção Figura 5: Expressão de CCL2 e CCL5 nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados por L. major. Os camundongos foram infectados com 1x106 L. major na pata e após 6 e 15 semanas de infecção os animais foram eutanasiados e as patas coletadas para a análise da expressão de mRNA de (A) CCL2 e (B) CCL5 por PCR em tempo real. Barras representam a média ± desvio padrão de quatro animais por grupo. * representa p<0,05 pelo t de Student. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 44 4.1.4 Avaliação do infiltrado inflamatório nas lesões crônicas desenvolvidas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major Houve persistência de números maiores de neutrófilos (Ly6G+) e células T CD8+ nas lesões dos camundongos TNFR1 KO infectados após quinze semanas de infecção, quando comparados aos animais selvagens (p<0.05). Não foram detectadas diferenças no número de macrófagos (F4/80) e de células T CD4+ entre os camundongos selvagens e os TNFR1 KO nos pontos de infecção estudados (Figura 6AD). Foi investigado também o infiltrado de células dendríticas nas lesões. Em duas semanas de infecção foi encontrado um número similar de células dendríticas CD11c+ e Ly6C+ e CD11c+ e MHCII+ em ambas linhagens. Entretanto, após seis semanas de infecção, nossos resultados mostraram uma porcentagem menor de células dendríticas CD11c+ e MHCII+ e CD11c+ e Ly6C+ nas lesões dos camundongos TNFR1 KO infectados em comparação aos camundongos selvagens (p<0.05) (Figura 7A e B). 45 B A 2000 C56BL/6 TNFR1 KO CD4+ 1500 1000 TNFR1 KO CD4 C57BL/6 500 0 88.8% 66.3% C 2000 24.6% CD8 Ly6G 0.51% 8.83% Contagem de células 37% 9.02% F4/80 Número de Células nas lesões CD8+ 3.91% 1500 * 1000 500 0 D 250 200 150 100 C57BL/6 (MFI 31.2) 50 TNFR1 KO (MFI TNFR1KO (MFI339) 339) 0 C57BL/6 (MFI 31.2) F4/80 E 800 Ly6G+ * 600 400 200 0 Figura 6: Infiltrado inflamatório nas lesões crônicas nos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados com L. major. Os camundongos foram infectados com 1x106 L. major na pata e após 15 semanas de infecção os animais foram eutanasiados e as patas coletadas para a análise do infiltrado inflamatório por citometria de fluxo. (A) dot plots das células da lesão. Números absolutos das células TCD4+ (B), TCD8+ (C), F4/80 (D) e Ly6G+ (E). Barras representam a média ± desvio padrão de quatro animais por grupo. * representa p<0,05 pelo t de Student. 46 % de células CD11c+ e MHCII+ A 50 C57BL/6 40 TNFR1 KO * 30 20 10 0 2 6 % de células CD11c+ e Ly6C+ B 50 40 * 30 20 10 0 2 6 semanas após infecção Figura 7: Infiltrado inflamatório de células dendríticas nas lesões nos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados com L. major. Grupos de camundongos selvagens C57BL/6 e TNFR1 KO foram infectados com 1x106 L. major pela via intradérmica na orelha. Após 2 e 6 semanas de infecção a lesão foi coletada e processada para análise das porcentagens das populações CD11c+ e MHCII+ (A) CD11c+ e Ly6C+ (B) por citometria de fluxo. Barras representam a média ± desvio padrão de quatro animais por grupo. * representa p<0,05 pelo t de Student. 47 4.2. Caracterização do processo de redução das lesões crônicas desenvolvidas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células mononucleares purificadas da medula óssea 4.2.1 Avaliação da terapia com células mononucleares purificadas da medula óssea nas lesões crônicas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major Nas preparações de células mononucleares por gradiente de Ficoll há maior porcentagem de células expressando CD115 e CD117 (c-kit) e menor porcentagem de células Ly6G+ quando comparadas com a expressão desses marcadores nos preparados de células totais da medula óssea. Esses resultados mostram que a separação células mononucleares tem maior porcentagem de monócitos (p<0.05). Não houve diferenças na porcentagem de células CD11b+ e Ly6C+ entre as preparações de células totais e células mononucleares purificadas da medula óssea (Figura 8A). O tratamento com células de medula óssea é capaz de reduzir as lesões cutâneas crônicas na pata dos animais infectados, quando comparados aos animais tratados com PBS (p<0.05) (Figura 8B). Interessantemente, não houve diferenças significativas nas medidas das lesões entre os camundongos TNFR1 KO que receberam células purificadas suficientes ou deficientes do receptor 1 do TNF-α, entretanto há diferença significativa e qualitativa entre os tratamentos com células totais e células mononucleares purificadas da medula óssea quando comparados entre si (p<0.05) (Figura 8B-D). 48 B A Células da medula óssea 3.0 Células mononucleadas purificadas 2.5 60 * 40 * * Lesão (mm) % de células positivas 80 20 + PBS + células da medula óssea do TNFR1 KO 2.0 ** 1.5 * ** * 1.0 * 0.5 0.0 0 0 CD11b+ Ly6C+ Ly6G+ CD115+ c-Kit+ 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 semanas após infecção D C + PBS 3.0 + Células mononucleares do TNFR1+/+ 2.0 * 1.5 1.0 * * ** *** 0.5 Lesão (mm) Lesão (mm) 2.5 3.0 + PBS 2.5 + Células mononucleares do TNFR1 KO 2.0 * 1.5 1.0 ** ** * ** * 0.5 0.0 0.0 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 semanas após infecção 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 semanas após infecção Figura 8: Efeito dos tratamentos com células da medula óssea nas lesões crônicas dos camundongos TNFR1 KO e selvagens infectados com L. major. (A) Células de medula óssea e uma fração de células mononucleares purificadas da medula óssea por gradiente de ficoll foram obtidas de camundongos TNFR1 KO não infectados e posteriormente marcadas com anticorpo anti-CD11b, anti-Ly6C, anti-Ly6G, antiCD115 e anti-c-kit. Cinqüenta mil células foram analisadas por amostra, por citometria de fluxo. Barras representam a média ± desvio padrão da porcentagem de marcadores nos preparados de células de cada animal analisado (n=2). Grupos de camundongos TNFR1 KO (n=5) foram infectados com L. major e após 15 semanas da infecção os camundongos foram tratados com três injeções consecutivas, pela via endovenosa, de células de medula óssea (B) ou células mononucleares purificadas de medula óssea TNFR1+/+ (C) ou TNFR1 KO (D) (1x107/por injeção). Camundongos controles foram tratados com PBS. As lesões foram acompanhadas e medidas semanalmente. *representa p<0,05 pelo teste t de Student. Experimento representativo de três repetições independentes. 49 4.2.2 Avaliação do efeito na expressão de citocinas, arginase I, iNOS e FoxP3 após o tratamento com células mononucleares purificadas da medula óssea nas lesões crônicas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major Os camundongos TNFR1 KO infectados (décima quinta semana de infecção) apresentam maior expressão de IFN-γ, TNF-α, IL-17 e expressão semelhante de IL-10 e FoxP3 quando comparados aos camundongos selvagens. Dessa forma, amostras de lesões de animais TNFR1 KO tratados e não tratados com células purificadas da medula óssea foram coletadas após um e dois meses do último tratamento (vigésima primeira e vigésima quinta semana de infecção) processadas e analisadas para expressão de mRNA de IFN-γ, TNF-α, IL-17, IL-10, TGF-β e para arginase I, iNOS e FoxP3. Houve maior expressão de IFN-γ e IL-10 nas lesões dos camundongos TNFR1 KO infectados e tratados com células purificadas da medula óssea após um e dois meses do último tratamento com células purificadas da medula óssea em comparação aos camundongos que receberam PBS (Figuras 9A-B e 10A-B) (p<0.05). Interessantemente, houve menor expressão de IL-17 nas lesões dos animais TNFR1 KO infectados e tratados com células após um e dois meses do tratamento quando comparados aos camundongos que receberam PBS (Figuras 11A-B) (p<0.05). Entretanto, não foram detectadas diferenças entre as expressões de TNF-α (Figuras 9CD), TGF-β (Figuras 10C-D), FoxP3 (Figuras 11C-D), iNOS (Figuras 12A-B) e arginase I (Figuras 12C-D) nas lesões dos camundongos TNFR1 KO infectados e tratados com células purificadas da medula óssea após um e dois meses de tratamento. 50 1 mês 2 meses A B IFN- * 40 Aumento da expressão de mRNA (aumento em vezes/HPRT) 30 40 não infectado infectado + PBS infectado + células 20 20 10 10 0 0 C 50 40 * 30 D TNF- 50 40 30 30 20 20 10 10 0 0 Figura 9: Expressão de IFN-γ e TNF-α nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea. Grupos de camundongos TNFR1 KO foram infectados com L. major e após 15 semanas da infecção os camundongos foram tratados com três injeções consecutivas, por via endovenosa, de células mononucleares TNFR1 KO purificadas da medula óssea (1x107/por dose). Camundongos infectados foram tratados com PBS como controles. Após 1 e 2 meses do último tratamento (21 e 25 semanas de infecção), os camundongos foram eutanasiados e as patas coletadas para análise da expressão de mRNA para IFN-γ (A-B) e TNF-α (C-D). Barras representam a média ± desvio padrão de quatro animais por grupo. *representa p<0,05 pelo t de Student. