Revista Médica ISSN 1677-194X ANA COSTA Órgão Científico Oficial do Hospital Ana Costa Conselho Editorial Revista Médica Dr. Airton Zogaib Rodrigues, Santos - SP - Brasil Dr. André Vicente Guimarães, Santos - SP - Brasil Dr. Celso Afonso Gonçalves, Santos - SP - Brasil Dr. Evaldo Stanislau A. de Araújo, Santos - SP - Brasil Dr. Everson Artifon, Santos - SP - Brasil Dr. Luiz Alberto Oliveira Dallan, São Paulo - SP - Brasil Dr. Rider Nogueira de Brito Filho, Santos - SP - Brasil Dr. Rogério Aparecido Dedivitis, Santos - SP - Brasil Dr. Waldimir Carollo dos Santos, Santos - SP - Brasil Dr. Woite Antônio Bertoni Meloni, Santos - SP - Brasil Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa Rua Pedro Américo, 60 - Campo Grande, Santos/SP, Brasil e-mail: [email protected] www.anacosta.com.br Periodicidade: trimestral Tiragem: 500 exemplares Jornalista Responsável: Lucinaira Souza (Mtb: 40.248) Produção Gráfica: Comunicação e Marketing do Hospital Ana Costa A Revista Médica Ana Costa é distribuída gratuitamente para os membros do Corpo Clínico do Hospital Ana Costa, para bibliotecas e faculdades das áreas de saúde cadastradas. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos dessa revista, desde que citada a fonte. Revista Médica Ana Costa / Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa S.A. v. 19, n. 2 (abril / maio / junho 2014). Santos: Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa S.A., 2014. 23 p. :il. Periodicidade trimestral ISSN 1677 194X 1.Ciências Médicas. 2. Medicina CDD 610 CDU 616 Normas de Publicação A Revista Médica Ana Costa é publicada trimestralmente pelo Hospital Ana Costa e aceita artigos na área de saúde. Artigos de caráter comercial não serão aceitos. Serão aceitos manuscritos originais relacionados às seguintes categorias: a) artigos originais - trabalhos resultantes de pesquisa científica, apresentando dados originais de descobertas com relação a aspectos experimentais ou observacionais, incluem análise descritiva e ou inferências de dados próprios. Sua estrutura deverá conter os seguintes itens: Introdução, Métodos, Resultados, Discussão, Conclusão e Referências; b) artigos de revisão - têm por objetivo resumir, analisar, avaliar ou sintetizar trabalhos de investigação já publicados em revistas científicas. Apresenta síntese e análise crítica da literatura levantada e não pode ser confundido com artigo de atualização; c) artigos de atualização - destinados a relatar informações geralmente atuais sobre tema de interesse para determinada especialidade, uma nova técnica ou método, por exemplo, e que têm características distintas de um artigo de revisão, visto que não apresentam análise crítica da literatura; d) relato de caso - relata casos de uma determinada situação médica especialmente rara, descrevendo seus aspectos, história, condutas, etc, incluindo breve revisão da literatura, descrição do caso e discussão pertinente. Apresenta as características do indivíduo estudado, com indicação de sexo e idade. Pode ser realizado em humano ou animal. c) indicação da instituição em que cada autor está afiliado, acompanhada do respectivo endereço; d) nome do departamento e da instituição no qual foi realizado; e) indicação do autor responsável para troca de correspondência (nome completo, endereço, telefones de contato e e-mail); f) quando houver, indicar as fontes de auxílio à pesquisa; g) se extraído de dissertação ou tese, indicar título, ano e instituição onde foi apresentada; EXEMPLOS h) se apresentado em reunião científica, indicar nome do evento, local e data de realização. Livros RESUMO - Todos os artigos submetidos deverão ter resumo em português e em inglês, com um mínimo de 150 e no máximo de 250 palavras. Para os artigos originais os resumos devem ser estruturados destacando: objetivos, métodos básicos adotados (informando local, população e amostragem da pesquisa), resultados e conclusões mais relevantes, considerando os objetivos do trabalho, e indicar formas de continuidade do estudo. Para as demais categorias, o formato dos resumos deve ser o narrativo, mas com as mesmas informações. Capítulo de Livros Discussão: deve explorar adequada e objetivamente os resultados, discutidos à luz de outras observações já registradas na literatura. A primeira página deverá conter: b) nome completo de todos os autores; Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 67, abr / mai / jun 2014 Meltzer PS, Kallioniemi A, Trent JM. Chromosome alterations in human solid tumors. In: Vogelstein B, Kinzler KW, editors. The genetic basis of human cancer. New York: McGraw-Hill; 2002. p.93-113. Dissertações e Teses Silva LCB. Aspectos da fotoestimulação intermitente em pacientes com epilepsia: Teófilo Otoni [dissertação]. Campinas: Pontifícia Universidade Católica de Campinas; 2000. Attenhofer Jost CH, Connolly HM, O'Leary PW, Warnes CA, Tajik AJ, Seward JB. Left heart lesions in patients with Ebstein anomaly. Mayo Clin Proc. 2005; 80(3):3618. Trabalhos de Congressos, Simpósios, Encontros, Seminários e outros APRESENTAÇÃO DO MANUSCRITO a) título do artigo (em português e em inglês); Adolfi M. A terapia familiar. Lisboa: Editorial Veja; 1982. Artigos de periódicos TERMOS DE INDEXAÇÃO - Deverão acompanhar o resumo, um mínimo de 3 e o máximo de 5 palavraschave descritoras do conteúdo do trabalho, utilizando os descritores em Ciência da Saúde - DeCS - da Bireme. Resultados: sempre que possível, os resultados devem ser apresentados em tabelas ou figuras, elaboradas de forma a serem auto-explicativas, e com análise estatística. Evitar repetir dados no texto. Tabelas, quadros e figuras devem ser limitadas a 5 no conjunto e numerados consecutiva e independentemente, com algarismos arábicos de acordo com a ordem de menção dos dados, e devem vir em folhas individuais e separadas, com indicação de sua localização no texto. O autor responsabiliza-se pela qualidade de desenhos, ilustrações e gráficos, que devem permitir redução sem perda de definição. Sugere-se impressão de alta qualidade. Ilustrações coloridas não são publicadas, a não ser que sejam custeadas pelos autores. PÁGINA DE TÍTULO A exatidão das referências é de responsabilidade dos autores. Citações bibliográficas no texto: deverão ser colocadas em ordem numérica, em algarismos arábicos, sobrescrito, após a citação e devem constar da lista de referências. SUBMISSÃO DOS ARTIGOS A submissão dos artigos à Revista Médica Ana Costa implica transferência dos direitos autorais da publicação. Os trabalhos submetidos devem ser originais e acompanhados por uma declaração dos autores de que o trabalho não será publicado em qualquer outra revista no formato impresso ou eletrônico. Os trabalhos serão avaliados por pelo menos dois revisores, em procedimento sigiloso quanto a identidade tanto do(s) autor(es) quanto dos revisores. Todo trabalho que envolva estudo em seres humanos deverá apresentar a carta de aprovação de Comitê de Ética e Pesquisa registrado no CONEP. Caso haja utilização de ilustrações, fotografias e tabelas devem ser de boa qualidade e marcadas no verso somente com o número da figura e o título do trabalho. As legendas devem ser impressas em folhas separadas. Modelo da carta de submissão Título do Artigo: Considerando a aceitação do trabalho acima, o(s) autor(es) abaixo assinado(s) transfere(m) para a Revista Médica Ana Costa, todos os direitos autorais do artigo mencionado, sendo vedada qualquer reprodução total ou parcial em outro meio de divulgação. Declara(m) que o presente trabalho é original, sendo que seu conteúdo não foi ou está sendo considerado para publicação em outro periódico, quer no formato impresso ou eletrônico. Data: Assinatura (s) Os originais deverão ser enviados para o Hospital Ana Costa - Divisão de Ensino, rua Pedro Américo, 60 - 10º andar, CEP 11075-905, Santos/SP, Brasil. Enviar os manuscritos à Revista Médica Ana Costa em duas cópias, impressos em papel sulfite A4, preparados em espaço duplo, com fonte Times New Roman, tamanho 12. Após as correções sugeridas pelos revisores, a forma definitiva do trabalho deverá ser encaminhada em uma via impressa e em disquete 3 ½” ou em CD-ROM. Os originais não serão devolvidos. primeiros autores seguido de et al. As abreviaturas dos títulos dos periódicos citados deverão estar de acordo com o Index Medicus. ESTRUTURA DO TEXTO Introdução: deve conter revisão da literatura atualizada e pertinente ao tema, adequada à apresentação do problema e que destaque sua relevância. Não deve ser extensa, a não ser em manuscritos submetidos como Artigo de Revisão. Metodologia: deve conter descrição clara e sucinta, acompanhada da correspondente citação bibliográfica, dos seguintes itens: · procedimentos adotados; Harnden P, Joffe JK, Jones WG, editors. Germ cell tumours V. Proceedings of the 5th Gern Cell Tumour Conference; 2001 Sep 13-15; Leeds, UK. New York: Springer; 2002. Material eletrônico Periódicos eletrônicos, artigos Sabbatini RME. A história da terapia por choque em psiquiatria. Cérebro & Mente [periódico online] dez. 1997/fev. 1998 [Acesso em 12 ago. 2000]; (4). Disponível em: · universo e amostra; http://www.epub.org.br/cm/n04/historia/shock.htm · instrumentos de medida e, se aplicável, método de validação, Monografia em um meio eletrônico · tratamento estatístico. Conclusão: apresentar as conclusões relevantes, considerando os objetivos do trabalho, e indicar formas de continuidade do estudo. Se incluídas na seção Discussão, não devem ser repetidas. Agradecimentos: podem ser registrados agradecimentos, em parágrafo não superior a três linhas, dirigidos a instituições ou indivíduos que prestaram efetiva colaboração para o trabalho. Referências: devem ser numeradas consecutivamente na ordem em que foram mencionadas a primeira vez no texto, baseadas no estilo Vancouver. A ordem de citação no texto obedecerá esta numeração. Nas referências com 2 até o limite de 6 autores, citam-se todos os autores; acima de 6 autores, citam-se os 6 São Paulo (Estado). Secretaria do Meio Ambiente. Entendendo o meio ambiente [monografia online]. São Paulo; 1999. [Acesso em: 8 mar. 1999]; v.1. Disponível em: http://www.bdt.org.br/sma/entendendo/atual.htm Anexos e/ou Apêndices: incluir apenas quando imprescindíveis à compreensão do texto. Caberá à Comissão Editorial julgar a necessidade de sua publicação. Abreviaturas e Siglas: deverão ser utilizadas de forma padronizada, restringindo-se apenas àquelas usadas convencionalmente ou sancionadas pelo uso, acompanhadas do significado por extenso quando da primeira citação no texto. Não devem ser usadas no título e no resumo. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 67, abr / mai / jun 2014 Artigo Original Sintomatologia e do tratamento empregado em crianças com diagnóstico de Coqueluche.............................32 Symptoms and treatment employed in children diagnosed with whooping cough André Horcajo Agostinetti e Paulo Sergio Ciola Perfil de pacientes com câncer criticamente enfermos em UTI..........................................................................35 Profile of critically ill cancer patients in ICU Natasha Crepo Nahon, Ana Paula de Carvalho Odoni Rocha, Rebeca Maria Lopes Grezos eSueli Monterroso Cruz Epilepsia – o que sabe a população geral sobre esse tema?.................................................................................38 Epilepsy – what does the general population know about this subject? Melissa Vieira Franco, André Knudsen Santana, Carina Verissimo Mendes e Yára Dadalti Fragoso Artigo de Revisão Lesões císticas do pâncreas...................................................................................................................................40 The cystic pancreatic lesions Marco Antonio Buch Cunha, Lubia Bonini Daniel, Flavia Gerbi Azevedo, Renato Brassolotto Bello, Luciana Cleaver Aun, Osmar Silvio Garcia de Oliveira, Carlos Kioshi Furuya Junior, Ricardo Sato Uemura, Katia Ferreira Guenaga, Dayse Pereira da Silva Aparicio e Everson Luiz de Almeida Artifon Carcinomatose meníngea......................................................................................................................................45 Meningeal Carcinomatosis Sureya Maria de Almeida David Gibelli e Sueli Monterroso da Cruz Relato de Caso Seguimento e gravidez no pós-esvaziamento uterino devido à mola hidatiforme....................................48 Follow up and pregnancy after emptying of the uterus owing to hydatidiform mole Daniel Machado e João Henrique Araújo Fernandes Drusas da cabeça do nervo óptico e membrana epirretiniana.....................................................................51 Drusen of the optic nerve head and epiretinal membrane Felipe Alves Utyama, Celso Afonso Gonçalves e Marcos Alonso Garcia Tuberculose geniturinária................................................................................................................................54 Tuberculosis of the testis Felipe Camargo Bestane, André Luiz Farinhas Tomé, Mohamad Dib Salah Ali e Fernando Lievana Mangolin Síndrome de Steven Johnson pesadelo oftalmológico................................................................................56 Stevens Johnson Syndrome – ophthalmologic nightmare Lucas Holdack, Luciana Garcia Iervolino, Celso Afonso Gonçalves, Marcos Alonso Garcia e Érika Alessandra Galembeck Silvino Rodrigues Morte materna por influenza H1N1..................................................................................................................60 Maternal death from H1N1 influenza in Santos - SP, in 2013 Marion Curado da Silva e Pia Ceraldi A importância do diagnóstico precoce para o tratamento específico da leucemia promielocítica aguda...................................................................................................................63 The importance of early diagnosis or specific treatment of acute promyelocytic leukemia Suellen Nastri Castro e Letícia Medeiros Abscesso cerebral em paciente portador de endocardite de valva protética.............................................65 Brain abscess in patients with prosthetic valve endocarditis Amanda Evelyn Andrade Rocha e Rodolfo Leite Arantes Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 67, abr / mai / jun 2014 Sintomatologia e do tratamento empregado em crianças com diagnóstico de Coqueluche Symptoms and treatment employed in children diagnosed with whooping cough 1 André Horcajo Agostinetti 2 Paulo Sergio Ciola RESUMO Introdução: a coqueluche é uma infecção vigente como importante problema de saúde pública, inclusive em países com alta cobertura de imunização ativa. Devido à curta duração da imunidade vacinal e a falta de reforços vacinais ou naturais, a doença agora tem afetado adolescentes e adultos, que contaminam recém-nascidos e crianças muito jovens para serem vacinadas. Objetivo: avaliar a abordagem de crianças com coqueluche. Métodos: estudo realizado revisando 13 prontuários de crianças até 12 anos internadas com diagnóstico final de coqueluche e suas variantes. Foi analisada sintomatologia antes da internação, estado vacinal dos pacientes, tratamento empregado e evolução da doença. Resultados: quanto à sintomatologia, notou-se prevalência de 100% de crianças com queixa de tosse e, como segunda queixa (77%), obteve-se cianose pós-tosse, como complicação da primeira queixa. Todos aqueles estudados estavam com seu calendário vacinal em dia, porém a maioria deles tinha esquema vacinal incompleto, devido à idade dos alvos do estudo. Quanto ao tratamento empregado, empregou-se macrolídeo em 92% dos casos e uso de corticóide, de inalação com Beta-2-agonista e de Fisioterapia respiratória acima de 69% das vezes. ABSTRACT Introduction: Whooping cough is an infection considered an important public health problem, even in countries with active immunization coverage. Due to the short duration of immunity vaccine and lack of natural or vaccinal reinforcements, disease now has affected adolescents and adults, infecting newborns and children too young to be vaccinated. Objective: To evaluate the management in children with whooping cough. Methods: The study reviewed 13 cases of children under 12 years with a final diagnosis of Whooping cough and its variants. The symptoms before admission, immunization status of patients, treatment and follow disease progression were evaluated. Results: The presenting symptom noticed a prevalence of 100% of children with complaints of cough, and as the second most common complaint, post-cough cyanosis (77 %) as a complication of the first complaint. All patients had their immunization updated, though most of them had incomplete immunization due to the age of the targets of the study.Regarding the treatment, macrolide were used in 92% of cases, and corticosteroids, inhalation of beta-2-agonist and respiratory physiotherapy above 69% of the time. Key words: Bordetella pertussis. Whooping Cough. Cough. Descritores: Bordetella pertussis. Coqueluche. Tosse Coqueluchóide, Tosse. Introdução A coqueluche é uma infecção vigente como importante problema de saúde pública, inclusive em países com alta cobertura de imunização ativa1,2. É altamente contagiosa, principalmente para recém-nascidos e idosos e acomete o trato respiratório. É causada pelas bactérias Bordetella pertussis e B. parapertussis. Nos últimos anos, a vacinação intensiva das crianças permitiu uma redução importante de mortalidade e morbidade. Ainda assim, em nível mundial ela é um dos principais agentes letais, estimando-se 300.000 mortes por ano por esta causa1-3. Dessa forma, a generalização da vacinação conduziu a uma mudança na transmissão da doença devido à curta duração da imunidade vacinal e a falta de reforços vacinais ou naturais. A doença afeta agora adolescentes e adultos que contaminam recém-nascidos e crianças muito jovens para serem vacinadas5. É importante saber quais são os principais sintomas que levam os pacientes a internação, e como se comporta essa infecção após intervenção médica hospitalar. Neste estudo, procurou-se entender melhor os tipos de tratamento empregados em crianças com suspeita de coqueluche, o conjunto de sinais e sintomas que levaram seus acompanhantes a procurar o pronto atendimento e a evolução da doença, uma vez iniciada a intervenção. Métodos Trata-se de estudo retrospectivo observacional de abordagem qualitativa, com dados do Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa no período de janeiro de 2011 a dezembro de 2012. Selecionaram-se pacientes internados, com idades entre zero e onze anos, onze meses e vinte e nove dias, com diagnóstico de alta hospitalar abrangendo os CIDs A370 até A379, ou seja, coqueluche e todas as suas variantes. Foi feita a revisão de dados dessas internações, avaliando sintomatologia e sinais apresentados antes da internação e cada tipo de tratamento empregado. 1) Estagiário de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Chefe do Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa. Professor de Pediatria da Faculdade de Medicina da UNIMES. Instituição: Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil Correspondência: Rua Afonso Veridiano, 3, Ap. 803, Embaré, Santos/SP. E-mail [email protected] Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 02/02/2014; publicado online em: 31/05/2014. 32 Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 34, jan / fev / mar 2014 Quanto à sintomatologia apresentada pelos pacientes, foram organizadas em seis categorias: febre, tosse, cianose, guincho, perda de tônus e dispnéia. A febre foi considerada quando a mãe descrevia a presença de temperatura axilar acima de 37,8ºC ou se a criança tinha temperatura axilar medida pelo médico do PS ou da internação aferida também acima desse referencial. A tosse foi considerada quando era referida pela mãe ou quando avaliada pelo médico da internação ou do PS como importante: um acesso de prolongado, com complicações seguidas após este. Dispnéia era considerada pela pesquisa quando referida no período de intercrise, ou seja, fora dos períodos de tosse. Cianose, guincho e perda de tônus foram três critérios que entraram na pesquisa como conseqüências de crise de tosse importante e incapacitante. Cianose e perda de tônus muscular ocorriam imediatamente após um episódio prolongado de tosse e o guincho é a inspiração forçada e de tom agudo que vem após esses quadros de tosse prolongada e seguida, caracterizada por muitas pequenas incursões respiratórias. Quanto aos tipos de tratamento empregados durante a internação, estes foram listados em seis tipos, sendo organizados a partir da revisão dos prontuários e incluindo todas as condutas aplicadas: fisioterapia respiratória, Corticoterapia (por via oral ou por via intravenosa), uso de inalação (com Beta-2-Agonista), uso de macrolídeo (Claritromicina), oxigenioterapia complementar durante crises de tosse e uso de Ceftriaxona (Cefalosporina de 3ª geração). Foram incluídos pacientes internados na enfermaria e em UTI Pediátrica. Quanto à situação vacinal das crianças estudadas, esta foi certificada por meio revisão da carteira vacinal de todas. Resultados Foram estudados 13 casos de crianças internadas no serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa entre janeiro de 2011 e dezembro de 2012. A idade dos pacientes variou entre um mês de idade e 26 meses, sendo que a média foi 5,1 meses e a moda dois meses. A média de dias internado variou entre um e 11 dias de internação, sendo a média 5,6 dias. Quanto aos sinais e sintomas apresentados, seis queixas foram motivo de preocupação dos acompanhantes dos pacientes na hora de levá-los para avaliação hospitalar e posterior internação. São elas: tosse, cianose pós-tosse, perda de tônus pós-tosse, guincho típico coqueluchóide pós-tosse, febre e dispnéia nas intercrises. No Gráfico 1, pode-se ver a prevalência de tosse como principal queixa. Cem por cento das crianças estudadas apresentaram esse sintoma. A segunda queixa mais comum referida na internação era de cianose pós-tosse (77% das crianças), seguida de perda de tônus pós-tosse (23% do total) e guincho clássico de tosse coqueluchóide (15%). Febre só foi relatada por 1 paciente (7%), assim como dispnéia. Gráfico1 – Número de pacientes com sinais e sintomas respectivos. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 34, jan / fev / mar 2014 Quanto aos tratamentos aos quais os pacientes foram submetidos, a revisão de dados mostrou 6 tipos diferentes, que foram aplicados isoladamente ou de forma combinada. Nota-se prevalência de tratamento dos quatro primeiros listados, como se pode ver no gráfico abaixo – Gráfico 2. Gráfico 2 – Número de pacientes submetidos aos respectivos tratamentos. O tratamento empregado com mais prevalência foi o macrolídeo (Claritromicina), usado em 12 dos 13 pacientes internados (92%). Em seguida, o uso de corticóide (por via oral ou intravenosa) foi aplicado em 11 dos 13 pacientes estudados (84%). Em terceiro lugar na ordem de prevalência, com nove casos em 13, vieram uso de inalação com Beta-2-agonista e fisioterapia respiratória (69%). Uso de Oxigênio complementar durante crises de tosse e de Ceftriaxona só foram aplicados em um paciente (7%). O estudo da situação vacinal das crianças estudadas mostrou que todas elas tinham vacinação em dia para a idade. Em busca de focar a vacinação contra a B. pertussis, nesta análise se buscou os dados da vacinação contra tríplice bacteriana, ou seja, DTP ou DTPa. De acordo com a idade dos pacientes-alvo, notou-se que um paciente (26 meses) tinha tomado três doses de vacina DTP e uma dose do reforço. Dois pacientes (oito meses/13 meses) tinham tomado três doses da vacina DTP. Sete pacientes (entre dois e três meses) tinham esquema vacinal com uma dose de DTP. Três pacientes (um mês) ainda não tinham sido vacinados com 1ª dose de DTP. Discussão Este estudo é uma revisão de sinais e sintomas de pacientes que foram internados com diagnóstico de coqueluche, de seu histórico vacinal e das respectivas condutas tomadas durante a internação, para tratamento dessa doença. Essa análise deve ser iniciada avaliando-se o método diagnóstico utilizado para dar inicio à pesquisa. Foram aceitas crianças que estiveram internadas no hospital privado de referência e que tinham diagnóstico final de coqueluche e variantes, ou seja, CID-10 entre A370 e A379. Não foi usado método de detecção de Bordetella por meio de Swab ou sangue pois, em estudo feito para avaliar a frequência de infecções respiratórias em crianças com suspeita de coqueluche, notou-se que 44% das crianças tinham PCR para Bordetella positivo e 35% tinham esse exame indeterminado. Chegou-se à conclusão de que o teste sorológico não exclui a possibilidade da doença e que a avaliação clínica ainda tem muita soberania no diagnóstico4. Quanto à situação vacinal dos pacientes deste estudo, todos estavam com seu calendário vacinal em dia, contudo, a maioria tinha esquema vacinal incompleto, no que diz respeito ao mínimo de doses necessárias para se obter um fator protetor efetivo contra a B. pertussis, que corresponde a um mínimo de três doses e um reforço. É sabido o grande impacto da vacinação contra doenças infecciosas e quantas mortes já foram evitadas em todo o mundo 33 por isso6. Assim, pode-se correlacionar a maior incidência de internações pela doença em crianças com o esquema vacinal incompleto, e devido à sua baixa idade. Ainda que a sintomatologia em muitos pacientes recém-nascidos ou lactentes seja de difícil detecção7, pôde-se reparar que aqueles mais graves tiveram uma sintomatologia melhor definida, acabando por ser internados. Em contrapartida, alguns autores citam sinais mais freqüentes em recém-nascidos, como acessos de tosse intensos seguidos de cianose, perda de tônus muscular por baixa oxigenação cerebral, bradicardia e parada respiratória810 . Esses fatos podem ser comprovados neste estudo por meio dos dois sintomas/sinais mais citados à internação, que foram tosse intensa seguida de cianose e da idade média de internação, que é de 5,1 meses. O questionamento que fica sem poder ser respondido é de quantas crianças que foram atendidas no prontosocorro e acabaram ficando sem o diagnóstico de coqueluche, por ter sintomatologia pouco rica, e por tampouco terem sido submetidas à pesquisa da Bordetella em epitélio da retrofaringe. A respeito do uso elevado de Macrolídeos, isso se deu pelo fato de a amostra usada para o estudo ser somente de casos que tiveram diagnóstico final de coqueluche ou alguma de suas variantes, ou seja, a amostra é considerada viciada. É certo que seu uso deve ser ponderado, como concluíram Ferronato et al., em seu estudo sobre infecções respiratórias virais em crianças com suspeita clínica de infecção por B. pertussis4. O tratamento foi realizado por sete dias, na dose de 15 mg/kg/dia em duas tomadas. A Ceftriaxona foi usada em uma criança, que foi internada em UTI. Foi introduzida no dia da entrada do paciente na unidade e retirada no dia seguinte, após exclusão de infecção pneumônica secundária. Quanto aos dias de internação, estes ficaram em média 5,4 dias internados. Assumindo-se que os pacientes tiveram sua doença diagnosticada durante sua fase paroxística, devido à queixa de tosse intensa com complicações, chegamos à discussão sobre a eficácia da antibioticoterapia visando diminuir os sintomas apresentados. É bem estabelecida a eficácia do tratamento com macrolídeos na diminuição dos sintomas, quando estes são iniciados na fase catarral11-13. Entretanto, ainda não existe consenso se o início do antibiótico na fase paroxística diminui a duração do período sintomático. Só existe a informação de que há garantia de eliminação da bactéria dentro dos primeiros cinco dias de terapia iniciada, o que coincide com o tempo médio de internação dos pacientes estudados neste trabalho. Não foi encontrada evidência científica de melhora do tratamento 34 com o uso de corticóides (VO ou EV) e inalação com Beta-2agonista. Nota-se a banalização de seu uso em pacientes com qualquer queixa que envolva trato respiratório. A fisioterapia respiratória também é questionada, sem evidência prática de melhora. Esta inclusive muitas vezes acaba sendo desestimulada, por poder levar a uma crise de tosse em uma criança que estaria previamente fora de crise. Sendo esta uma doença quem ainda tem um grande índice mundial de letalidade e, devido ao fato de ser ainda muito subdiagnosticada, um trabalho como este pode ajudar médicos em geral a levantar a hipótese de coqueluche em pacientes que tenham queixas características, como tosse persistente e, principalmente, complicações da tosse. Referências 1. Tan T, Trindade E, Skowronski D. Epidemiology of pertussis. Pediatr Infect Dis. 2005;24:S10-8. 2. Aguas R, Goncalves G, Gomes M. Pertussis: increasing disease as a consequence of reducing transmission. Lancet Infect Dis. 2006; 6:112-7. 3. Edwards K, Halasa N. Are pertussis fatalities in infants on the rise? What can be done to prevent them? J Pediatr. 2003;143:552-3. 4. Ferronato AE, Gilio AE, Vieira SE. Respiratory viral infections in infants with clinically suspected pertussis. J Pediatr (Rio de Janeiro). 2013; 89:23-5. 5. Guiso N. Why still whooping cough? Rev Prat. 2005; 55(12):1287-92. 6. Guiso N. 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Os prontuários foram avaliados quanto à idade, sexo, tipo de câncer, número de sítios metastáticos, motivo de internação na unidade de terapia intensiva, dia internação em enfermaria, dias de internação em UTI e óbito. Resultados: as mulheres com diagnóstico de neoplasia foram admitidas em maior número em relação aos homens (12 mulheres para 3 homens). A neoplasia mais incidente foi a de mama (8 casos). Em dez casos os pacientes já apresentavam metástase e o sítio mais frequente foi o ósseo. O diagnóstico que mais motivou a internação em UTI foi insuficiência respiratória. O desfecho óbito em UTI foi presente em nove casos dos 15 e a permanência em UTI foi de no máximo nove dias, sendo que cinco dos casos foi de apenas um dia. ABSTRACT Introduction: Support in the ICU is sometimes necessary for the immediate relief of symptoms and improves quality of life of oncological patients, even among those without possibility of cure. Aim: To analyze the profile of cancer patients admitted to the ICU of Hospital Ana Costa. Methods: Admissions from July 2012 to July 2013 at Hospital Ana Costa were analyzed. The charts of these patients were evaluated regarding age, gender, type of cancer, number of metastatic sites, reason for hospitalization in the intensive care unit, day ward stay, days of ICU stay and death. Results: Women diagnosed with cancer were admitted in greater numbers compared to men (12 women to 3 men). The most frequent cancer was breast (8 cases). In ten cases the patients already had metastases and the most frequent site was the bone. The diagnosis that most led to ICU admission was respiratory insufficiency. The outcome death in the ICU was present in nine of 15 cases and the permanency in ICU was nine days in most cases, with five of the cases was only one day. Key words: Cancer. Intensive Care Unit. Admission. Descritores: Câncer. Unidade de Terapia Intensiva. Admissão. Introdução Atualmente se observa um aumento nos casos de câncer. Isso deve-se à transição epidemiológica iniciada na década de 60 que trouxe como principais causas de morte os casos de câncer e as doenças do aparelho circulatório em detrimento das doenças infecciosas1. Segundo a Organização Mundial da Saúde, há uma estimativa de que, em 2030, podem-se esperar 27 milhões de casos incidentes, 17 milhões de mortes por câncer e 75 milhões de pessoas vivas, anualmente, com câncer2. Uma doença tão incidente resultou em um aumento da expectativa de vida, explicada por três motivos: o avanço no tratamento de tumores sólidos e hematológicos com desenvolvimento de terapias mais potentes e específicas e avanço na prevenção da disfunção de órgãos; o progresso na seleção dos pacientes com indicação de unidade de terapia intensiva com uma admissão precoce; e a capacidade de obter um diagnóstico em pacientes com insuficiência respiratória aguda com melhor prognóstico3,4. Apesar de novos avanços no tratamento, estes podem afetar inúmeros órgãos, gerar maior predisposição a infecções, levando a um maior risco de vida, ocupando mais leitos na UTI, prolongando sofrimento e alocando recursos limitados para área4,6. Além disso, para os pacientes que estão lúcidos, além da dor, estão reservados o tubo, as sondas, os cateteres, a luz incidindo no olho, o barulho dos alarmes, o vozerio dos profissionais, o frio, a nudez, a solidão e o medo do tempo. Já tem sido vista a evidência de que a ida para esses centros de pacientes com chance de cura ou de controle do câncer tem taxas de mortalidade reduzida, incluindo pacientes com sepse e submetidos à ventilação mecânica. O suporte em UTI é, às vezes, necessário para o alívio imediato dos sintomas e melhora a qualidade de vida, mesmo nos pacientes sem possibilidades de cura5. Outros estudos têm relatado altas taxas de mortalidade para pacientes com câncer depois de uma longa permanência em UTI, especialmente quando eles tinham leucopenia ou necessitaram de ventilação mecânica e manejamento agressivo de tratar as complicações com risco de vida nestes pacientes tem sido 1) Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP 2) Residente do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP 3) Chefe do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP Instituição: Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Correspondência: Rua Tiradentes, 315 ap. 52 – 11700-290 Praia Grande/SP. E-mail: [email protected] Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 26/01/2014; publicado online em: 31/05/2014. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 35 - 37, abr / mai / jun 2014 35 questionada. Devido ao questionamento quanto a admitir ou não o paciente oncológico em UTI, percebe-se que há a necessidade de um levantamento e comparativamente tirar conclusões sobre qual 7 é a melhor opção para o paciente oncológico . Métodos Foram analisadas as internações contidas entre o período de julho de 2012 a julho de 2013 no Serviço de Clínica Médica do Hospital Ana Costa e, destes, selecionados os casos internados com o Serviço de Oncologia, excluindo, portanto, casos de neoplasia internados em outro serviço. O material utilizado para o levantamento das internações foram os cadernos de registros. A lista adquirida foi cruzada com a lista de admissão na Unidade de Terapia Intensiva Geral, gerando um montante quinze pacientes a serem analisados. Os prontuários de tais pacientes foram avaliados quanto à idade, sexo, tipo de câncer, número de sítios metastáticos, motivo de internação na unidade de terapia intensiva, dia internação em enfermaria, dias de internação em UTI e óbito. Resultados A análise dos pacientes admitidos no serviço de terapia intensiva permitiu avaliar que as mulheres com diagnóstico de neoplasia foram admitidas em maior número em relação aos homens (12 mulheres para três homens). A neoplasia mais incidente foi a de mama, apresentando oito casos na amostra. Em segundo lugar, esteve a neoplasia pulmonar. Outras neoplasias também foram encontradas como: cólon e próstata. Em dez casos os pacientes já apresentavam metástase, sendo o sítio mais frequente relacionado com a metástase foi o ósseo. Dos quinze pacientes, quatro foram admitidos diretamente na UTI, sem tempo de permanência na enfermaria do hospital. O diagnóstico que mais motivou a internação em UTI foi insuficiência respiratória, seguido de sepse e em outros casos pósoperatórios. O desfecho óbito em UTI foi presente em nove casos dos quinze e a permanência em UTI foi de no máximo nove dias, sendo que em cinco dos casos foi de apenas um dia. Discussão O levantamento dos prontuários demonstrou uma maior porcentagem de mulheres é admitida em UTI, assim como em um dos estudos5, enquanto que em outro estudo foi apontado um número maior de pacientes admitidos do sexo masculino7. Taccone et al. também relatou que nos tumores sólidos os pacientes, geralmente, eram mais velhos. Com relação às metástases, foi encontrada uma incidência de 21,1% no momento da admissão em UTI7, enquanto que, em nossa série, esta taxa foi de 66,6%. As principais razões para a admissão na UTI foram: insuficiência respiratória em 47,1% contra 60% no nosso , sepse em 17,6% contra 33,3% e acompanhamento pós-operatório em 14,7% contra 33,3%5. Em um trabalho com 19 mulheres criticamente enfermas com câncer de mama ou ginecológico que foram admitidas na UTI (cancer da mama n = 11, o câncer de ovário n = 4, o câncer do colo do útero n = 3 e câncer endometrial n = 1) foi mostrado que, dos pacientes, nove mulheres com câncer de mama e três pacientes com câncer ginecológico já apresentavam doença metastática 63,2%. As principais razões para a admissão à UTI neste estudo foram sepse 94,7%, insuficiência respiratória 36,8% e hipotensão com necessidade de suporte vasoativo 26,3%.. Em todos os 6 casos, a causa da morte foi falência múltipla de órgãos . Encontraram-se 35,3% de mortalidade dos pacientes durante o período de internação na UTI, contrastando com 60% em nosso 36 serviço. Esses dados estão de acordo com a média de mortalidade geral na UTI, semelhante a outros estudos recentemente publicados, que mostraram mortalidade global UTI variando de 22 a 51%5. Estudos atuais tentam encontrar uma explicação para a diferença nas taxas de mortalidade. A necessidade de ventilação mecânica, presença de infecção fúngica invasiva, o desenvolvimento de falência de múltiplos órgãos e alta severidade da doença são fatores prognósticos adicionais para a mortalidade entre os pacientes com câncer. Tem sido proposto que a neutropenia é um fator independente para mortalidade no câncer4. A idade foi pouco relatada nos estudos. Em apenas um trabalho foi mencionado que a idade foi fracamente relacionada com a mortalidade8. Os casos admitidos na UTI do Hospital Ana Costa tinham idade entre 41 e 82. Ainda há muita dificuldade na admissão de pacientes com câncer para UTI, porque a classificação do paciente em bom estado de saúde e mal estado é complicada e subjetiva. Há a descrição em um estudo de que 20% dos pacientes oncológicos não foram admitidos por serem considerados "muito bem", morreram antes da alta hospitalar (principalmente após a admissão na UTI atraso) e 25% dos pacientes não admitidos porque estavam muito doentes acabaram sobrevivendo4. O aumento do número de dias de sobrevivência pode ser apenas um prolongamento do processo de morte ou só aumento efetivo na sobrevivência com boa qualidade de vida. A maioria dos pacientes sente dor, desconforto, ansiedade, distúrbios do sono, a fome ou insatisfeito ou sede. Há relato de depressão e dispnéia. Dor significativa e desconforto foram associados com os procedimentos de UTI comuns. Incapacidade de se comunicar, dormir rompimento, e limitações de visita foram particularmente estressante entre as condições da UTI.4 Quando analisados pacientes oncológicos admitidos em UTI com pacientes oncológicos não admitidos em UTI não há diferença em termos estatísticos do tempo livre de doença no período de seis anos 9. Já quanto a sobrevida, os pacientes não internados na UTI apresentam uma sobrevida melhor do que aqueles admitidos na UTI (pacientes não-UTI: A sobrevida média, 19,6 meses e a sobrevida aos 8 anos: 21%; pacientes da UTI: sobrevida média, 1,3 meses, a taxa de sobrevivência aos 8 anos: 9%, p <0,05). Internação na UTI é um fator prognóstico adverso independente no que diz respeito à sobrevivência9. O trabalho realizado no Hospital Ana Costa não comparou os casos oncológicos admitidos com os não-admitidos em UTI para verificar se a sobrevida foi maior quando estes pacientes eram admitidos. Os pacientes com câncer foram mais comumente admitidos por motivos respiratórios, mas com menor frequência de doenças neurológicas agudas e traumas7. Nosso estudo tem algumas limitações, como a pequena amostra de pacientes admitidos na UTI. Outro ponto negativo é comparar diferentes tipos de cânceres em estádios diversos, o que acaba tornando o estudo mais descritivo. Apesar dos avanços nas técnicas de tratamento, ainda é limitado o número de pacientes admitidos em UTI e o desfecho dos pacientes é incerto. A mortalidade ainda é muito elevada e existe dificuldade em achar o melhor momento. Então, há a necessidade de novos trabalhos para quem sabe criar um protocolo no futuro sobre admissão de pacientes oncológicos na UTI. Referências 1. Alcantara LS, Sant'Anna JL, Maria da Glória Nascimento de Souza. Illness and finitude: considerations about the interdisciplinary approach in the oncological Intensive Care Unit. Saúde Colet. 2013;18(9):2507-14. 2. 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Ostermann M, Raimundo M, Williams A, Whiteley C, Beale R Retrospective analysis of outcome of women with breast or gynaecological cancer in the intensive care unit. JRSM Short Rep. 2013;4(1):2. 7. Taccone FS, Artigas AA, Sprung CL, Moreno R, Sakr Y, Vincent JL. Characteristics and outcomes of cancer patients in European ICUs. Crit Care. 2009;13(1):1-10. 8. Slatore CG, Cecere LM, Letourneau JL, O'Neil ME, Duckart JP, Wiener RS, Farjah F, Cooke CR. Intensive care unit outcomes among patients with lung cancer in the surveillance, epidemiology, and end results-medicare registry. J Clin Oncol. 2012;30(14):1686-91. 9. Schellongowski P, Staudinger T, Kundi M, Laczika K, Locker GJ, Bojic A, Robak O, Fuhrmann V, Jäger U, Valent P, Sperr WR.Prognostic factors for intensive care unit admission, intensive care outcome, and post-intensive care survival in patients with de novo acute myeloid leukemia: a single center experience. Haematologica. 2011;96(2):231-7. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 35 - 37, abr / mai / jun 2014 37 Epilepsia – o que sabe a população geral sobre esse tema? Epilepsy – what does the general population know about this subject? 