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 51 1 mês 2 meses A IL-10 * Aumento da expressão de mRNA (aumento em vezes/HPRT) 30 20 B não Infectado Infectado + PBS Infectado + células * 30 20 10 10 0 0 C 25 D TGF- 25 20 20 15 15 10 10 5 5 0 0 Figura 10: Expressão de IL-10 e TGF-β nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea. Grupos de camundongos TNFR1 KO foram infectados com L. major e após 15 semanas da infecção os camundongos foram tratados com três doses consecutivas, por via endovenosa, de células mononucleares TNFR1 KO purificadas da medula óssea autóloga (1x107/por dose). Camundongos infectados foram tratados com PBS como controles. Após 1 e 2 meses do último tratamento (21 e 25 semanas de infecção) os camundongos foram eutanasiados e as patas coletadas para análise da expressão de mRNA para IL-10 (A e B) e TGF-β (C e D) por PCR em tempo real. Barras representam a média ± desvio padrão de quatro animais por grupo. *representa p<0,05 pelo t de Student. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 52 1 mês A 20 2 meses B IL-17 * 15 Aumento da expressão de mRNA (aumento em vezes/HPRT) 20 não Infectado infectado + PBS 15 Infectado + células 10 10 5 5 0 0 C 60 D FoxP3 60 40 40 20 20 0 * 0 Figura 11: Expressão de IL-17 e FoxP3 nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea. Grupos de camundongos TNFR1 KO foram infectados com L. major e após 15 semanas da infecção os camundongos foram tratados com três doses consecutivas, por via endovenosa de células mononucleares TNFR1 KO purificadas da medula óssea autóloga (1x107/por dose). Camundongos infectados foram tratados com PBS como controles. Após 1 e 2 meses do último tratamento (21 e 25 semanas de infecção) os camundongos foram eutanasiados e as patas coletadas para análise da expressão de mRNA para IL-17 (A e B) e FoxP3 (C e D) por PCR em tempo real. Barras representam a média ± desvio padrão de quatro animais por grupo. *representa p<0,05 pelo t de Student. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 53 1 mês A B iNOS 20 não infectado infectado + PBS infectado + células 15 Aumento da expressão de mRNA (aumento em vezes/HPRT) 2 meses 10 8 6 10 4 5 2 0 0 C D Arginase I 20 20 15 15 10 10 5 5 0 0 Figura 12: Expressão de arginase I e iNOS nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea. Grupos de camundongos TNFR1 KO foram infectados com L. major e após 15 semanas da infecção os camundongos foram tratados com três doses consecutivas, por via endovenosa, de células mononucleares TNFR1 KO purificadas da medula óssea autóloga (1x107/por dose). Camundongos infectados foram tratados com PBS como controles. Após 1 e 2 meses do último tratamento (21 e 25 semanas de infecção) os camundongos foram eutanasiados e as patas coletadas para análise da expressão de mRNA para iNOS (A e B) e arginase I (C e D) por PCR em tempo real. Barras representam a média ± desvio padrão de quatro animais por grupo. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 54 4.2.3 Avaliação do efeito de IFN-γ e IL-10 provenientes de células do linfonodo drenante e baço após o tratamento com células mononucleares purificadas da medula óssea nas lesões crônicas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major Diante dos resultados que mostraram diferenças na expressão de IFN-γ e IL-10 nas lesões dos camundongos tratados, os esplenócitos provenientes dos linfonodos drenantes e baço foram estimuladas com antígeno de L. major por após 72 horas. Houve aumento na produção de IL-10 e IFN-γ em comparação com as células provenientes dos animais que receberam apenas PBS (p<0.05). Não foram observadas diferenças nas concentrações de IFN-γ e IL-10 nas culturas de células provenientes do baço dos animais tratados com células purificadas da medula óssea e estimuladas com antígeno de L. major em comparação ao grupo que recebeu PBS (Figuras 13A-D). 55 IL-10 A IFN-γ B * 600 * Infectado + PBS Infectado + Células mononucleares 300 2000 pg/mL pg/mL 450 * 2500 1500 1000 150 500 0 Sem estímulo 0 + ag de L. major sem estímulo C D 600 3000 400 pg/mL pg/mL + ag de L. major 200 2000 1000 0 0 sem estímulo + ag de L. major sem estímulo + ag de L. major Figura 13: Produção de IL-10 e IFN-γ por células órgãos linfoides secundários dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea. Grupos de camundongos TNFR1 KO foram infectados com L. major e após 15 semanas da infecção os camundongos foram tratados com três doses consecutivas, por via endovenosa com células mononucleares TNFR1 KO purificadas da medula óssea autóloga (1x107/por dose). Camundongos infectados foram tratados com PBS como controles. Após 1 mês do último tratamento, os camundongos foram sacrificados e as linfonodos drenantes e baço foram coletados, processados e as células estimuladas com antígeno de L. major por 72 horas. Após esse período os sobrenadantes foram coletados e as concentrações de IL-10 (A e C, linfonodo e baço, respectivamente) e IFN-γ (B e D, linfonodo e baço, respectivamente) determinados por ELISA. Barras representam a média ± desvio padrão de quatro animais por grupo. *representa p<0,05 pelo t de Student. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 56 4.2.4 Avaliação do efeito, na carga parasitária, após o tratamento com células mononucleares purificadas da medula óssea nas lesões crônicas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major A carga parasitária dos camundongos tratados com células purificadas da medula óssea após um e dois meses do último tratamento por diluição limitante. Não foram detectadas diferenças entre o número de parasitas nos grupos de camundongos que receberam injeções de PBS e o grupo de camundongos tratados com células purificadas da medula óssea nos períodos analisados (Figuras 14). 57 A 10 8 n.s. 6 Carga parasitária (-log10) 4 2 0 +PBS + celulas B 10 n.s. 8 6 4 2 0 + PBS + celulas Figura 14: Carga de parasitas nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados com L. major e após o tratamento com células purificadas da medula óssea. Grupos de camundongos TNFR1 KO (n=9) foram infectados com L. major e após 15 semanas da infecção os camundongos foram tratados com três doses consecutivas, por via endovenosa, de células mononucleares TNFR1 KO purificadas da medula óssea. Após 1 (A) e 2 (B) meses do último tratamento (21 e 25 semanas de infecção) os camundongos foram eutanasiados e as lesões coletadas para análise das cargas parasitárias. A quantificação de parasitas foi determinada individualmente e as médias das diluições máximas de cada grupo foram expressas pelo logaritmo negativo do título (última diluição positiva). Experimento representativo de duas repetições independentes. 58 4.2.5 Análise da migração das células mononucleares transferidas para as lesões cutâneas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major Foram encontradas células GFP+ nas lesões cutâneas crônicas dos animais TNFR1 KO infectados com L. major, após 24 horas e sete dias da transferência. Houve também maior presença de células transferidas GFP+ após 24 horas do que com sete dias. Células transferidas GFP+ também foram localizadas nos linfonodos drenantes e baço, após 24 horas e sete dias, dos animais TNFR1 KO infectados (Figura 15). 59 Lesão Linfonodo drenante Baço 10000 7500 5000 2500 di as 7 ho ra s 24 di as 7 ho ra s 24 di as 7 ho ra s 0 24 Número de células GFP+ por órgão 12500 Figura 15: Análise da migração das células purificadas da medula óssea de camundongos TNFR1 KOGFP+ para as lesões cutâneas crônicas de camundongos TNFR1 KO infectados por L. major. Camundongos TNFR1 KO (n=4) foram infectados com L. major na pata e após 15 semanas da infecção foram tratados com células purificadas da medula de camundongos não infectados TNFR1 KO GFP+ (1x107 células/camundongo). Após 24 horas ou 7 dias da transferência das células, a pata infectada e os órgãos linfóides secundários foram coletados e analisados por citometria de fluxo (100.000 eventos/análise). Os resultados estão expressos por número absoluto de células GFP+ nos órgãos analisados. Barras representam a média ± desvio padrão de quatro animais por grupo Experimento representativo de duas repetições independentes 60 4.2.6 Avaliação do infiltrado inflamatório, por histopatologia, nas lesões cutâneas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major após o tratamento com células mononucleares purificadas da medula óssea Após quatro semanas do último tratamento as lesões cutâneas dos camundongos TNFR1 KO infectados e tratados com PBS (Figura 16A) ou células mononucleares purificadas da medula óssea (Figura 16B) foram registradas. Nas lesões do grupo que recebeu apenas PBS há grande reatividade vascular, associada com infiltrados compactos e por vezes associada a intensos graus de lesão celular, e presença de restos celulares, com predomínio de fenômenos degenerativos. Entretanto, nas lesões dos animais tratados, há presença de infiltrado inflamatório associado com deposição de material intercelular e edema, além de intensa reatividade celular das células do tecido conjuntivo, bem como aspecto de tecido de granulação com vasos neo-formados em maior quantidade. As lesões necrótico-degenerativas estão ausentes, e o padrão do infiltrado é predominantemente mononuclear. Tal cenário poderia sugerir ação das células transplantadas nos mecanismos de regeneração tecidual (Figura 16 C e D). Os resultados quantitativos das análises histopatológicas mostraram uma menor porcentagem de células polimorfonucleares nas lesões dos camundongos TNFR1 KO tratados com células purificadas da medula óssea em comparação aos animais tratados com PBS (p<0.05) (Figura 16E). 61 B + CÉLULAS + PBS A C D 20m % de células polimorfonucleares do número total de células inflamatórias E 10 8 * 6 4 2 0 + PBS + Células Figuras 16: Análises histopatológicas das lesões crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major e tratados com células purificadas da medula óssea. Grupos de camundongos TNFR1 KO (n=3) foram infectados com L. major e após 15 semanas da infecção os camundongos foram tratados com três doses consecutivas, por via endovenosa com células mononucleares TNFR1 KO purificadas da medula óssea. Após 1 mês do último tratamento (21 semanas de infecção) os animais foram eutanasiados e as lesões coletadas para as análises histopatológicas. (A e B) aspecto macroscópico das lesões de camundongos, após 1 mês do tratamento com células. (C e D) aspecto histológico das lesões após 1 mês do tratamento com células. (E) quantificação diferencial de polimorfonucleares do infiltrado inflamatório total por morfometria. O ponto de infecção e tratamento analisado (1 mês após o tratamento) é representativo de três camundongos por grupo. * representa p<0,05 pelo t de Student. Os resultados são representativos de dois experimentos independentes. 62 4.2.7 Tratamento de camundongos selvagens infectados com L. major com células mononucleares purificadas da medula óssea Para essa análise do fenômeno de cicatrização das lesões cutâneas em outras linhagens de camundongos utilizamos camundongos C57BL/6 selvagens. Entretanto, essa linhagem de camundongos cura espontaneamente as lesões desenvolvidas pela infecção por L. major. Dessa forma, para avaliar esse fenômeno, após infectarmos grupos de camundongos C57BL/6 com L. major, transferimos, simultaneamente, células purificadas da medula óssea (10x106/50 µL/camundongo). O grupo controle recebeu apenas o veículo, PBS. Esses mesmos tratamentos foram repetidos por mais dois tempos em duas semanas. A progressão das lesões foi acompanhada e medida por oito semanas. Nossos resultados mostraram que as células purificadas da medula óssea induziram proteção no desenvolvimento das lesões no animal selvagem, quando comparadas aos controles com PBS (p>0.05) (Figura 17). 63 1.5 PBS Lesão (mm) Células 1.0 0.5 * * * 2 4 * 0.0 0 6 8 semanas após infecção Figura 17: Tratamento de camundongos selvagens, infectados com L. major, com células purificadas da medula óssea. Grupos de camundongos C57BL/6 (n=5 por grupo) foram infectados com L. major (1x106) e simultaneamente tratados com injeção, pela via endovenosa, com células purificadas (10x106/por injeção). Os animais receberam mais duas injeções de células semanalmente. As lesões foram acompanhadas por oito semanas e medidas semanalmente com paquímetro. *representa p<0,05 referente ao teste t de Student. 64 4.2.8 Análise da diferenciação, in situ, das células mononucleares purificadas da medula óssea nas lesões cutâneas de camundongos infectados com L. major Para avaliar a diferenciação das células purificadas da medula óssea, nós construímos um modelo na leishmaniose experimental para avaliar a diferenciação de células purificadas da medula óssea in situ. Dessa forma, infectamos animais selvagens com L. major e após duas semanas de infecção transferimos células purificadas da medula óssea. O fenótipo das células das lesões foi analisado 24 horas e sete dias após a transferência. Após 24 horas da transferência, as células permanecem com o fenótipo similar antes da transferência (CD11clo). Entretanto, após sete dias da transferência, as células transferidas estavam diferenciadas em células dendríticas (CD11c high) (Figuras 18A e B). Para avaliar o efeito da diferenciação das células purificadas da medula óssea nos camundongos TNFR1 KO infectados, infectamos camundongos selvagens CD45.1 e após duas semanas, transferimos células CD11b+ purificadas da medula óssea de doadores CD45.2 TNFR1+/+ e TNFR1KO. Após sete dias da transferência, o local de lesão e linfonodos drenantes foram analisados e a população de células transferidas marcadas para células dendríticas. Nossos resultados mostraram que não houve influência significativa do receptor 1 do TNF-α na diferenciação das células purificadas da medula óssea em tipos de células dendríticas (CD11c+ e MHCII+) nas lesões de animais infectados (Figuras 19A e B) 65 A B 24 horas Infectado + células Infectado Infectado + células CD45.2 Infectado 7 dias Ly6C 10.8% CD11c CD11c CD45.1 62.2% Ly6C Figura 18: Modelo para análise da diferenciação de células purificadas da medula óssea em células dendríticas in vivo. Grupos de camundongos selvagens CD45.2+ (n=3) foram infectados com L. major de forma intradérmica na orelha (1x106). Após duas semanas de infecção, grupos de camundongos receberam, de forma endovenosa, uma injeção com células de camundongos CD45.1+ purificadas da medula (10x106/50µL/camundongo) e o grupo controle PBS. Após 24 horas (A) e sete (7) dias (B) da transferência, as lesões foram coletadas e analisadas para marcadores de monócitos e células dendríticas (Ly6C e CD11c) por citometria. Foram analisados 100.000 eventos por amostra. Os plots são representativos de gates originários de populações de células vivas e CD11b+ . Os resultados mostrados são representativos de quatro experimentos independentes. 66 A + PBS 0% 0.9 % + células TNFR1 KO % de células CD11c+ e MHCII+ CD45.1 + células TNFR1+/+ 100 0.3 % n.s. 80 60 40 20 0 + células TNFR1+/+ + células TNFR1 KO CD45.2 Figura 19: Análise da participação do TNFR1 na diferenciação de células purificadas da medula óssea em células dendríticas in situ. Grupos de camundongos selvagens CD45.1+ foram infectados com L. major por via intradérmica na orelha (1x106). Após duas semanas de infecção, grupos de animais (n=3por grupo) receberam, por via endovenosa, células CD11b+TNFR1+/+ ou CD11b+TNFR1KO, todas de camundongos CD45.2+, purificadas da medula óssea. Sete dias após a transferência, as lesões foram coletadas e a população transferida analisada para marcadores de células dendríticas (CD11c+ e MHCII+). Em (A), representa-se a população de células TNFR1+/+ e TNFR1KO CD45.2+ localizada na lesão e em (B) representa-se a população CD11c+ e MHCII+ na população transferida após 7 dias da transferência. Foram analisados 100.000 eventos por amostra. Os plots são representativos de gates originários de populações de células vivas e CD11b+. *representa p<0,05 pelo t de Student. Os resultados mostrados são representativos de dois experimentos independentes. 67 4.2.9 Avaliação do perfil de células produtoras de citocinas nas lesões de animais infectados e tratados com células mononucleares purificadas da medula óssea Células do infiltrado inflamatório de animais TNFR1 KO infectados foram coletadas e analisadas para a produção de citocinas após a transferência de células purificadas da medula. Nossos resultados mostraram que após sete dias da transferência, as lesões dos animais TNFR1 KO tratados com as células de medula apresentaram uma menor porcentagem de células T CD8+ produtoras de IFN-γ e também menor porcentagem de células T CD4+ e T CD8+ produtoras de TNF-α quando comparadas às lesões dos animais tratados com PBS (p<0.05). Não houve diferença significativa na produção de TNF-α em células CD11b+ dos animais recipientes entre os grupos (Figura 20A a C). 68 A B Infectado + células Infectado Infectado + células Infectado 3.8% 31% 1.8% 31% TNF-α IFN-γ * CD4 CD4 2.7% 9.9% 0.9% 4.1% * * CD8 C CD8 Infectado 6.1% TNF-α 7.5% Infectado + células CD11b Figura 20: Análise das células produtoras de citocinas nas lesões de camundongos TNFR1 KO infectados com L. major e tratados com células purificadas da medula óssea. Grupos de camundongos (n=3 por grupo) TNFR1 KO foram infectados com L. major por via intradérmica na orelha (1x106). Após duas semanas de infecção, grupos de animais receberam, por via endovenosa, células CD11b+ TNFR1 KO purificadas da medula óssea (10x106/camundongo). Sete dias após a transferência dessas células os camundongos foram sacrificados, as células das lesões foram coletadas, estimuladas com brefeldina A e ionomicina, marcadas e analisadas por citometria para produção de citocinas IFN-γ e TNF-α. (A) análise de IFN-γ na população de células TCD4+ e TCD8+ (CD11b-) da lesão de camundongos infectados por L. major e tratados com células da medula óssea; (B) representa a análise de TNF-α na população de células TCD4+ e TCD8+ (CD11b-) das lesão de camundongos infectados com L. major e tratados com células da medula óssea; (C) representa a análise de células TNF-α+ na população de células CD11b+ das lesões de camundongos infectados com L. major e tratados com células da medula óssea. Foram analisados 100.000 eventos por amostra. *representa p<0,05 pelo t de Student Os resultados mostrados são representativos de dois experimentos independentes. 