1 Melissa Vieira Franco 1 André Knudsen Santana Carina Verissimo Mendes1 Yára Dadalti Fragoso2 RESUMO Objetivo: Identificar o grau de conhecimento da população geral sobre epilepsia. Métodos: Entrevistas individuais com questionário especificamente criado para o propósito deste estudo. Resultados: Foram entrevistados 200 adultos (100H, 100M), idade média de 37 anos (20 a 60 anos), de vários níveis socioeconômicos e diferentes graus de escolaridade. Deste grupo, 184 (92%) diziam ter lido ou ouvido sobre epilepsia, porém 88,5% deles referiam saber pouco ou nada sobre a doença. Quarenta por cento do grupo conhecia pessoalmente alguém que tinha epilepsia e 37,5% já tinha presenciado pelo menos um caso de crise convulsiva. Vinte por cento dos entrevistados não permitiriam que seus filhos se brincassem com alguém com epilepsia e 23,5% não aprovariam que seus filhos se casassem com alguém com epilepsia. De acordo com 6% dos entrevistados, epilepsia é contagiosa. Apenas um quarto dos indivíduos sabia citar o nome de algum anticonvulsivante, e 88,3% destes citou o fenobarbital (geralmente pelo nome comercial Gardenal). Mais de 80% dos entrevistados acredita que as pessoas com epilepsia sejam discriminadas pela sociedade. Conclusão: O desconhecimento, mitos e tabus sobre epilepsia ainda são importantes na população. ABSTRACT Objective: To identify the degree of knowledge about epilepsy in individuals of the general population. Methods: Individual interviews using a questionnaire devised for this study. Results: Two-hundred adults (100M, 100F) were interviewed. Their average age was 37 years (20 to 60 years), and they had different socioeconomic and educational backgrounds. From this group, 184 (92%) said they had heard or read about epilepsy, but 88.5% of them believed they knew very little or nothing about the disease. Forty percent of the group personally knew someone suffering from the disease and 37.5% of them had seen at least one episode of seizure. Twenty percent of the individuals would not allow their children to play with epileptic children, and 23.5% would not approve the marriage of their offspring to someone with epilepsy. According to 6% of the individuals, epilepsy is a contagious disease. Only one quarter of the individuals could name an anticonvulsant drug and 88.3% of them cited phenobarbital (usually by the commercial name Gardenal).Over 80% of the people interviewed believe that people with epilepsy suffer discrimination by the society. Conclusion:The lack of knowledge and the myths about epilepsy still rate high in the population. Introduction Methods Epilepsy is a neurological condition characterized by recurrent seizures that can be manifested in different manners, according the affected area of the brain. Beyond the high impact and the burden of epilepsy, patients frequently face rejection from the society1. This may result in psychological and psychiatric conditions, adding to the negative impact of the disease. Tonic-clonic seizures with loss of conscience are particularly dramatic and people may be uncomfortable having patients with this type of epilepsy in their personal and professional environment. Ignorance, fear and mystification of the disease will invariably affect the patients, their families and, ultimately, the successful treatment of epilepsy. Epilepsy stigma may have different levels affecting the personal and professional life of an individual with the disease. The social and quality of life problems arising from a diagnosis of epilepsymay represent even greater challenges than the disease itself2. Even the mother of an epileptic child may find it difficult to live with this diagnosis3, while teachers tend to underestimate the capability of epileptic children4. The objective of the present study was to assess the knowledge about epilepsy in a Brazilian population of unaffected individuals. The study was approved by the Ethics Committee of Universidade Metropolitana de Santos under the registration number CAAE 04806212.2.0000.5509, .and all participants signed a written consent to take part in the project. This was a transversal study carried out with individual face-to-face interviews with 200 individuals aged between 20 and 60 years. These individuals were residents of the city of Santos (Brazil) where literacy rates are 96.6%. The group was organized to include 100 men and 100 women and to cover a variety of socioeconomic and schooling levels. The questionnaire used in the interviewed was specifically created with this purpose and all data were included in an excel file for analysis. Except for the simplest mathematical calculations, the results were analyzed and presented in a descriptive manner. Results The average age of the 100 men and 100 women participating in this study was 37 years, and their economic level according to the Brazilian classification was class A1 = 2%; A2 = 15,5%; B1= 19%; B2 1) Medical student at Universidade Metropolitana de Santos, Santos, SP, Brazil 2) Head of the Department of Neurology, Universidade Metropolitana de Santos, SP, Brazil. Correspondence: YD Fragoso, Department of Neurology, Medical School, UNIMES Rua da Constituição 374, CEP 11015-470, Santos SP, Brazil. E-mail: [email protected] Conflicts of interest to declare: This study was carried out withour financial support from private or public institutions. The project is part of the Scientific Initiation Program at Universidade Metropolitana de Santos, SP, Brazil. Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 01/03/2014; publicado online em: 31/05/2014. 38 Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 38 - 39, abr / mai / jun 2014 = 23%; C1 = 51%; C2 = 7.5%; and D = 7.5%. This classification is based on the goods a family possesses and the present distribution represents the typical Brazilian percentages of each economic class5,6. While 92%of the individuals reported having read or heard about epilepsy, 88.5% of them referred to know little or nothing about the disease. Forty percent of the group personally knew someone with epilepsy, and 37.5% had already seen a patient having a seizure. These individuals who witnessed a seizure reported the most frequent signs as tongue biting (34.9%), loss of conscience (30.1%), a state of mental confusion after the seizure (25.2%) and loss of urine and/or feces (9.8%). Only two thirds of the individuals interviewed knew that epilepsy was not contagious (6% thought it was and 27% were not sure). Only 40% of those interviewed knew that epilepsy itself did not affect the mental ability of a person, but 14% considered that medications might induce serious mental compromise. Only one quarter of the people interviewed could name an anticonvulsant drug, and 88.3% of them cited phenobarbital as the only drug they ever heard about. Regarding their views on epileptic children, 20% of those interviewed would not allow their own children to play with epileptics, and 17% were not sure whether they would let such friendship flourish. In addition, 23.5% of all individuals interviewed in the present study would not allow their offspring to marry someone with epilepsy, while 28% were not sure whether they would permit such relationship to occur. While 85.5% of individuals agreed that the society discriminates epileptic people, they did not see themselves doing so. Discussion Epilepsy is a frequent neurological disease, affecting millions of people worldwide. A recent survey in the USA estimated that 1.0% of their adult population suffered from epilepsy but this number rose to 1.9% if only people with lower annual income were considered7.Patients with epilepsy live daily with the enacted or perceived stigma based on myths, misconceptions and misunderstandings that have persisted for thousands of years8. The image of epilepsy in Brazil is often associated with criminal behavior and violence, dating as long ago as the theories of Cesare Lombroso (1835-1909) and still perpetuated by media headlines9. An interesting aspect observed in those who witness a seizure is the “we see what we expect to see” phenomenon, previously pointed out by other studies10. In Brazil, the tongue-biting idea related to seizures is very well known and, in fact, when asked about the seizure they had witnessed, people most frequently mentioned tongue-biting as the main aspect of the convulsion. In London, due to the excessive foaming through the mouth portrayed by films and television, this was frequently reported among people interviewed about seizures10. Although most papers dealing with the myths and taboos related to epilepsy are from developing countries11-14, also in the USA and Europe the misconceptions are frequent among the general population10,15. Perhaps the most striking feature of the present study was the fact that participants agreed that there was prejudice against epileptic patients, but many of them would not allow their children to play with or to marry to an individual with epilepsy. Similar rejection rates were observed in Greece16. References 1. Thomas SV, Nair A. Confronting the stigma of epilepsy. Ann Indian Acad Neurol. 2011;14(3):158-63. 2. Jacoby A, Austin JK. Social stigma for adults and children with epilepsy. Epilepsia. 2007;48 Suppl 9:6-9. 3. Pekcanlar Akay A, Hiz Kurul S, Ozek H, Cengizhan S, Emiroglu N, Ellidokuz H. Maternal reactions to a child with epilepsy: Depression, anxiety, parental attitudes and family functions. Epilepsy Res. 2011;95(3):213-20. 4. Katzenstein JM, Fastenau PS, Dunn DW, Austin JK. Teachers' ratings of the academic performance of children with epilepsy. Epilepsy Behav. 2007;10(3):426-31. 5. http://classe-social.info accessed 10th December 2012. 6. http:// www.ipcbr.com, dados demográficos, accessed 10th December 2012. 7. Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Epilepsy in adults and access to care - United States, 2010. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2012;16;(61):909-13. 8. Bandstra NF, Camfield CS, Camfield PR. 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Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 38 - 39, abr / mai / jun 2014 39 Lesões císticas do pâncreas The cystic pancreatic lesions 1 Marco Antonio Buch Cunha 1 Lubia Bonini Daniel Flavia Gerbi Azevedo2 Renato Brassolotto Bello2 Luciana Cleaver Aun2 2 Osmar Silvio Garcia de Oliveira 2 Carlos Kioshi Furuya Junior 2 Ricardo Sato Uemura Katia Ferreira Guenaga2 Dayse Pereira da Silva Aparicio2 Everson Luiz de Almeida Artifon3 RESUMO As lesões císticas do pâncreas são peculiares em relação ao diagnóstico e tratamento, devendo ser lembradas como diagnóstico diferencial nos pacientes com quadro de dor abdominal e lombar, perda de peso, empachamento pósprandial, icterícia, pancreatite e massas abdominais palpáveis. Podem ser divididas em pseudocistos, cistos não-neoplásicos e cistos neoplásicos (cistoadenoma seroso, cistoadenoma mucinoso e neoplasia mucinosa papilar intraductal). Geralmente são diagnosticadas incidentalmente em exames de imagem abdominal por queixas inespecíficas, podendo ser melhor estudadas através da ecoendoscopia (endossonografia), a qual pode diferenciar lesões benignas de malignas. Este é um método diagnóstico que possui maior sensibilidade em lesões císticas menores que 2,0 cm de diâmetro, permitindo ainda a punção aspirativa com agulha fina do conteúdo líquido cístico, onde a análise pode auxiliar no diagnóstico diferencial das lesões císticas. A análise do conteúdo líquido dos cistos pancreáticos pode ser realizada por meio de sua citologia e bioquímica (amilase, lipase e dos marcadores tumorais CEA e CA19-9). De acordo com os resultados laboratoriais, as hipóteses diagnósticas podem ser feitas com boa sensibilidade e especificidade. Portanto, lesões císticas pancreáticas são afecções com alta possibilidade de cura na ocasião do diagnóstico precoce, podendo oferecer-se tratamento precoce e efetivo. ABSTRACT Cystic lesions of the pancreas are peculiar regarding the diagnosis and treatment and should be remembered as a differential diagnosis in patients with abdominal pain and lower back, weight loss, postprandial bloating, jaundice, pancreatitis and palpable abdominal masses. They can be divided in pseudocysts, cysts non- neoplastic and neoplastic cysts (serous cystadenoma, mucinous cystadenoma and intraductal papillary mucinous neoplasm). They are usually found incidentally on abdominal imaging by nonspecific complaints and can be better studied by echoendoscopy (endosonography), which can differentiate benign from malignant lesions. This is a diagnostic method that has greater sensitivity in cystic lesions smaller than 2.0cm in diameter, while still allowing fine-needle aspiration of the cystic fluid content where analysis can aid in the differential diagnosis of cystic lesions. The analysis of the liquid contents of pancreatic cysts can be performed through its cytology and biochemical (amylasis, lipasis and tumor markers CEA and CA19 -9). According to the laboratory results diagnostic hypotheses can be made with good sensitivity and specificity. Therefore, pancreatic cystic lesions are diseases with high possibility of cure at the time of early diagnosis and can offer up early and effective treatment. Key words: Pancreas. Neoplasms. Endosonography. Pancreatic Cyst. Pancreatic Pseudocyst. Descritores: Pâncreas. Neoplasias. Endossonografia. Cisto Pancreático. Pseudocisto Pancreático. Introdução Lesões císticas pancreáticas podem ser encontradas durante a avaliação de pacientes com dor abdominal e pancreatite, porém, estão cada vez mais sendo diagnosticadas incidentalmente em exames de imagem abdominal por causas inespecíficas1. Essas lesões podem ser divididas em pseudocistos, cistos nãoneoplásicos e cistos neoplásicos, que incluem cistoadenoma seroso, cistoadenoma mucinoso e neoplasia mucinosa papilar intraductal. Sabe-se ainda que outros tumores pancreáticos também podem conter espaços císticos ou regiões de degeneração cística, como neoplasia sólida pseudopapilar, tumor endócrino cístico e até adenocarcinoma ductal2. Uma avaliação adequada é importante, pois cistos nãoneoplásicos requerem tratamento apenas quando sintomáticos, enquanto algumas das neoplasias císticas têm um potencial maligno significante e devem ser ressecadas. Diagnóstico Os sinais e sintomas mais comuns são dor abdominal, perda de peso, dor lombar, icterícia, pancreatite, massa abdominal palpável e empachamento pós-prandial3. Devido ao seu aspecto radiológico, as neoplasias císticas pancreáticas podem ser erroneamente classificadas como pseudocistos3-5. Entretanto, apesar de sua semelhança, elas são diferenciadas por meio de suas características clínicas, achados ecoendoscópicos, citológicos e da análise do conteúdo líquido em seu interior (Tabela 1). 1- Residente do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2- Médico Assistente do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 3- Chefe do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Correspondência: Av. Mal. Floriano Peixoto, 227, Apto 82, Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 30/11/2013; publicado online em: 31/05/2014. 40 Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 40 - 44, abr / mai / jun 2014 Tabela 1: Carac terístic as das lesões císticas pancreática s. Qua dro clínico Achados e coendoscópicos Líquido Citologia Potenc ia l maligno P se udocisto Históric o de pancreatite Anecóic o, parede espe ssa, Fino, N eutrófilos, grave ou moderada raras se ptações, linfonodos amarronzado macrófagos, histiócitos; regionais infla matórios pode m c oloração nega tiva pa ra ser vistos IPMN N enhum muc ina Históric o de pancreatite, Ducto pancreático princ ipal Viscoso, claro dor abdominal ou ac hado dila tado ou ductos secundários; muc inosas com atipia inc idental pode se r um cisto septado; variá vel; coloração pode ter um componente sólido Células colunares Sim A análise do conteúdo líquido dos cistos fornece informações importantes a respeito de sua etiologia. Os exames mais realizados são a citologia, a dosagem bioquímica de amilase e dos marcadores tumorais antígeno carcinoembrionário (CEA) e CA 199. Dependendo desses resultados, a orientação para uma hipótese diagnóstica da lesão cística pode ser feita com boa sensibilidade e especificidade (Tabela 2)8. positiva para m ucina Cistoadenoma Geralmente um ac hado M acrocístico, septado; mucinoso inc idental, ma s pode ca lc ificações periféricas, Viscoso, claro muc inosas com atipia causa r dor abdominal e componentes sólidos e Células colunares variá vel; coloração massa pa lpável linfonodos re gionais qua ndo Sim positiva para m ucina malignos Cistoadenoma Geralmente um ac hado M icroc ístico c om padrão “fa vo Fino, claro ou E pitélio c uboide com seroso inc idental, ma s pode de mel”; raramente possui se rossanguinole c oloração positiva para causa r dor abdominal e componente macrocístic o; nto glicogênio massa pa lpável ca lc ificação c entra l Neoplasia endócrina Pode ter cara cterísticas Cisto unilocular oc upa qua se Fino, claro Células monomórficas cística clínic as de neoplasia toda a ne opla sia Q uase nulo Sim de tumor e ndócrino; endócrina sólida c oloração positiva para pancreática c romogranina e Tipos de lesões císticas: sinaptofisina Neoplasia sólida Geralmente um ac hado Sanguinolento e Células monomórficas pseudopapilar inc idental; raramente Compone ntes sólidos e císticos com debris c om núcleo causa desconforto necróticos a rredondado; abdomina l Sim e osinofílico; coloração positiva para vimentina ea -1-antitr ipsina Adenocarc inoma Icte rícia indolor, dor M assa sólida primariame nte Sanguinolento Pode ser observado ductal com abdomina l/lombar ou com espaç os císticos com ou sem a denocarcinoma degeneraç ão c ístic a rarame nte com pancreatite debris maligno, mas vá rios Já presente gra us de atipia pode m e star presentes Fonte: Jacobson BC, Baron TH, Adler DG et al. AS GE guideline: The role of endoscopy in the diagnosis and the management of cystic lesions and inflammatory fluid collections of the pancreas. Ga strointest Endosc. 2005;61(3):363-70. Dentre os exames de imagem, a tomografia computadorizada com cortes finos é a forma mais utilizada no diagnóstico de lesões císticas, podendo fornecer informações sobre a localização no parênquima pancreático, relação com vasos e influenciar a estratégia terapêutica. A ressonância nuclear magnética pode ser uma alternativa para melhor avaliação da anatomia ductal, também sendo uma opção nos casos de alergia ao contraste iodado. Na figura 1, propomos um algoritmo de investigação e conduta na abordagem das lesões císticas pancreáticas (adaptado de Figueiras et al.)6. a) Pseudocisto pancreático Os pseudocistos são um tipo de coleção líquida que resulta da inflamação e necrose pancreática, como complicações de pancreatite crônica, aguda, ou trauma pancreático. Compreendem cerca de 15% a 30% de todas as lesões císticas pancreáticas e cerca de metade dos cistos pancreáticos em pacientes com histórico de pancreatite9,10. Em um paciente com histórico de pancreatite aguda, uma lesão cística somente deve ser diagnosticada como pseudocisto se houver um exame de imagem prévio demonstrando sua ausência. A ausência de um epitélio interno é o que distingue o pseudocisto de uma lesão cística verdadeira, pois sua parede é formada por um tecido fibroso e de granulação originados de um processo inflamatório. Podem ser únicos ou múltiplos e a maioria dos pseudocistos possui comunicação com o sistema ductal pancreático, contendo altos níveis de amilase e lipase. De acordo com a classificação revisada de Atlanta de 199211: · Pseudocisto pancreático: coleção bem definida, encapsulada, com líquido homogêneo e componente sólido; · Walled-off necrosis: coleção bem definida, encapsulada, com líquido heterogêneo e presença de componente sólido necrótico. A maior parte dos pseudocistos tem resolução espontânea, contudo, podem ocorrer complicações agudas como infecção, rotura e sangramento e complicações crônicas como obstrução biliar, trombose de veia esplênica ou porta e dificuldade no esvaziamento gástrico. Nesses casos, o tratamento de drenagem cirúrgica, percutânea ou endoscópica está indicado – Figura 2. Figura 1: Abordagem das lesões císticas pancreáticas - adaptado de Figueiras et al.6. A ecoendoscopia é um método diagnóstico que possui maior sensibilidade em lesões císticas menores que 2cm de diâmetro e ainda permite a punção aspirativa com agulha fina do conteúdo líquido cístico, onde a análise pode ajudar no diagnóstico diferencial das lesões císticas7. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 40 - 44, abr / mai / jun 2014 Figura 2: Tomografia de abdome evidenciando volumoso pseudocisto pancreático situado no mesogástrio, com paredes espessas e contato com a parede gástrica. À ecoendoscopia setorial percebe-se volumoso pseudocisto com conteúdo anecóico, medindo 12,1 cm X 6,6 cm. A drenagem ecoguiada falhou devido à parede espessa do pseudocisto com impossibilidade de dilatação do trajeto. Paciente foi submetido à cistogastrostomia cirúrgica. b) Cistos pancreáticos não-neoplásicos Os cistos pancreáticos não-neoplásicos são raros e geralmente assintomáticos, não necessitando de tratamento específico. Na maioria das vezes, são diagnosticados depois de uma ressecção 41 devido à suspeita de tratar-se de uma neoplasia cística pancreática no pré-operatório. Eles incluem cistos verdadeiros, cistos de retenção, cistos mucinosos não-neoplásicos e cistos linfoepiteliais. c) Neoplasias císticas pancreáticas A identificação de neoplasias císticas pancreáticas é importante, pois algumas possuem potencial maligno e têm indicação cirúrgica. Seus quatro subtipos são: · Neoplasia cística serosa; · Neoplasia cística mucinosa; · Neoplasia mucinosa papilar intraductal · Neoplasia sólida pseudopapilar. Neoplasia cística serosa A maioria das neoplasias císticas serosas são cistoadenomas, que são neoplasias benignas formadas por células cuboidais ricas em glicogênio originadas de células centroacinares do pâncreas exócrino. Localizam-se predominantemente no corpo e cauda pancreáticos e são mais diagnosticadas em mulheres acima de 60 anos12-14. À ecoendoscopia, podemos caracterizar as lesões em suas variações morfológicas: microcística, macrocística e mista. A variação mais frequente é a microcística, que consiste em uma lesão hipoecóica, heterogênea, com vários cistos anecóicos separados por septos finos e regulares, determinando um aspecto em “favo de mel” – Figura 3. Esses septos podem coalescer, formando uma cicatriz central, que quando calcificada, denota um sinal patognomônico nos exames de imagem. A variação macrocística é composta por um ou mais cistos acima de 20mm, dificultando sua diferenciação com as lesões mucinosas. O padrão misto, com cistos de tamanho macrocístico. Uma vez que sua degeneração maligna é extremamente rara, o tratamento só é necessário quando há presença de sintomas ou quando ocorre um crescimento rápido da lesão. Na maioria dos casos, está indicado um acompanhamento clínico e através de exames de imagem (avaliar tamanho e conteúdo da lesão). Figura 3 – Lesões císticas na cabeça (A) e colo (B) do pâncreas caracterizada por vários pequenos cistos agrupados e traves hiperecogênicas no centro (cicatriz estrelar). O aspecto ecoendoscópico é sugestivo de cistoadenoma seroso. Neoplasia cística mucinosa As neoplasias císticas mucinosas ocorrem quase que exclusivamente em mulheres e são mais comumente diagnosticadas acima dos 40 anos de idade. Possuem um grau de atipia celular variável e secretam mucina, semelhantemente às neoplasias mucinosas papilares intraductais15,16. Entretanto, em contraste com estas últimas, não se comunicam com os ductos pancreáticos e apresentam tecido estromal semelhante ao ovariano que tipicamente tem origem do corpo ou cauda pancreáticos16,17. À ecoendoscopia, podemos caracterizá-la mais frequentemente como uma lesão macrocística, que pode ser multiloculada ou microcística, que é mais rara. Suas paredes são geralmente finas e bem definidas em relação ao parênquima pancreático. Evidências de nodularidade mural, calcificação na parede (aspecto em casca 42 de ovo) e obstrução ductal são indicativos de malignidade da lesão – Figura 4. A Organização Mundial de Saúde (OMS) classificou seu aspecto patológico em adenoma (cistoadenoma mucinoso), borderline e maligno (cistoadenocarcinoma mucinoso)9. Devido ao seu potencial maligno, estando o paciente em condições clínicas favoráveis, a ressecção cirúrgica é recomendada. Figura 4 – Ecoendoscopia setorial demonstrando imagem cística de 47mm X 34mm, em corpo pancreático, com traves e conteúdo espesso interno, compatível com neoplasia mucinosa (cistoadenoma mucinoso). Neoplasia mucinosa papilar intraductal (IPMN) As neoplasias mucinosas papilares intraductais são lesões produtoras de mucina originadas do sistema pancreático ductal que exibem graus de atipia celular variável e causam dilatação dos ductos pancreáticos18. Têm um pico de incidência acima dos 50 anos de idade e igual distribuição entre os sexos. De forma semelhante às neoplasias mucinosas, podem ser classificadas de acordo com o grau de atipia em adenoma, borderline ou carcinoma mucinoso papilar intraductal. Localizamse principalmente na cabeça do pâncreas, sendo comum a presença de doença multifocal9 – Figura 5. Figura 5 – Tomografia evidenciando dilatação uniforme do ducto pancreático a partir da cabeça do órgão onde se verifica lesão cística multiseptada. À ecoendoscopia, verifica-se dilatação do ducto pancreático e, na cabeça do pâncreas, lesão macrocística com septos finos, não comunicante ao ducto de Wirsung. A imagem endoscópica demonstra papila pátula com drenagem de material mucoide. A ecopunção demonstrou tratar-se de IPMN. Em relação ao acometimento do sistema ductal, o IPMN pode acometer o ducto pancreático principal, os secundários ou ambos. Sabe-se que o acometimento dos ductos secundários evolui com menos frequência para um carcinoma invasivo, o que é importante para a definição de conduta. O último consenso internacional, em 2012 19 , indica as características para o tratamento cirúrgico dos IPMN de ductos secundários, com seu manejo clínico dependendo do grau de acometimento do ducto pancreático principal ou secundário, da presença de componente sólido, da ocorrência de calcificações e do tamanho do cisto – Figura 6. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 40 - 44, abr / mai / jun 2014 pancreática, com ou sem esfincterotomia, pode ser adequada se a coleção tiver comunicação com o ducto pancreático principal31,32. Uma vantagem da abordagem transpapilar, quando comparada à transmural, é a prevenção de hemorragia ou perfuração que podem ocorrer com esta última. A desvantagem seria que uma prótese pancreática pode induzir a uma cicatrização e fibrose do ducto pancreático principal, alterando sua anatomia em pacientes cujo ducto pancreático é normal e, ainda, dificultando a adequada drenagem de coleções maiores33,34. Figura 6 – Abordagem do IPNM de ducto secundário. Fonte19: Tanaka M, Fernández-del Castillo C, Adsay V, et al. International consensus guidelines 2012 for the management of IPMN and MCN of the pancreas. Pancreatology 2012;12(3):183-97. Neoplasia sólida pseudopapilar As neoplasias sólidas pseudopapilares pancreáticas são raras e ocorrem geralmente em mulheres jovens com menos de 35 anos de idade. Estão localizadas mais comumente no corpo e cauda pancreáticos, e podem conter ambos os componentes, sólido e cístico, além de áreas de calcificação20,21. Drenagem de coleções líquidas pancreáticas - tratamento endoscópico O tratamento endoscópico para drenagem de coleções líquidas pancreáticas é aceito como uma opção menos invasiva que a drenagem cirúrgica ou percutânea. Apesar de existirem terapêuticas ecoguiadas de ablação para neoplasias císticas com injeção de etanol ou outros agentes ablativos, seu uso está restrito a casos selecionados e não devem ser utilizadas rotineiramente na prática clínica22-25. Indicações As indicações para drenagem endoscópica estão, principalmente, relacionadas aos sintomas do paciente, sendo os principais: dor abdominal, retardamento no esvaziamento gástrico, saciedade precoce, perda de peso e icterícia. A infecção cística e o aumento de seu tamanho também são indicativos de tratamento. A maturação da parede cística das coleções líquidas pancreáticas, onde o aspecto é bem definido, está relacionada ao tempo do episódio de pancreatite – maior que quatro semanas. Este aspecto as torna tecnicamente favoráveis à drenagem endoscópica. Em outro aspecto, somente o tamanho do pseudocisto não é uma indicação para a sua drenagem, porém sabe-se que quando atingem dimensões maiores que 6cm eles tendem a ser sintomáticos. Dessa forma, podemos resumir as indicações em: · Sinais e sintomas clínicos; · Tamanho maior que 6cm; · Tempo acima de quatro semanas. b) Técnica transmural Essa técnica é obtida por meio da colocação de uma ou mais próteses através da parede gástrica ou duodenal. Uma avaliação ecoendoscópica antes da drenagem pode ser feita para reduzir as chances de complicações, definindo a melhor topografia para a punção e drenagem da coleção30,35-38. A inviabilidade na realização de uma ecoendoscopia não significa a suspensão do procedimento, exceto nos casos em que não haja um abaulamento endoscopicamente visível, a presença de vasos interpostos ou uma falha prévia na tentativa de drenagem. Nesses casos, o local de punção deve ser o ponto máximo de compressão extrínseca causada pela coleção. A punção da coleção é realizada com uma agulha de grande calibre ou um estilete com eletrocautério29. Após a passagem de um fio guia na cavidade, é realizada uma dilatação balonada do trajeto seguida da colocação de uma ou mais próteses, geralmente plásticas tipo duplo pigtail, para obter-se a drenagem. Recentemente, o uso de próteses metálicas auto-expansíveis temse tornado uma alternativa às próteses plásticas, com a vantagem de formarem uma fístula de maior diâmetro, reduzindo o risco de obstrução precoce e, ainda, permitindo um acesso endoscópico para exploração da cavidade39-44. Essa técnica vem sendo utilizada com boa frequência em nosso serviço, onde foram obtidos resultados satisfatórios na resolução tanto de pseudocistos, como em walled-off necrosis, nos quais são necessárias novas abordagens e sessões de lavagens internas da coleção. Complicações Recomenda-se que a drenagem endoscópica de uma coleção pancreática seja realizada somente com a disponibilidade de radioscopia e suporte clínico adequado em caso de complicações45, as quais podem ocorrer durante o procedimento ou a partir da drenagem inadequada do conteúdo das coleções Infecção é a principal complicação, e deve-se à obstrução das próteses, quando o conteúdo é espesso ou está associado à presença de restos necróticos. Outras complicações incluem sangramento, perfuração, pancreatite, broncoaspiração do conteúdo da coleção, migração da prótese, lesão ao ducto pancreático e complicações relacionadas à sedação. Resultados O resultado após uma tentativa de drenagem endoscópica depende do tipo de coleção e da experiência do endoscopista45,46. De uma forma geral, o sucesso da drenagem endoscópica dos pseudocistos é obtido em 82% a 89% dos casos, com taxas de complicações que variam de 5% a 16%; e as de recorrência entre 4% a 18%47-49. A experiência com drenagem endoscópica de walled-off necrosis é ainda limitada, mas em dois estudos apresentou resolução nãocirúrgica bem sucedida em 31 dos 43 pacientes incluídos (72%)45,48. Em um estudo de Park et al50 a drenagem transmural de abscessos pancreáticos através da colocação de próteses obteve uma resolução em 91% (10) dos casos, ocorrendo sangramento autolimitado em apenas um (11%). Técnica A abordagem endoscópica para drenagem de um pseudocisto pode ser transpapilar, transmural ou uma combinação das duas 2630 . A decisão de qual método a ser utilizado deve ser baseada na relação anatômica da coleção com o estômago e duodeno, com a presença de comunicação ductal e no seu tamanho. Referências a) Técnica transpapilar A drenagem transpapilar por meio da colocação de uma prótese 1. Spinelli S, Fromwiller TE, Daniel RA, Kiely JM, Nakeeb A, Komorowski RA, Wilson SD, Pitt HA. Cystic pancreatic neoplasms: observe or operate. Ann Surg. 2004;239(5):651-7. 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O tratamento é paliativo e sempre que possível deve-se indicar a quimioterapia intratecal. The meningeal carcinomatosis is a rare condition (5-8%) that can occur in solid and hematological tumors. The tumors that are most associated with it are decreasing order: breast, lung, melanoma, leukemias and lymphomas. There are several forms of tumor dissemination to reach the cerebrospinal fluid, as hematogenous, lymphatic spread, direct extension, among others. The clinical manifestations can be paralysis of cranial nerves, headache, convulsions, and coma. Usually the diagnosis is made by collecting the cerebrospinal fluid, however, it can be negative in 10% of all. Without treatment, median survival is about a month and a half. The best modality is intrathecal chemotherapy, should be indicated whenever it is possible. Descritores: Carcinomatose Meningea; Câncer de Mama. Key words: Meningeal Carcinomatosis. Breast Cancer. Introdução A carcinomatose meníngea, descrita inicialmente em 18701, pode ser identificada em 4-15% dos pacientes com neoplasia2. Alguns autores referem que essa taxa varia em uma faixa mais estreita, 5 a 8%3 daqueles pacientes portadores de tumores sólidos (mais frequentes), leucemias e linfomas. Tumores cerebrais primários apresentam essa condição em uma frequência bem menor. Inicialmente, a carcinomatose meningea era uma condição rara, porém, atualmente, representa uma incidência considerável3. Os tumores primários mais relacionados são: mama, pulmão e melanoma. Na neoplasia de mama, o acometimento das leptomeninges pode alcançar 2-5% dos casos4. Há uma estimativa que cerca de 30-60% dos pacientes com diagnóstico de carcinomatose meníngea é portador de neoplasia de mama5. No tumor de mama, a incidência é maior no subtipo lobular (58%) em relação ao ductal (33%)4. Em se tratando da neoplasia de pulmão, o tipo histológico mais relacionado é o adenocarcinoma6. Fisiopatologia As células tumorais atingem as meninges por diversas vias: disseminação hematogênica, linfática, extensão direta por depósitos contíguos; e por meio da migração centrípeta a partir de tumores sistêmicos ao longo dos espaços perineurais e perivasculares7. Uma vez dentro do espaço subaracnoide, as células neoplásicas são transportadas pelo líquor, resultando em comprometimento disseminado e multifocal do neuroeixo3. A infiltração tumoral acomete principalmente a base do crânio, mais especificamente nas cisternas basilares e na superfície dorsal da medula espinhal, em particular na cauda equina. A obstrução do fluxo do líquor por nódulos tumorais depositados ao nível do quarto ventrículo pode resultar em hidrocefalia. Essas formações nodulares podem interferir negativamente na ação de quimioterapia intratecal, pois os agentes quimioterápicos administrados por essa via penetram milímetros nos tecidos adjacentes 1. Quadro clínico As manifestações clínicas da carcinomatose leptomeníngea consistem em sinais e sintomas relacionados a três áreas da função neurológica: os hemisférios cerebrais; os nervos cranianos; e a medula espinhal e raízes associadas3,5. Cerca de 40% dos pacientes que desenvolvem essa complicação existe o acometimento de nervos cranianos, evoluindo com as manifestações mais frequentes: diplopia, redução da acuidade visual, redução do paladar e paralisia facial8. Hidrocefalia, cefaleia, vômitos e alterações do nível de consciência pode ocorrer em cerca de 70% dos casos9. 1) Residente de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil 2) Chefe do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Instituição: Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 10° andar – 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 03/03/2014; publicado online em: 31/05/2014. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 45 - 47, abr / mai / jun 2014 45 Outros sinais incluem confusão, demência, convulsões e hemiparesias. Cerca de metade dos pacientes desenvolve acometimento das raízes espinhais, apresentando alteração de reflexos tendinosos profundos, alteração da sensibilidade, disfunção vesical e retal9. Ponto importante que deve ser sempre lembrado é a precocidade do diagnóstico. O atraso está diretamente relacionado a pior prognostico1. Diagnóstico O exame do líquor representa o exame laboratorial padrão ouro para o diagnóstico da carcinomatose meníngea. A citologia oncótica é negativa em cerca de 10% dos casos, percentagem que representa os falsos-negativos. Portanto, uma citologia oncótica negativa, não exclui o diagnóstico9. As anormalidades observadas na análise bioquímica do líquor são: aumento de proteína (76%), redução da glicorraquia (32%), aumento da contagem celular a custa de linfócitos provável de origem reacional (56%)6. Essas alterações são sugestivas, porém, não são diagnósticas7. Já a presença de células neoplásicas estabelece o diagnóstico, contudo, nem sempre são identificadas em uma única amostra. A natureza do tumor não pode ser estabelecida por meio do exame citológico3. Embora o diagnóstico possa ser estabelecido em 80% dos pacientes por meio de uma segunda punção, o benefício é limitado com a realização de um número maior de procedimentos. Se o paciente apresenta sinais e sintomas cranianos, uma amostra obtida por punção ventricular, geralmente apresenta uma positividade maior que o líquor colhido via lombar, bem como na presença de sinais e sintomas espinhais, a amostra obtida por punção lombar é frequentemente positiva. A ressonância magnética (RM) contrastada com gadolíneo representa a técnica de escolha para avaliar pacientes com suspeita de metástases leptomeníngeas. Esse exame é capaz de detectar cerca de 60 a 70% dos casos de carcinomatose meningea, devendo ser realizada sempre que aventada a suspeita10. A RM é mais sensível que a tomografia computadorizada contrastada, pois qualquer irritação das leptomeninges resultará em um aumento de sinal7. A imagem observada na RM corresponde a hipercaptação do contraste, focal ou generalizada, nos nervos cranianos, cisternas, no epêndima, na superfície do cérebro e na medula espinhal. Podem-se também observar redução no volume do parênquima cerebral, hidrocefalia e nódulos subaracnóides. A taxa de falso-negativos na RNM pode alcançar 30% 6. Portanto, o diagnóstico de Carcinomatose Meningea pode ser dado se citologia do líquor positiva para células neoplásicas ou se quadro clínico compatível com acometimento multifocal neurológico e exames de imagem sugestivos, mesmo com citologia oncótica negativa8. O bloqueio do fluxo liquórico representa um sinal de mau prognóstico e constitui uma indicação formal para o tratamento focal com radioterapia3. Prognóstico Estima-se que a sobrevida mediana de pacientes portadores que evoluem com carcinomatose meningea não tratada é de quatro a seis semanas7,8. A disfunção cerebral progressiva é a responsável pelo grave desfecho dessa condição. A intenção do tratamento é melhorar ou estabilizar a condição neurológica, bem como aumentar a sobrevida. Geralmente, a evolução é desfavorável em pacientes que apresentam comprometimento do estado geral, várias alterações neurológicas fixas, doença maciça no sistema nervoso central, encefalopatia carcinomatosa e anormalidades no fluxo observadas na ventriculografia. Pacientes com doença metastática sistêmica que já não apresentaram boa responsta aos tratamentos quimioterápicos sistêmicos, dificilmente apresentarão um benefício da terapêutica 46 intratecal. O tratamento precoce, antes do aparecimento de déficits neurólógicos fixos, é crítico para impedir a progressão da doença7. Tratamento O tratamento tem caráter paliativo na tentativa de evitar a progressão, bem como estabilizar os sintomas neurológicos. A avaliação da eficácia do tratamento da CM é complicada pela ausência de uma conduta padrão 8 pela dificuldade na demonstração de uma resposta diante dos métodos de diagnóstico pouco sensíveis e pelo fato de a mortalidade estar frequentemente associada à progressão da doença sistêmica3. A radioterapia tem papel importante na paliação dos sintomas neurológicos. Porém quando realizada radiação de todo o neuroeixo, está associada a uma alta morbidade e a mielossupressão importante, portanto não deve ser indicada3. A radioterapia deve atingir a dose de 30Gy (10-12 frações) se forem evidenciados pontos de obstrução ao fluxo e lesões visualizadas pelos exames de imagem8. A quimioterapia intratecal é o tratamento de escolha nos casos de carcinomatose meningea, apresenta inúmeras limitações. Uma delas é a baixa penetração nos nódulos tumorais. Se houver uma obstrução ao fluxo liquórico, há um aumento da toxicidade bem como falha terapêutica8. Ddemonstrou-se que o Metotrexate, quando administrado via intraventricular, possui distribuição mais uniforme, quando comparada com a infusão via lombar12. Nesta, a chance de administração no espaço subdural ou epidural é muito grande, reduzindo a concentração liquórica. A via intraventricular representa o sistema ideal na maioria dos casos por ser mais simples e confortável para o paciente e mais seguro do que a realização de punções lombares repetidas. Existem dois tipos básicos de reservatório: o Rickham Style, que consiste em um reservatório plano colocado sobre o orifício de trepanação e o reservatório de Ommaya, com a superfície em forma de cúpula, mais fácil de ser palpado. O cateter é posicionado no corno anterior do ventrículo lateral ou próximo do forâmen de Monro através de uma punção ventricular. É fundamental que a ponta do cateter e os orifícios laterais estejam posicionados completamente dentro do ventrículo para evitar a instilação da droga no parênquima cerebral7. Existem três agentes que são utilizados rotineiramente na quimioterapia intratecal, são eles: metotrexato, citarabina (incluindo a preparação liposomal) e a trietilenotiofosforamida (tiotepa). Não existe diferença de resposta entre os diversos agentes, e a frequência de sua utilização é variável. Os níveis liquóricos do preparado lipossomal da citarabina podem permanecer por mais de dez dias e a sua utilização pode parecer mais vantajosa. Alguns estudos, entretanto, descrevem uma frequência maior de meningite química associada àquele agente9. Infecções liquóricas ocorrem em cerca de 10% dos pacientes e resultam em cefaleia, febre e alterações do nível de consciência. O agente mais frequentemente identificado é o Staphylococcus epidermidis. Alguns autores recomendam a retirada imediata do reservatório e o tratamento da infecção com antibióticos sistêmicos. A meningite química pode ser tratada com corticosteroides e repouso. O uso combinado de quimioterapia e radioterapia pode resultar em leucoencefalopatia tardia, frequentemente sintomática. Alguns estudos argumentam que a quimioterapia intratecal não contribui significativamente para o controle da doença meníngea quando comparada ao tratamento sistêmico. Embora, o tratamento intratecal permanece como a terapia padrão para esses pacientes. A avaliação de resposta, como mencionada é limitada por uma análise citológica de difícil avaliação. Dos sintomas neurológicos associados à CM, a dor responde de uma forma mais consistente ao tratamento utilizado.2 O Metrotexate não é metabolizado pelo sistema nervoso central, alcançando a corrente sanguínea pelo coróide, podendo provocar neutropenia e mucosite em alguns pacientes. A suplementação do Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 45 - 47, abr / mai / jun 2014 ácido fólico pode amenizar essas complicações8. O MTX normalmente é administrado na dose de 12mg duas vezes por semana em um total de oito semanas, posteriormente dose mensal de manutenção9. Uma complicação que pode haver algumas horas após a infusão do quimioterápico é a meningite asséptica, podendo ocorrer em cerca de 30% dos casos. Normalmente, cursa com quadro clínico de febre, cefaleia, confusão mental, náuseas, vômitos e meningismo. Mesmo com uso de ácido fólico, cerca de 8% dos pacientes desenvolvem toxicidade6. Considerações finais O tratamento agressivo deve ser reservado para pacientes com uma estimativa de sobrevida superior a três meses e um estado geral preservado. O tratamento de suporte deve ser oferecido para todos os pacientes e inclui a utilização de anticonvulsivantes, analgésicos e ansiolíticos, quando necessários. Corticosteroides possuem eficácia limitada no controle de sintomas determinados pela CM7. Trata-se de uma complicação extremamente grave, com sobrevida curta, diretamente proporcional ao tempo entre e diagnóstico e o início do tratamento. of Clinical Oncology; 2002 May 18-21; Orlando. pp.369-74. 4. Jayson GC, Howell A, Harris M, Morgenstern G, Chang J, Ryder D. Carcinomatous meningitis in patients with breast cancer: an aggressive disease variant. Cancer. 1994;74(12):3135-41. 5. Bokstein F, Lossos A, Siegal T. Leptomeningeal metastases from solid tumors. Cancer. 1998;82(9):1756-63. 6. Chamberlain MC, Kormanik RN. Carcinoma meningitis secondary to nonsmall cell lung cancer. Arch Neurol. 1998;55:506-12. 7. Cole JS, Patchell RA. Metastatic epidural spinal cord compression. Lancet Neurol. 2008;7(5):459-66. 8. Wasserstrom WR, Glass P, Posner JB. Diagnosis and treatment of leptomeningeal metastases from solid tumors: experience with 90 patients. Cancer. 1982;49:759-72. 9. Mason WP, Yeh SDJ, DeAngelis LM. 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Diagnosis and treatment of leptomeningeal metastasis. 2002 Educational Book of the 38th Annual Meeting of the American Society Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 45 - 47, abr / mai / jun 2014 47 Seguimento e gravidez no pós-esvaziamento uterino devido à mola hidatiforme Follow up and pregnancy after emptying of the uterus owing to hydatidiform mole Daniel Machado1 João Henrique Araújo Fernandes2 RESUMO Relato de caso: descreve-se a gravidez molar em uma adolescente, na qual o acompanhamento da remissão espontânea foi prejudicado por uma nova gestação. Verificouse um aumento nos níveis de â-hCG sérico. Nesse momento, a atividade persistente do tecido trofoblástico possibilitou o diagnóstico e, por causa disso, a indicação de quimioterapia foi discutida. No entanto, por meio de exames complementares, foi descoberto um aborto durante o seguimento. Assim, depois de outro esvaziamento uterino, os valores séricos de â-hCG diminuíram e permaneceram negativos durante os outros controles. Desse modo, fica evidente que a gravidez torna difícil a interpretação e a conduta no seguimento da mola hidatiforme. Descritores: Doença Trofoblástica Gestacional. Quimioterapia. Gravidez Molar. Gravidez na Adolescência. Introdução A mola hidatiforme (MH) constitui uma modalidade da doença trofoblástica gestacional (DTG). Essa condição origina-se pela degeneração do tecido trofoblástico, no início da gravidez. Em um estudo da Escola Paulista de Medicina, a frequência de MH foi de 1:215 gravidezes1,2. Apesar de haver dificuldade, em alguns casos, para diferenciar a DTG de abortamento retido ou incompleto, a ultrassonografia superou os demais métodos não invasivos para o diagnóstico da mola3. O tratamento da MH consiste, em esvaziamento uterino e seguimento com exames complementares, principalmente, para diagnosticar precocemente o risco de malignização da doença, o qual varia de 15 a 33%4,5, sendo, neste caso, empregada a quimioterapia6. A elevação do nível sérico da gonadotrofina coriônica humana (hCG) é um parâmetro para esse diagnóstico. Assim, a gravidez, durante o seguimento da doença, causa confusão na evolução e na conduta da MH4. Relato de caso Paciente de 16 anos, nuligesta, chegou ao serviço, com queixa de sangramento vaginal. A data da última menstruação era desconhecida. Relatou uso de condom nas relações sexuais, menarca aos 12 anos e primeira relação sexual aos 14 anos de idade. Ao exame, apresentou bom estado geral, com temperatura ABSTRACT Case report: It is reported a case of molar pregnancy in an adolescent, in whom the follow up of the spontaneous remission was hampered by another pregnancy. It was found some rise in the serum determinations of â-hCG. At that time, the persistent activity of the trophoblastic tissue made the diagnosis possible. Thus, the indication of chemotherapy was discussed. However, by means of auxiliary exams, an abortion was discovered during the follow up. Thus, after another uterine evacuation, the values of serum â-hCG decreased and remained negatives during the other controls. So, it is evidenced that pregnancy can make difficult the interpretation and conduct in the follow up of the hydatidiform mole. Key words: Gestational Trophoblastic Disease. Chemotherapy. Molar Pregnancy. Pregnancy in Adolescence. corporal de 36,5ºC e pressão arterial de 100 x 60 mmHg, durante a palpação e toque vaginal negou dor e não foram evidenciadas massas ou visceromegalias. Entretanto, havia sangramento pelo orifício externo do colo uterino, em pouca quantidade. Conduta: pedido de â-hCG sérico qualitativo. Resultado do exame: positivo. O exame ultrassonográfico transvaginal evidenciou útero anteversofletido, com morfologia preservada, endométrio centrado, espessado e heterogêneo com 26 mm de espessura e discreta imagem sacular de oito mm, sem caracterização de eco embrionário, mas, sugerindo estado gravídico. O controle, após 15 dias, mostrou um â-hCG sérico quantitativo de 303.690 mUl/ ml e um exame de ultrassonografia com alterações inespecíficas que poderiam estar relacionadas com moléstia trofoblástica, pois apresentou múltiplas formações císticas com aspecto “em cacho de uva” no endométrio, medindo cerca de 5,7cm. O embrião não foi individualizado e o volume uterino era de 165ml. Foi realizado esvaziamento uterino por meio de curetagem e o material foi enviado para exame histopatológico, o qual apontou vilosidades coriônicas dilatadas, revestidas por citotrofoblasto hiperplásico com discreta atipia, apoiada em estroma de tecido conjuntivo frouxo, dando diagnóstico de mola hidatiforme. No seguimento, a mensuração do â-hCG sérico foi decrescente durante seis semanas, chegando a 2mUl/ ml, porém, com aumento do valor na sétima semana, atingindo 433 mUl/ ml, embora com o útero mantendo as dimensões normais com 80,5 cc, mas a ecotextura miometrial era finamente heterogênea e o eco endometrial espessado, ecogênico, com 10 mm de espessura. Com isso, 1) Residente de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/ SP. 2) Chefe do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/ SP. Instituição: Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/ SP, Brasil. Correspondência: Daniel Machado, Rua Pedro Américo, 60 – 10º andar, 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 30/05/2013; aceito para publicação em: 30/11/2013; publicado online em: 31/05/2014. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 48 Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 48 - 50, abr / mai / jun 2014 houve suspeita da persistência de tecido trofoblástico em atividade, com atenção especial para o risco de malignização da doença trofoblástica gestacional. A adolescente, orientada a utilizar rigorosamente contraceptivo hormonal oral e não manter relação sexual, afirmava o uso regular da pílula e negava relação sexual após a curetagem uterina. Na oitava semana, o valor do âhCG chegou em 8918 mUl/ ml e o risco de tumor trofoblástico gestacional tornou iminente o encaminhamento da paciente para a equipe de oncologia, a fim de avaliação e provável início de quimioterapia. Todavia, ao ser informada sobre o tratamento a ser proposto e sobre os efeitos adversos dos quimioterápicos, contradizendo as informações primárias, relatou, além de relação sexual recente, o uso inadequado do anticoncepcional hormonal oral. Assim, com essas informações, um eco endometrial heterogêneo, uma imagem cística regular de 8,8cm e volume uterino de 73ml, a hipótese diagnóstica de nova gravidez seguida de abortamento foi sedimentada e optou-se por nova curetagem uterina, após radiografia simples de tórax com transparência normal do parênquima pulmonar. O exame histopatológico confirmou a gravidez, mostrando restos ovulares e placentários. Depois disso, o método contraceptivo foi modificado para de uso injetável, com supervisão mais rigorosa da mãe da paciente. Então, os próximos exames de â-hCG sérico foram decrescentes, até serem considerados negativos e permaneceram abaixo de 2mUl/ml por cinco medidas consecutivas. Discussão Mola hidatiforme No momento da implantação do óvulo fecundado no endométrio, após o estádio de mórula, o blastocisto possui uma camada externa chamada de trofoblasto, que é dividido em citotrofoblasto (camada interna do trofoblásto), sinciciotrofoblasto (camada externa que reveste as vilosidades coriônicas da placenta) e trofoblasto (camada intermediária). A partir do trofoblásto é formado o cório, que se ramifica e torna-se vascularizado, a fim de complementar a formação da placenta. Essas ramificações são chamadas de vilosidades coriônicas7. A MH é uma massa policística em que as vilosidades coriônicas sofreram degeneração cística. É uma complicação relativamente infrequente da gravidez, mas com potencial evolução para formas que necessitam de tratamento sistêmico e podem ser ameaçadoras da vida. São reconhecidos dois tipos de MH: completa (MHC) e parcial ou incompleta (MHP)1. Nas MHC, feto, cordão e membranas sempre estarão ausentes; as vilosidades de primeiro trimestre medem entre 1 e 8mm de diâmetro e as de segundo trimestre entre 1,5 e 20mm. Assim, as vilosidades não aparecerão normais, mostrarão proliferação generalizada e pronunciada do trofoblasto e maior frequência de atipias dos núcleos celulares3. Em relação ao cariótipo, os genes da MHC são de origem paterna por dissomia uniparental, sendo 90% 46,XX e 10% 46, XY, já a MHP apresenta triploidia ou tetraploidia3. Para cálculo da frequência da MH, a Escola Paulista de Medicina estabeleceu como base 13.986 gravidezes, contando com partos, abortos e gravidezes ectópicas, somando, no período do estudo, 65 casos de mola hidatiforme. Desse modo, a frequência da mola hidatiforme ficou estabelecida em 1:215, valor comparável aos países asiáticos e africanos1,2. A gravidade da DTG encontra-se na evolução para neoplasia trofoblástica estacional (NTG), também chamada de tumor trofoblástico gestacional (TTG), que diz respeito à forma maligna da DTG, caracterizada pela persistência de tecido trofoblástico ativo na parede uterina ou em outros órgãos e tecidos4. No Brasil, a incidência de TTG nos casos de mola hidatiforme varia de 15 a 33%5. A Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO) estabeleceu os seguintes critérios para o diagnóstico de NTG: Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 48 - 50, abr / mai / jun 2014 platô da hCG sérica em três semanas de seguimento ou mais; ascensão de mais de 10% do valor da hCG, em duas semanas de seguimento ou mais; persistência da hCG sérica detectável por seis meses ou mais, após o esvaziamento uterino e diagnóstico histológico de corionarcinoma4. O diagnóstico precoce é fundamental para evitar complicações como pré-eclâmpsia, hipertireoidismo, anemia, hiperêmise e síndrome do desconforto respiratório (SDR)8. Assim, o diagnóstico pode ser investigado, inicialmente, na vigência de sangramento, através do ultrassom e da dosagem sérica do â-hCG8. Os níveis de â-hCG estarão muito elevados e quase a metade das pacientes têm níveis superiores a 100.000 mUI/ ml1. A ultrassonografia superou todos os métodos não invasivos para o diagnóstico, apesar de haver confusão entre mola e aborto retido. Por isso, alguns casos de mola são diagnosticados após o exame histopatológico em material de curetagem uterina, indicada, primeiramente, para um abortamento retido. Por outro lado, muitos casos de mola completa exibem imagens típicas, apresentando grande quantidade de material ecogênico, contendo múltiplas vesículas anecóicas difusas no útero3. O tratamento da mola consiste em esvaziamento uterino, no entanto, os seguintes exames devem se pedidos antes do procedimento: hemograma completo, grupo sanguíneo e fator Rh, determinação do nível de hCG e raio-X de tórax3. Os principais desafios para tratamento de pacientes com MH abrangem o diagnóstico precoce, antes de 10 a 12 semanas de gravidez, o esvaziamento uterino imediato, o controle das complicações clínicas, o seguimento pós-molar regular com dosagem sérica de â-hCG e contracepção eficiente no período de seguimento8. Em um estudo com adolescentes, com alto risco para malignidade, foi empregado actinomicina D (o mesmo que dactinomicina) para um grupo, sendo a frequência de neoplasias 6,9%, já no grupo controle a frequência foi de 29%1. O tratamento quimioterápico, primeiramente, consiste em actinomicina-D ou metotrexato6. Os efeitos adversos da actinomicina D são náusea, vômito, ulceração da mucosa, mielossupressão dose-limitante e manifestações dermatológicas. Já com o uso de metrotrexato, fica o paciente passível, principalmente, a mielossupressão e a mucosite9. A maioria das mulheres com doença trofoblástica gestacional pode ser curada e manter o seu futuro reprodutivo, dependendo do diagnóstico, tratamento e seguimento5. Entretanto, a experiência de todos os serviços especializados mostra dificuldade para manter a aderência das pacientes a um seguimento1, contudo, o controle personalizado com motivação continuada, assim como anticoncepção gratuita, reduz o percentual de abandono do controle da doença10. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que o seguimento pós-molar ideal deve ser feito com dosagem seriada de â-hCG a cada duas semanas, até que os níveis se normalizem, e a cada mês, no primeiro ano5. Além disso, é importante a adesão da paciente ao tratamento contraceptivo, de preferência, oral ou injetável1. A curetagem diagnóstica durante o seguimento deve ser criteriosa, pois a segunda curetagem é contraindicada se houver metástase, elevação persistente dos níveis de â-hCG ou coriocarcinoma1. Gravidez e adolescência A atividade sexual na adolescência vem-se iniciando cada vez mais precocemente, com consequências indesejáveis. Sabe-se que as adolescentes engravidam mais a cada dia e em idades cada vez menores. Além disso, a sociedade tem aceitado melhor o sexo antes do casamento e a própria gravidez na adolescência. Portanto, tabus, inibições e estigmas estão diminuindo e a atividade sexual e a gravidez aumentando11. Um dos fatores que colaboram com a gravidez precoce é a utilização de métodos contraceptivos de modo ineficaz na 49 adolescência. Isso está relacionado aos fatores psicológicos, inerentes a esta fase da vida, pois a adolescente nega a possibilidade de engravidar. Como também ela não assume perante a família a sua sexualidade, dessa forma, a posse de um contraceptivo seria a prova formal de vida sexual ativa e a adolescente deixa de utilizar um anticoncepcional por não o ter no momento da relação11,12. Um fator biológico também colabora com o aumento da baixa idade na gravidez, a idade em que ocorre a menarca tem se adiantado em torno de quatro meses por década, assim, a adolescente está cada vez mais tempo exposta a gravidez. Noventa e cinco por cento da menarca encontram-se nos limites de 11,0 a 15,0 anos de idade11. Do mesmo modo, ocorre com a questão demográfica, pois a gravidez na adolescência também tem aumentado devido ao crescimento da população de adolescentes em nossa sociedade13. Considerações finais A gravidez, no seguimento da MHC, eleva os níveis séricos da âhCG e pode levar a paciente ao tratamento quimioterápico. No caso em questão, a adolescente seria exposta, desnecessariamente, às reações adversas de drogas utilizadas na prevenção da NTG. Então, devemos permanecer atentos para o comportamento das adolescentes, pois o descaso com o uso de contraceptivo e a prática sexual inconsequente e banalizada pode gerar gravidez e alterar a conduta em um caso de remissão espontânea de uma mola hidatiforme. Referências na Escola Paulista de Medicina. Rev Assoc Med Bras. 1992;38(4):217-20. 3. Montenegro CAB, Rezende Filho J. Rezende. Obstetrícia fundamental. 12ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011. pp.285-97. 4. Delamanto LRMG, Maestá I, Braga Neto AR, Michelin OC, Passos JRS, Gaiotto FR, Rudge MVC. A curva de regressão da gonadotrofina coriônica humana é útil no diagnóstico precoce da neoplasia trofoblástica gestacional pós-molar? Rev Bras Ginecol Obstet. 2007;29(10):506-10. 5. Maestá I, Rudge MVC, Passos JRS, Calderon I, Carvalho N, Consonni M. 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Incidência da mola hidatiforme 50 Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 48 - 50, abr / mai / jun 2014 Drusas da cabeça do nervo óptico e membrana epirretiniana Drusen of the optic nerve head and epiretinal membrane Felipe Alves Utyama Celso Afonso Gonçalves Marcos Alonso Garcia RESUMO Introdução: as drusas da cabeça do nervo óptico (drusas de papila), frequentemente referidas como pseudopapiledema, são uma condição hereditária autossômica dominante irregular de penetrância incompleta. São bilaterais em 70% dos casos, porém assimétricos e mais frequentemente em brancos. A membrana epirretiniana (MER) faz parte das anormalidades de interface vítreo retiniana, consiste em membrana fibrocelular e avascular que prolifera sobre superfície interna da retina, produzindo vários graus de disfunção macular. Relato de caso: Paciente do sexo masculino, caucasiano, 62 anos, acompanhado pela Clínica de Oftalmologia UNILASER, em Santos/SP, apresentou as duas condições simultaneamente, porém, assimétricas em ambos os olhos. Em função da boa acuidade visual do paciente (20/20 parcial com a melhor correção) em ambos os olhos, optou-se por conduta expectante com avaliação periódica do paciente. ABSTRACT Introduction: Drusen of the optic nerve head (optic disc drusen), often referred to as pseudopapilledema, is a hereditary condition irregular autosomal dominant with incomplete penetrance. They are bilateral in 70% of cases and more often in caucasians. The epiretinal membrane (ERM) is part of abnormalities vitreoretinal interface and consists of fibrocellular membranes and avascular proliferating on the inner surface of the retina, producing varying degrees of macular dysfunction. Case report: A Caucasian 62 year-old male patient, previously followed up at Optometry Clinic UNILASER, in Santos, presented both conditions simultaneously, however, asymmetric in both eyes. Due to the good visual acuity presented by the patient (20/20 partial with the best correction) in both eyes. We opted for expectant management with periodic follow up. Key words: Druze of the Optic Nerve. Epiretinal Membrane. Abnormalities of the Vitreoretinal Interface. Descritores: Drusa de Nervo Óptico. Membrana Epirretiniana. Anormalidades da Interface Vitreorretiniana. Introdução As drusas de disco óptico constituem uma alteração na cabeça do nervo óptico de origem familiar autossômica dominante que acomete igualmente homens e mulheres. É mais encontrada em caucasianos e não tem relação com condições patológicas do olho. 1 A forma bilateral é encontrada na maioria dos casos (70%) , sendo normalmente assintomáticos, porém, podem levar à perda do campo visual (mais frequentemente na forma de defeitos arqueados) ou, em raros casos, da acuidade visual central. Estão confinadas anteriormente à lâmina cribrosa e são compostos de material proteináceo que se tornam calcificados com o avançar da idade. Sua patofisiologia está relacionada com o fluxo axoplasmático diminuído, com consequente formação de excrescências calcificadas. Tais depósitos podem ser considerados pequenos tumores que se desenvolvem na cabeça do nervo óptico, podendo causar uma protuberância (daí o termo pseudopapiledema). Os depósitos calcificados podem, então, comprometer as camadas de fibras nervosas e suprimento vascular, levando a defeitos do campo visual e hemorragias variadas da cabeça do disco óptico. O diagnóstico é feito por meio do exame clínico da cabeça do nervo óptico, além de estudos de imagem. Se as drusas da cabeça do nervo óptico são superficiais, isso pode ajudar no diagnóstico durante o exame de fundo de olho dilatado. O disco óptico toma 1 uma aparência granulosa-irregular (lumpy-bumby) . Exames complementares de grande auxílio são a angiografia com fluoresceína e a ecografia modo B, onde é possível identificar uma 2 alta refletividade diferentemente do verdadeiro papiledema . Raramente são encontradas alterações vasculares como microhemorragias em chama de vela, neuropatia óptica não arterítica, oclusão da veia central da retina e formação de membranas 2 neovasculares ao redor do nervo óptico . Não há tratamento disponível para essas drusas. Laserterapia tem sido usada para conter a neovascularização ao redor da cabeça do nervo óptico. O prognóstico é geralmente bom e os pacientes 3 devem ser apenas observados . Numerosos termos têm sido usados para descrever membrana ) Residente de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Médico Oftalmologista, Chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 3) Médico Oftalmologista, Preceptor de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP Instituição: Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 10 andar – 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 05/01/2014; publicado online em: 31/05/2014. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 48 - 50, abr / mai / jun 2014 51 epiretiniana, incluindo: pucker macular, membrana epimacular, maculopatia em celofane e fibrose macular epirretiniana. O tipo mais comum é a maculopatia em celofane branda (em cinco anos, incidência de 3,8%). A incidência de sua formação é mais elevada em pacientes portadores de membranas epirretiniana no olho oposto (em cinco anos, incidência de 13,5%)4. A membrana epirretiniana é um tecido fibrovascular localizado sobre a superfície interna da retina, semitransparente que prolifera na superfície da camada limitante interna desta. A forma mais comum de apresentação é a idiopática, todavia, pode estar secundariamente presente em doenças vasculares da retina, condições inflamatórias, trauma, após cirurgias oculares, tumores intraoculares, e descolamentos ou rupturas de retina. Outros fatores de risco incluem a idade, descolamento de vítreo posterior e história de membrana no outro olho. A patogênese das membranas epirretinianas não é completamente entendida. Aparentemente, a patogênese da forma idiopática pode ser diferente da que ocorre após o aparecimento do descolamento de retina. O desenvolvimento de descolamento do vítreo posterior parece ser essencial para o desenvolvimento de membranas idiopáticas5. A maioria dos pacientes com membranas epirretinianas idiopáticas está acima dos 50 anos de idade; entretanto, crianças e adultos 6,7 jovens ocasionalmente são afetados . A idade média do 4 diagnóstico é de 65 anos . Sua prevalência diagnosticada por meio 8-10 de retinografia em estudos varia de 4 a 11% . São bilaterais em 6,8,11 20-30% dos casos . Células gliais e pigmentares da retina são os maiores componentes. Não há medidas preventivas em sua forma idiopática. O diagnóstico é baseado na história clínica e no exame biomicroscópico do fundo do olho e, em alguns casos, a angiografia com fluoresceína juntamente com a tomografia de coerência óptica é útil no acompanhamento de sua evolução. A cirurgia da membrana epirretiniana é a mais comum cirurgia vítreo retiniana realizada segundo centros especializados e convênios de 12 saúde , que envolve o peeling de membrana com vitrectomia via pars plana. Relato e caso Paciente 62 anos, masculino, hipertenso, procedente de Santos foi encaminhado à clínica oftalmológica UNILASER para procedimento de facoemulsificação e implante de lente intraocular devido catarata senil em ambos os olhos (realizado o procedimento em olho direito em agosto de 2008 e olho esquerdo em junho de 2013). Foi submetido a tal cirurgia sem intercorrência, com instilação correta dos colírios pré e pós-operatórios, segundo o protocolo da clínica. Em setembro de 2013, procurou novamente o serviço, queixando-se de baixa de acuidade visual em olho esquerdo, referindo “visão de fantasma” e sem dor ocular. Ao exame de biomicroscopia externa na lâmpada de fenda, não havia alterações. A acuidade visual também era normal (20/20 parcial em ambos os olhos com a melhor correção). Procedendo ao exame de biomicroscopia do fundo de olho notou-se área de palidez da cabeça do nervo óptico. Após a identificação dessa alteração solicitamos retinografia e angiofluoresceinografia para elucidação diagnóstica – Figura 1. Após os resultados dos exames, estabeleceu-se o diagnóstico de drusas de nervo óptico associado à membrana epirretiniana branda. O paciente encontra-se em seguimento. Optou-se por conduta conservadora, sendo o mesmo reavaliado a cada seis meses para averiguar possível piora da acuidade visual e progressão da condição, onde condutas mais invasivas poderão ser tomadas. Figura 1 – Retinografia e angiofluoresceinografia de olho direito e esquerdo 52 Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 51 - 53, abr / mai / jun 2014 Discussão O presente caso apresenta simultaneamente e de forma bilateral a formação de membrana epirretiniana com drusas da cabeça do nervo óptico. Não foram encontrados artigos relacionando essas duas alterações de pólo posterior. O paciente não apresentava antecedentes de cirurgias vítreo-retinianas, inflamação, cicatriz corioretiniana ou vasculopatia peripapilares que poderiam justificar de maneira secundária a formação de membranas epiretinianas. Apesar da causa idiopática da membrana epirretiniana ser a mais comum5, foi questionado se a presença de drusas da cabeça do nervo óptico poderia ser a causa primária do seu encontro. O principal problema relacionado com a formação de membrana na região macular é que, devido à sua propriedade contráctil, pode haver tração na superfície da retina, causando mudanças na morfologia neuroretiniana13 e, consequentemente, distúrbios visuais. Os sintomas estão diretamente relacionados com a espessura da membrana e com a severidade da distorção14, sendo que, no presente caso, foi observado ser de grau leve ao exame de polo posterior segundo a classificação de Gass proposta em 198715, sendo: grau leve = membrana isolada; grau moderado = membrana com dobras; grau avançado = membrana com dobras e contração da limitante interna (pucker macular). Vitrectomia via pars plana com peeling da membrana limitante interna é o tratamento padrão para a remoção da membrana epiretiniana. Apesar da remoção da membrana ser questionada por algum tempo, a maioria dos autores acredita ser benéfico para melhora dos sintomas e sua recorrências. Essa técnica remove células gliais, hialócitos e fibroblasto sobre limitante interna, causa bem conhecida de proliferação celular e recorrência de formação de membrana. Futuros relatos de casos com a presença de drusas de papila e membrana macular poderão estabelecer alguma relação entre essas duas patologias. Com relação ao tratamento adotado, optou-se apenas pelo acompanhamento (tratamento conservador) devido à boa acuidade visual apresentada pelo paciente. Normalmente, membranas epiretinianas brandas produzem sintomas mínimos. Em tais casos, não é necessária nenhuma intervenção. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 51 - 53, abr / mai / jun 2014 O quadro fundoscópico ilustrado por esse paciente nos faz questionar a relação entre essas duas doenças. Abre-se um espaço para que novos casos parecidos sejam relatados e estudos são necessários para se tentar estabelecer ligação entre essas duas condições, que aparentemente não parecem existir. Referências 1. Davis PL. Optic disc drusen. Sem Ophthalmol. 2003;18(4):222-42. 2. Gossman MV. Pseudopapilledema. eMedicine. Disponível em: http://emedicine.medscape.com/article/1217393-overview 3. Kanski JJ. 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St Louis: Mosby; 1997:938-41. 53 Tuberculose geniturinária Tuberculosis of the testis 1 Felipe Camargo Bestane 2 André Luiz Farinhas Tomé 1 Mohamad Dib Salah Ali 1 Fernando Lievana Mangolin RESUMO Introdução: A tuberculose geniturinária corresponde ha 0,5% dos casos extrapulmonares e 1,5% nos com tuberculose pulmonar. Por ser uma forma rara de apresentação e ter como diagnóstico diferencial doença neoplásica característica de adultos jovens, torna-se importante relatar este caso. Relato de caso: Paciente masculino, de 31 anos, deu entrada no pronto-socorro com quadro de insuficiência respiratória devido a derrame pleural extenso associado a nódulo sólido testicular. Por tratar-se de adulto jovem, sem antecedentes e com exames laboratoriais negativos para tuberculose, foi aventada hipótese de neoplasia testicular metastática. A orquiectomia confirmou o diagnóstico de tuberculose pela presença de necrose caseosa. ABSTRACT Introduction: The genitourinary tuberculosis corresponds to 0.5% of extrapulmonary cases and 1.5% of those with pulmonary tuberculosis. Being a rare form of presentation and having neoplastic disease characteristic of young adults as differential diagnosis, it is important to report this case. Case report: A 31 year-old man was admitted to the ED with respiratory failure due to extensive pleural effusion associated with testicular solid nodule. For being a young adult with no history and negative laboratory tests for tuberculosis, was suggested hypothesis of metastatic testicular cancer. Orchiectomy confirmed diagnosis of tuberculosis by the presence of caseous necrosis. Key words: Tuberculosis. Genitourinary. Testicles. Descritores: Tuberculose. Genitourinária. Testicular. Introdução A tuberculose constitui um problema de saúde pública em todo o mundo, principalmente nos países em desenvolvimento. Mesmo com protocolo de tratamento bem definido, mantem-se como a principal causa de morte por doença infectocontagiosa1. O Brasil é o 22o país com maior incidência da doença, sendo esta de 48/100 mil habitantes2. A tuberculose pulmonar é a infecção inicial e de manifestação mais comum, correspondendo a 70 % dos casos3. O acometimento extrapulmonar é mais frequente em pacientes com imunodeficiência, principalmente portadores de síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS)4-6. A tuberculose genitourinária (TBGU) é a forma mais frequente de doença extrapulmonar, atingindo 15 a 20% dos pacientes infectados2. Foi primeiramente descrita por Porter, em 19847. O patógeno M. tuberculosis é responsável pela maioria dos casos, sendo rara TBGU por outra espécie de Mycobacterium8. O acometimento do trato geniturinário dá-se quase que exclusivamente por disseminação hematogênica de infecção pulmonar. Das manifestações genitais, a orquiepididimite refratária ao tratamento clínico é a mais frequente, podendo ocorrer abscesso com fistulização. Nódulo sólido mimetizando neoplasia também tem sido descrito. Tem início na cauda do epidídimo e atingir o testículo por contiguidade. Quando causa de infertilidade, esta em sua maioria é obstrutiva2,9. A pluralidade de sintomas e manifestações clínicas oriundas da TBGU dificulta, muitas vezes retardando o diagnóstico. Muitos pacientes acabam por apresentarem alterações e sequelas irreversíveis, as quais o tratamento cirúrgico se impõe10. Relato de caso Homem de 31 anos, com quadro de dispnéia progressiva associada à tosse seca e emagrecimento, sem febre, havia 1 mês, ao exame físico, encontrava-se caquético e dispneico, com murmúrio vesicular abolido à direita, além de testículo esquerdo aumentado de volume, de consistência endurecida e indolor. Os exames laboratoriais demonstraram leucocitose moderada e alteração da função renal, além de importante leucocitúria e hematúria, com urocultura negativa. A radiografia simples de tórax mostrou velamento do hemitórax direito. Foi realizada drenagem torácica e biópsia pleural, a qual revelou processo inflamatório crônico inespecífico. Os exames de PPD e a bacterioscopia para BAAR da secreção pulmonar foram positivas para M. tuberculosis. A ultrasonografia evidenciou aumento do volume do testículo esquerdo, com padrão heterogêneo e fluxo sanguíneo ao Doppler – Figura 1. A tomograrfia computadorizada de tórax e abdome revelou infiltrado pulmonar com destruição do parênquima à direita, além de espessamento de todo o sistema coletor urinário, bexiga, próstata e vesícula seminal esquerda – Figuras 2, 3 e 4. Optou-se pela realização de orquiectomia esquerda. O resultado do exame anatomopatológico foi compatível com tuberculose testicular, confirmado pela presença de focos de necrose caseosa compro- 1) Residente de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Assistente do Serviço de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Correspondência: Rua José Caballero, 60 ap. 109 – 11055-300 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 15/03/2014; publicado online em: 31/05/2014. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 54 Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 54 - 55, abr / mai / jun 2014 metendo o testículo e o epidídimo, com sinais de infiltração do cordão. Iniciou-se tratamento com isoniazida 400 mg/dia, rifampicina 600 mg/dia e pirazinamida 2g/dia por quatro meses e isoniazida e rifampicina por mais quatro meses. Discussão O M. tuberculosis infecta um terço da população mundial, mas apenas 5 a 10% dos pacientes apresentarão alguma forma de doença ativa. Contudo, a tuberculose ainda mata três milhões de pacientes por ano10. Houve grande aumento no número de casos, principalmente na África, pela disseminação da AIDS. O risco de um paciente com HIV desenvolver tuberculose é de 10% ao ano, enquanto de um indivíduo sadio é de 10% durante toda a vida. A tuberculose geniturinária corresponde a 0,5% dos casos extrapulmonares e 1,5% nos com tuberculose pulmonar. Ao longo dos anos, houve queda dos números de pacientes acometidos12. O mecanismo de acometimento testicular é controverso, sendo a disseminação possível através da via hematogênica, retrouretral, linfática e por contiguidade, porém, a via hematogênica é a mais frequentemente responsável pelo acometimento13. Os homens com tuberculose testicular, por vezes, mimetizam o quadro de neoplasia testicular, sendo difícil a exclusão de malignidade, como demonstrado no caso acima, em que o paciente se apresentou com massa testicular, endurecida, indolor e derrame pleural, aventando assim a hipótese de doença neoplásica testicular metastática12. O tratamento é clinico com quimioterapia por seis a nove meses e o tratamento testicular cirúrgico esta indicado quando a resposta ao tratamento clínico não é satisfatória e/ou há suspeita de malignidade13. As complicações como infertilidade de causa obstrutiva, abscesso e fístula também apresentam indicação cirurgica11. A epididimectomia, quando realizada, melhora a eficácia dos quimioterápicos à doença testicular. A TBGU deve ser sempre suspeitada em pacientes com história de contato ou infecção prévia, moradores de regiões com alta incidência e em casos de doença recorrente, mesmo após tratamento de primeira linha. Apesar dos avanços na medicina e na vigilância epidemiológica, a tuberculose ainda se mantém como um problema de saúde pública, embora haja protocolo de tratamento definido. O acometimento extra-pulmonar é frequente, porém, a gama de sintomas inespecíficos e o conhecimento insuficiente da TBGU por parte de profissionais e pacientes, leva ao diagnóstico tardio. A política de saúde urbana, visando a diminuição dos casos de tuberculose, deve iniciar o tratamento precoce desses pacientes para que haja menor disseminação e menor tempo para desenvolver tuberculose extrapulmonar. pulmonar tuberculosis. Urology. 2009;74(1):41-5. 9- Kulchavenya E, Zhukova I. Spectrum of urogenital tuberculosis. J Infect Chemother. 2013;19:880-3. 10- Kumar V, Abbas AK, Aster JC, Fausto N. Robbins and Cotran Pathologic Basis of Disease. 8th ed. Philadelphia: WB Saunders; 2007. 11- Kulchavenya E. Masks of kidney tuberculosis. Urology. 2011;78(suppl 3):S223. 12- Jacob JT, Nguyen TM, Ray SM. 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Clinical features of confirmed versus suspected urogenital tuberculosis in region with extremely high prevalence of Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 54 - 55, abr / mai / jun 2014 Figura 2 – Tomografia de tórax com cavitação e fibrose do parênquima pulmonar. 55 Síndrome de Steven Johnson pesadelo oftalmológico Stevens Johnson Syndrome – ophthalmologic nightmare 1 Lucas Holdack 1 Luciana Garcia Iervolino 2 Celso Afonso Gonçalves Marcos Alonso Garcia3 Érika Alessandra Galembeck Silvino Rodrigues4 RESUMO Introdução: A Síndrome de Stevens-Johnson, também chamada de eritema multiforme maior, faz parte de um conjunto de alterações de pele e mucosas desencadeada por reação de hipersensibilidade tipo 3 após uso de determinadas drogas ou contato com micro-organismo. O quadro clínico é acompanhado por comprometimento sistêmico com febre, vômitos, cefaleia e prostração e pode durar até seis semanas. Pode ainda se apresentar sob a forma de necrólise epidérmica tóxica (NET). Não há tratamento específico na fase aguda. Recomenda- se higiene palpebral, lubrificantes, corticosteróide e antibioticoterapia profilática. Para quadros crônicos, medidas como lubrificação ocular e epilação podem ajudar. Correção cirúrgica das pálpebras é importante para diminuir a evaporação lacrimal. Transplante de membrana amniótica pode minimizar o dano ao segmento externo. Contudo, o prognóstico, principalmente nos casos com olho seco severo, continua reservado. Relato de caso: Paciente do sexo feminino, 63 anos, aposentada, parda, natural e procedente de Guarujá, procurou o Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa apresentando dor, irritação ocular e baixa acuidade visual progressiva em ambos os olhos há dois meses, após alta hospitalar devido a síndrome Stevens Johnson. Apesar de simbléfaro bilateral, o olho direito apresenta-se pior, com deficiência lacrimal muito importante e com lesão com infiltrado perilesional nesse olho. Apesar de prontamente iniciada terapia com lagrimas artificiais sem conservantes, antibiótico e corticoide tópicos, o olho direito evoluiu de maneira não satisfatória, necessitando de transplante de córnea e posteriormente evisceração devido perfuração com endoftalmite. O olho esquerdo apresentou- se maneira menos agressiva até o 8º mês de seguimento quando apresentou, a despeito de grande arsenal terapêutico, afinamento e posterior lesão perfurante pequena, que foi prontamente tamponada e agora segue em acompanhamento ambulatorial. ABSTRACT Introduction: Stevens-Johnson syndrome , also called erythema multiforme major, part of a set of changes to skin and mucous membranes1 triggered by type 3 hypersensitivity reaction after use of certain drugs or contact with microorganism . The clinical picture is followed by systemic involvement with fever, vomiting, headache and prostration and can last up to six weeks. It may present in the form of toxic epidermal necrolysis (TEN). There is no specific treatment in the acute phase. It is recommended eyelid hygiene, lubricant, prophylactic corticosteroid and antibiotic. For chronic cases, measures such as ocular lubrication and epilation may help. Surgical correction of eyelid is important, in order to reduce tear evaporation. Recent studies show that amniotic membrane transplantation for ocular surface can minimize the damage to the outer segment. However, the prognosis , especially in cases with severe dry eye, remains reserved. Case report: A female patient, 63 years old, retired, mulatto, born and living in Guarujá, sought the Ophthalmology Service at Hospital Ana Costa presenting pain, eye irritation and progressive visual impairment in both eyes for two months after hospital discharge due to Stevens Johnson syndrome. Despite bilateral symblepharon, the right eye had become worse with very relevant tear deficiency and eye lesion with perilesional infiltration. Even though therapy with artificial tears without preservatives, antibiotics and topical corticosteroids was promptly initiated, the eye remained unsatisfactorily, requiring corneal transplantation and subsequently eviscerated caused by drilling followed by endophthalmitis. The left eye was way less aggressive until the 8th month follow-up, when presented, despite aggressive therapy, thinning and subsequent small perforating injury, which was readily buffered and now continues under follow up. Key words: Stevens-Johnson Syndrome. Ocular Complications. Descritores: Síndrome de Stevens-Johnson. Complicações Oculares. 1) Residente de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Médico Oftalmologista, Chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 3) Médico Oftalmologista, Preceptor de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 4) Médico Oftalmologista do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 10º andar 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 30/10/2013; aceito para publicação em: 25/02/2014; publicado online em: 31/05/2014. 56 Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 56 - 59, abr / mai / jun 2014 Introdução A síndrome de Stevens-Johnson, também chamada de eritema multiforme maior, faz parte de um conjunto de alterações de pele e mucosas1 desencadeada por reação de hipersensibilidade tipo 3 após uso de determinadas drogas (por exemplo, as sulfonamidas, anti-inflamatórios, penicilina,barbitúricos, alopurinol e vacinas) ou contato com micro-organismo (Mycoplasma pneumoniae, vírus como Herpes simplex, entre outros). O quadro clínico é acompanhado por comprometimento sistêmico com febre, vômitos, cefaleia e prostração e pode durar até seis semanas. Pode ainda se apresentar sob a forma de necrólise epidérmica tóxica (NET) ou síndrome de Lyell, entidade rara caracterizada por necrose extensa da epiderme2. Envolvimento da superfície ocular é muito comum e pode causar cegueira em muitos casos. Estruturas oculares estão envolvidas em 67% a 81% dos pacientes3,4. Casos moderados apresentam-se com conjuntivite e defeitos epiteliais localizados em conjunctiva, com os pacientes experimentando desconforto ocular leve. A maior parte dos casos severos tem inflamação extensa e difusa da mucosa, pseudomembrana e conjuntivite membranosa, com descamação epitelial com dor severa e fotofobia5. À medida que as ulcerações da mucosa melhoram, podem cicatrizar, levando à adesão, chamada simbléfaro, entre conjuntiva tarsal e conjuntiva bulbar5. Pode haver encurtamento dos fórnices conjuntivais6. A intensa resposta inflamatória da conjuntiva leva à destruição de células caliciformes, diminuindo a produção de mucina e desestabilizando o filme lacrimal3. Pode também haver diminuição da produção aquosa da lagrima, devido dano às glândulas lacrimais acessórias e dutos da glândula lacrimal principal.a superfície conjuntival é reposta por epitélio cicatricial e tecido cicatricial subjacente5, com metaplasia escamosa6. Tudo isso resulta em extremo ressecamento podendo promover opacificação corneana e deformidades palpebrais5. Olho seco severo é a complicação ocular mais comum em longo prazo e pode ser encontrada em 46% dos pacientes4. Triquiase é a segunda mais comum, atingindo 16%4. Opacificação corneana diminui significativamente a acuidade visual e ainda pode haver defeitos epiteliais recorrentes, haze inflamatório e neovascularização. Deficiencia de stem cell no limbo pode acontecer em casos graves6. Não há um tratamento específico na fase aguda. Recomenda-se higiene palpebral, lubrificantes, corticosteróide e antibioticoterapia profilática tópica. Corticosteróide e imunossupressão sistêmicos são controversos. Para os quadros crônicos, medidas adjuvantes, como lubrificação ocular e epilação de cílios podem ajudar7. Correção cirúrgica das alterações palpebrais é importante, assim como tarsorrafia para diminuir a evaporação lacrimal. Estudos recentes demonstram que transplante de membrana amniótica para a superfície ocular durante a primeira semana da doença pode minimizar o dano ao segmento externo ocular8–14. Contudo, o prognóstico, principalmente nos casos com olho seco severo, continua reservado. não foi removida. Iniciou-se terapia antibiótica e antiinflamatória tópicas, além de uso de lágrimas artificiais sem conservantes. Na 4ª semana de tratamento optou-se pela tarsorrafia em OD, para tentar amenizar a falta de lubrificação. Porém, nas consultas subsequentes apresentou piora do quadro corneano, com infecção e afinamento em porção central do OD (Figura 2), mesmo na vigência de terapia antibiótica tópica. No início do 3º mês, apresentou descemetocele importante nesse olho, que recebeu então transplante corneano na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, iniciando acompanhamento ambulatorial conjunto. Como complicação imediata, apresentou elevação da pressão intraocular devido ângulo fechado em porção nasal, que foi controlada com mediação oral e tópica. Todavia, as condições adversas de lubrificação e constante inflamação acabaram por levar à falência do transplante, com consequente perfuração e infecção. O olho direito foi eviscerado no 4º mês de seguimento. O olho esquerdo, no entanto, seguia dentro dos padrões de normalidade esperados para o quadro, até que no 8º mês de seguimento apresentou edema corneano e ceratite importante, com pressão intraocular elevada e infiltrado corneano perilesional com afinamento de 1/3 da espessura corneana – Figura 3. Após uso de medicações via oral e tópica, teve a pressão intra ocular controlada e iniciou seguimento diário para lesão corneana. Ao final de cinco dias apresentou perfuração , que foi prontamente recoberta com ceracrilato – Figura 4. Paciente segue em acompanhamento quinzenal em ambulatório e mantem uso de lagrima artificial sem conservantes, soro autólogo, corticoide tópico e antibioticoprofilaxia. Figura 1 – Aspecto inicial à biomicroscopia. Relato de caso Paciente do sexo feminino, 63 anos, dona de casa, parda, natural e procedente de Guarujá, procurou o Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa queixando-se de dor, irritação ocular e baixa acuidade visual progressiva em ambos os olhos havia dois meses, após alta hospitalar devido quadro de Síndrome de Steven Johnson em decorrência de uso de medicamento contendo sulfa. Ao exame oftalmológico, apresentava acuidade visual de 20/200 em olho direito (OD) e 20/100 em olho esquerdo (OE). À biomicroscopia, apresentava simbléfaro de grau 3b (até 50% de área tarsal encurtada) em ambos os olhos, hiperemia conjuntival 3+/4+ em ambos os olhos e ceratite em porção central, sem infiltrado perilesional; a motilidade extrínseca estava preservada em ambos os olhos – Figura 1. Devido à intensa fibrose, a área com simbléfaro Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 56 - 59, abr / mai / jun 2014 Figura 2 – Afinamento em porção central da córnea. 