69 DISCUSSÃO 70 5. DISCUSSÃO 5.1 O modelo A infecção por parasitas do gênero Leishmania pode gerar lesões cutâneas autolimitadas e que podem cicatrizar espontaneamente. Entretanto, aproximadamente 3% dos indivíduos que obtiveram cura espontânea ou farmacológica da primeira infecção desenvolvem muitos anos depois, lesões ulcerativas que atingem e destroem as regiões das mucosas causando morbidade, estigma social e em alguns casos a morte do individuo afetado. O tratamento para esses tipos de lesões é complicado pela difícil cicatrização e pelas mutilações ocorridas nessas regiões acometidas como a região nasofaringe (Amato e cols., 2003; Amato e cols., 2008). Outro desafio, no âmbito do estudo da leishmaniose mucocutânea, é ausência de um modelo experimental bem estabelecido que simule as características apresentadas nas lesões em humanos e também que seja de fácil manejo laboratorial. Neste trabalho caracterizamos as lesões cutâneas crônicas de camundongos TNFR1 KO e mostramos que as características descritas coincidem com as encontradas nas lesões de humanos. Além disso, na vertente da medicina regenerativa, as terapias celulares, nos últimos anos, mostraram um grande potencial no tratamento de doenças crônicas. Existem poucos estudos que elucidam os benefícios da terapia celular e nesse seguimento, nossa proposta é tratar as lesões crônicas dos animais TNFR1 KO com células mononucleares provenientes da medula óssea. A leishmaniose mucocutânea é causada por L. braziliensis, L. guyanensis (Marsden, 1994; Guerra e cols., 2011) ou L. amazonensis (Junqueira e cols., 2003). Nesse trabalho, nós infectamos os camundongos TNFR1 KO com L. major em continuação aos trabalhos iniciados por Vieira e colaboradores (1996). Resultados de nosso laboratório tem mostrado que a infecção de camundongos TNFR1 KO por L. braziliensis ou L. amazonensis reproduz o mesmo fenótipo de quando estes animais são infectados com L. major na manutenção das lesões cutâneas por mais de 10 semanas de infecção e o controle do parasitismo no local, similar às lesões dos animais selvagens 71 (comunicação pessoal entre os integrantes do laboratório de Gnotobiologia e Imunologia Matheus Heitor Carneiro, Leonardo Vaz e Paula Melo Seixas sobre projetos em desenvolvimento no presente momento de infecção dos camundongos TNFR1 KO com outras espécies de Leishmania, 2011-2012). Os resultados mostraram que as lesões cutâneas desenvolvidas nos camundongos TNFR1 KO não disseminam para tecidos de mucosas, como relatado nos pacientes que desenvolvem a forma mucocutânea. A causa do desenvolvimento das lesões nas mucosas dos pacientes ainda não é conhecida, mas alguns fatores, como a espécie da Leishmania e a genética do individuo infectado, parecem ser cruciais nessa forma de manifestação da doença. Por isso, essas informações podem ser usadas para explicar o não acometimento das mucosas em camundongos TNFR1 KO infectados. O fato de camundongos TNFR1 KO não desenvolverem lesões invasivas nas mucosas no nosso modelo pode ser explicado pelo fato de a L. major não ser a causadora dos casos de leishmaniose mucocutânea. É conhecido que espécies de Leishmania que causam a forma mucocutânea podem estar infectadas por certos tipos de vírus e essa pode ser uma característica particular que está correlacionada ao desenvolvimento das lesões crônicas nos pacientes e em camundongos (Ives e cols., 2011). Outro fator relevante pode estar ligado ao hospedeiro. Apesar dos poucos relatos do acometimento de regiões de mucosas em camundongos infectados com Leishmania, foi mostrado que espécies de Leishmania causadoras da forma mucocutânea invadiram tecidos de mucosas de cobaias (Zeledon e cols., 1982). Outros estudos envolvendo Leishmania braziliensis infectadas ou não com vírus, serão conduzidos por nosso grupo para avaliar o acometido de mucosas nos camundongos TNFR1 KO. Os dados mostram, para o modelo murino da leishmaniose mucocutânea, que as lesões crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados com L. major são persistentes devido à permanência de um processo inflamatório com alta expressão de IFN-γ, TNF-α e IL-17. Este infiltrado inflamatório é rico de células T CD8+ e neutrófilos. Outros dados mostraram que o perfil inflamatório local nos camundongos TNFR1 KO é caracterizado por baixa taxa de apoptose e expressão de IL-4 (Oliveira e cols., 2012), IL- 72 10 e FoxP3, em período mais avançado da infecção, quando comparados aos animais selvagens C57BL/6. Esses dados se mostram interessantes quando comparados com o perfil de humanos acometidos pela forma mucocutânea: as lesões são crônicas apresentam baixo parasitismo no local de lesão (Amato e cols., 2003 ; Amato e cols., 2008), altos níveis de IFN-γ, TNF-α e presença de IL-17 (Castes e cols., 1993; Bacellar e cols., 2002); um infiltrado inflamatório rico em linfócitos e polimorfonucleares (Barral-Neto e cols., 1995; Boaventura e cols., 2010); e defeitos na regulação do processo inflamatório na lesão (Faria e cols., 2005). Sobre o controle do parasitismo local nas lesões cutâneas de camundongos infectados sabe-se que a resolução do crescimento de L. major em camundongos é mediada por óxido nítrico produzido por óxido nítrico sintase 2 (NOS2), que é induzida por IFN-γ e TNF-α (Liew e cols., 1990; Cunha e cols., 1992). O fato de os camundongos TNFR1 KO apresentarem alta produção de TNF-α e IFN-γ nas lesões os torna aptos a controlar o parasitismo local. O TNF-α induz a produção de óxido nítrico via TNFR1, sugerindo que a indução de NOS2 observada nesses animais é proveniente de uma via alternativa como de sinalização via CD40/CD40L. Dessa forma, como previamente descrito (Vieira e cols., 1996; Nashleanas e cols., 1998), a persistência das lesões não é devido à carga parasitária nas lesões cutâneas nos camundongos TNFR1 KO infectados. O TNF-α é um dos primeiros fatores que medeiam à infiltração de células para o sítio de infecção, estando muitas vezes associado ao dano tecidual (Malek e cols., 1998). Em contrapartida, foi mostrado em infecções por outros patógenos que camundongos TNFR1 KO não controlam o infiltrado inflamatório e a lesão tecidual (Yap e cols., 1998; Kanaly e cols., 1999; Di Genaro e cols., 2007; Eliçabe e cols., 2010). Entretanto, em outro modelo, o murino de encefalomielite por HSV-1, camundongos TNFR1 KO apresentam pequeno infiltrado inflamatório e pequena lesão, como consequência da ausência das células na lesão (Vilela e cols., 2010). Nossos resultados mostraram que camundongos TNFR1 KO apresentam um infiltrado inflamatório exacerbado e permanente após quinze semanas de infecção quando comparados aos animais 73 selvagens, o que pode ser explicado pelos altos níveis de CCL2 e CCL5 detectados nas lesões cutâneas destes animais também na décima quinta semana de infecção. Não observamos aumento de outras quimiocinas nas lesões dos camundongos TNFR1 KO em comparação aos animais selvagens quando infectados com L. major (dados não mostrados). CCL2 e CCL5 são quimiocinas importantes na migração de monócitos, macrófagos, células T e células NK em locais de lesão (Allavena e cols., 1994; Ritter & Moll, 2000; Oghumu e cols., 2010). Dessa forma, podemos explicar o grande acúmulo de células nas lesões ao aumento da expressão dessas duas quimiocinas. Os resultados mostraram que o infiltrado inflamatório de células T CD8+ e neutrófilos é persistente nos camundongos TNFR1 KO infectados quando comparados aos animais selvagens. m camundongos, os linfócitos T CD8+ são essenciais para o controle da infecção primária com atividade importante contra células que apresentam antígeno de Leishmania (Stern e cols., 1998; Tsagozis e cols., 2003; Stager e cols., 2010). No nosso trabalho relacionamos a persistência das lesões cutâneas nos animais TNFR1 KO com a manutenção das células T CD8+ no infiltrado inflamatório, sugerindo um provável papel destas células na manutenção das lesões. Esse é um fato interessante, quando correlacionado ao envolvimento das células T CD8+ nas lesões mucocutâneas em humanos, uma vez que alguns trabalhos relacionam a presença destas células com a persistência das lesões crônicas nessa forma da doença (Barral-Netto e cols., 1995; Brodskyn e cols., 1997). Foi mostrado que T CD8+, obtidas do sangue de indivíduos não infectados, quando estimuladas in vitro com antígeno de L. amazonensis, expressam marcadores de ativação de superfície e maior produção de IFN-γ que células T CD4+ (Pompeu e cols., 2001). Outros estudos mostraram que as células mononucleares do sangue provenientes de pacientes com leishmaniose mucocutânea apresentam maior atividade citotóxica mediada por células NK e células T CD8+ (Brodskyn e cols., 1997). Um maior recrutamento de linfócitos T CD8+ expressando granzima A está associado à progressão desta doença (Faria e cols., 2009). Podemos, assim, supor que o papel destes linfócitos é a produção de IFN-γ, TNF-α e IL-17, embasados em alguns trabalhos que 74 mostram a importância dos mesmos na manutenção da inflamação em infecção por Leishmania (Vargas-Inc e cols., 2008; Boaventura e cols., 2010). Outros dados interessantes foram à persistência de neutrófilos e a maior expressão de IL-17 nas lesões crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados quando comparados aos animais selvagens. A presença de IL-17 em altos níveis está associada ao desenvolvimento e progressão de lesões em doenças crônicas em modelos experimentais e em humanos. Um dos mecanismos de ação da IL-17 nas lesões crônicas está ligado ao recrutamento de neutrófilos para as lesões (Hemdan e cols., 2010). Camundongos BALB/c quando infectados com L. major apresentavam lesões progressivas associadas a maior concentração de IL-17. Quando o gene para IL-17 foi deletado esses camundongos infectados com L. major não apresentaram mais lesões progressivas. Esses dados sugerem que a presença de IL-17 era responsável por um número maior de neutrófilos nas patas, e, como consequência, maiores lesões (Lopez e cols., 2009). Em humanos, estudos mostraram que pacientes com a forma mucocutânea da leishmaniose apresentam maior infiltrado celular, em especial de neutrófilos, nas áreas de nasofaringe, quando comparados àqueles que foram tratados com fármacos anti-Leishmania (Guerreiro e cols., 2000). Foi descrito que pacientes com a leishmaniose mucocutânea apresentam expressão de IL-17 por células T CD4+, T CD8+ e CD14+ nas lesões (Bacellar e cols., 2009; Boaventura e cols., 2010). Boaventura e colaboradores (2010) mostraram que as lesões de pacientes com a leishmaniose mucocutânea apresentam infiltradas de neutrófilos positivo para elastase, mieloperoxidase e MMP-9, que estão relacionados com dano tecidual nos pacientes infectados com L. braziliensis que desenvolveram a leishmaniose mucocutânea. Outros estudos mostraram que a indução de MMP-9 na infecção por L. braziliensis está relacionada às lesões mucocutânea (Maretti-Mira e cols., 2011). Dessa forma, a persistência de IL-17 e neutrófilos nas lesões dos camundongos TNFR1 KO sugerem que ambos são fatores importantes na persistência das lesões cutâneas crônicas. Em resumo, a persistências das lesões nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major, poderia estar associada a um processo inflamatório intenso caracterizado 75 por uma resposta do tipo Th1 e Th17, assim como relatados nas lesões em humanos com a leishmaniose mucocutânea (Amato e cols., 2003; Antonelli e cols., 2004; Silveira e cols., 2004; Faria e cols., 2005; Gaze e cols., 2006; Amato e cols., 2008; Bacellar e cols., 2009; Boaventura e cols., 2010) e outros tipos de lesões crônicas em modelo experimentais em camundongos (Sarkar e cols., 2009; Ma e cols., 2010; Batoulis e cols., 2011; Grigorian e cols., 2011; Kroenke & Segal, 2011; Postigo e cols., 2011). Para outros tipos celulares, como macrófagos (F4/80), nós observamos um número similar entre o camundongo selvagem e o animal TNFR1 KO. Entretanto, a presença de células dendríticas nas lesões parece ser importantes em processos de regulação da inflamação nas lesões cutâneas crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major como iremos discutir adiante. Uma das formas de regulação do processo inflamatório pode ser realizada eliminando-se células inflamatórias, por apoptose. Trabalhos indicam que a apoptose de células inflamatórias na leishmaniose experimental é um fator importante para o controle do desenvolvimento das lesões (Desbarats e cols., 2000; Savill e cols., 2002). Nós mostramos que as lesões crônicas dos camundongos TNFR1 KO apresentam menor taxa de apoptose, quando comparadas aos animais selvagens, sugerindo que esse é um processo importante para eliminação das células inflamatórias das lesões e manutenção das lesões (Oliveira e cols., 2012). Outro fator interessante é que as lesões de camundongos selvagens e TNFR1 KO em fases iniciais da infecção apresentam números similares de células dendríticas. Já na sexta semana (fase crônica) o número de células dendríticas em camundongos TNFR1 KO foi baixo, quando comparados aos animais selvagens. Trabalhos mostram a importância do TNF-α para induzir a migração e a maturação de células dendríticas (Ritter e cols., 2008; Wiethe e cols., 2008; De e cols., 2009; Vohra e cols., 2010; Ding e cols., 2011), dessa forma podendo contribuir para o reparo tecidual. Assim, a ausência de seu principal receptor nos camundongos em estudo constitui um empecilho para eliminação das células inflamatórias via sinalização por TNF-α. (Allenbach e cols., 2006; Richter & Topham, 2007; Allenbach e cols., 2008). Dessa forma, a não 76 eliminação das células inflamatórias não permite o estabelecimento de tipos celulares importantes para o reparo tecidual. A regulação da resposta imune na lesão cutâneas é importante para estabelecimento da homeostase (Belkaid & Rouse, 2005; Belkaid e cols., 2006; Belkaid e cols., 2007). Células dendríticas são tipos celulares importantes para manutenção e regulação da integridade de tecidos cutâneos. Na imunologia de pele, as células dendríticas são participantes importantes de processos de captura de antígeno presentes nesses tecidos e ativação da resposta imune adquirida. Outro fato importante desse processo é a participação de células dendríticas nos processos de reparo tecidual com ativação de linfócitos T regulatórios, com produção de citocinas anti-inflamatórias (IL10), que migram para os tecidos cutâneos mantendo ou restabelecendo a integridade tecidual durante a inflamação (Chu e cols., 2011). Assim sendo, a presença de células dendríticas e fatores anti-inflamatórios são importantes para regulação da resposta inflamatória intensa nas lesões cutâneas. Leon e colaboradores (2007) mostraram, no modelo de infecção por L. major, que as células dendríticas derivadas de monócitos provenientes da circulação, diferenciam-se no local de lesão, migram para linfonodos drenantes e atuam na ativação de células T CD4+ para produção de IFN-γ e consequente controle do parasitismo local. Nossos resultados mostraram que as lesões crônicas de camundongos TNFR1 KO apresentam menores porcentagens de subtipos de células dendríticas (Ly6C+ e CD11c+ e CD11c+ e MHCII+) quando comparadas às lesões dos camundongos selvagens. Esses resultados podem ser explicados pela importância do TNF-α na indução de migração de células dendríticas para lesão ou na participação do TNFR1 para diferenciação de monócitos em células dendríticas (Van Lieshout e cols., 2005). Entretanto, esses resultados sugerem que na infecção cutânea do camundongo selvagem a migração destas células pode ser importante no reparo tecidual via ativação de linfócitos T FoxP3+ e produtores de IL-10. Coerentemente, os camundongos TNFR1 KO apresentam números baixos de células dendríticas (Ly6C+ e CD11c+; CD11c+ e MHCII+) nas lesões e menor expressão de IL-10 e FoxP3. Esses dados sugerem que a participação de células dendríticas na infecção cutânea dos camundongos TNFR1 KO 77 pode estar relacionada à ativação de células T regulatórias produtoras de IL-10, importante em reações anti-inflamatórias. Esse conjunto de dados mostra que as lesões persistentes dos camundongos TNFR1 KO são dependentes da persistência do infiltrado inflamatório exacerbado predominante de células T CD8+, neutrófilos e falha na regulação desse infiltrado inflamatório via apoptose e mecanismos de regulação dependente de ativação de células regulatórias por células dendríticas. Dessa forma, apesar da ausência de acometimento das mucosas, essas características da infecção e desenvolvimento da patogênese das lesões cutâneas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major coincidem com as características descritas nas lesões crônicas dos pacientes com a leishmaniose mucocutânea (Tabela 2). Esse modelo em camundongo pode servir para estudos da patologia, terapias farmacológicas e biotecnológicas, para a leishmaniose mucocutânea. 