57 Figura 3 – Afinamento corneano em OE. Figura 4 – Aspecto de perfuração em OE após uso de ceracrilato. Discussão Os objetivos do manejo oftalmológico em pacientes com SJS são a prevenção da infecção, o controle da inflamação e impedir adesões conjuntivais. O tratamento efetivo requer uma abordagem multidisciplinar e um encaminhamento precoce a um centro de referência para queimaduras para reduzir os riscos de infecção e mortalidade significativamente15. A interrupção dos possíveis medicamentos causadores do quadro e o início dos cuidados de suporte são os pilares do tratamento. Devido ao fato de a inflamação dos olhos poder evoluir rapidamente nos primeiros dias da doença, é importante que as avaliações diárias sejam realizadas até que seja evidente que nenhum agravamento do quadro ocorra. O envolvimento agudo dos olhos pode variar de uma leve conjuntivite à descamação de toda a mucosa da superfície dos olhos e das pálpebras. A presença de cicatrizes na conjuntiva tarsal tem sido associada a uma morbidade de longo prazo, relacionada também ao ato de piscar, que acaba por causar lesões corneanas em decorrência do atrito causado16. Corticóides sistêmicos, plasmaférese, ciclosporina sistêmica, e 58 imunoglobulinas intravenosas têm recebido atenção como possíveis meios de tratamento, mas tiveram resultados variáveis ? e permanecem controversos, sem que ainda apresentem diferença significativa na mortalidade17-21. Em relação ao tratamento da fase aguda ocular, que visa diminuir os efeitos em longo prazo da doença, estudos recentes demosntaram benefício no uso de corticoterapia tópica intensa, diminuindo o dano à superfície ocular de maneira segura10,22. Tal medida pode facilitar o desenvolvimento de infecção local, e por isso a visita do especialista deve ser diária para que seja iniciada terapia antibiótica em caso de necessidade. Outra alternativa que vem apresentando bons resultados é o uso de transplante de membrana amniótica(5,8-10,12,14,23-26), devido propriedades antiinflamatórias e por diminuir chance de cicatrização. Contudo, os maiores índices de beneficio estão associados ao transplante realizado entre sete e 10 dias do início do quadro11,13 No presente estudo, observa-se má condução do quadro em sua fase aguda, uma vez que na unidade de tratamento em que foi recebida não foram disponibilizadas avaliações ou medidas oftalmológicas básicas, o que resultou em evolução para a fase crônica caótica e dramática. Após admissão no Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, a paciente iniciou medidas terapêuticas para fase crônica, que compreendem lubrificação abundante com colírios sem conservantes, bem como uso de corticoesteróides e antibióticos tópicos para amenizar os quadros infeccioso e inflamatório que se apresentavam . Apesar do uso de soro autólogo e da tarsorrafia realizada como tentativa de terapia agressiva para o olho extremamente seco, a paciente ainda manifestava sintomatologia importante de dor, sensação de corpo estranho e fotofobia, assim como observado em outros relatos6,27. O uso de membrana amniótica não foi realizado conforme baseado na literatura supracitada devido o tempo decorrido entre a apresentação dos sintomas e o primeiro exame oftalmológico realizado, de maneira que a paciente não poderia mais ser beneficiada pelo procedimento Devido a complicações relacionadas ao filme lacrimal adquiridas com a doença, o transplante de córnea não foi bem sucedido, apresentando ulcerações recorrentes e endoftalmite, sendo necessária evisceração. Apesar do número crescente de opções de tratamentos possíveis para o manejo da SJS tanto na fase aguda quanto na crônica, essa entidade permanece sendo extremamente desafiadora e, muitas vezes, a despeito de cuidado intensivo julgado adequado, proporcionam apenas alívio parcial dos sintomas e são suscetíveis a falhas. O transplante precoce de membrana amniótica precoce parece prevenir ou aliviar a maior parte dos sintomas que se sobrepõe no seguimento desses pacientes, evitando ou ao menos amenizando a fase crônica, o que evidencia a necessidade de acompanhamento oftalmológico dentro da multidisciplinariedade que implica a doença desde a admissão no hospital. Referências 1. Neves RA, Foster CS. Ceratoconjuntivites cicatriciais. In: Belfort Júnior R, Kara-José N. Córnea: clínica-cirúrgica. São Paulo: Roca; 1996. p.304-6. 2. Cabral L, Diogo C, Riobom F, Teles L, Cruzeiro C. Necrólise epidérmica tóxica (Síndrome de Lyell): uma patologia para as unidades de queimados. Acta Med Port. 2004;17(2):129-40. 3. Chang YS, Huang FC, Tseng SH, Hsu CK, Ho CL, Sheu HM. Erythema multiforme, Stevens-Johnson syndrome, and toxic epidermal necrolysis. Cornea. 2007;26:123-9. 4. Yip LW, Thong BY, Lim J, Tan AW, Wong HB, Handa S, Heng WJ. 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Case report: We report the case of a 19 year-old patient, on 27 weeks pregnant complaining of myalgia and fever for 5 days. The imaging scan suggested pneumonia, however, the diagnosis of H1N1 influenza was confirmed and she dead due to the disease. Comments: This report emphasized the importance of vaccination in pregnant women, as well as the early diagnosis and treatment in an attempt to reduce maternal and fetal mortality from this disease. Descritores: Gestação. Influenza. Influenza H1N1. Influenza Pandêmica. Morte Materna. Key words: Pregnancy. Influenza. H1N1 Influenza. Pandemic Influenza. Maternal Death. Introdução Em abril de 2009, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recebeu informes de infecções de um novo vírus da influenza A (H1N1) no México e nos Estados Unidos. Rapidamente, o vírus se propagou para diversos países da Europa, Américas e Extremo Oriente. Em 6 de maio daquele ano, o Ministério da Saúde do Brasil (MS) recebeu testes para confirmação diagnóstica de influenza A, o que permitiu que, em 7 de maio, fossem confirmados os primeiros casos dentre as amostras de suspeitos1. Nessa época, os testes laboratoriais para diagnóstico do vírus ainda eram limitados, tornando imprescindível a atenção na interpretação de resultados em pacientes com suspeita da gripe. Segundo a OMS, mais de 214 países relataram casos confirmados de influenza A durante a epidemia, chegando a mais de 18.449 óbitos². No Brasil, a disseminação foi confirmada oficialmente em 16 de julho de 2009. Em 21 de agosto de 2009, o Brasil tinha 34.506 casos de doença respiratória aguda grave. Destes, 5.457 casos foram confirmados laboratorialmente como sendo secundários à infecção pela influenza A pandêmica, porém, o número total de casos foi provavelmente bem maior, pois com a evolução da epidemia, houve uma orientação por parte do Ministério da Saúde de só testar casos graves³. A literatura atual, a partir da última pandemia e de surtos anteriores de H1N1, tem demonstrado que as gestantes no segundo e terceiro trimestres de gravidez são quatro vezes mais suscetíveis a hospitalizações do que a população geral e têm uma taxa significa- tivamente maior de mortalidade. Além disso, oito – 16% de todas as mortes por infecção por H1N1 aconteceram entre gestantes, embora este grupo represente apenas 1% da população geral. No Brasil, do total de 1.632 óbitos registrados até o dia 28 de novembro de 2009, 156 eram gestantes (9,56%)¹. Na última epidemia da doença, a estratégia de enfrentamento foi baseada em medidas de contenção – identificação precoce, tratamento e isolamento de casos e seguimento de seus contatos próximos. No cenário atual, essa estratégia perde importância e efetividade – fenômeno esperado na transmissão de agentes infecciosos, particularmente com as características dos vírus influenza – requerendo medidas mais integradas de monitoramento da situação epidemiológica de priorização da assistência aos casos graves ou com potencial de complicação¹. O presente relato de caso aborda os aspectos fisiopatológicos, diagnósticos, terapêuticos e profiláticos da infecção pelo novo vírus A H1N1 durante a gestação, objetivando avaliar a importância do tratamento antiviral em gestantes infectadas e as indicações de interrupção da gestação nessas pacientes. Relato de caso Paciente de 19 anos, primigesta, gestante de 27 semanas e 2 dias, sem comorbidades prévias, procurou atendimento de urgência no dia 14 de abril de 2013 com queixa de febre e mialgia havia cinco dias e dor torácica à direita havia um dia. Ao exame físico, encontra- 1) Residente de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Médica ginecologista e obstetra do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Correspondência: E-mail: [email protected] Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Recebido em: 20/11/2013; aceito para publicação em: 12/02/2014; publicado online em: 31/05/2014. 60 Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 60 - 62, abr / mai / jun 2014 va-se em bom estado geral e comn ausculta pulmonar com com roncos e sibilos difusos bilateralmente. O exame obstétrico inicial mostrava movimentação fetal presente e batimentos cardíacos fetais (BCF) de 147 bpm. Foram realizados Hemograma: Hb = 10,7 ; Ht = 32,7 ; leucócitos = 16.400 (com 20 bastonetes) e plaquetas = 261.000. Urina I sem alterações e Raio X de tórax mostrando hipotransparência pulmonar bilateralmente e obliteração dos seios costo-frênicos. Ultrassom (USG) obstétrico: feto único, BCF = 151 bpm, líquido amniótico = 15,3, peso fetal = 1045 g; gestação de 27 semanas e 6 dias. Com base nesses resultados, foi orientada internação, na vigência de Amoxacilina 1,5g por dia, inalação com Fenoterol e Ipratrópio e Acetilcisteína. No dia seguinte, foram suspensas Amoxacilina e Acetilcisteína, introduzidos Cefriaxone e Hidrocortisona 300mg por dia. O ecocardiograma materno evidenciou apenas taquicardia. No mesmo dia, houve piora do quadro respiratório associado à acidose metabólica, sendo encaminhada à UTI, onde foi realizado acesso central (intracath) e iniciado Meropenem 2g por dia e Vancomicina 2g por dia. Dia 16 de abril foi realizado novo Raio X de tórax com sinais de derrame pleural bilateral, sendo realizada toracocentese em hemitórax direito com saída de aproximadamente 300ml de líquido serosanguinolento e introduzido Oseltamivir 75mg duas vezes ao dia. A pesquisa de H1N1 resultou positiva. Por apresentar piora progressiva do padrão respiratório, sem tolerar CPAP, foi realizada intubação orotraqueal no dia 17 de abril, com presença de grande quantidade de fluido sero-hemático, em vias aéreas inferiores e aumentada a dose de Oseltamivir. Entre os dias 18 e 20 de abril foram introduzidos Furosemida e Noripurum e realizado ciclo de Betametasona para maturação pulmonar fetal. Devido a alterações no exame físico neurológico, como ausência de reflexos óculocefálico, córneo-palpebral e escala de Glasgow = 3, foi realizada tomografia de crânio dia 20 de abril mostrando isquemia parietal direita com transformação hemorrágica e edema difuso. Dia 21 de abril, foram retiradas as drogas vasoativas e mantido o suporte clínico. No dia seguinte, a avaliação neurológica mostrou sinais clínicos de morte encefálica. O USG Doppler transcraniano mostrou fluxo nas artérias oftálmicas e cerebral média esquerda. Feito também USG obstétrico com líquido amniótico = zero, peso fetal = 950 g e gestação de 25 semanas. De acordo com o resultado do USG obstétrico, optou-se pela resolução da gestação por via alta. No intraoperatório, foi feita histerotomia segmento-corporal e observada placenta calcificada. O recém-nascido, do sexo masculino, pesou 945 g e apresentou APGAR 04/06/08 respectivamente. Nos primeiros três dias pós-parto a conduta foi mantida, ocorrendo depois parada cardíaca em assistolia e constatado o óbito da paciente. A causa da morte foi hipertensão intracraniana devido a um acidente vascular cerebral, causado por sepse pelo vírus influenza H1N1. O recém-nascido permaneceu internado na UTI neonatal do próprio serviço, recebendo alta hospitalar em setembro de 2013. Discussão A pandemia por influenza A 2009 foi a primeira do século 21. Houve grande número de casos, que se disseminaram rapidamente e acometeram principalmente indivíduos jovens, como sugeriram diversas coortes publicadas. Devido a isso, embora a letalidade da doença pareça ter sido baixa, houve uma grande quantidade de pacientes admitidos na UTI, o que gerou uma série de estudos relatando a apresentação clínica e a evolução destes pacientes3. Os sintomas dos pacientes infectados pelo novo vírus influenza são basicamente os mesmos de uma gripe sazonal, incluindo tosse, febre de até 41°C, mialgia, astenia, hiporexia, odinofagia e cefaléia, também podendo aparecer sintomas gastrointestinais como náuseas, vômitos e/ou diarréia. O curso clínico da doença é variável de acordo com o indivíduo em questão, sendo que, normalmente, na ausência de fatores de risco, o quadro é autolimitado1. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 60 - 62, abr / mai / jun 2014 Existem grupos de maior risco que incluem gestantes, crianças com menos de dois anos, idosos, pacientes com imunossupressão (câncer, AIDS, uso de medicamentos imunossupressores, transplantados) e indivíduos com doenças crônicas (pneumopatias, cardiopatias, doenças hematológicas, renais e obesidade mórbida) ². As gestantes devem ser incluídas em um grupo de risco elevado para desenvolver complicações devido à série de alterações fisiológicas do organismo materno durante a gravidez. Primeiramente, seu sistema imunológico encontra-se deprimido em consequência da alteração de suas respostas humorais e celulares pelos antígenos específicos fetais. Embora essa mudança fisiológica seja necessária para facilitar a tolerância materna aos antígenos de origem paterna, também torna a gestante mais suscetível aos patógenos intracelulares, tais como vírus¹. Além de alterações imunológicas, as gestantes sofrem algumas adaptações fisiológicas, apresentando alterações mecânicas e hormonais, o que leva a modificações no sistema cardiovascular e pulmonar, com aumento da frequência cardíaca, volume sanguíneo, consumo de oxigênio e redução da capacidade pulmonar. De modo geral, perante todas essas alterações e adaptações, as infecções virais manifestam-se de forma mais grave quando adquiridas durante a gestação, especialmente na segunda metade da gravidez, tornando a gestante mais propensa a complicações, que tendem a acontecer mais no segundo e terceiro trimestres². Pouco se sabe sobre os efeitos diretos do vírus da gripe sobre o feto, mas acredita-se que a viremia seja infrequente e, assim, a transmissão vertical parece ser rara¹. Já as principais complicações maternas são síndrome do desconforto respiratório do adulto, embolia pulmonar, edema agudo de pulmão, pneumonia bacteriana, insuficiência renal e morte². A coleta de exame para diagnóstico etiológico deve ser priorizada nas gestantes e puérperas internadas, seguindo-se os critérios de suspeição de doença respiratória aguda grave4. O teste laboratorial recomendado pela OMS para a detecção qualitativa do vírus da influenza. A é a reação em cadeia da polimerase em tempo real (rRT-PCR). As amostras clínicas que devem ser coletadas para a realização do teste são swabs combinados de nasofaringe e orofaringe, preferencialmente até o terceiro dia após o início dos sintomas. Recentemente, o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) emitiu um consultivo de saúde alertando sobre a baixa sensibilidade dos testes rápidos e afirmando que as decisões clínicas sobre o tratamento não devem ser guiadas ou postergadas com base no resultado desses testes¹. Recomenda-se o tratamento com inibidores da neuraminidase, como Oseltamivir 75mg por via oral, duas vezes ao dia por cinco dias associado a adoção oportuna de todas as medidas de suporte clínico, de todas as gestantes e puérperas com sídrome gripal, preferencialmente até 48 horas após o início da febre4. De forma geral, o tratamento está indicado para todos os pacientes hospitalizados com infecção suspeita ou confirmada e pacientes de risco para complicação, conforme avaliação clínica¹. O tratamento tardio da terapia antiviral foi associada com doença mais grave e morte, como mostrado anteriormente, tanto para a gripe sazonal quanto para a influenza A, enquanto que o início do tratamento precoce tem sido associado com a redução da gravidade da doença, a duração dos sintomas, a mortalidade e incidência de complicações secundárias, hospitalizações e a necessidade de antibióticos5. Efeitos indiretos da influenza, particularmente, hipertermia materna no primeiro trimestre, estão relacionados com defeitos do tubo neural, anomalias e defeitos cardíacos congênitos. A febre durante o parto pode causar convulsões neonatais, encefalopatia, paralisia cerebral e até morte neonatal. Sendo assim, o tratamento com paracetamol é o mais recomendado6. Com relação à interrupção da gestação, em gestantes com menos de 32 semanas, a melhor indicação é a manutenção da gravidez; já naquelas com 34 semanas ou mais, haverá melhora funcional após 61 o parto, principalmente nas pacientes com sintomas respiratórios moderados a graves. Quanto à via de parto, deve-se levar em conta que o parto vaginal exige maior demanda de oxigênio tanto para mãe quanto para o feto. Em pacientes instáveis, a via de parto mais adequada é a cesariana¹. Os medicamentos antivirais apresentam de 70% a 90% de efetividade na prevenção da influenza, entretanto, a quimioprofilaxia indiscriminada não é recomendável, pois pode promover o aparecimento de resistência viral. Para que ela seja efetiva, o antiviral deve ser administrado durante a potencial exposição à pessoa com influenza e continuar por mais sete dias após a última exposição conhecida7. É imprescindível que as gestantes recebam as orientações corretas acerca da vacina contra a Influenza A durante o pré-natal, no sentido de disseminar tais informações entre essa população8. Torna-se essencial o desenvolvimento de estratégias de comunicação entre o profissional de saúde e as gestantes para o estabelecimento de relação de confiança e estudos das representações acerca das campanhas de vacinação, em especial, envolvendo a influenza A. Até o momento, nenhum estudo demonstrou a ocorrência de complicações maternas ou fetais decorrentes da vacinação. evolução de pacientes com infecção por Influenza A (H1N1) que necessitaram de terapia intensiva durante a pandemia de 2009. Rev Bras Ter Int. 2010; 22(4):333-8. 4. Manual de Recomendações para grávidas, puérperas e recém-nascidos da Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo; 2009. 5. Siston AM, Rasmussen SA, Honein MA, Fry AM, Seib K, Callaghan WM, Louie J, Doyle TJ, Crockett M, Lynfield R, Moore Z, Wiedeman C, Anand M, Tabony L, Nielsen CF, Waller K, Page S, Thompson JM, Avery C, Springs CB, Jones T, Williams JL, Newsome K, Finelli L, Jamieson DJ; Pandemic H1N1 Influenza in Pregnancy Working Group. Pandemic 2009 influenza A(H1N1) virus illness among pregnant women in the United States. JAMA. 2010;303(15):1517-25. 6. Weber C, Correa G, Haberland M, Martini RR, Beck SE, Lara GM. Risco de infecção da gripe H1N1 em gestantes e HIV positivos. Newslab. 2013;118:122-4. 7. Protocolo de Tratamento de Influenza do Ministério da Saúde – 2013. 8. Pereira BFB, Martins MAS, Barbosa TLA, Silva CSO, Gomes LMX. Motivos que levaram as gestantes a não se vacinarem contra H1N1. Ciência Saúde Col. 2013;18(6):1745-52. Referências 1. Figueiró EA, Oliveira MLG, Coelho LR, Souza BA. Infecção pelo vírus H1N1 e gestação. FEMINA. 2011; 39(2). 2. Pastore APW, Prates C, Gutierrez LLP. Implicações da influenza A\H1N1 no período gestacional. Scientia Med. 2012;22(1):53-8. 