78 Tabela 2: Características comuns descritas entre as lesões cutâneas de pacientes com leishmaniose mucocutânea e as lesões crônicas desenvolvidas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major Características Leishmaniose mucocutânea Referências Jones e cols., 1987; Amato e cols., 2003; Amato e cols., 2008 Camundongos TNFR1 KO infectados com L. major Lesões cutâneas crônicas Sim Sim Infiltrado inflamatório intenso nas lesões crônicas Sim Guerreiro e cols., 2000; Carvalho e cols., 2007 Sim Carga parasitária baixa nas lesões Sim Amato e cols., 2003; Amato e cols., 2008 Sim Altos níveis de IFN-γ e TNF-α nas lesões Sim Castes e cols., 1993; Da-Cruz e cols., 1996; Blackwell e cols., 1999; Gaze e cols., 2006; Bacellar e cols., 2002 Defeito na regulação da resposta imune inflamatória nas lesões Sim Faria e cols., 2005 Sim Sim Barral e cols., 1995; Brodskyn e cols., 1997; Guerreiro e cols., 2000; Faria e cols., 2009; Boaventura e cols., 2010 Sim Presença de altos números de células TCD8+ e neutrófilos nas lesões Presença de IL-17 Sim Destruição de cartilagens Sim Invasão dos tecidos de mucosas Sim Barcelar e cols., 2009; Boaventura e cols., 2010 Jones e cols., 1987; Guerreiro e cols., 2000; Maretti-Mira e cols., 2011 Jones e cols., 1987; Amato e cols., 2003; Amato e cols., 2008 Sim Sim Sim Não 79 5.2. Transferência de células da medula óssea A segunda parte desse trabalho foi o teste e caracterização do efeito da terapia celular nas lesões cutâneas crônicas nos camundongos TNFR1 KO infectados por L. major. O tratamento para a leishmaniose mucocutânea é realizado pela administração de fármacos como o antimônio pentavalente (Amato e cols., 2007). Essa terapia farmacológica causa morte do parasita pelo fármaco, sugerindo que a eliminação dos parasitas é importante para a cura das lesões. Entretanto, apesar do baixo número de parasitas nas lesões dos pacientes com a forma mucocutânea, as lesões persistem (Carvalho e cols., 2007). Interessante notar que a melhora das lesões induzida pelo tratamento farmacológico da leishmaniose mucocutânea também reflete e está associada à diminuição de tipos específicos de células do infiltrado inflamatório, como, por exemplo, das células T CD4+, T CD8+ IFN-γ+ e TNF-α+ e neutrófilos (Guerreiro e cols., 2000; Amato e cols., 2003; Amato e cols., 2007). Esses dados sugerem que os diferentes tipos celulares presentes nas lesões mucocutâneas são importantes para o progresso da cura ou permanência das lesões nos pacientes acometidos. Entretanto, outros dados mostram que o uso prolongado de medicamentos anti-Leishmania podem induzir resistência ao fármaco, ocasionando falha do tratamento ou novo aparecimento das lesões, com seu infiltrado inflamatório típico (Grogl e cols., 1992; Ait-Oudhia e cols., 2011a; Ait-Oudhia e cols., 2011b.). Dessa forma, novas propostas de terapias alternativas, com o intuito de modular a resposta imune inflamatória intensa nas lesões da leishmaniose mucocutânea, são necessárias. Na vertente da medicina regenerativa, recentemente, trabalhos têm mostrado o uso das terapias celulares, com células originadas da medula óssea autóloga, para o reparo tecidual no tratamento de doenças crônicas (Fassas & Kazis, 2003; Annaloro e cols., 2009; Sullivan e cols., 2010; Ou-Yang e cols., 2012). A medula óssea é um tecido rico de tipos celulares importantes, como células indiferenciadas da linhagem hematopoiética. Quando utilizadas de forma terapêutica, participam de mecanismos de 80 reparo tecidual em injúrias (Soares & Santos, 2009; Deng e cols., 2011; Kang e cols., 2011; Van e cols., 2011; Pai e cols., 2012). Em especial em doenças crônicas degenerativas ocasionadas por agentes infecciosos, os resultados mostraram que camundongos infectados com T. cruzi ou S. mansoni apresentavam melhoras e reparo tecidual nos órgãos afetados pela doença, como o coração e fígado lesionados, respectivamente, após o tratamento com células purificadas de medula óssea. Esse processo de reparo foi correlacionado com a chegada das células da medula óssea (GFP + transferidas por via endovenosa) no local de lesão (Soares e cols., 2004; Oliveira e cols., 2008). Baseado nesses relatos e dispondo do modelo para lesões crônica cutâneas da leishmaniose, foi avaliado o potencial da terapia celular na leishmaniose. Nossos resultados mostram que camundongos TNFR1 KO infectados quando tratados com preparações enriquecidas de células mononucleares purificadas da medula óssea (que contém porcentagem reduzida de células Ly6G+) apresentam lesões menores quando comparados aos animais que receberam PBS. Esse controle das lesões crônicas está correlacionado com a chegada e diferenciação em células dendríticas nas lesões e aumento da resposta anti-inflamatória. Esses resultados podem ser explicados pela importância de células dendríticas na estimulação de respostas anti-inflamatórias para o controle da inflamação crônicas. Soares e colaboradores (2004) mostraram que tratamentos com células purificadas da medula óssea autóloga são capazes de induzir apoptose das células do infiltrado inflamatório na cardiopatia crônica induzida pela infecção T. cruzi e esse fato está relacionado e sugere que a melhora da cardiopatia desenvolvida nos camundongos é pela substituição e diferenciação das células transferidas em células do músculo cardíaco. Nos nossos resultados, as reduções das lesões não alteraram o número total de células do infiltrado inflamatório, como o esperado, baseado nos achados do modelo de infecção por T. cruzi (dados não mostrados). Porém, as reduções das lesões estão associadas com a migração das células transferidas para o local, diferenciação em células CD11c+, são tipos de células importantes no controle das lesões crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados. Nos animais tratados houve redução no número 81 de células polimorfonucleares e da expressão de IL-17; da mesma forma aumento de IL10. Dessa forma, os resultados sugerem uma mudança no perfil das células inflamatórias nas lesões dos camundongos TNFR1 KO infectados, após o tratamento com as células mononucleares, sendo importante no processo de reduções das lesões crônicas. Nós investigamos a participação da ausência do receptor 1 do TNF-α nas células transferidas na diferenciação das células dendríticas nas lesões dos camundongos TNFR1 KO. O receptor 1 do TNF-α apresenta diferentes funções na resposta à sinalização a essa citocina, como apoptose e diferenciação celular (Vujanovic e cols.., 2010). O TNF-α é importante para a diferenciação de monócitos em células dendríticas, bem como exerce importante função na migração dessas para a lesão em camundongos infectados por L. major, refletindo na susceptibilidade desses animais a infecção (Baldwin e cols., 2004; Van Lieshout e cols, 2005). No modelo de infecção por L. major nós avaliamos a influência do TNFR1 na diferenciação celular após a transferência de células purificadas da medula óssea em animais infectados. Nossos resultados mostraram que o TNFR1 não exerceu influência significativa na diferenciação das células da medula óssea em células CD11c+ e MHCII+ in vivo no modelo de infecção por L. major. Assim não houve diferenças entre a presença ou ausência do TNFR1 no efeito do controle das lesões nos tratamentos dos camundongos TNFR1 KO infectados que avaliamos. Esses dados sugerem que o processo de diferenciação das células da medula óssea em células dendríticas é similar em animais selvagens e animais TNFR1 KO. Dessa forma, em concordância com os dados que obtivemos do perfil de células dendríticas das lesões de TNFR1 KO, acredita-se que a manutenção da migração e funções desse tipo celular nas lesões é importante para a redução das lesões. De forma similar, Leon e colaboradores (2007) mostraram que camundongos BALB/c infectados com L. major, que apresentam lesões cutâneas não cicatrizantes e ulcerativas, em comparação aos animais C57BL/6, apresentam menor migração de monócitos e diferenciação de células dendríticas para as lesões. O mesmo nós descrevemos com esses camundongos infectados com L. mexicana (Manuscrito em redação: “Leishmania mexicana induces limited recruitment and activation of monocytes and monocyte- 82 derived dendritic cells early during infection” Patricia M. Petritus; Daniel Manzoni-deAlmeida; Ciara Gimblet; Cláudia Gonzales Lombana; Phillip Scott). É interessante notar que trabalhos mostraram que camundongos BALB/c infectados com L. major e tratados com células dendríticas apresentaram melhor proteção contra a infecção e reduções das lesões cutâneas (Remer e cols., 2007; Remer e cols., 2010). A correlação desse conjunto de informações sugere que a “reposição” ou inserção de células dendríticas nas lesões pode induzir um processo de redução das lesões. As lesões de pacientes que desenvolvem a forma mucocutânea da leishmaniose são ricas de um infiltrado inflamatório com células T CD4+, T CD8+ e neutrófilos, citocinas TNF-α, IFN-γ e IL-17 e apresentam baixa regulação da inflamação via IL-10, uma vez que apresentam baixa expressão do receptor de IL-10 nos leucócitos, diferentemente das lesões auto-limitantes da leishmaniose cutânea (Amato e cols., 2003; Faria e cols., 2005; Amato e cols., 2008). Esses relatos sugerem a importância dos tipos celulares que povoam e persistem no infiltrado inflamatório dessas lesões cutâneas para o desenvolvimento ou do reparo das injúrias teciduais. O infiltrado inflamatório nas lesões de camundongos TNFR1 infectados por L. major são ricos de neutrófilos, células T CD8+, TNF-α e IFN-γ (Oliveira e cols., 2012). Os resultados mostraram, ainda, que as lesões dos camundongos TNFR1 KO apresentam alta expressão de IL-17 e apresentam baixa porcentagem de células dendríticas (CD11c+ e Ly6C+ e CD11c+ e MHCII+) em comparação com aos animais selvagens. Outros estudos de doenças crônicas de pele em humanos, como a psoríase, relatam a correlação da presença de neutrófilos com o dano tecidual desenvolvido (Lin e cols., 2011). Nos mesmos relatos dos mecanismos imuno patológicos da psoríase foi destacada a importância de células dendríticas no controle do processo inflamatório das lesões (Schmid e cols., 1994; Gilliet e cols., 2004.). Da mesma forma, a gama de células dendríticas residentes ou que migram para a pele em processos inflamatórios, como na hipersensibilidade tardia são fatores no processo de reparo tecidual (Bennet e cols., 2007; Kaplan e cols., 2008; Martin & Jakob, 2008). Sabe-se que nos modelos de infecção por L. major um infiltrado inflamatório rico em monócitos, macrófagos e 83 células dendríticas é importante para resistência à infecção em camundongos C57BL/6 (Leon e cols., 2007; Gonçalves e cols., 2011), além disso, outros relatos mostram que um infiltrado rico em neutrófilos está correlacionado ao desenvolvimento de lesões e à suscetibilidade a infecção (McFalane e cols., 2008). Em humanos acometidos pela forma mucocutâneo da leishmaniose a presença de neutrófilos e MMP-9 estão associadas ao dano tecidual desenvolvido nas lesões (Boaventura e cols., 2010; Marretti-Mira e cols., 2011). De forma contrária, trabalhos mostram que células dendríticas residentes da pele são importantes fatores no desenvolvimento da resposta imune efetiva ou reparo tecidual por diferentes mecanismos, como por exemplo, induzindo processos anti-inflamatórios (Sullivann e cols., 1986; Merad e cols., 2004.). Esses dados sugerem que em humanos e no modelo experimental os neutrófilos são células importantes na patogênese das lesões cutâneas da leishmaniose. Entretanto, células dendríticas podem ser importantes células do infiltrado inflamatório que trabalham no processo do reparo tecidual nas lesões cutâneas crônicas. Dessa forma, a chegada das células transferidas e diferenciação em células dendríticas nas lesões sugerem a importância de células dendríticas no controle das lesões crônicas nos camundongos TNFR1 KO. Células dendríticas podem estimular a resposta imune mediada por células T. Relatos mostram que a as células dendríticas podem induzir ativação de diversas populações de células T induzindo resposta pró-inflamatória ou anti-inflamatória (Geissmann e cols., 2010). Os resultados mostraram que o tratamento com preparações enriquecidas com células mononucleares purificadas da medula óssea reduziu a lesão crônica de camundongos TNFR1 KO infectados com L. major. Interessante que a redução das lesões correlaciona-se com a chegada das células de medula óssea ao local da inflamação, com a sua diferenciação em células dendríticas e o aumento de processo anti-inflamatório como maior expressão de IL-10 nas lesões e diminuição de fatores inflamatórios como presença de polimorfonucleares, IL-17 e células T CD8+IFN-γ+. As células dendríticas CD11c+ e MHCII+ podem ser diferenciadas de monócitos (CD11b+, CD11c-, Ly6C+, CD115+, Ly6G-) originados da medula óssea (Serbina e cols., 2008; Geissmann e cols., 2010; Liu e cols., 2010). Monócitos são células presentes em grande 84 quantidade na medula óssea e são originadas de células-tronco precursoras da linhagem hematopoiética (células c-kit+) (Geissman e cols., 2010; Shi e cols., 2010). Essas células não são dotadas da capacidade de captura, processamento, apresentação de antígeno e ativação de células T CD4+ via MHCII e moléculas co-estimulatórias (CD80, CD86 e CD40), como as células dendríticas e macrófagos (Kim e cols., 2011; Gregory e cols., 2012), importantes na geração da resposta Th1 para eliminação dos parasitas intracelulares como Leishmania (Leon e cols., 2007; Dos Santos e cols., 2008; Gonçalves e cols., 2011); o mecanismo de ação dessas células, em modelo de infecção por bactérias, fungo e vírus, consiste em migrar do sangue periférico para as lesões para diferenciação em células dendr(Crane e cols., 1999; Serbina e cols., 2008; Osterholzer e cols., 2009). Na leishmaniose, ainda não é claro se os monócitos indiferenciados ganham os locais de lesão via CCR2, como em outros modelos. Foi íticas para execução da função de ativação da resposta imune mediada por células T descrito, que na leishmaniose cutânea experimental a migração de monócitos para lesão e ativação específica da resposta Th1 e a eliminação do parasitismo local (com a morte intracelular do parasita por mecanismos via superóxido) são associadas à resistência a infecção por L. major (Gonçalves e cols., 2011). Interessantemente, Gonçalves e colaboradores (2011) mostraram que camundongos deficientes de CCR2 apresentam lesões maiores e suscetibilidade quando infectados por L. major, sugerindo a importância da migração de monócitos Ly6C+ para a lesão via mecanismos de passagens de monócitos circulantes do sangue para as lesões. Células Ly6C+ apresentam diferentes funções em processos inflamatórios. É conhecido que células Ly6Chigh presentes no sangue entram nas lesões, diferenciam em células dendríticas inflamatórias, participando da geração da resposta Th1, entretanto células Ly6Clo infiltram nas lesões diferenciando-se em células apresentadoras de antígeno que participam de processos de reparo tecidual (Nahrendorf e cols., 2007; Dunay e cols., 2008; Geissmann e cols., 2010). As células CD11b+ e Ly6C+ induzem processos antiinflamatórios em lesões crônica (Garcia e cols., 2010; Zhu e cols., 2011). Zhu e colaboradores (2007) mostraram que células CD11b+ e Ly6C+ induzem a melhora das 85 lesões cerebrais de camundongos no modelo de encefalomielite aguda experimental (EAE), promovendo regulação negativa da co-estimulação em células T, sugerindo que esse tipo celular proveniente da medula óssea participa da regulação da resposta antiinflamatória em lesões crônicas. A participação de células CD11b+ e Ly6C+, com papel imunossupressor, nas lesões cutâneas da leishmaniose é ainda pouco esclarecida. Pereira e colaboradores (2011) mostraram que essas células são importantes para a morte do parasita, mas também para supressão da resposta de células T de forma e que ambos dependem de NO. Nossos resultados mostraram a relação direta da ausência de células dendríticas nas lesões crônicas com a reposição dessas células, o que pode induzir reduções significativas das lesões e aumento de IL-10. É interessante notar que trabalhos utilizando células dendríticas diferenciadas de células da medula óssea mostraram resultados terapêuticos promissores como vacinas celulares para estimulação da resposta imune com produção de IFN-γ e morte do parasita (Remer e cols., 2007; Remer e cols., 2010; Gonçalves e cols., 2011). Aqui, nós utilizamos “células imaturas” da linhagem hematopoiética que são incapazes de realizar ativação pela ausência de sistema coestimulador, podendo induzir tolerância e resposta imune anti-inflamatória importante para o reparo tecidual. Outro tipo celular importante relacionado ao dano tecidual das lesões de pacientes que que desenvolvem a leishmaniose mucocutânea e nas lesões de camundongos TNFR1 KO infectados são as células T CD8+ (Brodskyn e cols., 1997; Pompeu e cols., 2001; Oliveira e cols., 2012). Os resultados mostraram que após o tratamento com as células purificadas da medula óssea foi observada redução da porcentagem de células T CD8+ IFN-γ+ nas lesões de camundongos TNFR1 KO infectados. Entretanto, nós observamos aumento da expressão e concentrações de IFN-γ nas lesões e produção de citocinas por células dos linfonodos drenantes (ex vivo) dos animais tratados com as células em comparação aos animais não tratados. Esse fato pode ser explicado pela manutenção de células T CD4+ IFN-γ+ nas lesões dos animais tratados com PBS e tratados com células purificadas da medula óssea. Essa permanência e aumento da expressão e produção de IFN-γ pode ser correlacionada à não alteração da 86 carga parasitária nos animais tratados com as células da medula óssea, visto que animais TNFR1 KO infectados com L. major conseguem controlar o parasitismo via mecanismos alternativos de ativação de células apresentadores de antígeno por IFN-γ (Nashleanas e Scott, 2000). Os resultados também mostraram que após o tratamento com células purificadas da medula óssea houve redução de porcentagem de células T CD4+ e T CD8+ produtoras de TNF-α nas lesões de camundongos TNFR1 KO infectados. Entretanto, esses camundongos não respondem ao TNF-α via receptor 1. Dessa forma esses dados podem não explicar as reduções das lesões encontradas nos camundongos TNFR1 KO, mas tais resultados podem ser interpretados como importantes para a administração de células indiferenciadas da medula óssea e estimulação de processos anti-inflamatórios em tecidos danificados, mediados via TNF-α, como os relatados em pacientes acometidos pela forma mucocutânea da leishmaniose (Da-Cruz e cols., 1996; Blackwell, 1999; Menges e cols., 2002) A redução das lesões cutâneas nos camundongos TNFR1 KO infectados com L. major e tratados com células da medula óssea pode ser explicada pela correlação da redução da expressão de IL-17 e o menor número de células polimorfononucleares e aumento da expressão de IL-10 nas lesões. Sabe-se que uma das ações da IL-17 é o recrutamento de células polimorfonucleares, neutrófilos mais especificamente. Trabalhos recentes mostram que a ação de células Th17+ são