3. Nassar AP, Mocelin AO, Nunes ALB, Brauer L. Apresentação clínica e 62 Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 60 - 62, abr / mai / jun 2014 A importância do diagnóstico precoce para o tratamento específico da leucemia promielocítica aguda The importance of early diagnosis or specific treatment of acute promyelocytic leukemia Suellen Nastri Castro1 Letícia Medeiros2 RESUMO ABSTRACT Introdução: a leucemia promielocitica aguda é uma doença peculiar, responsável por 10 a 15% das leucemias mieloides agudas. Aproximadamente 95% dos casos apresenta translocação balanceada entre os cromossomos 15 e 17 envolvendo rearranjo dos genes PLM e RARa. Cabe ressaltar a importância dos novos tratamentos, como ATRA e sua associação com quimioterapia, como visto anteriormente dobra a taxa de cura, eleva as taxas de remissão a 80 a 90% dos casos e as taxas de sobrevida em longo prazo se tornam superiores a 75% em relação à quimioterapia isolada. Relato de caso: apresentamos um caso de uma paciente com quadro inespecífico de pancitopenia, prontamente suspeitado de leucemia aguda. Foi introduzido ATRA (acido transretinoico), antes mesmo de iniciar investigação especifica de qual tipo de leucemia estávamos lidando, conduta essa que exige experiência do profissional e conhecimento do comportamento da doença e que melhora o prognostico principalmente da leucemia mieloide aguda do tipo promielocitica. Descritores: Leucemia Promielocitica Aguda. Ácido Transretinoico. Introduction: The acute promyelocytic leukemia is a peculiar disease, accounting for 10-15% of acute myeloid leukemias. Approximately 95% of the cases present balanced translocation between chromosomes 15:17 rearrangement involving genes and PLM RARa. We highlight the importance of new treatments, such as ATRA and its association with chemotherapy, as seen earlier doubles the cure rate increases remission rates of 80 to 90% of cases and rates of long-term survival becomes greater than 75% compared to chemotherapy alone. Case report: We present a case of a patient with nonspecific box pancytopenia, promptly suspected acute leukemia. ATRA (all-trans retinoic acid) was introduced even before starting research specifies which type of leukemia were dealing, conduct that requires professional experience and knowledge of the behavior of the disease, which mainly improves the prognosis of acute myeloid leukemia promyelocytic type. Key words: Acute Promyelocytic Leukemia. Trans Retinoic Acid. Introdução Leucemia mielóide aguda (LMA) é uma doença clonal maligna que se caracteriza pela proliferação anormal de células progenitoras da linhagem mielóide, ocasionando produção insuficiente de células sanguíneas maduras normais. Desse modo, a infiltração da medula por essas células é frequentemente acompanhada de pancitopenia. O mecanismo que faz com que a célula perca o controle da proliferação celular, ocasionando clone leucêmico, parece estar relacionado com a ativação de proto oncogênese mutação em genes supressores que regulam o ciclo celular1. O pleomorfismo da LMA, assim como uma possível diferença no comportamento biológico, motivou o estabelecimento de uma classificação. Em 1975, pela primeira vez, o grupo cooperativo Franco Americano Britânico (FAB) propôs a classificação em seis diferentes subtipos, baseado estritamente em aspectos morfológicos e citoquímicos. Em 1985, essa classificação foi revisada originando a atual, onde foram acrescentados dois novos subtipos1 – Tabela 1. 1) Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. 2) Médica Assistente de Hematologia Clínica do Hospital Ana Costa Instituição: Serviço de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil. Correspondência: Av. Bernardino de Campos, 586 ap 11, Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected] Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 11/03/2014; publicado online em: 31/05/2014. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 63 - 64 abr / mai / jun 2014 63 Como visto acima, a leucemia promielócitica aguda (M3) se caracteriza por apresentar promielócitos anormais. Nesse tipo de leucemia, os pacientes costumam apresentar quadro clinico e laboratorial compatível com coagulação intravascular disseminada (CIVD), situação essa grave que necessita rápido diagnóstico e intervenção. Após o advento do ácido transretinoico (ATRA), a LMA M3 passou a apresentar boa resposta a esse quadro de coagulopatia grave, tornando-se o subtipo com melhor prognóstico e chance de cura. Caso clínico Paciente feminina, de 20 anos, veio encaminhada do PS Guarujá, devido a quadro de febre diária, não aferida, associada a mal-estar inespecífico, fraqueza, inapetência e dor no corpo havia aproximadamente um mês. Referiu que, nesse período, procurou o PS do Guarujá diversas vezes e, durante as avaliações, foi diagnosticada infecção do trato urinário e gripe. Apesar do tratamento adequado, mantinha os mesmos sintomas. Ao exame físico, apresentava-se descorada, desidratada e febril. O hemograma de entrada apresentava pancitopenia, principalmente anemia e plaquetopenia. Suspeitou-se de leucemia mielóide aguda e, de imediato, introduziu-se vesanoid. Após, foram solicitados exames laboratoriais complementares, mielograma com imunofenotipagem e citogenética, onde se fechou o diagnóstico de leucemia mielóide aguda do tipo M3 – promielocítica aguda. Iniciou-se, associado ao Vesanoide, quimioterapia com Antraciclina e Citarabina. A paciente evolui com melhora do quadro, sem complicações, seguindo em acompanhamento ambulatorial. Discussão A leucemia promielocítica aguda é caracterizada pela proliferação anormal de células progenitoras de linhagem mielóide. Os promielocitos anormais têm núcleo excêntrico, abundantes granulações e múltiplos bastonetes de Auer no citoplasma, que caracterizam esse tipo de leucemia. Ela corresponde a 10 a 15% das leucemias mieloides agudas e, de acordo com a classificação de FAB (Franco-Americana-Britânico), é caracterizada pela sua apresentação celular e características citoquímicas como M3, onde, em cerca de 90% dos casos, há translocação t15; 17 q22; q212. Em 1991, descobriu-se que essa translocação cromossômica causava a fusão do gene do receptor do ácido transretinoico alfa (RARa) ao chamado gene de leucemia promielocítica no cromossomo 15, produzindo uma proteína de fusão, PML RARa (que pode ser confirmada por meio da detecção por método de FISH, reação de cadeia de Polimerase -RTPCR ou citogenetica convencional). 64 Portanto, esses dados sugeriam que a perda da função normal do gene deveria ser a causa do desenvolvimento da leucemia promielocitica aguda2. A LPA, diferentemente dos outros subtipos de LMA, ocorre com maior freqüência em adultos jovens e tem incidência praticamente estável entre os 20 e 59 anos de idade. Não há predomínio de nenhum dos sexos e não está associada à síndrome mielodisplásica prévia. Apresenta maior incidência em países de colonização latina e algumas regiões da Espanha. Porém, a real incidência da LPA não é conhecida e a maioria dos estudos baseia-se em registros hospitalares3. A leucemia promielocítica aguda é uma emergência hematológica que, na maior parte dos casos, apresenta-se clinicamente por pancitopenia, podendo estar presente no início do diagnóstico uma grave coagulopatia. Assim, requer confirmação diagnóstica imediata e medidas terapêuticas precisas. A introdução do acido transretinóico na terapia da LPA dobra a taxa de cura em relação à quimioterapia isolada e as taxas de remissão em 80 a 90% dos casos. As taxas de sobrevida em longo prazo superior a 75% foram alcançados com a combinação de ATRA e quimioterapia contendo antraciclina. Ainda assim, em média, 10% dos pacientes morrem na fase inicial da doença e 20 a 30% recidivam4. O tratamento da LPA sofreu importantes modificações nos últimos 20 anos e difere dos esquemas utilizados para as demais LMAs. O maior impacto no tratamento da LPA foi, sem dúvida, a demonstração de que o ácido all-trans-retinóico (ATRA), em doses farmacológicas, permite a progressão da diferenciação celular. Desta forma, o clone leucêmico progride na maturação mielóide, tornando-se susceptível aos mecanis-mos de morte celular. O tratamento com ATRA deve ser iniciado imediatamente diante da suspeita morfológica3. Referências 1. Martins SLR, Falcão RP. A importância da imunofenotipagem na leucemia mielóide aguda. Rev Ass Méd Bras. 2000;46(1):57-62. 2. Prevedello CP, Sagrillo MR. Disc. Scientia. Série: Ciências da Saúde, Santa Maria, 2008;9(1):39-50. 3. Jácomo RH, Figueiredo-Pontes LL, Rego EM. Do paradigma molecular ao impacto no prognóstico: uma visão da leucemia promielocítica aguda. Rev Ass Méd Bras. 2008;54(1):82-9. 4. Lengfelder E, Platzbecker U, Niederwieser D, Schlenk RF, Womann B. Onkopedia Guidelines; 2012. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 63 - 64 abr / mai / jun 2014 Abscesso cerebral em paciente portador de endocardite de valva protética Brain abscess in patients with prosthetic valve endocarditis Amanda Evelyn Andrade Rocha¹ Rodolfo Leite Arantes² RESUMO Introdução: A endocardite infecciosa (EI) é uma infecção microbiana de uma valva cardíaca ou do endocárdio mural. A disponibilidade de agentes antimicrobianos potentes, dotados de capacidade bactericida e o progresso da tecnologia cirúrgica promoveram uma redução na morbidade e na mortalidade relacionadas à endocardite. Todavia, a EI representa uma doença em evolução. Para ser capaz de diagnosticá-la prontamente e tratá-la de modo eficaz, devemse compreender suas novas e sutis apresentações, os problemas especiais envolvidos quando do acometimento de uma prótese valvar, complicações extracardíacas, a abordagem antibiótica moderna e o papel desempenhado pela cirurgia no tratamento desta condição. Relato de caso: Apresentamos o caso clinico de um paciente de 52 anos, portador de endocardite de prótese valvar mitral, evoluindo com presença de múltiplos abscessos cerebrais. Optou-se pela realização de drenagem cirúrgica do abscesso e, posteriormente, nova troca de prótese valvar. ABSTRACT Introduction: Infective endocarditis (IE) is an infection of a heart valve or mural endocardium. The accessibility of potent antimicrobial agents, endowed with bactericidal capacity and progress in surgical technology promoted a reduction in morbidity and mortality related to endocarditis. However, IE is a disease in evolution. In order to be able to directly diagnose it and treat it effectively, the clinician must understand their new and subtle manifestation, the special problems with the involvement of a prosthetic valve, extracardiac complications, antibiotic modern approaches and the role of surgery in treating this condition. Case report: We present the clinical case of a patient of 52 years old, with prosthetic mitral valve endocarditis, developing the presence of multiple brain abscesses. It was decided to carry out the surgical drainage of the abscess and subsequent surgery for replacement of the valve prosthesis. Key words: Infective Endocarditis. Valve Prosthesis. Cerebral Abscess. Descritores: Endocardite Infecciosa. Prótese Valvar. Introdução A endocardite infecciosa é uma infecção microbiana de uma das valvas cardíacas ou do endocárdio mural causada por agentes infecciosos. A lesão primária é uma vegetação, que consiste em um trombo de plaquetas e fibrina infectado, localizado dentro do coração1. A infecção valvar nativa (EVN) consiste em uma infecção de valvas cardíacas naturais normais ou anormais. A endocardite de valva protética (EVP) envolve valvas artificiais implantadas. A incidência geral da endocardite infecciosa varia de 1,7 a 6,2 casos:100.000 indivíduos/ano2. Embora a incidência geral tenha permanecido relativamente estável nas últimas cinco décadas, houve variação da frequência relativa da doença em determinados subgrupos particulares, assim como de muitos aspectos distintos de sua epidemiologia. A média da idade dos pacientes que sofrem de endocardite aumentou para 57,9 anos3. Entre as principais condições predisponentes, a doença cardíaca reumática crônica tornou-se relativamente incomum nos países desenvolvidos, enquanto as doenças valvares degenerativas ganharam importância. Os casos de endocardite associada ao uso abusivo de fármacos por via parenteral e à presença de valvas cardíacas protéticas tornaram-se mais comuns, assim como a endocardite infecciosa nosocomial. Também está havendo aumento da frequência das infecções com envolvimento de dispositivos intravasculares implantados, referidas como endocardites infecciosas associadas a dispositivos cardíacos (EIADC), diferentes do envolvimento valvar4. O risco de endocardite protética valvar é de 1 a 5% no primeiro ano 1) Médica Residente de Clinica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP. 2) Médico Cardiologista do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Instituição: Serviço de Cardiologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP. Correspondência: Rua Pedro Américo, 60, Santos/SP, Brasil. E-mail: Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em 05/03/2014; publicado online em: 31/05/2014. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 65 - 67 abr / mai / jun 2014 65 após o implante e depois diminui para cerca de 1% por ano. É semelhante entre válvulas mecânicas e prótese biológica e comparável entre as válvulas nas posições aórtica e mitral5. EPV ocorrendo nos primeiros 12 meses após a cirurgia é mais freqüentemente causada por estafilococos coagulase-negativo ou S. aureus6, enquanto EPV de início tardio tem microbiologia semelhante ao ENV7. Os pacientes com EI aguda geralmente descrevem o início abrupto de febre e calafrios e pode apresentar sintomas de embolia. A história deve incluir inquérito específico sobre os fatores de risco conhecidos para o EI, incluindo procedimentos invasivos, uso de drogas injetáveis, doença cardíaca estrutural, e endocardite prévia. A apresentação clínica da EI subaguda é variável, caracterizada por sintomas constitucionais de longa data1. Complicações podem ser comuns em pacientes com EI. Complicações cardíacas foram as mais comuns, mas as taxas de mortalidade foram maiores para complicações neurológicas e sépticas. Por isso, a insuficiência cardíaca foi substituída por complicações neurológicas e sépticas como as principais causas de morte em pacientes com endocardite infecciosa. As complicações neurológicas podem surgir por meio dos seguintes mecanismos, frequentemente associadas no mesmo paciente: oclusão das artérias cerebrais por embolia derivados de vegetação endocárdica, hemorragia cerebral, infecção das meninges, abscesso cerebral e aneurismas micóticos. Encefalopatia relacionada à sepse, definida por estado confusional agudo ou delírio, com flutuação de vigilância também pode contribuir para manifestações neurológicas da EI, especialmente em pacientes com infecção pelo S. aureus8. Relato de caso Paciente de 52 anos, caucasiano, masculino, portador de insuficiência mitral, submetido à cirurgia para troca de valva mitral por prótese biológica em abril de 2013. Procurou atendimento médico em nosso serviço em 16 de julho 2013 apresentando episódios de febre alta e dor torácica recorrente havia dois dias. Ao exame, apresentava-se em regular estado geral, corado, desidratado+/4+, anictérico, acianótico, febril (39°C), com pressão arterial de 110 x 70 mmHg, frequência cardíaca 120bpm e saturação de O2 de 98% em ar ambiente. O ecocardiograma evidenciou função ventricular diminuída de grau importante, hipocinesia difusa, prótese biológica mitral com gradiente médio de 2,5mmHg e presença de imagem ecogênica mitral na haste da prótese sugestiva de vegetação. A terapia com Vancomicina, Rifampicina e Meropenem foi iniciada e o paciente foi internado no nosso serviço. No segundo dia de internação, evoluiu com quadro de confusão mental e hemiplegia direita, sendo então transferido para UTI cardiológica. Foi submetido a uma tomografia computadorizada de crânio e, posteriormente, ressonância magnética, evidenciando presença de diversas lesões isquêmicas cortiço-subcortical occipital esquerdo, cortiço-subcortical parietal bilateral, subcortical fronto-temporo-parietal esquerda e presença de formação com sinal heterogêneo na região frontal esquerda com compressão de sulcos cerebrais ipsilateral – Figura 1. A equipe da neurocirurgia optou por intervenção cirúrgica com realização de drenagem do abscesso cerebral sem intercorrência. Evoluiu com melhora do quadro clinico, consciente e orientado, afebril, com persistência de hemiparesia direita. A hemocultura evidenciou presença de Staphylococcus aureus. Recebeu alta hospitalar em 3 de setembro, em uso de Vancomicina, orientado acompanhamento com equipe para programação de cirurgia eletiva para nova troca de prótese valvar em dois meses. Apresentou novos quadros de febre e, após 10 dias, foi novamente internado para realização de nova troca de valva mitral biológica, sem intercorrêncis. Evolui de forma satisfatória, assintomático e com melhora parcial do déficit motor à direita. Recebeu alta hospitalar em 21 de outubro, mantendo uso de Vancomicina e em acompanhamento com serviço de home care. 66 Figura1 – Ressonância magnética de crânio, evidenciando abscessos cerebrais. Discussão O Staphylococcus aureus é a causa principal de EI aguda. A incidência de S. aureus vem aumentando nas últimas décadas, tornando-se o organismo predominante na maioria dos relatórios. O aumento do uso de cateteres endovenosos e próteses implantadas levaram a taxas mais elevadas de estafilococos associados à bacteremia, colocando mais pacientes em risco para o EI9. Está associada a maiores taxas de embolia e de mortalidade em comparação com a EI causada por outros organismos10. O abscesso cerebral é uma complicação rara da EI subaguda, porém, é menos rara na forma aguda. É detectável por meio de tomografia computadorizada com infusão de contraste ou ressonância magnética. Esses abscessos são geralmente pequenos, com menos de 1,5cm de diâmetro e, frequentemente, são múltiplos. A terapêutica antimicrobiana intensiva, com um agente antimicrobiano capaz de atravessar a barreira hematoencefálica, representa um tratamento eficaz. É rara a ocorrência de um grande abscesso cerebral, exigindo a drenagem cirúrgica11. Determinadas subpopulações de pacientes com EI experimentam uma elevada taxa de mortalidade, apesar da terapêutica com agentes antimicrobianos potentes. Essas subpopulações englobam aqueles pacientes cuja EI é causada por um microrganismo virulento ou resistente à antibioticoterapia e aqueles pacientes cuja EI produz complicações cardíacas ou extracardíacas significativas. A endocardite em próteses valvulares é complicação pouco frequente, porém, muito grave. A intervenção cirúrgica é frequentemente necessária, contudo, há controvérsia em relação ao melhor momento para indicação. Não há consenso, na literatura, em relação aos fatores que provocariam a endocardite após o implante da prótese. Nos casos em que a doença desenvolve-se precocemente após a cirurgia, a contaminação pré ou intraoperatória da prótese é o fator mais aceito, principalmente quando o agente etiológico é estafilococo12. A ausência de ensaios clínicos randomizados na literatura de terapia cirúrgica versus terapia médica isolada no tratamento de EI, as diretrizes atuais para o tratamento cirúrgico da IE são baseadas principalmente em dados observacionais, que são propensos a vícios, como confusão por indicação e sobrevivência e viés de seleção de tratamento13. Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 65 - 67 abr / mai / jun 2014 O tratamento cirúrgico para endocardite protética valvar é frequentemente indicado, e é realizada em cerca de metade de todos os casos de EPV14. Esses pacientes devem ser cuidadosamente considerados para cirurgia, embora pacientes de baixo risco com EPV podem ser geridos de forma adequada com a terapia médica sozinho. Características que sugerem menor risco incluem ausência de insuficiência cardíaca, abscesso ou deiscência da válvula, e aqueles cuja EI é causada por organismos menos virulentos, como estreptococos viridans15. Baseados em dados da literatura, podemos concluir que as condições clínicas pré-operatórias influem decisivamente no resultado cirúrgico, não devendo, portanto, ser postergada a indicação da operação quando o tratamento clínico não está produzindo resultados satisfatórios. A cirurgia de urgência tem resultados menos favoráveis, devido às condições mais críticas dos doentes. Endocardites mais precoces são mais graves e a manipulação de focos infecciosos em pacientes com prótese valvular deve ser cuidadosa e precedida de antibioticoterapia. Nos pacientes sobreviventes à operação, a evolução em longo prazo apresenta melhora significativa da classe funcional12. A sobrevida geral para os pacientes com endocardite infecciosa é de cerca de 75 a 80%. Essa taxa de sobrevida é um pouco melhor que aquela vigente na década de 1950, mas ainda precisa melhorar16. A perspectiva depende em grande parte da rapidez com que o diagnóstico é estabelecido e a terapia é iniciada, bem como da natureza do organismos infeccioso, da existência de comorbidades e do desenvolvimento de complicações cardíacas e neurológicas17. Embora os resultados sejam piores nos casos de EPV em fase inicial, as taxas de sobrevida para os pacientes em fase tardia parecem ser similares às taxas de sobrevida dos pacientes com infecção de valva nativa18. Com a incorporação de uma intervenção cirúrgica mais precoce no tratamento dos pacientes com endocardite, a insuficiência cardíaca passou ter menor destaque como causa mortalidade. No entanto, as complicações significativas envolvendo o SNC e a infecção descontrolada, sobretudo a formação de abscesso, continuam associadas a uma maior mortalidade19. endocarditis: A consequence of medical progress. JAMA. 2005;293:301221. 10. Miro JM, Anguera I, Cabell CH, Chen AY, Stafford JA, Corey GR, Olaison L, Eykyn S, Hoen B, Abrutyn E, Raoult D, Bayer A, Fowler VG Jr;International Collaboration on Endocarditis Merged Database Study Group. Staphylococcus aureus native valve infective endocarditis: Report of 566 episodes from the International Collaboration on Endocarditis Merged Database. Clin Infect Dis. 2005;41:507-14. 11. Pruitt AA, Rubin RH, Karchmer AW, Duncan GW. Neurologic complications of bacterial endocarditis. Medicine. 1978;57:329. 12. 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