controladas pela sinalização de IL-10 proveniente de células T regulatórias FoxP3+ (Chaudhry e cols., 2011; Huber e cols., 2011). Bai e colaboradores. (2009) mostraram que após o tratamento com células derivadas da medula óssea no modelo de encefalomielite crônica houve diminuição de células Th17+ e aumento de células produtoras de IL-4. Esses fenômenos estão associados à melhora das lesões cerebrais. Nossos dados mostraram que as lesões dos camundongos TNFR1 KO infectados com L. major após o tratamento com células purificadas da medula óssea apresentam menor expressão de IL-17 e maior expressão nas lesões e concentração de IL-10 produzida por células dos linfonodos drenantes estimuladas por antígeno. Entretanto, não observamos aumento da expressão 87 de FoxP3 nas lesões dos animais tratados com células purificadas da medula óssea. Outras análises da quantificação de células T regulatórias FoxP3+ e FoxP3- serão realizadas nas lesões e órgãos linfoides secundários, visto que os dados da produção de IL-10 por células nos linfonodos drenantes sugerem ativação específica de células produtoras de IL-10 que podem ser responsáveis pelas melhoras das lesões após o tratamento com células purificadas da medula óssea. Células polimorfonucleares são importantes para defesa do organismo em infecções. Entretanto em diferentes modelos experimentais para doenças mediadas por reação excessiva de células polimorfonucleares mostrou que a presença dessas células pode ocasionar dano tecidual (Hemdan e cols., 2010). Na infecção experimental por L. major, a questão da presença de células polimorfonucleares na susceptibilidade ou resistência a infecção é ainda discutida. É sabido que mastócitos contribuem para a susceptibilidade à infecção por L. major (Wershil e cols., 1994; Romão e cols., 2009). Um infiltrado inflamatório rico em polimorfonucleares, em especial neutrófilos, está relacionado ao desenvolvimento de lesões e susceptibilidade à infecção por L. major (McFalane e cols., 2008). A presença de neutrófilos está associada à regiões em que se encontra a expressão de IL-17 nas lesões na leishmaniose mucocutânea (Boaventura e cols., 2010). Acompanhando o lavado celular das lesões nasofaringeas de pacientes com lesões mucocutâneas da leishmaniose mostrou-se que a presença de neutrófilos correlaciona-se inversamente com a cura das lesões (Guerreiro e cols., 2000). Em correlação ao descrito em humanos, a infecção experimental por L. major mostrou a associação direta de neutrófilos e altos níveis de IL-17 para desenvolvimento da patogenese das lesões cutâneas em camundongos BALB/c (Lopez e cols., 2009). Interessante que o tratamento com células purificadas da medula óssea mostra associação direta das melhoras das lesões crônicas com a diminuição de IL-17 (Bai e cols., 2009). Nossos dados mostraram que após o tratamento com células purificadas da medula óssea há diminuição do número de células polimorfonucleares e da expressão de IL-17 nas lesões quando os animais tratados são comparados aos animais não tratados. Dessa forma, os resultados sugerem que o controle das lesões cutâneas crônicas dos 88 camundongos TNFR1 KO infectados com L. major e tratados com células purificadas da medula óssea é via inibição de IL-17, talvez por IL-10. Células dendríticas maduras são importantes estimuladoras da resposta imune em linfócitos T. Essas células são capazes de capturar o antígeno nas lesões, migrar para órgãos linfóides secundários e induzir a estimulação de células T via apresentação de antígeno. Na leishmaniose experimental, as células dendríticas são responsáveis pela captura de antígenos e estimulação das células T CD4+ produtoras de IFN-γ (Moll e cols., 1995; Leon e cols., 2007). Entretanto, células dendríticas imaturas podem induzir tolerância com produção de IL-10 (Menges e cols., 2002). O tratamento com células dendríticas imaturas no modelo experimental de EAE mostrou a capacidade de estimular a resposta anti-inflamatória com expansão de células T CD4+ produtoras de IL-10 e proteger o desenvolvimento das lesões cerebrais (Menges e cols., 2002). A IL-10 durante a infecção por L. major exerce diferentes funções nas inflamações em cada modelo de infecção. Em camundongos C57BL/6 infectados por L. major a estimulação e o aumento do número de células T CD4+ produtoras de IL-10 em fases crônicas da infecção são importantes para regulação da inflamação e redução das lesões (Belkaid, 2003; Mendez e cols., 2004). Nossos dados mostraram que injeções repetidas de células purificadas da medula óssea induzem redução das lesões em animais selvagens e TNFR1 KO, que é, interessantemente, correlacionada ao aumento da expressão de IL-10 e IFN-γ nesses locais. Tais resultados também podem ser comparados à concentração de IL-10 antígeno específico que detectamos em cultura de células dos linfonodos drenantes em camundongos TNFR1 KO infectados com L. major e tratados com células purificadas da medula óssea. Esses dados sugerem que a indução de IL-10, é devida a repetidas transferências com células imaturas purificadas da medula óssea. Uma das funções da IL-10 é a sinalização em células apresentadoras de antígeno induzindo a ativação da chamada via alternativa com expressão de arginase (Munder e cols., 1998; Munder e cols., 1999). Os dados mostraram que as lesões de camundongos TNFR1 KO infectados e tratados com células purificadas da medula óssea não apresentam diferentes expressões de arginase I, iNOS e TGF-β como esperado na 89 correlação com o aumento da expressão de IL-10 nas lesões após o tratamento (Stenger e cols., 1994; Li e cols., 1999; Iniesta e cols., 2002; Padigel & Farrel, 2005; Muller e cols., 2008; Muleme e cols., 2009; Biswas e cols., 2011). O papel da arginase na ativação de macrófagos tem sido investigado em células in vitro (Shearer e cols., 1997). Em processos de cicatrização encontrou-se um aumento da atividade de arginase e iNOS em queratinócitos. Entretanto não havia mudança na expressão de arginase em regiões de hiper-proliferação das regiões de epitélio. Nesses trabalhos, os autores criaram a hipótese de que a baixa expressão de arginase e NO pode favorecer a re-epitelização, favorecendo a cicatrização de tecidos com injúrias (Kampfer e cols., 2003; Kavaluka e cols., 2011). Kavaluska e colaboradores (2011) mostraram que a inibição farmacológica específica da atividade de arginase após lesão tecidual cutânea num modelo de cirurgia experimental induziu maior cicatrização das lesões de pele. Esses dados sugerem que a não modulação da expressão de arginase e iNOS no nosso modelo pode ser fruto do processo similar de redução das lesões como descrito acima para as lesões de pele. Em conclusão, nossos dados mostraram que as lesões cutâneas crônicas de camundongos TNFR1 KO infectados com L. major apresentam características que coincidem com as encontradas nas lesões de pacientes com leishmaniose mucocutânea. Nossos resultados também mostraram a eficiência da terapia celular com células imaturas purificadas da medula óssea. Estas células se diferenciam em células dendríticas nas lesões, o que sugere que estejam envolvidas no reparo tecidual nas lesões com produção de IL-10 por essas células ou estimulando a produção de IL-10 que por sua vez inibem a IL-17 e impedem a persistência de polimorfonucleares em animais TNFR1 KO infectados com L. major. Esse fenômeno de redução das lesões cutâneas não é restrito apenas as lesões crônicas dos camundongos TNFR1 KO infectados. Nós observamos o mesmo fenômeno em camundongos BALB/c (dados não mostrados) e C57BL/6 selvagens infectados com L. major: quando tratados com células purificadas da medula óssea, estes camundongos apresentam as lesões diminuídas e com presença de células transferidas nas lesões. O mesmo é válido para outras infecções, com camundongos C57BL/6 selvagens infectados com L. mexicana (Patrícia Petritus; Daniel 90 Manzoni-de-Almeida, Ciara Gimblet; Cláudia Gonzales Lombana e Phillip Scott manuscrito em redação). Nosso trabalho abre perspectivas de estudos de estratégias para tratamentos de lesões cutâneas crônicas da leishmaniose com intervenções farmacológicas para estimulação da migração desses tipos celulares para a lesão ou inibição específica de células do perfil Th17, como consequência eliminação de polimorfonucleares envolvidos nas lesões crônicas, como as lesões de pacientes que desenvolvem a leishmaniose mucocutânea. 91 CONCLUSÕES 92 6. CONCLUSÕES: A infecção cutânea crônica do camundongo TNFR1 KO por L. major apresenta características que coincidem às encontradas em lesões e pacientes com a forma mucocutânea da leishmaniose; O tratamento com células mononucleares purificadas de medula óssea induziu reduções significativas das lesões, com a regulação do infiltrado inflamatório e aumento do processo anti-inflamatório nas lesões em camundongos TNFR1 KO infectados por L. major. 93 REFERÊNCIAS 94 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Acestor, N., Masina, S., Ives, A., Walker, J,; Saraiva, N. 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